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IAD I 1ºa parte

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INTRODUÇÃO AO DIREITO I
Prof. Fernando José Bronze
Introdução: 
É possível encontrar várias perspetivas diferentes na abordagem da disciplina de Introdução ao Direito entre as quais: 
a) Sociológica- já que o Direito é inquestionavelmente um fenómeno social;
b) Filosófica- o Direito dirige-nos deveres e “impinge-nos” responsabilidades e podemos então questionarmo-nos em que fundamento;
c) Epistemológica- visto que o Direito é um objeto aberto ao nosso conhecimento. 
d) Normativa- cruza-se em todas estas, mas não se reduz a qualquer uma delas. 
A perspetiva adotada é a perspetiva normativa.
Procuraremos compreender o Direito como dimensão normativa da nossa prática, visto que este é o fundamento/ critério de muitos dos nossos comportamentos, na medida em que se diz a validade/invalidade, da licitude/ilicitude de muitas das ações por mediação das quais interagimos comunitariamente. 
Deste modo, o Direito é uma norma de dever-ser, e, por isso padrão constitutivo da própria ação e das relações que estabelecemos uns com os outros. 
Resumidamente, o Direito é um princípio ou fundamento normativo que determina a validade dos nossos comportamentos societariamente relevantes.
O direito é uma realidade, logo o papel do jurista é compreender a sua normatividade e projetá-la na realidade. É um papel prático porque tem de assumir e compreender a intenção própria do direito e projetá-la na sociedade (realidade). Fá-lo através do juízo e decisões que vai proferindo. O direito só se torna real quando é convocado para transformar a realidade, ou seja, colocando a realidade em conformação com as normas.
A perspetiva prático-normativa é a que melhor combina com o papel do jurista. O pensamento jurídico é um pensamento de caráter prático e para uma conceção prática do direito a categoria fundamental é a do juízo de resolução de casos. O juízo é uma ponderação de uma realidade concreta, orientada por argumentos que são pertinentes. 
· O Direito enquanto quid ius e não enquanto quid iuris
O Direito, normativamente perspetivado, pode ser considerado de dois modos diferentes: 
- O Direito aparece como critério de solução, em questão de Direito, ou de quid iuris ( em que se pergunta: O que de Direito se pode dizer neste caso?); aqui o Direito é pressuposto, não é ele próprio interrogado.
- Se interrogarmos e questionarmos o próprio Direito, como um autêntico problema do quid ius ( em que se pergunta: quê Direito, o que é isso que chamamos de Direito).
· Qual a atitude do jurista?
Ainda no quadro de uma perspetiva normativa, podemos afirmar que a atitude do jurista perante o Direito pode ser uma de duas:
1) Ou Atitude Técnico-Profisisonal: na qual o jurista pretenderia conhecer as leis para as aplicar às controvérsias que surgissem no grande mercado de interesses em que se transformaria o mundo, sem qualquer compromisso cultural com o Direito, exercendo um ofício puramente técnico, pelo que só deveria atender aos meios sem ter que problematizar os fins; nesta 1ª hipótese, o Direito seria dado ao jurista, que o mobilizaria como objeto.
2) Ou Atitude criticamente comprometida com os objetivos práticos do Direito: nesta, o Direito é uma etapa que o toca; procura encontrar a sua intencionalidade prático-normativa. 
Por qual destas posições deve o Jurista optar? O jurista deve compreender a especificidade da tarefa e o sentido dos problemas culturais que o Direito lhe coloca, envolvendo-se neles; deve ainda preocupar-se com questões éticas, não podendo deixar de atender da concreta determinação das ações axiologicamente louváveis, como das pressuponentes e constituendas questões de saber o que é o “bem” e o “dever-ser”.
É de acrescentar que este universo do Direito exige também um certo tipo de pensamento, pois a normatividade consonante forma mentis do jurista é dialético-argumentativa, pois o que se lhe pede é que podere prudencialmente e decida em termos normativamente fundamentados controvérsias que se manifestem no âmbito de situações histórico-concretas que devam ser consideradas juridicamente relevantes. 
A Ordem Jurídica: análise
Porque precisamos de uma ordem? A ordem jurídica visa articular um todo com uma certa coerência. É uma das expressões do esforço cultural do Homem para vencer a anarquia resultante da sua natural dispersão. Uma ordem regula, articula as relações entre as pessoas, tem um efeito integrador. 
A ordem que o direito constitui é a Ordem Jurídica- esta é a síntese de uma estrutura formal e de um sistema com um determinado conteúdo material. 
Através da estrutura da Ordem Jurídica podemos perceber o tipo de situações jurídicas que o direito regula. 
 (
sociedade
)
 (
3a
) (
2a
)
 (
1a
) (
cidadãos
) (
Cidadãos 
)
1º LINHA: 
( relações das partes com as partes)
 Na 1ª linha, a de base, encontram-se as relações juridicamente relevantes que estabelecemos com os outros na veste de sujeitos de Direito Privado. Somos particulares ante particulares e relacionamo-nos em termos de paridade. 
Nesta linha, a Ordem Jurídica define as nossas autonomias, delimitando-as, e permite a realização dos nossos interesses, tutelando-os. 
A função que o direito desempenha é a de garantir a atuação das autonomias reciprocamente delimitadas e a de fornecer um critério de resolução dos conflitos que possam surgir. 
Nesta 1ª linha avultam essencialmente dois valores: o da liberdade centrada em cada um, e atendendo que as autonomias, que se relacionam, se relativizam mutuamente; e o da igualdade, pois desde que se verifiquem todos os respetivos pressupostos, todos podem realizar os seus interesses. 
Esta linha tem preponderantemente a ver com a Justiça de Troca ou Comutativa. É nesta linha que incide o Direito Privado: o direito privado comum ( civil) e o direito privado especial ( direito comercial e direito do trabalho). A esfera do direito civil abrange o Direito das Obrigações, da Família e das Sucessões. 
2ª LINHA
( relações entre os cidadãos e a sociedade)
Nós não somos apenas indivíduos, mas também cidadãos e as relações que estabelecemos entre cada um de nós e a sociedade tomada no seu todo é o objeto desta segunda linha. A sociedade emerge como sujeito das relações que estabelecemos com ela. Com efeito, a sociedade tem ela própria valores e interesses a garantir que nos dirige e cujo cumprimento nos impõe. A sociedade surge aqui como sujeito nas relações que connosco estabelece em primeiro plano. Mas os indivíduos também dirigem à sociedade exigências que derivam da afirmação da sua autonomia. Nas relações que estabelecemos com a sociedade estamos todos diante dela e não uns perante os outros. Por isso, esta linha regulamenta as relações da parte com o todo.
Os ramos do Direito que se localizam nesta segunda linha ( entre os quais, direito constitucional, o direito penal, o direito fiscal e o direito militar) visam regulamentar as exigências que a sociedade nos dirige, mas também institucionalizar, legitimar e limitar o poder; pois também nós temos interesses em reivindicar, como é o caso dos direitos fundamentais. Ou seja, a sociedade pode exigir-nos prestações mas não arbitrariamente. 
Aqui, o Direito cumpre as funções de: tutela dos bens jurídicos fundamentais; responsabilização comunitária e garantia da autonomia das pessoas. Acima de todos os valores que aqui encontramos, o valor da salvaguarda da nossa autonomia em momentos fundamentais como são aqueles em que estejam em causa a liberdade pessoal singularmente enucleada e a responsabilidade social de cada um. 
Quanto ao particular tipo de justiça, estamos perante a justiça geral, que se traduz em tudo aquilo que em nome de todos se pode exigir a cada um ou tudo aquilo que cada um pode exigir ao todo. Estamos também e ainda, perante a justiça protetiva, pois o Direito é aqui chamado a institucionalizar formalmente, a limitar e a controlar o poder e, consequentemente a garantir a situação dos particulares que com eles se confrontam. 
3ª LINHA
( relações entre a sociedade e os cidadãos-destinatários)
A sociedade é considerada uma entidade atuante,dinâmica, que tem um programa específico que quer atuar para atingir os objetivos a que se propõe. Esses objetivos podem ser-nos favoráveis mas também podem visar o benefício da própria sociedade: por exemplo, no Direito da Providência ou Assistência Social somos muitas vezes benificiários mas também contribuímos com descontos para fundos sociais. O direito aparece aqui como um estatuto de atuação, mas também de limitação. A sociedade, vai, portanto atuar o seu programa mas nos termos em que o direito o permitirá. Ele define os fundamentos e os meios com que a sociedade irá executar o programa. Quanto aos ramos do Direito presentes nesta linha, cabe-nos referir o direito público em geral, nomeadamente, o direito constitucional, administrativo, previdência social, direito público da economia, direito do ambiente… 
No que diz respeito aos valores que aqui se revelam, serão o da liberdade pessoal comunitariamente radicada e o da solidariedade. Note-se que este valor de solidariedade impõe frequentemente uma atuação em termos de desigualdade para se atingir, no fim, a igualdade ( ou melhor, a diminuição das desigualdades); digamos, que nesta sede, a igualdade não aparece aqui como critério, mas como objetivo 
Quanto à modalidade de justiça que se afirma nesta linha é a justiça distributiva que impõe uma atuação de recolha e distribuição de meios; como também uma justiça corretiva. 
Distinção entre Direito Público e Direito Privado:
Para proceder à distinção rigorosa entre os diversos ramos do direito privado/público a doutrina utiliza vários critérios:
- critério do interesse;
- critério da posição relativa dos sujeitos na relação jurídica.
-teoria dos sujeitos: 
 1- critério de identidade dos sujeitos da relação jurídica;
 2- critério da qualidade dos sujeitos da relação jurídica. 
Critério do Interesse: 
De acordo com este critério vamos atender à natureza do interesse protegido por cada uma das normas jurídicas. Uma norma seria de direito público, se visasse a tutela de um interesse público, ou seja, de um interesse geral da coletividade; e seria de direito privado sempre que prosseguisse um mero interesse particular. 
 Crítica/apreciação: temos que referir que interesse público e privado estão profundamente interligados, por isso também podemos afirmar que é de interesse público proteger interesses privados e que muitas normas não revelam apenas interesses privados mas também interesses gerais como a justiça, a paz social e a segurança. 
Este critério não é muito adequado. 
Critério da Posição Relativa:
De acordo com este critério, o direito público regularia relações assimétricas, ou seja, relações estabelecidas entre sujeitos colocados numa posição de supremacia e outros colocados numa posição de subordinação; diferentemente, o direito privado iria disciplinar relações entre sujeitos ligados por posições de igualdade e de coordenação.
Crítica: contudo, pode surgir no direito público, posições de igualdade ou de coordenação entre sujeitos ou pessoas coletivas de direito público. 
Ex: dois municípios que sejam membros de uma associação de municípios.
 Por outro lado, podemos encontrar também no direito privado relações jurídicas hierarquizadas. Ex: a relação que se estabelece pelo poder paternal entre pai e filho. 
Teoria dos Sujeitos: 
1- Critério de identidade dos sujeitos da relação jurídica:
Seriam normas de direito público, aquelas que interviessem como sujeito da relação o estudo ou qualquer outro ente público. Ao invés integrariam o direito privado, as normas que, regulam as relações jurídicas em que tivessem apenas particulares. 
Só se os entes públicos também podem intervir com particulares em certos negócios jurídicos.
Ex: se o Estado compra ou arrenda uma casa, está a agir como particular; tem de cumprir as mesmas regras que os particulares, para adquirir ou arrendar casa. ( Compra e venda será sempre direito privado)
Acresce-se também que os particulares podem relacionar-se entre si no âmbito do Direito Público. 
Ex: no caso de um concurso para o acesso à função pública no qual há critérios e procedimentos de natureza pública que interessam as relações dos particulares entre si. 
2- Critério de qualidade: 
Interessa agora saber se na relação jurídica, um dos sujeitos surge investido de um poder de autoridade pública, ou de soberania, ou de ius imperii. Seriam normas de direito privado as que regulassem relações jurídicas estabelecidas entre particulares ou entre o estado e particulares, sempre que estes ajam em veste de particulares, ou seja, despidos de qualquer poder de autoridade pública ou fora do exercício das funções soberanas. 
Também este critério não está isento de reparos, pois nem sempre é fácil de determinar o que é um poder de autoridade pública. Contudo, o nosso ordenamento jurídico parece inclinar-se ou preferir estes critérios da qualidade dos sujeitos jurídicos. 
No âmbito do Direito Privado distinguimos: 
- Direito Privado Comum/Civil : regula a conduta dos cidadãos;
- Direito das Obrigações: regula as situações jurídicas pelas quais uma pessoa está vinculada a realizar, em benefício da outra, uma prestação;
- Direito Real: regula os poderes diretamente incidentes sobre os bens;
- Direito da Família: regula a constituição da família e as relações pessoais e patrimoniais que se desenvolvem no seu seio;
- Direito das Sucessões: regula as vicissitudes da sucessão pela morte;
No âmbito do Direito Público distinguimos: 
- Direito Constitucional: regula os órgãos de soberania e da vida em comunidade;
- Direito Administrativo: compila o conjunto de normas que disciplinam a atividade da administração pública;
- Direito Penal: o conjunto de normas jurídicas que ligam certas condutas ( crimes) a certas consequências jurídicas específicas;
- Direitos Processuais: conjunto complexo de normas que regulam o processo jurisdicional, atos que são realizados pelos tribunais e pelas pessoas que atuam perante eles;
- Direito Financeiro: regula o direito fiscal, as finanças públicas, o direito tributário, etc.
Quando nos referimos à estrutura e à organização do material jurídico há que levar em conta a complexidade de cada situação, daí não ser tão linear a distinção entre Direito Público e Direito Privado. 
Funções da Ordem Jurídica
1- Função Prescritiva ( Primária);
2- Função Organizatória ou Secundária.
1: Função Prescritiva ( Primária): Nesta função, a OJ aparece-nos como princípio de ação e critério de sanção. 
É um princípio de ação porque define prescritivamente os direitos subjetivos e as responsabilidades ao mesmo tempo que avalia judicativamete os nossos comportamentos. Estas prescrições e juízos definem um princípio de ação porque através deles a ordem jurídica visa influenciar e direcionar o nosso comportamento, levando-nos a agir de modo lícito. 
Este conjunto de prescrições identifica um princípio de ação, pois o nosso comportamento é condicionado por este critério.
Mas a OJ não se fica por aqui, não se limita a comunicar que os nossos direitos são “estes” e que as nossas responsabilidades são “aquelas”… seria insuficiente. A OJ não é portanto só principio de ação ou não seria possível distinguir o seu caráter normativo de outros, como por exemplo a moral.
O direito impõe sanções. Acabamos por criar regras que nos vão “adotar”. A moral não estabelece sanções. Somos nós que internamente acabamos por sentir remorsos. 
A OJ se, por um lado, prescreve critérios de fruição do mundo ( sendo, portanto, princípio de ação), por outro lado, concorre também, para que estes critérios se realizem praticamente, apresentando-se igualmente como critério de sanção. 
A sanção é todo o meio que a OJ mobiliza para tornar eficaz as suas prescrições. Sancionar significa efetivar, consagrar, tornar sérios, dignos de respeito aos diversos imperativos jurídicos. 
A ideia de coercibilidade: 
· Porque necessita o direito desta parte?
É que, compartilhando nós o mesmo mundo, podemos ser tentados a abusar dele, impedindo injustificadamente os outros de o usufruírem ou delhes dificultar essa fruição. Neste horizonte de intersubjetividade, é razoável que se instituam meios destinados a evitar ou a punir tais abusos. 
Na esfera do direito exige-se , portanto, o cumprimento das obrigações de todos. 
Podemos afirmar, numa síntese que a específica vigência histórico-social do direito, o modo como ele se revela e a característica sanção que o predica, distingue-se da moral. 
DIREITO VS. MORAL
Critérios de distinção entre Direito e Moral: 
a) Critério do Mínimo Ético;
b) Critério da Autonomia;
c) Critério da exterioridade;
d) Critério do Fim e da Teologia;
e) Critério de Coercibilidade;
f) Critério 
Critério do Mínimo Ético: De acordo com este critério, o direito abrange apenas as regras morais básicas, cuja observância se revela indispensável para garantir a paz, a liberdade no plano social. Ou seja, as conceções morais das pessoas são diversas mas há um núcleo mínimo de valores que definem um comportamento comum e que o direito defende. 
CONTUDO, se assim fosse, o direito e a moral seriam materialmente idênticos, distinguindo-se somente quanto à extensão na medida em que o direito seria menos extenso e apenas cobriria e racionaria o núcleo essencial dos valores éticos. O direito identificaria a zona de interseção entre as várias conceções éticas socialmente vigentes. Deste modo, corresponderia a zona que existe maior densidade ética em virtude da sobreposição dessas perspetivas. Os bens mais importantes seriam os mais consensuais em termos éticos. A moral é mais ampla, o direito vai apenas sancionar as condutas que são mais importantes. 
Critério da Autonomia: De acordo com este critério, a moral é autónoma porque os seus preceitos ou regras têm por fonte e juízo do respetivo cumprimento a própria consciência individual. Nós somos o juízo da nossa própria consciência. Ao passo que, o direito traduz sempre uma forma de heteronomia, uma vez que, implica uma vinculação e cumprimento de regras alheias. 
Por outras palavras, as normas morais, sendo ditadas pela consciência de cada um a si mesmo, são a expressão da autonomia. Ao passo que o direito representa um conjunto de normas ditadas pelo exterior. 
Critério da Exterioridade: O direito contenta-se com a observância exterior constatável das normas, pouco lhe interessando que a pessoa cumpra a norma porque sabe do seu valor e limita-se a observá-lo. Já a moral exige uma ligação íntima ao valor que dita. Reclama das pessoas uma ação convicta- convicção de que se deve atuar de determinada maneira.
Critério do Fim ( Finalidade): De acordo com este critério, podemos afirmar que a normatividade jurídica tem por objetivo a realização da justiça e o alcance da paz social ( fim social) imprescindíveis ao desenvolvimento das pessoas e das respetivas condutas sociais; quanto à moral, por sua vez, visa orientar as pessoas para o fim supremo na sua plena realização, ajuizando da conformidade dos atos com esse modelo individual de perfeição. 
Critério da Coercibilidade: É o que permite distinguir da moral. As normas jurídicas são sancionáveis.
Sancionabilidade é todo o meio que a OJ segue/mobiliza para fazer valer as suas prescrições. O que não acontece com a moral. O direito é sancionável e a moral não, porque o direito repousa no seu caráter societário. A situação e o comportamento de cada um condiciona sempre a situação e a conduta do outro. Não existimos isolados e, por isso, vivemos sempre em reciprocidade. 
Sanção tanto pode ser positiva como negativa. Em termos de sanção positiva, pense-se nos diversos subsídios e isenções fiscais, nas bolsas de estudo. Por seu turno, as sanções negativas normalmente são posteriores a um determinado facto ( infringe norma do código da estrada -> paga multa) , mas pode também ser de caráter cautelar. Uma sanção impõe sempre algo de desagradável a quem as sofre. Nem todas as sanções envolvem o recurso à força ou constrição física ( coação). O direito mobiliza diferentes meios sancionatórios -> sanção e coação não se confundem. 
TIPOS/MODALIDADES DE SANÇÃO: 
- AUTOTUTELA: 
· Legítima defesa; ( é proibida)
· Ação direta;
· Estado de Necessidade. 
-HETEROTUTELA:
· Preventivos;
· Compulsivos;
· Reconstitutivos, Compensatórios;
· Punitivos;
· Recusa de efeitos jurídicos. 
Sanções Preventivas: medidas destinadas a impedir a violação da OJ; procuram evitar o incumprimento das normas jurídicas. Desempenha aqui um papel de relvo a atividade das autoridades públicas que condicionam, limitam e fiscalizam a ação dos particulares. Ex: inibição do exercício de tutela (instrumento que visa acompanhar menores e interditos através de um tutor). 
Sanções Compulsórias/ Compulsivas: sanções que procuram compelir/obrigar o infrator de uma norma a adotar a conduta devida cessando a violação em curso e que por conseguinte cessam logo que esta conduta termina. Ex: sanção pecuniária (dinheiro) compulsória que constrange o incumpridor de uma obrigação a pagar uma determinada quantia pecuniária por cada dia de atraso no cumprimento ( Art.829/A do C.C). 
Sanções Reconstitutivas: estas medidas são medidas de garantia ao restabelecimento da situação que existiria se a norma jurídica não tivesse sido violada. A reconstituição pode assumir várias espécies.
- Reconstituição em Espécie: esta visa a reposição da situação anterior sem recurso a qualquer bem inexistente à época. Por exemplo: se alguém de má fé constrói uma obra em terreno alheio do ano deste terreno tem o direito de exigir que a mesma seja desfeita e o terreno restituído ao estado primitivo;
-Execução: trata-se de impor a realização da prestação imposta pela norma ofendida, se o devedor não cumprir a obrigação de entregar ao credor este pode exigir o cumprimento da prestação em falta mediante a entrega dessa coisa. Este mecanismo designa-se por execução específica. 
-Indemnizações: a reposição da situação alcança-se através de um bem que não sendo aquele que foi efetivamente danificado, está em condições de o substituir; desempenha a mesma função. 
Sanções Compensatórias: estão pensadas para o caso em que não é possível restabelecer a situação anterior e em que se tenta por isso reproduzir uma situação de valor equivalente. Para tal, obrigam o transgressor a ressarcir o lesado pelos danos causados, tanto os danos diretamente emergentes da lesão ( danos emergentes) como ainda os que resultam da cessão de lucros (lucros cessantes). 
Quando os danos não sejam passíveis de indemnização por terem uma índole pessoa ou não patrimonial falamos de compensação ou reparação da dor ou do sofrimento estamos perante uma compensação. 
Sanções Punitivas: estas sanções são as mais pesadas visto que acarretam no mal para o infrator privando-o de bens como a liberdade, o património e em certos países a própria vida. As sanções punitivas, geralmente designadas por penas, podem ser de diversas espécies: 
a) Criminais;
b) Penas contra-ordenacionais;
c) Penas civis;
d) Penas disciplinares.
Criminais: são sanções próprias do direito penal;
Contra-ordenacionais: são aplicadas pela administração pública e punem com coimas certas condutas que lesam interesses fundamentais, como é o caso das violações das regras de trânsito. 
Civis: estas pertencem ao direito civil e ocorrem em caso de verificação de comportamentos indignos, como é o caso da incapacidade sucessória de alguém (um filho mata o pai, este perde o direito à herança; a pessoa perdeu a capacidade sucessória.)
Disciplinares: aplicam-se à infração de deveres por parte de determinadas categorias profissionais no exercício das respetivas funções: por exemplo, a repreensão, a suspensão e o despedimento. 
Recusa de efeitos jurídicos ( ineficácia em sentido amplo): estamos a falar de casos em que o determinado contrato não vai produzir o seu efeito esperado; vai-se desdobrar em: inexistência jurídica, invalidade ( divide-se em duas: nulidade; anulabilidade), ineficácia em sentido restrito. 
 (
Nulidade 
) (
Inexistência Jurídica 
)
 (
Invalidade
) (
RECUSA DE EFEITOS JURÍDICOS 
)
 (
Anulabilidade
)
 (
Ineficácia em sentidorestrito
)
Nestes casos, os efeitos jurídicos esperados não vão ocorrer. Podemos falar de ineficácia jurídica total ou parcial. Vejamos: 
- Inexistência: por exemplo, um casamento celebrado sem a declaração de vontade de um dos nubentes não produz qualquer efeito jurídico, ou seja, o mesmo é dizer que o ato não existe juridicamente;
- Invalidade: quando um ato materialmente existente está inquinado na sua validade por um vício, deixa também de produzir efeitos jurídicos por invalidade. 
Se ofenderem interesses públicos a invalidade assume a forma de nulidade (art.286º), pode ser invocada a todo o tempo ( seja um mês ou 20 anos) por qualquer interessado e ainda pode ser declarada oficiosamente por um juíz em tribunal. 
Se estiver em causa a lesão de interesses particulares a sanção de invalidade toma a forma de anulabilidade ( art. 287º). Apenas pode ser invocada a favor de quem foi estabelecida, é sanável pelo decurso do tempo e não pode ser declarada oficiosamente pelo tribunal. 
- Ineficácia em sentido restrito: casos em que o ato transgressor não produz total ou parcialmente os seus efeitos. 
EM NENHUM DESTES CASOS O NEGÓCIO VAI “AVANTE”
2. Função Organizatória ( Secundária): 
A par da função primária ou prescritiva, encontramos a função secundária; nesta, a OJ vira-se para si mesma para se auto-organizar para conseguir subsistir, evitando a natural desorganização própria da natureza humana. Sendo uma criação humana, e uma vez que o Homem é um ser dispersivo, a Ordem Jurídica correria o risco de se desagregar e deixar a sua principal função: organizar. 
Esta necessidade de organização surge também porque a OJ integra também uma multiplicidade de exigências e elementos entre os quais podem surgir incompatibilidades ou contradições, como é o caso dos conflitos de direito, as antinomias entre normas ou entre normas e princípios. 
É importante a coerência e a unidade sistemática, porque sem ela a OJ não constituiria sequer uma “segunda natureza” ( de caráter cultural) viabilizadora da própria coexistência humana. 
IDEIA DE ORGANIZAÇÃO, DE INSTITUIÇÃO
A OJ tem também como papel que resolver dificuldades e antinomias. Esta, organiza os modos da sua própria realização, daí que nos diz também a quem cabe solucionar os mencionados conflitos. Deste modo, a OJ cria órgãos a quem compete as funções implicadas: os tribunais e os órgãos da administração e até certas entidades privadas. Quanto ao poder legislativo, cuja atuação é igualmente bazilada pela OJ, compete-lhe criar os mais dos critérios que os tribunais e a administração depois mobilizam. 
Esta dimensão orgânica da função secundária da OJ remete-nos para a figura dos órgãos que são dotados de uma certa competência, que devem exercer de um modo determinado. Esta última faceta da sua atuação remete-nos para a referência ao processo. 
O Processo racionaliza a ação dos órgãos e controla o próprio órgão; constitui portanto um modo de controlar um determinado poder ( estamos a pensar, em particular, no processo jurisdicional). 
Referência sucinta à importância do Processo:
1- Racionaliza a ação;
2- Controla o próprio órgão;
3- Permite às partes exercer os seus direitos e garantir uma adequada participação na respetiva obtenção dos seus interesses.
RACIONALIZAR AS REGRAS É LIMITARO PODER DE ESTADO
Em suma, a Ordem Jurídica não define apenas ( através da função primária ou prescritiva) uma normatividade; ela auto-organiza-se também através da sua função secundária. Esta auto-organização é fator da sua própria subsistência como Ordem.
A especificidade desta função ser a auto-organização é tão essencial a um funcionamento eficiente que alguns autores sustenta mesmo, ser ela decisivamente caracterizadora da OJ. 
NOTAS CARACTERIZADORAS DE UMA OJ EM GERAL
I. A Ordem como cosmos natural;
II. O caráter comunitário;
III. Objetividade. 
I- A Ordem como cosmos natural
Ao afirmarmos que a OJ é um cosmos, estamos a dizer que não é um puro caos. 
A OJ por ser Ordem ( invocando estabilidade, dinâmica e unidade) evita e sana indesejáveis contradições; apresenta-se como um todo tendencialmente coerente. Traduz um esforço cultural necessário para compensar o já apontado caráter ontogeneticamente deficiente do Homem. 
II- O Caráter Comunitário 
A OJ constitui um esforço tendente a assegurar a integração comunitária, pois representa uma instância de controlo da vida em comum. 
Aparece como um integrante comunitário devido aos valores que materialmente a fundamentam. 
III- Objetividade 
Quando afirmamos que a OJ nos aparece como um mundo, estamos a reconhecer-lhe uma objetividade: a OJ esta aí, como a natureza, com a sua heteronomia; estando nós nela, ela existe independentemente de a querermos ou não. 
Apesar disto, a OJ não é um objeto qualquer: a sua objetividade apresenta, desde logo, uma autossuficiência podendo, por isso, qualificar-se como autárquica. 
A autarcia da Ordem surge como uma exigência da própria objetividade; a subsistência da OJ assenta nas suas próprias forças, das quais ressalta o caráter autárquico da respetiva objetividade. 
QUESTÃO: COM QUE LEGITIMIDADE APRESENTA A OJ UMA OBJETIVIDADE AUTÁRQUICA? 
Quando falamos em legitimidade da Ordem, já não tocamos na sua mera realidade mas autenticamente o seu sentido, que remete a uma validade;
A legitimidade da OJ consiste na sua justificação prática para os respetivos destinatários; para a OJ não somos apenas objetos mas autênticos sujeitos, pois o Direito é um modo de mediação de sujeitos com o mundo. 
A OJ tem, portanto, uma índole objetiva:
- Autárquica: enquanto instituição a Ordem Jurídica subsiste apoiada nas suas próprias forças. No plano imediato aparece como um objeto institucional;
-Dogmática: a nível do conteúdo. Na verdade, todo o universo prático-cultural ( Direito incluído) tem referentes que postulam, que são pontos de partida para as ações-decisões que o entretecem. Sem eles, não existiria opção. 
A prática tem, portanto, pressupostos dogmáticos. Nas ações-decisões, o Homem não parte do nada: mobiliza esta experiência culturalmente transmitida, vai reconstituindo a sua subjetividade e o seu mundo. 
 
 (
OBJETIVIDADE
)
 (
A OJ parte de ideias que já existem 
( de
 pressupostos dogmáticos), para construir os seus princípios e os seus valores. Portanto, n parte do zero; ela vai reconstruindo dogmas já existentes.
) (
Valores que fazem parte da OJ
) (
Dogmática
) (
Plano 
Intencional
 (
 conteúdo da OJ)
) (
Plano Institucional
) (
Autárquica
)
EFEITOS IMEDIATOS DE UMA QUALQUER ORDEM JURÍDICA:
I. A racionalização;
II. A institucionalização;
III. A segurança/previsibilidade;
IV. A liberdade enquanto responsabilidade e não como arbítrio;
V. A Paz como antecipação regulativa ( a Paz e a Justiça)
1. A racionalização 
A racionalização é a articulação de fatores diversos numa certe conexão unitária que, no limite, se nos apresenta como um sistema. O Homem invoca a razão sempre que não se conforma com os fenómenos tal como eles se apresentam. Procura enquadrar os factos desordenados num contexto, procurando situá-lo num quadro que lhe confira sentido. 
Sendo o Homem um ser livre, não codificado, ele é necessariamente um ser dispersivo; todavia, o Homem não pretende que o seu comportamento seja contingente e , para isso, tem que fazer um esforço cultural de racionalização. Ora, a OJ é precisamente uma das expressões do esforço cultural que o Homem faz para vencer a anarquia resultante da sua natural dispersão, pois constitui um esforço de racionalização da ação, visando dar-lhe coerência. 
É por isso que o Homem se projeta numa “segunda natureza”, em que se recria, destinada a instituir a determinação onde reinava a indeterminação; a substituir o caos por um cosmos, ou seja, a racionalizar o seu mundo. 
2. A Institucionalização
A racionalização tem somo seu corolário ( consequência) a institucionalização. 
A OJ como instituição que é, define padrões de comportamentos subsistentes com sentidos e valores simbólicos. O Homem precisa de instituições, poisé atirado para a vida quase desarmado, não estando dotado para atuar de modo determinado; tem de ser autor de si mesmo. 
Uma cultura identifica sempre um limite; Ora cada cultura representa, portanto, uma restituição à liberdade do Homem; ou seja, tudo o que se acaba de afirmar revela-nos a existência de uma dialética: o Homem, porque é livre, cria as instituições; instituições estas que, por sua vez, limitam a sua liberdade. 
Deste modo, duas dimensões são manifestadas: a liberdade (autonomia do Homem) e a comunidade ( uma vez que as instituições são a sua expressão). 
Liberdade vs. Comunidade
Estas duas dimensões, porque se limitam reciprocamente, articulam-se dialeticamente. Como sabemos, o mundo vai-se institucionalizando e as instituições desoneram o Homem do esforço requerido por um permanente exercício da liberdade; a institucionalização limita a liberdade mas sem ela a liberdade não poderia realizar-se, pois consumir-se-ia a si própria. 
Questão: Como resolver adequadamente esta dialética? Criando instituições que reconheçam e integrem equilibradamente a comunidade e a liberdade; a OJ é precisamente uma dessas instituições. Pelo facto de sermos mutáveis e indeterminados e simultaneamente sociais e associais é necessária uma ordem que integre esta dialética; ora, é precisamente essa a missão da OJ que tem esse efeito de racionalização institucionalizada dos comportamentos interferentes. 
 Em suma, a OJ é uma instituição; as instituições são necessárias, pois compensam o Homem da sua natural indeterminação, abertura e mutabilidade; o Homem tem necessidade da comunidade onde vive. Por isso, podemos afirmar que a comunidade é autenticamente dimensão e condição de humanização do Homem. 
POR OUTRAS PALAVRAS, a OJ tem um efeito institucionalizador porque define padrões de comportamentos subsistentes com sentidos e valores simbólicos. O Homem precisa de instituições pois é atirado para a vida quase desarmado, não estando dotado para atuar de modo determinado: tem de ser autor de si mesmo.
As instituições permitem que não partamos do nada; oferecem-nos bases de atuação e conceções do mundo. Desoneram o Homem do esforço exigido pelo exercício da liberdade. As instituições vão-se modificando, evoluindo à medida das pessoas. São a concretização de uma cultura, permitem desde logo articular a nossa sociedade. Traduzem o equilíbrio entre a liberdade individual e a comunidade. Esta é para o Homem uma condição de humanização. Mesmo o que somos ontogeneticamente é através da comunidade que o alcançamos. 
Mas, por outro lado, o Homem afasta-se da comunidade a que pertence, individualiza-se. Surge uma dialética que é resolvida na medida em que as instituições conseguem integrar a comunidade e as suas liberdades humanas. Para que não se institucionalize demais, esta deixa um espaço para a individualidade ( liberdade). 
A OJ está sujeita à crítica e à reflexão; pretende equilibrar a liberdade com a comunidade. E faz isto porque tem o efeito de racionalização institucionalizadora nos comportamentos sociais, de maneira a garantir o mínimo de liberdade a cada um. Daí na sociedade existirem vários papéis e estatutos. Mas a vida social, embora institucionalizadora, deixa sempre espaço para a liberdade.
3. A segurança/ previsibilidade
A OJ garante a segurança, pois vivendo nós no seu seio conhecemos antecipadamente os efeitos dos nossos comportamentos juridicamente relevantes e dos outros que connosco vivem. 
O Direito condiciona cada um de nós e uns aos outros, pelo que podemos prever os resultados dos comportamentos sócio juridicamente interferentes- e a segurança não é mais do que isto. Esta previsibilidade permite programar a nossa vida, sendo este fator de segurança de tal forma importante que alguns o consideram o valor nuclear do direito. 
Acrescentamos ainda que o imprevisto representa sempre uma agressão, gerando a insegurança. A Ordem Institucionalizada diz-nos com o que podemos contar, transmitindo-nos segurança: permite-nos que calculemos as consequências dos nossos atos, adverte-nos antecipadamente do que nos espera e ao fazer isso, com que possamos organizar e programar a nossa vida. 
4. A Liberdade enquanto responsabilidade e não como arbítrio 
Não existe liberdade absoluta. Tem que se aceitar limitar a liberdade porque se o outro que convive não vê um limite na sua ação ficamos permanentemente sujeitos ao seu arbítrio. Para que isso não aconteça temos que nos submeter a certas regras e definir concertadamente o que é lícito e o que é ilícito. A regra é sempre uma civilização. Há sempre uma compreensão da liberdade, contudo visa defender a própria liberdade. 
O que se pretende é definir regras que nos garantam perante os outros e os outros perante nós, uma certa liberdade evitando o comportamento arbitrário, sem regra. 
Quer tudo isto dizer que, a prático-consonante limitação da liberdade é uma garantia da própria liberdade e a institucionalização limita a liberdade para a salvar em termos praticamente razoáveis. Significa isto que a liberdade juridicamente relevante é sempre uma proporcionalmente igual liberdade para todos e que o Direito deve ser um fator de oposição aos obstáculos que se deparem à realização de uma praticamente adequada liberdade geral. 
5. A Paz como antecipação regulativa ( a Paz e a Justiça)
 O Direito define um conjunto de normas que nos integra, quais os meios para o cumprimento dessas normais e quais os órgãos que vão defender a aplicação dessas normas. O direito impede o exercício privado da força para a aplicação do direito, defendendo os órgãos estaduais e a incumbência de fazer valer o direito, mas submetendo-o a regras processuais, limitando o poder estatal e a relação com os outros. 
A Ordem Jurídica resolve os conflitos jurídicos entre as pessoas, contribuindo para a paz social. Contudo, tem que se ir além da paz; a paz não pode ser apenas a negação da violência. Há um sentido positivo da paz que só advém através da justiça. A paz que se pretende alcançar é a que provem da justiça e só assim será uma realidade. A paz é uma obra da justiça.
A paz, à semelhança da justiça, articula a OJ, sendo que esta deve prosseguir o ideal da paz, apesar de nunca ser totalmente alcançado. A Ordem Jurídica substitui a força e a violência pela razão. Em arena processual é reproduzido o conflito- só que aí não se trocam agressões mas sim argumentos. 
O direito será tanto mais eficaz quanto mais prevenir ( em vez de se limitar a resolver) os conflitos. O societariamente mais relevante efeito da Ordem Jurídica é, portanto, o da prevenção de conflitos; concluímos que a OJ é um importante fator de paz. 
Em suma, o Direto é uma via de substituir a força bruta pela razão, pois num tribunal as partes não utilizam a força mas argumentos; Mesmo em caso de conflito aberto entre as partes, o Direito pré ordena-se pela paz, pois resolve o problema a favor de quem tiver a razão argumentativa mais forte e não quem lançar mão da força empírico-factualmente mais bruta. 
O societariamente mais relevante efeito da OJ é o da prevenção de conflitos; pautamo-nos por esse “principio da ação” e compreendemos que a OJ é um decisivo fator de paz.
A ORDEM JURÍDICA E O SENTIDO DO DIREITO
 Não há direito sem ordem; a existência de uma é, portanto, condição necessária do Direito. 
Questão: Não será sua condição suficiente? Não. Estamos perante uma Ordem, mas será uma ordem de Direito? Ora, o Direito tem uma carga axiológica que o Homem, enquanto sujeito ético assume; Uma ordem, tal como a descrevemos até aqui, não define objetivamente o direito. A OJ manifesta uma insuficiência objetiva, pois não basta só por si, para nos revelar o sentido do direito- isto porque existem Ordens que prevalecem não a nossa adesão, mas a nossa repulsa.
Questão: Será que podemos resolver o nosso problema referindo a OJ à Estadualidade? 
Não; não bastará a qualificação de estadualidade da ordem para a reconhecermos genuinamente de Direito porque, não obstante o facto do Estado ocupar um lugar importante, Estado e Direito sãorealidades diferentes. 
Existem 3 razões fundamentais que diferenciam a Ordem normativa e a Ordem Política do Estado: 
1. O Direito e o Estado não se identificam:
O Estado e o Direito distinguem-se culturalmente porque têm histórias diferentes. A invenção do Estado é recente, surgiu apenas na idade moderna e com este surgiu um certo tipo de Direito: o Direito-legislativo; mas antes dessa época, já existia o Direito ( ex. Direito Grego, Direito Romano). 
Ora, foi precisamente esta a razão pela qual se levou à identificação do Direito pela estadualidade. A expressão Direito identifica realidades muito diversas, abrange o direito-legislação, mas também o Direito internacional, o direito primitivo, etc; ou seja, apesar de ser o modo de constituição da normatividade jurídica vigente mais relevante, não absorve todo o direito, pois existem outras fontes do direito. 
Contudo, se é um facto que o Estado ocupada em relação ao direito um importante lugar, é certo que há muitos sinais que relativizam essa posição. A estadualidade não é característica necessária nem suficiente da juricidade de uma ordem socialmente reguladora. A coincidência histórica entre estadualidade e juricidade é acidental e não essencial. 
O Direito e o Estado não se identificam; a ordem de direito não é exclusivamente criada pelo estado; e o poder político que o Estado titula não é o fundamento da Ordem Jurídica, sendo a juricidade que fundamente materialmente a estadualidade.
Estado e Direito não se identificam material ou intencionalmente:
· O estado é uma organização de poder, remete para a politica; o direito é uma ordem normativa que nos remete para um sistema de princípios que afirma uma validade;
· O estado visa fins, mobiliza o poder e intende à eficácia; já o Direito baseia-se em valores, atua com normatividade e procura a validade;
· A racionalidade do Estado é de meio-fim, estratégica; mas a do Direito é a axiológica referida a valores- uma solução jurídica é válida porque está de acordo com certos valores e não porque pretende atingir um certo fim; 
· Os partidos políticos são discriminadores porque a lógica da conquista do poder é a lógica de uma estratégia; o direito centra-se em valores e estes são universais.
2. A Ordem de Direito não é exclusivamente criada pelo Estado:
Com efeito, nem todo o Direito que existe é constituído pela imediata mediação do Estado; grande parte tem como fonte o poder estadual, mas não tem de sê-lo. 
Nem todos os sistemas jurídicos são sistemas de legislação ( como é o caso dos sistemas de Common Law); E mesmo no sistema de legislação como o nosso, nem todo o direito vigente é criado pelo Estado. 
Note-se ainda que a distinção entre Estado e Direito se manifesta na expressão “ Estado-de-Direito”; esta fórmula integra duas dimensões: a da estadualidade e a da juridicidade. 
3. O Poder Político que o Estado titula não é fundamento da OJ: 
O direito não é só direito por ter sido criado pelo Estado; o Estado é diferente de direito; estadualidade é diferente de juricidade. O direito é direito porque provém do titular que governa o Estado; o fundamento do poder não pode ser o próprio poder, não é o direito que se precisa de fundamentar no direito, mas sim o poder. O Estado de Direito é aquele em que o poder está submetido à juricidade. 
O que dá sentido jurídico à OJ é uma dimensão normativa porque o Direito refere-nos a uma normatividade, a um dever cívico; assim a perspetiva normativa é a privilegiada para compreender o Direito ( o jurista tem que resolver problemas concretos). 
EM SUMA
Ser Ordem é um elemento necessário para que se possa falar de Direito mas não é um elemento suficiente; uma ordem socialmente regulamentadora não pode dizer-se de direto pelo facto de ter sido criada pelo Estado. 
Pelo que subsiste a pergunta: o que é que dá sentido de direito à OJ? Será uma dimensão normativa; sem esta normatividade material não haverá uma verdadeira ordem de direito. A OJ para constituir uma autêntica ordem de direito tem que manifestar uma dimensão normativa positiva, ou seja, uma validade. Como devemos compreender essa dimensão normativa? 
Em primeiro lugar, devemos recordar que a OJ assimila valores e que estes sintetizam plenitudes de significação num determinado horizonte cultural e que a densificam conferindo-lhe uma interioridade com a qual a nossa interioridade pode dialogar. Esses valores concorrem para a vigência de uma Ordem, pois ela terá que assentar em valores para poder perfurar durante muito tempo. Uma Oj tem também uma dimensão prescritiva pois distingue o válido do inválido, o lícito do ilícito. 
A materialidade normativa da OJ é determinada pelo conjunto de referentes axiológicos em que assenta a sua validade. São precisamente esses valores que conferem uma dimensão normativa à ordem de direito e é esta específica dimensão que a distingue de outras ordens com as quais se poderia formalmente confundir. 
A OJ para que possa ser considerada como autêntica de direito tem que traduzir a síntese de um conteúdo reconhecido como materialmente válido e como sociologicamente eficaz; ou seja, a vigência abarca duas dimensões: a validade e a eficácia. 
 
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