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Mediação Arte Público Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Profa. Esp. Débora Rosa da Silva Revisão Textual: Profa. Ms. Selma Aparecida Cesarin Mediação: acolhendo públicos e impulsionando profissionais 5 • Mediação: acolhendo públicos e impulsionando profissionais • Onde tudo começa? • E onde termina? • Ler, fazer e contextualizar • Ação mediadora na escola, museu, espaços culturais etc. • As escolhas desses profissionais • Curadorias afetivas e profissionais • Culturas: é preciso estar presente nas curadorias · Apropriarmo-nos do conceito de mediação e de como abarcar a diversidade cultural e os diversos públicos é a base dos trabalhos dos profissionais da mediação. · Nosso objetivo é que juntos possamos construir um diálogo fluido sobre o que gira em torno destes conceitos para que saibamos interagir, partindo de uma linguagem comum a essa área de conhecimento, possibilitando catalisar ideias que teçam nossa trama de conexões. · Alcançar a confluência de habilidades que permitem identificar, interagir e ressignificar vivências e experiências de nosso dia a dia e saber nos colocar como protagonistas conscientes de possíveis mediações também é nosso objetivo. Olá! Para maior compreensão desta Unidade, sugiro que a cada tema abordado você visite os links indicados e a cada palavra nova que encontrar nesta leitura, pesquise-a. Vamos fazer um glossário próprio! Será bem divertido! Teremos a compreensão das palavras novas que às vezes tomam sentidos diferentes daqueles que conhecíamos ou imaginávamos. Outra dica é: ao ler toda a Unidade vá fazendo anotações sobre tudo que chame sua atenção, fazendo mapas e cartografias, o que também pode ser uma prática gostosa e boa para fixar conteúdos. Boa viagem por esta Unidade. Mediação: acolhendo públicos e impulsionando profissionais 6 Unidade: Mediação: acolhendo públicos e impulsionando profissionais Contextualização Olá caro(a) aluno(a) Neste material complementar podemos ampliar nossa compreensão do conceito de mediação e suas possibilidades. É um documentário breve, “Obra Revelada”, que acompanha um funcionário da Pinacoteca de São Paulo falando sobre suas impressões de uma obra escolhida por ele. Fique atento a como o professor Jorge Coli faz gerar a ação mediadora, suas perguntas, seu silêncio, sua presença. Estas observações serão importantes para a sua formação. Vídeo: O documentário está disponível em: https://www.youtube.com/watch?t=49&v=g_3dlQRn_wc. 7 Mediação: acolhendo públicos e impulsionando profissionais Nesta Unidade, nós iremos nos apropriar do conceito de mediação e de como abarcar a diversidade cultural e os diversos públicos, que é a base do trabalho dos profissionais da mediação. Nosso objetivo é que juntos possamos construir um diálogo fluido sobre o que gira em torno destes conceitos para que saibamos interagir, partindo de uma linguagem comum a essa área de conhecimento, possibilitando catalisar ideias que teçam nossa trama de conexões. Alcançaremos a confluência de habilidades que nos permitam identificar, interagir e ressignificar vivências e experiências de nosso dia a dia e nos colocar como protagonistas conscientes de possíveis mediações. Podemos iniciar nossos estudos tentando identificar os mediadores que permearam nossa formação: na escola, na família ou no trabalho. Aquelas pessoas que de alguma forma estiveram presentes, provocando nossa atenção, que foram estratégicas em nos apresentar algo, pelo jeito como apontaram para uma questão que ainda não tínhamos percebido. Eu me lembro de como meu pai me alertava para os diferentes cheiros das madeiras que ele serrava, entre elas, de como o cheiro da madeira Imbuia era intenso e provocava amargor na boca, enquanto outras não. E até hoje sinto aquele cheiro e gosto que me apresentou. Você lembra-se de alguém que hoje você reconhece como mediador? Que em sua trajetória o estimulou a perceber algo, que o surpreendeu e provocou sua percepção por algo? Nossa trajetória pelo mundo é sempre mediada, seja por pessoas, seja por objetos. Um livro pode agir como mediador. Um livro pode nos apresentar um mundo que muitas vezes ainda nem inventamos, situações nunca antes conhecidas, imagens nunca antes imaginadas. Como um educador, que recebe grupos de adultos ou crianças, estudantes e famílias, é aquele que acompanha um determinado grupo ou indivíduo para uma visita em museus ou espaços expositivos. Em sua ação mediadora, pretende provocar questionamentos, suscitar ideias, chamar a atenção para detalhes não percebidos, incita o diálogo entre os presentes, fica atento àquela criança que pouco interagiu e a surpreende de algum jeito, provocando também para que todo o grupo a acolha. Aquele professor que em sua ação mediadora acolhe cada estudante em sua particularidade, impulsiona as diferentes características, tem escuta sensível e lida com o protagonismo com possibilidades de alternância. 8 Unidade: Mediação: acolhendo públicos e impulsionando profissionais Figura 1 – Cinthia Marcelle - Sobre este mesmo mundo, SP - 2010 E olhando para esta obra? Uma lousa de aproximadamente 8m, com vestígios de muitas aulas. Repare na quantidade de pó de giz no chão. Em sua jornada como estudante, quais foram os professores/educadores que hoje você identifica nesta ação mediadora? Imaginando e formando significados para este conceito, vamos agora nos aproximar de contribuições importantes para a compreensão deste tema. Nossa bibliografia apresenta relevantes estudos a respeito: O conceito de educação como mediação vem sendo construído ao longo dos séculos. Sócrates falava da educação como parturição das ideias. Podemos, por exemplo, por aproximação, dizer que o professor assistia, mediava o parto. Rousseau, John Dewey, Vygotsky e muitos outros atribuíam à natureza, ao sujeito ou ao grupo social o encargo da aprendizagem, funcionando o professor como organizador, estimulador, questionador, aglutinador. O professor mediador é tudo isso (BARBOSA; COUTINHO, 2009, p.13) E nosso estudo tem por objetivo pensar esta ação, a ação mediadora com a Arte. As professoras nos presenteiam com a abordagem do professor como mediador. Importante que saibamos que entre as linhas de estudos baseadas na ação mediadora está o Direito que, com maestria, tem aplicado em suas necessidades com a justiça a ação mediadora como um grande facilitador nos casos cíveis e criminais, apropriando-se de um dos maiores trunfos desta ação, a escuta. Porém, no acontecimento museal ou na sala de aula, esta ação, este conceito mediador, tem especificidades em que ora há similaridades com o Direito, mas em que outras, as diferenças são enormes. 9 No caso da escuta, essa é uma das bases mais valiosas para a ação mediadora. Os objetivos é que são nossa maior diferença. No caso da mediação cultural, nosso objetivo não é o consenso ou que alguém ceda para um ou para outro, definindo uma opinião. Em nosso caso, os estudantes/visitantes têm a autonomia de articular e escolher sobre suas próprias hipóteses, sem que alguém ganhe ou que alguém perca. Nosso objetivo é a experiência: A mediação é, então, um processo de acompanhamento semiótico e de inter-relação semiótica necessário que intervém em cada ocasião de fabricação dos signos. A mediação da qual falamos neste capítulo não é senão um tipo particular da mediação semiótica elementar. O mediador (dispositivo, máquina ou humano), como um intérprete, insinua-se no processo semiótico elementar para lhe inserir os interpretantes destinados a facilitar, desenvolver, efetivar, enriquecer, ampliar e mesmo questionar o processo interpretativo (DARRAS, 2009 apud BARBOSA; COUTINHO, 2009, p.36) Ora, ora. Acabamos de nos deparar com um conceito de suma importância para o desenvolvimento de nossos estudos, a Semiótica. Trago um verbete que nos auxiliará na continuidade de nossos estudos, em posse de entendimentos de conceitosque podem ser novos para o nosso vocabulário. A Semiótica provém da raiz grega semeion, que denota signo. Assim, desta mesma fonte, temossemeiotiké, ‘a arte dos sinais’. Esta esfera do conhecimento existe há um longo tempo e revela as formas como o indivíduo dá significado a tudo que o cerca. Ela é, portanto, a ciência que estuda os signos e todas as linguagens e acontecimentos culturais como se fossem fenômenos produtores de significado, neste sentido define a semiose. Ela lida com os conceitos, as ideias, estuda como estes mecanismos de significação se processam natural e culturalmente. Ao contrário da linguística, a semiótica não reduz suas pesquisas ao campo verbal, expandindo-o para qualquer sistema de signos – Artes visuais, Música, Fotografia, Cinema, Moda, Gestos, Religião, entre outros. Por Ana Lucia Santana: http://www.infoescola.com/filosofia/semiotica/ No primeiro parágrafo da citação, a autora nos propõe refletir sobre a mediação como um processo de acompanhamento semiótico e de inter-relação semiótica necessário, que intervém em cada ocasião de fabricação dos signos. Quando dizemos que vamos acompanhar alguém, estamos dizendo que iremos juntos a determinado lugar, não é mesmo? 10 Unidade: Mediação: acolhendo públicos e impulsionando profissionais Este é um sentido de maior importância para a medição, a consciência de estar num conjunto, unidos neste percurso, cada participante seguirá seu próprio ritmo. Entretanto, o professor/educador em ação mediadora tem a responsabilidade de organizar, provocar, estimular o diálogo, como bem demonstraram Barbosa e Coutinho (2009, p.13), na citação acima, tendo em vista um objetivo pré-estabelecido, planejado, estudado, pesquisado, porém sempre aberto a desvios. O nosso professor/educador para ação mediadora desenvolve um tema, prepara, planeja sua aula daquele dia ou o roteiro de sua visita. Entretanto, sua turma disparada por um signo presente em seu material mediado traz questões acirradas de um caso vivido, que pelo signo presente no material mediado despertou conexão. A turma inquieta, logo na primeira etapa do diálogo, demonstra toda a sua inquietude e a sua necessidade de voz, pedindo para ser acolhida. O professor mediador já percebeu que parte de seu planejamento tomou outro corpo e que se faz necessário acolher o que trazem e em conjunto abarcar este fato, disparados por um signo que já estava presente no material, apenas ainda não visto pelo professor, porque se trata da interpretação, revelada por sua turma que foi despertada pelo signo presente na obra. O professor mediador está sempre atento ao que sua turma traz. Por isso a necessidade de olhar, ouvir e sentir aqueles que estão à sua volta. Santella contribui com objetividade para nossa compreensão dos signos: [...] o signo é uma coisa que representa uma outra coisa: seu objeto. Ele só pode funcionar como signo se carregar esse poder de representar, substituir uma outra coisa diferente dele. Ora, o signo não é o objeto. Ele apenas está no lugar do objeto. Portanto, ele só pode representar esse objeto de um certo modo e numa certa capacidade. Por exemplo: a palavra casa, a pintura de uma casa, o desenho de uma casa, a fotografia de uma casa, o esboço de uma casa, um filme de uma casa, a planta baixa de uma casa, a maquete de uma casa, ou mesmo o seu olhar para uma casa, são todos signos do objeto casa. Não são a própria casa, nem a ideia geral que temos de casa. Substituem-na, apenas, cada um deles de um certo modo que depende da natureza do próprio signo. A natureza de uma fotografia não é a mesma de uma planta baixa. Ora, o signo só pode representar seu objeto para um intérprete, e porque representa seu objeto, produz na mente desse intérprete alguma outra coisa (um signo ou quase-signo) que também está relacionada ao objeto não diretamente, mas pela mediação do signo (SANTELLA, 2013, p.12). 11 É como quando estamos frente a um objeto e somos desviados a partir dele para outro tema ou lugar. Aquela imagem em conexão com algo que trazemos conosco, guardado em nossa memória sensorial, é então despertada. Mas para nos permitir essa apreensão, precisamos ter percorrido com delicadeza todo o objeto, imagem ou situação mediada. Figuras 2 e 3 – Felix Gonzales Torres- Blue Placebo, 1991- New York Observe atentamente esta obra. Identificou o que podem vir a ser estes pontos azuis? Na primeira imagem, o que imaginou? Na segunda foto, pela aproximação da lente, pudemos enxergar mais detalhes desta imagem, mas ainda assim eu e você podemos estar pensando coisas diferentes. Mesmo após sabermos que se trata de 130 kg de balas espalhadas pelo chão, ainda assim nossas interpretações poderão ser diferentes. O que determinará estas interpretações? Será o mesmo significado de bala para cada um de nós? Bala, docinho de criança ou uma substância que pode fazer mal a alguns e acalmar outros. Cada pessoa poderá ter um signo, um símbolo com significados diferentes para o mesmo objeto, dependerá do repertório, das vivências e experiências de cada um. Para a ação mediadora acontecer, o professor/educador opta por caminhos a serem percorridos por uma imagem, por um objeto ou por um acontecimento. Inicia por identificar, aproximar-se de seu público, sua turma, seu grupo. Para fazer suas escolhas, identificar quais as vias de acesso à compreensão daqueles que estarão à sua volta, respeitando e acolhendo as singularidades de cada um. Cada grupo trará um olhar, porque cada grupo têm suas singularidades por se tratar de pessoas diferentes. E o professor/educador desenvolve abordagens adequadas a cada perfil de grupo. Qual será o foco de interesse de um grupo de crianças em determinada obra? E a mesma obra para um grupo de adultos, qual poderá ser sua abordagem? Em todas essas escolhas, o professor/educador acolherá os guardados, os saberes trazidos, as referências que os diferentes grupos têm e compartilham. Para a leitura de uma obra de arte, ou melhor, para a leitura de todas as coisas que há no mundo, quem quer que a faça, fará criticamente. Há várias pesquisas nesta área que orientam e instrumentalizam o professor/educador para lidar no dia a dia, baseando-se no conceito de mediação cultural. No Brasil, as décadas de 1980 e 1990 foram muito férteis, professores de arte, artistas e educadores impulsionaram um período de grandes mudanças e sistematização de conceitos vinculados à arte e educação no país e no mundo. 12 Unidade: Mediação: acolhendo públicos e impulsionando profissionais Onde tudo começa? Será muito difícil sabermos onde tudo começou, mesmo porque tudo é muita coisa, não é mesmo? Caro(a) aluno(a), vamos começar a falar da formação dos professores e educadores de Arte a partir de nossa formação? Você já parou para pensar sobre suas aulas de Arte? Como eram? Qual era a formação de seu professor? O curso de graduação vinculando Educação e Arte, chamado antes de Educação Artística, Licenciatura plena e curta, foi instaurado sistematicamente no Brasil em 1973. Para a base de nossa formação, precisamos saber como era o ensino de Arte no Brasil. A Escola de Arte no Brasil, a de cultura erudita, modelo europeu, teve seu início com as construções de estilo barroco, em que os mestres, em sua maioria padres portugueses, ensinavam escravos indígenas e negros, seus aprendizes. Por decreto de D. João VI, em 1816, iniciou a institucionalização da Escola de Arte no Brasil. Em 1926, inaugurou a Academia Imperial de Belas Artes, com a chegada da Missão Francesa, para ensinar inicialmente gravura, pintura e desenho. Direcionada à burguesia, a Escola Imperial de Belas Artes tinha o objetivo de consolidar qual era o conceito de bom gosto da burguesia daquela época. Figura 4 – Anônimo. Academia Imperial de Belas Artes. Litografia – 1846 Mais tarde, só em 1856, no Rio de Janeiro, foi fundado o primeiro Liceu de Artes e Ofício, com o objetivo de formar os artífices, aprendizadode artes para o trabalho. E depois se propagou o modelo para todas as capitais do Brasil. Estas são nossas primeiras referências em Escola de Arte, até meados de 1870/80, quando os liberais lutaram pelo ensino de Arte nas Escolas Secundárias, focadas no ensino de Desenho Geométrico com aplicação para a Indústria, seguindo propostas do inglês Water Smith, amplamente divulgadas nos Estados Unidos e muito defendidas por Rui Barbosa, no Brasil. 13 Na reforma educacional de 1901, foi instituído no Código Epitácio Pessoa o Ensino de Desenho Geométrico ensinado para fundamentos do trabalho. Percebemos resquícios desta Escola até hoje em nossos livros didáticos. Nos anos 1930, tivemos um movimento com importantes nomes para a educação no Brasil, chamado “Escola Nova”1, período também em que o movimento modernista lutava por uma identidade cultural no país. Todos empoderados pela necessidade de reflexões acerca de diferentes proposições pedagógicas em Arte, traziam a compreensão da importância da aula de Arte como expressão e reflexão. Anísio Teixeira (1900-1971) foi inspirado pelas pesquisas de John Dewey(1859-1952), que foi filósofo e pedagogo e seu professor nos EUA. Posteriormente, Teixeira contribuiu para divulgar no Brasil reflexões que até hoje são referências nas pesquisas em Arte e Educação. Mário de Andrade e Anita Malfati, entre outros, fizeram projetos de ensino de Arte para crianças e priorizavam a expressão reflexiva, já inspirados na Escola Nova. Houve outros experimentos em Belo Horizonte e Pernambuco, inspirados e cientes das reflexões de John Dewey (1859-1952), da escola como lugar da experiência propositora de aprendizagens. Entretanto, as políticas do Estado Novo e posteriormente a ditadura militar silenciaram por longos anos as pesquisas sobre Ensino de Arte nas escolas, congelando um modelo tecnicista que até hoje, infelizmente, reflete-se em nossa formação. Nos anos seguintes, juntamente com a luta por democracia, o professorado lutou por direitos e, entre eles, o da implementação de pós-graduação nesta área, Arte e Educação. Em seguida, conquista-se, na USP, sob orientação de Ana Mae Barbosa (1942) estas solicitações, com cursos de pós-graduação na área de Arte e Educação. Ana Mae (1942), que também estudou no EUA, inspirou-se nas ideias de John Dewey(1859-1952), que defendia o movimento pela Escola Nova. O pintor tem de vivenciar conscientemente o efeito de cada pincelada que dá ou não saberá o que está fazendo nem para onde vai seu trabalho. Além disso, tem de discernir uma relação particular entre o agir e o suportar em relação ao todo que deseja produzir. Apreender tais relações é pensar, uma das modalidades mais exigentes do pensamento. (DEWEY, 2010, p.124) Ufa! Sei que esta contextualização por mais enxuta que possa parecer é densa. Sugiro, caro(a) aluno(a), que para este estudo específico, histórico e de grande importância em nossa formação, você procure aprofundar-se no tema. Em nosso material complementar desta Unidade, você terá acesso a referências significativas. 1 A Escola nova, também chamada de Escola Ativa ou Escola Progressiva, foi um movimento de renovação do ensino, que surgiu no fim do século XIX e ganhou força na primeira metade do século XX 14 Unidade: Mediação: acolhendo públicos e impulsionando profissionais E onde termina? O objetivo é prosseguirmos com a consciência de que o processo de consolidação de Arte e Educação está com suas veias abertas. O reconhecimento do ensino de Arte como área de conhecimento nos guarda muitas possibilidades de inserção no mercado de trabalho, mas antes de tudo nos guarda a responsabilidade e o compromisso de valorizarmos um caminho de lutas traçadas por pessoas que se dedicaram à arte e educação. Temos muitos nomes, mas citarei apenas um: Ana Mae Barboza (1942), por conta de seu legado vinculado às primeiras sistematizações de abordagens de práticas de ensino da arte nas escolas e em museus no Brasil. De acordo com nossa conversa inicial, em 1973 foram instituídos os cursos de Licenciatura em Arte. E como eram sistematizadas as práticas de ensino de Arte antes de 1973? Você lembra-se de suas aulas? Pelo que estudamos até aqui, você considera que sua aprendizagem era focada na técnica ou na expressão reflexiva? O reconhecimento da publicação do livro A imagem do Ensino da Arte, em 1991, trouxe a “Proposta triangular”, uma proposta elaborada com base nas vivências educacionais em museus, mas rapidamente difundida e aplicada nas escolas no Ensino de Arte. A proposta triangular parte de três abordagens para construir conhecimento em Arte: contextualizar, ler e fazer. Não existe ordem estabelecida para ser desenvolvida. 15 Ler, fazer e contextualizar Figura 5 – Candido Portinari - Pulando Carniça A partir do estudado acima, podemos seguir com a leitura da imagem desta pintura. • Suas cores definem cada elemento, vamos identificá-los! Quais são? • Além das crianças brincando, reparou na mulher carregando uma trouxa na cabeça? • Você conhece estas brincadeiras? Já brincou como elas? • E este lugar? Já esteve em algum lugar assim? 16 Unidade: Mediação: acolhendo públicos e impulsionando profissionais Candido Portinari (1903/1962) nasceu em Brodóski, estado de São Paulo, estudou na Escola Imperial de Belas Artes, ganhou prêmios, os quais garantiram bolsas de estudo de Arte em Paris. Portinari, próximo de seus sessenta anos, retratou com mais intensidade crianças e memórias de suas brincadeiras de infância, revelando com nitidez as cores das ruas de sua cidade e sua convivência com a comunidade. O que acha de, ao término deste estudo, correr para um quintal e brincar de algo que lembra que já fez ou que queria muito fazer como empinar uma pipa, jogar bolinha de gude, pega pega, amarelinha, esconde esconde? A imagem da pintura poderá significar ainda mais para você se seu corpo experimentar. A proposta triangular tem como abordagem ler, fazer e contextualizar, base para ações de aprendizagem em Arte. Lembre-se, não é necessário obedecer a sequência alguma; poderíamos iniciar empinando pipas. Outras pesquisas foram desenvolvidas em torno da mediação. Muitos professores/educadores basearam-se na experiência de estudos estrangeiros para segmentarem suas pesquisas, como o caso de Ana Mae Barbosa (1942). Essas pesquisas são referências para os profissionais que como você optaram pelo caminho da Arte e Educação. E quais são as possibilidades de inserção no mercado de trabalho nesta área? 17 Ação mediadora na escola, museu, espaços culturais etc. Podemos optar por nos tornarmos um professor/educador na educação formal e/ou não formal. Educação Formal: são as escolas de modo geral; há um vínculo com a instituição vinculada às instâncias da educação, submetidas às secretarias municipais, estaduais e federais de educação, mesmo sendo da educação privada; há a seriação e o processo sequencial; Educação não Formal: poderá estar vinculada a qualquer instância; governamental e não governamental. Por exemplo: educador em Museu de Ciências e Tecnologia, vinculado ao ministério da ciência e tecnologia; ONG – Organização não governamental; Instituições sem fins lucrativos, museus, galerias, instituições culturais etc. Não há seriação. Tem como característica a efemeridade do convívio. Entretanto, há também um planejamento consciente das expectativas de aprendizagem, próximo ou igual ao formal em algumas instituições. A ação mediadora será a fiel aliada ao professor/educador, onde quer que ele desenvolva seu trabalho com base em Arte e Educação. 18 Unidade: Mediação: acolhendo públicos e impulsionando profissionais As escolhas desses profissionais O professor/educador fará escolhas! Entre os materiais, projetos, conceitos a serem trabalhados, artistas e obras, linguagens etc. A mesma situação acontecerá na educação formal ou não formal. A essas escolhas que irão compor um projeto/planejamentopessoal ou coletivo podemos chamar de curadoria. Saiba Mais Atualmente, o papel do curador de arte vai além do papel da organização, sendo também responsável pela intermediação entre o artista, a crítica artística e o mercado consumidor da arte. O trabalho de um curador atinge não apenas os “bens materiais” do mercado da arte, mas também possui um importante compromisso educacional na sociedade, agindo como um mediador cultural entre a arte e a população que visita às exposições. Esta ação também é conhecida por “curadoria educativa”. Saiba mais em: http://www.significados.com.br/curadoria/ O desenvolvimento do trabalho do professor/educador é muito importante, porque por essas escolhas ele irá decidir-se entre as prioridades estabelecidas por um estudo prévio de seu objetivo. O curador educativo é aquele que irá construir junto à equipe de educadores da instituição um projeto que dispare ações mediadoras, conceitos de acordo com o projeto da curadoria geral e que potencialize entendimentos do planejado. O desenvolvimento do trabalho do professor/educador é muito importante, porque por essas escolhas irá decidir entre as prioridades estabelecidas por um estudo prévio de seu objetivo. 19 Curadorias afetivas e profissionais Pensando em nossas escolhas para compor nossos guardados e como nos decidimos entre um objeto e outro, nós nos questionamos o que nos levou a pendurar tal objeto na parede do quarto. Foi preciso entrar em acordo com alguém? Como foi esta negociação? Quais são seus significados? Por que estão ali? Em toda nossa trajetória vamos fazendo composições, escolhas entre as imagens que nos povoam, das obras de arte que vão significando muito ou pouco para nós. Podemos dizer que esta é uma curadoria. Agora, é importante refletirmos sobre o que nos leva a tais escolhas. Qual seria o fio condutor que alinhava a escolha de uma coisa e não outra? Um bom exemplo é um álbum de fotografias, quando escolhemos qual ficará ao lado de qual, o que priorizamos como narrativa. Queremos que transmita a alegria ou a surpresa que vivemos na situação retratada? Em processo de consolidação no Brasil, a curadoria educativa atua em parceria com a curadoria geral de uma determinada exposição. Enquanto a curadoria geral elabora as linhas gerais do projeto, o curador educativo compõe suas estratégias educativas, as ações mediadoras que irão permear a exposição. Para escrever este texto, fiz escolhas, decidi o que iria trazer, como exporia um assunto, para compor o que viria e em qual sequência. Uma curadoria pensa o modo que um assunto será exibido, pensando e decidindo lateralidade, quem estará do lado de quem e por que, definindo uma narrativa, um conceito, uma história. Para darmos conta das demandas contemporâneas de uma curadoria educativa que leve em conta a acessibilidade, trouxe algumas iniciativas que contemplam a ação mediadora de diferentes formatos. Esta curadoria optou pelo uso de dispositivos sonoros e impressos em dois formatos: Braille e Português. Como poderá ser esta mediação? Como um dispositivo ou máquina poderá fazer esta ação? Há, entre outros, um serviço de fornecimento de aparelhos sonoros, mas que infelizmente ainda não atende a todos os museus e espaços expositivos e está em fase de implementação em muitos deles, que é o audioguia. Acesse o link a seguir e saiba um pouco sobre esta obra por um mediador sonoro/audioguia, em que a artista/educadora Amanda Tojal concebeu a curadoria a partir da mediação. Faça uma visita virtual ao site, experimente ouvir o audioguia e leia sobre a curadoria. 20 Unidade: Mediação: acolhendo públicos e impulsionando profissionais Figura 6 – Berthe Worms (Uckange/França, 1868 - São Paulo/SP, 1937). Saudades de Nápoles, 1895 Esta é uma das possibilidades. Há também material impresso em pranchas ou colado nas paredes expositivas. O processo de mediação há de ser provocativo, instigante ao pensar e ao sentir, à percepção e à imaginação. Um ato capaz de abrir diálogos, também internos, ampliados pela socialização dos saberes e das perspectivas pessoais de cada fruidor. (MARTINS; PICOSQUE, 2008, p.29) Os curadores, expositivo e educativo, têm a consciência destas premissas para que seu projeto tenha aceitação e compreensão dos públicos. Para concluirmos nossa Unidade, podemos dizer, então, que a ação mediadora é balizadora do trabalho do professor/educador, aquele que também é um curador que, imbuído de saberes, é propositor do diálogo, do encontro e da efetiva presença de diferentes culturas em sua curadoria. 21 Culturas: é preciso estar presente nas curadorias A Arte pode ser um excelente combinado de ações, registros e procedimentos que abarcam infinitas possibilidades para potencializar diálogos. Figura 7 – Claudia Andujar - Série “Marcados” - Década/1980 Por sua lente, a fotógrafa Claudia Andujar (1931) dedicou décadas de sua vida à luta pelos direitos dos povos Yanomamis. Na série Marcados, ela não mede esforços para trazer à tona questões étnicas complexas. • Quais as perguntas que você faria para ação mediadora com seus alunos sobre essa obra? • Como perguntar sem induzir a uma ou outra opinião? • Quais seriam suas estratégias para proporcionar um ambiente em que todos expressassem suas ideias? • E como fazer contextualizações, contar sua pesquisa a respeito da obra de uma forma que não bloqueie o diálogo? É mesmo desafiador nosso trabalho em arte e educação. A artista, que nasceu em Neuchâtel, Suíça, em 1931, desenvolveu em sua pesquisa fotográfica uma forma de externar, mostrar ao mundo o que a chocou de forma avassaladora. Nos anos de 1970, acompanhando ações humanitárias de vacinação contra malária nas aldeias, ia junto com a equipe de médicos, fotografando os “pacientes” com números para poderem ser acompanhados clinicamente, imagem que a fez lembrar-se de sua história como filha de judeu, que teve parte de sua família dizimada pelo Holocausto, marcando-a pela significação que naquele contexto era de vida e em sua memória os números marcavam a previsão da morte. A arte em si já indica e inicia diálogos. Entretanto, é preciso que na ação mediadora não a silenciemos. Não podemos nos esquecer da tríade que compõem este encontro: obra, público e professor/educador. Por isso, a importância da escuta, da compreensão de seu grupo e da proposição consciente de seus objetivos e contextos. 22 Unidade: Mediação: acolhendo públicos e impulsionando profissionais Para o respeito e entendimento da identidade nacional, é necessária a compreensão de sua composição, de suas influências e de suas diferentes essências. O sentimento de pertencimento à multiculturalidade, só acontece de fato com a aproximação da cultura que nos rodeia, dos costumes observados a partir de nossas próprias famílias, da valoração das manifestações artísticas e culturais de nossas comunidades. Por multiculturalismo compreende-se a presença, em determinada região, de diferentes culturas, costumes, manifestações artísticas e religiosas. Entretanto, convivendo entre si, em busca de harmonia e valorização da diversidade, em que as diferenças sejam evidenciadas e valorizadas, o reconhecimento das influências a que somos expostos e a consciência que influenciamos e pela qual somos influenciados. A sobreposição de culturas, infelizmente, ainda é uma realidade; o que poderá ocasionar mudanças na formação dos futuros estudantes serão as ações nas quais vocês serão protagonistas, como futuros professores/educadores comprometidos com a valoração e integração das diferentes culturas. Figura 8 – Tradição Paraense – Carimbó 23 Figura 9 – Apresentação de Balé Convivendo entre si, em busca de harmonia e valorização da diversidade, em que as diferenças sejam evidenciadas e valorizadas, e que não haja predominância entre uma cultura e outra, ao contrário, a busca de equilíbrio e confluência de saberes. Ao pensar em mediação, pensaremos em diálogo, em confluênciade saberes, em escuta, em percepção da presença do outro, em experiências. E para que todo este caldeirão de possibilidades seja inteiro, teremos de principalmente estar abertos às diferenças. Apontar as diferenças é reconhecer e valorizar a diversidade. Figura 10 – Balé Folclore da Bahia Somos os propositores; somos o molde; a vocês cabe o sopro, no interior desse molde: o sentido da nossa existência. Somos os propositores: nossa proposição é o diálogo. Sós, não existimos; estamos a vosso dispor. Somos os propositores: enterramos a obra de arte como tal e solicitamos a vocês para que o pensamento viva pela ação. Somos os propositores: não lhes propomos nem o passado nem o futuro, mas o agora. (Lygia Clark, “Nós somos os propositores”, Livro-obra, 1964. http://www.lygiaclark.org.br/defaultpt.asp) 24 Unidade: Mediação: acolhendo públicos e impulsionando profissionais É chegada a hora de finalizarmos nosso encontro nesta Unidade e compartilho com você minha impressão de que aprendemos muito. Entretanto, é preciso que nos dediquemos ainda mais às proposições da Unidade, que se envolva na atividade de aprofundamento e amplie conceitos no material complementar. Sei que irá se surpreender. Boa jornada! Um abraço. 25 Material Complementar Nesta unidade, vamos nos apropriar do conceito de mediação e como a ação mediadora é base do trabalho do professor/educador. Percorreremos uma brevíssima abordagem da história da arte e educação e como a ela reflete em nosso dia a dia. Leituras: Conversaremos sobre questões que disparam interpretações e análises das imagens e situações que nos rodeiam, como tomam sentido e significações, tornando-se signos. Por isso, posto o link do livro O que é semiótica?. SANTELLA, LÚCIA. O que é Semiótica. Coleção primeiros passos. Brasiliense, 2003. Disponível em: http://goo.gl/96JH3l Vídeos: Esta pesquisa pode dar ainda mais base para a sua formação, porque quanto mais soubermos a jornada de nossas referências, mais saberemos construir nosso presente. Indico também um vídeo interessantíssimo, com narrativas de Ana Mae Barbosa, citada em nossos estudos: https://www.youtube.com/watch?v=KyjPjAM784o E ainda, sobre o tema: http://www.acervodigital.unesp.br/bitstream/123456789/40427/3/2ed_art_m1d2.pdf Documentário O povo brasileiro https://www.youtube.com/watch?v=eqlcHGj4f7k Sites: E, por último, o site da exposição virtual “Sentir pra ver”, de Amanda Tojal: http://sentirpraver.com.br/obra_cena_referencia.html Sugestão Faça uma pasta de arquivo, guardando estas indicações, pois podem ser muito úteis em sua vida profissional. Você terá seu acervo educativo para poder compor curadorias. Um abraço e até breve! 26 Unidade: Mediação: acolhendo públicos e impulsionando profissionais Referências BARBOSA, A. M. T. B. Arte-Educação: Leituras no Subsolo. 3.ed. São Paulo: Cortez, 2001. BARBOSA, A. M. T. B.; COUTINHO, R. G. Arte/Educação Como Mediação Cultural e Social. v.1. São Paulo: Unesp, 2009. DEWEY, J. Arte como Experiência. São Paulo: Martins Fontes, 2010. PILLAR, A. D. (Org.). A Educação do Olhar no Ensino das Artes. 2.ed. Porto Alegre: Mediação, 2001. SANTAELLA, LÚCIA. O que é Semiótica. Brasil. Editora: Brasiliense. Coleção Primeiros Passos, 2003. MARTINS. M. C.; PICOSQUE. G. Medição cultural para professores andarilhos da cultura. São Paulo. Intermeios, 2008. 27 Fontes das imagens Fig 01 – pipa.org.br Fig 02 – afmuseet.no Fig 03 – afmuseet.no Fig 04 – historia.jbrj.gov.br Fig 05 – museudainfancia.unesc.net Fig 06 – Bertha Worms (1868–1937)/Wikimedia Commons Fig 07 – pletz.com Fig 08 – brasil.gov.br Fig 09 – portaldoprofessor.mec.gov.br Fig 10 – conselho.cultura.ba.gov.br 28 Unidade: Mediação: acolhendo públicos e impulsionando profissionais Anotações
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