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Ecologia das Floresta Tropicais 1. INTRODUÇÃO O que são biomas? Imagine que você liga a televisão e está passando um filme com pessoas andando dentro de uma floresta exuberante como a da figura ao lado. Durante algum tempo você fica incerto se o filme se passa na África, na Amazônia, no México, na Índia ou na Indonésia. Demora um pouco para você descobrir, até que passa algum tipo de animal ou alguma peculiaridade da região. Por que locais tão distantes são tão parecidos? Esta semelhança não se restringe a florestas tropicais, há outros biomas no mundo, vejamos quais são eles e por que são semelhan- tes. Biomas são áreas que tem dimensões globais com vege- tações semelhantes (o mesmo “jeitão”) em continentes diferentes. As classificações dos biomas variam um pouco entre livros, adotamos aqui uma das mais comuns, um Uma floresta tropical, mas pouco modificada: onde? a) As florestas tropicais úmidas (FTU) São regiões com predomínio de florestas densas, isto é, as copas das árvores maiores formam uma camada fechada chamada dossel, a estratificação é complexa e a biomassa é alta. As árvores dominantes são de grande porte (25 a 45 m). Abaixo do dossel há um sub-bosque que contem jovens de árvores de dossel e árvores e arbustos adultos de sub-bosque (“floresta dentro da floresta”). Algumas árvores desenvolvem copas aci-ma do dossel, e são chamadas de emergentes. São florestas muito ricas em espé-cies e situadas nos Trópicos, onde o clima é quente e úmido o ano inteiro (ou com estação seca curta). Além das árvores, outras estratégias vegetais são abundantes, como trepadeiras, lianas, epífitas e ervas. Criptógamos como samambaias e musgos também são abundantes. b) floresta tropical semi-decídua (FTSD) semelhantes às FTU, mas ocorrem em áreas com estação seca um pouco mais longa. Um pouco menos altas e menos densas e com várias espécies de árvores que perdem folhas na época seca. Geralmente, possuem mais palmeiras de dossel e lianas que as FTU (florestas de palmeiras e florestas de cipós). A maioria das FTSD fica na periferia das FTU. c) floresta subtropical úmida (FSU) ocorrem em clima subtropical e são semelhantes às FTU, mas menos densas e com menor diversidade. A maioria das árvores preserva as suas folhas durante o inverno. 2 mony mony mony mony d) floresta temperada decídua (FTD) ocorrem em clima temperado, possuem poucas espécies de árvores, na maioria Angiospermas, e quase todas as árvores e arbustos perdem as suas folhas durante o inverno; e) florestas e Bosques esclerofilos (FBE) também ocorrem em clima temperado, mas do tipo mediterrâneo, que tem Época seca no verão. Por isto, as arvores mantêm as suas folhas durante o inverno. Estas folhas têm adaptações para resistir à falta de água que ocorre no inverno. É uma floresta com baixa diversidade com predomínio de An- giospermas. f) florestas de coníferas ou taiga, ocorrem em locais com invernos mais longos e extremos que a FTD e tem baixa diversidade de árvores, com pre- domínio de Gim- nospermas (pi- nheiros), cujas folhas se mantêm durante o inverno e geralmente tem forma de agu-lhas. g) savanas, formação aberta tropical, com predomínio de gramíneas (principalmente capim) e ciperáceas, normalmente intercalada de árvores e arbustos (inclusive com florestas de galerias próximas aos rios e riachos). A vegetação tem adaptações ao fogo, que é frequente neste bioma; C i n c o b i o m a s : f l o r e s t a t e m p e r a d a d e c í d u a ; d e s e r t o q u e n t e ; e s t e p e ; t n d r a e f l o r e s t a t r o p i c a l mony mony h) estepe- formação vegetal aberta de clima temperado, constituída por uma vasta planície desprovida de árvores, é comum no sudeste da Europa e da Ásia e no centro da América do Norte. ; i) tundra: Vegetação aberta das regiões polares onde o verão é curto e com temperaturas constantes. Não há árvores, apenas ervas, musgos e liquens. O solo da tundra permanece gelado o ano todo e a vegetação geralmente fica coberta pela neve boa parte do ano; j) deserto seco: áreas de baixa precipitação com vegetação escassa (ou ausente) caracterizada por adaptações morfológicas extremas contra a seca e/ou ciclos de vida adaptados a chuvas eventuais. I) deserto gelado. áreas extremamente frias onde a vegetação é ausente ou rara localizada nos polos e no topo das montanhas mais altas. Estas descrições são vagas, são só para se ter uma ideia. Nas aulas passaremos filmes em que veremos melhor o “jeitão” de cada bioma. Mas ver não basta, temos que entender o porquê de cada um ser como é. Os Biomas e o clima. Pelas descrições acima, já fica claro que os diferentes tipos de vegetação são determinados principalmente pelo clima, mesmo em vegeta- ções de locais distantes com composições de espécies muito diferentes. É o resultado de convergência evolutiva após evolução em condições semelhantes por muito tempo. Por exemplo, em regiões áridas as plantas precisam ter reservas de água e defesas contra animais interessados nesta água (e.g. espinhos e látex venenoso). Muitas famílias diferentes de plantas de lugares distantes evoluíram por milhares de anos nestas condições, por isto, não surpreende que o “jeitão” da vegetação seja o mesmo entre continentes distantes. A dependência dos biomas em relação ao clima pode ser observada na comparação dos mapas das distribuições dos biomas e dos climas de nosso planeta (figura da próxima página). São três os fatores climáticos principais que determinam a distribuição dos biomas: temperatura (calor), precipitação, e sazonalidade (ou estacionalidade) climática. (sazonalidade= variações ao longo do ano, que se repetem todos os anos aproximadamente da mesma forma no clima, nos ciclos de vida de animais e plantas, e no cotidiano humano). Sobreposição dos mapas dos Biomas e de climas. A semelhança entre os mapas reflete a estreita relação que existe entre clima e vegetação. O gráfico abaixo mostra quais os biomas esperados em função da temperatura média e da precipitação média de um local. Este gráfico é válido em geral, mas é uma simplificação, pois sabemos que é bem diferente um lugar com 1500 mm de chuva anual com chuva bem distribuída ao longo do ano comparado com um local que tivesse quase toda a chuva concentrada em poucos meses. No primeiro local provavelmente haveria uma floresta exuberante, enquanto no segundo provavelmente ha- mony veria uma vegetação rala e adaptada à seca. O mesmo pode se dizer da temperatura. Na tundra, o clima é frio com um verão curto e um inverno longo. No alto de uma grande montanha no Equador, o clima é frio, mas sem sazonalidade temperatura. Há diferenças entre estas duas situações frias, como veremos adiante. Portanto, para en- tendermos os Biomas, teremos que entender o que determina os diferen- tes climas da terra e a sazonalidade climática. Depois de olhar para cima para estudar o clima, olharemos para baixo para estudar o solo. O relevo e o tipo de solo influem na disponibilidade de água e nutrientes para as plantas. O relevo, porque afeta o clima local e porque determina a drenagem da água (isto é, como ela escorre por dentro do solo). E o tipo de solo, porque solos arenosos têm capacidade muito menor de reter água e nutrientes. Veremos o efeito do relevo sobre o clima e o solo no capítulo 3. O relevo também determina locais onde a água se acumula, formando ecossistemas complexos. A hidrologia é importante para entendermos estes ecossistemas, e será abordada no capítulo 4. Entender o clima e o solo é apenas a metade do caminho para começarmos a entendermos os biomas. Precisamos também entender as plantas e as sua diferentes necessidades e as estratégias que elas utilizam para sobreviver.Tanto árvores como musgos precisam de água, luz e nutrientes para completar seus ciclos de vida. Entretanto, árvores são diferentes de musgos. Cada tipo de planta tem sua estratégia para conseguir esta água, luz e nutriente e completar seu ciclo reproduzindo-se. E cada estratégia difere no seu sucesso de acordo com as condições bióticas e abióticas do meio. As diferentes estratégias das plantas. Biomas: transições graduais por fora e heterogêneos por dentro Os biomas não têm fronteiras definidas, isto é, de um bioma para outro vizinho costuma haver uma mudança gradual. Não podemos esquecer que a categorização em biomas é criação do homem. Ela reflete diferenças reais, mas os limites e o número de categorias são arbitrários. Por isto, vocês encontrarão diferentes classificações de biomas. Incluímos acima a floresta tropical semi-decídua, que não costuma ser incluída em outras classificações. O mais importante sobre os biomas não terem fronteiras é ressaltar que cada bioma não é uma entidade independente, completamente diferente dos demais e com lógica própria, como se fosse um país com línguas e leis diferentes dos vizinhos. Cada local é parte da biosfera e todas as plantas fazem essencialmente o mesmo. Além disto, ao categorizar os locais em biomas, temos a impressão que são unidades homogêneas, entretanto, temos de ressaltar que há variação dentro deles. Em alguns desertos há chuva eventual e uma flora e uma fauna bastante significativa, incluindo até anfíbios. Em outros, não há chuvas por décadas, e não encontramos praticamente nada. A Amazônia está no Bioma das florestas tropicais úmidas, entretanto, dentro deste bioma temos florestas de terra firme em platôs, florestas de terra firme em baixios, campinaranas, campinas, igapós e diversos tipos de várzeas. Por ser este o bioma em que vivemos, estudaremos os diferentes ecossistemas presentes na Amazônia nos capítulos 6 e 7. O que são ecossistemas e ecorregiões? Os biomas podem ser divididos em ecorregiões para detalhar a heterogeneidade que existe em cada um deles. O termo “Ecossistema” é definidos em alguns livros como “o maior sistema de interação, envolvendo organismos viventes e seu meio ambiente”. O termo “maior” é vago, pode significar a Biosfera, qualquer área de um bioma, uma ecorregião, e até mesmo uma pequena poça de água. O que importa ao se evocar o termo ecossistema é que estamos dando ênfase ao funcionamento deles e com a mente aberta para a sua complexidade, não é apenas uma descrição estática e restrita. Por exemplo, quando falamos "ops, pisei em uma poça de água", apenas pensamos nela como um local molhado onde podemos sujar os pés. Quando falamos no ecossistema poça de água, pensamos nos organismos que vivem lá, no fato que ela pode secar matando muitos deles, que tem uma quantidade de oxigênio alta ou baixa, que uns organismos alimentam-se de outros, que há épocas em que encontramos girinos lá, etc. Existem milhares de fenômenos ocorrendo numa poça de água, basta colocar uma gota em um microscópio para perceber isto. Descrever ecologicamente uma poça de água poderia até ser um trabalho para muitos anos, e pessoas diferentes irão destacar aspectos diferentes da ecologia da poça. Entretanto, a maioria das pessoas iria incluir nesta descrição fatores físicos como o tamanho da poça, sua profundidade, se ela seca ou congela parte do ano, o teor de oxigênio, pH, se a água é transparente ou não, e aspectos biológicos, como as espécies mais abundantes, quais espécies estão lá o ano todo e quais delas saem da poça (como os girinos e alguns insetos). Mas, principalmente, não poderíamos deixar de falar nos processos, como o que acontece quando cai o teor de oxigênio, como algumas espécies resistem quando a poça se seca, e as interações que ocorrem entre as espécies (predação, competição, mutualismo), e quais os problemas que estas espécies tem de resolver. Nesta apostila, quando falarmos de ecossistemas amazônicos, não estaremos falando de poças, ou de outros ecossistemas pequenos e médios, embora, na realidade também sejam ecossistemas amazônicos. Estaremos falando de ecossistemas maiores, como a várzea, os igapós, mangues, a floresta densa de terra firme, campináramos, campinas, savanas e outros. Os limites da várzea estão relacionados com as cheias dos grandes rios de água branca. A diversidade de ambientes na várzea é tão grande que não pode ser representada com uma única fotografia. Os outros ecossistemas podem ser razoavelmente ilustrados usando uma fotografia da vegetação. Usamos nomes de formações vegetais para nomear alguns ecossistemas, porque assim podemos reconhecer estes ecossistemas, mas não podemos esquecer que a descrição do ecossistema vai bem além da descrição da vegetação. 2. NOÇÕES DE CLIMATOLOGIA Vamos tomar a nossa região como referência. Por que o clima tropical é quente? E por que é úmido? Por que tem pouca sazonalidade térmica? Por que tem sazonalidade de chuvas? Nessa seção abordaremos as causas para os padrões climáticos globais. Entenderemos as tendências climáticas considerando a posição de cada lugar na terra. Por que é quente nos trópicos? Os trópicos recebem uma luz mais concentrada que latitudes mais altas porque a Terra é redonda. O sol está tão distante que podemos considerar seus raios paralelos. Um raio que incida sobre o equador ao meio dia terá um ângulo de aproximadamente 900 (varia um pouco ao longo do ano) e vai se espalhar muito pouco, por isto é concentrado. Claro que nos outros horários o ângulo muda, mas ao longo do dia os trópicos acumulam mais calor. Veremos adiante que, devido à inclinação da terra, a maior incidência solar não está sempre sobre o equador. Entretanto, considerando o acumulado no ano, é o equador que recebe a maior quantidade de energia. Por que é úmido nos trópicos e os desertos estão concentrados nas latitudes 30º N e 30º S ? No início do dia o sol aquece o solo e o solo aquecimento o ar superficial. O ar da superfície mais quente se dilata e tem 2 características: tem sua capacidade de carregar água aumentada (como uma esponja) e torna-se mais O ar é como uma esponja que se dilata, absorve água e sobe levando esta água. Após a condensação, esta esponja segue seca para locais distantes mony mony leve do que era, pois tem densidade menor (mesmo estando carregado de água). Portanto, ele sobe e leva a água com ele. A isto chamamos evaporação. À medida que sobe entra em contado com ar mais frio e vai se esfriando. Em certa altura a água que contém se condensa e transforma-se em nuvens e até em chuva. Mas o ar não para de subir até se esfriar tanto que fica novamente pesado e começa a cair. Este fenômeno acontece em escala local, mas também em escala global, de forma que se estabelecem padrões globais de circulação de ar. No equador a água que evaporou se precipita localmente e ar seco é exportado. Este ar seco acaba por determinar regiões áridas e desérticas em outros locais do mundo. Por outro lado, a água que evapora nas regiões vizinhas ao equador tendem a ser sugadas para repor o ar exportado. Enquanto o equador é quente e úmido, áreas vizinhas tendem a se tornar secas. A imagem que temos de desertos é que são locais quentes. Alguns realmente são. Isto acontece porque faltam nuvens para proteger o solo da incidência direta do sol. Além disto, independente de nuvens, o ar seco tem menor inércia térmica. Por isto é mais fácil de ser esfriado e esquentado, causando extremos. Algumas pessoas se surpreendem ao saber que os desertos tendem a ser muito frios à noite. Para piorar, estas condições atrapalham o estabelecimento de vegetação que também tem um efeito forte sobre o microclima.eixo de rotação da terra (em relação ao plano de translação). Entretanto, uma resposta destas sem explicação ajuda pouco. Esta inclinação acaba determinando que o número de horas varie ao longo do ano fora do Equador. Quanto mais alta a latitude mais forte é este efeito (ver figura abaixo). É importante perceber que quando a incidência solar é maior no hemisfério norte, ela é menor no Hemisfério Sul. Acontece uma situação peculiar nos polos: um dia ou uma noite podem durar mais que 24 10 Sazonalidade climática Fenômenos sazonais são aqueles que variam aproximadamente da mesma forma todos os anos, por exemplo, o clima (inverno-verão), os ciclos de vida de animais e plantas (estação reprodutiva, mi- grações), e até o cotidiano humano (colheitas, festas). Por que a sazo- nalidade térmica é tão grande em latitudes mais altas? Por que lá neva numa época do ano e na ou- tra faz sol, enquanto aqui o clima muda pouco ao longo do ano? A Translação e a sazonalidade climática exposta é: Devido à inclinação do mony horas (em alguns lugares podem durar meses). Em resumo, a principal causa da grande sazonalidade de temperatura (in- verno-outono-verão-primavera) fora dos trópicos é a variação no numero de horas de incidência solar (aquecimento) contra o número de horas de noite (resfriamento). No esquema ao lado, na situação c (que ocorre em dezembro), temos o verão do hemisfério sul. Notem que o sol incide Per- pendicularmente sobre a linha do Trópico de Capricórnio. Nesta época é como se o equador fosse lá. Dizemos que o equador climático varia ao longo do ano. Lembrem que no Equador chove muito. É por isto que esta também tende a ser a época de chuvas sobre este trópico. (Há variações devido a outros fatores geográficos, a maior chuva em São Paulo é em fevereiro, não no final de dezembro). Sobre o Equador seriam esperadas duas épocas de chuva, uma na primavera e uma no outono (quando o Equador Geográfico é também o "Equador Climático"). É assim em alguns locais, como na Nigéria. Entretanto, devido a fatores geográficos como a continentalidade e movimentos de massas de ar, não ocorre exatamente como o esperado (2 estações por ano). O que predomina na Amazônia é uma estação de chuvas e uma relativamente seca. Na parte da Amazônia que está ao sul do Equador esta seca tende a ser aproximadamente/geralmente de agosto a outubro. Ao norte, como em Roraima e no Amapá, a época seca é de Janeiro a Março, pois está no Hemisfério Norte. . 11 3. ENTENDENDO O RELEVO Embora o chão seja algo concreto, entender a história do chão é algo quase abstrato. A geologia lida com tempos tão longos que desafiam a nossa imaginação. Montanhas em movimento A terra surgiu há cerca de 5 bilhões de anos. A Terra teve uma superfície que era uma mar de magma derretido, mas se esfriou formando uma crosta sólida e a água da atmosfera se condensou formando mares. Ainda hoje encontramos parte desta crosta muito antiga, inclusive na Amazônia. A superfície da Terra tem uma aparência estática, entretanto, ela apresenta movimentos. Estes movimentos em conjunto são denominados Deriva Continental. Eles ocorrem por- que o interior da Terra é muito ativo, devido à rotação e à força de gravidade do exterior sobre o interior do planeta. Os continentes sólidos estão sobre uma matéria relativamente plástica abaixo deles. O resultado de forças internas sobre massas que não estão apoiadas em algo muito sólido é a movimentação lenta destas massas. É como se os continentes fossem pesados barcos à deriva. Entretanto, isto não significa que estes movimentos sejam suaves, pois toda a crosta é sólida, e o deslocamento de uma parte leva a atrito com outra. E é por isto que temos terremotos e vulcanismo, especialmente em regiões de encontros de placas. Grande parte da formação de montanhas também se deve ao encontro entre placas. Veremos que isto será importante para a formação da Bacia Amazônica adiante. A erosão é o desgaste e transporte da terra pela água, gelo ou vento. É um fenômeno que conhecemos mais, pois, em condições favoráveis, é visível na escala de tempo de meses ou anos. Imagine o seu efeito numa escala de milhões de anos. Cadeias de montanhas altas podem se transformar em vales. Mares interiores (continentais) imensos podem ser aterrados com sedimentos trazidos por rios. Dá para imaginar? Vamos tomar a América do Sul como exemplo (esquema ao lado). A América do Sul separou-se da África há cerca de 100 milhões de anos. À medida que se deslocava para oeste, a placa do Oceano Pacífico adentrou para baixo da placa da América do Sul. Deste encontro de placas resultou o lento soerguimento dos Andes (Cadeia de Montanhas a Oeste da América do Sul). Inicialmente formou-se um mar interior. (Encontramos conchas do mar em alguns lugares no alto dos Andes). Com o passar do tempo este mar foi sendo assoreado pelos sedimentos trazidos pelos rios, restando apenas rios de água doce. Mas os sedimen- tos não paravam de chegar, a tal ponto que as bacias hidrográficas que drenavam para oeste foram se preenchendo com mais sedimentos, até que ficaram também assoreadas e a água então começou a drenar para leste. Desta forma formou-se a maior bacia hidrográfica do mundo. Agora os sedimentos desta região são depositados no mar. Esta história é importante para entender a Amazônia. Com base nela podemos dividir a Amazônia em 3 regiões geológicas principais: 1) Os antigos escudos ao norte (Escudo das Guianas) e ao sul (Escudo Bra- sileiro); 2) A região a oeste formada pelo Soerguimento dos Andes; 3) Uma região central bastante plana formada principalmente por sedimentos de origem Andina: a Bacia Sedimentar amazônica. Relevo, Topografia, composição do solo e principalmente os tipos de rios estão relacionados com esta origem. Voltaremos a isto nas aulas sobre hidrologia da Amazônia. O relevo numa escala local O que vimos acima ajuda a entender a formação do relevo em uma escala global. Vamos prestar atenção aqui ao detalhe do relevo em escala local. Topografia é a representação de uma porção de um terreno com todos os acidentes e objetos que se achem à sua superfície. Discutiremos a topografia de áreas inundáveis nas aulas sobre hidrologia. Chamamos a atenção para a topografia de Terra Firme (áreas que não estão sujeitas às inundações anuais de grandes rios) da Planície Amazônica para mostrar um exemplo de analise de relevo em escala local e porque ela ajuda a entender diferenças de tipos de solos e de habitats em Florestas de Terra Firme. Vimos que a Planície Amazônica se formou com a deposição de sedimentos fluviais. É importante esclarecer que depois da deposição a planície foi amadurecendo e houve mudanças no nível do mar. Portanto, áreas que antigamente eram inundáveis deixaram de sê- lo, tornando-se terra firme. Esta superfície foi se erodindo muito lentamente. O resultado é uma topografia que pode ser dividida em 3 partes: 1) o platô, que é uma área que não foi erodida ainda e que é plano; b) a vertente, que é a área que está em um lento processo de erosão; c) o baixio, que é geralmente plano também, e é onde correm os igarapés Imagine agora um solo argiloso normal, ele tem partículas de vários tamanhos, as pequenas se chamam argila e as grandes areia. O que acontece com este solo em cada um destes locais? Nos locais planos, a água da chuva não se desloca lateralmente, apenas para baixo, e é absorvida pelo solo. os locais inclinados, parte da água é absorvida, mas parte dela pode escorrer na superfície e até abaixo da superfície. A floresta influi muito neste processo, retardando-o. Se não houvesse uma floresta, a tendência é que a erosão seria rápida, levando o solo das vertentes, tanto aargila como a areia. Dependendo da inclinação da vertente e da posição na vertente, a velocidade e a quantidade de água que escorre pode ser suficiente para mudar o tipo de solo, pois é como se este solo estivesse sendo lentamente “’lavado” ao longo de centenas de anos. Por isto, na vertente, especialmente nas partes mais baixas, frequentemente temos solos arenosos. No baixio, a água que vem de toda a bacia e a própria água do igarapé que transborda ocasionalmente, lavam o solo constantemente, resultando em um solo predominantemente arenoso. Este solo tem características próprias por estar constantemente encharcado, e por isto nós o denominamos hidromórfico. Este processo explica porque encontramos geralmente solos argilosos ou arenosos dentro da floresta (os intermediários são mais raros). Não é o único processo que determina solos arenosos. Em alguns locais o solo for- mouse da decomposição de uma rocha arenosa. Em outros locais, o solo é arenoso porque ali foi um igapó há muito tempo atrás. Estas diferenças de solos determinam diferenças importantes na vegetação, como veremos no capítulo 05. A influência do relevo sobre o clima Vimos no capítulo anterior o que determina o clima global. Entretanto, há fatores locais, como o relevo, que afetam o clima. Já vimos, por exemplo, que pode até nevar nos trópi-cos. Quanto mais alto nas mon- tanhas, mais baixa é a temperatura porque o ar é mais rarefeito. Ao subirmos uma montanha alta nos trópicos, podemos encontrar em poucos quilômetros uma mudança na vegetação semelhante à que encon- tramos indo do equador aos pólos. Entretanto, há algumas diferenças importantes, a sazonalidade é menor. Na floresta temperada de montanhas, as árvores não perdem todas as folhas na estação mais fria porque não há estação mais fria. Na “tundra” da montanha, a variação térmica diária é grande, e há plantas adaptadas a guardar o calor do dia para enfrentar o frio da noite, o que não se encontra na tundra polar. Além disto, uma montanha é uma barreira para o deslocamento das massas de ar que carregam a umidade. O ar que vai em direção à montanha é forçado a subir e condensa-se, devido às temperaturas menores, causando chu- vas. Após passar as montanhas, o ar de expande novamente e rouba umidade do ambiente. Portanto costumamos encontrar florestas a barlavento, e áreas mais áridas, até desertos, a sota-vento, conforme o esquema acima. Em montanhas altas situadas nos trópicos encontramos um gradiente de vegetação semelhante ao que encontramos quando viajamos do equador aos pólos, entretanto a sazonalidade é muito menor e a variação térmica diária é muito maior. Montanhas afetam muito o clima local porque são barreiras para massas de ar O relevo e a drenagem de água Todo mundo sabe onde procurar um igarapé: no local mais baixo. Parte da água das chuvas pode escorrer pela superfície, mas a maior parte da água que chega ao igarapé se desloca dentro da terra, e forma uma camada úmida chamada de lençol freático. Esta camada pode ficar mais profunda ou mais rasa em função de particularidades do relevo, como vemos na figura ao lado. As árvores são mais sensíveis que o capim a longos períodos sem água (mesmo se o capim morrer, haverá sementes para germinar na estação chuvosa seguinte). Por isto, elas são indicadoras de solos mais úmidos próximo à superfície. Em locais onde chove o ano todo, o solo está permanentemente úmido. Em locais muito secos, apenas encontraremos florestas próximos a rios. Entretanto, na transição, como na foto ao lado, podemos encontrar floresta nas áreas de encosta em posições que favorecem a retenção da água. A água das chuvas se desloca principalmente dentro do solo até aflorar em igarapés. Os locais com florestas nas vertentes nesta figura indicam solos mais úmidos na superfície em função da topografia e da drenagem da água. 4. HIDROLOGIA: MARES DE ÁGUA DOCE Mesmo nos continentes, há regiões tão cheias de água que é quase como se fossem mares de água doce. A Amazônia e o Pantanal são áreas que se destacam globalmente em relação a isto. Na nossa região, como vimos acima, o soerguimento dos Andes, em função da deriva continental, acabou por determinar a formação da maior bacia hidrográfica do planeta. Portanto, não falta água doce por aqui, alguns rios são imensos e existe uma grande área inundada anualmente por estes rios. A área sob influência das inundações é de apenas cerca de 5% da área da Amazônia. Entretanto, nestes 5 % encontramos ecossistemas ricos em biodiversidade, é ai onde se concentra a maior parte da população e da economia rural da região. Além disso, é uma das paisagens mais belas do planeta. Novamente, utilizaremos nossa região como modelo para entender aspectos bióticos de ecossistemas de água doce tropicais. Vamos desenvolver o tema das águas amazônicas a partir de 3 perguntas básicas: 1) por que existem diferentes tipos de água na Amazônia? 2) por que existem as cheias e vazantes dos rios Amazônicos? 3) quais são as principais características da paisagem amazônica próximo aos grandes rios? Os tipos de água Na foto ao lado, vemos o encontro dos rios Negro e Solimões, que passa a ser denominado Amazonas. O contraste é muito marcante. O Rio Negro tem uma água da cor de chá preto forte, e o rio Amazonas é barrento de cor marrom claro a amarelada, devido a um fino sedimento (partículas sólidas inorgânicas) em suspensão. Quando vamos ao encontro das águas percebemos ainda que o Rio Solimões é mais agitado e mais frio. Mas há outras diferenças. O Rio Solimões também é mais rico em nutrientes e tem pH neutro ou levemente ácido. Como consequência, sustenta uma fauna (peixes, mosquitos, etc) mais abundante (discutiremos mais sobre isto na aula sobre os ecossistemas aquáticos). O Rio Negro contrasta por ter um pH bastante ácido (por volta de 4) e poucos nutrientes. A fauna não é tão abundante, mas a biodiversidade também é muito alta. O entorno destes rios também diverge muito, como veremos adiante (hidrologia) e em outra aula (os ecossistemas). O Rio Negro é considerado o principal exemplo de rio de "água preta", outros exemplos são o Rio Urubu e outros que tem nascentes em florestas. O Solimões-Amazonas é o principal exemplo de rio de "água branca" ou de "água barrenta", outros exemplos são o Rio Madeira, o Purús e o Juruá. Ainda há um terceiro tipo de rio, o rio de "água clara". Os rios de água clara, como os rios Tapajós, Xingú e Trombetas, geralmente carregam muito pouco sedimento em suspensão, como os rios de água preta, mas não são escuros como eles. Em geral são rios relativamente pobres em nutrientes e com pH ácido, mas não tanto como os rios de água preta. É comum que se desenvolvam algas nestes rios, tornando-os esverdeados. U m r i o d e á g u a p r e t a c o m u m a p r a i a a r e n o s a Esta categorização de águas é útil do ponto de vista prático e didático, entretanto, para entender o que acontece é importante reconhecer a existência de gradientes (ver figura). As águas brancas têm sedimentos em suspensão, mas a quantidade de sedimentos varia no tempo e no espaço. Por exemplo, o Rio Branco em Roraima tem uma cor barrenta em uma época do ano e clara em outra, em função da variação na quantidade de sedimentos. Além disto, quando as águas "brancas" do Rio Solimões entram em lagos e reduzem sua velocidade, os sedimentos se depositam e a cor da água muda. Entretanto, as características químicas principais mudam pouco, continua sendo uma água rica em nutrientes, mesmo que a cor seja de água preta ou clara. Por isto, dizemos queas águas destes lagos são águas "brancas sedimentadas", isto é, águas cujas partículas em suspensão se depositaram. As "águas pretas" se diferenciam das claras por possuírem grande quantidade de ácidos húmicos e fúlvicos. Entretanto, a quantidade destes ácidos também varia no tempo e no espaço. Águas pretas e claras podem possuir um pouco sedimento. Águas Brancas podem ter muito ou pouco ácidos húmicos e fúlvicos, mas isto só pode ser visto quando coletamos uma amostra desta água e deixamos que fique parada para sedimentar as partículas em suspensão. Já entendemos que a quantidade de sedimentos e de ácidos orgânicos varia, falta entender por quê. Quanto aos sedimentos, temos que lembrar que a Planície Amazônica formou-se da deposição de sedimentos fluviais e lacustrinos (desde uma época geologicamente recente denominada Terciário até os dias de hoje). Aqueles rios cujas nascentes estão nos Andes, ou nas bases dos Andes, recebem sedimentos dos Andes e têm margens formadas por sedimentos geologicamente muito recentes (principalmente do Quaternário, inclusive de anos recentes). Estas margens são barrancos que estão constantemente caindo, liberando barro na água em alguns pontos que se deposita novamente em outros. Portanto, são rios muito dinâmicos. Moradores ribeirinhos frequentemente perdem seus terrenos neste processo. Em resumo, os rios de água branca são barrentos porque carregam sedimentos resultantes principalmente dos processos erosivos intensivos dos Andes. A cor escura da água preta é causada por substâncias orgânicas derivadas da de- composição incompleta de folhas na floresta. Estas substâncias chegam aos igarapés ou não. Se o solo for argiloso existe uma demora na drenagem da água suficiente para dar tempo para as bactérias fazerem a decomposição mais completa. Além disto, é necessário que haja uma quantidade grande de folhas em decomposição para que uma quantidade significativa de ácidos orgânicos chegue aos igarapés. Portanto, em bacias de drenagem sobre solo argiloso ou em regiões com vegetação aberta, os igarapés tendem a ter uma água mais do tipo "clara" que do tipo "preta". Se o solo for arenoso, a drenagem é rápida e o pH do solo é menos favorável para a ação de bactérias, de forma que a água chega aos igarapés ainda cheia de ácidos orgânicos da decomposição incompleta. Também nos baixios e em áreas pantanosas, onde o solo é encharcado, a decomposição tende a ser incompleta, com liberação de ácidos orgânicos para a água, devido à falta de oxigênio. Por que existem as cheias e vazantes dos rios Amazônicos Basicamente por duas razões, porque existe forte sazonalidade de chuvas e porque os rios estão sobre uma bacia sedimentar muito plana. O esquema ao lado mostra a variação anual na quantidade de chuva em Manaus (curva com o pico em março) e do nível do Rio Negro em frente a Manaus. Note como o pico da enchente (a outra curva) ocorre apenas em junho. Isto acontece porque 1) a água da chuva é retida no solo e escoa lentamente; 2) drenagem é lenta em uma superfície muito pouco inclinada (de cerca de 1m a cada 100km). Estamos falando da maior bacia hidrográfica do mundo. Embora o Rio Amazonas seja grande, é muita água para sair e ela se acumula. Quanto mais longe da foz, maior é a "fila" que cada gota tem Variação na chuva e no nível de água no Rio Negro em frente a Manaus enfrentar. Por isto, em Belém, a diferença entre o nível dos picos da cheia e da vazante é pequena (cerca de 2 metros em média), em Manaus é de cerca de 8 m e no alto Solimões pode chegar a 15m. Características da paisagem amazônica próxima aos grandes rios Estas características dependem do Rio, de um lado temos os rios de água negra ou clara, que carregam poucos sedimentos, do outro lado temos os Rios de água branca, que levam mui- tos sedimentos. Vejamos por quê. Neste esquema vemos um rio de água branca em corte (Rio Juruá). Note que existe um sedimento mais velho nas bordas. Este sedimento foi depositado e depois passou por um processo de erosão, especial- mente em uma época quando o nível do mar estava mais baixo, formando um vale. Isto ocorreu tanto em rios de água clara e negra quanto em rios de água branca. Depois, o nível do mar voltou a subir. Nos rios de água branca um novo sedimento foi depositado. Como resultado, os Rios de água negra ou clara praticamente não tem várzea, isto é, uma área grande de terra alagável. Nas áreas de rios de água negra ou clara, temos basicamente uma margem com florestas ou formas mais abertas de vegetação. As florestas inundáveis e são chamadas de Igapós. Ilhas, como as Ilhas Anavilhanas do Rio Negro são pouco comuns. (Aparentemente estas foram formadas a partir da deposição de sedimentos do Rio Branco.) Há poucos lagos e não existe uma ampla várzea como nos Rios de água branca. Quando a água baixa, geralmente ficam expostas longas praias de areia branca. Em rios de água branca a várzea pode ser imensa. Há locais no Rio Amazonas em que ela chega a ter 100 km de largura. Nos locais onde os rios não são muito grandes e as várzeas são estreitas, geralmente temos apenas o canal do rio (com muitos meandros), a floresta inundável, e lagos de ferradura (ou de meandro sacado). Corte do Rio Juruá Meandros no rio Purus Nos locais com várzeas amplas temos um ambiente mais complexo. Nestas várzeas encontramos florestas de várzea alta, florestas de várzea baixa, restingas, lagos temporários, lagos permanentes, furos, Rio Principal, Paranás e também alguns lagos de meando abandonado. Na figura ao lado podemos entender como se formam os meandros e um pouco da dinâmica destes rios. Note que no lado de dentro das curvas dos rios há deposição de sedimentos, no lado oposto ocorre erosão. Isto faz com que as curvas fiquem cada vez mais abertas, e uma curva pode tocar a outra. Quando isto acontece, o rio muda de curso e o meandro fica abandonado, formando um lago. Note que rios como este são muito dinâmicos, há muito tempo que passa um rio drenando água por ai (entre as 2 áreas de terra firme mostradas), mas a posição do rio muda constantemente. Em fotos de satélite podemos ver as "cicatrizes" dos leitos antigos. 5. DIFERENÇAS ENTRE VEGETAÇÕES O principal elemento da paisagem que nos leva a categorizar um bioma é a vegetação. Podemos até identificar uma savana africana em uma foto pela presença de um elefante, mas foram as características semelhantes da vegetação do cerrado e da savana africana que levaram os biólogos e geógrafos a colocá-las em uma mesma categoria de bioma. Portanto, além dos fatores físicos discutidos acima, temos que entender as necessidades vegetais e como os fatores físicos e as interações com espécies afetam as plantas para compreender melhor as características e as dinâmicas dos diferentes biomas. Praticamente todas as plantas fazem fotossíntese (falaremos da exceção depois). Para isto, elas precisam de água, luz, calor e nutrientes (e algo mais que veremos logo). Mas há diferentes formas de se obter isto, desde uma erva anual até uma árvore centenária. Há diferentes tipos de plantas em cada bioma. Não nos referimos aqui às espécies, mas agrupamentos maiores que vamos chamar de estratégias vegetais. A divisão destas estratégias é um pouco arbitrária, como a de biomas, que discutimos na seção 1; aqui também as fronteiras entre categorias não são absolutas, mas servem para discutirmos diferenças reais. Cada estratégia vegetal é diferente no conjunto de adaptações para a sua sobrevivência (água, luz, calor, nutrientes e oxigênio para as raízes), para uma reprodução eficiente (mistura genética) e para o estabelecimento da geração seguinte (fixação-sustentação, colonização e defesa).Vejamos primeiro as necessidades vegetais para depois compararmos as estratégias vegetais mais comuns em cada bioma. As necessidades vegetais Água As plantas terrestres originaram-se de algas que viviam em ambiente aquático. Raízes de algas (quando existem) servem apenas para fixação; o próprio meio aquático dá sustentação, possibilita as trocas de nutrientes, de oxigênio e de gás carbônico, e possibilita a troca de gametas da reprodução sexuada. Por isto, a conquista do ambiente terrestre ao longo da evolução envolveu grandes mudanças morfológicas e fisiológicas. Entretanto, a fisiologia celular não mudou tanto assim. Sem um forneci- mento constante de água, as células de um tecido vegetal morrem (mesmo no caso extremo de uma semente em dormência há uma necessidade mínima de água que é fornecida metabolicamente). Ao contrário dos animais, as plantas não podem se deslocar para resolver uma necessidade momentânea de água. mony mony Por isto, a água é a principal necessidade vegetal e há uma forte relação entre a quantidade e regularidade da disponibilidade de água no solo e o tipo de vegetação. Onde há chuvas abundantes no ano todo normalmente haverá florestas. As árvores são os organismos vegetais mais dependentes de água, mas onde esta não falta este tipo de planta predomina por vencer a competição pela luz. Se a chuva for mais ou menos regular e pouco abundante, a vegetação tende a ser mais aberta, mas poderemos encontrar florestas em locais onde a topografia determina maior quantidade e regularidade de água no solo, como próximo a riachos (floresta de galeria). Onde há uma quantidade de água muito pequena na maior parte do ano, mesmo que haja uma época chuvosa, teremos uma região de semiárido ou deserto. É interessante notar que o efeito da temperatura baixa sobre plantas é menos direto (pelo seu efeito em diminuir das reações químicas do metabolismo vegetal como um todo) do que indireto. O frio limita a capacidade das plantas em absorver água, seja pelo congelamento do solo ou pela redução do metabolismo das raízes. Calor Como vimos, a temperatura tem principalmente um efeito indireto sobre os vegetais devido à restrição de água. Entretanto, há um efeito mais direto do frio. As geadas são reduções rápidas na temperatura do ar que não costumam ser suficientemente duradouras e intensas para determinar uma falta da água para a planta, entretanto pode matá-la por outra razão. O problema é a formação de cristais de gelo que rompem as células das plantas, o conteúdo celular vasa e oxida, deixando-a “queimada”. Plantas que suportam o inverno gelado com folhas verdes como os pinheiros possuem substâncias anti- congelamento dentro das células. Este é um problema principalmente na agricultura em certas regiões. Em locais com invernos rigorosos, são escolhidas espécies adaptada ao frio ou o cultivo é feito nas épocas apropriadas. O problema são as áreas com geadas eventuais. Ai, o cultivo destas plantas é uma questão de risco. A geada também afeta as plantas selvagens, há mudança de composição de espécies ao sul e ao norte da região das geadas eventuais. Além da falta de água, há outros importantes efeitos indiretos do calor, aqueles relacionados com interações com animais e outros organismos. Os animais são fortemente influenciados pela redução na temperatura. Desta forma, um inverno rigoroso pode restringir os herbívoros e as doenças. Também relações mutualísticas como a polinização e a dispersão devem ser mais restritas em ambientes mais frios, seja um frio sazonal (e. g. tundra ártica) ou não (e. g. tundra alpina tropical). Luz As plantas são autótrofas. Este termo significa que são capazes de “alimentar a si mesmas”, isto é, fixam gás carbônico do ar em moléculas de glicose que servirão tanto para construção como para o funcionamento do organismo vegetal. É uma fixação de matéria e de energia. Para isto, a planta precisa da água que retira do solo, do gás carbônico do ar e energia luminosa. mony Ao conquistar o ambiente terrestre, as plantas tiveram de desenvolver filtros contra o excesso de luz e adaptações fisiológicas para evitar o superaquecimento. Entretanto, estes problemas foram superados. O problema mais comum de luz nos ambientes naturais é a sua falta, que ocorre principalmente devido à presença de outras plantas. Houve três caminhos evolutivos em resposta a isto: a) crescimento para cima em direção à luz ou b) adaptação a um ciclo de vida inteiro sob baixa incidência solar; c) alelopatia. O primeiro caminho resultou numa pressão para árvores mais altas e trepadeiras que crescem apoiadas nas árvores. O segundo, na vegetação de sub-bosque. Estas estratégias vegetais serão discutidas depois. No caso da alelopatia, uma planta produz substâncias que inibem o crescimento de outras. Esta estratégia ocorre com muitas ervas, capins, pinheiros, eucaliptos e bambus. Aparentemente é uma estratégia que funciona apenas em situações de baixa diversidade, na qual há clones ou plantas muito próximas geneticamente lado a lado. No caso de florestas tropicais, certamente é mais vantajoso gastar energia na produção de frutos. A influência de uma planta sobre outra na busca por luz geralmente é chamada de competição. Entretanto, por definição, na competição os dois organismos envolvidos são prejudicados para existência do outro. Podemos dizer que isto ocorre no caso da alelopatia, pois uma planta gasta energia para produzir a toxina inibitória e a outra é prejudicada por ser inibida. Competição também pode ocorrer durante a sucessão vegetal, em que uma planta pode crescer mais rápido que outra e prejudica-la com sua sobra. Entretanto, no caso do sombreamento de uma plântula por uma árvore em uma floresta madura, seria mais apropriado chamar esta relação de amensalíssimo, pois a plântula se prejudica pela sombra da árvore, mas o oposto não acontece. Nutrientes Não basta água, gás carbônico e luz para o funcionamento e desenvolvimento de uma planta. “Macronutrientes” como Nitrogênio, Fósforo e Potássio (N, P, K), “micronutrientes” como Ferro, Zinco, Boro, Cobre e Manganês são necessários para a fisiologia da planta. Cada nutriente tem a sua função, mas, para as finalidades desta apostila, podemos tratá-los genericamente apenas como nutrientes. Se um ou mais destes nutrientes estiver em uma quantidade baixa, dizemos que o solo é pobre em nutrientes. Solos pobres tendem a ter produtividade baixa, isto é, o crescimento vegetal é mais lento do que poderia ser, e a produção de flores e frutos é menor. No caso das plantações, esta é uma grande preocupação, e o homem frequentemente corrige isto acrescen- mony tando nutrientes e/ou alterando o pH do solo, o que pode disponibilizar melhor os nutrientes existentes no solo. Entretanto, no caso das vegetações naturais, o efeito basicamente se restringe a uma produtividade baixa. Uma floresta sobre solo rico difere estruturalmente muito pouco de uma floresta sobre solo pobre. Voltaremos a isto mais longamente adiante quando compararmos os ecossistemas amazônicos Sustentação e fixação Adaptações para a sustentação começaram na evolução das primeiras plantas terrestres, com o aparecimento do caule para elevar a altura das folhas e das raízes, que, além da função de absorção, tem a função de fixar e dar equilíbrio à planta. Especialmente em ambientes que tem o solo menos firme, como em baixios, várzeas e no mangue, algumas árvores e arbustos tem modificações para aumentar a estabilidade, como as raízes tabulares e raízes escoras. Algumas estratégias vegetais dependem de adaptações especiais para se fixar a outras plantas, como ocorre com as trepadeiras, para apoiar-se na planta hospedeira, e as epífitas, que precisam prender- se rapidamente durante a germinação nos troncos, evitando cair com o vento e a chuva.Oxigênio para as raízes O oxigênio está em abundância no ar, de forma que não falta para as folhas. Entretanto, nos locais em que o solo é encharcado, o oxigênio pode faltar para as raízes. Existe oxigênio na água, mas o problema é que em locais encharcados este oxigênio costuma se consumido por organismos do solo, especialmente bactérias. Sem oxigênio nas raízes, elas param de funcionar, e a planta não pode absorver água. Curiosamente, em alguns locais, como na floresta de várzea, é na época das enchentes que as árvores têm falta de água e perdem as suas folhas para economizar água. Entretanto, esta estratégia tem seus limites, e, abaixo de um certo nível topográfico a duração da seca fisiológica é longa demais para permitir a existência de árvores. mony No baixio e no mangue, onde o solo é encharcado, mas o nível da água sempre volta a baixar, são comuns raízes que emergem para fora do solo com aberturas para absorver o ar chamadas de pneumatóforos. Solos compactados podem restringir o crescimento vegetal pela dificuldade física no crescimento de raízes (especialmente na germinação de sementes). Entretanto, a redução na dimensão dos poros restringe também a quantidade de água e de oxigênio para as raízes. Estes fatores em conjunto tendem a ter um forte efeito sobre a vegetação. Isto é um problema especialmente em condições Defesa Plantas terrestres praticamente não se movem. De certa forma elas se movem de uma geração para outras, pois as sementes podem ir parar longe da planta mãe. Há plantas, como a Espada de São Jorge, que pode ir crescendo um rizoma em um sentido, e pode gradualmente ir mudando de posição. Mesmo considerando estas formas de mobilidade, permanece o fato que as plantas não podem fugir dos animais. Então, por que os animais (herbívoros) não comem logo todas as plantas? Esta pergunta parece ingênua, mas não é tão ingênua assim. Muitos animais comem partes da planta “oferecida” por ela, como néctar e frutos, mas isto é vantajoso para plantas (como veremos adiante). Nós comemos alface entre outras plantas, mas isto é o resultado de seleção artificial do homem. Nós tiramos as defesas destas plantas para consumi-las, tanto que precisamos de agrotóxicos para defendê-las. De forma geral, as plantas têm defesas, principalmente químicas, muito fortes, que tornam seu tecido tóxico para a maioria dos animais. Além das defesas químicas, o tecido vegetal é de difícil digestão, pois em cada célula tem uma parede celulósica que exige enzimas especiais para ser quebrada. Há outras defesas como espinhos, a altura das folhas, e animais mutualistas que as defendem, especialmente as formigas. A dispersão/espalhamento das sementes/esporos para longe das plantas-mães e o tempo de dormência (especialmente em espécies anuais) também dificultam a ação dos herbívoros (e de doenças). Se considerarmos os insetos, por exemplo, veremos que na maioria das ordens predominam os predadores e decompositores. As formigas saúvas são importantes destruidoras de plantas, entretanto, elas não comem diretamente as plantas, mas fungos que utilizam as folhas como substrato dentro do formigueiro. Portanto, vemos que o consumo de tecidos vivos de plantas é mais complexo do que parece. O consumo de plantas exige adaptações dos herbívoros, que resulta em aumento da defesa das plantas, que por sua vez exige adaptações mais extremas dos herbívo- mony mony ros. Este processo chama-se co-evolução. Um herbívoro pode co-evoluir com uma ou algumas espécies de plantas, mas não pode co-evoluir com todas. Portanto, cada espécie de planta tem poucos animais capazes de consumi-la. Onde a diversidade das plantas é alta, os herbívoros terão certa dificuldade em encontrar alimento, e isto já é um fator a mais a limitar a herbivoria. Nem sempre a defesa é tão forte. As zebras, gnus e outros animais comem diariamente dezenas de quilos de capim na savana africana. Neste caso, a diversidade do capim é baixa, e não protege as plantas. Entretanto, há dois fato- res importantes a limitar os herbívoros: os grandes predadores e a sazonalidade climática. A parte verde do capim tende a morrer todo ano durante a seca, obrigando estes herbívoros a migrar ou morrer de fome, e a vegetação pode se recuperar. A herbivoria é um fator importante dentro das diferentes estratégias vegetais. A defesa pode ter um custo elevado. A planta precisa investir também em crescimento da raiz, do contrário poderá faltar água ou nutrientes, em altura, para poder ter mais folhas, e em folhas, para fixar matéria e energia. Mas se não investir em defesa, poderá não ter mais as folhas, e morrerá. Este balanço de custo-benefício depende da situação. Algumas plantas abdicam dos investimentos em defesa para ter um crescimento rápido e reproduzir em pouco tempo. Isto eh comum em ambientes com situação favorável passageira, como em clareiras formadas dentro de florestas, ou para plantas de ciclo de vida curto em áreas inundáveis. Dentro da mata, plantas que crescem fora de clareiras normalmente têm sementes grandes, pois necessitarão da energia para a sua defesa e crescimento inicial durante a fase crítica em que são plântulas. Mistura Genética Cada organismo tem uma bagagem genética limitada, com falhas e inflexível. A bagagem genética da população eh muito mais ampla e dinâmica. Muitos indivíduos podem morrer devido a uma doença nova, entretanto, se alguns tiverem em sua bagagem genética condições de resistir doença, então a população sobrevivera. Quanto mais intensa for a troca genética, melhor a capacidade da população para resistir a mudanças ambientais. E não faltam mudanças ambientais quando consideramos tempo evolutivo. Doenças, novos inimigos naturais, novas oportunidades, e ate a manutenção do patrimônio exigem mudanças constantes. A bagagem de um individuo basta para uma geração, mas clones deste individuo estariam predestinados a extinção. Portanto, as trocas genéticas são essenciais, e encontraremos adaptações importantes para otimizar as trocas genéticas das plantas. Para termos uma dimensão da importância da mistura genética, considere o custo que uma árvore tem para se perpetuar em uma floresta primária. Nestas florestas, a composição de espécies é praticamente constante. Portanto, em média, uma arvore mony mony substitui uma outra arvore a cada geração. Considerando os milhares de sementes que uma arvore produz, a taxa de mortalidade é extremamente elevada. Os vegetais têm uma capacidade de reprodução vegetativa (assexual) bastante elevada. Para muitas plantas, basta plantar um galho e ele começa a brotar. A reprodução vegetativa teria vantagens imensas para uma árvore, que poderia fazer germinar a ponta de sua raiz e sustentar este novo individuo durante o seu desenvolvimento inicial, aumentando muito as suas chances de sobrevivência. Entretanto, nenhuma arvore de floresta, faz isto. Aparentemente, as vantagens da reprodução com troca genética, por mais alto que seja o seu custo, superam as vantagens da reprodução vegetativa. A mistura genética não depende apenas de reprodução sexual, isto é, da união de gametas de indivíduos diferentes. Uma mistura mais efetiva acontece quando indivíduos menos aparentados realizam esta mistura. Uma analogia pode deixar isto claro. Imagine pessoas que trocam receitas de bolo com vizinhos. Esta prática permitirá que cada casa melhore a qualidade de seus bolos gradualmente. Agora imagine que algumas pessoas trocam receitas de bolo pela internet com o mundo inteiro. As trocas com indivíduos distantes têm um potencial muito superior de melhoramento. As plantas não se deslocam depois que germinam, mas suas sementes (ou esporos) e gametas podem ser levados para longe das “plantas pai e mãe”. Nas plantas terrestres primitivas (musgos e samambaias), os gametas dependem de água para a fecundação e o deslocamentodo gameta masculino (anterozóide) é muito restrita. Portanto a fecundação sempre ocorre muito próxima das duas plantas que produzem os gametas (masculinos e femininos). A mistura genética eficiente depende destas duas plantas terem origem de locais distantes. Por isto, estas plantas têm um ciclo de vida dividido em duas partes. Após a fecundação, germinará um esporófito, que é uma planta que produz esporos (a samambaia é o esporófito). Os esporos são secos, podem ser levados para longe com o vento e germinam distante das plantas pai e mãe, formando as plantas que produzirão gametas. Desta forma, aumenta a chance de fecundação entre plantas de parentesco distante, e a mistura genética é melhor. Com o aparecimento dos grãos de pólen nas Gimnospermas, a fecundação deixou de depender de água. Isto foi importante para a conquista mais efetiva do ambiente terrestre. Entretanto, a polinização pelo vento contribui pouco para uma melhora na mistura genética, pois a fecundação tende a ocorrer entre as plantas mais próximas. A mistura genética efetiva ainda depende mais de mecanismos que levem os indivíduos a se afastarem da planta mãe, de forma que os indivíduos próximos estejam pouco próximos geneticamente. Este afastamento das plantas mãe chama-se dispersão. A dispersão também pode ser pelo vento (anemocoria), mas aqui começa a aparecer uma interação com animais. Animais que se alimentam de sementes podem perder algumas longe da planta mãe. O prejuízo de comer as sementes pode ser pequeno comparado com às vantagens de levar algumas sementes para bem longe da planta mãe.. Posterioremente, evoluíram os frutos com um tecido nutritivo para a atração do animal. Desta forma, o animal deixou de comer (ou de digerir) a semente para realizar a dispersão. A dispersão por animais chama-se zoocoria. Uma grande revolução na história das plantas terrestres foi o aparecimento das flores e a polinização por animais. Para a polinização pelo vento, era necessário muito pólen para uma planta fecundar outra planta que estivesse a alguns metros de distância. Este pólen atraiu consumidores, especialmente besouros. Ao passar de uma planta para a outra, mesmo consumindo parte do pólen, os besouros facilitaram a troca genética com uma eficiência muito maior do que qualquer outro mecanismo anterior de mistura genética. Agora, com um gasto mínimo de pólen, ficou possível a mistura genética de plantas distantes dezenas de metros, e até quilômetros. Da mesma forma que aconteceu com os frutos, as plantas forneceram um alimento alternativo ao pólen para atrair os insetos: o néctar. A polinização mediada por animais foi um sucesso tão grande que mudou todos os ecossistemas tropicais e subtropicais em um tempo geológico muito curto. As Angiospermas praticamente levaram as Gimnospermas à extinção nos trópicos, e se diversificaram muito. Ao mesmo tempo, os insetos polinizadores também se diversificaram imensamente. Os biomas do mundo mudaram completamente.. Há cerca de 40 milhões de anos, surgiu um grupo que também teve um sucesso enorme: as gramíneas. Este grupo especializou-se em áreas abertas com estações secas longas demais para árvores. Basicamente, as gramíneas têm um metabolismo que lhes dá maior resistência à seca e crescem seus caules sob o chão (rizoma). Na época seca, suas folhas morrem, mas o rizoma permanece vivo. Estas folhas secas ficam sujeitas a incêndios que podem matar outras ervas, mas o rizoma subterrâneo resiste. O sucesso foi tão grande que elas cobriram savanas e estepes. Curiosamente, a polinização destas plantas é pelo vento, o que parece um retrocesso evolutivo. Entretanto, se lembrarmos que as gramíneas cobrem as superfícies onde ocorrem, veremos que a polinização por insetos seria ineficiente para a mistura genética, pois os insetos passariam pólen de uma planta para a vizinha. O vento pode fazer o mesmo com um gasto menor. No caso das gramíneas, a mistura genética entre indivíduos distantes é garantida pela dispersão. E quem realiza a dispersão das gramí- neas de forma muito eficiente são as aves, que possibilitam misturas genéticas de quilômetros. Colonização A dispersão é importante na mistura genética das plantas, especialmente a dispersão de esporos para as plantas primitivas e para as plantas com polinização pelo vento no caso das Gimnospermas e algumas Angiospermas. Entretanto, a dispersão também é importante para defesa e para a colonização. Para a defesa das sementes e plântulas, pois perto da planta mãe é o local menos seguro para uma planta crescer. É ai que os predadores vão procurar alimento. A dispersão é importante para a colonização. A colonização deve ser vista em um sentido amplo. Pássaros podem levar se- mentes de capim para uma ilha distante. Coqueiros chegam na ilha pela água. Alguns habitats, como ilhas pequenas, praticamente só possuem estas espécies colonizadoras. Entretanto, de certa forma, uma clareira é parecida com uma ilha neste sentido. Os galhos novos de uma árvore grande também são como uma nova ilha para plantas epífitas. Interação entre necessidades vegetais e as estratégias vegetais Didaticamente, separamos as necessidades das plantas acima: água, luz, nutrientes, sustentação, oxigênio para as raízes, defesa, mistura genética e colonização. Entretanto, na realidade todas as necessidades ocorrem ao mesmo tempo. Algumas destas necessidades estão relacionadas entre si. A relação mais óbvia é a de água com nutrientes. A falta de água não compromete apenas o balanço hídrico das plantas, mas restringe a captação dos nutrientes. Água, em excesso no solo também ser um problema por afetar a disponibilidade de oxigênio para as raízes. Necessidades Contexto: Vegetais: Água Clima Nutrientes Solo Luz Topografia Sustentação A mesma espécie Oxigênio (raízes) Defesa Outros Vegetais Mistura genética Outros organismos Colonização Todas as plantas têm estas necessidades, entretanto, em algumas situações estas necessidades não são um problema. Se o clima e o solo garantem um suprimento de água o ano todo, então a necessidade de água não é um problema. Entretanto, se há água o ano todo, então teremos uma floresta, e se há floresta, uma semente no solo terá de enfrentar a falta de luz. Se há pouca luz, então seu desenvolvimento será lento, e a chance de um predador de plântulas aparecer é grande, logo, é necessária uma defesa química eficiente, etc. Ou seja, está tudo relacionado. São muitos problemas a serem resolvidos, e a solução de um problema de uma necessidade pode levar a um problema em outra necessidade. Por isto, temos diferentes estratégia vegetais. Entendendo as diferentes estratégias vegetais estaremos a caminho de entender o funcionamento de todos os ecossistemas terrestres. mony Estratégias Vegetais e Suas Relações com os Biomas. A mesma estratégia vegetal pode ser encontrada em vários biomas. Por exemplo, os cactos são muitos comuns na caatinga, entretanto, também ocorrem em copas de árvores na floresta tropical, pois no alto das árvores incide sol forte e existe um microclima muito seco. Para evitar ser repetitivo, serão abordadas as estratégias já dentro de uma abordagem contextualizada em biomas. A floresta tropical é a melhor referência para começarmos a apresentação das estratégias vegetais, devido à mai-or diversidade de estratégias que encontramos lá. Estratégias mais comuns na floresta tropical. Árvore do dossel: As “árvores do dossel” são as árvores de florestas tropicais que atingem a maturidade no dossel (o nível das copas das árvores mais altas). Incluímos também nesta categoria espécies emergentes, que ultrapassam o nível da maioria das árvores de dossel, como a Castanheira do Pará. São as rainhas dos vegetais. Água e luz não lhes faltam. Em solos férteis,podem produzir toneladas de frutos Em solos pobres produzem menos, mas são as maiores produtoras da floresta de qualquer forma, pois suas raízes se espalham so- bre uma superfície muito grande. Entretanto, têm uma infância terrível. Antes de brotar, recebem uma herança da mãe: uma semente grande e cheia de reservas; e “dinheiro para o táxi”: um fruto suculento que atrairá os dispersores. Mesmo assim, muitas sementes não conseguirão pegar o táxi e serão atacadas antes de germinar por predadores de sementes, ou germinarão abaixo da planta mãe, mas serão consumidas em poucas semanas pelos predadores de plântulas. Longe da planta mãe, a semente germinará mais segura. Entretanto, a mata é escura, apenas cerca de 2% da luz que incide acima da mata chega ao solo. É pouco para fazer fotossíntese. Algumas plântulas crescem lentamente; outras prati- camente param de crescer e aguardam a sorte de uma árvore ou um galho grande cair para aumentar a luminosidade e iniciar o crescimento. Se isto não acontecer, morrem na espera, pois sua resistência cai e são comidas. O conjunto de plântulas aguardando maior luminosidade é denominado“banco de plântulas”. As plantas que passaram por esta fase começam a encontrar condições de luminosidade melhores, mas ainda fracas, e o crescimento ainda é difícil. É importante aumentar a altura, pois, quanto mais alto, mais luz haverá. Por isto, as árvores jovens parecem varetas nesta fase, com um caule fino e comprido com folhas nas pontas e sem galhos embaixo. A madeira é leve, pois não há energia suficiente para construir uma madeira dura. A mortalidade ainda é alta nesta fase, pois a árvore jovem tem poucas folhas e é mais vulnerável ao ataque de herbívoros. Finalmente, a árvore começa a se aproximar da copa, a luz começa a aumentar e ela começa a se desenvolver mais. Neste momento, seus galhos terão de disputar com os galhos de outras árvores pela luz. Pode levar bastante tempo até que ela desenvolva uma copa grande. A partir daí, a árvore atinge a maturidade, mas ainda não consegue produzir muitas flores e frutos. Então, elas começam a desenvolver mais rapidamente as suas raízes, cobrindo uma área muito maior, principalmente próximo da superfície do solo, que é onde há mais Martinha Realce nutrientes. Seu tronco se alarga, sua copa se desenvolve. Muito poucas de suas irmãs sobreviveram, mas agora ela terá uma vida muito longa, e será a principal fonte de entrada de matéria e energia no seu ecossistema. Seu néctar, frutos e sementes alimentarão herbívoros. Alguns comerão suas folhas, mas suas defesas são fortes, e a maioria das folhas só será consumida pelos decompositores após serem descartadas. Na transição entre a floresta tropical e a savana, temos a floresta tropical semidecídua. Nesta floresta, a estação seca ainda é suficientemente curta para permitir a existência de uma floresta, mas há um estresse hídrico que é sentido especialmente pelas árvores mais altas (emergentes), que podem perder as suas folhas. Quanto maior a duração da seca, mais árvores perdem as folhas. Provavelmente, a mudança estrutural mais forte nestas florestas seja o aumento na quantidade de palmeiras e cipós, como discutiremos adiante. Árvores, arbustos e ervas de sub-bosque. grupo 1- baixa produtividade: Abaixo das copas das árvores de dossel, há árvores cujas copas não alcançam o dossel, e uma diversidade de plantas menores. Para simplificar, incluímos todas numa única categoria, entretanto, há algumas di- ferenças que precisam ser mencionadas, por isto as dividimos em dois grupos. A maioria destas plantas tem produtividade baixa. Assim como as árvores jovens, seu crescimento é lento devido ao escuro da mata. Diferente das árvores, estas plantas produzem flores e frutos sob baixa incidência de sol. Entretanto, sua produção é bastante limitada. Suas sementes são geralmente de tamanho médio. Grupo 2- produtividade alta (considerando-se o contexto). Algumas plantas de sub-bosque só germinam se há muita luz, normalmente devido à abertura de uma clareira, de um igarapé mais largo, ou de uma estrada. O conjunto de sementes de plantas que está no solo “aguardando” a eventualidade de aumento de luz é denominado “banco de plântulas”. Estas plantas têm um desenvolvimento rápido e podem produzir uma quantidade significativa de frutos. Esta estratégia depende muito da sorte da semente cair em um lugar iluminado, pois isto, ao contrário das árvores, as sementes são pequenas, porque assim a planta pode produzir mais sementes e multiplicar suas chances de sucesso. Várias destas plantas são dispersas por morcegos, como as sementes de Embaúba e desta piperácea da foto. Seus frutos costumam ser compridos para facilitar sua localização por colocação, e podem ser verdes, como se vê nesta foto em preto e branco. As trepadeiras Como vimos, as árvores têm uma juventude muito difícil. Não é fácil construir um tronco no escuro. A estratégia das trepadeiras é uma alternativa econômica. Apoiando-se nas árvores, elas podem chegar até as copas com um investimento muito menor. Em seguida, começam a crescer sobre a copa de várias árvores, seu tronco se alarga e começam a emitir raízes (cipós). Estes troncos grandes de trepadeiras são chamados lianas. Há muitas trepadeiras pequenas que não chegam até as copas. Algumas, como a Arácea Jibóia, crescem alguns metros e adquirem uma forma semelhante à de uma bromélia. Elas são chamadas hemiepífitas. As trepadeiras que se desenvolvem sobre as copas das árvores podem crescer muito. Algumas florestas são chamadas de matas de cipó porque a quantidade destas plantas é tão grande que é difícil se deslocar dentro da mata. Estas matas de cipós são mais comuns nas áreas de floresta tropical semidecídua. Aparentemente, a maior abertura de dossel e menor altura das árvores neste tipo de floresta favorece as trepadeiras. O prejuízo que causam às árvores é muito grande, e a estrutura destas florestas é bem diferente. O dossel torna-se irregular e coberto pelas trepadeiras, pois poucas árvores resistem a esta cobertura. As epífitas A falta de luz no solo da floresta é um problema sério para o desenvolvimento das plantas jovens. Entretanto, nem toda a floresta é escura. As epífitas são plantas que germinam suas sementes nas copas e se desenvolvem lá. Entretanto, a solução deste problema criou vários outros. O primeiro é o da semente chegar até um galho. Orquídeas produzem milhares de sementes pequenas que são carregadas pelo vento. A grande maioria não cai em galhos e morrerá, mas algumas conseguirão chegar a um galho. É importante que isto ocorra numa época seca, pois sementes molhadas não podem ser levadas pelo vento e ao caírem em galhos podem ser retiradas dele pela chuva. Em seguida, precisam germinar e desenvolver o mais rápido possível uma raiz para se fixar. Um problema sério neste momento e ao longo da vida da orquídea é a falta de água. Embora esteja numa região de muita chuva, o tronco da árvore se resseca com o sol forte durante o dia. A orquídea resolve isto aproveitando a umidade da noite. Sua raiz exposta é capaz de absorver a água do ar e do orvalho, especialmente durante a noite, e esta água fica armazenada em suas grossas folhas. Seu metabolismo é de um tipo especializado que permite uma economia de água. Outro problema é a falta de nutrientes. Nos galhos, normalmente não há um solo. Apenas em forquilhas de grandes árvores e ocasionalmente sobre troncos muito velhos se acumula matéria orgânica que serve como solo para as epífitas (como na foto), e então elas podem se desenvolver muito. Em geral, as orquídeas dependem dos nutrientes que escorrem pelo galho. Suas raízes também são ricas em micorrizas que auxiliam na captação de nutrientes. Embora as orquídeas estejam em um local iluminado, sua produtividade é baixa, devido à falta de água e de nutrientes. O resultado disto é que as orquídeasgeralmente são pequenas e produzem poucas flores ao longo do ano. Como produzem poucas flores, estas flores tendem a ser muito vistosas, para facilitar o seu encontro pelos polinizadores. Como poucas plantas estarão produzindo flores, é necessário que a flor tenha duração de vários dias e que o polinizador seja muito específico, para que se desloque diretamente de uma flor de orquídea para outra flor de orquídea da mesma espécie. Portanto, as flores tem estruturas especializadas para evitar polinizadores de menor eficiência. O exemplo da orquídea ilustra bem o que dissemos antes: a solução de um problema pode levar à criação de outros problemas. Entretanto, estes outros problemas têm solução. E por isto a estratégia epífita é tão diferente das outras. As Bromélias das copas são epífitas que encontraram os mesmos problemas das orquídeas. A maioria das suas soluções foi parecida. Uma diferença está na forma de armazenas água. Suas folhas estão dispostas em forma de coroa, formando um reservatório de água. Este reservatório pode secar eventualmente, mas as suas folhas são relativamente resistentes à dessecação. A presença de cactos entre as epífitas pode surpreender algumas pessoas, pois é uma vegetação mais associada a ambientes semiáridos. Entretanto, eles são comuns nas copas das árvores, pois o microclima lá é seco. Orquídeas, bromélias, cactos e a maioria das epífitas são comensais, isto é, não prejudicam a árvore sobre a qual cresceram. Existem epífitas que são parasitas. Por exemplo, a erva de passarinho consegue penetrar suas raízes dentro do tronco da planta hospedeira e retira água e sais minerais deste tecido. No início de suas vidas, encon- tram problemas semelhantes aos das orquídeas, entretanto, a sua dispersão é por pássaros que ingerem suas sementes e as depositam ao defecar sobre os troncos. A semente da erva de passarinho tem uma substância que a adere ao tronco, reduzindo sua chance de cair. Após desenvolverem as suas raízes de absorção, terão água, nutrientes e luz, e podem se desenvolver bastante, em alguns casos, a ponto de matar a planta hospedeira. Como absorvem água e nutrientes, ainda têm que fazer fotossíntese, por isto são chamadas de hemiparasitas. Outras epífitas desenvolveram um parasitismo ainda mais extremo. Suas raízes são capazes de absorver a seiva elaborada da planta hospedeira. A seiva elaborada é aquela que vem das folhas trazendo os produtos da fotossíntese para alimentar as raízes e o restante do corpo vegetal. As epífitas que absorvem esta seiva não são verdes porque não precisam fazer fotossíntese e são chamadas de holoparasitas. Algumas holoparasitas crescem sobre a copa, como uma convolvulácea (gênero Cuscuta), chamada popularmente de “fios de ovos” por- que sua cor é semelhante à de um doce feito com a gema do ovo. Outras crescem no interior do tronco das árvores hospedeiras, sua presença só é notada quando produzem as suas flores. Palmeiras da floresta As palmeiras são plantas que ocorrem tanto em ambientes abertos como em florestas. Costumam Desenvolver um tronco do tipo estipe, que geralmente não tem crescimento em largura. Entretanto, podem ser bastante altas. Geralmente são sensíveis à falta de água, provavelmente devido às suas folhas muito grandes. Palmeiras como o Buriti são indicadoras de locais com solos hidromórficos e possuem pneumatóforos para resistir ao excesso de umidade. São comuns dentro da floresta, incluindo algumas espécies de sub-bosque e outras de dossel. Muitas espécies de floresta têm caule subterrâneo, como a Inajá e a Attalea. A abundância de espécies com caules subterrâneos possivelmente esteja relacionada ao fato que a disposição de suas folhas enermês acaba por formar um grande funil coletor das folhas das copas das árvores, determinando um acúmulo de nutrientes à sua volta. Outras estratégias vegetais na floresta tropical Há outras estratégias menos comuns na floresta. O Mata-pau ou apui é uma estratégia que evoluiu apenas em dois gêneros de plantas (Ficus e clusia), entretanto, é uma estratégia que pode ser considerada importante, pois estas árvores são relativamente abundantes na floresta tropical. A planta nasce como uma epífita, na copa das árvores, onde há bastante luz. Entretanto, diferente das epífitas, sua raiz cresce até atingir o solo. Ao chegar neste estágio, a planta tem a luz das copas e a água e os nutrientes do chão, e começa a desenvolver mais esta raiz, que começa a cobrir o tronco da hospedeira. Sua raiz não tem a capacidade de apertar o tronco da hospedeira, entretanto, ela termina por morrer porque não pode impedir o desenvolvimento natural do seu tronco, comprimindo os vasos que levam seiva. Plantas do jardim de formigas. A quantidade de formigas em uma floresta é muito grande. Aparentemente, a competição entre elas acaba por restringir os bons locais para construção de formigueiros. Algumas formigas resolveram isto levando solo para cima de galhos para construção do seu formigueiro. Entretanto, o excesso de chuvas dificulta a manutenção destes formigueiros. Para evitar que o formigueiro se desfaça com a chuva, elas trazem sementes de determinadas espécies de plantas e as protegem de herbívoros. Assim, elas se desenvolvem nesta terra, e sua raiz retira o excesso de umidade e fornece uma estrutura firme que retêm a terra. Estas plan-tas apenas são encontradas nestes locais. As Holoparasitas de raízes. Nem todas as holoparasitas são epífitas. A maior flor simples do mundo pertence a uma holoparasita de raízes, Rafflesia arnoldii, da Indonésia, que se desenvolve dentro da raiz de uma trepadeira. Algumas parasitas de raízes se- quer entram em contato direto com as suas hospedeiras e produzem flores bem pequenas. Suas raízes são parasitas de fungos de micorrizas, que são mutua- listas de árvores. Micorrizas são associações entre fungos e plantas, na qual o fungo recebe alimento da planta e a planta recebe nutrientes do solo que os fungos tem maior capacidade de absorver. Praticamente todas as plantas fazem estas associações, mas as árvores em especial, especialmente se o solo for pobre. As plantas holoparasitas de micorrizas se associam ao fungo, mas ao invés de fornecer alimento, retiram o alimento que o fungo obteve de outra planta. Não é uma estratégia muito comum, entretanto, vale a pena ser citada para verificarmos que existem possibilidades de estratégias vegetais bem diferentes das mais comuns. Estratégias mais comuns na savana. Árvores e arbustos de savana aberta. As savanas geralmente possuem árvores próximas dos cursos de água. Nestes locais, o lenço freático está próximo da superfície, de forma que a disponibilidade de água ao longo do ano todo permite a ocorrência de árvores. Em vertentes de morros também pode haver disponibilidade de água em alguns pontos que permitem a existência de água suficiente. Fora desta situação, a existência de árvores é possível em savanas, mas depende da profundidade do lençol freático, e poucas árvores e arbustos sobrevivem à seca por tempo suficiente para suas raízes chegarem à profundidade necessária. Portanto, não ocorre a formação de um dossel, as árvores e arbustos ficam esparsos. As árvores de savanas são diferentes das árvores de dossel da floresta tropical. Suas raízes são profundas, porque seu fator limitante é água. O mesmo ocorre com os arbustos. Na maioria das savanas, predominam os arbustos, e as árvores são muito baixas. Costumam ter copas baixas, isto é, ramos deste a base. A savana africana um pouco é diferente. Lá há mais árvores altas com copas altas devido à abundância de herbívoros que atacam os ramos mais baixos. Devido à abundância de capim que seca na época sem chuvas, a ocorrência de fogo é relativamente comum neste bioma. Entretanto, é um fogo que passa rapidamente. Por isto, os arbustos costumam ter cortiças grossas ao redor do
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