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Coisa julgada e segurança jurídica_ flexibilização e eficácia executiva da sentença

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07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
https://daniellixavierfreitas.jusbrasil.com.br/artigos/146506445/coisa-julgada-e-seguranca-juridica-flexibilizacao-e-eficacia-executiva-da-sentenca 1/47
Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva
da sentença
Por Mariana Rusche Wierzchowskir
O estudo propõe soluções para situações envolvendo coisa julgada e segurança
jurídica, bem como analisa os limites do legislador ao definir o perfil dogmático da
coisa julgada e do judiciário ao promover sua flexibilização atípica.
“O passado pode deixar dissabores, mas põe termo a todas as incertezas. Na
ordem do universo e da natureza, só o futuro é incerto e esta própria incerteza é
suavizada pela esperança, a fiel companheira da nossa fraqueza. Seria agravar
a triste condição da humanidade querer mudar, através do sistema da
legislação, o sistema da natureza, procurando, para o tempo que já se foi, fazer
reviver as nossas dores, sem nos restituir as nossas esperanças.”[1]
Sumário:1. Coisa julgada e segurança jurídica: Limites e possibilidades perante a
coisa julgada. 2. Hipóteses de relativização da coisa julgada. 2.1 Querela Nullitatis.
2.2 Ação Rescisória. 3. Coisa julgada e flexibilização atípica. 4. Coisa julgada e
eficácia executiva. 4.1 Distinções fundamentais. 4.2 Eficácia executiva e segurança
jurídica. 4.3 Eficácia executiva e posterior declaração de inconstitucionalidade pelo
STF. 4.4 Eficácia executiva e eficácia preclusiva da coisa julgada. Conclusão.
Bibliografia.
1. Coisa julgada e segurança jurídica: Limites
e possibilidades perante a coisa julgada
http://jus.com.br/945246-mariana-rusche-wierzchowski/perfil
07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
https://daniellixavierfreitas.jusbrasil.com.br/artigos/146506445/coisa-julgada-e-seguranca-juridica-flexibilizacao-e-eficacia-executiva-da-sentenca 2/47
A necessidade de estabilizar as relações jurídicas após a apreciação do Poder
Judiciário é um imperativo do Estado Democrático de Direito, porquanto constitui
corolário fundamental da segurança jurídica. Como teríamos segurança sem poder
confiar que aquilo que o Poder Judiciário decidiu, após o devido processo legal,
representa efetivamente a norma jurídica que regerá a demanda a ele conduzida?
Se um Estado de Direito tem por objetivo estabelecer normas jurídicas que
confiram previsibilidade aos cidadãos a respeito do direito vigente, com maior razão
se deve confiar naquilo que o próprio Estado concretamente apreciou, definiu e
informou ao jurisdicionado sobre a norma individual que deverá reger sua relação
jurídica.
Analisando o sistema jurídico brasileiro, observamos na Constituição Federal regra
expressa de proteção da coisa julgada, precisamente no art. 5º, XXXVI,
constituindo garantia fundamental e erigida à condição de cláusula pétrea.
Contudo, é a própria Constituição Federal que também prevê mecanismos de
revisão das decisões transitadas em julgado, informando-nos, portanto, que a coisa
julgada não é uma garantia absoluta, podendo ser flexibilizada em algumas
situações. E mais, outra importante mensagem podemos extrair de tais normas:
cabe ao legislador ordinário delimitar as hipóteses de flexibilização da coisa julgada,
como se processará e em que tempo isso pode ocorrer.
Interessante, no particular, a crítica desferida pelo Prof. Barbosa Moreira à ideia de
“relativização” da coisa julgada. Informa o Autor que não se pode relativizar o que já
é relativo, mas sim o que se pode pretender é ampliar as hipóteses de relativização
já constantes do ordenamento jurídico. [2]
Temos aqui um ponto da mais alta relevância. Apesar de a Constituiçãoinstituir a
coisa julgada como garantia constitucional, direito fundamental dos cidadãos, o seu
perfil dogmático será delineado pelo legislador ordinário.[3] Cabe a este definir, a
partir da noção de segurança jurídica presente em determinado momento histórico,
em que medida as decisões transitadas em julgado podem ser revistas pelo Poder
Judiciário, o que inevitavelmente acaba por flexibilizar a garantia da confiança
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/155571402/constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-constitui%C3%A7%C3%A3o-da-republica-federativa-do-brasil-1988
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10641516/artigo-5-da-constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-de-1988
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10729579/inciso-xxxvi-do-artigo-5-da-constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-de-1988
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/155571402/constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-constitui%C3%A7%C3%A3o-da-republica-federativa-do-brasil-1988
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/155571402/constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-constitui%C3%A7%C3%A3o-da-republica-federativa-do-brasil-1988
07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
https://daniellixavierfreitas.jusbrasil.com.br/artigos/146506445/coisa-julgada-e-seguranca-juridica-flexibilizacao-e-eficacia-executiva-da-sentenca 3/47
prometida pelo Estado aos jurisdicionados. Cumpre analisar, portanto, de que
forma o ordenamento jurídico brasileiro disciplina esse importante instituto
jurídico.
2. Hipóteses de relativização da coisa
julgada.
2.1 A querela nullitatis.
A querela nullitatis constitui meio de impugnação de decisões judiciais originária do
direito intermédio (século XI e seguintes), quando da forte influência do direito
germânico sobre o direito romano, instituída com o objetivo de impugnar errores in
procedendo. Para os errores in iudicando o remédio utilizado era a appellatio,
surgida com o Império Romano (período da cognitio extra ordinem), viabilizando o
duplo grau de jurisdição para se impugnar a justiça da decisão.[4]
Antes da sua previsão, entendia-se que as sentenças que continham alguma mácula
na formação (errores in procedendo) eram inexistentes juridicamente (nulla
sententia), não sendo necessária uma impugnação formal para retirar-lhe do
mundo jurídico. Simplesmente, não precisavam ser observadas. Assim, a querela
nullitatis surgiu como uma forma de conferir segurança jurídica àquele beneficiado
pela decisão proferida, pois enquanto não fosse formalmente impugnada, deveria
ser considerada válida e plenamente eficaz.[5] No Direito brasileiro, tal ideia jamais
prevaleceu, fazendo-se necessário, sempre, algum tipo de impugnação após o
trânsito em julgado, a fim de rescindir a decisão viciada.
Ao longo da história, as razões que justificavam o ajuizamento da querela nullitatis
foram pouco a pouco se agregando como hipóteses de cabimento da ação rescisória
(adiante estudada), fazendo com que tal instituto não lograsse previsão expressa no
sistema processual brasileiro. Contudo, apesar de não haver uma disciplina
específica de tal meio de impugnação das decisões judiciais e, ainda, de a ação
07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
https://daniellixavierfreitas.jusbrasil.com.br/artigos/146506445/coisa-julgada-e-seguranca-juridica-flexibilizacao-e-eficacia-executiva-da-sentenca 4/47
rescisória ter absorvido aquelas hipóteses que historicamente justificaram o seu
manejo, a doutrina brasileira considera ainda presente a querela nullitatis no
sistema jurídico nacional, em virtude de ser possível ao executado se opor à
execução por meio da alegação da falta ou nulidade da citação no processo de
conhecimento.[6]
É curioso notar como a doutrina se mostra tolerante com um instrumento que,
consoante vem sendo espraiado, teria o condão de anular uma decisão acobertada
pela força da coisa julgada, por ato de um juízo de primeira instância.[7] Ignora-se,
na espécie, as disposições constitucionais atinentes à necessidade do ajuizamento
de ação rescisória perante um tribunal como instrumento de insurgir-se contra
decisões de mérito transitadas em julgado. E assim ocorre, sem maiores
questionamentos, em nome do costume e da gravíssimamácula que corporifica uma
decisão prolatada à revelia do réu não citado.
De fato, na hipótese do inciso I do art. 741 do CPC (nulidade de citação no processo
de conhecimento que correu à revelia do réu), estamos diante da colisão de dois
direitos fundamentais: o da ampla defesa e o da segurança jurídica. O legislador
optou pela prevalência do primeiro, em detrimento do segundo, opção esta
absolutamente razoável, porque constituiria uma violência aceitar a prevalência da
coisa julgada oriunda de um processo em que o réu em concreto não teve real
possibilidade de defender-se.[8]
A indagação remanescente desse quadro é a seguinte: poderia o legislador ordinário
estabelecer as situações passíveis de provocar a nulidade das decisões judiciais
qualificadas pelo manto da coisa julgada em face da gravidade da deformidade que
a macula? Ou a única situação aceitável seria aquela advinda da falta ou nulidade da
citação, já que assim sempre o foi? Aponta-se o caso português, onde há
possibilidade de, em sede de execução, arguir o malferimento à coisa julgada
produzido pela decisão executada.[9]
Parece-nos que a possibilidade de se alegar, em sede de embargos à execução, a
falta ou nulidade da citação merece uma releitura, diante de uma visão
constitucional da coisa julgada, pois admitir que um juiz de primeira instância, por
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10649793/inciso-i-do-artigo-741-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10649831/artigo-741-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91735/c%C3%B3digo-processo-civil-lei-5869-73
07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
https://daniellixavierfreitas.jusbrasil.com.br/artigos/146506445/coisa-julgada-e-seguranca-juridica-flexibilizacao-e-eficacia-executiva-da-sentenca 5/47
meio de simples ação ordinária, supere a garantia da coisa julgada não está em
consonância com as balizas previstas na CF/88.
Bem examinadas as disposições constantes nos arts. 475-L, I, e 741, I, do CPC, não
conseguimos nele identificar um regramento expresso que viabilize a anulação das
decisões judiciais transitadas em julgado que contenham o vício ali previsto, como
faz crer a doutrina amplamente majoritária. A norma que deles se extrai apenas
confere a possibilidade de o réu não ter a sua esfera jurídica atingida por uma
decisão da qual ele não participou da formação. Isso porque, em um Estado
Democrático de Direito, não se pode admitir que alguém seja vulnerado no seu
patrimônio jurídico sem o devido processo legal.
Com efeito, a decisão transitada em julgado não será anulada com a apresentação
de embargos à execução que apontam a inexistência ou a nulidade da citação, mas
apenas será bloqueada a eficácia executiva do julgado em face do réu não citado.
“Como se vislumbra, ainda que não haja consenso doutrinário, o mais adequado é
resolver os problemas inerentes ao sujeito que não foi vinculado como parte no
processo no plano da eficácia.”[10]
Não se nega que o vício de citação proporciona uma decisão final maculada no seu
iter de formação[11], contudo, como ocorrem com os demais defeitos processuais,
uma vez ocorrido o trânsito em julgado, opera-se o saneamento geral do processo,
precluindo a possibilidade de impugnar o julgado por conta de tais defeitos, salvo
ação rescisória.[12]
De acordo com a CF/88, a desconstituição da coisa julgada, conforme já expusemos,
só pode ser admitida por meio de ação rescisória apreciada por um tribunal. Trata-
se de um parâmetro mínimo de proteção da segurança jurídica que a coisa julgada
visa a tutelar. Admitir que pululem exceções a partir da gravidade do vício que
macula o processo não é a solução mais consonante aos ditames constitucionais.
Mais adequado, por exemplo, que seja adaptado o regime da ação rescisória a tal
situação de tamanha gravidade, possibilitando o início do prazo para a
desconstituição do julgado a partir do conhecimento, pelo réu, da decisão proferida
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/28966759/artigo-475l-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/28966757/inciso-i-do-artigo-475l-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10649831/artigo-741-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10649793/inciso-i-do-artigo-741-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91735/c%C3%B3digo-processo-civil-lei-5869-73
07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
https://daniellixavierfreitas.jusbrasil.com.br/artigos/146506445/coisa-julgada-e-seguranca-juridica-flexibilizacao-e-eficacia-executiva-da-sentenca 6/47
à sua revelia. Assim, restaria observado o comando constitucional de proteção à
coisa julgada e, ao mesmo tempo, a possibilidade daquele que teve o seu direito de
defesa suprimido de livremente se insurgir contra o julgado.
Definitivamente, não se coaduna com a relevância conferida pela CF/88 à coisa
julgada a possibilidade de o réu revel, ainda que não citado, uma vez ciente da
existência de uma decisão transitada em julgado contra si, permaneça inerte por
tempo indeterminado e deixe a comunidade jurídica imersa no ludíbrio
proporcionado pela decisão estatal.
Observe-se que existem posições doutrinárias que, inclusive, perfilham a preclusão
de se alegar o vício de citação, caso o réu seja citado para a execução e não se
manifeste sobre o vício da citação no processo originário.[13] Não chegamos a
tanto, propondo-se aqui uma posição mais branda, que confere ao réu não citado
ainda o prazo de dois anos para a propositura da ação rescisória.
Ademais, tal posicionamento é corroborado com a possibilidade de termos até
mesmo a formação de coisa julgada sem a citação do réu, desde que ele não sofra
prejuízo. Tal é a norma que se extrai dos art. 219, § 6º, e art. 285-A do CPC. Ou seja,
se o ordenamento processual permite que seja proferida uma decisão de mérito,
com aptidão de formar coisa julgada, sem a citação do réu, porque não admitir a
existência de um prazo decadencial para a desconstituição da sentença viciada?[14]
E se o réu não citado entender que a sentença é justa e com ela aquiescer, ainda
assim os demais litisconsortes poderão anular o julgado com a utilização da querela
nullitatis a qualquer tempo, como pretende a doutrina amplamente majoritária?!
Estamos convictos de que a solução tradicionalmente conferida pela doutrina a
favor da ampla impugnabilidade com base no vício do ato citatório não atende ao
ideal de segurança jurídica almejado pelo Constituinte.
Por tais razões, não visualizamos nos dispositivos aqui tratados a histórica querela
nullitatis, nem mesmo a sua aptidão para dispensar a ação rescisória nas hipóteses
previstas[15], mas apenas a consagração da possibilidade de se bloquear a eficácia
executiva sobre a esfera jurídica do réu não citado.[16] Não à toa sua previsão na
disciplina dos embargos à execução e da impugnação ao cumprimento de sentença.
E quando nos referimos a patrimônio jurídico, pretendemos com isso abarcar não
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10719883/artigo-219-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10719582/par%C3%A1grafo-6-artigo-219-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/27996258/artigo-285a-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91735/c%C3%B3digo-processo-civil-lei-5869-73
07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
https://daniellixavierfreitas.jusbrasil.com.br/artigos/146506445/coisa-julgada-e-seguranca-juridica-flexibilizacao-e-eficacia-executiva-da-sentenca 7/47
só a eficácia das sentenças condenatórias, mas também das decisões constitutivas e
declaratórias, possibilitando que o revel se insurja quanto aos eventuais efeitos de
taisprovimentos sobre a sua esfera jurídica.
Havendo um litisconsorte necessário não citado, por exemplo, a decisão judicial
transitada em julgado, enquanto não rescindida, será plenamente válida e eficaz em
relação aos litisconsortes citados que participaram regularmente do processo.[17]
Após o conhecimento, pelo litisconsorte não citado, da coisa julgada formada e
passados dois anos de tal ciência inequívoca, a decisão deverá, também em relação
ao seu patrimônio jurídico, gerar plenamente os efeitos que lhes são próprios.
Trata-se de solução que harmoniza a proteção que merece a coisa julgada e, ao
mesmo tempo, a garantia fundamental do devido processo legal.
2.2 Ação rescisória.
O instrumento típico estabelecido no sistema processual brasileiro para a rescisão
das decisões alcançadas pela autoridade da coisa julgada é a ação rescisória,
demanda autônoma de impugnação[18] com previsão constitucional, de
competência originária dos tribunais. Como já expusemos, trata-se do único
mecanismo, na seara cível, previsto na Constituição Federal com aptidão de
questionar as decisões definitivas proferidas pelo Poder Judiciário.
Consagrada constitucionalmente pela primeira vez na Constituição Federal de
1937, Carta Política que sequer insculpia proteção expressa à coisa julgada, já
possuía previsão legislativa desde o Regulamento 737/1850, que estabelecia no seu
art. 681 que “A sentença pode ser annullada: § 4.º Por meio da acção rescisoria, não
sendo a sentença proferida em grau de revista”, podendo ser manejada nas
hipóteses de incompetência, suspeição, peita e suborno do magistrado; violação a
“expressa disposição da legislação commercial”; estar “fundada em instrumentos ou
depoimentos julgados falsos em Juízo competente”; “o processo em que ella foi
proferida será annullado em razão das nullidades referidas no capitulo
antecedente”.
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/155571402/constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-constitui%C3%A7%C3%A3o-da-republica-federativa-do-brasil-1988
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/92067/constitui%C3%A7%C3%A3o-dos-estados-unidos-do-brasil-37
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/155571402/constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-constitui%C3%A7%C3%A3o-da-republica-federativa-do-brasil-1988
07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
https://daniellixavierfreitas.jusbrasil.com.br/artigos/146506445/coisa-julgada-e-seguranca-juridica-flexibilizacao-e-eficacia-executiva-da-sentenca 8/47
Com redação parecida nos Códigos Estaduais, encontrou uma regulamentação um
pouco mais ampla no Código de Processo Civil de 1939 (arts. 798 a 801), que
dispunha ser “nula a sentença”: “I – quando proferida: a) por juiz peitado,
impedido, ou incompetente racione matéria e; b) com ofensa à coisa julgada; c)
contra literal disposição de lei; II – quando o seu principal fundamento for prova
declarada falsa em Juízo criminal, ou de falsidade inequívocamente apurada na
própria ação rescisória.”.
Disposição interessante vinha consagrada no art. 800, que deixava claro que a ação
rescisória não tinha por objetivo corrigir a injustiça do julgado, nos seguintes
termos: “A injustiça da sentença e a má apreciação da prova ou errônea
interpretação do contrato não autorizam o exercício da ação rescisória.”. Ou seja, é
possível perceber que, em 1939, nosso legislador já conferia uma especial atenção à
estabilização das decisões judiciais, só possibilitando a sua “anulação” por vícios
pontuais, via de regra relacionados a errores in procedendo. Não se admitia
rescisória tão só porque a decisão estava aparentemente errada. Inclusive, conforme
já se afirmou alhures, é diante de uma sentença injusta que a coisa julgada
evidencia mais fortemente o seu valor.[19]
Por fim, destaque-se que o prazo para ajuizamento da ação rescisória era previsto
no Código Civil de 1916, possibilitando a rescisão da decisão transitada em julgado
até cinco anos após o desfecho do processo.
Com o Código de Processo Civil de 1973 a situação se alterou substancialmente, pois
foram ampliadas as suas hipóteses de cabimento (art. 485 do CPC), bem como foi
reduzido o prazo para o seu ajuizamento para dois anos (art. 495 do CPC). Ademais,
suprimiu-se aquela dicção normativa antes consignada no art. 800 do CPC/39, que
informava que a ação rescisória não poderia ser utilizada para a correção de
injustiça do julgado.
Atualmente, temos a consagração constitucional de proteção à coisa julgada,
instituto jurídico elevado à condição de garantia fundamental, mas também da ação
rescisória, com uma ampla regulamentação infraconstitucional. Diante desse
desenho normativo, com especial atenção aos comandos constitucionais, fica a
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91735/c%C3%B3digo-processo-civil-lei-5869-73
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/103251/c%C3%B3digo-civil-de-1916-lei-3071-16
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91735/c%C3%B3digo-processo-civil-lei-5869-73
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10686517/artigo-485-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91735/c%C3%B3digo-processo-civil-lei-5869-73
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10685136/artigo-495-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91735/c%C3%B3digo-processo-civil-lei-5869-73
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10644355/artigo-800-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91735/c%C3%B3digo-processo-civil-lei-5869-73
07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
https://daniellixavierfreitas.jusbrasil.com.br/artigos/146506445/coisa-julgada-e-seguranca-juridica-flexibilizacao-e-eficacia-executiva-da-sentenca 9/47
pergunta de qual mensagem o Constituinte pretendeu transmitir ao conferir
tamanha importância à coisa julgada e, ao mesmo tempo, possibilitar a sua
desconstituição por meio da ação rescisória.
Parece-nos que a Constituição Federal estabeleceu uma reserva de superação da
coisa julgada por meio da ação rescisória, de maneira que, diante de uma garantia
constitucional de tamanha relevância para o Estado Democrático de Direito, apenas
pelo instrumento previsto na própria Constituição poderá ser superada uma decisão
judicial qualificada pela autoridade da coisa julgada. Destinou-se uma demanda
autônoma para a sua análise, evitando-se que o tema fosse tratado de forma
meramente incidental, como simples etapa do julgamento de outra questão.
Agregue-se a isso um segundo elemento que pode ser extraído do texto
constitucional, qual seja, a necessidade de tal superação ser necessariamente
operada por um tribunal. Repare-se que não pode ser considerado furtivo o fato de
a CF/88 concentrar nos tribunais a competência para apreciação das ações
rescisórias. Órgãos colegiados e formados por magistrados mais experientes,
certamente terão melhores condições de definir a respeito da manutenção ou não de
um comando judicial que representa uma das maiores garantias de segurança
jurídica no Estado Constitucional.
Com efeito, temos na ação rescisória a única hipótese de desconstituição da coisa
julgada prevista no ordenamento jurídico brasileiro, a ser apreciada
necessariamente como questão principal e por um tribunal, merecendo as suas
hipóteses de cabimento toda a atenção do legislador ordinário e do Poder
Judiciário.
Analisando o art. 485 do CPC, é possível perceber que as hipóteses ali consignadas
que admitem o ajuizamento da ação desconstitutiva, em regra, não refletem
propriamente uma revisão do juízo feito pelo magistrado a respeito da solução
conferida ao caso apreciado. Trata-se da eleição de vícios de alta gravidade que
aconselham a rescisão do julgado, seja porque a imparcialidade ou a competência
do juiz estavam maculadas, seja em função de atos das partes que impediram a
adequada análise do caso, por ofensa à coisa julgada, violação a literal disposição de
lei, em razão da obtenção de documentonovo ou descoberta da falsidade de
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/155571402/constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-constitui%C3%A7%C3%A3o-da-republica-federativa-do-brasil-1988
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/155571402/constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-constitui%C3%A7%C3%A3o-da-republica-federativa-do-brasil-1988
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/155571402/constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-constitui%C3%A7%C3%A3o-da-republica-federativa-do-brasil-1988
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10686517/artigo-485-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91735/c%C3%B3digo-processo-civil-lei-5869-73
07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
https://daniellixavierfreitas.jusbrasil.com.br/artigos/146506445/coisa-julgada-e-seguranca-juridica-flexibilizacao-e-eficacia-executiva-da-sentenca 10/47
documento velho, invalidação de confissão, renúncia ou transação que serviram de
base para a decisão ou, por fim, pela constatação de que um fato relevante foi
considerado existente ou inexistente, sem ter havido efetivo juízo ao seu respeito.
Não há, portanto, nas hipóteses de cabimento da ação rescisória, a possibilidade de
se corrigir a injustiça do julgado, decorrente de um juízo equivocado sobre a prova
dos autos ou da eleição de uma das interpretações razoáveis do texto legal[20]. Isso
faz com que alguns doutrinadores ainda entendam presente, de forma implícita, no
nosso sistema processual a referida norma decorrente do revogado
art. 800 do CPC/39.[21]
Por fim, uma questão que nos parece fundamental diz respeito à necessidade de
utilização da ação rescisória, quando, ao invés de se pretender impugnar a decisão
pela presença de algum vício previsto no art. 485 do CPC, almeja-se apenas apontar
uma alteração nas circunstâncias fáticas ou jurídicas apreciadas na decisão
transitada em julgado, fazendo com que tal decisão não mais seja adequada a
regular a nova situação formada. Tais situações ocorrem quando a demanda trata de
relações jurídicas de trato continuado[22], na qual a decisão proferida irá reger não
só os fatos jurídicos passados, mas também futuros, enquanto presentes as mesmas
circunstâncias que foram objeto da decisão passada em julgado.
A ação rescisória visa a rescindir um julgado em decorrência de algum vício que o
macule, proporcionando a sua desconstituição (iudicium rescindens) e, se
necessário, a prolação de novo julgamento (iudicium rescissorium). Assim, quando
estamos diante do julgamento de uma relação jurídica de trato continuado e da
alteração das circunstâncias que foram objeto da anterior apreciação judicial, não se
pretende rescindir o julgado, porquanto vício nenhum o maculou, mas apenas obter
o reconhecimento de que a decisão antes proferida não é adequada para regular a
nova situação existente. Tais situações, portanto, estão longe de exigir a propositura
de ação rescisória, porquanto não constituem hipótese de superação da coisa
julgada.
Assim, caso provenha alguma modificação da relação jurídica objeto da apreciação
judicial que está acobertada pela autoridade da coisa julgada, simplesmente tal
julgado não terá aptidão para regular a nova relação jurídica formada, a ela não se
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10644355/artigo-800-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91735/c%C3%B3digo-processo-civil-lei-5869-73
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10686517/artigo-485-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
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07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
https://daniellixavierfreitas.jusbrasil.com.br/artigos/146506445/coisa-julgada-e-seguranca-juridica-flexibilizacao-e-eficacia-executiva-da-sentenca 11/47
aplicando. Não se cogita, pois, de rescindir a decisão anterior, mas apenas de
analisar os seus limites objetivos e identificar sobre qual relação jurídica ele se
refere.
3. Coisa julgada e flexibilização atípica.
A flexibilização da coisa julgada, em hipóteses não previstas em lei, continua sendo
tormentosa e está longe de ganhar contornos de convergência doutrinária. Percebe-
se em tais discussões certa dose de emoções afloradas que, por vezes, nos distancia
da necessária técnica que deve nortear o discurso jurídico.
Teme-se que qualquer brecha para flexibilização da coisa julgada em situações não
previstas em lei possa abrir margem para o total enfraquecimento da garantia
constitucional, levando-se em alguns casos tal temor às últimas consequências, de
maneira a ignorar ou menosprezar situações aberrantes e insuportáveis, admitindo-
as como um mero risco que o sistema deve suportar.
Imaginemos, por exemplo, a hipótese de uma ação civil pública que vise à defesa do
meio ambiente, pois determinada fábrica está contaminando um rio que abastece
uma cidade inteira. Por equívocos na produção probatória (não pela falta de provas,
que obstaria a formação da coisa julgada), formou-se coisa julgada sobre uma
decisão de improcedência da ação. Contudo, não há dúvidas de que realmente as
provas foram forjadas e que, em poucos anos, a população da referida cidade será
dizimada, bem como todo o ecossistema do entorno. Não há mais prazo para ação
rescisória.
Não obstante a importância da garantia da coisa julgada no nosso sistema, será que
devemos levá-la a consequências tão graves, ao ponto de prestigiá-la frente a
quaisquer injustiças, por mais graves que sejam? O exemplo citado é apenas uma
das graves situações que podem ser perpetuadas com uma decisão flagrantemente
injusta, ao lado de outras que já vêm sendo reconhecidas pela jurisprudência, como
na investigação de paternidade sem o uso do DNA[23] e as indenizações milionárias
por desapropriação, baseadas em laudos falsos.[24]
07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
https://daniellixavierfreitas.jusbrasil.com.br/artigos/146506445/coisa-julgada-e-seguranca-juridica-flexibilizacao-e-eficacia-executiva-da-sentenca 12/47
No âmbito tributário, o Professor Humberto Ávila expõe interessante exemplo da
necessidade de flexibilização da coisa julgada quando, no seio de relações jurídicas
continuativas, sobrevém decisão do STF em controle concentrado de
constitucionalidade, ou difuso acrescido de instrumento de ampliação da eficácia
(resolução do Senado ou súmula vinculante), e determinado contribuinte, em
virtude de decisão transitada em julgado, tenha de se submeter a um “estado de
desigualdade por ela provocado por meio da obrigação de alguém ter de pagar o que
ninguém deverá pagar, ou de alguém não pagar o que todos deverão pagar”.[25]
Diante desse quadro, questiona-se se a regra da coisa julgada possui uma finalidade
que a sustente que seja imponderável com outros princípios constitucionais fora das
hipóteses expressamente previstas de cabimento de ação rescisória.
Esse problema possui uma raiz profunda na teoria geral do direito, especialmente
no estudo das diferenças entre regras e princípios, aliada à possibilidade de
superação das regras, mesmo que preenchida a previsão normativa para sua
incidência.
Refletindo sobre a previsão constitucional de proteção da coisa julgada, estabelecida
no art. 5º, XXXVI, concordamos com o Professor Marinoni, para quem tal
enunciado prescritivo consubstancia uma regra e não um princípio.[26]-[27] Isso
porque se adéqua àquele conjunto de normas “imediatamente descritivas, na
medida em que estabelecem obrigações, permissões e proibições mediante a
descrição da conduta a ser adotada”, afastando-se, portanto, das normas-princípio
que são “imediatamente finalísticas, já que estabelecem um estado de coisas para
cuja realização é necessária a adoção de determinados comportamentos.”.[28]
Nesse contexto, a Constituição Federal é peremptória em afirmar a necessidade de
preservação da coisa julgada, proibindo medidasque visem a afastar tal garantia de
estabilidade da ordem jurídica e tutela da confiança dos cidadãos no Estado. Por ser
norma descritiva de uma conduta vedada pelo ordenamento, trata-se de nítida regra
jurídica que, a partir da ponderação de valores, deixou claro que o Constituinte
optou por prestigiar a segurança jurídica, cristalizando tal valor em regramento
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/155571402/constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-constitui%C3%A7%C3%A3o-da-republica-federativa-do-brasil-1988
07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
https://daniellixavierfreitas.jusbrasil.com.br/artigos/146506445/coisa-julgada-e-seguranca-juridica-flexibilizacao-e-eficacia-executiva-da-sentenca 13/47
específico. Entre eternizar a busca da justiça e conferir estabilidade às relações
jurídicas, optou o Constituinte por colocar fim ao litígio, impedindo a revisão da
decisão transitada em julgado.
Com efeito, indaga-se se, diante de uma regra constitucional, é possível que o
legislador ordinário ou mesmo o Poder Judiciário possam, em alguma medida, não
aplicar tal regra, ou melhor, excepcioná-la, viabilizando a modificação de uma
decisão transitada em julgado, “pela consideração de razões excepcionais que
superem a própria razão que sustenta a aplicação normal da regra”,
consubstanciando o que se chama de “aptidão para cancelamento (defeasibility)”.
[29]
Conforme já afirmamos, foi a própria Constituição Federal que outorgou ao
legislador ordinário a possibilidade de, ponderando valores, prescrever situações
em que a coisa julgada será flexibilizada, na medida em que estabeleceu o
cabimento da ação rescisória e da revisão criminal, sem precisar em que situações
poderiam ser manejadas.
Coube assim ao legislador, no âmbito civil, disciplinar no art. 485 do CPCas
hipóteses de cabimento da ação rescisória. Ou seja, verificaram-se situações que
apresentavam tamanha injustiça e gravidade que se viabilizou a flexibilização da
coisa julgada por meio da ação rescisória. Estamos aqui, portanto, diante de uma
flexibilização tipificada da coisa julgada. Não se pode perder isso de vista. As
hipóteses de cabimento da ação rescisória e o seu prazo nada mais são do que
situações de flexibilização da coisa julgada estabelecidas, por meio da ponderação
de valores, pelo legislador ordinário. Afastou-se, assim, a regra constitucional em
virtude de razões axiológicas que superaram a razão que confere sustentação a tal
garantia. Se a coisa julgada é um importante instrumento de proteção da segurança
jurídica, esse valor constitucional não é absoluto e, havendo situações que
recomendam seu afastamento para prestigiar outro valor (justiça), estamos diante
de casos que justificam a superação da regra e, no caso, possibilitam o ajuizamento
da ação rescisória.
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/155571402/constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-constitui%C3%A7%C3%A3o-da-republica-federativa-do-brasil-1988
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10686517/artigo-485-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
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07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
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Com efeito, não obstante ser a garantia da coisa julgada uma regra constitucional,
no dizer de Marinoni uma “super-regra”[30], sua aplicação não observa
constantemente a lógica do “tudo ou nada”, havendo situações excepcionais que,
não obstante preenchido o enunciado prescritivo que recomenda sua observância,
será possível a superação.[31]
A grande questão que ainda precisa ser resolvida doutrinariamente diz respeito à
possibilidade de que tal superação seja operada pelo Poder Judiciário, fora das
hipóteses previstas em lei. Trata-se de tema dos mais difíceis, porquanto não há
qualquer disciplina legal a respeito, a não ser a regra constitucional de proteção da
coisa julgada e a competência dos tribunais para apreciação de rescisória e de
revisão criminal.
Na doutrina nacional encontramos as mais diversas opiniões, desde a ampla
possibilidade de flexibilização atípica da coisa julgada, até a sua radical negação.
Conhecidas são as ideias defendidas por José Augusto Delgado, no sentido de
sobrepor ao princípio da segurança jurídica inúmeros outros como a legalidade,
moralidade e justiça, abrindo-se, assim, amplo campo de possibilidades mitigadoras
da coisa julgada.[32] Destaca-se, outrossim, a doutrina de Cândido Dinamarco, que
pretende cotejar a coisa julgada com os “princípios da razoabilidade e da
proporcionalidade”, viabilizando a flexibilização sob a ideia de que não se pode
perpetuar injustiças a pretexto de evitar a eternização de incertezas.[33]
Como dissemos, não obstante seja a coisa julgada uma regra das mais importantes
em um Estado de Direito, o que faz com que sua superação ocorra em situações
absolutamente excepcionais, não nos parece que só o Poder Legislativo esteja
autorizado a estabelecer os casos de superação da regra constitucional. Deve ter
prioridade, mas não exclusividade. Há de remanescer, em alguma medida,
atribuição ao Judiciário para afastar uma decisão transitada em julgado.[34]
O Poder Judiciário ocupa papel de alta relevância em um Estado Democrático de
Direito, inclusive para suprir eventuais omissões do Legislativo.[35] Por exemplo, já
passamos da hora de ter uma previsão legislativa de cabimento de rescisória ou
07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
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outra forma de superação da coisa julgada[36] nos casos de investigação de
paternidade em que a decisão transitou em julgado negando a qualidade de pai sem
a realização do exame de DNA.[37]
Não nos afigura adequado que o Judiciário fique absolutamente engessado, diante
de situações aberrantes, que importem sacrifícios irrazoáveis para os
jurisdicionados e para a sociedade, em nome da preservação da coisa julgada.
Temos que atentar, todavia, que estamos diante de uma das regras mais
importantes de um Estado Democrático de Direito e essa premissa deve nortear
toda a construção proposta. Isso reforça, por exemplo, a preocupação antes citada
do Professor Humberto Ávila no sentido de que as regras só podem ser superadas
“por razões extraordinárias e mediante um ônus de fundamentação maior”.[38] No
particular, tal exigência se avulta.
Preocupa-nos bastante a tese ora perfilhada de ao Poder Judiciário ser possível,
ainda que excepcionalmente, afastar a coisa julgada quando presentes razões que
superem os valores que fundamentam tal garantia constitucional.[39] Entretanto,
sendo coerente com o discurso jurídico até aqui desenvolvido, não podemos
defender que a coisa julgada se sustenta em um valor absoluto, insuperável, pois o
próprio sistema nos desmentiria, na medida em que as hipóteses de cabimento da
ação rescisória e da revisão criminal escancaram a possibilidade de superação da
regra constitucional.
Como dissemos, o que se faz necessário é o entendimento de que a flexibilização
dessa “super-regra” só pode ocorrer em situações absolutamente excepcionais e
mediante um ônus argumentativo da mais alta envergadura. Tal ingerência do
Judiciário deve se dar com a consciência de que a tarefa de flexibilização da coisa
julgada é prioritariamente exercida pelo Poder Legislativo, devendo ser respeitadas,
na maior medida possível, as escolhas por ele delineadas de superação da
imutabilidade dos julgados.[40]
Importante, ainda, que o próprio Poder Legislativo estabeleça mecanismos claros ao
exercício desse poder excepcional de revisão da coisa julgada pelo Judiciário e,
ainda, fique atento paraavaliar se, nas hipóteses flexibilizadas, não seria
07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
https://daniellixavierfreitas.jusbrasil.com.br/artigos/146506445/coisa-julgada-e-seguranca-juridica-flexibilizacao-e-eficacia-executiva-da-sentenca 16/47
interessante uma atuação célere do Parlamento no sentido de conferir um
tratamento legal à hipótese em que a regra constitucional foi superada.
Quanto à crítica a respeito da garantia de que a segunda decisão do Judiciário seria
mais justa que a primeira[41], como dito acima, a superação da regra só será
admitida em situações excepcionais, em que estejam presentes todas as evidências
de que o valioso princípio da segurança jurídica deva ceder diante de outros valores
que, no caso, devam ser preservados. Assim, parece-nos que o fundamental não é
perscrutar sobre a justiça da segunda decisão - pois efetivamente o ideal de justiça
sempre será relativo - mas sim identificar com precisão que a decisão transitada em
julgado proporciona situação tão injusta que justifique a preservação de outros
valores em detrimento das razões que dão suporte à garantia da coisa julgada. Não
há como prometer a justiça absoluta do segundo julgado, mas sim exigir certo
consenso quanto à aberração jurídica proporcionada pela decisão transitada em
julgado.
Não se desconhece a dificuldade em identificar qual seria tal “injustiça flagrante”
apta a dar ensejo à flexibilização atípica da coisa julgada. Tampouco se pretende
oferecer uma fórmula mágica como panaceia ao intricado problema. Pensamos que
tal identificação deve ser fruto de dedicado e responsável trabalho da doutrina e da
jurisprudência, com o atento olhar do Legislativo, no intuito de conferir a menor
insegurança possível à sociedade.[42]
Nos termos aqui propostos, teremos um ordenamento jurídico que preservará a
coisa julgada como garantia fundamental constitucionalmente prevista, cuja
superação se dará nas hipóteses previstas em lei, cabendo ao Judiciário, em
situações absolutamente excepcionais e mediante procedimento legalmente
estabelecido[43], flexibilizá-la com a máxima atenção possível ao “estado de
confiabilidade do Direito por meio da estabilização das decisões”.[44]
4. Coisa julgada e eficácia executiva
4.1 Distinções fundamentais
07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
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ç
Uma interessante questão que merece ser examinada diz respeito à relação que se
alega existir entre coisa julgada e eficácia executiva da decisão transitada em
julgado. A questão que se apresenta é saber se a supressão da possibilidade de
execução de uma decisão transitada em julgado implica, em alguma medida,
violação à garantia da coisa julgada.
Como já afirmado anteriormente, a imutabilidade da coisa julgada incide sobre a
norma jurídica concreta definida na decisão de mérito transitada em julgado. Tal
norma jurídica nada mais significa do que o direito subjetivo erigido a partir do
ordenamento jurídico vigente.
A princípio, deveriam os jurisdicionados identificar a norma jurídica concreta a
partir das relações jurídicas estabelecidas socialmente e observarem, de forma
voluntária, o ordenamento em vigor. Contudo, situações há em que não existe
consenso quanto ao conteúdo da norma jurídica concreta, fazendo com que se
busque o Poder Judiciário para fazê-lo. Quando o Estado-Juiz intervém e define a
norma jurídica concreta (que poderia ter sido definida pelos sujeitos da demanda
ajuizada), agrega a sua autoridade a tal norma[45], conferindo-lhe a qualidade de
imutável, no intuito de proporcionar segurança jurídica à sociedade.
O que queremos atestar com tal arrazoado é que a decisão judicial, embora
represente um complemento à norma jurídica que poderia ter sido concebida pelos
próprios sujeitos da relação de direito material[46], não assegura a exigibilidade
infinda do direito reconhecido. Da mesma forma que os direitos subjetivos
reconhecidos voluntariamente pelos cidadãos não são exigíveis para sempre, por
igual motivo o direito subjetivo recriado pela decisão judicial também não o é. Em
suma, não é objeto da coisa julgada a exigibilidade do direito declarado na decisão
final, tornando-a definitiva. A coisa julgada incide sobre o conteúdo do julgado,
tornando o direito nele previsto inquestionável.
A afirmação acima se confirma, por exemplo, na prescrição da pretensão executiva.
Consoante a súmula n. 150 STF, “Prescreve a execução no mesmo prazo de
prescrição da ação.”. Ou seja, após o trânsito em julgado de uma decisão, deve-se
verificar no direito material qual é o prazo de prescrição para exigir aquele direito
07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
https://daniellixavierfreitas.jusbrasil.com.br/artigos/146506445/coisa-julgada-e-seguranca-juridica-flexibilizacao-e-eficacia-executiva-da-sentenca 18/47
reconhecido judicialmente. Em tendo transcorrido o prazo, não mais haverá
possibilidade de exigir o cumprimento do direito (exigibilidade) e, por via de
consequência, fulminada estará a eficácia executiva do julgado.
Não se questiona, na espécie, qualquer malferimento à coisa julgada a circunstância
de não mais ser executável a decisão transitada em julgado, exatamente porque o
reconhecimento de um direito em juízo e a inalterabilidade advinda da coisa julgada
nada tem a ver com a exigibilidade desse direito.[47]
Inúmeros outros casos de supressão da exigibilidade podem ser listados, tais como
cumprimento da obrigação, compensação, transação, renúncia etc. Em síntese, tais
hipóteses comprovam, sem sobra de dúvidas, que a coisa julgada não confere
imutabilidade à exigibilidade do direito.[48]
O art. 741 do CPC nos demonstra de forma eloquente tal relação entre a
exigibilidade dos direitos e a eficácia executiva dos julgados. Impressiona como a
doutrina não confere a devida relevância a tais distinções e, vez por outra, afirma de
forma categórica que a supressão da eficácia executiva das decisões importa
violação à coisa julgada.
A coisa julgada, reitere-se, não tem por objeto a exigibilidade dos direitos ou a
eficácia executiva da decisão, mas sim o próprio direito reconhecido, tornando-o
incontestável quanto à sua existência. A exigibilidade, porém, pode ser alterada,
suprimida, interrompida, suspensa, sem qualquer violação à coisa julgada.
4.2 Eficácia executiva e segurança jurídica.
Feita a necessária distinção entre o objeto da coisa julgada e a eficácia executiva da
decisão transitada em julgado, é importante perceber que o instituto da coisa
julgada é apenas uma das formas de proteção da segurança jurídica, mas não a
única. Como já afirmado, o princípio da segurança jurídica é uma decorrência
imediata do Estado Democrático de Direito, podendo ser extraído diretamente
da Constituição. Assim, todo ordenamento jurídico deve ser por ele orientado, tanto
na elaboração legislativa, como na sua interpretação.
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10649831/artigo-741-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91735/c%C3%B3digo-processo-civil-lei-5869-73
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/155571402/constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-constitui%C3%A7%C3%A3o-da-republica-federativa-do-brasil-1988
07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
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O tema nos interessa, pois a suspensão da exigibilidade de um direito reconhecido
judicialmente, a depender de como for prevista, pode gerar uma situação de
insegurança incompatível com a promessa constitucional de um ordenamento
jurídico confiável. Imaginemos, porexemplo, uma previsão legal que determine que
o autor vitorioso deva requerer a execução da decisão judicial em vinte e quatro
horas, sob pena de inexigibilidade do título executivo. Seria razoável um prazo tão
exíguo para o exercício da pretensão executória, após a longa duração fisiológica e,
por vezes, patológica do processo[49]?
A resposta a tal indagação será identificada após a ponderação dos valores que se
pretende proteger com a regra hipotética antes sugerida e o valor segurança
jurídica. Se entendermos que a disposição legal proporciona uma situação de
insegurança injustificável diante dos valores que visa prestigiar, é de ser
reconhecida a sua inconstitucionalidade.
Não pretendemos nos estender nesse ponto, a fim de não fugirmos do tema a que
nos propomos (coisa julgada). O que precisamente interessa aqui é destacar que a
eventual inconstitucionalidade da regra citada, manipulando a exigibilidade do
direito reconhecido e consequentemente a eficácia executiva do julgado, não
decorre de uma possível violação à coisa julgada, mas sim de uma agressão direta ao
princípio da segurança jurídica. A norma jurídica concreta cujo direito nela
reconhecido se torna imutável em nada é abalada com a supressão da exigibilidade,
conforme já amplamente demonstrado.
4.3 Eficácia executiva e posterior declaração
de inconstitucionalidade pelo STF
Os questionamentos acerca da exigibilidade do direito reconhecido por decisão
transitada em julgado tornam-se ainda mais interessantes quando analisados sob a
ótica do art. 741, parágrafo único, e do art. 475-L, § 1º, do CPC, que veiculam, em
sede de embargos à execução e de impugnação ao cumprimento de sentença, a
viabilidade de alegação da inexigibilidade do título executivo, sempre que “fundado
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10649831/artigo-741-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10649553/par%C3%A1grafo-1-artigo-741-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/28966759/artigo-475l-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/28966745/par%C3%A1grafo-1-artigo-475l-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91735/c%C3%B3digo-processo-civil-lei-5869-73
07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
https://daniellixavierfreitas.jusbrasil.com.br/artigos/146506445/coisa-julgada-e-seguranca-juridica-flexibilizacao-e-eficacia-executiva-da-sentenca 20/47
em lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal
Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou ato normativo tidas
pelo Supremo Tribunal Federal como incompatíveis com a Constituição Federal.”.
Tais regramentos foram inseridos no ordenamento jurídico brasileiro por
inspiração do direito alemão que, no § 79 da Lei Orgânica do Tribunal
Constitucional Federal, prevê:
(1) É legítimo o pedido de revisão criminal nos termos doCódigo de Processo
Penall contra a sentença condenatória penal que se baseia em uma norma
declarada inconstitucional (sem a pronúncia de nulidade) ou nula, ou que se
assenta em uma interpretação que o Bundesverfassungsgericht considerou
incompatível com a Lei Fundamental. (2) No mais, ressalvado o disposto no§
955 (2), da Lei da Bundesverfassungsgericht ou uma disciplina legal específica,
subsistem íntegras as decisões proferidas com base em uma lei declarada nula,
nos termos do§ 788. É ilegítima a execução de semelhante decisão. Se a execução
forçada tiver de ser realizada nos termos da disposição do Código de Processo
Civil, aplica-se o disposto no § 767 do Código de Processo Civil. Excluem-se as
pretensões fundadas em enriquecimento sem causa. (grifo nosso)[50]
À vista do dispositivo inspirador da regra existente no ordenamento jurídico
brasileiro, importante sublinhar alguns pontos que nos parecem fundamentais: a) O
dispositivo alemão trata nitidamente da eficácia executiva de decisões baseadas em
dispositivos declarados inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional. Por tal razão
que é expresso em afirmar que as decisões proferidas ficam íntegras, sendo inviável
apenas a sua execução; b) Ademais, também de forma clara, impede que a decisão
do Tribunal Constitucional tenha efeitos pretéritos, vedando pretensões de
enriquecimento sem causa decorrentes do cumprimento de uma decisão baseada
em dispositivo tido por inconstitucional.
Apesar de o ordenamento jurídico brasileiro não ser claro quanto aos consectários
do art. 741, parágrafo único, e art. 475-L, § 1º, do CPC, não entendemos porque a
doutrina nacional ignora completamente tal interpretação autêntica delineada pelo
legislador alemão e não a utiliza para nortear a aplicação dos referidos dispositivos.
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/155571402/constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-constitui%C3%A7%C3%A3o-da-republica-federativa-do-brasil-1988
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/1028351/c%C3%B3digo-processo-penal-decreto-lei-3689-41
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91735/c%C3%B3digo-processo-civil-lei-5869-73
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91735/c%C3%B3digo-processo-civil-lei-5869-73
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10649831/artigo-741-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10649553/par%C3%A1grafo-1-artigo-741-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/28966759/artigo-475l-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/28966745/par%C3%A1grafo-1-artigo-475l-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91735/c%C3%B3digo-processo-civil-lei-5869-73
07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
https://daniellixavierfreitas.jusbrasil.com.br/artigos/146506445/coisa-julgada-e-seguranca-juridica-flexibilizacao-e-eficacia-executiva-da-sentenca 21/47
[51] Prefere-se, ao contrário, perfilhar que a regra brasileira tem efeitos retroativos,
ataca a própria existência da decisão e viabiliza pretensões repetitórias caso
cumprida a decisão baseada em disposição inconstitucional.
O Professor Marinoni lembra interessante passagem de conferência proferida por
Friedrich Müller, no Rio de Janeiro em 2002, na qual tece considerações sobre o
regramento alemão e como é visto pela Corte Constitucional Federal. Vejamos:[52]
O § 79 regulamentou matérias especialmente relevantes: contra sentenças
penais que se baseiam em uma norma posteriormente declarada
inconstitucional ou nula cabe a retomada de um processo. Mas decisões não
mais impugnáveis nas outras áreas do direito remanescem “intocadas”: por
conseguinte, não mais podem ser eliminadas. Se a partir delas ainda não tiver
sido efetuado o procedimento da execução – e. G., no Direito Civil -, isso não
poderá mais ocorrer a partir de agora. E caso no passado já tenha sido
realizada uma execução a partir delas, essa prestação (Leistung) não mais
poderá ser cobrada de volta, “pretensões resultantes de enriquecimento ilícito
(...) estão excluídas” (§ 79 II 4). Nesses casos a dimensão temporal do passado é
por assim dizer sustada, é bloqueada diante do futuro. Uma exceção – abertura
facultativa da dimensão futura – só vale para o direito penal. A razão é
plausível, pois esse ramo do direito intervém de modo especialmente cortante
nas relações pessoais e porque a pena envolve um juízo de desvalor sobre o
comportamento humano – mas justamente com base em uma norma agora
declara inconstitucional. O § 79 precisava solucionar o conflito entre a justiça
do caso individual e a segurança jurídica objetiva – em uma constelação que
abrange diversas dimensões temporais; em outras palavras, num caso clássico
de direito intertemporal. Nos casos antes citados – bloqueio do passado diante
do futuro -, o § 79 decidiu-se pela segurança jurídica e foi por isso elogiado pelo
Tribunal Constitucional Federal. A Corte extraiu do § 79 até um “princípiojurídico universal”, no sentido de “que uma decisão do Tribunal Constitucional
Federal, que declara a nulidade de uma norma, em princípio não deve produzir
efeitos sobre relações jurídicas já processadas, abstraindo da exceção de uma
sentença penal transitada em julgado.
07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
https://daniellixavierfreitas.jusbrasil.com.br/artigos/146506445/coisa-julgada-e-seguranca-juridica-flexibilizacao-e-eficacia-executiva-da-sentenca 22/47
É interessante observar que não se cogita, com a cessação da eficácia executiva, em
violação à coisa julgada. Ao contrário, prestam-se encômios à impossibilidade de a
decisão posterior do Tribunal Constitucional alemão não poder retroagir para
abalar a coisa julgada fora da seara penal, impedindo assim qualquer pleito
repetitório.[53] É o que se chama de sustação da dimensão temporal do passado
diante do futuro. Assim, nas situações já consolidadas, ocorre “o bloqueio do
passado diante do futuro”, tendo sido elogiado pelo Tribunal Constitucional alemão,
porquanto decidiu pela segurança jurídica. Contudo, caso ainda não cumprido o
direito definido na decisão judicial, isso não mais poderá ocorrer, pois suprimida
está a eficácia executiva diante da decisão da Corte Suprema.
Pensamos que o art. 741, parágrafo único, e o art. 475-L, § 1º, do CPCdevem ser
interpretados nos mesmos termos do regramento alemão, na medida em que
constituem uma hipótese de ineficácia prospectiva dos julgados baseados em
dispositivos tidos por inconstitucionais pelo STF. Não é furtivo o fato de ser
suprimida a exigibilidade do direito, afastando a eficácia executiva do julgado. O
que tais dispositivos pretendem, pois, é suprimir a possibilidade de se executar um
título judicial caso sobrevenha um evento da mais alta relevância no ordenamento
jurídico nacional, que é o reconhecimento da inconstitucionalidade de um
enunciado normativo pelo STF. Visa ao futuro, jamais ao passado. Não há
retroatividade que atinge a coisa julgada, muito menos possibilidade de repetição
do que foi regularmente cumprido.
Defender que tais regramentos retroagem para atingir a decisão transitada em
julgado ou possibilitar a repetição do indébito quando já cumprido o direito
reconhecido judicialmente só pode ser fruto de um hercúleo exercício exegético,
pois definitivamente não é isso que está consignado no texto legal.[54]
O grande problema que identificamos na doutrina que se debruça sobre a
constitucionalidade de tais dispositivos está na premissa adotada. Costuma-se
afirmar que são retroativos, fazendo com que a decisão posterior do STF retroaja
para afetar a coisa julgada e elimine todos os efeitos gerados pela decisão transitada
em julgado. Realmente, se essa for a premissa adotada, sobram argumentos para
configurar a inconstitucionalidade.
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10649831/artigo-741-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10649553/par%C3%A1grafo-1-artigo-741-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/28966759/artigo-475l-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/28966745/par%C3%A1grafo-1-artigo-475l-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91735/c%C3%B3digo-processo-civil-lei-5869-73
07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
https://daniellixavierfreitas.jusbrasil.com.br/artigos/146506445/coisa-julgada-e-seguranca-juridica-flexibilizacao-e-eficacia-executiva-da-sentenca 23/47
Contudo, se a mera leitura do art. 741, parágrafo único, e do art. 475-L, § 1º,
do CPC não é suficiente para se afastarem tais conclusões, utilizemo-nos da sua raiz
histórica alemã e da respectiva doutrina a respeito como auxílio na interpretação
dos dispositivos. O que não se pode concordar é com a tentativa de inquiná-los de
inconstitucionais por razões que lhes são estranhas e avessas à sua teleologia.
Delimitado, portanto, o conteúdo normativo do art. 741, parágrafo único, e do
art. 475-L, § 1º, do CPC, cumpre-nos voltar à questão se a supressão da eficácia
executiva de uma decisão acobertada pela coisa julgada viola tal garantia
constitucional.
Conforme já expusemos, a eficácia executiva das decisões não fica acobertada pela
garantia da coisa julgada, existindo inúmeros exemplos nos quais ela é suprimida,
suspensa, interrompida, enfim, modificada das mais diversas maneiras. Entender
diversamente implica reconhecer que, por exemplo, a prescrição da pretensão
executória consubstancia hipótese de flexibilização da coisa julgada, o que não nos
parece adequado.
Com efeito, a inexigibilidade prospectiva das decisões transitadas em julgado não
afeta a coisa julgada, que tem por objeto o direito reconhecido judicialmente,
garantindo a sua existência e impossibilidade de ser questionado em outras
demandas judiciais. Por tal razão, como o art. 741, parágrafo único, e o art. 475-L, §
1º, do CPC proporcionam apenas a inexigibilidade do direito reconhecido
judicialmente, não se pode falar violação à coisa julgada.
Diante de um evento de alta relevância, que é a decretação da inconstitucionalidade
pelo STF, o legislador ponderou valores e cristalizou a regra que suprime a eficácia
executiva das decisões baseadas no dispositivo inquinado de inconstitucional pela
Corte Suprema. Afastou a segurança jurídica que emerge do direito de executar a
decisão transitada em julgado e considerou o reconhecimento da
inconstitucionalidade pelo STF evento superveniente e apto a prevalecer em um
juízo de proporcionalidade.[55]
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10649831/artigo-741-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10649553/par%C3%A1grafo-1-artigo-741-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/28966759/artigo-475l-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/28966745/par%C3%A1grafo-1-artigo-475l-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91735/c%C3%B3digo-processo-civil-lei-5869-73
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10649831/artigo-741-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10649553/par%C3%A1grafo-1-artigo-741-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/28966759/artigo-475l-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
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http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91735/c%C3%B3digo-processo-civil-lei-5869-73
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http://www.jusbrasil.com.br/topicos/28966759/artigo-475l-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
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07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
https://daniellixavierfreitas.jusbrasil.com.br/artigos/146506445/coisa-julgada-e-seguranca-juridica-flexibilizacao-e-eficacia-executiva-da-sentenca 24/47
Os dispositivos ora interpretados visam, assim, a compatibilizar o controle difuso de
constitucionalidade existente no Brasil com a existência de uma Corte de cúpula,
responsável em dar a última palavra em questões constitucionais. Como a decisão
do STF causa induvidoso impacto no ordenamento jurídico, optou o legislador em
inviabilizar a execução de decisões baseadas no regramento inconstitucional.[56]
Assim, ainda que analisado apenas sob a ótica da segurança jurídica (item 4.2
supra), não nos parece inconstitucional o resultado da ponderação de valores feita
pelo Legislador,quando positiva que a definição sobre a constitucionalidade de um
dispositivo legal pelo STF constitui algo tão impactante no ordenamento jurídico
que se torne apto a impedir a execução de decisões que o tenha por fundamento.
Além de prestigiar a autoridade das decisões da Suprema Corte e a própria força
normativa da Constituição[57], consagra a isonomia, na medida em que busca
proporcionar uma aplicação homogênea do ordenamento, na maior dimensão
possível. Os cidadãos, por sua vez, estarão devidamente informados que as decisões
judiciais não produzirão mais efeitos se o Supremo Tribunal Federal reconhecer a
inconstitucionalidade dos dispositivos no qual ela se baseia.
Interessante registrar que, mesmo antes do art. 741, parágrafo único, e do art. 475-
L, § 1º, do CPC, Teori Zavascki já recomendava a supressão da eficácia executiva das
decisões judiciais, após decisão do STF em controle concentrado ou difuso com
resolução do Senado, mediante a ponderação de valores constitucionais, nos
seguintes termos:[58]
Quid juris sobre a exeqüibilidade, após a Resolução do Senado, de obrigações
anteriores ainda pendentes? Estaria ela assegurada pela força vinculante da
sentença? Entendemos que não. Reproduz-se, na situação focada, o conflito
entre a força vinculante da sentença do caso concreto e a da que decorre da
decisão do Supremo e da Resolução do Senado. Entre uma e outra, mesmo que
se esteja em fase de execução, a prevalência, pelos motivos antes expostos, é da
segunda, que poderá ser invocada, em embargos do devedor, como causa
extintiva da obrigação executada (CPC, art. 741, VI).
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/155571402/constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-constitui%C3%A7%C3%A3o-da-republica-federativa-do-brasil-1988
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10649831/artigo-741-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10649553/par%C3%A1grafo-1-artigo-741-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/28966759/artigo-475l-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/28966745/par%C3%A1grafo-1-artigo-475l-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91735/c%C3%B3digo-processo-civil-lei-5869-73
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91735/c%C3%B3digo-processo-civil-lei-5869-73
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10649831/artigo-741-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10649590/inciso-vi-do-artigo-741-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
https://daniellixavierfreitas.jusbrasil.com.br/artigos/146506445/coisa-julgada-e-seguranca-juridica-flexibilizacao-e-eficacia-executiva-da-sentenca 25/47
Em recente decisão, o STJ ratificou essa posição, extinguindo sem julgamento de
mérito ação ordinária proposta em primeira instância por um contribuinte, na qual
objetivava afastar decisão transitada em julgado com base em pronunciamento
posterior do STF incrementado pela resolução do Senado. Segundo a Corte, apesar
da ação não poder ser manejada, pois ofenderia a coisa julgada, tributos cujos fatos
geradores ocorreram entre a coisa julgada e a resolução do Senado que ainda não
foram pagos, não mais poderiam ser exigidos, em virtude da ineficácia executiva
que se operou após o pronunciamento do STF e a resolução senatorial.[59]
4.4 Eficácia executiva e eficácia preclusiva da
coisa julgada.
Um último ponto merece nossa atenção quanto às alegações de
inconstitucionalidade do art. 741, parágrafo único, e do art. 475-L, § 1º, do CPC.
Defende-se que a possibilidade de alegação, na fase executiva, da inexigibilidade do
título executivo com base na inconstitucionalidade proporcionaria violação da coisa
julgada, pois flexibilizaria a sua eficácia preclusiva.[60] Isso porque a
inconstitucionalidade do dispositivo legal (como tal reconhecido pelo STF) poderia
ter sido alegada antes do trânsito em julgado, não podendo ser aduzido após o seu
advento. Tal possibilidade violaria a garantia constitucional da coisa julgada.[61]
Tal argumento não nos convence. Analisando os regramentos que suprimem a
exigibilidade das decisões transitadas em julgado, verificamos que efetivamente
ocorre um evento posterior à formação da coisa julgada apto a proporcionar tal
efeito. Referimo-nos à decisão do STF dando a última palavra sobre a
constitucionalidade de certo dispositivo legal e não à mera alegação de
inconstitucionalidade desprovida de pronunciamento da Corte Suprema.
Se, antes do pronunciamento do STF, realmente era possível termos a alegação da
inconstitucionalidade do dispositivo legal, fazendo com que a eficácia preclusiva da
coisa julgada impedisse uma nova alegação na fase executiva, estamos aqui tratando
da supressão desse dispositivo do ordenamento jurídico, após a decisão do STF.
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10649831/artigo-741-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10649553/par%C3%A1grafo-1-artigo-741-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/28966759/artigo-475l-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
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07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
https://daniellixavierfreitas.jusbrasil.com.br/artigos/146506445/coisa-julgada-e-seguranca-juridica-flexibilizacao-e-eficacia-executiva-da-sentenca 26/47
Entender que o contexto jurídico anterior e posterior à decisão da Suprema Corte é
rigorosamente o mesmo é admitir que este fato não causa qualquer impacto no
ordenamento jurídico.[62]
Assim não nos parece. Após o STF dar a última palavra sobre a constitucionalidade
de certo dispositivo legal, em especial quando reconhece sua inconstitucionalidade,
temos uma alteração significativa o ordenamento jurídico, porquanto os juízes não
mais poderão aplicar a regra afastada pela Corte maior. Caso o faça, e não estejamos
diante do pronunciamento do STF em sede de controle concentrado de
constitucionalidade – situação que confere grande nitidez ao referido impacto
jurídico – basta que a demanda seja conduzida ao STF que certamente tal solução
lhe será conferida.[63]
Não podemos concordar com o Professor Marinoni, quando afirma que o
art. 741, parágrafo único, e o art. 475-L, § 1º, do CPC importam violação da eficácia
preclusiva da coisa julgada, pois viabilizam a apresentação, em oposição da
execução, dos mesmos motivos “que foram arguidos ou que poderiam ter sido
invocados na fase antecedente à resolução do mérito”.[64]
O legislador não permitiu a mera alegação da inconstitucionalidade em sede de
execução, nos mesmos moldes que poderia ter sido feito na fase de conhecimento,
mas sim oportunizou trazer aos autos um elemento novo, posterior à decisão
transitada em julgado, que foi a decisão da Suprema Corte. E este novo elemento,
justamente porque sequer existia, não poderia ter sido antes alegado.
Como dissemos, entender que a situação jurídica anterior e posterior à decisão da
Suprema Corte é a mesma, significa admitir que este fato não causa qualquer
impacto no ordenamento jurídico. Luis Guilherme Marinoni, paradoxalmente,
tratando das relações jurídicas continuativas, reconhece expressamente que as
decisões do STF impactam de forma significativa no ordenamento jurídico,
apresentando aptidão de fazer cessar a eficácia das decisões judiciais transitadas em
julgado em relação aos fatos jurídicos futuros. Vejamos:
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10649831/artigo-741-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10649553/par%C3%A1grafo-1-artigo-741-da-lei-n-5869-de-11-de-janeiro-de-1973
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07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
https://daniellixavierfreitas.jusbrasil.com.br/artigos/146506445/coisa-julgada-e-seguranca-juridica-flexibilizacao-e-eficacia-executiva-da-sentenca 27/47
A declaração de inconstitucionalidade pode ser vista como uma circunstância
superveniente, tal como uma nova norma. Assim, pode permitir ao vencido na ação
anterior – em que a inconstitucionalidade não foi reconhecida – alegar, por
exemplo, a declaração de inconstitucionalidade do tributo.[65]
(...)
(...) a declaração de constitucionalidade tem os efeitos de eliminar a dúvida
sobre a aplicação de uma norma – dando-lhe especial eficácia – e de vincular os
órgãos do Judiciário e os órgãos da Administração, obrigando-os a se
comportar de acordo com o pronunciamento do Supremo Tribunal Federal. A
partir da declaração de constitucionalidade há certeza jurídica sobre a
constitucionalidade da norma. Além de a certeza jurídica vincular os órgãos do
Judiciário e da Administração, ela se impõe sobre todos os membros da
sociedade, obrigados que estão a respeitá-la.[66]
Ora, como se pode considerar a declaração de inconstitucionalidade pelo STF um
evento posterior à coisa julgada que impacta a ordem jurídica e demonstra aptidão
de ser considerada como alteração das circusntâncias jurídicas frente às relações
jurídicas continuativas e, em relação à eficácia preclusiva, tal fato não
consubstancia evento novo e, portanto, não se submete à eficácia preclusiva da coisa
julgada? Com o devido respeito, há uma contradição em tais posicionamentos.
Nesses termos, não há de se falar em violação à eficácia preclusiva da coisa julgada,
pois o que proporciona a supressão da exigibilidade não é a simples alegação de
inconstitucionalidade que poderia ter sido veiculada antes do trânsito em julgado,
mas sim a decisão do STF, dando a última palavra sobre o tema.
CONCLUSÃO
Todo o estudo teve como objetivo principal propor soluções para situações bastante
complexas que estão longe de alcançar consenso doutrinário. Trabalhar o instituto
da coisa julgada envolve necessariamente a percepção da ideia de segurança jurídica
07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
https://daniellixavierfreitas.jusbrasil.com.br/artigos/146506445/coisa-julgada-e-seguranca-juridica-flexibilizacao-e-eficacia-executiva-da-sentenca 28/47
presente em determinado momento histórico. A partir daqui começamos a verificar
em que medida pode o legislador infraconstitucional delinear o perfil dogmático da
coisa julgada, quais os seus limites e possibilidades.
Inicialmente, foi enfrentada aquela que reputamos a mais difícil questão, que é a
possibilidade de flexibilização atípica da coisa julgada pelo Poder Judiciário. Em
regra não se pode admitir, pois consubstanciaria verdadeira negação da garantia
constitucional. Porém, não se pode vedar inteiramente essa hipótese, pois a
segurança jurídica, que tem a coisa julgada como um instrumento de sua promoção,
não consubstancia um valor absoluto, podendo ceder diante de circunstâncias que
recomendem a prevalência de outros valores constitucionais. Diante da importância
da coisa julgada na conformação de um Estado Democrático de Direito, tal
recomendação deve se dar em situações excepcionalíssimas, acompanhadas de um
acentuado ônus argumentativo e, por fim, de uma atenção toda especial do Poder
Legislativo, seja para criar um modus operandi para tal flexibilização, seja para
tipificar situações flexibilizadas de forma atípica.
Em um segundo momento, analisou-se a coisa julgada sob a ótica da segurança
jurídica, aferindo em que medida esse princípio deve ceder diante de situações
flagrantemente injustas. Investigou-se no que consiste tal instituto jurídico e sobre
o que incide, conferindo a qualidade de imutável. Desenvolvemos nossas ideias
sobre esse difícil tema, expondo a melhor doutrina e concluindo que a coisa julgada
constitui a situação jurídica caracterizada por imutabilizar a norma concreta
definida na parte dispositiva das decisões judiciais. Sobre o conteúdo da decisão
judicial incide a coisa julgada, não alcançando os seus efeitos, nem a sua eficácia,
em especial a sua eficácia executiva.
Destarte, os efeitos da decisão não são inabaláveis, ao revés, são passíveis de
alteração ou mesmo não serem produzidos. Igual tratamento pode ser dispensado à
eficácia, haja vista que tal capacidade de produzir efeitos não é imutável, havendo
incontáveis hipóteses em que é suprimida, obstada ou limitada.
Tais noções foram fundamentais para o adequado enfrentamento de temas
polêmicos, como a inexigibilidade de títulos executivos judiciais fundados em ato
normativo reconhecido como inconstitucional pelo STF.
07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
https://daniellixavierfreitas.jusbrasil.com.br/artigos/146506445/coisa-julgada-e-seguranca-juridica-flexibilizacao-e-eficacia-executiva-da-sentenca 29/47
Demonstrou-se que não viola a coisa julgada os dispositivos que suprimem a
exigibilidade do título executivo judicial em virtude de decisão posterior do STF,
pois a imutabilidade que lhe é inerente não incide sobre a eficácia executiva do
julgado, sendo possível identificar inúmeros exemplos no ordenamento brasileiro
que impedem a execução de decisões transitadas em julgado. Outrossim, foi
possível perceber que a decisão posterior do STF constitui evento de suma
relevância no ordenamento jurídico, ocorrida posteriormente à formação da coisa
julgada, impedindo qualquer cogitação a respeito de eventual ruptura com a sua
eficácia preclusiva.
Com essas considerações, delinearam-se as linhas mestras da nossa compreensão a
respeito do desafiador instituto processual que é a coisa julgada, na tentativa de
conferir soluções para as mais polêmicas questões que atualmente preocupam a
doutrina. Espera-se que esses apontamentos suscitem reflexões sob alguns pontos
de vista que ainda carecem de maior dedicação e aprofundamento em solo nacional.
BIBLIOGRAFIA
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07/02/2020 Coisa julgada e segurança jurídica: flexibilização e eficácia executiva da sentença
https://daniellixavierfreitas.jusbrasil.com.br/artigos/146506445/coisa-julgada-e-seguranca-juridica-flexibilizacao-e-eficacia-executiva-da-sentenca 30/47
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