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UNIVERSIDADE SÃO JUDAS TADEU Programa de Pós-Graduação Stricto-Sensu em Educação Física CAPOEIRA NA ESCOLA: ANÁLISE E REFLEXÕES ACERCA DE SUA LEGITIMAÇÃO NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA DAS ESCOLAS ESTADUAIS DA DIREC 13 – JEQUIÉ-BAHIA GIULIANO PABLO ALMEIDA MENDONÇA SÃO PAULO 2013 UNIVERSIDADE SÃO JUDAS TADEU Programa de Pós-Graduação Stricto-Sensu em Educação Física CAPOEIRA NA ESCOLA: ANÁLISE E REFLEXÕES ACERCA DE SUA LEGITIMAÇÃO NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA DAS ESCOLAS ESTADUAIS DA DIREC 13 – JEQUIÉ-BAHIA GIULIANO PABLO ALMEIDA MENDONÇA Dissertação apresentada à Banca Examinadora do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu/ Mestrado em Educação Física da Universidade São Judas Tadeu, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Educação Física, sob orientação da Profª Drª Eliana de Toledo. SÃO PAULO 2013 Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca da Universidade São Judas Tadeu Bibliotecário: Ricardo de Lima - CRB 8/7464 Mendonça, Giuliano Pablo Almeida M539c Capoeira na escola: análise e reflexões acerca de sua legitimação nas aulas de Educação Física das escolas estaduais da Direc 13- Jequié-Bahia / Giuliano Pablo Almeida Mendonça. - São Paulo, 2013. 164 f. : il. ; 30 cm. Orientador: Eliana de Toledo Ishibashi. Dissertação (mestrado) – Universidade São Judas Tadeu, São Paulo, 2013. 1. Capoeira. 2. Educação física escolar. I. Ishibashi, Eliana de Toledo. II. Universidade São Judas Tadeu, Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação Física. III. Título CDD 22 – 796 GIULIANO PABLO ALMEIDA MENDONÇA CAPOEIRA NA ESCOLA: ANÁLISE E REFLEXÕES ACERCA DE SUA LEGITIMAÇÃO NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA DAS ESCOLAS ESTADUAIS DA DIREC 13 – JEQUIÉ-BAHIA Dissertação de Mestrado apresentada a USJT – Universidade São Judas Tadeu, como requisito parcial à obtenção do grau de Mestre em Educação Física, sob a orientação da Professora Doutora Eliana de Toledo. Banca examinadora ___________________________________________ Titular – Profª Drª Eliana de Toledo (orientadora) Universidade São Judas Tadeu – SP ____________________________________________ Titular – Profª Drª Paula Cristina da Costa Silva Universidade Federal do Espírito Santo – ES _____________________________________________ Titular – Profª Drª Maria Luiza de Jesus Miranda Universidade São Judas Tadeu – SP SÃO PAULO 2013 AGRADECIMENTOS A Deus, por me dar força e me carregar nos braços nos momentos de fraqueza; A meu bom São Judas, por, quando tudo parecia impossível, abrir algum caminho para resolução; A meus pais, Mendonça e Neyde, por sempre me incentivarem a ir adiante, a me encorajarem para esse enorme desafio e sempre dizer “vai lá meu filho, tudo vai dar certo”; A Mary, minha parceira, minha companheira, minha mais que amiga, que entendeu os momentos de stress e de ausência. Saiba que se não fosse por você, nada disso teria acontecido. A meu irmão Giorgione, com nossos demorados telefonemas, dando força um ao outro quando estávamos longe de casa; A minha querida orientadora, Profª Drª Eliana de Toledo, que sempre acreditou em mim e me auxiliou nos momentos de dúvidas. Obrigado por me (des) orientar, em me fazer pensar e, sobretudo, escrever o que pensava; A Profª Drª Paula Cristina da Costa Silva, por sua disponibilidade e contribuições para a melhoria dessa pesquisa; A Profª Drª Maria Luiza de Jesus Miranda, minha madrinha na São Judas, aquela que puxou pelo braço e disse, “vamos ,Baiano!”; Aos Professores Graciele Massoli, Sheila Aparecida e Érico Caperuto, por tanto me ajudarem tanto nas aulas, quanto no bate-papos informais; A Ray, uma das pessoas mais especiais que já conheci na minha vida, ela que é considerada com a segunda mãe de Mary, posso dizer Ray, que você ganhou também mais um filho, e sou muito agradecido por me considerar assim. A minha “família” de São Paulo, Roque, Isabel, Anderson e Cristina, que me acolheram com especial cuidado. Profissionalmente falando, tenho que agradecer a algumas pessoas, talvez elas não saibam, mas tem uma parcela de contribuição imensa na minha vida, Sonia da Guarda, Marcelo Lomanto, Samara Macedo, Valdemir Dias e José Alberto Pereira, hoje me considero um educador pelos exemplos e auxílios que me deram ao longo do tempo; A meu amigo-irmão Hegel, pela parceria de longos anos; Ao Mestre Alfredo, pelas nossas longas conversas, eu na minha ousadia querendo discutir Capoeira com uma pessoa que respira dia a dia essa manifestação; Aos meus mais que colegas, com o passar do tempo, transformaram-se em verdadeiros amigos, Luciana Giannocoro, Osmar Júnior, Cossote e Daniel Bocchini, uma amizade que mesmo com a distância, nunca se apagará; Aos demais colegas e funcionários da São Judas; Aos meus amigos da Bahia; A família Pio XII e Vicenzo Gasbarre; Aos colegas professores que se dispuseram a responder o questionário e contribuir com a pesquisa; Enfim, a todos que, direta e indiretamente, participaram em algum momento da minha vida. A todos, meus mais sinceros agradecimentos! RESUMO Nos últimos anos, a Capoeira tem tido uma ascensão no que se refere ao seu estudo e divulgação na sociedade como um todo. É crescente o movimento que busca valorizar essa manifestação cultural Afro-brasileira, especialmente no ambiente escolar, como evidenciam inúmeros estudos e documentos oficiais que sinalizam essa possibilidade. Mas, mesmo com esse processo de valorização dessa manifestação cultural, percebemos que o tema Capoeira ainda não é desenvolvido de forma maciça na escola. Sendo assim, o presente estudo tem como objetivo investigar se a Capoeira está sendo abordada nas aulas de Educação Física na região da DIREC 13, e caso não esteja (nossa hipótese mediante imersão nesta realidade), compreender e analisar os motivos pelos quais isso ocorre, a partir do discurso dos professores. Paralelo a esse objetivo principal, buscaremos também, por meio destes discursos, relacionar estes motivos às fases historicamente vividas pela Capoeira, apontando rupturas e permanências neste processo de legitimação da Capoeira no ambiente escolar. Neste contexto, a presente pesquisa se justifica por ser mais um estudo acadêmico que vem a abordar esta temática, somando-se a outras que temos em nível nacional, e que visam colaborar para a defesa do ensino da Capoeira nas aulas de Educação Física escolar. Outra justificativa que parece pertinente é fomentar o debate acerca de uma tensão existente nesta área no Estado da Bahia, pois embora esta manifestação da cultura corporal seja valorizada fora dos “muros escolares” nesta região, sendo tratada em academias, nas ruas, filmes, novelas, propagandas, livros, etc; seu espaço parece ainda não estar sendo valorizado no contexto escolar. O método utilizado para essa pesquisa foi o descritivo de cunho qualitativo, utilizando-se como instrumento a aplicação de questionários, contemplando uma amostra de 47 professores que lecionam a disciplina Educação Física nas escolas estaduais da região abrangidas pela (DIREC 13) Jequié-BA. Cerca de 53% desta amostra respondeu aos questionários, e a partir da análise de Bardin (1977), foi possível algumas interpretações. Concluímos que todos os professores participantes são licenciados em Educação Física e quase todos tiveram a disciplina Capoeira na graduação. A maioria também fez cursos de especialização e o curso promovido pela Secretaria de Educação do Estado sobre a Capoeira. Todos eles consideram importantedesenvolver o tema Capoeira em suas aulas (por motivos culturais, históricos e de desenvolvimento motor), apesar de 18, dos 25 professores de fato a desenvolverem em suas aulas. Outro dado a destacar é que 78% dos professores entendem a Capoeira como um tema multifacetado, o que se constitui como uma facilidade para aborda-la nas aulas de Educação Física. No que diz respeito às dificuldades encontradas para se desenvolver a Capoeira, o argumento da falta de material também apareceu, somado às mais diversas formas de preconceito, principalmente a religiosa, evidenciando que teremos que lidar com um novo tipo de preconceito para desenvolver este tema: a intolerância religiosa. Palavras-chave: Capoeira; Educação Física Escolar; História da Capoeira. ABSTRACT In recent years, Capoeira has been a rise in relation to its study and dissemination in society as a whole. A growing movement that seeks to valorize this African-Brazilian cultural manifestation, especially in the school environment, as evidenced by numerous studies and official documents indicate that possibility. But even with this valuation process this cultural manifestation, realize that the issue is not yet developed Capoeira massively in school. Thus, this study aims to investigate whether Capoeira is being addressed in physical education classes in the region of DIREC 13, and if not (our hypothesis by immersion in this reality), understand and analyze the reasons why this occurs, from the teachers' discourse. Parallel to this main objective, also seek through these discourses, these reasons relate to the phases historically experienced by Capoeira, pointing ruptures and continuities in this process of legitimation of Capoeira in the school environment. In this context, this research is justified because it is more an academic study that comes to addressing this issue, adding to the other we have at the national level, and aimed to contribute to the defense of the teaching of Capoeira classes in Physical Education. Another justification is that it seems pertinent to stimulate debate about a tension in this area in the State of Bahia, for although this manifestation of body culture is valued outside of "school walls" in this region, being treated in gyms, on the streets, films, novels , advertisements, books, etc; your space seem even not being valued in the school context. The method used for this research was descriptive qualitative nature, using as instrument the questionnaires, covering a sample of 47 teachers who teach Physical Education in state schools in the region covered by (DIREC 13) Jequie-BA. About 53% of this sample responded to the questionnaires, and the analysis of Bardin (1977), it was possible some interpretations. We conclude that all participating teachers are licensed in Physical Education and almost all had the discipline Capoeira graduation. Most also made specialized courses and course sponsored by the State Education about Capoeira. All they consider important to develop the theme Capoeira in their classes (for cultural, historical and motor development), although 18 of the 25 teachers actually develop in their classes. Another fact worth noting is that 78% of teachers believe Capoeira as a multifaceted issue, which is constituted as a facility to address her in physical education classes. With regard to the difficulties encountered in developing the Capoeira, the argument of lack of material also appeared, together with various forms of prejudice, especially religious, showing that we have to deal with a new kind of bias to develop this theme: religious intolerance. Keywords: Capoeira, Physical Education, History of Capoeira. LISTA DE FIGURAS Figura 01- Negros no porão 26 Figura 02- Negros no tronco 27 Figura 03- Gargalheiras. Máscaras e mordaças 28 Figura 04- N’Golo ou dança das zebras 31 Figura 05- Jogar Capoeira 32 Figura 06- Mestre Bimba 50 Figura 07- Mestre Pastinha 59 Figura 08- Pastinha e seus discípulos 64 LISTA DE QUADROS Quadro 01- Bloco de conteúdos 79 Quadro 02- Unidades de contexto das respostas da questão 10 106 Quadro 03- Unidades de registro das respostas da questão 10 108 Quadro 04- Categorização das respostas da questão 10 110 Quadro 05- Unidades de contexto das respostas da questão 11 112 Quadro 06- Unidades de registro das respostas da questão 11 114 Quadro 07- Categorização da das respostas da questão 11 116 Quadro 08- Unidades de contexto das respostas da questão 13 118 Quadro 09- Unidades de registro das respostas da questão 13 119 Quadro 10- Categorização das respostas da questão 13 120 Quadro 11- Unidades de contexto das respostas da questão 16 (Facilidades) 125 Quadro 12- Unidades de registro das respostas da questão 16 (Facilidades) 126 Quadro 13- Categorização das respostas da questão 16 (Facilidades) 127 Quadro 14- Unidades de contexto das respostas da questão 16 (Dificuldades) 128 Quadro 15- Unidades de registro das respostas da questão 16 (Dificuldades) 129 Quadro 16- Categorização das respostas da questão 16 (Dificuldades) 130 LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 01- Idade 95 Gráfico 02- Instituição de formação 97 Gráfico 03- Ano de conclusão do curso 98 Gráfico 04- Disciplina com o tema Capoeira na graduação 99 Gráfico 05- Curso de especialização 100 Gráfico 06- Área de especialização 101 Gráfico 07- Conclusão da especialização 101 Gráfico 08- Participação em cursos, encontros e congressos 102 Gráfico 09- Tempo de exercício na rede pública estadual 103 Gráfico 10- Participação no curso Capoeira na escola 105 Gráfico 11- Utilização do tema nas aulas 117 Gráfico 12- Perfil/ perspectiva de abordagem 123 SUMÁRIO CAPÍTULO 1 Introdução 13 CAPÍTULO 2 O caminhar da pesquisa 19 CAPÍTULO 3 As fases da Capoeira no Brasil: nuances de um olhar histórico 24 3.1- Capoeira no Brasil – da herança Africana a uma forma de resistência 25 3.2- A Perseguição 33 3.2.1- Rio de Janeiro 34 3.3- A Criminalização 39 3.3.1- Bahia 41 3.4- Esportivização da Capoeira 46 3.4.1- Mestre Bimba 50 3.4.2- Mestre Pastinha 59 3.5- Expansão e valorização como patrimônio e fenômeno cultural 65 CAPÍTULO 4 Capoeira na Escola: entre a valorização e a legitimação 70 4.1- Educação Física Escolar frente às LDB’s e aos PCN’s 71 4.2- A abordagem e o ensino da Capoeira nas aulas de Educação Física 76 4.2.1- Abordagens Conceituais 76 4.2.2- Formas de Ensino 85 CAPÍTULO 5 Capoeira na escola na região da Direc 13- Jequié-BA 94 5.1. Parte I: Perfil dos sujeitos pesquisados 94 5.2. Parte II- Participação no curso “Capoeira na Escola” 104 5.3. Parte III- Utilização do tema nas aulas de Educação Física 111 CAPÍTULO 6 Considerações Finais 133 Referências 136 Apêndices 144 Anexos 151 13 1- INTRODUÇÃO Em 1998, quando ingressei no curso de Educação Física, não pensava que fosse atuar na área da Educação Física escolar, uma vez que associava, naquela época, a área relacionada ao ensino dos esportes, numa visão bastante limitada. Porém, aos poucos fui descobrindo que essa era uma vocação adormecida - o ser educador estava na minha alma- e hoje tenho buscado alimentar e aprofundar cada dia mais. Pensando como professor de Educação Física que sou hoje e lembrando como foram as minhas aulas na época de estudante do ensino fundamental e médio, considero- me um privilegiado por ter tidoa oportunidade de vivenciar vários conteúdos e tipos de aulas e em locais diferentes. O que atualmente serviu como uma espécie de filtro para que eu pudesse avaliar a minha própria conduta como docente somada às experiências e conhecimentos que adquiri até hoje. Comecei tendo o que chamo de aulas com “herança militar”, pois na 5º e 6º séries minhas aulas eram basicamente exercícios físicos militares, sendo que no período da manhã, bem cedo, corríamos vários quilômetros como “aquecimento” e no retorno fazíamos mais alguns exercícios calistênicos na “parte principal”, e como “volta à calma”, alongávamos e íamos para casa. Em outros raros momentos, jogávamos futebol, e com essa rotina sofríamos nas primeiras semanas com dores musculares, o que não nos motivava para fazer a aula novamente. Esta vivência ocorreu quando morava no povoado do município de Brejões- Bahia, e, dois anos depois, entre 1993 e 1994, minha família foi morar em Maracás, também no Estado da Bahia. Coincidentemente nesse período houve uma mudança no formato das aulas de Educação Física na Rede Pública de ensino deste Estado, pois as 14 aulas passaram a ser no mesmo turno das demais disciplinas, e não mais no contraturno escolar. Essa mudança se caracterizou como um choque para mim, visto que só tinha presenciado até aquele momento uma Educação Física exclusivamente prática e sem uma aparente sistematização, não conseguindo associar essa disciplina a alguma coisa que não fosse correr ou jogar futebol, ou outra modalidade qualquer. Acredito que esse choque tenha sido também para os professores que me ensinavam naquela época, lembro-me bem que nenhum deles era formado, até porque, a Educação Física servia como uma espécie de complemento de carga horária para os professores de outras áreas, que iam “tapando buracos”, ou complementando suas cargas horárias lecionando esta disciplina. Isso parecia ocorrer, provavelmente, porque era quase uma unanimidade que qualquer um podia ser professor dessa disciplina, afinal, era só dar uma bola e pronto!... E também porque, reconheçamos, eram escassos os profissionais formados que se aventuravam no interior do Estado para lecionar, mesmo porque os cursos superiores existiam basicamente na capital Salvador, pois esse processo de abertura de cursos de Educação Física, numa maior quantidade no interior da Bahia, se intensificam a partir do ano de 1997, quando a Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia e a Universidade Estadual de Feira de Santana iniciaram suas atividades (PIRES, 2008). Terminado o ensino fundamental, precisava fazer o ensino médio numa escola que me preparasse para o vestibular, fato que fez com minha família mudasse novamente para outra cidade no início de 1995. E nessa nova escola, agora particular, vivenciei outro tipo de Educação Física, a exclusivamente esportivizada. Nesses três anos vivenciei uma gama maior de esportes, aprendendo a jogar basquete, handebol, vôlei, atletismo. 15 Apesar de não ter sido um “exemplo” de estudante, consegui a aprovação no vestibular na primeira tentativa, e como todo “leigo”, acreditava que iria jogar “muita bola” na faculdade. Ledo engano... Ingressei no curso no mesmo ano que foi regulamentada a profissão de Educação Física e para minha surpresa, o curso tinha um cunho muito mais pedagógico do que para o treinamento físico ou para o esporte de rendimento. Quando iniciei o terceiro semestre, consegui um estágio na Escola que leciono até hoje, que me deu elementos para vivenciar o que estudávamos na Universidade, analisando no “chão da escola” o que poderíamos fazer para romper com o exclusivismo dos esportes clássicos (dentro de uma visão da performance esportiva), enraizado nos nossos alunos quando até hoje escutamos a célebre frase “Professor, é bola hoje?”, ou trazendo para a gíria da Bahia “Professor, hoje é o baba?”. Na tentativa de oportunizar aos meus educandos uma maior gama de conteúdos e conhecimentos nas aulas de Educação Física e tornar esta disciplina mais significativa para a vida dos alunos, já citava a Capoeira no meu planejamento por entender, de forma simplória, que esta deveria ser tratada quando abordasse os aspectos históricos da Educação Física no Brasil. Porém, o fazia de uma maneira mais tímida, afinal, “não tinha a experiência do praticante de Capoeira”. Este fato começou a mudar efetivamente após participar do curso de extensão em Capoeira na Escola, em 2010, ofertado pela Secretaria de Educação do Estado da Bahia, o qual me deu elementos e curiosidade em pesquisar esse tema. Nas conversas que tínhamos no referido curso, seja com os colegas, seja com mestres de Capoeira, percebi que havia uma certa lacuna no que diz respeito ao trato desse conteúdo no ambiente escolar. Alguns colegas a utilizavam, boa parte não a abordava em suas aulas, e outros ainda utilizavam-na de forma esporádica (por uma 16 série de motivos). Este último fato me causava certa estranheza, afinal, a Bahia figura como um dos Estados que tem a Capoeira como uma manifestação cultural muito sólida, sendo considerada na atualidade como um berço da mesma. Essa não utilização efetiva nos leva a refletir no que Penha (2009) afirma quando toca no assunto de que a escola estabelece critérios de acordo as suas necessidades, juntamente com as necessidades da sociedade, quando diz respeito às manifestações culturais, sendo assim, um processo de escolha no qual a escola prioriza alguns temas em detrimento de outros. A partir desta realidade vivida, comecei a me indagar acerca da não inserção da Capoeira como conteúdo das aulas de Educação Física, procurando entender quais poderiam ser os motivos dessa escolha. Problemática que foi amadurecida no projeto de pesquisa que apresentei por ocasião do processo seletivo do Mestrado em Educação Física, da Universidade São Judas Tadeu, em 2010, o qual fui aprovado para a turma que se iniciaria em 2011. Assim, a presente pesquisa objetiva investigar se a Capoeira está sendo abordada nas aulas de Educação Física na região da Diretoria Regional de Ensino- Direc 13, situada na cidade de Jequié- Bahia, e caso não esteja (nossa hipótese mediante imersão nesta realidade), compreender e analisar os motivos pelos quais isso ocorre, a partir das respostas dos professores. Paralelo a esse objetivo principal, buscaremos também, por meio destes discursos, relacionar estes motivos às fases historicamente vividas pela Capoeira, apontando rupturas e permanências neste processo de legitimação da Capoeira no ambiente escolar, também vivido de forma mais ampliada na sociedade. É válido destacar que essa Diretoria Regional de Educação tem como papel representar a Secretaria de Educação na administração regional, abrangendo em sua jurisdição 25 municípios, e atualmente está sob a direção de Alvanil Cunha. 17 A escolha por essa região se deve ao fato do pesquisador trabalhar em uma escola pertencente a essa Direc, além de participar constantemente de encontros com os professores das demais localidades abrangidas por essa diretoria, fato que facilitaria o contato com os sujeitos da pesquisa, bem como uma preocupação particular no desenvolvimento da Educação Física nessa região. Neste contexto, a presente pesquisa se justifica por ser mais um estudo acadêmico que vem a abordar esta temática, somando-se a outros em nível nacional e que visam colaborar para a defesa do ensino da Capoeira nas aulas de Educação Física escolar. Outra justificativa que parece pertinente é fomentar o debate acerca de uma tensão existente nesta área, especialmente no Estado da Bahia, pois embora ela seja valorizada fora dos “muros escolares”, sendo tratadas em academias, nas ruas, filmes, novelas, propagandas, livros, etc; seu espaço parece ainda não estar sendo valorizado e até mesmo legitimado no contexto escolar. Num aspecto mais amplo,poderá colaborar para uma reflexão e efetivação da Capoeira na escola, contribuindo com a formação continuada de professores, assim como, para a constituição de uma Proposta Curricular para o Estado da Bahia, que está em fase de elaboração. Para garantir esses objetivos, organizamos essa dissertação da seguinte forma: No segundo capítulo, apresentaremos a opção metodológica da pesquisa que foi a descritiva, de cunho qualitativo, assim como o campo de estudo, os sujeitos da amostra e os instrumentos de coleta de dados. No capítulo terceiro buscamos trazer uma abordagem histórica para a Capoeira, buscando expor as características que ela traz desde a suas origens, bem como seu aparecimento no Rio de Janeiro, com a intensa perseguição e consequente criminalização, chegando ao ponto de quase desaparecer nos registros históricos, até 18 ganhar visibilidade em Salvador, quando do aparecimento de Mestre Bimba e do Mestre Pastinha, dois dos principais ícones da Capoeira no Brasil até a atualidade. Concomitante a Bimba e Pastinha, abordaremos o processo de esportivização da Capoeira, e a sua expansão e valorização como patrimônio e fenômeno cultural, conseguido por meio do seu tombamento no Ministério da Cultura, no ano de 2008. No quarto capítulo, abordaremos a Capoeira na escola, especialmente nas aulas de Educação Física, perpassando pelas duas últimas LDB’s publicadas, e também pelos Parâmetros Curriculares Nacionais, até chegarmos à Lei 10.639/03, que inclui o estudo obrigatório na rede oficial de ensino, da temática história e cultura afro-brasileira, o que na nossa visão, consolidaria a inserção do tema na escola e nas aulas de Educação Física. Ainda nesse capítulo, traremos alguns estudos que inserem a Capoeira em suas propostas pedagógicas, bem como algumas publicações propõem a forma de sistematiza-la nas aulas de Educação Física escolar, mostrando as mais diversas possibilidades de trabalha-la. No quinto capítulo, traremos a análise dos dados da pesquisa, fundamentados na Análise de Conteúdo de Bardin (1970). Enfim, no sexto capítulo, apresentaremos as considerações finais em que serão apontadas algumas conclusões acerca da temática estudada, comungando os referenciais teóricos utilizados e os dados obtidos na pesquisa de campo. 19 2- O CAMINHAR DA PESQUISA O presente estudo se caracteriza por uma pesquisa descritiva, de cunho qualitativo, abordando uma amostra não probabilística atípica, escolhida pelo autor a partir do problema de pesquisa, e levando em consideração condições temporais, técnicas e de acesso às instituições educacionais. (THOMAS e NELSON, 2002; LAVILLE e DIONNE, 1999). Segundo Minayo et al. (1999, p.21), a “pesquisa qualitativa [...] trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis”. Gil (1999, p.44) complementa que essas pesquisas “[...] têm como objetivo primordial a descrição das características de determinada população ou fenômeno ou o estabelecimento de relações entre variáveis”. A partir dos autores supracitados, esta pesquisa atende aos preceitos da pesquisa qualitativa, uma vez que busca descrever e interpretar os dados coletados dos professores acerca da apropriação e desenvolvimento do tema Capoeira em suas aulas. A pesquisa inicia-se com um levantamento bibliográfico acerca do contexto histórico da Capoeira, de como essa manifestação apareceu e foi se constituindo ao longo dos tempos em nosso país. Num segundo momento, buscamos identificar alguns referenciais que versavam sobre a Capoeira e sua inclusão nas aulas de Educação Física escolar. Encerrado esse processo, se iniciou outro tipo de pesquisa com caráter exploratório (o de campo), para contemplar o objetivo da pesquisa. O primeiro passo foi contatar a Diretoria de Ensino 13, no nome da diretora Avanil Cunha, para uma 20 apresentação da pesquisa. Após este contato informal, foi estabelecido outro mais formal, encaminhando-se à Direc 13 um pedido de autorização (Apêndice A) para contatar de forma oficial os professores sujeitos da pesquisa (todos eles atuantes em escolas públicas pertencentes a esta Diretoria). Concomitante a este processo, iniciou-se a elaboração do instrumento de pesquisa, o questionário. Fizemos a opção por este instrumento devido à grande quantidade de sujeitos que pretendíamos investigar, pois, como afirmam Laville e Dionne (1999, p.184) o questionário “permite alcançar rápida e simultaneamente um grande número de pessoas, uma vez que elas respondem sem que seja necessário enviar- lhes um entrevistador”. O questionário foi dividido em três partes, assim organizado: Parte I- Dados Pessoais/ Formação; Parte II- Participação no curso específico de Capoeira; Parte III- Utilização da Capoeira nas aulas. Na parte I, buscamos levantar o perfil dos sujeitos, obtendo dados sobre a formação e a atualização profissional, o tempo de exercício na rede pública de ensino do Estado da Bahia, dentre outros. Para essa primeira parte do questionário, nos permitimos fazer uma análise quantitativa, visto que ela apresenta dados muito objetivos. Na parte II, levantamos dados acerca da participação dos professores no curso de capacitação em Capoeira na Escola, curso esse que foi ofertado de forma opcional para professores da Rede Estadual, no ano de 2010, com carga horária de 130 horas, em que visava dar elementos para que o professor trabalhasse com o tema na Escola, buscando com o curso efetivar o cumprimento da lei 10.639/03 que versa acerca da inclusão da obrigatoriedade do ensino da história e cultura afro-brasileira, característica na qual a Capoeira se vincula. 21 Por fim, a parte III, buscamos levantar dados a respeito da importância da utilização do tema por parte do professor, porque (utiliza ou não) e caso a aborde, de que forma o faz em suas aulas. A opção pelo questionário veio ao encontro da necessidade do autor, uma vez que a região proposta a ser pesquisada compreendia um grande número de escolas, e, consequentemente, de professores, sendo inviável a visita de forma pessoal por parte do pesquisador. Com a devida autorização por parte da Direc 13, encaminhamos o projeto para a apreciação do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade São Judas Tadeu (CEP- USJT), por meio da Plataforma Brasil. Depois de receber o parecer autorizando a pesquisa pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade São Judas Tadeu (Anexo A), contatamos os professores para que a eles fosse encaminhado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) (Apêndice B) e o questionário (Apêndice C). Ressalta-se que, seguindo as orientações do CEP, os professores receberam o TCLE, que continha informações sobre os objetivos, riscos e benefícios da pesquisa, e um campo para a assinatura de autorização para utilização dos dados contidos no questionário. O universo da pesquisa constitui-se, portanto, de 47 professores de Educação Física, docentes de escolas estaduais pertencentes à DIREC 13. Alguns professores foram consultados presencialmente, mas outros, devido à distância das escolas ou por problemas de incompatibilidade com os horários do pesquisador, foram consultados via email. Um total de 47 professores receberam os questionários, seja pessoalmente ou via email, no período de fevereiro de 2013 a abril de 2013. Obtivemos uma amostra final que totalizou 25 respostas, sendo que não obtivemos respostas dos demais, pois alguns professores não estavam atuando em sala 22 de aula, outros não quiseram responder o questionário e alguns não o devolveram a tempo da análise dos dados por parte do pesquisador, totalizando assim 53% de questionários válidos. A análise dos dados foi fundamentadaem Bardin (1977, p.38), que propõe a análise de conteúdo “como um conjunto de técnicas de análise das comunicações, que utiliza procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens”. Para essa autora (op.cit.), a análise de conteúdos compreende três fases diferenciadas: - a pré-análise; - a exploração do material e o tratamento dos resultados; - A inferência e a interpretação. A pré-analise configura-se como a fase de organização propriamente dita, em que o objetivo é sistematizar as ideias iniciais para que se possa estruturar um esquema preciso de desenvolvimento das operações seguintes num plano de análise. A exploração do material consiste na administração sistemática das decisões previamente tomadas após os procedimentos da pré-análise. Para o tratamento dos resultados utiliza-se a codificação que é o momento em que permite transformar os dados brutos em unidades de maneira sistemática. Essa codificação ocorre mediante a identificação de dois elementos: Unidades de registro, que Minayo (1999, p. 75) explica que “essas unidades se referem aos elementos obtidos através da decomposição do conjunto da mensagem”. Entre as unidades de registro mais usadas, podemos exemplificar a palavra, a frase ou a oração. Unidades de contexto, maior que a unidade de registro, situado como uma referência mais ampla, tendo como função primordial facilitar a compreensão no processo de 23 codificação da primeira. Podemos citar como unidades de contexto a frase para a palavra e o parágrafo para o tema. Neste trabalho foi considerada unidade de contexto a resposta completa por parte dos professores em cada uma das questões abertas, e como unidades de registro, o destacamento de expressões que julgamos terem sido mais significativos para a construção das respostas. Identificadas às unidades de contexto e as respectivas unidades de registro, buscamos estabelecer as categorias, a partir de agrupamento de unidades de registro que tinham similaridade entre eles, com temas centrais comuns, que por sua vez, nomearam estas categorias. 24 3- AS FASES DA CAPOEIRA NO BRASIL: NUANCES DE UM OLHAR HISTÓRICO A importância da análise histórica para o trato do conhecimento na atualidade vem sendo cada vez mais fortalecida em diferentes áreas e trabalhos acadêmicos, e não somente na área da História, como em diversas outras áreas, incluindo a Educação Física. No entanto, parece que ainda muitos trabalhos não têm dado o devido trato e importância a esta relação, fazendo dos primeiros capítulos destes trabalhos acadêmicos, textos desconexos com o tema do trabalho, onde se tratam de maneira superficial esses aspectos históricos, diminuindo e subestimando sua importância. Diferentemente destes trabalhos, o objetivo da abordagem histórica da Capoeira nesta dissertação é de poder analisar a trajetória histórica desta manifestação de nossa cultura, justamente para melhor compreender seu presente como parte deste processo, e, portanto, a ele relacionado. E esta abordagem que segue poderá fornecer subsídios para traçarmos paralelos acerca do processo de sua legitimação no espaço escolar ao analisarmos os dados obtidos na pesquisa de campo. Neste contexto, ao tomar contato com a literatura que aborda os aspectos históricos sobre a Capoeira no Brasil, é possível concluir que ela passou por diversas etapas. Estas etapas serão tratadas com maior densidade nos sub-capítulos a seguir. 25 3.1- CAPOEIRA NO BRASIL – DA HERANÇA AFRICANA A UMA FORMA DE RESISTÊNCIA O Navio Negreiro Abadá Capoeira Que navio é esse que chegou agora é o navio negreiro com os escravos de Angola vem gente de Cambinda Benguela e Luanda eles vinham acorrentados pra trabalhar nessas bandas aqui chegando não perderam a sua fé criaram o samba a capoeira e o candomblé Que navio é esse que chegou agora é o navio negreiro com os escravos de Angola acorrentados no porão do navio muitos morreram de banzo e de frio São nesses navios negreiros, como trata a canção, que os escravos trouxeram sua bagagem cultural constituída pelos seus costumes, religiões, danças, músicas, modos de cozinhar, se vestir, enfim, todo um arcabouço que foi forjado em diferentes etnias e que, chegando ao Brasil juntamente com outros elementos culturais, dos povos que aqui moravam, constituíram a criação de uma manifestação cultural que se transformou num dos maiores legados da cultura negra no nosso país: a Capoeira. Rego (1968 p.15) relata que vieram de Angola os primeiros escravos, bem como a maior quantidade de negros importados: “Angola era o centro mais importante da época e atrás dela, querendo tirar-lhe a hegemonia, estava Benguela. Angola foi para o Brasil o que o oxigênio é para os seres vivos”. Essa predileção pelos negros de Angola era devido à boa qualidade dos escravos, entendo-se boa qualidade como sinônima de maior robustez e fácil disciplinamento (“eram mais submissos”), associados à concepção de uma boa mercadoria. Porém, os http://letras.mus.br/abada-capoeira/ 26 angolanos não eram os únicos, negros de outros países do continente africano eram escravizados e trazidos para o Brasil de forma desumana e violenta. Forma essa de tratamento que ia desde o seu aprisionamento na África, retirando-os do convívio dos seus familiares, de seus costumes e de sua terra, passando pelo seu transporte, realizado nos porões fétidos dos navios negreiros superlotados, com pouco alimento, conforto, culminando com sua chegada ao Brasil onde eram vendidos nos mercados públicos como se fossem objetos ou mercadorias (SILVA, 2007). (figura 01) Figura 01 - João Maurício Rugendas - Negros no porão do navio, Litografia. 1835. Diante da formação heterogênea desses grupos, a ideia dos senhores era que esses escravos, pertencendo a grupos distintos, não conseguissem se articular para uma organização na luta pela liberdade. Mas, mesmo pertencendo a grupos com língua (idioma ou dialeto), costumes e tradições diferentes, não foram estes os fatores limitadores de uma mobilização coletiva. Ou seja, no momento em que eram obrigados a trabalhar juntos, observados sob uma severa vigilância, e a conviver juntos em senzalas, acabavam por mesclar estas culturas 27 e a encontrar mecanismos coletivos de sobrevivência (que colaboravam para a superação destas diferenças). Freitas (2006 p.28) afirma que A constante vigilância e severa violência empregada contra os negros foram à marca dos cativeiros brasileiros que preservaram a cultura de quanto mais o outro for subjugado, humilhado, castigado, amedrontado, mais controle se tem sobre ele. De certa forma, esta também pode ter sido a mola propulsora para que acontecessem as rebeliões nas senzalas. Aos descontentes com este tratamento restava o tronco. Tronco no sentido literal, onde o escravo rebelde era amarrado e, exposto em público, era chicoteado quantas vezes fossem necessárias para esquecer ideias contrárias às de submissão e servidão. Figura 02. Jean Baptiste Debret. Negros no Tronco, Pintura. 1835 A violência a qual os negros escravizados estavam submetidos obedecia a uma rotina, que era a de sofrer chicotadas diárias. Além delas, havia também o castigo preventivo, realizado semanalmente para não pensar em fuga, e, quando chamavam atenção, sofriam um castigo exemplar, como mutilações de dedos, furo nos seios, queimaduras com ferro em brasa, ou dos açoites no pelourinho, sob trezentas chicotadas de uma vez, para matar (RIBEIRO, 1995). 28 Ansiando por liberdade devido aos maus tratos sofridos, alguns negros fugiam e, se capturados eram castigados mais severamente, “[...] sendo marcado(s) com ferro em brasa, tendo um tendão cortado, viver peado com uma bola de ferro, ser queimado vivo,em dias de agonia, na boca da fornalha ou, de uma vez só, jogado nela para arder como um graveto oleoso” (ibidem, p.120). Para aliviar os sofrimentos do cativeiro, os escravos usavam a cachaça e a maconha, na época chamada “fumo de Angola”, que era trazida clandestinamente nos navios negreiros (DEL PRIORE e VENANCIO, 2010). Outra forma de revolta a este meio de vida era o suicídio. Muitos escravos se suicidavam comendo terra, enforcando-se, envenenando-se com ervas e potagens dos mandingueiros (FREYRE, 2003). Na tentativa de minimizar esse tipo de atitude, os senhores colocavam uma máscara de ferro na boca do escravo que fosse suspeito de querer cometer suicídio (FREITAS, 2006), como nos mostra a figura 03. Figura 03- Jacques Etienne Arago - Gargalheiras,Máscara e Mordaças. Litografia. 1839. 1 1 Há um fato curioso nesta imagem, pois ao contemplar em seu título a palavra “gargalheiras”, causou-nos a reflexão, seguida de uma curiosidade histórico-acadêmica, acerca inclusive da proibição do riso e da gargalhada (e portanto, à diversão, conversa e felicidade) pelos escravos. Neste sentido, esta máscara não 29 Inconformados com a situação de maus tratos e principalmente de clausura, os negros escravos acabaram por perceber que sua única arma contra toda opressão que sofriam seria o seu próprio corpo, conforme podemos observar no comentário de (Santos, 1990, apud Freitas, 2006, p.28) 2 . Para poderem adestrar seus corpos à vista dos seus senhores, disfarçavam os movimentos da luta numa forma de dança, passando assim uma imagem de simples divertimento, e quando fugiam das senzalas e eram encontrados, procuravam se defender com seus coices, cabeçadas e rasteiras para não serem reconduzidos ao cativeiro. Percebendo que a agilidade e destreza corporal poderiam ser eficazes para empreender fugas, os negros de fato investiram em fazer dos seus próprios corpos, uma arma para se defenderem e para enfrentarem seus opressores em emboscadas e a refugiar-se em bandos, criando assim os chamados quilombos (DIAS, 1997). Del Priore e Venancio (2010, p.59) relatam que os quilombos eram “comunidades originalmente constituídas por negros fugidos, instaladas, hoje, nas áreas onde houve luta e resistência contra a escravidão. Palmares foi o maior quilombo colonial, nascido no bojo das guerras do açúcar”. No Nordeste, desde os fins do século XVI, foram registradas fugas de escravos. Sabia-se, então, que os fugitivos se concentravam na área que se estendia entre o norte do curso inferior do rio São Francisco, em Alagoas, às vizinhanças do cabo São Agostinho, em Pernambuco. Tratava-se de uma região acidentada, coberta de mata tropical onde abundava a palmeira pindoba, daí o nome: Palmares (Ibidem, p.60). Essa forma de se defender praticada pelos negros nos quilombos figura como uma hipótese para o surgimento da Capoeira, porém, não é a única, existem autores que só era utilizada para inibir o suicídio, mas também para coibir este divertimento. No entanto, esta reflexão não encontrou eco em algumas literaturas como: Ribeiro, 1995; Freyre, 2003; Caldeira, 2008; Narloch, 2009). 2 SANTOS, A.O. Capoeira: Arte-Luta Brasileira. Curitiba: Imprensa Oficial do Estado, 1983. 30 colocam que a Capoeira, apesar de ter se materializado efetivamente no Brasil, traz elementos de manifestações da África, como Falcão (2004, p. 17) afirma Os registros históricos evidenciam que, quando a capoeira ensaiou os seus “primeiros passos”, no Brasil, o fez através dos corpos de africanos de várias etnias e reinos, trazidos pelos portugueses para a, então denominada, Terra de Santa Cruz. É possível afirmar, portanto, que, embora ela tenha sido “engravidada” na África, ela já “nasce” no Brasil pluriétnica. Metaforicamente, poderíamos dizer que seu “berço” é africano, mas sua “cama” é brasileira, embora nela povos de outros cantos tenham tirado alguns “cochilos”. Ou seja, ela foi “batizada” no Brasil, como “filha” de uma condição de exploração a que foram submetidos seres humanos procedentes de diversas etnias africanas em terras recém invadidas pelos portugueses. Para complementar essa informação, poderíamos dizer que, há outras hipóteses acerca dos “berços” da Capoeira, ao qual se referiu Falcão (2004), como a proposta a seguir, considerando-a que a mesma adveio de algumas características do N’golo ou Dança das zebras (Figura 04). O n’golo é dançado por rapazes nos territórios do sul de Angola, durante o ritual da puberdade das meninas. Chamado de mufico, efico ou efundula, esse ritual marca a passagem da moça para a condição de mulher, apta a namorar, casar e ter filhos. É uma grande festa em que se consome muito Macau, bebida feita de um cereal chamado massambala. O objetivo do n’golo é vencer o adversário atingindo seu rosto com o pé. A dança é marcada pelas palmas, e, como na roda de capoeira, não se pode pisar fora de uma área demarcada. N’golo significa “zebra” e, de fato, alguns movimentos, em particular o golpe dado pelo pé, de costas e com as duas mãos no chão, parecem mesmo com o coice de uma zebra. (ASSUNÇÃO e MANSA, 2008, p.01) 3 3 Disponível em: http://www.revistadehistoria.com.br/secao/artigos-revista/elo-perdido http://www.revistadehistoria.com.br/secao/artigos-revista/elo-perdido 31 Figura 04- N’Golo ou Dança das Zebras. In: PIRES, Antônio Liberac Cardoso Simões. A capoeira na jogo das cores: criminalidade, cultura e racismo na cidade do Rio de Janeiro (1890-1937). 1996. Dissertação (Mestrado em História) - Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCH), Universidade Estadual de Campinas, Campinas. Mas, essa manifestação não surgiu com este nome, e percebemos que até hoje discussões são travadas na tentativa de explicar a origem desse vocábulo. Rêgo (1968) faz um levantamento acerca das versões etimológicas do termo, dentre os quais podemos destacar: - Capoeira vem do tupi-guarani caá-puêra, mato que deixou de existir ou mato ralo; - Capoeira era também um nome de uma ave encontrada em várias regiões do país, principalmente, espalhada no sul da Bahia, Rio de Janeiro, Minas Gerais, São Paulo, dentre outros Estados, principalmente no sul do Brasil. Fazendo uma acepção com a capoeira, este mesmo autor destaca que o macho desta espécie era muito ciumento e por conta disso travava lutas com o rival, que entrasse em 32 seus domínios, com movimentos naturais que se assemelhavam aos movimentos executados pelos capoeiristas; - Capoeira era também o nome dado a um cesto de palha ou vime, que servia para carregar capões, galinhas e outras aves para serem vendidas no mercado e que, em alguns momentos ociosos, nesses locais, os escravos praticavam essa manifestação a que podemos chamar de capoeira. Figura 05- Rugendas- 1835- Jogar capoeira A figura anterior leva-nos a refletir alguns pontos que consideramos importantes acerca da Capoeira: percebemos apenas negros reunidos observando dois em movimento, que supostamente estariam lutando: além disso, conseguimos verificar outro negro tocando uma espécie de tambor e no fundo na imagem, na mão do negro, nos pareceu uma cabaça, o que pode sinalizar outro instrumento: e por fim, essa prática se dá num local aparentemente sem “mato”, o que pode vir a corroborar com a associação do nome com o vocábulo em tupi-guarani exemplificado anteriormente. 33 Estas informações nos remetem a uma reflexão acerca da existência de um local específico para o surgimento da Capoeira, como aborda Abib (2004, p.96), Não existiu uma matriz, ou um centro irradiadorúnico que pudesse ser considerado como o local de surgimento da capoeira. Ela brotou espontaneamente e com formas diferenciadas em diferentes locais pelo país, materializando, porém, uma memória e um saber coletivos que caracterizavam a ancestralidade de milhões de homens e mulheres que, vindos da África, traziam e cultivavam um pedaço dela no Brasil. Não existem ainda pesquisas que afirmem categoricamente sobre o aparecimento da Capoeira, que foi compreendida como um misto de dança, herança africana e usada para disfarçar o treinamento de golpes dos senhores, e de luta, para se proteger dos castigos. E essa Capoeira foi sistematicamente perseguida e repreendida a partir dos fins do século XVIII e início do século XIX no Rio de Janeiro por parte das autoridades locais por estar ligada principalmente a registros policiais envolvendo escravos em desordem pelas ruas da cidade (ABIB, 2004). 3.2- A PERSEGUIÇÃO Como não houve um centro irradiador da Capoeira 4 conforme citado anteriormente, as obras recém-publicadas nos levaram à cidade do Rio de Janeiro, capital do Brasil no começo do século XIX, mais especificamente abrigo da família Real, que no ano de 1808 desembarcou “fugida de Portugal”. Devido a esta presença da corte, a cidade tornou-se o centro das atenções e maior centro financeiro do país, e também por isso, palco de conflitos sociais, onde temos as primeiras notícias relacionadas à perseguição dos Capoeiras. 4 Para esta pesquisa, utilizaremos o termo Capoeira precedido do artigo no feminino quando se tratar da manifestação e o termo Capoeira precedido do artigo no masculino quando tratarmos do praticante de Capoeira. 34 3.2.1-RIO DE JANEIRO Foi no Rio de Janeiro Autor desconhecido Foi no Rio de janeiro Chegaram os ex escravos colega veio A grande periferia Vagando pela cidade Sem ninguém pra lhe ajudar Negro ia vadiar Na capoeira meu irmão E o jogo começava Rabo de arraia A cabeçada e a rasteira Mas o passado escravo Oh! Fez o negro inferior Sem condições de viver colega veio Marginal ele virou Assaltando casas nobres Foi mercenário sim sinhô manhosos e traiçoeiros eram Guiamuns eram Nagôs rodas no Rio de Janeiro foi verdadeiro terror e nem mesmo a polícia podia nada fazer Essa canção retrata a situação marginal do negro quando chegou ao Rio de Janeiro. E foi esse local, capital Federal desde 1763, que recebeu um contingente maior de escravos e ex-escravos, e, devido às precárias condições de vida, em sua grande maioria, que alguns deles passaram a perturbar a ordem pública, segundo as autoridades da época. Na pesquisa de Soares (2001, p. 21) há uma passagem de um jornal da época citando que “[...] um dos maiores problemas da ordem social da capital do país e quiçá do império no meio século anterior: os Capoeiras”. A partir dessa passagem, seria “natural” que pensássemos quem eram os Capoeiras os grandes protagonistas das desordens naquela época. Na sequência desta narrativa, Soares (op cit, p.23) ainda menciona que a reportagem traz uma definição corrente daquele tempo, em que os Capoeiras eram indivíduos sem ocupação legítima. 35 Isto é, começa-se a perceber que a prática da Capoeira não era mais manifestação exclusiva de escravos, e sim, de pessoas desocupadas em geral (dentre eles escravos). É nesse período também que jornais de época começam a alertar não só os senhores de engenho, mas também a força policial acerca dessa manifestação de capoeiragem local. A impunidade por uma parte, a frouxidão da polícia e o desleixo de muitos senhores por outra, são as causas destas tristes ocorrências. Se não fora a muita moralidade que felizmente se observa entre nós, e o espírito manso e pacífico dos habitantes desta cidade, muitos mais desacatos se veriam praticar. Ainda assim estes arrombamentos de portas e mesmo roubos que recentemente têm havido manifestam bem que não há bastante receio dos que velam pela pública tranquilidade. E quem se não os tais capoeiras e peraltas tem ousado violar o asilo do cidadão. (SOARES, op.cit, p. 23). Pelo descrito nesta matéria, a imprensa da época parecia culpabilizar os Capoeiras pelo aumento da criminalidade na cidade, e isso provavelmente se deveu ao fato da habilidade desses indivíduos terem utilizados os gestos da Capoeira para se proteger, bem como para fugir. Porém, há de se lembrar que a segurança pública da cidade também estava ameaçada por outros tipos de elementos que perturbavam a ordem pública, como arrombadores, assaltantes, ladrões, etc. Como estratégia de proteção, os negros começam a se articular em grupos procurando se defender da perseguição e consequentemente da truculência da polícia e também dos seus senhores (KARASH apud SOARES, 2001) 5 . Essa articulação, espontânea ou planejada, foi denominada como as maltas de capoeira. A malta era a unidade fundamental de atuação dos capoeiras. Elas vão significar toda uma refinada organização social que reunia escravos cativos, libertos ou forros em solidariedade com toda uma parcela marginalizada da população de brancos e mulatos, constituída desde trabalhadores pobres, até desocupados, arruaceiros, bêbados, delinquentes, vigaristas, biscateiros, 5 KARASH, M.C. A vida dos escravos no Rio de Janeiro (1808-1850). São Paulo: Companhia das Letras, 2000. 36 punguistas, desordeiros, valentões, contando com uma parcela importante de portugueses, franceses, espanhóis e ingleses entre outros imigrantes, não menos marginalizados, que portando paus, porretes, facas e navalhas, promoviam “correrias” pelas ruas da Corte, em espetáculos bizarros de pancadaria e demonstração de destreza e valentia; seja em ocasiões de grandes concentrações populares como festas, desfiles cívicos, comícios políticos, etc., seja inesperadamente, à luz do dia ou à noite, para desespero da população e perplexidade da polícia, que atônita, muitas vezes não tinha muito a fazer nessas ocasiões (ABIB, 2004, p.100). É válido lembrar que esses grupos (maltas) não surgiam exclusivamente para a luta contra as repressões policiais, mas sim, para demarcar seus espaços e consolidar sua identidade (SOARES, 2001). Os piores embates eram travados entre os próprios negros que, aglutinados em suas respectivas maltas, defendiam os limites de seus territórios, utilizando golpes de Capoeira, navalhas e porretes no meio das ruas (ALMEIDA, 2008). Esses indivíduos eram identificados pelos seus meios peculiares de vida, com suas próprias linguagens, roupas e adornos, além do uso de facas e navalhas 6 , o que se transformou em formas de identificação por parte da força policial. Os registros policiais revelam que era muito comum se prender capoeiras por usarem chapéus com fitas amarelas e vermelhas, ou uma combinação das duas, como uma marca de identificação. Em 1818, José Rebolo, escravo de Alexandre Pinheiro, foi preso por carregar uma navalha e usar “um chapéu branco com uma grande fita vermelha e amarela em torno da parte superior com o resto ficando livre” – o inconfundível sinal dos capoeiras. Outros eram presos por assobiarem sons associados com os grupos, que eram a forma de senha para contatar seus companheiros. (SOARES apud SOARES, 2001, p.64) 7 Assim, Soares (2001) nos mostra que a Capoeira era um dos principais motivos das prisões no início do século XIX, onde os castigos físicos visavam intimidar seus praticantes, criando um clima de violência constante na cidade, pois afinal, os Capoeiras voltavam a encontrar seus algozes nas ruas. 6 Soares (1997) ressalta que um dos sinais da influência e da presença dos portugueses na Capoeira seja a utilização da navalha,visto que essa “arma” também era um objeto utilizado pelos fadistas em Portugal. 7 SOARES, L.C. Urban slavery in nineteenth century. Rio de Janeiro, Londres, University College, tese de P.H.D., 1988 37 Os castigos sofridos pelos Capoeiras consistiam de centenas de chibatadas em plena praça pública, quando não eram mandados para o “Calabouço”, um presídio localizado no Morro do Castelo, onde, além das chibatadas, os presos sofriam com as condições desumanas do cárcere, como a falta de água e a comida estragada (ABIB, 2004). Esses dados estão registrados nos chamados Códices, que eram os volumes em que se registravam os ofícios e as ocorrências policiais da primeira metade do século XIX. Soares (2001) menciona o códice 403 como o primeiro registro de prisões do século XIX, e que se constitui como a maior fonte de dados sobre os Capoeiras desse período. Também por meio destes registros da época é que começamos a perceber as diversas nuances da capoeira, ora considerada luta, ora vista como jogo, dança, folguedo, etc. No início da década de 1810, era comum o escrivão relatar que o indivíduo estava “jogando” a capoeira, algo que demonstra a presença do lúdico, do exercício. Curiosamente, no decorrer dos anos, este detalhe passa a ser mais omitido e os negros são presos simplesmente por “capoeira” [...] Este uso pode ter influenciado na conformação do termo capoeira para identificar o indivíduo, o tipo social, e não, como antes, a prática, a dança (SOARES, op. cit, p.76). É esse Capoeira, perseguido, massacrado por uma ordem social vigente da primeira metade do século XIX, que deixa um legado para as gerações seguintes O legado deixado para as gerações seguintes de negros e homens pobres da cidade do Rio de Janeiro foi uma estratégia social, uma forma de lidar com os agressores, uma comunhão da solidariedade grupal – importante para muitos que deixaram parentes e amigos do outro lado do Atlântico -, como autodefesa frente aos inimigos, fossem eles da mesma extração social, ou envergassem os trajes de defensores da ordem (Ibidem, p.76) É a partir desse legado, que verificamos na segunda metade do século XIX, a continuação da perseguição aos Capoeiras, agora estavam muito mais organizados na forma de maltas. 38 Como não conseguiram extinguir essa prática e, por ocasião da Guerra do Paraguai nos fins de 1864, o governo se utilizou do mecanismo do recrutamento forçado dos negros, fossem eles livres ou escravos, pois o Brasil necessitava de um contingente maior de soldados no front de guerra. Este recrutamento também era uma estratégia utilizada pela monarquia para “livrar-se dos elementos considerados indesejáveis” (REIS, 1997, p. 56). A vitória do país na Guerra e o retorno dos soldados sobreviventes trouxeram algumas consequências à sociedade, e uma delas foi à boa imagem por parte da população sobre esses soldados, que em grande parte eram negros ou pertencentes às camadas mais populares. A presença em massa de elementos das camadas populares na Guerra do Paraguai, participando ativamente, decidindo combates, demonstrando bravura, modificou o imaginário por parte da elite sobre o negro, o mestiço, o homem das cidades e do campo. O mestiço, o caboclo, o ex-escravo, visto com desdém antes de 1865 passou a ser observado por parcela da classe dirigente como símbolo da nacionalidade, herói da pátria, defensor do império (SOARES, 1993, p.270) Porém, com a prerrogativa da condição de militar, o consequente não cumprimento de promessas feitas, dentre as quais podemos destacar a de alforria dos escravos que se engajaram na guerra, fazem com que reapareçam a figura dos Capoeiras do pré-guerra, com o agravante do status alcançado, além da politização conseguida após aquela ocasião (ibidem). Com o agravamento desse quadro, escutam-se as primeiras vozes pedindo a criminalização da Capoeira, que até aquele momento ainda não era considerada crime segundo o código penal, apesar das perseguições e consequentes punições por parte das autoridades. Convém lembrar que nessa época o discurso do higienismo estava presente na sociedade e que, por meio desse discurso, que se pautava numa abordagem biologicista, considerava-se a raça negra como inferior à branca e como tal, seus 39 pertencentes não conseguiriam transcender a esse estado de arruaceiros, não conseguindo, portanto, viver de forma harmoniosa com a sociedade (REIS, 1997). Esse discurso da criminalização da Capoeira fora reforçado também por questões políticas, pois os negros apoiavam os monarquistas, inimigos políticos dos republicanos, que chegaram ao poder em 1889 através de um golpe militar, reforçando a perseguição frente aos Capoeiras. Reis (op cit, p.63) amplia esta reflexão: De que modo os capoeiras constituíram um obstáculo para a efetivação desse projeto político? A imbricação de capoeiras na ordem política anterior e a oposição aberta que alguns deles fizeram aos republicanos será o pretexto imediato para que os novos donos do poder os caracterizem como inimigos políticos ou, na ótica jacobinista, “inimigos do povo virtuoso”. Pires (1996) ainda menciona que os presos, por praticarem a Capoeira, eram enviados para o presídio da ilha de Fernando de Noronha, e que essa política de repressão aos Capoeiras era capitaneada por Sampaio Ferraz, então chefe da polícia na capital federal daquele período. Sampaio Ferraz era auxiliado por um grupo de informantes, dentre os quais, Capoeiras e velhos conhecidos da polícia, que ajudaram a organizar uma lista de nomes e endereços. De posse dessas informações, iam buscar os Capoeiras “em casa” (SOARES, 1999). A estratégia de Sampaio Ferraz era de deportar os presos logo para a ilha de Fernando de Noronha de forma arbitrária, sem qualquer medida judicial, para não dar tempo dos advogados liberá-los (PIRES, 1996). 3.3- A CRIMINALIZAÇÃO Essa intensa perseguição aos Capoeiras culmina na oficialização dessa prática como crime, fato que se oficializa a partir do dia 11 de outubro de 1890, quando esta 40 passa a constar no código penal Brasileiro, em seu artigo 402, que tratava “Dos vadios e capoeiras” Fazer nas ruas e praças públicas exercícios de agilidade e destreza corporal conhecidos pela denominação capoeiragem; andar em correrias, com armas ou instrumentos capazes de produzir uma lesão corporal, provocando tumulto ou desordens, ameaçando pessoa certa ou incerta, ou incutindo temor de algum mal. Pena – prisão celular de dois a seis meses. Parágrafo único: é considerada circunstância agravante pertencer a algum bando ou malta. Aos chefes e cabeças se imporá a pena em dobro. (REGO, 1968, p. 292) Nota-se neste artigo uma aproximação generalizada entre vadios e capoeiras, e, além disso, podemos pensar que, qualquer exercício de agilidade e destreza poderia ser considerado como Capoeira. Assim, qualquer manifestação corporal expressa ao ar livre (especialmente em grupo), mesmo que não viesse a colocar em risco outras pessoas, poderiam ser passíveis de prisão. Outra observação que fazemos é uma tentativa, muito mais acentuada, em acabar com a ação das maltas, uma vez que a pena imposta era agravada caso um indivíduo fizesse parte de um grupo desses. Complementando ainda esse Código Penal, encontramos o artigo 403 e o artigo 404 que estabeleciam: No caso de reincidência será aplicado ao capoeira, no grau máximo a pena do art. 400. (Pena de um a três anos em colônias penais que se fundarem em ilhas marítimas, ou nas fronteiras do território nacional, podendo para esse fim serem aproveitados os presídios militares existentes). Parágrafo único- Se for estrangeiro será deportado depois de cumprir a pena Art. 404- Se nesses exercícios de capoeiragem perpretar homicídios, praticar lesão corporal, ultrajar o pudor público e particular, e perturbar a ordem,a tranquilidade e a segurança pública ou for encontrado com armas, incorrerá cumulativamente nas penas cominadas para tais crimes. (SOARES, 1999, p.434) E foi baseado nesse artigo, não sabemos se o cumprindo à risca, que os Capoeiras eram mandados para as prisões marítimas, naquele momento de uma forma 41 oficial, já que os Capoeiras já eram enviados para as prisões marítimas antes da inserção desse artigo no código penal. Pires (1996) afirma que a repressão policial comandada por Sampaio Ferraz deu um duro golpe na organização dos Capoeiras, mas, apesar disso, ainda houve registros das atuações das maltas dos Capoeiras pelo menos até as duas primeiras décadas do século XX no Rio de Janeiro. Se Sampaio Ferraz não conseguiu acabar totalmente com a prática da Capoeira, pelo menos conseguiu minar a atuação política e autonomia social das maltas, força essa obtida especialmente no pós-guerra do Paraguai, desfocando assim a relevância que essa manifestação ganhou ao longo do século e com isso, desviando a atenção para com os Capoeiras, não aparecendo tanto nos noticiários policiais. E se no Rio de Janeiro a Capoeira deixou de ser notícia, é no Estado da Bahia, que a partir do século XX, passa a ganhar notoriedade, seguindo as ondas de repressão e perseguição advindas da Capital Federal do século XIX. 3.3.1- BAHIA Que Magia Tem A Bahia Abadá Capoeira Que magia tem a Bahia Quem poderá explicar Tem mandinga tem energia Tem capoeira no ar Chegando no Pelourinho Escuto um berimbau viola Bahia terra que para muitos possui uma aura especial, terra que respira Capoeira, o Estado que ouvimos cotidianamente como sinônimo de Capoeira. http://letras.mus.br/abada-capoeira/ 42 A viagem do Rio de Janeiro à Bahia neste texto, não só justifica-se pela maior abrangência da literatura pesquisada, mas também pela relação já pré-existente entre estas regiões e o tema Capoeira. Abordamos anteriormente que os Capoeiras, juntamente com prostitutas, assaltantes, pedintes, entre outros, estavam constantemente sendo alvo da repressão aos chamados vadios daquela época na cidade do Rio de Janeiro. Mas o fato interessante é que “[...] de um total de 2.632 presos capoeiras entre 1861 e 1890, temos 112 baianos (4,25%). Mesmo descontando aqueles que foram presos mais de uma vez, esses 5% são mais numerosos que qualquer comunidade fora da província do Rio ou da corte” (SOARES, 1999, p.03). Continuando, o autor, ainda aponta que em 1872, 5.559 baianos residiam no Rio de Janeiro, sendo 1.432 escravos e 4.127 livres, não sendo explicitada a forma como esses indivíduos foram “parar” na Corte. A suposição que Soares (1999) faz, e a qual acreditamos, é a de que, como o Rio de Janeiro era a capital federal, considerada como uma grande metrópole, seria esperado que esse grande contingente de baianos tenha ido para lá em busca de melhores oportunidades e condições de vida. A ligação entre Bahia e Rio de Janeiro se deu de várias formas. Por motivos sociais, políticos, econômicos, dentre outros e uma delas refere-se à difusão da prática e a marginalização da Capoeira. Mas enfocaremos neste momento o Estado da Bahia do início do século XX, uma vez que esta região acabou se notabilizando como símbolo da Capoeira desde essa época até os tempos atuais. Abib (2004) comenta que a Bahia, mais especificamente Salvador e as cidades do Recôncavo Baiano, tem uma atmosfera diferente dos demais locais do país, uma aparente herança africana que determina os gestos, o andar, a rítmica, a linguagem, a religiosidade, o “estado de espírito”, enfim, o modo de ser e se relacionar com o mundo. 43 É nesse contexto diferenciado de “ser baiano” que a Capoeira ganha uma influência própria, influência essa que faz com que essa prática se transforme em referência para o restante do país nos anos que se seguiram, a qual trataremos mais adiante, especialmente quando falarmos de dois dos Mestres mais notáveis do universo da Capoeira: Bimba e Pastinha. No que concerne ao início de sua prática, não diferente do que acontecia na Capital do império durante o século XIX, a Capoeira que começa a figurar na Bahia é uma prática marcada pelas relações estabelecidas nas ruas. Oliveira (2009), afirma que as ruas eram espaços privilegiados para o desenvolvimento dos comportamentos antissociais das camadas populares, e exemplo da vagabundagem. E essa presença nas ruas, principalmente no período da noite, que chamava a atenção dos jornais e noticiários da época. Era comum os noticiários publicarem manchetes como “campanha contra a gatunagem”, “campanha contra a vagabundagem”, “O policiamento das ruas”. São nessas notícias que encontramos os capoeiras, ou melhor, seus esconderijos, uma vez que raramente aparece associado a eles o termo “capoeira”, assim dificultando sua identificação. Os indivíduos nas referidas manchetes aparecem identificados por alcunhas um tanto quanto depreciativas a exemplo de capadócio, desordeiro e vagabundo, representando o medo dos transeuntes das vias públicas da Salvador republicana, seriam eles os “donos das ruas.” (OLIVEIRA, op cit, p.39) Salvador, buscando atender aos projetos modernizadores preconizados pelas primeiras décadas da República no país, e tendo como impulsionadores uma elite politicamente articulada, sonhava em transformar-se numa capital mais moderna e civilizada, seguindo os modelos europeus. Mas para isso era necessário “limpar as ruas” (DIAS, 2004), pois nelas aconteciam as experiências cotidianas: o trabalho, o lazer e o conflito. Importante ressaltar que o Rio de Janeiro já havia passado por essas transformações, executadas na gestão do então prefeito e engenheiro Pereira Passos, o 44 qual coube o direcionamento das obras de remodelação, embelezamento e saneamento da cidade, tornando-a uma “Europa possível”. Para isso, houve uma demolição em massa dos cortiços localizados no centro da cidade, deslocando essas moradias, e consequentemente seus habitantes para os subúrbios e favelas que começavam a crescer na então Capital Federal (MOURA, 1995). Porém, apesar de deslocar as moradias para os subúrbios da cidade, a população negra e mestiça ainda permanece nesse espaço central da cidade, emprestando sua mão de obra para trabalhos domésticos, serviços de rua e por meio de seus hábitos culturais (músicas, danças, comidas, festas,...) (SILVA, 2002). Para Oliveira (2004, p.48), era neste espaço que as desavenças geradoras de confusões ocorriam, resultando em combates corporais que aconteciam praticadas tanto por homens quanto por mulheres e, dentre esses “valentões”, estavam os Capoeiras. Interessante notar que a partir desse momento, diferenciando-se da Capoeira praticada e reprimida no Rio de Janeiro do século anterior (não sabemos se por falta de registro ou de pesquisas a respeito), começamos a perceber a figura feminina nas ocorrências de confusões. Um exemplo deste caso é trazido por Oliveira (2004, p. 52) As habilidades com a navalha não se restringiram ao mundo masculino, o “sexo frágil” também a conheceu de perto. Foi o que ocorreu entre Maria Melanina de Souza e seu ex-amante Benjamim João de Souza. O caso ocorreu em 1914, no cabula, hoje um dos maiores bairros de Salvador. O desfecho do conflito deu-se pela razão do casal que já não vivia mais maritalmente, se desentender e entrar em combate corporal, quando Maria “golpeou seu ex-affecto”. Custou a prisão da habilidosa navalhista. Outras passagens de confusões envolvendo mulheres também aparecem no estudo deste autor, e fica difícil afirmarmos categoricamente aspectos sobre a participação delas na Capoeira propriamente dita. Mas, uma observação que podemos fazer é a da utilização das navalhas como arma, instrumento muito utilizado pelos 45 Capoeiras do Rio de Janeiro no século anterior, uma influência nítidados fadistas Portugueses. Voltando à “limpeza das ruas”, o que queriam os reformadores de então, era impedir os “usos e abusos” daqueles que não se enquadravam no modelo de civilização almejado. E nesse modelo almejado, principalmente pelos higienistas, os velhos habitantes, aqueles que viviam nas ruas, não estavam inclusos nesse processo de embelezamento da cidade (DIAS, 2004). Percebia-se claramente que a cidade abrigava diversos espaços sociais. Se para as elites burguesas a rua era apenas uma via de acesso, meio entre dois pontos definidos, para as camadas populares a rua era como uma grande casa, lugar de relações sociais, de contatos, de vínculos, espaço de lazer e de trabalho, vital a seus inúmeros expediente de sobrevivência (Ibidem, p.18). Verificamos assim que as ruas se constituíam como lócus agregador de pessoas, que abrigava desde trabalhadores (que podemos defini-los como informais), até pedintes e pessoas que se utilizavam de meios “ilícitos” de sobrevivência, como prostitutas, bicheiros e ladrões. Como não existia um ritmo regular de trabalho, esses indivíduos permeavam entre momentos de ocupação e ociosidade, esta última traduzida em diversão regada a goles de pinga, o que fazia com que fossem vistos como pessoas que tinham a vida “vadia e ociosa”, entendendo que O termo “vadio” era usado tanto para se referir àqueles que não tinham trabalho, como para designar todos os que viviam de ocupações esporádicas. A palavra “vadiação” também qualificava as brincadeiras, os jogos e os divertimentos de rua cultivados pelo povo e repudiados pelos que sonhavam com uma população que vivesse disciplinadamente pelos supostos padrões europeus (DIAS, 2004, P.22). O Capoeira se enquadrava nesse perfil, indivíduos que viviam perambulando pelas ruas, em busca de sustento e de lazer, sendo assim, exposto às situações cotidianas, buscando se defender e também a demarcar seu espaço além de afirmar 46 valores sociais, o que na maioria das vezes, fazia-se com uso de violência (OLIVEIRA, 2004). E era nos eventos que aconteciam nas ruas que a Capoeira aparecia mais claramente e envolta de uma outra conotação As festas populares, as chamadas “festas de largo”, eram um dos espaços privilegiados onde a capoeira baiana se mostrava, e se desenvolvia. Eram os momentos em que os grandes capoeiristas da época exibiam seus dotes e sua destreza, e também, não raro, onde aconteciam confusões, brigas, desordens e perseguições por parte da polícia. Mas, sem dúvida, as festas de largo foram espaços importantes de desenvolvimento e de popularização da capoeira baiana. (ABIB, 2004, p.105) De um modo geral, eram nessas festas que indivíduos provenientes de diferentes áreas da cidade se encontravam e buscavam resolver suas rixas, utilizando golpes de Capoeira, além da navalha (PIRES, 2001). E é paralelo a essas confusões entre os Capoeiras e perseguições por parte da força policial nas primeiras décadas do século XX, que a partir da década de 30, por ocasião do governo de Getúlio Vargas, e sua proposta de valorizar o que é nacional, que a Capoeira começa efetivamente a se descriminalizar, por meio de um movimento de esportivização, que embora tenha se iniciado no Rio de Janeiro no início do século, é na Bahia que se consolida, por consequência da participação de dois dos principais ícones da Capoeira, Mestre Bimba e Mestre Pastinha, como veremos a seguir. 3.4- ESPORTIVIZAÇÃO DA CAPOEIRA Capoeira o Jogo Praticado Mestre Matias Capoeira É jogo praticado na terra de São Salvador Capoeira Manuel dos Reis Machado Ele é fenomenal Ele é o Mestre Bimba Criador da Regional http://letras.mus.br/mestre-matias/ 47 Manuel dos Reis Machado, o Mestre Bimba, o qual falaremos adiante, mostrou- se como um indivíduo à frente do seu tempo, apesar de seu pouco estudo formal, tendo sido um dos primeiros responsáveis pela efetiva propagação da Capoeira de uma forma sistematizada. Porém, antes de adentrarmos na esportivização conseguida por ele é válido destacarmos alguns movimentos de esportivização da Capoeira. Dentre essas tentativas, podemos citar que no Rio de Janeiro, num processo paralelo ao da repressão da Capoeira, houve também um movimento valorizador dessa manifestação. Esse segundo movimento foi encabeçado pelo então deputado Coelho Neto, que dentre outros fatores, tentou colocar o ensino da Capoeira nas forças armadas, modelada pelas lutas marciais e com a ideia de um “esporte genuinamente brasileiro” (PIRES, 2001). Em 1907, tem-se o registro da primeira obra direcionada para uma sistematização de golpes e contragolpes da Capoeira, assinada por um pseudônimo de O.D.C., e intitulada de Guia do Capoeira ou Gymnastica brazileira, a qual Pires (2001) suscita a possibilidade, não comprovada, dessa obra ter sido escrita pelo próprio Coelho Neto. Essa obra tinha o intuito de [...] levantar a Gymnastica brazileira do abatimento em que jaez(ia), nivelando-a como singularidade pátria, ao soco inglez, à savatta franceza, à lucta allemã, às corridas e jogos tão decantados em outros paízes. Nossa briosa mocidade hoje desconhece pela mor parte, os trabalhos e termos da ate antiga, e porisso nós resolvemos publicar o presente guia (O.D.C., 1907 apud SILVA, 2002, p.72). Por essa passagem conseguimos perceber um anseio em ter uma manifestação esportiva brasileira que pudesse ser conhecida e valorizada pelos brasileiros, como os outros esportes oriundos de outros países já eram. 48 Numa linha de raciocínio parecida, em 1928 surge uma outra obra que versa sobre a Capoeira, em que oferecia um método de ensino e aprendizagem da Capoeira, bem como de regras para sua prática esportiva, denominada Gymnastica Nacional (Capoeiragem) – Methodisada e Regrada, escrita por Annibal Burlamaqui, que em seu prefácio dizia No, Brasil já se praticam, pode-se dizer, todos os sports; temos campeonato de remo, natação, foot-ball, basket-ball, Box, luta romana, tênis, atletisomo em geral, etc. Actualmente até o polo e golfe já são disputados em nosso terra. No entanto é de lamentar que até hoje nada se tenha em prol do Sport nacional. Cogita-se de uma arte nacional, brasileira, da música brasileira. Até mesmo da política brasileira (BURLAMAQUI, 1928 apud PIRES, 2001, p. 98). Nesse prefácio podemos constatar que o autor mostra que havia uma valorização de práticas esportivas oriundas de outros países, mas que ainda não se havia feito isso com uma prática brasileira. Ora, se pensarmos que o livro de O.D.C. fora publicado em 1907 e que em 1928 a luta era praticamente a mesma, podemos perceber que houvera poucos avanços nessa política de valorização da prática da Capoeira. Silva (2002) narra que Burlamaqui apresentou um total de 27 golpes e contragolpes em sua obra, e que esses movimentos muito se assemelham com os praticados na Capoeira dos dias atuais. E outro Capoeira que mereceu destaque nesse processo de esportivização foi Agenor Moreira Sampaio, “Sinhôzinho”. Após Burlamaqui, Sinhôzinho foi um dos principais líderes do movimento de esportivização da Capoeira. Para ele, a Capoeira era a ginástica nacional, o esporte genuinamente brasileiro. Assim ele afirmava; “prefiro não a classificar como dança, jogo ou luta. A meu ver trata-se da verdadeira ginástica nacional (PIRES, 2001, P.104). Dentre os discípulos de Sinhôzinho, podemos destacar o professor de Educação Física Inezil Penna Marinho, pertencente à primeira geração de discípulos de 1940 (SILVA, 2002). 49 Penna Marinho foi o autor de uma monografia intitulada “Subsídios para o estudo da metodologia do treinamento da capoeiragem”, vencedora de um concurso de trabalhos sobre Educação Física promovido pelo Ministério da Educação e da Saúde, em 1944 (PIRES, 2001). Segundo Silva (2002, p.133) a intenção do livro de
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