Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
CURSO MESTRADO EM DESIGN DISCIPLINA: DESIGN ESTRATÉGICO E INOVAÇÃO SOCIAL DOCENTE: RUI MIGUEL FERREIRA RODA DISCENTE: LEONARDO DE OLIVEIRA BONALDI (Ano letivo 2018/2019) DESIGN ESTRATÉGICO E CULTURA DE PROJETO JUNTO AO PRODUTO-SERVIÇO BONALDI, Leonardo de Oliveira 1 RESUMO Esta recensão crítica em forma de artigo discute o significado amplo e difundido do Design Estratégico na contemporaneidade, sendo guiado sempre pela visão da cultura de projeto implementada em empresas e indústrias. São abordados os aspectos relacionados aos que foram abordados nos textos apresentados durante as aulas da disciplina, os tendo como ponto de partida. Passando por exemplos de PSS, implicações do design estratégico nos cenários criados e sua influência na vantagem competitiva de empresas. Um dos principais objetivos é refletir sobre o tema e mostrar suas possibilidades projetuais, uma vez que, quando se trata de design estratégico a ênfase está em aspectos pouco profundos e pouco integrados com os processos projetuais. Palavras-chave:. Design Estratégico, Sistema Produto-Serviço, Cultura de Projeto, Estratégias, Usuário, Posicionamento. ABSTRACT This critical review in the form of an article discusses the broad and widespread significance of Strategic Design in contemporary times, being always guided by the vision of the project culture implemented in companies and industries. The aspects related to the ones that were approached in the texts presented during the classes of the subject are approached, taking them as starting point. Going through examples of PSS, implications of strategic design in the scenarios created and their influence on the competitive advantage of companies. One of the main objectives is to reflect on the theme and to show its design possibilities, since when it comes to strategic design the emphasis is always on clear and little integrated aspects with the design processes. Keywords: Strategic Design, Product-Service System, Project Culture, Strategies, User, Positioning. _____________ 1Aluno do Curso de Design da Universidade de Évora, leonardobonaldi@gmail.com; Évora – Portugal, janeiro de 2019. 2 INTRODUÇÃO “Não existem receitas formais capazes de equacionar os desafios da atualidade”. A afirmação, feita por Rafael Cardoso (2012: 41), demonstra a complexidade de se buscar soluções para problemas na pós-modernidade, os quais abrangem a área social, ambiental e econômica, sendo, de toda forma, de interesse comum. O Design estratégico, hoje analisado de diversos pontos de vista, engloba todas essas áreas e devido à sua complexidade de dimensionamento e delimitação, demanda uma pesquisa ampla desde o pós Terceira Revolução Industrial, momento em que a área de design se expandia mas ainda ficava na periferia das decisões projetuais. É fato que, desde os primórdios, a área de design intermedia a relação entre o sistema sociocultural e o sistema produtivo para criar ofertas materializadas (Freire, 2014), trazendo ideias instagíveis para a tangibilidade, estando intrinsicamente ligado ao mixer de conhecimentos e processos que o design deve lidar para criar estratégicas mercatológicas e posteriormente posicionar uma empresa no mercado. Dessa maneira, ao citar o sistema sociocultural, que segundo a própria definição da palavra, diz respeito aos aspectos sociais e culturais de uma sociedade ou comunidade, entendemos implicitamente que se trata das realizações humanas, delas é que se origina esse sistema. De forma semelhante o sistema produtivo só existe devido às realizações humanas, seja para produzir, para consumir toda a produção e também para criar novas demandas neste setor. Assim, se o design intermedia esses dois sistemas, ele está ligado às relações interpessoais, a forma de expressão, a hierarquização de classes, as formas de comunicar de um grupo, as ferramentas utilizadas em atividades do cotidiano, dentre muitas outras coisas. O que devemos pontuar ainda é que o design estratégico aborda justamente esses aspectos a nível de projeto, não como complemento para adequação daquilo que já está definido, mas definindo durante o projeto aspectos primordiais do produto ou serviço. Logo, trataremos aqui de discutir a definição de design estratégico junto a cultura de projeto, por meio de exemplos do sistema produto-serviço, além de demonstrar que a atividade projetual deve tormar partido do design, para que o produto final seja adequado ao uso e ao usuário, baseando-se nisso para buscar novas estratégias organizacionais. Na empresa contemporânea a estratégia é “um processo coletivo de construção de sentido” (Zurlo apud Freire, 2014: 4) e ainda segundo Francesco Zurlo (2010: 2): o design estratégico opera em âmbitos coletivos, suporta o agir estratégico graças às próprias capacidades e finaliza a própria operatividade na geração de um efeito de sentido, que é a dimensão de valor para alguém, concretizando este resultado em sistemas de oferta mais do que em 3 soluções pontuais, um produto-serviço mais do que um simples produto, que é a representação visível da estratégia. O presente artigo tem como objetivo analisar criticamente o pensamento de pesquisadores como Francesco Zurlo, Anna Meroni e Ezio Manzini, que escrevem sobre design estratégico, permeado pela análise das ações projetuais, dos atores envolvidos, das relações desencadeadas, das áreas do conhecimento utilizadas e pelos processos que derivam e dependem desses pontos. DAS ORIGENS AS ÁREAS DO CONHECIMENTO E SEUS ATORES O design estratégico é nomeadamente, segundo Zurlo (apud Freire, 2014: 2), a contribuição da área do design para as organizações, de modo que se desenvolvam estratégias pela coprodução de valor e não pela competição, definindo sua identidade e as posicionando no mercado. Primeiramente, fica claro que o design estratégico está mesmo inserido na lógica das organizações, entendendo organização como a associação de pessoas para um propósito coletivo (Maximiano, 1993), sendo elas empresas, órgãos do governo, entidade públicas e privadas e do terceiro setor. Ao entender associação de pessoas, estamos englobando todo tipo de associação composto por pessoas com um objetivo coletivo, para demonstrar que o design está, ou deveria estar presente, em todas as empresas e organizações que lidam com decisões projetuais. É realmente complexo delimitar onde o design se faz presente e onde poderia fazer, uma vez que suas origens remontam da Bauhaus e da Revolução Industrial, quando o design ainda era entendido como desenho industrial. O fato é que sua origem se mescla com a própria história da cultura material, sofrendo um processo de evolução constante para chegar até o que conhecemos hoje como design. Esse processo ocorreu com o design estratégico, o qual antes era entendido como design para diferenciação de produtos (Kotler e Rath apud Freire, 2014) deixou, após os anos 90, de ser apenas instrumento e passou a nortear o desenvolvimento de estratégias por meio da produção coletiva de valor. O desenvolver estratégias, ainda de acordo com Zurlo, diz respeito a definição de qualidades, construção de sentido e de identidade de uma organização, com decisões tomada em conjunto, dentre os atores de uma empresa, sejam eles os que ocupam cargos de gerência ou os colaboradores indiretos de um projeto. Tange assim ao conceito de inovação social, outro item importante para posicionamento mercadológico e que, na contemporaneidade, vai ao encontro da ideia de Zurlo sobre a coprodução coletiva, a inovação social, podendo ser classificada, segundo Manzini, entre inovação top-down (de cima para baixo), bottom-up (de baixo para cima) e híbrida (encontro das duas anteriores). 4 Manzini caracteriza a inovação social como um processo de mudança recombinando ativos existentes para alcançar objetivos sociais de umanova maneira (2014:1), o que podemos concordar em sua totalidade pois inovar é reorganizar determinados aspectos para originar outros mais adequados, no caso da inovação social estamos falando de uma relação próxima ao design estratégico no que se refere a diversidade de atores envolvidos e o objetivo comum dentre ambos. O que parece inadequado a priori, mas que se faz compreendido numa análise mais profunda, é o fato de Manzini diferenciar os tipos de inovação como sendo a top-down dirigida pelo design estratégico e a bottom-up pelas comunidades locais, porque considerando os diversos atores nos processos de design estratégico, a comunidade local pode participar da tomada de decisões numa inovação top-down, mesmo não sendo ela o gerente de determinado setor de uma empresa, mas é nela que estão os usuários dos produtos-serviços criados, e são eles que darão feedbacks para modificações futuras e possíveis inovações a partir disso. Podemos depreender da visão de Manzini que o fazer comunitário e o fazer empresarial se distanciam na medida em que ações vindas do topo podem não atingir a comunidade, de forma que as vindas de baixo partem da comunidade e afetam diretamente ela. Dessa maneira a inovação híbrida é a mais próxima do design estratégico, considerando um alinhamento entre os autores citados, pois nela é que se constroem plataformas de sentido coletivo para apoiar as tomadas de decisão. OS PROJETOS E SEUS MÉTODOS Ana Meroni (2008: 37) considera que design estratégico se trata da construção de cenários: a maneira como um designer estratégico transforma visões em hipóteses plausíveis por meio deles. Os quais são visões compartilháveis que traduzem informações e intuições em conhecimento perceptível. A construção de cenários, segundo Meroni, é a maneira indutiva do design estratégico de abordar a resolução de problemas. Complementando a mesma linha de raciocínio, Francesco Mauri (apud Freire, 2014) sugere que o design pode assumir o papel de articular diferentes saberes e dar forma as ideias por conta de suas competências peculiares: uma disposição à intuição e à sensibilidade perceptiva e estética; uma capacidade de escuta, de imaginação, de pesquisa da inovação e de recusa pela solução óbvia. É pela sua habilidade de tornar o pensamento visível. Tendo em vista essas proposições, o design estratégico tem mesmo como uma das capacidades e artifícios principais construir cenários, uma vez que, as ideias e ações 5 pensadas devem ser mostradas como possíveis e alcançáveis, demonstrar isso se faz, de forma mais eficaz, por meio da criação de cenários, utilizando ações no presente de acordo com o que se vislumbra para o futuro e não apenas com ações futuras. Essas ações são coletivas, por englobar atores diversos, e também por se tratar de encaminhamentos projetados pelos objetivos, que necessitam de envolvimento ativo dos participantes, desde gerentes, investidores, stakeholders e fornecedores, bem como dos usuários. Não podemos deixar de exemplificar aqui com casos do sistema produto-serviço que se encaixam nessa lógica. Desenvolver um produto, que muitas vezes não vai ser utilizado para seus fins mais óbvios, e associá-lo ao desenvolvimento de um serviço, para suprir necessidades específicas do usuário e vender esse conjunto. São casos como o Uber, que vendem o serviço de transporte privado, ou das lavanderias que comercializam a lavagem das roupas, ou mesmo de aplicativos de telemóvel que vendem o acesso a músicas e filmes por streaming. Todos esses foram projetados pela criação de cenários, propondo soluções baseadas nos já existentes, considerando para seu funcionamento os agentes e suas ações desempenhadas. Para os streamings services, do ponto de vista projetual, certamente foram criados personas que os utilizariam, considerando suas necessidades e o que buscavam, como seria o contato e uso da plataforma, e cada uma de suas ações durante o uso, que são utilizadas para enxergar problemas e fazer ajustes. Esses pontos são os mesmos utilizados para posicionamento estratégico no mercado, atendendo o usuário de maneira superiormente satisfatória, com ferramentas não presentes em serviços semelhantes de outras empresas, ou seja, criando valor na cadeia de consumo. Devemos ressaltar a capacidade de leitura qualitativa do design e simulação projetual, e como apontado por Manzini e Jegou (apud Freire, 2014), o diálogo estratégico entre atores externos e internos à organização é promovido por meio da produção de cenários, uma vez que, permite desenvolver uma visão compartilhada e comum a todos os envolvidos. Por outro lado, mesmo que Zurlo não aponte um método que articule essas capacidades, podemos pontuar os frameworks como um deles. Uma estrutura base para ser replicada em diversos projetos, que considera o que acontece no presente e aponta o que se deseja no futuro, podendo se basear na experiência do usuário, o pós compra. De fato é uma maneira eficaz de buscar uma metodologia de projeto adequada, porque mais uma vez favorece a discussão de pontos de vista diferentes, para tomar decisões e direcionar o projeto coletivamente. É de suma importância dizer que, durante o processo projetual, surgirão conflitos e divergências em relação a tomada de decisões norteada por vários pontos de vista. Como exemplo, o que aponta Francesco Zurlo (2010) é o brief demasiadamente limitador, pois 6 para o autor, quanto mais definido for o brief menor será a capacidade criativa e estratégica do design, pois isso reflete a exigência de que o processo de projeto seja coerente e controlado. As alternativas apontadas são integrar o design durante a definição do brief ou formular um controbrief interlocutório, buscando razões daquilo que é pedido. Sendo assim é mesmo necessário buscar alternativas, pelo fato de que não é possível integralizar o design estratégico nos projetos de uma organização que só o considera na busca de estratégicas de posicionamento mercadológico, semelhante a instrumentalidade do design antes dos anos 90. Ele deve ser parte ativa das etapas de projeto, seja na criação de personas, na geração de opções de projeto e na escolha delas, no desenvolvimento, aprimoramento e detalhamento do projeto e até mesmo no feedback pós implementação. E o design aparecerá não somente como estratégico, mas também como design thinking, agindo ativamente no método de projeto, design management, gerenciando as etapas de projeto e suas demandas, dentre outras várias nomeações recebidas pelo design que orienta decisões organizacionais a nível projetual. Tomando base do que foi exposto, para exemplificar os fatos, Alexandre Real (2017), mestre em gestão de empresas, analisa casos de empresas que eram líder de mercado em um determinado período e que perderam esse posto ou decretaram falência. O fato é que elas não estavam atentas ao mercado de forma a adaptar produtos e serviços e saber responder a demanda específica do setor que se encontram. Assim não existem empresas ou profissões imutáveis, que não precisem passar por adequações durante todo seu período de atividade. Esse fato influencia a educação e formação das pessoas, que deve cada vez mais estarem dotadas de competências transversais para que possam desempenhar mais de um cargo. Real define essas competências como sendo a criatividade, comunicação, resolução de problemas complexos, pensamento crítico entre outras. Podemos então relacionar esse mapa de competências com o design estratégico, pois de forma análoga os posicionamentos diferentes devem servir para buscar soluções não imaginadas, tirando proveito das melhores partes de cada um deles durante o projeto, incluindo ainda as competências diversas de uma organização para a diferenciar das demais. Esse mix é o que garante às organizações a capacidade de lidar com o ambienteexterno evoluindo e desenvolvendo sua identidade (Meroni, 2008), assim compreendemos essa lógica como estando o design estratégico dentro das empresas, analisando por pontos de vista de dentro e de fora, buscando objetivos definidos coletivamente pelos agentes envolvidos e utilizando-os para nortear ações. 7 CONCLUSÕES O design estratégico, segundo apontado pelos autores abordados, possui definição complexa. Entendemos que ele é mais que uma ferramenta ou finalidade, é parte de um processo. Processo que se inicia incluindo partes que pensam e se posicionam de forma diferente e analisando as potencialidades de uma, ou seja, diversos pontos de vista que podem ou não estar apontados para o mesmo objetivo, mas que ao traçar os pontos finais convergem para um objetivo final comum. Esse objetivo se torna coletivo na medida em que os atores envolvidos são considerados como possibilidades de agregar valor àquela organização por poder contribuir com sua experiência. Os métodos utilizados passam pela observação de oportunidades do mercado em que a organização está inserida, tomando partido da leitura e tradução dos ambientes pelo design, o qual primeiramente cria hipóteses e ideias para mudar a situação atual e as materializa em cenários. Os cenários demonstram os ganhos futuros com ações no presente, que serão desempenhadas pelos diversos atores da organização que se trata, porque como já definido anteriormente, uma organização é uma associação de pessoas. Esses cenários criados servirão para continuar a projetar o produto ou serviço em questão e direcionar decisões de forma adequada. Esse projeto resultara então em protótipos que serão testados, analisando considerações dos usuários para fazer modificações e ajustes. O qual encaminha para implementação do que foi criado e deve estar atento às respostas do mercado. Essas respostas, feedbacks e formas de lidar podem ser utilizadas para promover melhorias naquele serviço, e ser também argumento para traçar estratégias de mercado, e então esse ciclo se repete. Podemos concluir assim que o design estratégico não existe sem a troca, sem o compartilhamento de ideias, de posicionamentos, de visões. A cultura de projeto é parte integrante pois configura o sentido que irá apoiar as decisões, e esse sentido pode mudar conforme os novos objetivos buscados. 8 REFERÊNCIAS CARDOSO, Rafael. Design para um mundo complexo. São Paulo: Cosac Naify, 2012. FREIRE, Karine de Mello. Design Estratégico: Origens e Desdobramentos. Blucher Design Proceedings, v.1, n.4, Nov. 2014. MANZINI, Ezio. Making things happen: Social innovation and design. Design Issues, v.30, p. 57---66. 2014. MAXIMIANO, Antonio Cesar A. Introdução a administração. 3ª ed. São Paulo: Editora Atlas, 1992. MERONI, Anna. Strategic design: where are we now? Reflection around the foundations of a recente discipline. Strategic Design Research Journal, v.1, n.1, Dec 1, p.31--‐38. 2008. REAL, Alexandre. As profissões vão acabar! Invista em um mapa de competências. Jornal de Negócios. 2017. Disponível em <https://www.jornaldenegocios.pt/opiniao/colunistas/alexandre-real/detalhe/as-profissoes- vao-acabar-invista-num-mapa-de-competencias>. Acesso em 19 jan. 2019. ZURLO, Francesco. Design Strategico. In Opera XXI Secolo, vol. IV, Gli spazi e le arti. Roma: Editore Enciclopedia Treccani. 2010.
Compartilhar