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apostila 09

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1 
SUMÁRIO 
 
1 A ESCOLHA DO CÔNJUGE ....................................................................... 2 
1.1 Motivações transgeracionais ................................................................ 8 
1.2 A escolha conjugal ............................................................................. 10 
2 TERAPIA FAMILIAR ................................................................................. 13 
3 A CONSULTA PSICOLÓGICA DA TERAPIA FAMILIAR .......................... 20 
4 MODELOS DE FAMÍLIA E INTERVENÇÃO TERAPÊUTICA: RELATO DOS 
TERAPEUTAS DE FAMÍLIA ...................................................................................... 25 
4.1 Técnicas terapêuticas em situações de violência intra-familiar .......... 41 
BIBLIOGRAFIA ............................................................................................... 46 
 
 
 
 
2 
1 A ESCOLHA DO CÔNJUGE 
 
Fonte: palavradedeus.co 
O estudo do inconsciente coloca-nos diante de um paradoxo, pois mostra que 
o homem não tem o poder de decisão que imagina ter, mas também não pode ino-
centar-se, atribuindo seus sucessos e insucessos a agentes externos. A felicidade de 
um casamento não é obra do acaso, nem se encontra à mercê de forças do além. Por 
outro lado, a adoção de determinadas posturas e as diversas opções feitas ao longo 
da vida sofrem marcante influência de fatores internos, fora do alcance da consciên-
cia. 
Há elementos de importância fundamental na vida de uma pessoa, sobre os 
quais ela não tem a menor possibilidade de escolha. Ela não pode, por exemplo, es-
colher seus pais ou sua bagagem genética. Mas nem por isso lhe cabe considerar-se 
vítima ou privilegiada pelo destino. Ela estará sempre diante de uma questão básica: 
definir-se perante os estímulos que recebe, integrando os de origem externa com os 
de origem interna. 
É nesse sentido que se pode afirmar que, em larga escala, o homem é o autor 
de sua própria história. É preciso levar em conta, porém, que ele vai se encaminhar 
 
3 
de acordo com uma grande bagagem de motivos inconscientes, cuja influência é su-
mamente poderosa. 
O uso da liberdade é, comumente, muito mais limitado pelo próprio indivíduo 
do que pela realidade, em seu sentido mais amplo. Na medida em que alguém não se 
conhece e não tem adequadamente elaborados os seus conflitos infantis, neuróticos, 
inconscientes, cai facilmente nas armadilhas que armou, tornando-se prisioneiro de si 
mesmo. 
Um psicoterapeuta observa, em inúmeros casos, como os pacientes vão, gra-
dativamente, modificando sua história, ao se conhecerem melhor e ao travarem me-
lhores relações consigo mesmos e com seus objetos internos. Parece que se aperfei-
çoa a integração entre estas duas faces da mente, ou seja, entre emoção e razão. 
Esta é a mola mestra. 
A relação de um ser humano com outro ser humano e tudo o que ele faz na 
vida derivam sempre das relações que estabelece com o próprio self; ou seja, de seus 
registros pessoais, de suas crenças e dos recursos que desenvolveu, integrando sua 
bagagem genética com seus diferentes modelos e níveis de aprendizagem. 
O estudo teórico e prático da psicologia demonstra como passado, presente e 
futuro se entrelaçam, como estão permanentemente ligados. Basta um pequeno estí-
mulo significativo e o computador humano entra em ação. 
Não é possível ver, a olho nu, as conexões que ele efetiva. Tem-se apenas o 
resultado final e, na maior parte das vezes, as pessoas nem se preocupam em avaliar 
as relações de causa e efeito. Essas conexões são profundamente examinadas em 
uma psicanálise e em uma psicoterapia de orientação analítica. Ambas focalizam o 
indivíduo, sob o prisma de seu mundo interior. 
As terapias de abordagem sistêmica, por sua vez, visualizam especialmente 
“as inter-relações”, ou seja, o que se passa “entre” as pessoas significativamente vin-
culadas, levando--as a assumirem papéis e funções que as influenciam decisivamente 
em suas escolhas e no desenrolar de suas histórias em comum. Também as desco-
bertas mais recentes da psiconeurologia confirmam e enriquecem a compreensão de 
como funciona o homem, enquanto ser vivo individual e membro de diferentes siste-
mas humanos (família, comunidade, etc.). 
 
4 
 
Fonte: kdfrases.com 
As ciências se unem, dando margem a entendimentos cada vez mais amplos e 
mais profundos, em favor de uma melhor qualidade de vida. 
No presente trabalho, procura-se examinar tais elos entre passado, presente e 
futuro: entre o adulto e a criança que existe dentro deste adulto, entre homem e mu-
lher; entre razão e emoção. Do início ao fim, são poucas afirmativas radicais, pois a 
intenção é definir as tendências naturais, as alternativas mais prováveis. 
A psicologia seria impraticável se ficasse aferrada a princípios rígidos, a este-
reótipos. Nunca é demais lembrar que somos indivíduos e, como tal, somos únicos. 
Embora tenhamos muito em comum, nós somos, no máximo, semelhantes. Por isso 
se diz que o conhecimento do ser humano em geral fornece as pistas para o conheci-
mento do ser humano em particular. Por outro lado, a compreensão profunda de seres 
humanos em particular é fundamental para que se construam teorias a respeito do ser 
humano em geral. 
Aspectos como os modelos transmitidos pelas famílias de origem e a busca por 
similaridade ou por complementaridade são destacados como importantes motiva-
ções para essa escolha. 
Diferentes autores da abordagem familiar sistêmica partem do entendimento 
de que as relações ocorridas no sistema familiar envolvem motivações e conse-quên-
cias transgeracionais, não sendo diferente com a escolha conjugal. 
 
5 
Ângelo, 1995; Carter & McGoldrick,1995; Whitaker, 1990). Segundo esses au-
tores, essa escolha estaria relacionada aos modelos parentais: todo indivíduo, ao to-
mar como modelo seus pais, construiria um esquema da maneira de se relacionar 
com um parceiro. 
 
 
Fonte: amorqueeisso.blogspot.com.br 
Dessa forma, os valores e as expectativas de cada indivíduo, assim como as 
ideias de quais características seriam desejáveis no parceiro escolhido, são transmi-
tidos, em grande parte, pelas famílias de origem. 
Embora a questão da influência das famílias de origem não seja um dos tópicos 
a que mais os pesquisadores da área têm se dedicado, alguns achados merecem ser 
comentados. Wolfinger (2003) foi um dos pesquisadores que se dedicou a essa ques-
tão ao investigar os efeitos do divórcio parental sobre a escolha conjugal. 
Bereczkei et al. (2002) também abordaram essa influência ao estudarem as 
semelhanças físicas existentes entre o cônjuge de uma determinada pessoa e a figura 
parental do sexo oposto. Os autores apresentaram mais de trezentas fotos de famili-
ares e controles a juízes que identificaram um significativo índice de semelhanças 
entre noras e sogras, mais inclusive do que entre estas e seus próprios filhos. 
 
6 
 
Fonte: www.negociofeminino.com.br 
A influência das experiências familiares mostrou-se relevante, uma vez que ho-
mens que haviam sido rejeitados por suas mães durante a infância apresentaram me-
nor probabilidade de se casarem com mulheres semelhantes a elas. 
Apesar da ideia comum de que os opostos se atraem, um número significativo 
de estudos afirma que, de forma geral, as pessoas buscam aqueles que são similares 
a elas próprias. 
Encontrou-se essa similaridade nos mais diversos aspectos, tais como idade, 
raça, nível cultural, religião, preferências e, até mesmo, no que se refere a certas ca-
racterísticas físicas (Correia, 2003; Houts et al., 1996; Ingoldsby et al., 2003; Knox et 
al., 1997; Thiessen et al., 1997). Uma das formas de justificar tais semelhanças é a 
ideia de que as oportunidades de encontrar alguém similar nesses aspectos são faci-
litadas pelos tipos de locais frequentados, os quais, por si só, tenderiam a selecionar 
pessoas semelhantes. 
Não se pode, por outro lado, desprezara possibilidade de essas pessoas de-
sejarem e buscarem parceiros semelhantes a si próprias em certas características 
Zentner (2005) destaca, ainda, a importância de considerar as características ideal-
mente desejadas em um parceiro, visto que esses ideais tendem a influenciar a forma 
como os indivíduos avaliam a si mesmos e aos outros. 
 
7 
 
Fonte: blog.fernandolimafotos.com.br 
Em dois estudos desenvolvidos com estudantes universitários que preenche-
ram escalas para a avaliação da própria personalidade e das características deseja-
das em um parceiro, o autor constatou, ainda, que, embora haja uma tendência pela 
busca de traços de personalidade semelhantes aos próprios, esse desejo por simila-
ridade varia de acordo com as características consideradas e a própria personalidade 
do indivíduo. Dessa forma, alguns tipos de pessoas tenderiam a buscar certas carac-
terísticas semelhantes às suas enquanto outros priorizariam complementaridades. 
 
8 
1.1 Motivações transgeracionais 
 
Fonte: novotempo.com 
Percebe-se que as relações conjugais e familiares estão entrando num período 
distinto em comparação aos outros já vividos, mas Goldenberg (2001), diz que o mo-
delo de casamento tradicional ainda ocorre com a exceção de as escolhas serem fei-
tas com maior liberdade e as separações conjugais, com mais facilidade. De acordo 
com Féres-Carneiro (2005), o casamento carregado de romantismo em seu entorno, 
geralmente, esconde problemas que mais tarde tendem a emergir com crises difíceis 
de serem superadas. 
Tais problemas ocorrem quando os cônjuges enfrentam os distintos valores da 
cultura familiar herdada, podendo este ser o principal viés das causas dos conflitos e, 
muitas vezes, os casamentos se desfazem por motivos resultantes de disfuncionali-
dades da família de origem, que, por sua vez, desestabiliza o casamento (Féres-Car-
neiro, 1998; Groisman, 2006b). 
 
9 
 
Fonte: www.slideshare.net 
Os valores familiares constituídos por padrões comportamentais, crenças, prin-
cípios, ritos e costumes são levados de geração em geração (Féres-Carneiro, 2005; 
Zornig, 2010). O nosso psiquismo registra as raízes familiares, transmitidas por meio 
dos comportamentos, que permeiam as relações no presente e as delineiam para o 
futuro. Ao deparar-se com as divergências culturais familiares um do outro a relação 
se estabelece e se concretiza (Groisman, 2006). 
Nesse sentido, a abordagem sistêmica e psicanalítica, respectivamente, refe-
rida por Féres-Carneiro (2005); Magalhães e Féres-Carneiro (2007); Zorning (2010) 
classificam a família como possuidora de poder geracional, construindo em todos os 
seus membros transmissões psíquicas que são compartilhadas de maneira ampliada 
no seu sistema, de modo a constituir hierarquias e as demais relações sociais dentro 
desse funcionamento circular. 
 
10 
 
Fonte: comunidadecristaviva.blogspot.com.br 
Também Féres-Carneiro e Diniz Neto (2008) mostram, na dimensão sistêmica, 
a intergeracionalidade que apresenta a família como uma rede de influência mútua e 
com repetições, procurando estudar as delegações transmitidas e as lealdades estru-
turadas através de três gerações passadas, ou seja, na transgeracionalidade. 
Os estudos das histórias geracionais das famílias e suas repercussões no con-
texto da vida conjugal têm gerado tema de pesquisas e objeto de teorizações. Este 
estudo teve como objetivo investigar as percepções que homens e mulheres separa-
dos e divorciados têm sobre a influência das famílias de origem na escolha do cônjuge, 
na vida marital e na decisão da separação. 
1.2 A escolha conjugal 
A escolha conjugal circunscreve o lugar do sujeito na cadeia geracional, e é no 
momento do encontro amoroso que os elos geracionais dos parceiros se misturam e 
formam a matriz da conjugalidade. Os parceiros são inconscientemente impulsiona-
dos no sentido da realização de mandatos familiares transmitidos (Féres-Carneiro & 
Ziviani, 2010). 
O lugar que o casamento dos genitores ocupa nos projetos de vida de seus 
filhos se entrelaça nos modelos de transmissão psíquica familiar. A maneira como os 
 
11 
filhos se aproximam de suas heranças familiares influencia-os nas suas trajetórias de 
vida futura amorosa (Magalhães & Féres-Carneiro, 2007). 
 
Fonte: www.semprefamilia.com.br 
Os discursos a seguir evidenciam o reflexo da família de origem diante da es-
colha do parceiro. A busca por semelhanças com seus genitores estimulou a escolha 
de seus companheiros, revelando características similares quanto aos cuidados dos 
pais na criação e no modo de tratamento entre si. 
"O comportamento que ela tinha comigo parecia o comportamento que minha 
mãe tinha com o meu pai..." (M.1). 
"... eu poderia dizer que o jeito dela eu achei na minha mãe, mas são senti-
mentos bem diferentes. Sinceramente queria buscar uma mãe, uma mulher 
e uma amiga ao mesmo tempo..." (M.2). 
"O meu pai se parecia no sentido do tratamento em si, da parte carinhosa, 
não sei. Os erros que o meu pai apontava em mim eu percebia que ele tam-
bém apontava, nesse sentido assim. E às vezes eu buscava uma referência 
como eu, estava aqui e não tinha mais a minha família por perto, aí ele aca-
bava sendo toda a minha família, toda a minha referência. Então eu tinha que 
me apoiar nele..." (F.4). 
Conforme Anton (2000), não é por acaso que diversas opções feitas ao longo 
da vida e determinadas posturas no seu decorrer resultam em influências de fatores 
internos, longe da consciência, capazes de contribuir na escolha do cônjuge. Por isso 
pode se dizer que apesar da escolha do cônjuge trazer projeções inconscientes a 
pessoa tem liberdade consciente relativa, pois está imersa a muitas expectativas pes-
soais, sociais e familiares, sendo fortemente influenciada pelas transmissões familia-
res (Rolim & Wendling, 2013). 
 
12 
 
Fonte: ascom.ufpa.br 
Logo, surgem as percepções de que os mandatos familiares decidem pela con-
solidação desse enlace: 
"Daí eu engravidei e nós casamos. Meu pai fez a gente casar, na época era 
assim que funcionava..." (F.3). 
"A minha família me incentivou a casar com ele mais do que eu queria casar. 
Então foi mais por incentivo da minha família o meu casamento com ele, e, 
não por mim mesma" (F.6). 
"... a mãe dela queria que ela casasse comigo porque as famílias se conhe-
ciam e a mãe dela sabia que a minha família era uma família boa, né. ... Mas 
ela casou comigo não gostando de mim, digamos assim" (M.4). 
"... Eu engravidei na época. Há 26 anos não tinha muito que se fazer. ... tá 
namorando, engravidou, tem que casar. E se cabe falar aqui, na verdade, 
quando eu casei, eu já sabia que não era aquilo que eu queria, aquele en-
canto tinha acabado, mas como adolescente envolvia a família... Eu tinha 17 
anos quando engravidei, fui levada pelas circunstâncias mesmo... ele não ti-
nha nada a ver com algum familiar meu. Mesmo o conhecendo melhor depois 
de 12 anos de casada, nem em caráter, personalidade, não reconheço nin-
guém da minha família, não..." (F.5). 
A influência familiar pela decisão do enlace marital aparece nos relatos acima. 
As falas remetem às incumbências valorativas da família de origem frente à situação, 
sem consentir qualquer tipo de escolha na decisão idiossincrática desses sujeitos. 
Assim, a família, muitas vezes, decide por todos e tem suas regras, ainda que seja 
outra, a vontade de seus membros. 
Observou-se nas narrativas seguintes, diferenças percebidas à fase inicial, o 
namoro, e pelo transcorrer do matrimonio: 
"No começo era ótimo, mas depois foi complicando" (M.1). 
"... eu sinto falta da pessoa que eu conheci. Porque ele modificou muito com 
o tempo" (F.2). 
 
13 
"A atenção do começo com a pessoa, tanto eu me doando pra pessoa quanto 
ela se doando, é bem diferente do meio pro fim" (F.4). 
A respeito destas transcrições, Barthes (2003) explana que, todo o relaciona-
mento amoroso é um drama, pois no início da relaçãoamorosa tudo parece mágico. 
Na primeira fase do "amor", as duas pessoas não vivenciaram conflitos, confrontos 
intrínsecos característicos do relacionamento diário. 
Percebe-se, então, a discrepância no momento de iniciação do namoro para a 
convivência no enlace marital, frente às peculiaridades em cada fase, ou seja, os con-
flitos inicialmente se reduzem e facilmente se resolvem, ou nem chegam a acontecer. 
Depois, acontece o contrário, os parceiros não conseguem se conservar os mesmos, 
(Groisman, 2006a). 
Não conseguem e talvez nem poderiam, pois com o acúmulo dos diferentes 
papéis (conjugal e parental entre outros) e as demandas inerentes ao papel parental 
são grandes desafios aos casais (Bottoli et al, 2012). 
2 TERAPIA FAMILIAR 
 
Fonte: www.curandosuavida.com.br 
Família é definida como um grupo de indivíduos unidos por laços transgeracio-
nais e interdependentes quanto aos elementos fundamentais da vida. Freud e seus 
sucessores referem-se aos membros da família enquanto atores no desenvolvimento 
 
14 
psíquico de um indivíduo, mas não se referem a qualquer teoria psicanalítica da famí-
lia enquanto grupo. (Doron & Parot, 2001). 
A terapia familiar baseia a sua intervenção na família enquanto sistema, com-
posto por elementos que possuem relações de interdependência entre si e que pro-
movem o desenvolvimento uns dos outros. A terapia familiar centra-se na família como 
um todo, não a considerando como uma mera soma das suas partes: tudo que acon-
tece num elemento irá afetar os outros elementos. 
 
 
Fonte: setimodia.wordpress.com 
A terapia familiar surgiu dos problemas da clínica psiquiátrica ligados a certos 
impasses pragmáticos que a realidade quotidiana colocava aos terapeutas. Aparece 
como um recurso diante de realidades inextrincáveis por meio da criação de aconte-
cimentos singulares; inscrevendo-se no tempo e no espaço; modificando a evolução 
espontânea da família; estabelecendo uma conexão entre a semiologia do corpo e a 
do espírito; dos modos de conduta, emoção e pensamento de microssistemas famili-
ares em sofrimento. 
A terapia familiar é composta por vários modelos, em que cada um deve ser 
visto como um sistema em si mesmo que funcionam como uma espécie de quadro, 
de guia de leitura e intervenção que fixa o objeto de estudo sem se confundir com ele 
(Miermont,1994). 
As terapias familiares correspondem a tratamentos psicoterapêuticos ou socio-
terapêuticos da família que apresenta dificuldades ligadas a um ou mais pacientes 
 
15 
reconhecidos socialmente como doentes. A conjunção-disjunção dos aspetos psíqui-
cos e sociais reflete-se nas divergências de pontos de vista entre modelos psicanalí-
ticose (sócio) sistémicos, sem que seja possível permanecer muito tempo num envol-
vimento puramente dicotômico, maniqueísta e exclusivo da ação e da reflexão a esse 
respeito (Miermont, 1994). 
 
 
Fonte: braincoachingperu.wordpress.com 
O termo remete para um conjunto de práticas e de teorias no contexto das quais 
são colocados problemas individuais, familiares e sociais; transtornos do comporta-
mento, atos de delito; violência familiar e social; confrontos interinstitucionais ou trans-
culturais. A finalidade da terapia familiar é atender as pessoas doentes em conjunto 
com a sua família, tratar da família, dos seus membros e do seu ambiente (Miermont, 
1994). 
Enquanto entidade, a terapia familiar é atravessada por inúmeras correntes 
aparentemente contraditórias (psicanalíticas, sistêmicas, comportamentais, gestálti-
cas, etológicas, sociológicas, etc.), supondo sempre um trabalho prévio de indicações 
e contra-indicações. Da estrutura interna da terapia familiar podemos salientar três 
aspetos unificadores: 
 A necessidade que o terapeuta tem de se apoiar numa teoria da família que 
tem de ter sempre em consideração a dinâmica familiar e o seu processo de 
mudança; a organização das relações interpessoais e uma concepção sobre a 
 
16 
saúde mental vs patologia da família, à qual se irão ajustar os procedimentos 
técnicos; 
 O processo terapêutico pode ser definido como a psicoterapia de um sistema 
social natural, tendo, frequentemente, na base a entrevista interpessoal con-
junta. Aqui o terapeuta deve assinalar quais os elementos da família que parti-
cipam na entrevista, em função do seu posicionamento teórico ou da própria 
fase e vicissitudes do processo terapêutico. O ritmo, periodicidade, número, 
duração e espaçamento das sessões variam em função dos modelos (Relvas, 
1999); 
 O setting especifico da terapia familiar converte-se num instrumento terapêutico 
por excelência. O suporte instrumental do terapeuta engloba: técnicas particu-
lares; suporte de análise do caso e do processo e ainda na formação e super-
visão. (Fontaine, 1993; Bleandonu, 1986, Heivil, 1984). 
 
Apesar das várias teorias subjacentes na área da terapia familiar, esta continuou 
a ser vista como um sistema que integra influências externas, mas que não está de-
pendente delas, ao mesmo tempo que existem forças internas que contribuem para a 
sua regulação, conferindo-lhe uma capacidade auto - organizativa, coerência e con-
sistência no jogo de equilíbrios dinâmicos interior-exterior. 
 Quanto à criação do sistema terapêutico: o terapeuta deixa de ser um mero 
observador neutro e exterior ao sistema, passando a ser encarado como um observa-
dor-participante na realidade em construção de acordo com a teoria dos sistemas, 
implicando sempre uma acoplagem de dois sistemas (terapeuta e família) que se per-
turbam mutuamente. 
 
17 
 
Fonte: psicologospozuelo.es 
A terapia familiar, embora formada por várias correntes, com concepções muito 
diferentes entre si, não se descurou do seu elemento principal: a família, enquanto 
agente de mudança e com poder para mudar o seu funcionamento e progredir ao 
longo do seu ciclo vital. Hoje, sabe-se que a família é entendida como um sistema em 
constante transformação e mudança, devendo estes dois pontos nunca ser esqueci-
dos numa situação de intervenção terapêutica. 
A família é um todo que não pode, nem deve, ser dissociado das suas partes, 
em que todos os seus elementos contribuem, de igual modo, para o seu desenvolvi-
mento e bom funcionamento. 
A concepção de família até aqui apresentada respeita a atual noção de sistema 
entendido como um conjunto ativo, estruturado, que se define em função das diferen-
ças que apresenta na relação com os contextos em que vive e nas finalidades que 
constituem a sua razão de existir. 
Relação e organização são as palavras-chave deste conceito, correspondendo, 
respectivamente, às capacidades interativas (circularidade, retroatividade) e auto - or-
ganizativa dos sistemas (Relvas, 2000). 
 
18 
 
Fonte: mingailustradoras.blogspot.com.br 
A terapia familiar mostrou que a família deve ser entendida na sua globalidade, 
ou seja, como sistema que cria através de relações e interações algo único e não 
sobreponível à soma das pessoas que a compõem. Por outras palavras, permitiu des-
cobrir como os indivíduos, as suas famílias e o seu sofrimento não podem ser isolados 
ou desligados dos contextos de vida em que participam, quer eles sejam privados ou 
mais sociais e comunitários. 
Não se deve ignorar que tudo isto deve ser relacionado com o presente, ao 
mesmo tempo que não pode ser dissociado da sua própria história individual e familiar 
(Relvas, 2002). 
A família é um sistema em constante transformação e que se adapta às dife-
rentes exigências das diversas fases do seu ciclo de desenvolvimento, assim como 
às mudanças e solicitações sociais com o fim de assegurar a continuidade e o cresci-
mento psicossocial dos seus membros. 
 Esta continuidade e crescimento desenvolvem-se através de um equilíbrio di-
nâmico entre duas funções: a tendência homeostática e a capacidade de transforma-
ção, isto é, circuitos retroativos agem através de um mecanismo de feedbackem di-
reção à manutenção da homeostasia (retroação negativa) ou em direção à mudança 
(retroação positiva). 
 
19 
 
Fonte: terapiacasalefamilia.blogspot.com.br 
Esta ideia da família como um sistema em constante transformação remete 
para a ideia de mudança, ou seja, cada família vai se transformando ao longo do seu 
tempo de vida em três aspetos fundamentais: estrutural, interacional e funcional. Cada 
família nuclear percorre um ciclo vital, marcado por etapas desenvolvimentais, carac-
terizado pela prossecução de objetivos específicos que concorrem para a obtenção 
de um único objetivo: a sobrevivência do sistema familiar. 
A mudança é um conceito fundamental para se perceber a família numa pers-
pectiva sistêmica, aparecendo associada ao fator tempo processual e familiar, no qual 
os diversos momentos estruturais da família se vão articulando progressivamente. 
Não se trata de uma mudança oposta à não mudança, já que a estabilidade 
não significa uma paragem na evolução da vida do sistema familiar, dado que estabi-
lidade e mudança são duas faces da mesma moeda: uma família encontra-se em mu-
dança permanente. 
Assim sendo, os momentos de mudança correspondem às chamadas crises, 
definidas por Minuchin (1974) como uma ocasião de evolução e risco de patologia. As 
crises, embora impliquem stress, não se relacionam com o caráter agradável ou de-
sagradável, nem com a carga afetiva negativa de determinada situação ou etapa da 
vida familiar. As crises podem relacionar-se com as exigências de mudanças internas 
ou externas, com as tarefas normativas do evoluir familiar (etapas do ciclo vital) ou 
com situações e fontes de stress acidentais que, de algum modo, intersectam ou co-
lidem com o caminho da família ao longo do seu ciclo de vida (Relvas, 2000). 
 
20 
Em suma, terapia familiar teve o mérito de fornecer todo um conjunto de técni-
cas específicas de intervenção que, acopladas à entrevista familiar conjunta baseada 
na circularidade, se constituiu como um meio para a atualização de estratégias que 
se propõem a perseguir os objetivos terapêuticos definidos pelo conjunto de clientes 
e terapeuta. 
3 A CONSULTA PSICOLÓGICA DA TERAPIA FAMILIAR1 
 
Fonte: www.cesfi.com.br 
A terapia familiar, no âmbito da consulta psicológica, irá atravessar diversas 
etapas que vão conduzir à concretização de um determinado objetivo. Optar por uma 
intervenção sistémica leva a que a família deva ser entendida e analisada como um 
todo, em que se um membro tem um determinado problema, toda a família contribui 
para a sua manutenção ou resolução. 
Ao contrário do que se possa pensar, a terapia familiar não passa logo para 
uma abordagem centrada na família: irá partir do particular, do individual, do paciente 
identificado para delinear uma intervenção centrada e para a família. Partindo dos 
pressupostos sistêmicos, torna-se necessário ressaltar as razões pelas quais se deve 
partir de uma abordagem individual para uma abordagem familiar. Significa que terá 
que ser adotado um modelo conceitual que nos leva do mundo interior, dos processos 
intrapsíquicos, para um mundo de comportamentos interativos observados no seu 
contexto temporal e espacial. 
 
1Texto extraído: http://unesav.com.br/ckfinder/userfiles/files/Resenha%20do%20texto.pdf 
 
21 
A abordagem sistêmica está mais virada para o estudo dos acontecimentos e 
das pessoas em detrimento da dinâmica interativa e não tanto para os seus significa-
dos intrínsecos (Andolfi, 1995). Ao adotar os pressupostos sistêmicos, toda a família 
irá ser concebida como um ser vivo, um sistema autônomo, auto organizado que tenta 
progredir ao longo do seu ciclo de vida. 
 Este “organismo” está em estreita relação com outros sistemas, cada um com-
posto por diferentes elementos: escola, grupo cultural ou social, nação, bairro, em-
prego. Desta forma, quando uma pessoa chega à consulta com algum problema, este 
encontra-se em toda a família, ou seja, dela dependerá a forma como ele será resol-
vido e quais os recursos que dispõe para que tal seja possível (Sidelski, 2000). 
 
Fonte: fomentocomunitario.wordpress.com 
Desta forma, a intervenção sistêmica defende que o terapeuta deve convocar 
toda a família, procurando estabelecer, desde logo, uma atmosfera de cooperação e 
confidencialidade (Andolfi, 1995). 
Falar do processo terapêutico em terapia familiar é um pouco complexo e quase 
impossível de fazer de modo genérico, ou seja, o sistema constituído pelo todo teórico-
epistemológico previamente referido compõe-se de vários subsistemas com pressu-
postos particulares e técnicas específicas. 
 
22 
 
Fonte: casalefamiliaaovivo.com.br 
Contudo, existem alguns elementos que se podem ressaltar do todo que é a 
terapia familiar. A necessidade que o terapeuta tem de se apoiar numa teoria da fa-
mília deve satisfazer os seguintes requisitos: 
1.Descrever e explicar a estrutura familiar, a sua dinâmica, processo e mu-
dança; 
2.Descrever as estruturas interpessoais e as dinâmicas emocionais dentro da 
família; 
3.Ter em conta a família como ligação entre o individual e a cultura; 
4.Descrever o processo de individuação e a diferenciação dos membros da fa-
mília; 
5.Prever a saúde e a patologia dentro da família, isto é, ter um conjunto de 
hipóteses acerca do funcionamento familiar e das causas da disfunção; 
6.Prescrever estratégias terapêuticas para lidar com a disfunção familiar. (cit. 
em Gameiro, 1992). 
Então, o processo terapêutico pode ser definido como a psicoterapia de um 
sistema social natural, a família, utilizando como técnica base a entrevista interpessoal 
conjunta (cit. Relvas, 2000: 29). 
A família e o terapeuta passam a formar o sistema terapêutico, numa acopla-
gem em que cada qual mantém intacta a sua organização e autonomia. Desta forma, 
a psicoterapia vai-se desenrolando através da realização de diversas entrevistas com 
 
23 
os elementos da família, pontuados pelo terapeuta como importantes no contexto em 
que surge o sintoma. 
 
Fonte: psicologasp.com/terapia-de-casal 
O terapeuta pode trabalhar diretamente com um só indivíduo, com um ou mais 
subsistemas. O ritmo e periodicidade das entrevistas variam conforme o terapeuta, 
podem ser mais ou menos espaçadas, regulares ou não. Ao longo de todo este pro-
cesso, vão-se utilizando técnicas próprias de cada modelo, aplicadas de forma pes-
soal por cada terapeuta, tendo como objetivo último a mudança da estrutura da famí-
lia, ou seja, a mudança da forma como mantém a sua organização. 
Quanto ao papel do terapeuta e à formação, nas palavras de Andolfi (1980) 
será sempre um “encenador do drama familiar” no sentido em que, conjuntamente 
com a família e aproveitando o seu potencial de mudança, vai reestruturando o “guião” 
que esta lhe apresenta, relativo ao seu vivido familiar, num cenário à partida modifi-
cado pela sua inclusão de um novo elemento da cena. Exerce um papel ativo, mas 
que não procura impor à família uma realidade que é dele. 
Rigorosamente, deve-se falar em terapia com a família e nunca de uma terapia 
da família. (Relvas, 2000). Assim sendo, a atitude do terapeuta não é a de tentar ex-
plicar um indivíduo, observado isoladamente, sobre o qual realizará inferências, mas 
sim de um participante num processo ativo que parte das observações das interações 
entre os membros da família e entre esta com os outros sistemas que com ela intera-
gem. 
 
24 
É este terapeuta, como agente de mudança, que favorece a amplificação das 
flutuações do sistema, de modo a que este, através da reestruturação, evolua para 
um novo nível de estabilidade: mais diretivo, provocador e consultor. 
Em que situações deverá recorrer a uma Terapia Conjugal? 
A intervenção terapêutica é centrada no relacionamento amoroso e procura: 
Enriquecer os comportamentos positivos; 
Enriquecer a capacidade comunicativa com o cônjuge;Desenvolver habilidades de resolução nos conflitos do dia-a-dia; 
Resolver divergências na educação dos filhos; 
Mudar padrões de comportamentos que levam à discórdia conjugal; 
Resolver situações associadas a ciúmes e traição; 
Aliviar problemas relacionados com insatisfação sexual; 
Reestruturar padrões de pensamentos disfuncionais e prejudiciais; 
Procurar a diminuição progressiva dos conflitos destrutivos (discussões, intole-
rância e irritabilidade na relação); 
Tentativa de salvar o relacionamento antes de haver uma decisão de separação 
do casal; 
Avaliar crenças quanto ao relacionamento; 
Resolução de situações associadas ao divórcio. 
 
 
Fonte: mundomulheres.com 
 
25 
4 MODELOS DE FAMÍLIA E INTERVENÇÃO TERAPÊUTICA: RELATO DOS TE-
RAPEUTAS DE FAMÍLIA2 
 
Fonte: sinergiamt.com.br 
Salvador Minuchin, psiquiatra, terapeuta de família da Escola Estrutural, com-
preende a família pela forma predominantemente nuclear, fundamentado no biológico, 
coadunando-se com a posição dos terapeutas acima referidos. Minuchin é insistente 
quanto a importância do terapeuta possuir uma definição teórica de família que per-
mita um nexo com a ideia de intervenção terapêutica, demonstrando assim a forte 
ligação entre ambos. 
Resumimos as ideias de Minuchin, que configuram a relação familiar a partir da 
relação conjugal: o casal, ao se constituir, precisa separar-se de suas relações ante-
riores, principalmente com os respectivos pais, isto é, “o investimento no casamento 
é feito a expensas de outras relações”; o casamento é um primeiro momento em que 
os participantes irão confirmar ou não suas novas identidades; “um contexto poderoso 
para confirmação e desqualificação”; “refúgio para as tensões de fora” (Minuchin, 
1990b, p. 27). 
Pelo descrito, percebe-se a necessidade da constituição familiar, iniciada pelo 
casal, separar-se como um núcleo isolado e diferenciado. 
 
2Texto extraído: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-29072003000200004 
 
26 
 
Fonte: sinergiamt.com.br 
A terapia de família, por consequência, visa a separar as fronteiras com o ex-
terior, nos casos em que o casal tenha essa dificuldade específica. Com a chegada 
dos filhos, o casal adquire uma nova função: a parental, que caracteriza a família como 
“uma instituição para educar as crianças”, sendo a vida familiar dependente “de um 
sólido vínculo de casal” (Minuchin, 1995a, p. 202). 
É nesse momento que surgem mais especificamente as tarefas ligadas à soci-
alização; a família exerce seu lugar de “matriz da identidade”, possibilitando a seus 
membros a experiência de pertinência a um grupo, assim como a experiência de sua 
separação, de sua autonomia. Entre pais e filhos, como entre o casal e o mundo ex-
terior, é preciso que existam fronteiras bem definidas e reguladas por regras que de-
terminam quem e como se participadas relações familiares. 
É indubitavelmente uma definição da família conjugal, constituída na moderni-
dade. 
 
27 
 
Fonte: vladimirmelo.com.br 
As mudanças impostas pelas novas tecnologias de reprodução refletem na fa-
mília, possibilitando novas transformações, mas sua participação social como um 
grupo que cuida de um ser dependente permanece e permanecerá. Outras formas de 
cuidado poderão surgir, ainda que os papéis familiares não continuem os mesmos. 
Mantém-se assim a ideia de proteção fornecida por esse grupo formador das 
identidades pessoais, seja ele biológico ou não. O processo da construção da perso-
nalidade permanece localizado no interior da família e da convivência íntima, apesar 
das transformações sociais. 
 
28 
 
Fonte: institutosalgado.com.br 
Na Abordagem Estrutural visualizamos a ênfase na família nuclear, caracteri-
zando uma concepção moderna. Minuchin corrobora a afirmação de que a família é a 
melhor maneira para criar indivíduos autônomos, gerando estabilidade interior, diante 
da constante mutação do mundo exterior à família. 
Ela é, portanto, o meio mais eficaz de manutenção da sociedade enquanto pro-
tege contra o mundo exterior. Para Minuchin (1990b), a família nuclear pode estar 
correndo riscos devido à sobrecarga de suas funções. Outro dos entrevistados apre-
senta como entende a família, ressaltando esse aspecto nuclear e de proteção: 
“...as pessoas estão dentro dessa cultura... que eu não sei se vai acabar... 
elas se agregam.É que precisam de um pacto de solidariedade, cumplicidade, 
um oásis, do anonimato do mundo, digamos, fora. Então eu acho que as pes-
soas vão se vinculando e escolhendo os seus parceiros por essa jornada. Por 
essa caminhada ao longo da vida. Eu acho que aí é importante ter esse nú-
cleo para ir gerando uma outra geração e acompanhar essa outra geração...” 
A “família ampla”, por sua vez, é uma forma bem adaptada a situações de es-
tresse e carência, na qual as funções são compartilhadas envolvendo membros da 
família extensa. Essa forma de funcionar é entendida por Minuchin como uma res-
posta às situações de pobreza, podendo ou não caracterizar estruturas familiares pa-
togênicas com fronteiras não definidas. 
 
29 
 
Fonte: alchetron.com 
Minuchin é conhecido por seu trabalho com famílias carentes, às quais se atri-
bui uma configuração extensa em oposição ao modelo nuclear, vinculado ao aburgue-
samento e à industrialização das grandes cidades. Entretanto, mesmo considerando 
tipos diferenciados de família, sua intervenção sempre privilegia uma constituição fa-
miliar que defina suas fronteiras ao constituir-se em separado. Afirma o autor: 
Prefiro trabalhar com a família nuclear, algumas vezes modificando a composi-
ção do grupo (diferentes subsistemas: casal, pai e filho, irmãos etc). (...) Em algumas 
famílias (porém), o trabalho com membros significativos da família ampla é importante 
(Minuchin, 1990a, p. 139). 
Em outro texto, ao abordar o trabalho com famílias amplas, Minuchin relativiza 
a afirmação anterior, sugerindo ao terapeuta uma maior flexibilidade para não separar 
completamente uma avó e seu neto, quando a avó cumpre funções parentais. Pode-
se observar a diferenciação das funções sem correr o risco de uma separação mais 
prejudicial que terapêutica, e sem transformar essa família necessariamente no re-
flexo do modelo nuclear: “a influência da família extensa nas funções da família nu-
clear nunca deverá ser subestimada” (1990b, p. 61). 
A mesma ênfase quanto à delimitação das fronteiras encontra-se na situação 
de famílias que se constituem por meio de um segundo casamento, um recasamento. 
Dessa vez, porém, as fronteiras referem-se às relações entre pais e filhos. 
 
30 
 
Fonte: psicologiaacolher.com.br 
Os estudos sobre famílias por recasamento mostram a importância crítica de 
se reforçar os vínculos entre os parceiros recasados, e não deixar que as clamorosas 
necessidades dos filhos destruam a intimidade do novo casamento. Cada novo casal 
precisa ter um tempo para namorar sozinho (tempo para as crianças serem crianças 
e para os casais ficarem sozinhos) (Minuchin, 1995a, p. 203). 
Outro de nossos entrevistados também vê a família como uma união heteros-
sexual visando à procriação, mas levanta a questão trazida pelas “novas formas” que 
não se enquadram nessa visão. 
 
Fonte: www.ceoafe.com.br 
“A família sempre se forma com a união de duas pessoas, sendo essa união 
oficializada ou não. (...) Tradicionalmente essa união se deu entre diferentes 
sexos, mas atualmente existem certas uniões que estão se dando até entre 
homossexuais que adotam filhos, e que dessa forma estariam concebendo 
núcleos familiares... chamados atualmente de novas famílias” (T.7). 
 
31 
Durante os anos 60 e 70, quando várias escolas já tinham se consolidado, e 
uma nova revolução sexual realizava-se na sociedade, as situações de recasamento 
e de casais homossexuais tornaram-se visíveis, a partir dos debates advindos do mo-
vimentofeminista. Uma nova interpretação quanto à ligação entre os membros da 
família e o sistema social mais amplo foi oferecida pela Terapia de Família Feminista, 
que questionando a família nuclear, centrada no casal heterossexual e na criação de 
filhos, aponta para outras formas: famílias monoparentais, famílias compostas por ho-
mossexuais e seus filhos etc (Perelberg, 1994; Goodrich et al, 1990). 
A maior parte das outras formas de composição familiar ou era encarada como 
patológica ou era simplesmente invisível para eles (terapeutas americanos, homens 
brancos de classe média) (Rampage e Avis, 1998, p. 190). 
Assegurando a experiência da diversidade, as feministas ressaltam algumas 
características surgidas do modelo moderno de família nuclear, como a liberdade de 
escolha e a intimidade. O estabelecimento de um modelo fixo deve ser superado, de-
mocratizando ainda mais as relações familiares. 
Os pais devem ter autoridade sobre seus filhos, e ao mesmo tempo respeitar a 
igualdade entre os sexos. As relações familiares devem ser fundamentadas tanto na 
igualdade quanto no respeito às diferenças. Orientando o trabalho terapêutico e ca-
racterizando ainda a ideia de um modelo a seguir, as feministas mantêm uma defini-
ção do que seria uma família saudável. 
 
Fonte: coopedceara.wordpress.com 
 
32 
A partir de uma perspectiva feminista, a família saudável é aquela em que seus 
membros se encontram comprometidos com o estímulo do potencial de todos, com a 
evitação de todo tipo de exploração interpessoal, e com o recíproco oferecimento de 
apoio, cuidados, assistência e afeição (Rampage e Avis, 1998, p. 203). 
O exemplo seguinte indica como variadas posições podem estar presentes em 
um mesmo terapeuta, demonstrando a dificuldade, própria do relativismo pós-mo-
derno, de se buscar uma definição exclusiva de família. Despontam, por consequên-
cia, posições paradoxais: ao lado de variadas possibilidades de formas relacionais 
permanece uma configuração de família definida pelo surgimento de um filho. 
Maurizio Andolfi é conhecido por juntar diferentes referências: a Teoria Estru-
tural, com sua ênfase no presente, e a Teoria dos Sistemas Familiares de Bowen, 
voltada para o passado e para a família de origem, definindo a família como um campo 
emocional que abarca três gerações (Andolfi, 1980; 1989a; 1989b; 1996; 1998). 
 
Fonte: www.amaecoruja.com 
Essa conjugação pode ser observada no relato que se segue, e em uma citação 
de Andolfi. A família, mesmo quando desconhecida, é um fator determinante, tanto no 
 
33 
nível biológico quanto no simbólico, para a formação do indivíduo, gerando questões 
a respeito da pertinência ao grupo e da autonomia individual. 
Esta é uma visão diferenciada da família nuclear moderna, propondo uma saída 
e acentuando a importância da família de origem, porquanto sua influência se faz sen-
tir até na ausência. Não se diluindo completamente, as relações nucleares são per-
meadas pelas histórias de gerações anteriores. 
Quando falamos de família não podemos nos limitar a pensarmos em termos 
de genitores e filhos, devemos sempre ter uma visão mais ampla que leve em consi-
deração as gerações anteriores e as regras sociais próprias de cada época. De fato, 
a história das gerações que precederam o indivíduo é cheia de significados, mesmo 
quando não se atinge diretamente: é possível obter informações a partir das narrações 
dos próprios genitores, de seus hábitos de vida e de objetos que clarificam suas rela-
ções passadas; além disso, reexaminar a imagem de uma figura parental, mesmo que 
física ou emotivamente distante do núcleo familiar e torná-la viva dentro da dinâmica 
familiar, pode permitir uma releitura dos eventos (Andolfi, 1996, p. 56). 
 
Fonte: www.simplessolucoes.com.br 
Na terapia de família hoje existe um movimento acompanhando a propagação 
do pós-modernismo e do pós-estruturalismo, que nega qualquer noção de estrutura 
interna à família (Lax, 1998). Dessa forma, alguns terapeutas de família formados na 
Teoria dos Sistemas, como Harlene Anderson, Harry Goolishian e Lynn Hoffman, pas-
 
34 
sam a ter como referência a Hermenêutica, e a entender a terapia como uma conver-
sação, um diálogo intersubjetivo (Anderson e Goolishian, 1988; 1998). Originados de 
diferentes movimentos, o Construtivismo (vinculado à Biologia) e o Construcionismo 
Social (oriundo da Psicologia Social) caracterizam uma mudança que necessita ser 
mais pesquisada entre nós devido à sua diferenciação de autores tradicionais como 
Minuchin e Andolfi. 
Salvador Minuchin (1998), ao observar outros terapeutas de família, construti-
vistas e/ou construcionistas sociais em ação, pergunta-se onde estão as famílias nes-
sas intervenções terapêuticas. No início, a importância de uma teoria sobre família era 
acompanhada de uma proposta de intervenção. 
A Escola Estrutural, com sua técnica de delimitar fronteiras, vincula-se a um 
modelo de família constituído por um casal e seus filhos, conforme o modelo nuclear. 
Caso não haja uma delimitação nítida entre as fronteiras, o terapeuta tem a tarefa de 
ajudar a família a separar seus subsistemas, para que cada indivíduo cumpra seu 
papel, de acordo com seu pertencimento ao grupo familiar. 
 
Fonte: www.sincovat.org.br 
Hoje pouco se escreve sobre uma noção de família ou sobre uma proposta que 
se pretenda minimamente generalista; escreve-se muito sobre as variedades das for-
mas encontradas, caracterizando um relativismo exacerbado (Minuchin, 1991). Pouco 
se relaciona à construção da técnica uma ideia generalista de família; muito se propala 
 
35 
a respeito de técnicas específicas, aplicadas às situações familiares específicas, de 
acordo com situações e tipos de problemas (Nichols e Scwartz, 1998). 
A crítica de Minuchin (1991) dirige-se ao abandono da sistematização de teo-
rias, já que “constatou-se” não haver realidade “em si”. Ao se abrir mão da idéia de 
verdade, não há mais necessidade de produzir sistemas teóricos explicativos. Restam 
a experiência, a linguagem e a conversação entre o terapeuta e seus “clientes”. Su-
cede-se, desse modo, a transformação do saber especializado em experiência a ser 
compartilhada, tendo implicações quanto à construção do conhecimento e à prática 
clínica. 
 
Fonte: vivabem.band.uol.com.br 
A ênfase anteriormente estava no poder do terapeuta para gerar a mudança. 
Este poder sendo questionado é posto de lado, enquanto o poder da família ou do 
cliente para dirigir as mudanças que deseja passa a ser enfatizado. 
Salvador Minuchin costuma fazer constantes relações entre a autoridade dos 
pais e a tarefa do terapeuta. Com o desvanecimento do modelo de autoridade tradici-
onal, o patriarcal, ele é substituído por um modelo flexível e racional. 
Aumentam as dificuldades parentais no enfrentamento da “complexidade da 
educação infantil”. O reconhecimento dessa mudança ajuda a julgar imparcialmente 
os pais na execução de sua tarefa de ao mesmo tempo “proteger e guiar”, enquanto 
“controlam e reprimem”. Os filhos, por sua vez, devem crescer e tornar-se indivíduos 
autônomos, rejeitando e atacando os pais. O processo de socialização, portanto, 
 
36 
torna-se conflitante. O terapeuta deve buscar apoiar todos os membros da família 
(1995b). Nesta perspectiva, ele é o responsável pelo sistema terapêutico; assume a 
liderança e é “fonte de apoio e cuidados” (1990a). A família convida o terapeuta (es-
pecialista)a ajudá-la a mudar. 
É possível que haja divergências entre terapeuta e família quanto aos objetivos 
da terapia, mas o terapeuta, ao atender um pedido de ajuda – “mude-nos sem nos 
mudar” –, ampliará as alternativas do sistema desafiando as regras estabelecidas. 
Desafia, assim, a família em seu modo de experimentar a realidade. 
 Fonte: 
www.vilamulher.com.br 
O autor enfatiza a família como a “matriz da cura e do crescimento de seus 
membros”. Se, no entanto, o terapeutaobservar que a autonomia dos filhos está 
sendo tolhida, deverá ajudar a família a ter uma compreensão sobre as diferenças 
individuais, reconhecendo diversos estágios de desenvolvimento (1990a). 
Concluindo que o terapeuta de família é “um agente de mudança limitado”, Mi-
nuchin reconhece os perigos das imposições dos modelos do terapeuta. Faz parte de 
seu trabalho de especialista reconhecer suas imposições e limitações. Seu saber deve 
conformar-se aos “dramas familiares”, não buscando sua própria confirmação, e sim 
a autonomia do sistema familiar. 
 
37 
No primeiro relato, a seguir, o terapeuta intervém a partir de um modelo de 
família. Para que a terapia seja efetiva é preciso que a família se adapte a um modelo. 
No segundo, o terapeuta cumpre sua função dando lugar à família, tornando a 
terapia um espaço privado, de proteção e elaboração de conflitos. Em ambos encon-
tramos a perspectiva da presença ativa do especialista, característica de uma imagem 
que os terapeutas de família têm sobre si, principalmente em seu início histórico, que 
corrobora a visão moderna da intervenção. 
Eu não posso mexer com uma terapia familiar... sem ajudá-los a criar situa-
ções, a fazer modificações às vezes práticas, reais, dentro das casas, para 
poder ter essa estruturação de família” (T.2). 
“As famílias estão precisando de espaços onde elas estejam confortáveis, e 
a Terapia de Família é um desses espaços. A família perdeu um pouco de 
espaço na sociedade” (T.1). 
As primeiras escolas marcam sua diferença a partir de uma intervenção ativa 
do terapeuta de família, criticando a suposta passividade do psicanalista. No exemplo 
seguinte encontramos as duas posições no mesmo entrevistado. 
 
Fonte: www.acadadiaquepassa.com.br 
A expressão do cliente e a ação do terapeuta ganham prioridades diferentes, 
dependendo da intervenção a ser realizada. Na primeira posição, a passividade é por 
 
38 
vezes confundida com a ideia de neutralidade; supõe, de qualquer forma, um afasta-
mento do terapeuta. Já na segunda, a atividade do terapeuta corresponde a sua pre-
sença, e em poder para levar a família à mudança desejada. 
“Eu faço o seguinte, na psicanálise a situação é a pessoa que percebe os 
seus sentimentos, pensa e modifica. Na minha terapia familiar é exatamente 
o contrário. Eu introduzo uma modificação. Depois é que vai gerar um pensa-
mento sobre essa modificação (na família)” (T.2). 
A união da pessoa com o especialista é mais um dos temas recorrentes no 
campo da terapia de família. Podemos encontrá-la em Minuchin (1990b; 1995a), An-
dolfi (1996), Elkaïm (1990; 1998), entre outros. Cada encontro terapêutico cria mo-
mentos de participação conjunta. Nossos entrevistados contam essa história, levando-
nos da noção de especialista à ideia de uma pessoa real consolidada com os anos de 
experiência. 
 
 
Fonte: slideplayer.com.br 
O terapeuta, com seus recursos pessoais, para além de suas técnicas, ajuda a 
família a encontrar seus próprios recursos rumo à autonomia na resolução de seus 
problemas. 
“... eu diria que tem muito pouca diferença hoje em dia do que eu sou fora 
daqui, do que eu sou aqui dentro. Eu acho que, quando eu comecei, eu era 
talvez uma terapeuta mais engomadinha. Hoje em dia eu acho que estou 
muito confortável nesse lugar. Isso é uma conquista com a idade” (T.4). 
“Os recursos que eu posso usar, os meus, como pessoa, para ajudar aquela 
família. E de que maneiras eu posso, principalmente, ajudar uma família a 
descobrir os recursos que ela tem, não os meus técnicos. Os meus técnicos 
 
39 
são muito limitados. Terapeuta de família que usa sua técnica, ele tem... os 
seus instrumentos muito limitados. Ele tem que ajudar a família a desenvolver 
a sua técnica ou os seus recursos pra seguir... porque você não pode fazer 
milagre. Numa hora de sessão não consegue transformar as pessoas” (T.3). 
A trajetória da noção de especialista é exemplificada na formação de um dos 
entrevistados: de interventor, especialista que traz a melhor saída para o problema 
com seu saber teórico-técnico, transforma-se naquele que busca com a família uma 
“narrativa mais útil”. O ápice da relativização do especialista é exemplificado com um 
segundo relato, em que a terapia é vista como uma “conversa”. De um observador 
objetivo passa-se a um participante de uma conversação que constrói novas histórias. 
 
Fonte: pt.dreamstime.com 
“Depois da psicanálise, a descoberta da terapia sistêmica, depois a leitura 
contextual, aí ficar namorando um pouco aquele fascínio daquela coisa es-
tratégica que tinha um observador tão objetivo. (...) Hoje em dia eu sou muito 
mais cada um tem sua narrativa, constrói... Então o que vai ajudar o paciente 
é entrar na narrativa que não é útil pra ele e começar talvez a mexer com ela, 
e poder criar outra que seja mais útil pra necessidade dele naquele momento” 
(T.4). 
“Mas, quando você consegue transformar a situação grave numa conversa 
chata, a terapia de família está acontecendo. Mais pra linha do construtivismo 
mesmo” (T.5). 
Esses dois últimos relatos permitem-nos finalizar, referindo novamente ao mo-
vimento mais atual da terapia de família. 
 
40 
Se antes era possível pensar em uma imagem do terapeuta como conhecedor 
e especialista, agora a viabilidade do conhecimento – e, portanto, a possibilidade de 
vinculá-lo à oferta terapêutica – encontram-se questionados. A experiência de Lynn 
Hoffman ajuda-nos a compreender o que vem ocorrendo no campo. 
 (...) a evolução de minha posição superou minha capacidade de traduzi-la 
para a prática. Eu continuava a “pensar Zen”, mas nem sempre sabia como 
“agir Zen”. Foi então que um colega da Noruega, Tom Andersen, surgiu com 
uma ideia fascinante, embora simples: a Equipe Reflexiva (Andersen, 1987). 
O recurso de pedir que a família assista à discussão da equipe sobre ela e 
que depois comente o que ouviu mudou tudo subitamente. O profissional não 
era mais uma espécie protegida, observando famílias patológicas por trás de 
uma tela ou falando sobre elas na privacidade de um escritório. A premissa 
da Ciência Social normal de que o especialista tinha uma posição superior a 
partir da qual poderia ser feita uma avaliação correta desmoronou. Para mim, 
pelo menos, o mundo da terapia foi alterado da noite para o dia (Hoffman, 
1998a, p. 24). 
 
Fonte: gshow.globo.com 
Ao enfatizar o papel da linguagem, da conversação, da história e do self, o 
terapeuta ocupa uma posição de “não-saber”. O trabalho clínico deixa de estar base-
ado em narrativas teóricas preexistentes (Anderson e Goolishian, 1998). Anterior-
mente, as perguntas do terapeuta refletiam uma compreensão teórica do ser humano. 
Perguntando, o terapeuta ia gerando maior entendimento sobre a situação. Nessa 
nova postura, também conhecida como “postura narrativa”, as perguntas são geradas 
pelo “não-saber”, e o terapeuta deixa-se conduzir pelo conhecimento e experiência de 
seus clientes (Anderson e Goolishian, 1993). 
 
41 
O sentido é gerado localmente e fundamenta-se no diálogo. O “poder” do tera-
peuta advém de sua responsabilidade nos limites do domínio relacional/social, cons-
truído em cada sistema terapêutico (Fruggeri, 1998; Gergen e Warhus, 1999). A posi-
ção do especialista vê-se assim transformada tanto quanto as relações familiares, não 
exigindo mais uma teoria específica para uma intervenção terapêutica específica. 
4.1 Técnicas terapêuticas em situações de violência intra-familiar 
O trauma familiar relacional é caracterizado pela ocorrência de um evento trau-
mático intrafamiliar sendo percebido pela criança como uma ruptura ou violação do 
sentido de segurança física ou emocional por um de seus cuidadores, como pais al-
coolistas, testemunho de violência doméstica, abuso sexual, entre outros. A explora-
ção das rupturas relacionais se faz necessária para que seja possível o reforço das 
conexões relacionais e de apego entre os membros desta família na quala criança 
traumatizada está (Sheinberg & True, 2008). 
A manutenção da sintomatologia de trauma complexo decorrente de violência 
intrafamiliar se trata de uma resposta aos padrões de comportamento desadaptativos 
entre os membros da família (Kiser et al., 2010), a partir de expectativa de retorno do 
trauma, sentimentos de insegurança e dificuldades de lidar com suas próprias emo-
ções (van der Kolk, 2005). 
A exposição precoce à violência e o convívio diário com o agressor, concomi-
tantes à instabilidade dos relacionamentos parentais, geram alterações nas capacida-
des de relacionamento interpessoal e visão de mundo desses indivíduos. O contexto 
no qual o abuso ocorre pode afetar a recuperação do indivíduo após o evento, sendo 
o processo psicoterápico um recurso eficaz para a diminuição das consequências ne-
gativas pós-traumáticas (Stalker et al., 2005). 
 
 
42 
Fonte: www.monografias.com 
Salienta-se a relevância da terapia familiar para que seja possível identificar 
pontos fortes e fracos de suporte da família, habilidades parentais e demais caracte-
rísticas familiares que possam encorajar as estratégias de enfrentamento da criança 
abusada (Faust, 2000). 
Assim, a terapia familiar é uma abordagem de tratamento eficaz para membros 
de uma família expostos a abuso ou agressão física com sintomas pós-traumáticos, 
utilizando-se técnicas cognitivo-comportamentais. 
A ressignificação da memória e o desenvolvimento de estratégias de enfrenta-
mento e de comportamentos para o tempo presente integram as experiências traumá-
ticas através da transformação, incorporação e resolução destas memórias traumáti-
cas (Levin, 2009). 
Uma importante técnica narrativa para famí-lias traumatizadas é o “storytelling”. 
É entendido como “storytelling” o processo de engajamento da família em relatar as 
experiências vividas uns aos outros. 
Esta forma de narrativa proporciona uma discussão familiar terapêutica facili-
tada, leva à construção de uma teoria compartilhada por todos os membros sobre os 
eventos vivenciados e à razão pelas quais estes aconteceram, permitindo que cada 
membro visualize a história de vida da família através da sua perspectiva e da de 
outros membros, inclusive no que se refere às emoções, o que resulta em um enten-
dimento compartilhado e integrado dos eventos (Kiser et al., 2010) e da história auto-
biográfica da família. 
 
Fonteinfogr.am 
 
43 
A narrativa considera a singularidade das experiências do ser humano e a 
forma como incorpora e dá significado às mesmas através da consolidação destas 
vivências. Ao integrar eventos de vida, a pessoa tenta adequar estas vivências de 
acordo com suas crenças sobre o mundo, buscando significados que confirmem o que 
é percebido através da óptica destas crenças/significados. A partir da elaboração da 
narrativa, é possível que se estabeleçam trocas linguísticas com outros e, consequen-
temente, a elaboração dos significados. 
Partindo do pressuposto da narrativa terapêutica como estratégia para recons-
trução de memórias traumáticas e do uso da linha do tempo para buscar na história 
de vida eventos significativos desenvolvemos a técnica da linha de vida com uma fa-
mília em processo de psicoterapia breve devido a vivência de múltiplas violências. 
Essa técnica consiste na elaboração de um painel com papel pardo e canetões, de-
marcando temporalmente a ocorrência dos eventos traumáticos. 
A importância da ilustração dos eventos traumáticos de maneira organizada ao 
longo da história de vida familiar é baseada em interações entre tempo e espaço, 
sugerindo que seres humanos representam o tempo como espaço, de maneira unifi-
cada. 
 A terminologia linha do tempo mental (mental time line) é utilizada para dar 
conta das interações tempo-espaço, considerando que o tempo é representado em 
um continuum de uma extremidade a outra, sendo o tempo relativamente represen-
tado espacialmente, a partir de pontos ou intervalos de referência Técnicas de terapia 
cognitivo-comportamental familiar que perpassam o conceito sistêmico da circulari-
dade, tais como resolução de problemas, dramatizações e o uso da empatia, além da 
identificação de padrões de pensamento e comportamento transgeracionais que se 
mantêm, podem ser utilizadas, garantindo o questionamento e a mudança dos pa-
drões de pensamento identificados no contexto terapêutico. 
 
44 
 
Fonte: www.josemarbessa.com 
Ainda, ambas as práticas (sistêmica e cognitivo-comportamental) valorizam o 
processo de comunicação entre os familiares (Dattilio, 2011). Partindo disso, surge a 
psicoterapia familiar cognitivo-comportamental sistêmica (Dattilio; Nichols, 2011), a 
qual permite a utilização de habilidades para mediação de reações emocionalmente 
intensas, facilitando uma comunicação efetiva e a mudança do comportamento, viabi-
lizando o processo de mudança (Dattilio & Nichols, 2011). 
Trata-se a psicoterapia familiar cognitivo-comportamental-sistêmica de uma 
abordagem pouco divulgada e referenciada, no entanto, frequentemente presente na 
prática clínica. 
Essa nova abordagem psicoterápica integra a compreensão sistêmica do fun-
cionamento familiar, norteando intervenções terapêuticas durante a sessão. 
Aspectos cognitivo-comportamentais estruturam as sessões e as tarefas de 
casa, abrem espaço às demais técnicas cognitivas e comportamentais, e estabelecem 
objetivos claros quanto ao tratamento. 
Trabalhar o sistema familiar auxilia na reestruturação das distorções do histó-
rico de violência, potencializa recursos individuais e relacionais visando à ruptura de 
padrões de violência, sendo que a maneira como a família desempenha seus papéis 
 
45 
nas suas relações intrafamiliares inicia, mantém ou exacerba os problemas manifes-
tados pelo paciente identificado. Assim, o impacto do abuso pode ser diminuído por 
um contexto organizado e que oferece o suporte adequado (Friedberg, 2006). 
 
 
Fonte: familia.com.br 
 
 
46 
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