Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Cultura Corpo e Desporto - CCD Mestrado em Gestão do Desporto – Turma 1 TECNOLOGIA Quais os limites do ser humano? Discentes: Docente: Gonçalo Tavares Camila Dalprá Machado Ritter Larissa de Freitas Azevedo Mariana Pereira Silva Vera Lúcia Emílio dos Reis Cruz Quebrada – Dafundo 17 de outubro de 2018 UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE MOTRICIDADE HUMANA i | P á g i n a Índice Introdução ............................................................................................................................. 1 1. A inovação tecnológica no desporto ............................................................................. 2 2. História e Inovação do Desporto Adaptado .................................................................. 7 2.1 A história do Desporto Adaptado .......................................................................... 7 2.1.1 Os jogos Surdolímpicos ................................................................................. 8 2.2 Desportos e Categorias Paralímpicos .................................................................... 9 2.2.1 Bicicletas ...................................................................................................... 10 2.2.2 Cadeiras de Rodas ....................................................................................... 11 2.2.3 Barcos .......................................................................................................... 12 2.2.4 Deficiências Visuais ..................................................................................... 12 2.2.5 Trenós, Skis e Snowboard ........................................................................... 13 2.3 Gerir o Treino do Desporto Adaptado - Testemunho ........................................ 13 3. As Próteses e a Sua Evolução ...................................................................................... 15 4. The Bionic Olympics ..................................................................................................... 18 4.1 A história da biónica ............................................................................................ 18 4.2 As Olimpíadas Biónicas ............................................................................................. 18 Conclusão ............................................................................................................................ 20 Referências ............................................................................................................................. i ii | P á g i n a Índice de imagens Figura 1 - Photo Finish........................................................................................................... 3 Figura 2 - Hawk-Eye (ténis) ................................................................................................... 3 Figura 3 - D-Tech ................................................................................................................... 3 Figura 4 - Video-Árbitro………………. ....................................................................................... 4 Figura 5 - Hawk-Eye (Futebol) ............................................................................................... 4 Figura 6 – Esgrima e Taekwondo .......................................................................................... 4 Figura 7 – Piscina………………………………………………………………………………………………………………4 Figura 8 - Natação Sincronizada ............................................................................................ 4 Figura 9 - Mike Burrell e Millie Knight................................................................................. 14 Figura 10 - Evolução das Próteses ....................................................................................... 17 file:///C:/Users/anahm/Desktop/da/CCD_Tecnologia_CamilaRitter_LarissaAzevedo_MarianaSilva_VeraReis.docx%23_Toc527544334 file:///C:/Users/anahm/Desktop/da/CCD_Tecnologia_CamilaRitter_LarissaAzevedo_MarianaSilva_VeraReis.docx%23_Toc527544337 Corpo, Cultura e Desporto 1 | P á g i n a Tecnologia – Quais os Limites do ser humano? Introdução Os envolvidos no tema tecnologia definem a mesma como um fenómeno que por si só é positivo, pois significa o desenvolvimento e progresso de uma sociedade tornando a vida do ser humano mais fácil, confortável e agradável (CARVALHO, 1997). Neste conceito, pode ser percebido o desenvolvimento da tecnologia desde os tempos mais remotos. No início da civilização, o homem utilizava fontes de matéria-prima da natureza (pedras, ossos, troncos de árvores) para desenvolver instrumentos que favorecessem a superação das fragilidades humanas até àquele dado momento. Em síntese, podemos notar que o avanço tecnológico transforma não apenas o comportamento do indivíduo, mas de todo um grupo social. O ser humano sempre procurou técnicas que fossem capaz de ajudá-lo na execução de suas atividades diárias, e, através da sua capacidade de raciocínio, obteve resultados satisfatórios nas suas invenções, dando origem ao processo gradual de transformação de tecnologias, alcançando patamares elevados de evolução. Será abordada a evolução do desporto face aos avanços tecnológicos, partindo de uma análise de evolução de funcionalidades tecnológicas utilizadas para a diminuição de erros nos resultados e aumento de performance, dados aos novos implementos utilizados pelos desportistas. De seguida, uma contextualização do desporto adaptado a pessoas com algum tipo de deficiência e das formas como cada desporto é adaptado a cada condição. Seguidamente temos a evolução tecnológica das próteses, a sua caracterização, utilização, benefícios e evolução. E por fim, a caracterização, inovação e evolução dos The Bionic Olympics. Corpo, Cultura e Desporto 2 | P á g i n a Tecnologia – Quais os Limites do ser humano? 1. A inovação tecnológica no desporto Quando se fala de desporto, é preciso compreender que a análise, contextualização e entendimento deste fenómeno tem diversificações, devido à dificuldade em afirmar a origem pontual do desporto. Segundo Stigger (2005), duas linhas de pensamento - continuidade e descontinuidade- tentam definir a origem deste fenómeno. A linha da continuidade passa pelo desporto ligado à prática de jogos primitivos em diversas culturas, segundo registos que remontam à prática desportiva por povos da antiguidade. Desta forma, o desporto, na sua essência, sempre existiu em todas as culturas tendo sido adaptado aos diferentes contextos. Em contrapartida, a linha da descontinuidade trata da origem do espaço temporal do desporto, ligado à história das sociedades modernas, onde a sua criação está diretamente relacionada com a industrialização, urbanização e desenvolvimento da ciência e tecnologia. Como podemos perceber, desde os tempos remotos, o ser humano já utilizava recursos tecnológicos. Desta forma, é perceptível o quanto as tecnologias se desenvolveram ao longo do tempo e, principalmente, nos últimos anos. Nos dias atuais, é notório o desenvolvimento do desporto face aos avanços e às inovações tecnológicas. O desporto tem sido um fenómeno mundialmente estudado, é transcrito, na atualidade, como dos principais fenómenos sociais e uma das maiores instituições do planeta (RUBIO, 2002). Um fenómeno complexo que movimenta os mais variados setores da sociedade. Observa-se que a evolução e o desenvolvimento do desporto contribuíram paraa difusão e percepção da sua importância, proporcionando assim, a magnitude que o desporto tem hoje em dia. Para Proni (1998), o desporto é considerado umas das “atividades económicas” com maior aumento a nível dos mercados globalizados, o que tem incitado a entrada de amplas corporações empresariais e tem solicitado métodos modernos de administração. Como a sociedade converteu o desporto num setor economicamente dinâmico e atrativo, o avanço tecnológico está cada vez mais dominante, dado o elevado consumo do desporto, seja na perspectiva do atleta, do espectador, do investidor, da espetacularização, entre outros. Como uma das grandes essências do desporto, a competitividade, seja do atleta com o seu adversário, de uma equipa para com a outra, ou até mesmo do atleta com ele mesmo (superação de seus próprios limites), faz com que a inovação tecnológica esteja em constante dinamismo e ajustes. Para minimizar erros de percepção (por parte de atletas e árbitros), de regras e situações que possam causar interferência na essência da competitividade, surgiram nos últimos tempos inúmeros instrumentos de verificação e monitorização de situações que ocorrem numa partida desportiva. Dentre eles, podemos destacar: ● ATLETISMO: Photo Finish (tornou-se oficial em 1968- México). Consiste numa câmara fotográfica que capta 10,000 fotogramas por segundo. A câmara regista e imprime a ordem de chegada Corpo, Cultura e Desporto 3 | P á g i n a Tecnologia – Quais os Limites do ser humano? exata, independentemente do facto de os atletas terminarem a sua corrida quase ao mesmo tempo. Desta forma é possivel evitar empates e resultados injustos. Figura 1 - Photo Finish (Fonte: Rio Replay: Women's 100m Final- 2016) ● TÉNIS: Hawk-Eye (olhos de falcão): Foi criado em 2005 e consiste num programa informático que capta, de diversos ângulos, a trajetória de vários objetos ou pessoas. As raquetes, feitas de fibra de carbono, também são mais leves e resistentes comparando com mais antigas. Figura 2 - Hawk-Eye (ténis) (Fonte: ISAT) ● VOLEIBOL: D-Tech (chip dentro da bola que envia informações para o árbitro). Com este sistema, também é possível verificar estatísticas como velocidade, número de toques, entre outros. O vídeo challenge, mais conhecido como “desafio”, é uma tecnologia de vídeo que permite verificar se o ponto foi marcado corretamente. Figura 3 - D-Tech Fonte: Liga Mundial 2017 ● FUTEBOL: Hawk-Eye (chip introduzido na bola) emite um alerta no relógio do árbitro, que informa se a bola atravessou ou não as linhas da baliza. Recentemente, tem sido utilizado, também, o Corpo, Cultura e Desporto 4 | P á g i n a Tecnologia – Quais os Limites do ser humano? Figura 6 – Esgrima e Taekwondo video-árbitro. Este consiste num árbitro assistente, que analisa as decisões tomadas pelo árbitro principal com a utilização de imagens de vídeo e de uns auscultadores que lhe permitem comunicar com o árbitro principal. Figura 4 - Video-Árbitro Figura 5 - Hawk-Eye (Futebol) (Fonte: UNIONRAYO) (Fonte: ESPN) ● TAEKWONDO e ESGRIMA: Nestes desportos, os atletas utilizam roupa e capacetes com sensores, que acusam se o golpe ocorreu de facto, ou não. No caso da esgrima, a espada também possui um sensor na ponta que, em conjunto com o fato, ajuda a perceber a efetividade do golpe. (Fonte: Tecnologia a serviço do esporte- Medium) ● NATAÇÃO: Nas extremidades da piscina, há sensores que, quando tocados pelo atleta, permitem perceber, exatamente, o momento em que o atleta termina a prova, fornecendo ainda, quando existam, os tempos intermédios exatos. Ainda na natação, também outros sistemas e tecnologias são utilizados, mas não para definir resultados. Por exemplo, na natação sincronizada, as atletas conseguem ouvir a música debaixo de água. Na maratona aquática, os atletas utilizam uma pulseira com um chip, permitindo ao árbitro acompanhar o percurso do atleta, ou até mesmo localizá- lo em caso de acidentes. Figura 7 - Piscina Figura 8 - Natação Sincronizada (Fonte: OFICINA DA NET) (Fonte: PISCINA LIMPA) https://pt.wikipedia.org/wiki/Bandeirinha https://pt.wikipedia.org/wiki/Replay Corpo, Cultura e Desporto 5 | P á g i n a Tecnologia – Quais os Limites do ser humano? Tratando-se do atleta, podemos destacar a evolução dos equipamentos e serviços disponíveis aos praticantes. De acordo com Camargo (2004), a ciência permite que se “crie” um atleta recordista, maximizando suas potencialidades físicas, ou seja, quando o homem desportivo chega ao limite de suas capacidades corporais, entra em campo a tecnologia dos equipamentos e serviços. Nestes podemos destacar: A bola incialmente era confeccionada de couro e bexiga de boi. Atualmente, é feita com materiais sintéticos que são criados a partir de polímeros, moléculas de produtos químicos. Desta forma, a bola tornou-se mais leve, resistente e à prova de água. As chuteiras, por sua vez, eram sapatos rústicos, feitos muitas vezes de madeira e com proteções de metal. Eram pesadas e absorviam água. Mais tarde foram acrescentas as travas, que não eram nada mais que pregos embutidos no calçado. Atualmente, as chuteiras são muito mais leves e feitas de materiais sintéticos. Elas são pensadas para proporcionar ao atleta tanto o maior conforto possível, quanto a melhoria de seu rendimento esportivo. O calçado em geral, ganhou amortecedores e design que previnem o aparecimento de lesões. As raquetes de ténis eram feitas de madeiras, depois em metal, e a partir da década de 80, passaram a ser fabricadas com grafite, titânio e carbono. Em 2013, a Head criou uma raquete de ténis à base de grafeno, com a promessa de revolucionar o equipamento, tornando-o mais leve e resistente. Tenistas do mais alto nível têm especialistas que estudam os seus movimentos e desempenho para, posteriormente, fabricar raquetes personalizadas a fim de melhorar ainda mais a sua performance. Os pisos desportivos também sofreram mudanças com as novas descobertas cientificas e os avanços tecnológicos. Atualmente, os pisos são fabricados com vista a absorver os impactos nos sistemas muscular, esquelético e articular dos atletas. Os relvados também ganharam sistema de amortecimento e drenagem. Atualmente é possível encontrar pisos feitos em placas modulares e desmontáveis. As roupas dos atletas, em diversos desportos, também passaram por grandes transformações ao longo do tempo. Atualmente são fabricadas visando a aerodinâmica, o conforto, leveza, absorção de suor, secagem rápida e, principalmente, o ganho de performance. Antes as roupas eram fabricadas em algodão (secagem lenta), depois com poliéster (pouca respiração), posteriormente, surgiu a poliamida (resistente a água e secagem lenta, com tecnologia antiodor, antibacteriana e proteção UV). Por fim, uma nova tecnologia foi aplicada à poliamida, dando origem à emana- raios infravermelhos e minerais bioativos (com os mesmos benefícios da poliamida, porém com ganhos fisiológicos: aumento da taxa de metabolismo e melhora da recuperação muscular; diminuição da fadiga). Relativamente aos fatos de banho de natação, por volta dos anos 1900, pesavam cerca de 5kg e, passados 73 anos, chegaram ao peso de 18 gramas. Na década de 2000, a federação internacional de natação, precisou de intervir e regulamentar os fatos de banho pois, com o avanço tecnológico resultando em super fatos Corpo, Cultura e Desporto 6 | P á g i n a Tecnologia – Quais os Limites do ser humano? de banho, eram os atletas com maiores recursos financeiros que ganhavam todas as competições (AMARAL, 2013). Ainda se podem destacar osavanços tecnológicos nas áreas da fisiologia, biomecânica, nutrição, psicologia, ergonomia, farmacologia e técnica/tática dos desportos, que por vezes influenciam nos ganhos de rendimento e performance (SILVA; PAULI; GOBATTO, 2011). Corpo, Cultura e Desporto 7 | P á g i n a Tecnologia – Quais os Limites do ser humano? 2. História e Inovação do Desporto Adaptado 2.1 A história do Desporto Adaptado Segundo Ian Brittain, em The Paralympic Games Explained, a história do desporto adaptado remonta ao início do século XX. As primeiras organizações voltadas para a promoção e adaptação do desporto a pessoas com alguma deficiência ou dificuldade, surgiram em Inglaterra, por volta dos anos 20 e 30. Existindo, no entanto, registos que demonstram que estas organizações podem ter aparecido ainda antes em Berlim. As primeiras organizações de desporto adaptado mencionadas pelo autor são a British Society of One-Armed Golfers, em 1932 e a ‘Disabled Drivers’ Motor Club, em 1922. Também na mesma altura, em 1924, foi fundado o Comité Internacional dos Desportos de Surdos, com apoio de algumas federações que já existiam com este mesmo objetivo. Nesse mesmo ano, ocorreram os primeiros “Jogos Silenciosos”, nos quais participaram nove países, ocorrendo hoje o evento de quatro em quatro anos, no ano que segue os jogos Olímpicos, quer a versão de verão, quer a de inverno. (Brittain, 2010) Aquando da segunda guerra mundial, surgiu o movimento considerado atualmente como o “Movimento Paralímpico Moderno”. A guerra, como era de esperar, causou inúmeros feridos, sobretudo com a perda de membros e lesões ao nível da coluna, que inicialmente eram vistos como “causas perdidas”. Os feridos tinham uma esperança de vida de dois anos, que se devia, não à lesão, mas ao próprio tratamento. No entanto, alguns avanços na medicina e mudanças impostas por Ludwig Guttmann nos tratamentos e no cuidado dos pacientes, permitiram aumentar a esperança de vida, levando a um segundo problema, a depressão. O desporto passou então a ser utilizado como meio de reabilitação, visto que vários estudos demonstraram ser uma forma de trazer uma sensação de aumentar a autoestima, mas também de mudar a forma como estas pessoas eram vistas pela sociedade. Aquilo que começou com o objetivo de reabilitação física e mental, rapidamente evoluiu para o desporto recreativo e, consequentemente, para o competitivo. Ludwig Guttmann, considerado o pai do Movimento Paralímpico, organizou então, em 1948, paralelamente aos jogos Olímpicos de Londres, um evento ao qual chamou de Stoke Mandeville Games. A competição destinava-se a atletas em cadeiras de rodas, tendo participado, em Tiro com Arco, vários homens e mulheres. Os Stoke Mandeville Games foram oficialmente fundados em 1952 e vieram mais tarde a originar os atuais Jogos Paralímpicos. Os primeiros Jogos Paralímpicos ocorreram oficialmente em Roma, Itália, nos quais tomaram parte 400 atletas de 23 países. Os Jogos Paralímpicos continuam, desde então, a ocorrer a cada 4 anos, imediatamente após o término dos Jogos Olímpicos de Verão e Inverno. É importante referir que os primeiros Jogos Paralímpicos de Inverno, surgiram apenas em 1976, na Suíça. Corpo, Cultura e Desporto 8 | P á g i n a Tecnologia – Quais os Limites do ser humano? No que toca a Portugal, a primeira participação nos Jogos Paralímpicos ocorreu em 1976 com os 11 atletas que compunham a equipa de basquetebol em cadeira de rodas. Após esta participação, deu- se a ausência de Portugal nos 3 ciclos seguintes (12 anos), tendo voltado a participar em 1984, anos no qual os Jogos Olímpicos se realizaram em Nova Iorque e os Paralímpicos em Stoke Mandeville, no Reino Unido. Apenas a partir de 1988, Seul, as duas competições passaram a ser realizadas na mesma cidade. Desde 1984 que Portugal participou em todas as 10 edições dos Jogos Paralímpico, até à última, no Rio de Janeiro em 2016. (Portugal, 2015) A participação de Portugal nos Jogos Paralímpicos conta também com resultados bastante positivos. Em 10 edições participaram 281 atletas, de 13 modalidades, que trouxeram para Portugal 92 medalhas (25 de Ouro, 30 de Prata e 37 de Bronze). A grande maioria das medalhas foram conquistadas no Atletismo (53) e na Boccia (26). No que toca aos jogos Surdolímpicos, Portugal participou já em 6 edições, tendo a primeira sido em 1993, em Sófia. Nestes jogos Portugal conquistou já 11 medalhas (5 de ouro, 3 de bronze e 3 de prata), tendo participado com um total de 65 atletas, em 10 modalidades diferentes. Apenas para concluir, um pouco da história dos Jogos Surdolímpicos que, como mencionado anteriormente, têm a sua origem dos “Jogos Silenciosos”, que decorreram pela primeira vez em 1924, em Paris. OS jogos passaram entretanto a ser chamados de “Jogos Mundiais para os Surdos”, sendo a designação atual “Jogos Surdolímpicos”, adotada apenas em 2001. A participação nestes jogos tem vindo a crescer a cada edição, sendo que na primeira, em Paris (1924), apenas 148 atletas de 9 países participaram, tendo participado apenas uma mulher. Nos últimos jogos participaram já 2873 atletas, de 86 países, em Samsun (2017). Os primeiros Jogos Surdolímpicos de Inverno, no entanto, decorreram apenas em 1949, em Seefeld, tendo participado apenas 33 atletas, de 5 países, todos do sexo masculino. A edição mais recente, em 2015, na Rússia, contou já com 336 atletas, de 26 países. A realização deste tipo de eventos, permite não só aos atletas paralímpicos demonstrar as suas capacidades e competir nos seus desportos de eleição, mas também mostrar que, mesmo com limitações físicas e/ou psicológicas, é possível praticar e competir em desporto. Aqui também se vê que o desporto pode e deve ser usado como uma ferramenta de integração e de reabilitação, quer ao nível físico, quer psicológico ou social, permitindo que pessoas debilitadas de alguma forma se sintam integradas e úteis, sendo estas, muitas vezes causas de depressão e desmotivação. 2.1.1 Os jogos Surdolímpicos Analisando, primeiro, os Jogos Surdolímpicos, quer de inverno, quer de verão, é importante perceber que as regras de cada desporto não são alteradas de nenhuma forma, contrariamente ao que acontece nos desportos Paralímpicos, em que as regras são alteradas em função da deficiência dos atletas. Corpo, Cultura e Desporto 9 | P á g i n a Tecnologia – Quais os Limites do ser humano? Sendo que a única limitação dos atletas surdos é, precisamente, o facto de não conseguirem ouvir, todas as regras são mantidas, exatamente como são, sendo as adaptações executadas a outros níveis. Nos desportos em que o árbitro, normalmente, usaria um apito, aqui passa a usar bandeiras, no atletismo, em vez do som de uma pistola, são usados luzes para sinalizar a partida. Sendo as diferenças tecnológicas, aqui, mais relacionadas com a comunicação entre os árbitros e os atletas, ou mesmo com o público, que em vez de bater palmas, abana as duas mãos no ar, tendo o gesto a mesma simbologia que um aplauso. Os Jogos Surdolímpicos de verão consistem da competição de atletas em 21 modalidades, sendo elas: Futebol, Golfe, Andebol, Judo, Karaté, Ciclismo de Montanha, Orientação, Tiro, Natação, Ténis de Mesa, Taekwondo, Ténis, Voleibol, Luta Livre, Lutas greco-romanas, Atletismo, Badmínton, Basquetebol, Voleibol de Praia, Bowling e Ciclismo de Estrada. Nos Jogos Surdolímpicos de inverno, por outro lado, existem atualmente apenas 5 desportos, Esqui Alpino, Esqui Cross-Country, Hóquei no Gelo, Snowboard e Curling. 2.2 Desportos e Categorias Paralímpicos No que toca aos desportos paralímpicos, os atletas são divididos em 9 categorias: • Paralisia muscular, para pessoas com limitação parcial do movimento dos músculos; • Movimento limitado passivo, para pessoas com movimento articular reduzido (artrites não se incluem nesta categoria); • Perda ou deficiênciade um membro, para pessoas com ausência total ou parcial de um membro devido a doença, trauma ou problemas genéticos; • Diferença de comprimento das pernas, para pessoas com problemas genéticos ou traumas que influenciaram o crescimento das pernas; • Baixa estatura, para pessoas com estatura baixa devido a ossos das pernas, tronco ou braços, derivados de variadas deficiências; • Hipertonia, para pessoas com rigidez excessiva dos músculos, devido a condições como: paralisia cerebral, outras lesões cerebrais ou esclerose múltipla; • Ataxia, para pessoas com falta de coordenação muscular dos movimentos, devido a condições como: paralisia cerebral, outras lesões cerebrais ou esclerose múltipla; • Atetose, para pessoas com movimentos descoordenados e desequilibrados, que têm dificuldades em manter uma postura normal, devido a condições como: paralisia cerebral, outras lesões cerebrais ou esclerose múltipla; • Deficiência visual, inclui pessoas, total e parcialmente cegas, desde que tenham uma visão suficientemente reduzida para serem consideradas legalmente como cegas; Corpo, Cultura e Desporto 10 | P á g i n a Tecnologia – Quais os Limites do ser humano? • Deficiência intelectual, para pessoas com capacidade intelectual reduzidas e limitações de comportamento, no entanto limita-se a atletas cujo diagnóstico tenha sido feito até aos 18 anos. Os desportos paralímpicos são então divididos em categorias e as categorias em classes. Em desportos como o basquete várias classes de atletas podem jogar em conjunto, desde que sejam respeitadas determinadas regras de composição das equipas. Noutros desportos, como é o caso do atletismo, os atletas competem exclusivamente com outros atletas da sua classe ou de classes compatíveis. Em todos os casos, no entanto, os atletas são sujeitos a avaliação médica e testes desportivos, de forma a serem distribuídos pelas classes existentes e serem atestados a competir em cada prova. No caso do futebol, por exemplo, existem duas provas, o futebol de 5 e o de 7. No futebol de 5, para deficiências visuais, ainda que exista um limite máximo de visão permitida aos atletas, todos devem jogar de olhos vendados, de forma a garantir que nenhuma equipa sai beneficiada. Neste caso, no entanto, o guarda-redes será um atleta sem qualquer problema de visão ou deficiência física. No futebol de 7, ainda que os atletas de todas as categorias joguem em conjunto, é preciso garantir que existe um número mínimo de atletas de cada categoria em campo. É importante perceber, portanto, que em algumas provas o desporto é apenas adaptado às limitações dos atletas, com a utilização de atletas guia para os cegos e certos níveis de deficiência visual, noutros a tecnologia e o avanço tecnológico visível nas últimas décadas, são um fator de extrema importância para a evolução, continuação e maior abrangência do desporto. No ciclismo, por exemplo, existem vários tipos de adaptações das bicicletas em função do atleta e da prova. Podem ser usadas bicicletas muito semelhantes às normais, apenas com uma adaptação do pedal para receber a prótese do atleta, outras permitem que o atleta se movimente apenas através do movimento de uma das pernas e outras ainda, são movidas através do trabalho dos braços. 2.2.1 Bicicletas Aprofundando o caso do ciclismo existem, portanto, 4 classes que utilizam equipamentos diferentes. A classe C1 a C5 que inclui atletas com paralisia cerebral, amputados ou em outras condições mas que estão habilitados a conduzir uma bicicleta regular, semelhante às usadas por atletas sem qualquer tipo de deficiência ou condição física. A categoria T1-T2 que inclui atletas com paralisia cerebral ou outras condições neurológicas e que não estão habilitados a conduzir uma bicicleta regular. Estes atletas, da categoria 3, competem num triciclo, com duas rodas atrás e uma à frente, que lhes conferem mais equilíbrio. A categoria B, para atletas com deficiência visual, que utilizam bicicletas tandem (bicicletas de duas pessoas), com um piloto que os guia durante a prova. É importante perceber que, no entanto, o piloto não deverá ser um ciclista profissional que tenha estado em atividade nos últimos 12 meses. Por fim, temos a categoria H1-h5, para atletas com limitações ao Corpo, Cultura e Desporto 11 | P á g i n a Tecnologia – Quais os Limites do ser humano? nível dos membros inferiores ou uma combinação de membros inferiores e superiores, que utilizam bicicletas movidas através da ação das mãos e dos braços. 2.2.2 Cadeiras de Rodas As cadeiras de rodas são diferentes para cada desporto, atualmente são 11 os desportos paralímpicos reconhecidos pelo comité internacional, em que são utilizadas cadeiras de rodas. São eles: atletismo, basquetebol em cadeira de rodas, Boccia, esgrima em cadeira de rodas, levantamento do peso, râguebi em cadeira de rodas, ténis de mesa em cadeira de rodas, ténis em cadeira de rodas, tiro, tiro com arco e Curling. No caso da Boccia, do Curling, do tiro, da esgrima e do ténis de mesa, não existe muita tecnologia na cadeira de rodas, visto que não se pretende que o atleta execute grandes deslocações. No caso do Curling, os atletas utilizam mesmo a sua própria cadeira pessoal, não tendo necessidade de investir em equipamento especializado. Na esgrima em cadeira de rodas, a cadeira é, inclusive, fixada numa plataforma no chão, obrigando a que os atletas se mantenham a uma certa distância. Relativamente ao ténis em cadeiras de rodas, um dos mais populares desportos de cadeiras de rodas, não são feitas quaisquer adaptações ao campo, raquete ou bolas. A única adaptação, tirando as cadeiras de rodas, é a introdução de uma regra em que, em vez de uma, a bola pode tocar duas vezes no chão, antes de ser batida pela atleta adversária. No râguebi, em que o atleta precisa de se mover de forma rápida, carregando a bola, a cadeira é adaptada ao desporto também. À frente e em ambas as laterais, existem proteções para evitar choques demasiado agressivos com outros jogadores e uns ganchos especiais que permitem prender os jogadores adversários. No caso de ambos, do râguebi e do ténis, bem como no basquete e no atletismo, a cadeira sofreu bastantes avanços e adaptações, relativamente à cadeira de rodas comum. Em vez de duas rodas laterais verticais, estas são inclinadas para dentro, permitindo um melhor acesso do atleta à mesma, para que consiga deslocar-se mais facilmente. Esta adaptação permite ainda que o atleta fique mais protegido no que toca a colisões com outros atletas, visto que é menos provável que fique com a mão entalada entre rodas. Esta adaptação permite também, associada às restantes, se seja alcançada uma maior velocidade de rotação e mudança de direção. Para desportos de velocidade, como a atletismo, a base da cadeira forma uma espécie de cruz, como um triciclo com duas rodas traseiras, maiores, e uma mais pequena à frente, ao centro. Estas cadeiras são mais leves e foram adaptadas e desenhadas de forma aerodinâmica, para permitir que sejam alcançadas maiores velocidades. O comprimento e largura da roda frontal varia também em função da prova, por exemplo, de provas de atletismo que envolvem cursos para aquelas em que o atleta se desloca em linha reta. Corpo, Cultura e Desporto 12 | P á g i n a Tecnologia – Quais os Limites do ser humano? Outro avanço no design das cadeiras de rodas para estes desportos foi, principalmente no caso do ténis, do basquetebol e do râguebi, a instalação de uma quinta roda, na parte traseira, que pretende impedir que a cadeira tombe durante o jogo. Desta forma, as cadeiras de rodas ficaram mais seguras para os atletas durante o jogo. 2.2.3 Barcos No remo e na canoagem foram, também, feitas algumas adaptações aos barcos para que os atletas com limitações físicas pudessem competir em segurança. Uma das principais diferenças, é a largura do barco, queé mais larga para permitir um maior conforto e estabilidade aos atletas. Para atletas sem mobilidade na parte inferior do corpo, podem ser usados flutuadores, um de cada lado do barco, para permitir manter o equilíbrio. Os encostos dos assentos sofrem também algumas alterações, para as competições individuais, o encosto é alto, para suporte das partes superior e inferior da coluna, em contrapartida, de forma a permitir um movimento mais livre do tronco, em duplas, o encosto é um pouco mais baixo. Para garantir uma maior segurança dos atletas, estes são fixados ao assento, através de tiras de velcro. Para finalizar e de forma a garantir uma maior justiça, os atletas cegos, ainda que não necessitem de barcos adaptados, devem competir de olhos vendados para impedir que a luz seja uma ajuda. Falando agora noutro tipo, de barcos, temos os barcos usados na vela. Neste desporto, os atletas são classificados em 4 categorias, sendo o barco e a competição adaptados em função da mesma. No caso das embarcações individuais, o barco é feito à medida do velejador, quer ao nível dos assentos quer dos equipamentos, conforme for a sua necessidade. Nos barcos para dois velejadores, os assentos são feitos por medida para cada um, com controlos elétricos que lhe permitem girar para a posição pretendida. Por fim, as embarcações para três atletas, são feitas de forma mais acessível, de forma a permitir uma maior mobilidade dos velejadores. Possuem assentos movíveis e barras para facilitar o movimento dos velejadores. 2.2.4 Deficiências Visuais Na generalidade dos desportos paralímpicos para cegos, como referido já no caso das bicicletas, existe um atleta piloto, que deve cumprir determinadas características, que guiará o atleta cego. Isto verifica-se também em desportos como o atletismo e o esqui alpino, no entanto, existe uma diferença no Biatlo, prova em que o atleta deve seguir um determinado percurso em esquis, tendo no final um alvo para o qual deve disparar com uma espingarda, antes de poderem concluir o percurso. No biatlo, os atletas cegos, utilizam um equipamento especial, que lhes permite localizar os alvos, sem os ver. Divididos em três categorias, conforme o seu nível de visão, apenas os atletas da categoria 1 são obrigados a esquiar com um guia (piloto), enquanto os restantes são livres de escolher se o fazem Corpo, Cultura e Desporto 13 | P á g i n a Tecnologia – Quais os Limites do ser humano? ou não. Estes atletas, não podendo perceber a localização dos alvos com os olhos, utilizam equipamentos que permitem localizar através da audição. A arma utilizada pelos atletas cegos é eletrónica, funciona através de um laser, não representando quais quer perigos para a assistência e para o próprio atleta. Os atletas disparam deitados, com headphones que emitem um som, que se vai tornando menos intervalado até estarem a apontar ao alvo. Conforme acertam ou não no alvo, ouvem um sinal sonoro que lhes transmite a informação, enquanto para o público o resultado é dado através de luzes verdes ou vermelhas no alvo. Fora esta diferença tecnológica, ao nível dos disparos, o Biatlo para atletas cegos é semelhante ao Biatlo praticado por atletas sem qualquer deficiência. 2.2.5 Trenós, Skis e Snowboard Atualmente, apenas um desporto de inverno utiliza o trenó. O Hóquei no gelo, paralímpico, é bastante semelhante ao normal, com a diferença de que os jogadores estão em trenós, praticamente deitados, e utilizam dois tacos, em vez de apenas um. Estes trenós são assentes sobre lâminas, devendo o disco conseguir passar por baixo dos mesmos. Também os tacos têm uma ligeira alteração, que permitem ao jogador manusear o disco com mais facilidade com uma das pontas, usando a outra ponta para se deslocarem no gelo. A construção do trenó obedece inúmeras regras de altura, comprimento e materiais, devendo permitir total mobilidade dentro do campo ao jogador. Os esquis, por outro lado, são usados no Esqui Alpino, Cross Country e no biatlo. A maior adaptação feita aos esquis para os atletas paralímpicos está relacionada com os atletas sem mobilidade ao nível dos meios inferiores. Atualmente, o grande problema com estes esquis é que são ou bastante ágeis ou bastante estáveis, mas não possuem ambas as características. O esquiador consegue mais agilidade ou mais estabilidade conforme coloque as suas pernas sobre ou assento ou as deixe em suspensão. O local onde o atleta se senta, fica assente sobre dois esquis, que lhe permitem deslizar. Ainda que, atualmente, estejam a ser desenvolvidos novos “esquis sentados” que confiram melhor conforto e agilidade aos atletas, existem já registos de esquiadores que conseguiram alcáçar algumas acrobacias, incluindo mortais (Cambalhotas em voo), nestes aparelhos. Por fim, recentemente passou a existir também o snowboard adaptado, em que os atletas usam pranchas ligeiramente alteradas. As pranchas são adaptadas para permitir a utilização de cada atleta, por exemplo, através de diferentes encaixes para diferentes próteses. 2.3 Gerir o Treino do Desporto Adaptado - Testemunho Para permitir o treino adequado a atletas com dificuldades seja ao nível da audição, visão, motoras ou neurológicas, os clubes e espaços têm de ser adaptados. Não só porque por vezes os Corpo, Cultura e Desporto 14 | P á g i n a Tecnologia – Quais os Limites do ser humano? campos, por vezes, têm medidas e/ou características diferentes, mas também porque os treinadores necessitam de formação especial direcionada para o traino destes atletas. Deste modo, tem de existir um investimento em equipamento e em adequação dos espaços por parte dos clubes, quer ao nível de acessos e de infraestruturas, quer ao nível da própria organização do clube e da sua logística, de forma a poder acomodar, em alguns casos, atletas com e sem deficiências ou limitações. De forma a tentar-mos ter uma melhor ideia do que é lidar com estes atletas, contactamos um treinador que trabalha de perto com atletas paralímpicos que competem pela seleção do Reino Unido. Este treinador, Mike Burrell, é preparador físico de vários atletas com diversas limitações. Quando lhe perguntamos se havia um grande trabalho de preparação mental com estes atletas, explicou que a grande maioria já nasceu com as limitações que os tornam para-atletas e, portanto, já sabem lidar bastante bem com as suas dificuldades. Quanto aos atletas que sofreram lesões numa fase mais avançada, geralmente por terem escolhido praticar e treinar um desporto, já significa que estão, também a lidar bem, ou a aprender a lidar com a sua “nova condição.” Relativamente a questões financeiras, foi-nos dito que, como em qualquer desporto, existem mais facilidade para alguns atletas que para outros. Enquanto alguns precisam de investir apenas no treino e no equipamento regular, outros têm um investimento maior em cadeiras de rodas, skis ou outro tipo de equipamento adaptado. Falou-nos, especificamente, de uma das suas atletas, Millie Knight, esquiadora, campeã do mundo de Downhill em 2017 e, mais recentemente, nos jogos Paralímpicos de Inverno de Pyeongchang (2018), foi medalha de prata em Downhill e Super-G. A Millie, por obter estes resultados e por ser já bastante conhecida no seu desporto, não tem problemas de financiamento, geralmente tem patrocinadores que lhe pagam o equipamento (neste caso os skis), ou consegue o financiamento através de ações de angariação de fundos. Esta atleta consegue ainda ser paga por fazer discursos em escolas e eventos, o que ajuda bastante com as suas despesas de competição. Por outro lado, um outro atleta de Râguebi em cadeira de rodas, por ser um desporto menos conhecido e com menos divulgação, tem bastante dificuldade em financiar a sua prática desportiva, o que o leva a passar por dificuldades financeiras. Por fim, quando questionado sobre as adaptações que são necessárias realizaraos métodos de treino, equipamentos do ginásio e exercícios, respondeu que é necessária apenas alguma imaginação. Não são necessários equipamentos especiais nem grandes adaptações, apenas alguma criatividade para adaptar os exercícios e bastante força de vontade por parte dos atletas. Figura 9 - Mike Burrell e Millie Knight (Fonte: Instagram) Corpo, Cultura e Desporto 15 | P á g i n a Tecnologia – Quais os Limites do ser humano? 3. As Próteses e a Sua Evolução O uso das próteses em pessoas com deficiência é mais antigo do que imaginamos. O primeiro registo foi feito na Índia Antiga, onde uma guerreira usou uma prótese de ferro para uma das suas pernas, para voltar à guerra. Enquanto isso, no Egito Antigo, a primeira prótese ortopédica terá sido encontrada numa múmia, acredita-se que antes de mumificação, para substituir o pé direito, em que o polegar era feito de madeira e a junção era feita com tiras de couro, ou seja, simulando as articulações que funcionavam como uma dobradiça. O uso de madeira e tiras de couro continuou durante a Grécia Antiga. Hipócrates (460 – 370 a.C.) - precursor da medicina, desenvolveu órteses com o objetivo de melhorar as fraturas na tíbia. Eram formadas por elásticos, argolas de couro e madeira, fazendo com que a órtese fosse tensionada, sendo presa no tornozelo e na altura abaixo do joelho. Há relatos de outros tipos de próteses na Roma Antiga, feitas de ferro, encontradas na região da Cápua, na Itália. Durante a Idade Média, não existiram avanços no desenvolvimentos das próteses, já que os conhecimentos dos gregos e dos romanos deixaram de ser explorados. O ferro era predominante, ainda nessa época, tendo em conta que o próprio responsável por produzir as armaduras também, muitas vezes, era o responsável por confeccionar as próteses. Eram pesadas e, na maioria dos casos, desconfortáveis, chegando a magoar. O maior destaque nessa época está relacionado com o início da utilização das pernas de pau e das próteses para os membros superiores. A primeira prótese articular desenvolvida pelo holandês Pieter Verduyn, em 1696, destinava-se aos membros inferiores e era composta por um pé de madeira, couro para sustentar o peso e um tipo de espartilho com dobradiças. Já o inglês James Pott, em 1800, também desenvolveu uma prótese articulada, porém, era uma chapa de madeira com encaixe para a coxa. A articulação do joelho era feita de aço e havia o uso de fibra animal para unir o joelho com o tornozelo, desta forma, era possível ter o movimento coordenado ao estender e flexionar os joelhos. Em 1863, Dubois D. Parmelee, responsável por patentear a primeira prótese que era presa por pressão e o encaixe era realizado por sucção, ou seja, o uso de espartilhos já não era necessário. A tecnologia utilizada por Dubois permanece até os dias de hoje, sendo desenvolvida ao longo desses anos. Diversos membros personalizados foram desenvolvidos ao longo dos séculos com diferentes materiais como o ferro, madeira, couro. A evolução partiu de membros estáticos até membros que possuíam articulações utilizando molas e engrenagens, por exemplo. Nas olimpíadas de 1904, nos Estados Unidos, George Eyser, atleta alemão que competiu pelo país americano, utilizou uma prótese de madeira na perna direita durante os jogos. George conquistou seis medalhas, sendo três delas de ouro, na ginástica. Oito anos depois, em 1912, o piloto inglês Marcel Corpo, Cultura e Desporto 16 | P á g i n a Tecnologia – Quais os Limites do ser humano? Desoutter, com a ajuda do seu irmão Charles, que era engenheiro, produziu a considerada primeira prótese de alumínio, tendo menos 1,5kg que as anteriores. Com o objetivo de ter uma maior inserção social e de reabilitação para as pessoas que não possuíam um dos membros, em meados do século XX houve a iniciativa de pessoas com membros a menos a praticarem o desporto. Nessa altura, o mundo vivia em guerra e, como consequência disso, inúmeros soldados voltaram amputados ou paraplégicos. Devido a esse cenário, com a proposta de minimizar os traumas e melhorar a ocupação pós- guerra, um grupo de soldados americanos, que voltaram debilitados, criaram uma equipa de basquete para com pessoas com deficiência. O avanço das tecnologias começa a ser percebido com a descoberta do poliuretano. Desta forma, certos polímeros já começam a ser explorados. A Northrop Aviation, em 1955, desenvolveu uma prótese com resina termoendurecível, denominada de “syme”. O pé era confeccionado de borracha. Na Universidade da Califórnia, usando como inspiração a criação de Verduyn, desenvolveu-se uma prótese onde a suspensão da prótese é realizada por uma correia presa na coxa. Na Alemanha, no final da década de 60, as próteses foram produzidas com uma meia, facilitando os encaixes para pessoas que tinham a amputação um pouco abaixo do joelho. A parte interna da prótese era flexível e revestida com EVA para dar um maior conforto aos usuários. A sustentação da mesma era por pressão, sem a necessidade de elementos extras. A segurança de uso dependia diretamente do conforto do encaixe. Também na Alemanha, a empresa OttoBock desenvolveu próteses parecidas com a perna humana, formadas por peças tubulares e revestidas de espuma de plástico. Os problemas de conforto e sustentação desapareceram na década de 80, quando chegaram as próteses de silicone. A utilização desse material minimizou o custo, facilitando o uso, diminuindo a rigidez e o incômodo. Com materiais mais novos e uma tecnologia mais avançada, as próteses foram melhorando de forma gradual ao longo dos anos. Portanto, há um primeiro destaque para a década de 90, onde Van Phillips, especialista em próteses desenvolveu novos equipamentos de fibra de carbono. Já nos anos 2000, ocorre a criação de uma prótese inspirada na pata da chita, também feita de fibra de carbono, com uma tecnologia de absorção de energia. O atleta Oscar Pistorius utilizou a sua Flex-Foot Cheetah durante as olimpíadas de Pequim, em 2008, na China. O modelo terá sido considerado mais eficiente que o pé humano. Com o avanço da tecnologia, o desenvolvimento em forma industrial das prótese teve um crescimento significativo. Ocorreu a criação do exoesqueleto, um tipo de prótese que auxilia pessoas que têm dificuldade motora. A utilização das impressoras 3D abriu caminhos para próteses Corpo, Cultura e Desporto 17 | P á g i n a Tecnologia – Quais os Limites do ser humano? personalizadas, com temas e cores distintas, e também com encaixes perfeitos para os seus utilizadores. Apesar de todas as facilidades devido ao desenvolvimento tecnológico, decorrem ainda estudos para o desenvolvimento de prótese com um preço mais acessível. Segundo uma notícia do Globo Esporte, em 2012, o atletas paralímpicos estão a ter uma evolução maior que os atletas olímpicos. Em 2064, os atletas amputados já deverão ter ultrapassado os atletas com seus membros íntegros, tendo conta a evolução das tecnologias com as próteses. Hoje, as próteses são feitas de fibra de carbono e pesam menos de 3kgs. Figura 10 - Evolução das Próteses (Fonte: Elaboração Própria) Corpo, Cultura e Desporto 18 | P á g i n a Tecnologia – Quais os Limites do ser humano? 4. The Bionic Olympics 4.1 A história da biónica A biónica surge quando há aplicação de conhecimentos de Biologia para resolver problemas relacionados com o design e engenharia. São recolhidos dados para resolver problemas que possam surgir a nível técnicos, tanto sobre objetos como sobre estruturas. Existe assim uma investigação pormenorizada das estruturas e soluções orgânicas aplicadas pela natureza aos seus elementos. Tudo começou na década de 40, durante a Segunda Guerra Mundial, quando começou a ser usada para fins científicos e práticos, como técnica sistemática. Em 1947, surgiu a primeira conferência “Máquinae Organismo”, onde o médico e filósofo Francês Georges Canguilhem demostrou que o estudo dos organismos era indispensável para desenvolver máquinas eficientes. Começaram a surgir laboratórios por todo o mundo, nomeadamente, nos países mais desenvolvidos. Onde era realizada uma pesquisa constante sobre esta poderosa solução da natureza. Hoje utilizada na engenharia aeroespacial e na medicina de próteses e transplantes, cibernética, projeto de produto (biodesign) e arquiteta. 4.2 As Olimpíadas Biónicas Invenções com a extensão do antebraço com o punho cerrado, Canoa Monóxila, Machado de Pedra, abrigos construídos com galhos e folhas trançadas surgiram durante a evolução dos primórdios o que demostra a capacidade que o homem teve desde muito cedo para encontrar soluções baseadas nas sugestões oferecidas pelo seu meio ambiente natural. Um exemplo de aplicação da biónica é o velcro, que se baseia no carrapicho. Também certas folhas e as asas do avião baseadas nas dos pássaros. A ideia surgiu de um professor de Sistemas Motrizes Sensoriais da Escola Politécnica Federal de Zurique, a ETHAs, Robert Riner. Cybathlon são competições internacionais para atletas deficientes em cadeiras de rodas autopropulsionadas com uso de tecnologias biónicas e dispositivos hi-tech, como por exemplo exosqueletos e neuro-controladores, os verdadeiros “ciborgues da vida real” . A ideia é que os atletas mostrem como conseguem desempenhar tarefas do dia-a-dia. Tanto os participantes como quem desenvolveu a ideia recebem medalhas consoante as classificações, não existindo qualquer limite para o tipo de tecnologia utilizada. A ideia é acabar com os entraves entre os pacientes, sociedade e comunidade científica. Tecnologias que já foram banidas nas paraolimpíadas podem ser utilizadas nesta competição impulsionando o desenvolvimento da mesma. A primeira concentração nas Olimpíadas realizou-se no dia 8 Outubro de 2016 na Suíça, Zurique, organizada pelo centro nacional Suíço de pesquisa robótica (NCCR). Apesar de ser o primeiro evento a Corpo, Cultura e Desporto 19 | P á g i n a Tecnologia – Quais os Limites do ser humano? nível internacional já existia previsão para que nos próximos anos seja realizado. Há previsões que o próximo local seja no Reino Unido. Pela primeira vez na história, serão realizadas competições apenas com recurso a tecnologias que interferem na performance do atleta. O objetivo é que comece a existir um maior interesse pela tecnologia aliada ao corpo humano. Fizeram parte destas olimpíadas 74 atletas de 25 países. O país com maior número de participantes foi a Rússia, contabilizando 3 equipas que competiram em 5 categorias distintas. Existem 6 modalidades: ciclismo. Corrida em cadeira de rodas hight-tech, corrida em exoesqueleto, corrida com a perna proteica, corrida de avatares através do uso de interface cérebro- máquina. Todas estas são disputadas por atletas que esteja totalmente paralisados, do pescoço para baixo. Corpo, Cultura e Desporto 20 | P á g i n a Tecnologia – Quais os Limites do ser humano? Conclusão Os grandes resultados dos atletas nos dias de hoje devem-se muito pela combinação perfeita da tecnologia com o desporto. Além de toda a parte no avanço de materiais, podemos identificar avanço tecnológico nas seguintes áreas: ferramentas de treino, experiências das arenas e assistência aos árbitros. Desta forma, conclui-se que a tecnologia e o desporto têm caminhado cada vez mais juntos em prol de um desenvolvimento benéfico, tanto para o atleta, quanto para o espectador, ou seja, permite que ocorra uma evolução nas metas e objetivos dos praticantes, desafiando os seus limites e, como consequência, uma maior interação por meio do próprio público. Apesar desse lado positivo, em certos aspetos, a tecnologia pode “robotizar” muito a prática desportiva, já que todos os movimentos e jogadas estão a ser observados e calculados. Até que ponto a prática do desporto, com influência tecnológica, continuará a ser humana? Corpo, Cultura e Desporto i | P á g i n a Tecnologia – Quais os Limites do ser humano? Referências (s.d.). Obtido em 12 de OUTUBRO de 2018, de UNIONRAYO: https://www.unionrayo.es/el-var-estara- la-proxima-temporada-en-primera-y-no-en-segunda/var-arbitro/ (s.d.). Obtido em 12 de outubro de 2018, de ESPN: http://www.espn.com.br/video/719334_destaque- no-chipre-belga-igor-de-camargo-fala-sobre-boa-fase-no-apoel-e-champions A Esperança Biónica. (s.d.). Obtido em 14 de outubro de 2018, de Super Abril: https://super.abril.com.br/ciencia/a-esperanca-bionica/ About Boccia. (s.d.). Obtido em 15 de outubro de 2018, de Bisfed: http://www.bisfed.com/about- boccia/ Adaptative Rowing Equipment. (s.d.). Obtido em 16 de outubro de 2018, de Dezeen: https://www.google.pt/amp/s/www.dezeen.com/2012/08/31/paralympic-design-adaptive- rowing-equipment/amp/ Amaral, A. F. (2013). Dois lados da Química nos esportes. Basketball Wheelchairs Adapted for Atheltics. (s.d.). Obtido em 16 de outubro de 2018, de Miami Heat Wheels: http://www.miamiheatwheels.com/basketball-wheelchairs-adapted-for-athletics/ Brittain, I. (2010). The Paralympic Games Explained . Burrell, M. (13 de Outubro de 2018). Treinador. (V. Reis, Entrevistador) Camargo, V. T. (2004). Ciência e tecnologia nos jogos olímpicos (Vol. 56). São Paulo. Carvalho, M. G. (julho de 1997). Tecnologia, desenvolvimento social e educação tecnológica. Revista Educação & Tecnologia. Como Funciona o Desafio Eletrónico no Ténis. (s.d.). Obtido em 12 de outubro de 2018, de ISA Ténis: https://www.isatenis.com/como-funciona-o-desafio-eletronico-no-tenis/ Curling. (s.d.). Obtido em 15 de outubro de 2018, de Disabled Port USA: https://www.disabledsportsusa.org/sport/curling/ Facha-Lab. (s.d.). Obtido em 12 de outubro de 2018, de Medium: https://medium.com/facha-lab/a- tecnologia-a-servi%C3%A7o-do-esporte-a59ce73c8805 i online. (s.d.). Obtido em Outubro de 2018, de Sapo: https://ionline.sapo.pt/411969 LIGA MUNDIAL 2017. (s.d.). Obtido em 12 de outubro de 2018, de https://www.youtube.com/watch?v=7wwyVHpj1Q0&t=4605s Mao Bionica Feita por Estudantes. (s.d.). Obtido em 14 de ourubro de 2018, de CM Jornal: http://www.cmjornal.pt/portugal/detalhe/mao_bionica_feita_por_estudantes?v=cb Corpo, Cultura e Desporto ii | P á g i n a Tecnologia – Quais os Limites do ser humano? Nado Sincronizado. (s.d.). Obtido em 13 de outubro de 2018, de Piscina Limpa: https://piscinalimpa.wordpress.com/tag/nado-sincronizado/ Paralympic Sailing Equipment. (s.d.). Obtido em 16 de outubro de 2018, de Dezeen: https://www.google.pt/amp/s/www.dezeen.com/2012/09/04/paralympic-sailing- equipment/amp/ Portugal, C. P. (2015). Histórico de Medalhas e Modalidades Paralímpicas. Proni, M. W. (1998). Marketing e organização esportiva: elementos para uma história recente do esporte-espetáculo (Vol. 1). Campinas: Conexões. RIO REPLAY: Women's 100m Final. (2016). Obtido em 12 de outubro de 2018, de https://www.youtube.com/watch?v=Y_Y7UCq_e3s&pbjreload=10 Rubio, K. (2002). Do olimpo ao pós-olimpismo: elementos para uma reflexão sobre o esporte atual. Revista Paulista de Educação Física. Shooting. (s.d.). Obtido em 2018, de Paralympic: https://m.paralympic.org/shooting/about SILVA, A. D. (2011). Fisiologia aplicada ao rendimento esportivo: bases científicas do treinamento de alta performance. Revista Digital. STIGGER, M. (2005). Educação Física, esporte e diversidade. Campinas: Autores Associados. Suiça Olímpiadas Biónicas. (s.d.). Obtido em Outubro de 2018, de Sputnik News: https://br.sputniknews.com/ciencia_tecnologia/201610086515535-suica-olimpiadas- bionicas-video/ Table Tennis. (s.d.). Obtido em 15 de outubro de 2018, de Paralympic: https://m.paralympic.org/table- tennis/classification Tecnologia e Erros em Competições. (s.d.). Obtido em 13 de outubro de 2018, de Oficina da Net: ttps://www.oficinadanet.com.br/post/17009-como-a-tecnologia-vem-ajudando-a-diminuir-erros-em-competicoes-esportivas What is sit ski and how does it work. (s.d.). Obtido em 15 de outubro de 2018, de Outside Online: https://www.outsideonline.com/1784376/what-sit-ski-and-how-does-it-work Wheelchair Fencing. (s.d.). Obtido em 16 de outubro de 2018, de Parasport: https://parasport.org.uk/play-sport/sports-a-z/wheelchair-fencing Wheelchair Technology in the Paralympics. (s.d.). Obtido em 16 de outubro de 2018, de The Conversation: https://www.google.pt/amp/s/theconversation.com/amp/wheelchair- technology-in-the-paralympics-and-its-spin-offs-8924 Wheelchair Tennis. (s.d.). Obtido em 15 de outubro de 2018, de Paralympic: https://m.paralympic.org/wheelchair-tennis ANEXO I
Compartilhar