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INTRODUÇÃO À
ECONOMIA
UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
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líMódulo í
2.2018lEmonu
Montaria de Introdução a Economia
Universidade de Brasília -FACE - Departamento de Economia
(ECO)
Introdução à Economia 2*72018
Coordenação da disciplina: Andrea Felippe Cabello«MT
Monitoria ifc toiroduç® à Economia
PROGRAMA INTEGRADO
1. OBJETIVOS E MÉTODO
O curso apresenta instrumentos de análise e conceitos básicos da Economia,
visando capacitar o estudante a melhor compreender os fenômenos económicos da
realidade que o cerca. Cursada por mais de mil e quinhentos alunos a cada semestre, a
disciplina é oferecida em um formato inovador, com turmas grandes, provas e programa
unificados, e um papel central atribuído à Equipe de Monitoria- IEMonit, formada por
estudantes especialmente selecionados e treinados para essa tarefa. O conteúdo do
programa será transmitido aos alunos por três vias igualmente importantes: as leituras
indicadas abaixo, as aulas expositivas dos professores e as aulas de exercícios,
ministradas pelos monitores.
Os textos de leitura são selecionados de várias fontes. Não é uma solução ideal:
há algumas superposições ou descontinuidades e o material proveniente de autores
estrangeiros contém, naturalmente, poucas referências a situações e exemplos
brasileiros. Mas essa deficiência é compensada por três mecanismos: aulas expositivas,
onde os temas das leituras são apresentados pelos professores numa sequência coerente
e com exemplos apropriados; material de leitura complementar referente à economia
brasileira, disponibilizado para os alunos via internet; e exercícios, aplicações
frequentemente referentes a situações concretas, conceitos e instrumentos apresentados
nas leituras e nas aulas.
As aulas, as leituras e os exercícios se complementam, portanto um bom
rendimento no curso dependerá do conjunto desses três elementos.
2. CONTEÚDO DO CURSO
O conteúdo da disciplina está dividido em sete unidades e dois módulos, sendo
as unidades 1, 2 e 3 no módulo I, unidades 4, 5, 6 e 7 no módulo II. Cada módulo
corresponde ao conteúdo das respectivas provas I e II. Segue abaixo uma relação
simplificada dos conteúdos abordados em cada uma das sete unidades do curso.
1" Unidade - Introdução. A teoria económica: objeto. Economia “positiva”: a hipótese
do comportamento maximizador. Alocação de recursos escassos e eficiência. Custos de
Oportunidade, Curvas de Possibilidades de Produção e Linhas de Possibilidade de
Consumo. Vantagens absolutas, vantagens comparativas e ganhos comerciais. Teorias
do Comércio. Relações económicas internacionais. Determinação de fluxos de comércio:
vantagens comparativas. Modelos alternativos: livre comércio e protecionismo.
1
Economia “normativa” e juízos de valor. Escolha social: decisões de mercado e
decisões centralizadas. Lista de Exercícios 1.
2a Unidade - Sistema de Preços. Teoria elementar da demanda e oferta de bens e
serviços: determinantes. Funcionamento do mercado: deslocamentos e políticas de
preço máximo e mínimo. Comportamento competitivo: o modelo de concorrência
perfeita; determinação de preços em concorrência; o conceito de equilíbrio de mercado.
Elasticidade preço e elasticidade-renda. Substituição e complementaridade. Bens
normais e inferiores. Estruturas de mercado. Falhas de Mercado: a ideia de
extemalidades, o conceito de bem público e o governo como agente regulador. Listas de
Exercícios 2A e 2B.
3a Unidade - Contas Nacionais. A mensuração da atividade económica. Óticas de
mensuração: Produto, Renda e Despesa. A despesa global e seus componentes. Formas
de medida dos agregados económicos. Comparações internacionais de nível de renda.
Comparações no tempo: o problema do deflacionamento. índices de preços. Listas de
Exercícios 3A e 3B.
4a Unidade - Noções de Economia Monetária. Funções e história da moeda. O sistema
bancário e a criação de moeda. Banco Central e controle da oferta monetária. Sistema
financeiro no Brasil. Inflação: causas, consequências. Lista de Exercícios 4.
5a Unidade - Noções de Macroeconomia. Produto potencial e produto efetivo.
Crescimento económico. A economia no curto prazo: flutuações do produto e renda.
Poupança, investimento e o papel do sistema financeiro. A visão “clássica” e a
keynesiana. Política anticíclica de curto prazo. Multiplicador keynesiano de despesa.
Política fiscal: efeitos, instrumentos. Desemprego keynesiano. Outras causas de
desemprego. Listas de Exercícios 5A e 5B.
6a Unidade - Noções de Economia Internacional. O Balanço de Pagamentos: conceito,
principais contas. Noções de macroeconomia aberta. O mercado cambial: regimes de
câmbio. Taxas de câmbio real e nominal. Teoria da paridade do poder de compra.
Teoria macroeconômica da economia aberta. Listas de Exercícios 6A e 6B.
7a Unidade - Distribuição de Renda e Tópicos de Economia Brasileira. Distribuição
pessoal e funcional da renda. Medidas absolutas de avaliação da pobreza: linha de
pobreza e linha de miséria. Medidas relativas: desigualdade distributiva e seus
indicadores. Curva de Lorenz, índice de Gini. Distribuição de renda no Brasil: evolução,
fatores que a influenciam. Evolução da economia brasileira; o processo de
industrialização; transformações recentes e perspectivas atuais. A experiência
inflacionária brasileira e os planos de estabilização. Lista de Exercícios 7.
3. LISTAS DE EXERCÍCIOS
Listas de Exercícios, cobrindo cada unidade do programa, estarão disponíveis na
página do curso na internet e nas apostilas do curso. Os exercícios são essenciais para
um bom aprendizado da disciplina e devem ser resolvidos paralelamente à discussão,
em classe, das unidades do programa. Os gabaritos destas listas serão divulgados na
semana seguinte à sua resolução pelos monitores, ou na sexta-feira da semana anterior à
prova.
2
4. EQUIPE DE MONITORIA-IEMonit
A Equipe de Monitoria é composta por 26 monitores. Cada professor contará
com um ou dois monitores referência, que se farão presentes periodicamente para levar
recados, aplicar controles e também tirar eventuais dúvidas sobre o conteúdo da
disciplina e sobre a equipe. Além do mais, também estarão disponíveis, em horário de
atendimento semanal, a ser anunciado para cada turma, na sala da Monitoria, localizada
no subsolo do ICC norte (BSS 553-56) e também podem ser contatados por email, a ser
informado em sala. Com base na experiência acumulada ao longo de trinta semestres, os
monitores estarão dando continuidade a um projeto que visa maximizar o desempenho
acadêmico dos alunos, e tem-se mostrado eficaz nesse propósito
O atual quadro de monitores referência, monitores que acompanham uma turma, é
composto por:
Alessandra Oliveira Barbosa, Antônio Elias Quaresma Pessoa, Bruno Motta Amat, Caio
Rodrigues de Oliveira, Carlos Henrique da Silva Figuerêdo, Fernanda Moreira Lins,
Gabriel Diógenes Madeira Sousa, Gabriel Lucas Soares Miranda Louzeiro, Gabriel
Menezes Resende, Gabriella Teixeira do Nascimento, Grace Kelly Ramiro de Araujo,
Islla Gabriele Pinheiro, Izabel de Sena Flores, João Victor Romanow Gabriel, Lucca
Henrique Gustavo Rodrigues, Luigi Bastos do Nascimento Pintaude, Marcello
Rodrigues Costa, Marina Paganine Julião, Mateus Gaudêncio Marques, Pedro Henrique
Salles Arouck de Souza e Rodrigo Cruz Pinagé.
Além dos monitores de cada turma, a Monitoria possui quatro coordenadores
responsáveis pelas tarefas administrativas da disciplina. Eles são:
Júlia Soares de SouzaCoordenadora Geral:
Coordenadora de Correções: Maria Salete Alves de Queiroz
Amilcar Lopes do Prado Ganzelevitch GramachoCoordenador de Exercícios:
Coordenador de Informática: Pedro Lima Moreira da Silva
Aulas de Exercícios - Questões das listas de exercícios serão resolvidas nas aulas de
monitoria, ministradas três vezes por semana e cobrindo o mesmo conteúdo, podendo o
aluno optar pelo horário que melhor lhe convier:
Terça: 12h20 às 13h20-A definir
Quarta: 12h20 às 13h20 e das 18h às 19h- A definir
Obs.: Durante as aulas de exercícios serão aplicados, eventualmente, controles de leitura
extras,que podem valer pontos adicionais.
Atendimento via e-mail - Além da página da disciplina, a IEMonit utilizará o serviço
de e-mails, por meio do grupo de e-mails de cada turma, para divulgar avisos
importantes, tirar dúvidas e manter os alunos informados sobre as últimas atualizações
na página da disciplina. É de responsabilidade do aluno o ingresso no grupo de e-
3
o
mail e este mecanismo será considerado como um dos meios de comunicação oficiais
entre monitor e aluno. A inscrição poderá ser efetuada pelo website da monitoria.
Informações disponibilizadas pelo grupo de emails são consideradas oficiais, logo,
elas poderão não ser repetidas em sala - cuidado. Isso inclui avisos referentes a
data e locais de avaliações e avisos referentes a imprevistos.
5. PÁGINA NA INTERNET
Nessa página serão disponibilizados: notas das provas; gabaritos das listas de
exercícios, e das provas; o link para entrar no grupo de e-mail da turma, textos
complementares, reportagens e notícias contemporâneas e avisos importantes. Aos
alunos que não tiverem acesso à Internet em casa, é possível acessar a página pelos
computadores disponibilizados no hall de entrada do ICC Norte, na biblioteca do
campus e laboratórios de informática.
O endereço da página é: http://introducaoaeconomia.wordpress.com/»
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Para facilitar ainda mais a comunicação com os alunos, o facebook da iemonit foi criado
para informações rápidas e mudanças repentinas no calendário.
Curta-nos também no facebook: www.facebook.com/iemonit.
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Fique atento a todos esses meios de comunicação (e-mails, facebook, página na internet)
pois eles podem ser utilizados para divulgadas datas ou alterações de datas de controles,
provas ou qualquer outros avisos adicionais aos dados em sala. É de sua
responsabilidade o acompanhamento desses meios e tais informações podem não
ser repetidas em sala de aula por alguma eventualidade.
6. AVALIAÇÃO
Serão aplicadas duas provas escritas com a duração de duas horas e cinco
controles de leitura (aplicados em sala). A primeira prova ocorrerá dia 13/10/2018 e a
segunda prova, na data provável dia 01/12/2018. As provas ocorrem aos sábados, com
início ao meio dia. Caso seja necessário, as datas e os horários poderão ser
alterados. Isso será avisado no grupo de e-mails e no site da disciplina, logo é de
sua responsabilidade estar atento a esses canais de comunicação.
Em dias de prova, em casos extremos a tolerância máxima para chegada do
aluno é de 30 minutos após o início de sua aplicação, portanto, caso o aluno chegue
com mais de 30 minutos de atraso este não poderá realizar tal avaliação. Alunos que
chegarem com atraso não terão compensação de tempo.
Você poderá sair da prova somente quando essa alcançar uma hora de
realização ou quando todas as assinaturas na lista de chamada dos alunos fazendo
prova no seu anfiteatro forem colhidas, o que vier depois. Esse processo muitas
vezes leva mais de uma hora, logo pode ser que você seja liberado somente depois das
O
4
13:00 caso esteja em um anfiteatro grande. Por favor, não insista para não perturbar
seus colegas fazendo prova ainda - essa medida é para a segurança da
identificação da sua prova.
Caso você precise faltar uma prova, você deve entrar em contato com
antecedência pelo email recurso.inteco@gmail.com - faça isso assim que você
souber que você não poderá comparecer. Será exigido algum tipo de comprovação
relativo ao motivo da falta (e esse pode ser aceito ou não), logo esteja preparado a
fornecer tais documentos. Qualquer comunicação de falta por outros meios
(comunicado verbal a professor, monitor e etc) não será considerada. Caso você faça a
comunicação da falta após a data de realização da prova (e somente com um
motivo válido para isso), esse somente será aceito, mesmo que com comprovação,
caso seja feito em até 48 horas corridas após a realização da prova pelo email
recurso.inteco@gmail.com sem exceções.
7. RECURSO
Você tem direito a recursos em relação à correção de controles e provas. A
revisão da nota de controles deve ser feita com o monitor responsável pela turma a qual
o aluno está matriculado na disciplina. A revisão da nota de provas deve ser feita em até
uma semana após a divulgação das notas, através da entrega do formulário de recurso
disponibilizado no site da monitoria. Após análise, o aluno será informado sobre o
resultado de sua solicitação. Dada a restrição de tempo do final de semestre, a revisão
da nota da segunda prova só é possível por meio do pedido de revisão de menção feito
na secretária do departamento de economia no período indicado pelo calendário
acadêmico vigente. Quando preencher esse pedido de revisão de menção, se você
precisar dele, lembre-se de colocar: a sua nota atual, a nota pretendida, os motivos e
justificativas que embasam seu pedido, sua turma (pedidos sem turma não serão
analisados) e sua matrícula. Qualquer documento que você acredite que possa reforçar
seu pedido (atestado médico, por exemplo) também deve ser anexado. Nenhum pedido
de revisão de menção ou documento enviado por email para esse fim será
considerado devido ao grande volume de pedidos recebidos
documentação/justificativa completa deve estar no seu pedido de revisão de menção,
lembre-se disso. Todos os pedidos são lidos com muita atenção pela coordenação do
curso, não se preocupe.
sua
MUITA ATENÇÃO PARA OS SEGUINTES PONTOS:
1. Os controles são obrigatórios e correspondem a 20% da nota final. Os cinco controles
de leitura poderão ser aplicados em qualquer dia, a critério do professor da turma. Serão
aplicados três controles de leitura antes de cada prova. Os controles poderão, ou não, ser
avisados, ficando a critério do professor.
2. Não haverá substituição para controles perdidos pelos alunos, independente da
justificativa apresentada, mas só serão consideradas, para cálculo da média, as quatro
melhores notas.
5
3. Haverá ainda controles de leitura extras, aplicados nas aulas de exercícios, sem aviso
prévio. Esses controles são opcionais; suas notas serão somadas às dos controles
regulares, para cálculo da média (portanto são úteis para compensar eventual perda de
um controle regular). Vale lembrar que só é permitido ao aluno fazer UM controle extra
antes de cada prova. Caso faça mais que um, valerá a maior nota.
4. Tanto nas provas como nos controles, os alunos devem apresentar documento de
identificação com foto. Do contrário, NÃO poderão fazê-los.
5. Os controles estarão disponíveis para consulta na Sala da Monitoria após a
divulgação das notas.
6. Todos os controles e provas devem ser feitos a caneta preta ou azul, sem o uso de
calculadoras e/ou qualquer material complementar. Controles e provas entregues
a lápis não serão corrigidos.
7. Para os alunos que faltarem em uma das provas da disciplina, haverá a possibilidade
de realizar a Prova alternativa. A prova alternativa referente ao conteúdo da primeira
prova ocorre no dia 04/10 (quarta-feira) e a referente à segunda prova ocorre no dia
29/11 (quarta-feira) em horário a ser divulgado (fique atento aos nossos meios de
comunicação oficiais); POREM, só realizará a prova alternativa aqueles que
apresentarem comprovante que justifique a falta nas provas realizadas aos
sábados. Para fazer a prova, você deve mandar um email para
recurso.inteco@gmail.com pedindo instruções. Qualquer dúvida, procure seu monitor.
A menção final será baseada na média de três notas: as notas das duas provas e a Nota
final dos controles. Ou seja,
Prova 1: 40%
Prova 2: 40%
Controles: 20%
Nota Final dos Controles = (somatório das quatro maiores notas dos controles em
classe + notas dos controles extras) - não podendo a nota final ser maior que 100.
Para aprovação, a nota final do aluno deve ser maior ou igual a 50,0 (cinquenta) pontos.
• Arredondamentos para fixação da menção final ficarão a critério do professor e
serão levados em consideração: o desempenho geral do aluno, a regularidade de
suas notas e sua assiduidade.
r\ 8. É de responsabilidade do aluno solicitar participação no grupode e-mails de sua
turma Todos os avisos enviados por este meio são considerados avisos dados ficando a
cargo do monitor responsável por cada turma outras formas de aviso.
6
8. Leituras
Bibliografia das Unidades - Parte das leituras é extraída do livro de Mankiw -
tradução da 3o edição americana (MANKIW, N.G. Introdução à Economia. Trad. Allan
Vidigal Hastings. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2005).
Textos Sugeridos
MÓDULO I
•Ia UNIDADE (Introdução)
Carvalho, L. W. R. Teorias do Comércio Internacional.
Mankiw, cap.2- 3. (“Pensando como um economista”, “Interdependência e Ganhos
Comerciais”, p. 19-60).
Versiani, F. R., Bruno P. Rezende e Patricia C. Rodrigues. Alguns Conceitos Básicos.
Versiani, F. R., Bruno P. Rezende e Patrícia C. Rodrigues. Escolha, Custo de
portunidade e Trocas.
Versiani, F.R. Custo de Oportunidade e Preços de Energia no Brasil
Versiani, Flávio R. O Curso de Introdução à Economia.
•2a UNIDADE (Sistema de Preços)
Carvalho, Lívio W.R. Os Dois Lados do Mercado: Oferta e Demanda
Carvalho, Lívio W.R. de, F. R. Versiani, B. P. Rezende e Max Villela. Elasticidade e
suas Aplicações.
Mankiw, cap. 4-6 p.63-134, cap. 10-11 p.203-240, cap.15-17 p.313-390.
Rezende, B. P. e F. R. Versiani. Estruturas de Mercado.
Sampaio de Souza, M. da Conceição e L. W.R. de Carvalho (col. ítria A. Tonon).
Extemalidades, Bens Públicos e Recursos Comuns.
•3a UNIDADE (Contas Nacionais)
Macedo, Roberto. O Desastroso IGP da FGV.
Mankiw, cap. 23-24 p.499-534.
Rezende. B.P., Michael W.D. Lima e F.R. Versiani. índices de Preços.
Versiani, F., L.W.R. de Carvalho e B. P. Rezende. Contabilidade Nacional.
MÓDULO II
•4a UNIDADE (Economia Monetária)
BACEN. Copom.
Carvalho, L.W.R. et al. Inflação: Teorias, Efeitos e Políticas Anti-inflacionárias
Mankiw, cap. 29-30 p.627-672
Versiani, F. R. (col. B. P. Rezende e P. C. Rodrigues). Economia Monetária
•5a UNIDADE (Noções de Macroeconomia)
Carvalho, L.W. R. Poupança, Investimento e Crescimento
Ellery Jr., Roberto G. Macroeconomia . Anexo: Introdução à Curva de Phillips
Fortuna, Eduardo. Mercado Financeiro, cap. 3
Krugman, Paul. Como Puderam os Economistas Errar Tanto?
7
Mankiw, cap. 25-26, p.537-582,cap. 31-32, p.675-720. cap. 35, p.781-808.
Versiani, F.R. Visão clássica e visão keynesiana.
r\
•6a UNIDADE (Economia Internacional)
BACEN. Risco-País.
Gonçalves, Flávio de O. e F. R. Versiani. Notas sobre Taxas de Câmbio e Mercado
Cambial.
Mankiw, cap. 31 (“Macroeconomia das Economias Abertas: Conceitos Básicos”, p.
676-694).
Sampaio de Souza. M. C., L. W. R. Carvalho e F. R. Versiani. Teoria Macroeconômica
da Economia Aberta.
Versiani, F. R., P. C .Rodrigues e F. T. Feijó Balanço de Pagamentos.
•V UNIDADE (Distribuição de Renda)
Barros, R.P. e R. Mendonça. “Geração e Reprodução da Desigualdade de Renda no
Brasil". Em: IPEA. Perspectivas da Economia Brasileira-1994. 2v. Brasília,
1993 (p. 471-490).
Cechin D. A., Versiani, F. R. e L. W. R. Carvalho (col. Marcus V. P. Pereira, B. P.
Rezende e Augusto Sticca). Desenvolvimento Económico e Desigualdade
Social.
EUA, Conselho de Relações Externas. O Brasil em Perspectiva Global e suas Relações
com os Estados Unidos.
Ferreira, S. F. e F. A. Veloso. “A Reforma da Educação”. Em: Pinheiro, A.C. & F.
Giambiagi (orgs.). Rompendo o Marasmo: a Retomada do Desenvolvimento no
Brasil. Rio de Janeiro: Elsevier, 2006.
Ferreira, Sérgio F. e Fernando A. Veloso. “A Escassez de Educação”. Em: F.
Giambiagi et al. (orgs.). Economia Brasileira Contemporânea. Rio de Janeiro:
Elsevier, 2005.
Ramos, L. e R. Mendonça. “Pobreza e Desigualdade de Renda no Brasil”. Em: F.
Giambiagi et al. . (orgs.). Economia Brasileira Contemporânea. Rio de Janeiro:
Elsevier & Campus,2005.
Versiani, F.R. A Economia Brasileira nas Últimas Décadas: Avanços e Problemas.
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7ÂXX Alguns Conceitos Básicos **0 *0* 101*0
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Introdução à Economia
Universidade de Brasília
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Flávio Rabelo Versiani, Bruno Pereira Rezende e Patrícia Costa Rodrigues
“A moral, pode-se dizer, representa o modo como aspessoas gostariam que
o mundofuncionasse-enquanto a Economia [representa o modo] como ele
realmentefunciona. ”
LEVITT, Steven D. DUBNER, Stephen J. Freakonomics. New York: HarperTorch, 2006.
O que é Economia? Você está iniciando seus estudos de Economia, e talvez já tenha se
perguntado: o que é Economia? A Economia é uma ciência que surge a partir de uma questão
aparentemente muito simples: a alocação de recursos escassos. Por recursos, entende-se não apenas
dinheiro e recursos financeiros, mas também disponibilidade de matéria-prima, trabalhadores,
terrenos etc. E, como bem se sabe, os recursos são limitados. Ainda que você seja a pessoa mais rica
do mundo, sua conta bancária tem um valor que indica a quantidade máxima de recursos que você
pode comprar (mesmo que ela seja, nesse caso, enorme). Como é possível, portanto, viver em um
mundo com recursos escassos? Escassez não diz respeito apenas à potencial falta de algo, mas
simplesmente à sua limitação, ou seja, ao fato de que esse “algo” não pode ser utilizado
irrestritamente, é finito. É verdade que existem alguns bens indispensáveis a todos nós, e dos quais se
pode dispor à vontade, sem que se chegue a uma situação de escassez: os chamados “bens livres”.
Exemplos possíveis são: o ar que respiramos, a luz do sol, etc. Para os povos primitivos, os bens
livres eram muito mais numerosos: nossos índios, antes de Cabral, tinham ampla provisão natural de
água ou de produtos de coleta ou de caça, sem temor de exaustão. Com o crescimento da população,
os bens livres vão rareando; hoje em dia, mesmo o ar puro vai se tomando cada vez mais escasso. Os
bens não livres, caracterizados pela escassez, são chamados de “bens económicos”; em geral são
objetos de troca, e têm um preço no mercado. Aí se inserem todos os tipos de bens que você puder
imaginar: laranjas, smartphones, biquínis, etc.
A palavra “economia” tem sua origem nas palavras gregas “oikos” (fortuna, riqueza,
propriedade) e “nomos” (regra, lei, administração), ou seja, envolve a administração, ou forma de
exercício de atividades relacionadas à riqueza, ou seja, à produção e distribuição de bens e serviços
necessários aos diversos aspectos da vida humana em sociedade. Na linguagem moderna, a palavra
tem duas acepções distintas, que em português representamos por Economia, com “E” maiusculo, e
9
economia, com “e” minúsculo. (Em línguas como o inglês, há uma palavra diferente para cada uma
delas: economics, para Economia, e economy, para economia). Com letra minúscula, economia (“uso
eficiente de recursos materiais”, como no dicionário) é justamente o objeto de estudos da Economia
com “E” maiúsculo; está é a ciência, o campo de estudos que se preocupa com o funcionamento da
“economia”.
Costuma-se definir a Economia, em princípio, como a ciência que estuda a alocação de
recursos escassos. Ou seja, que estuda como as sociedades dispõem dos recursos existentes,
evidentemente limitados, para tomar disponíveis os bens e serviços necessários à satisfação das
necessidades e desejos das pessoas. Se há escassez, se os recursos são finitos — enquanto as
necessidades e desejos são ilimitados —, então é preciso escolher. Isso fica claro em caráter
individual: se você tem um salário e vai ao supermercado para gastá-lo, você tem que decidir o que
comprar, pois não pode levar tudo o que gostaria; terá que escolher quais as necessidades ou desejos
irá satisfazer com suas compras. Da mesma forma, se você é um empresário, terá que escolher a
melhor maneira de aplicar seus recursos escassos: o que produzir, como produzir, etc. Também as
coletividades fazem escolhas, a todo momento, explícita ou implicitamente. Uma escolha básica é a
que se faz entre presente e futuro. Por exemplo: deve-se investir mais em aumento de capacidade
produtiva (o que possibilitará crescimento do consumo mais tarde, beneficiando gerações futuras), ou
favorecer o consumo atual, da geração presente? O governo deve construir maisestradas, ou
conceder aumentos ao funcionalismo? O objeto da Economia é, em grande parte, o estudo de
processos de escolha como os referidos acima.
Economia positiva e economia normativa. A tomada efetiva de decisões de escolha nem
sempre é fácil, como sabemos, especialmente quando envolve coletividades. Diferentes pessoas
têm opiniões e interesses distintos; a escolha nesse caso envolve uma compatibilização de diferentes
objetivos ou distintos juízos de valor (ou juízos morais, como na citação presente na epígrafe deste
texto). Isso pertence ao campo da chamada Economia “normativa”. Por outro lado, enquanto
fazem teorias para explicar a realidade, analisar e explicar os fenômenos económicos tais como são,
os economistas estão no campo da chamada Economia “positiva”.
Vamos dar um exemplo. Imagine que você leia uma notícia que diz: “o preço do feijão subiu
15% nos últimos três meses, o que pode ser atribuído à redução da produção pela escassez de chuvas
nas áreas produtoras”. É uma afirmativa sobre uma questão de fato: houve um aumento de preços, e
se oferece uma explicação para ele. É possível que haja divergência sobre essa explicação — outros
analistas podem julgar que a causa da alta de preços foi um aumento no preço do óleo diesel, por
exemplo, onerando o custo de transporte. Essa divergência poderá, em princípio, ser dirimida por
uma análise cuidadosa dos dados, resolvendo a questão de forma objetiva. Ou não: poderão persistir
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10
interpretações distintas se os analistas não chegam a um consenso. De qualquer forma, estamos no
campo da Economia positiva, da análise das coisas como são. Mas se consta da notícia a opinião do
jornalista de que, diante da subida de preços, o governo deveria subsidiar o preço do feijão para as
famílias mais pobres, isso é uma prescrição de política; uma proposição de Economia normativa,
portanto. Trata-se agora das coisas como devem ser, e não como são.
Em princípio, as análises da Economia positiva devem pautar-se pela objetividade científica;
elaboram-se teorias e modelos explicativos, a partir de certos pressupostos, e esses modelos e teorias
são submetidos à validação empírica, pelo confronto de suas conclusões com a realidade concreta —
por meio da coleta e análise de dados estatísticos, por exemplo. Se validados, revelam-se corretos; se
não, será necessário buscar novos modelos ou teorias explicativas. Tudo sem a intromissão de juízos
de valor.
(É necessário atentar, no entanto, para o fato de que o economista, e de modo geral o cientista
social, dificilmente pode ser tão objetivo e neutro quanto o físico, por exemplo, quanto este analisa a
estrutura da matéria. O cientista social pertence à realidade que analisa, tem, em relação a ela,
opiniões, juízos de valor e interesses, como qualquer outro agente económico. Sendo humano, pode,
eventualmente, ser influenciado por essas suas posições — ainda que inconscientemente — quando
faz uma análise que se pretende científica e objetiva.)
Quando estão envolvidos no desenho e aplicação de políticas económicas — ou seja, em
ações do Governo na área económica — os economistas estarão, tipicamente, praticando Economia
normativa, buscando agir sobre a realidade, impulsionando-a em determinada direção. Em que
direção? Quais as metas e objetivos pretende atingir? Na maioria das vezes, haverá posições
divergentes a esse respeito. Por exemplo: vimos que o valor do dólar em reais (a taxa de câmbio)
reduziu-se significativamente, nos últimos anos: a cotação da moeda norte-americana caiu de uma
média de R$ 3,40 / US$ 1, no segundo semestre de 2002, para metade desse valor (R$ 1,70 / US$1),
no primeiro semestre de 2008. Isso trouxe grandes perdas para alguns (como exportadores ou
produtores nacionais de artigos importados) e ganhos para outros (consumidores de produtos
importados, turistas no exterior). Supondo que o governo pudesse adotar medidas para conter essa
queda (uma suposição duvidosa, cabe notar), certamente haveria interesses e posições
diametralmente opostos em relação a tal política. É nesse sentido que se costuma dizer que a política
económica é uma arte: a arte de conciliar interesses e posições muitas vezes conflitantes, compondo
uma resultante que seja aceitável pela maioria, e vantajosa para a coletividade.
11
Alguns princípios básicos. O manual introdutório de Gregory Mankiw enuncia, em seu
primeiro capítulo, o que o autor chama de dez princípios básicos de Economia. Comentaremos aqui
os oito primeiros desses pontos, particularmente relevantes para o nosso contexto.
1. Escolhas e trade-offs.
Dado que os recursos são escassos, como vimos, é necessário escolher. No processo de
escolha, os agentes económicos — indivíduos, empresas, etc. — enfrentam trade-offs (um termo um
tanto difícil de traduzir por uma só palavra). Ou seja: enfrentam a necessidade de um cotejo entre
fatores que de alguma forma se opõem (sendo necessário sacrificar um em prol de outro), a fim de
atingir a melhor combinação. Um arquiteto, por exemplo, frequentemente enfrenta um trade-off
entre a funcionalidade e a beleza de uma edificação. E todos nós, em nossas decisões diárias de
consumo, nos defrontamos com trade-offs de várias naturezas: juntar dinheiro ou gastar já? Gastar
mais em pizzas ou em idas ao cinema?
Empresários, em suas decisões relativas à produção, deparam-se também com inúmeros
trade-offs. Digamos que um produtor rural contempla fazer um investimento para expandir a
produção. Seus recursos para esse investimento são limitados, pois ele dispõe de certa quantia de
dinheiro. Contudo, sua fazenda demanda gastos diversos, tais como a compra de novas máquinas
colheitadeiras; contratação e capacitação de empregados adicionais; mais insumos, como fertilizantes
e sementes, tudo visando aumentos de produtividade, etc. Isso indica que suas necessidades são, se
não ilimitadas, muito amplas. Desse modo, ele deve realizar a escolha da melhor alternativa possível
para aplicar o capital disponível no momento, levando em conta as possibilidades existentes, sua
informação a respeito delas, e a disponibilidade de recursos.1 E é claro que a opção por uma
alternativa — determinada aplicação de recursos — significa a não adoção de outras. Há um trade¬
off envolvido.
/"S
A escolha é uma questão básica em Economia; e trade-offs são características intrínsecas ao
processo de escolha.
2. Trade-offs e o “custo de oportunidade”.
As escolhas dos agentes económicos envolvem trade-offs; em geral, é necessário sacrificar
uma alternativa para obter o que foi escolhido. Nesse sentido, pode-se dizer que, do ponto de vista
económico, o custo da alternativa escolhida é dado pelo valor da alternativa que foi preterida. “Custo
1 Com respeito à informação, cabe mencionar aqui um aspecto importante, que será ressaltado mais tarde: a obtenção de
informação envolve custos; e muitas decisões são tomadas com informações incompletas, ou assimétricas — alguns
agentes detêm mais informações do que outros. Nos últimos anos, muitos economistas têm-se dedicado a analisar os
efeitos dessas assimetrias de informação sobre o funcionamento dos mercados.
12
de oportunidade” é, como vimos em texto anterior, a expressão que se usa para indicar tal forma de
definir o custo de uma ação. Se você considera a opção de ficar em casa estudando ou sair com os
amigos, o custo de oportunidade de sua saída serão as horas de estudo que você vai perder (e os
benefícios que tiraria disso). É, portanto, o que se “perde” (ou se deixa de ganhar) ao fazer uma
escolha qualquer.
O custo de oportunidade é um dos conceitos mais fundamentais da teoria económica (e às
vezes ignorado na prática dando origem a decisões incorretas, como vimos antes). “Custo”, em
Economia, significa, essencialmente, custo de oportunidade. É uma visão distinta da do contador, por
exemplo, para quem custos são, em princípio, os de natureza monetária. Num investimento, por
exemplo, os custos apurados na contabilidade sãos os dispêndiosincorridos pelo empresário —
compra de máquinas e equipamentos, juros de financiamentos, etc. Já o economista procurará
analisar, por exemplo, os lucros que o empresário deixou de ganhar em oportunidades alternativas de
investimento. Ou, numa perspectiva mais ampla, os custos sociais do investimento, que incluirão, por
exemplo, os danos ao meio ambiente trazidos pelo estabelecimento e a operação de uma nova
instalação produtiva.
3. Escolha e decisão “na margem”.
Esse é outro conceito da maior importância em Economia: muitas escolhas e decisões
económicas só têm sentido se feitas na margem, ou seja, considerando não grandezas totais (como
custos ou receitas), mas os acréscimos a esses valores associados à decisão considerada.
Um exemplo, já referido antes, toma a ideia mais clara. É o caso de viagens aéreas quando a
venda de passagens, ao preço normal, deixa lugares vagos nos aviões. Nesse caso, o custo de
transportar uma pessoa adicional — ou seja, o custo marginal — é irrelevante para a companhia
aérea. Valerá a pena, então, oferecer os assentos que ficariam vagos a preços muito inferiores ao
normal, o que traz para a companhia ganhos de publicidade e de conquista de novos passageiros. A
venda de passagens a preços simbólicos é, nesse caso, uma decisão economicamente racional, que
não traz prejuízo ao empresário, e não deve, assim, ser vista como uma prática de concorrência
desleal (como o dumping, que é uma venda a preços abaixo do custo).
Podem-se racionalizar muitas decisões empresariais a partir de uma comparação entre o custo
marginal e a receita marginal. Suponhamos, por exemplo, que uma montadora produza, em suas
fábricas, 200.000 carros por ano. Com um aumento de demanda, considera-se a possibilidade de
aumentar a produção, no curto prazo, para 220.000, sem expandir as instalações produtivas. A
decisão racional sobre isso levará em conta o custo marginal desse aumento de produção (que
poderia envolver, por exemplo, turnos extras) e a receita marginal que o produtor poderá ter com o
13
aumento de vendas. Quem estudar Microeconomia verá a importância do cálculo marginal em várias
questões importantes, como na determinação de preços.
Voltando ao exemplo anterior de água e diamantes. Quando consideramos o beneficio
trazido por um balde de diamantes e um balde de água, o relevante é considerar o benefício marginal
de cada um. Qual traz maior benefício marginal? Depende. Se uma pessoa estiver morrendo de sede
num deserto, e não for possível trocar imediatamente os diamantes por água, o que ela escolheria?
Certamente a água — que, portanto, tem para esse indivíduo um benefício marginal superior ao das
pedras preciosas. Mas, à medida que for saciando sua sede, o benefício trazido pela água irá
diminuindo, e o interesse nos diamantes passará a ser maior. O benefício marginal da água é,
portanto, decrescente. E o processo de escolha é, como fica claro nesse exemplo, afetado pelo fato de
o benefício marginal ser decrescente. Essa é outra ideia importante em Microeconomia: o ganho
marginal derivado do consumo de um dado bem (ou a utilidade marginal, como se diz em
Microeconomia) decresce, em geral, com a quantidade consumida.
4. Decisões e incentivos
Este é um princípio importante do raciocínio em Economia: os agentes económicos
respondem a incentivos. É uma decorrência do pressuposto da racionalidade dos agentes, como
vimos, e também uma implicação do ponto 2, acima. Uma vez que as pessoas analisam e comparam
custos e benefícios ao tomar decisões, seu comportamento e suas escolhas podem mudar quando
mudam os custos ou os benefícios envolvidos. Ou seja, quando se altera o sistema de incentivos.
Se o preço das bananas sobe, há um incentivo maior para que as pessoas comprem outras
frutas, já que aumentou o custo de comprar bananas. Por outro lado, o preço mais alto das bananas
trará estímulo aos que cultivam a fruta, os quais tenderão a aumentar sua produção, possivelmente
investindo na expansão da plantação, contratando mais mão-de-obra e buscando ganhar mais com
suas vendas. Haverá, assim, tanto incentivos ao consumo quanto à produção.
Não existem apenas incentivos financeiros, pode haver incentivos morais, por exemplo. A
desaprovação social a certas práticas, como a de jogar detritos nas ruas, faz com que pessoas bem-
educadas as evitem. A conscientização quanto a questões ambientais tem induzido mudanças de
comportamento com relação à preservação do meio ambiente. Quando tomamos decisões, portanto,
levamos em consideração não apenas o custo de oportunidade de cada escolha ou a análise “marginal”
dessa escolha, mas também os incentivos, positivos ou negativos, associados a certas opções.
/~\
14
5. Especialização na produção e trocas
Numa coletividade onde há especialização de funções e trocas entre produtores, todos podem
viver melhor do que em um mundo onde cada um produz tudo o que consome. Se o padeiro faz só
pães; o sapateiro, sapatos; e o alfaiate, roupas, a produção desses itens será mais eficiente do que se
cada produtor fabricasse todos eles. Com a especialização de funções, cada um se dedica àquilo que
sabe fazer melhor, e a produção será maior do que no caso em que todos produzem tudo. A
especialização está associada à troca: cada um produz seu artigo e o vende, e com o produto da
venda compra os demais artigos para seu consumo. Como a produção é maior, com a especialização
de funções, em princípio todos podem viver melhor. (Todos podem ganhar com especialização na
produção e trocas entre os produtores, mas não necessariamente todos ganham, como você verá
quando estudar o princípio das vantagens comparativas). Essa é uma proposição da maior
importância: o comércio entre produtores pode melhorar a vida de todos.
6. Trocas e mercados
Qual é a melhor forma de se organizar o sistema de especialização de funções e trocas entre
produtores? Pode-se argumentar que, na maioria dos casos (mas não todos), isso é feito de forma
mais eficiente pelo funcionamento livre dos mercados, sendo a alocação de recursos determinada, de
forma descentralizada, pela interação entre os agentes económicos, cada um tomando decisões
guiadas pelos seus próprios interesses e pela sinalização dada pelos preços.
Não é necessário, por exemplo, que haja uma autoridade que determine quais e quantos pães
as padarias de uma cidade vão produzir, e como irão organizar sua atividade produtiva. É fácil
imaginar que uma centralização de decisões dessa ordem produziria, muito provavelmente, muita
burocracia e pouca eficiência. Sem dúvida é melhor, nesse caso, que se deixe o mercado funcionar.
Se determinado tipo de pão tem muita procura, seus preços tenderão a subir, o que indicará aos
padeiros que vale a pena produzir mais deles; e o contrário, se um artigo não sai das prateleiras.
Dessa forma, haverá tendência a um ajuste entre o que é produzido e as demandas dos consumidores.
Se um novo método de produção reduz os custos de fabricação de pães, haverá indução para adotá-lo,
e quem não o adotar ficará em situação de inferioridade em relação aos demais produtores, lucrando
menos ou perdendo dinheiro. E, pela concorrência entre as padarias, a adoção generalizada de um
método mais eficiente de produção acarretará queda nos preços de venda, beneficiando os
consumidores. Em suma, as decisões de cada um, orientadas por seu próprio interesse individual, têm
como resultado uma situação desejável para a coletividade.
Ficou famosa a expressão usada por Adam Smith, um influente economista do final do século
XVIII, para descrever isso: ele disse que tudo se passava como se as ações individuais fossem
guiadas por uma “mão invisível”, de tal forma que a resultante de todas elas favorecesse o bem
15
comum. (A mão invisível era, pode-se supor, a mão da Providência Divina; Smith era muito
religioso). Mas, mesmo para os não religiosos, é evidente que o funcionamento do mercado, com
base em ações descentralizadas, no sistema de preços e na interação entreoferta e demanda, pode,
em inúmeras situações, ser mais eficiente, e levar a resultados superiores para a coletividade, do que
um complexo sistema de planejamento governamental.
7. Falhas de mercado e funções económicas do Governo.
Em situações como a acima, o melhor é deixar o mercado funcionar, sendo desnecessária ou
contraproducente, a intervenção governamental no sistema económico. Em alguns casos, no entanto,
essa intervenção é necessária ou desejável. Você vai estudar algumas situações em que o mercado
não funciona adequadamente: “falhas de mercado” fazem com que seja indicada uma ação corretiva
ou de coordenação por parte do governo. Isso sucede, por exemplo, quando há um conflito entre o
interesse individual e o coletivo: em certos casos, se cada um agir em função de seu próprio interesse,
o resultado é pior para todos, ou para a maioria.
São também vistas como desejáveis e necessárias ações do governo no sentido de reduzir
desigualdades, seja diminuindo o poder de mercado de certos agentes (como um monopolista, que
pode fixar seus preços sem a restrição dada pela concorrência de outros produtores), seja por ações
diretas de distribuição de renda, ou por outros instrumentos. Cabe também ao governo um papel da
maior importância na efetivação de investimentos de infraestrutura (construção de estradas, portos,
etc.), na provisão de serviços de educação e saúde e, em geral, em atividades que, por várias razões,
não podem ser supridas de forma adequada pela iniciativa privada. Também o próprio
funcionamento de mercados depende de ações do governo, garantindo, por exemplo, o cumprimento
de contratos entre agentes económicos (como no caso de empréstimos e financiamentos), os direitos
de propriedade, os direitos dos consumidores e dos trabalhadores, e assim por diante — sem o que os
agentes económicos não teriam confiança de efetuar trocas e negociar entre si.
Um tipo de ação governamental cuja importância passou a ser reconhecida na primeira parte
do século passado visa combater ou evitar reduções significativas na atividade produtiva causando
desemprego de mão-de-obra. Essas situações, como analisou Keynes, um economista inglês, em
livro publicado em 1936, podem decorrer de uma insuficiência geral de demanda, ou seja, de um
desequilíbrio entre o que é produzido e a disposição dos agentes económicos em efetuar gastos de
consumo ou de investimento. Nesse caso, o governo pode agir no sentido de aumentar diretamente
seus gastos (em investimentos de infraestrutura, por exemplo) ou estimular a demanda dos agentes
privados (reduzindo impostos, facilitando o crédito, etc.). Na recente crise económica mundial, em
2008-2009, vários governos, inclusive o brasileiro, adotaram medidas nesse sentido.
r\
16
Cabe também mencionar que, na história económica de vários países, como o Brasil, há
exemplos de atuação importante do governo no sentido de promover investimentos em determinados
setores, a partir do pressuposto de que a iniciativa privada não teria, por si só, recursos ou incentivos
suficientes para levar adiante empreendimentos julgados necessários ou vantajosos, do ponto de vista
da coletividade. Na industrialização brasileira em seu período inicial, quando a produção se voltava
apenas ao mercado interno, o papel de ações governamentais foi primordial no fornecimento de
incentivos de várias ordens aos investidores privados, no investimento promovido diretamente pelo
Estado ou por suas empresas, em setores como o siderúrgico, etc. Embora, no passado, essas ações
tenham tido efeito positivo sobre o desenvolvimento da indústria e o crescimento económico
brasileiro, especialmente no período de vigorosa expansão económica entre 1930 e 1980, em geral,
se reconhece que sua eficácia foi decrescente à medida que a economia se tomava mais complexa e,
principalmente, mais integrada à economia internacional. Nesse novo contexto, a ineficiência de uma
grande centralização de decisões económicas no âmbito do governo foi-se tomando patente. Essa
percepção influenciou a redução do papel do Estado na economia e o processo de privatização de
empresas estatais, levado a efeito nas últimas décadas.
8. Padrões de vida e produtividade.
Considerando o funcionamento da economia como um todo, há uma pergunta fundamental
que é sempre feita: o que explica a riqueza, ou pobreza, de países ou de regiões? E questões paralelas:
por que há uma variação tão grande no nível de riqueza? Por que diferenças tão grandes nos padrões
de vida, pelo mundo?
É claro que, em alguns casos, há uma resposta óbvia: a disponibilidade de certos recursos, em
países ou regiões específicas, pode trazer-lhes grande vantagem relativa, e explicar a maior
prosperidade de uns em relação a outros, menos dotados de tais recursos. É como se fosse uma
“loteria” premiando, por exemplo, países árabes com enormes reservas de petróleo, a Rússia com
muito gás em seu subsolo, o Brasil com minério de ferro e grande extensão de terras agricultáveis,
etc.
Já vimos, também, que em anos recentes a literatura económica tem enfatizado a grande
importância que instituições estatais podem ter sobre o bom funcionamento do sistema económico e,
particularmente, sobre as decisões dos investidores. Instituições estáveis e confiáveis facilitam o
investimento e, por consequência, o crescimento económico. Para alguns autores, esse seria o
principal fator da superioridade histórica das economias de países como os da Europa Ocidental e da
América do Norte, sobre as chamadas economias subdesenvolvidas.
17
Mas há uma explicação mais geral, especialmente relevante do ponto de vista de políticas
económicas visando promover o crescimento económico. O padrão de vida médio de um país
depende de sua capacidade de produzir bens; e essa capacidade produtiva tem relação direta com a
eficiência, a produtividade de sua economia. A produtividade é a relação entre a quantidade
produzida e a quantidade de fatores de produção utilizados: a produtividade do trabalho é a produção
por homem-hora; a produtividade da terra é a produção por hectare, e assim por diante.
De que depende a produtividade? Muito da tecnologia de produção: máquinas mais eficientes
produzem mais; é claro que um trabalhador com um trator movimenta muitíssimo mais terra do outro
que tenha apenas uma enxada. E depende também do nível de preparação, da educação e
experiência da força de trabalho. Particularmente nas indústrias modernas, onde as funções dos
operários em geral não se resumem a apertar continuamente o mesmo parafuso numa linha de
montagem (como ironizado no famoso filme de Charles Chaplin, “Tempos Modernos”), o nível de
conhecimento e preparação dos trabalhadores pode fazer enorme diferença, no que toca à eficiência
produtiva.
Não é coincidência, assim, que fases de aumento expressivo na produtividade tenham
consequências muito favoráveis sobre o crescimento económico. O extraordinário salto de
produtividade ocorrido no período da Revolução Industrial, na segunda metade do século XVTII,
consequente à introdução de inovações tecnológicas na indústria e à difusão de máquinas a vapor,
contribuiu para fazer da Inglaterra a “oficina do mundo”, e para pôr esse país na liderança da
economia mundial, no século XIX. A posição de vanguarda da economia dos Estados Unidos,
atualmente, tem muito a ver com a enorme capacidade de geração de progresso técnico em atividades
produtivas, nesse país, assim como sua liderança em pesquisa científica básica. Um alto nível médio
de educação da força de trabalho, como nos países do Sudeste asiático, é outro claro fator de
superioridade, na busca de maiores índices de produtividade e crescimento económico mais vigoroso.
No contexto brasileiro, pode-se mencionar que o rápido crescimento das exportações
agrícolas, nos últimos quinze anos, tem relação direta com os expressivos aumentos de produtividade
obtidos em setores como soja e açúcar -que mostram, em algumas regiões do País, os maiores
índices mundiaisde produtividade por área. (E é importante referir que esses ganhos de
produtividade resultaram, de forma decisiva, da atividade da EMBRAPA, um órgão governamental
de pesquisa agropecuária. O que ilustra outro importante papel do Governo nas economias modernas:
a condução de pesquisa básica e aplicada).
O caminho do crescimento económico passa, assim, necessariamente, pela busca constante de
aumentos de produtividade. E aumentos de produtividade, seja pela introdução de novas tecnologias
na produção, seja pelo aumento do nível educacional da força de trabalho, dependem de
r\
18
investimentos (em máquinas e equipamentos, no sistema educacional, etc.). Isso ressalta a
importância central do investimento no crescimento económico dos países. A taxa de investimento (a
relação entre o investimento total e o Produto Interno Bruto) é um indicador relevante, nesse
contexto. No caso brasileiro, muitos analistas mostram preocupação com o fato de que nossa taxa de
investimento é relativamente baixa, atualmente (inferior a 20%), em contraste com a de países cuja
economia tem crescido de forma acelerada nos últimos anos, como a índia e a China (com taxas de
investimento da ordem de 30% e 40%, respectivamente).
Os conceitos e princípios básicos, reunidos acima, serão a base de muitos conteúdos que
virão pela frente, servindo de fundamento para análises mais elaboradas.
QUADRO RESUMO - Oito Princípios de Economia
Princípio 1 - No processo de fazerem escolhas, os agentes económicos — indivíduos, empresas —
enfrentam tradeoffs.
Princípio 2-0 custo económico de um bem é dado pela alternativa de que se abre mão para obtê-lo
— seu “custo de oportunidade”.
Princípio 3-Escolhas racionais são feitas “na margem”.
Princípio 4 — Agentes económicos respondem a incentivos.
Princípio 5-0 fato de trocas serem possíveis conduz à especialização na produção, e pode deixar
todos em melhor situação.
Princípio 6-0 uso de mercados é, em geral, mas nem sempre, uma boa maneira de organizar a
atividade económica.
Princípio 7 - Quando o mercado falha, a intervenção do Governo pode ser indicada; e há outros
papéis relevantes para o Governo, numa economia moderna.
Princípio 8-0 padrão de vida de um país depende, em princípio, de sua capacidade de produzir
bens; e essa capacidade aumenta quando aumenta a produtividade.
19
01
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Escolha, Custo de Oportunidade e Trocas 01J0
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01Introdução à Economia
Universidade de Brasília
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Bruno Pereira Rezende, Flávio Rabelo Versiani, Patrícia Costa Rodrigues
Vimos que a escolha é um componente fundamental das decisões dos agentes económicos, e
estudamos nesse contexto, a noção de custo de oportunidade. Vamos neste texto explorar essas
ideias, e falar de trocas, um elemento básico da vida económica.
Antes, porém, será útil apresentar algumas definições de termos que usaremos com
frequência.
ALGUNS NOVOS CONCEITOS
Cazteris paribus. Podemos começar chamando atenção para uma expressão comumente usada
em textos de Economia: cceteris paribus (em latim) ou, em português, “tudo o mais constante”. É
empregada para indicar que, num dado raciocínio, tomam-se como constantes todas as variáveis que
poderiam ter influência no fenômeno em análise — com exceção da variável em consideração.
Quando se afirma, por exemplo, que “se a demanda é inelástica, uma redução na quantidade ofertada
aumenta a receita do monopolista, tudo o mais constante” (uma afirmativa cujo sentido ficará claro
mais tarde), a ideia é examinar apenas o efeito da redução de oferta, abstraindo de outras causas de
variação na receita.
Tipos de Bens. Em Economia, o conceito de “bem” se refere a tudo aquilo que contribui
para a satisfação direta ou indireta dos desejos e necessidades humanos. Às vezes a palavra é usada
num sentido restrito, referindo-se apenas a coisas tangíveis, que têm existência física (mercadorias),
em distinção a “serviços” (transporte, atividades de profissionais liberais, etc.). Quando estudamos as
transações externas de um país, por exemplo, falamos em “exportação de bens e serviços”. Outras
vezes é usada em sentido lato, abrangendo tanto mercadorias como serviços.
Nesse sentido mais amplo, os bens costumam ser classificados segundo critérios de
disponibilidade, forma de utilização e uso. É importante ter em mente que tais classificações não
dependem de características intrínsecas do bem, mas da forma e circunstâncias em que é utilizado. O
mesmo bem pode ser utilizado com bem de consumo e bem de capital, por exemplo. Veja o quadro a
seguir.
r*y
20
I
disponibilidade forma de
utilização
uso
bensde capital
apesar de não se
transformarem mais em
outros bens, os bens de
capital irão participar do
processo de produção de
novos bens
Exemplo: MP3 Player utilizado
por uma revista musical
bens livres
bens não-escassos
disponíveis suficientemente
para satisfazer todos os desejos
Bempios Ar, luz do sol
I bens intermediá rios
bens que irão compôr ou
se transformar em outros bens
Bemplo: Cristal utilizado
para a tela do MP3 player
bens
económicos
bens escassos
cuja obtenção implica
sempre um custo
Bemplo: Um MP3 player
bensfina is
bens que não sofrerão
mais nenhum processo de
transformação ou de agregação
de valor
Bemplo: O mesmo MP3 player
bensde
consumo
bens capazes de satisfazer
imediatamente as
necessidades das nessoas
MP3 Player utilizado por um
universitário comum
Segundo a disponibilidade, os bens podem ser livres ou económicos. Livres são aqueles cuja
quantidade é suficiente para satisfazer a todos os indivíduos, estando disponíveis sem restrição.
Exemplos comuns são o ar que respiramos (quando de fato disponível, sem poluição), a luz do sol
etc. Os bens económicos, nosso objeto de maior interesse aqui, caracterizam-se por serem escassos, e
portanto temos que pagar para obtê-los, têm um preço no mercado. O ar numa mina subterrânea é um
bem económico, e não um bem livre: há custos para tomá-lo disponível. Numa sociedade primitiva,
como a dos nossos índios antes de Cabral, os bens eram em geral livres. Com o avanço da
civilização, há cada vez menos bens livres.
Já segundo sua forma de utilização, os bens económicos podem se classificar em bens
intermediários e bens finais. Os bens intermediários são aqueles que ainda sofrerão transformações
para então se tomarem disponíveis para o uso (ou seja, deixando de ser algo para se tomar uma coisa
diferente). Como exemplo, temos o cristal líquido que será utilizado na tela do MP3player. Ou o aço
que é matéria-prima de motores de automóvel. São bens intermediários porque ainda irão sofrer
transformações, sendo incorporados em outros bens, para então se tomarem aptos ao uso (num MP3
player completo, num automóvel). Os bens finais, por sua vez, estão prontos para o uso ou consumo.
Nos exemplos, seriam os MP3players, ou os automóveis
Por fim, segundo seu uso, os bens finais dividem-se entre bens de capital e bens de
consumo. Os bens de capital são aqueles que não atendem diretamente às nossas necessidades, sendo
utilizados na produção de outros bens ou serviços. Convém ressaltar que o que difere os bens de
capital dos bens intermediários é que os bens de capital não sofrem transformação no processo
produtivo. Uma máquina de uma fábrica montadora de automóveis é um bem final porque não
sofrerá mais transformações para sua composição, já está pronta para o uso.
21
Um automóvel será um bem de consumo se utilizado por particulares, e um bem de capital se
for parte de uma frota de táxis. Da mesma forma, o MP3player é um bem de consumo quando usado
apenas para se ouvir música por diversão, mas será um bem de capital se utilizado por uma revista
especializada em crítica musical, por exemplo, pois nesse caso é fator de produção de um serviço
(críticas musicais).
Os bens de consumo podem também ser classificados em duráveis e não-duráveis. Os bens
de consumo duráveis são aqueles que produzem serviços ou têm utilidade por um período de tempo,
como geladeiras,máquinas de lavar, automóveis. Os não-duráveis são inteiramente usados no ato de
consumo, como, tipicamente, alimentos. Roupas e sapatos, embora possam durar vários anos, não
são classificados como bens duráveis (às vezes são referidos como “semiduráveis”). Note que casas
não são bens de consumo durável: gastos com a aquisição de moradias não são considerados gastos
de consumo, mas sim gastos de investimento das famílias (como veremos quando estudarmos
Contabilidade Nacional).
Eficiência económica. A ideia de eficiência, em Economia, tem a ver com a obtenção do
máximo possível, com os recursos disponíveis; ou a obtenção de certo resultado com o mínimo
possível de recursos. No lado do consumo, ao se considerar a escolha de um consumidor entre vários
bens, dada a soma de dinheiro disponível, a escolha será eficiente se só for possível consumir mais
de um bem, se diminuir o consumo de outros. Um empresário, dispondo de um dado conjunto de
fatores de produção, e contemplando a produção de dois bens, estará alocando eficientemente os
fatores de produção se o aumento de produção de um dos bens acarretar necessariamente uma
redução na produção do outro bem. No lado da distribuição (de bens, ou de renda) entre vários
agentes, a alocação será eficiente se só for possível melhorar a condição de um agente, em termos de
bens ou de renda, piorando a condição de outros. Esse conceito de eficiência costuma ser associado
ao nome de Pareto, um economista italiano; uma alocação eficiente é chamada de um “ótimo de
Pareto”.
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Eficiência x Equidade. Em certas circunstâncias, pode haver um conflito entre eficiência
económica e equidade distributiva; fala-se, nesses casos, num trade-off entre eficiência e equidade.
Por exemplo: o lançamento de impostos progressivos (os mais ricos pagando proporcionalmente
mais de sua renda) é um princípio de equidade; mas esses impostos podem ter efeito negativo sobre
os incentivos para o investimento, e causar outras distorções, impedindo a alocação eficiente de
recursos e reduzindo a produção. Sob certas condições, pode-se mostrar que uma economia de
mercado tende a situações de eficiência económica; mas não de igualdade distributiva. Se a
sociedade julga desejável que haja certo nível de igualdade, serão necessárias medidas de
intervenção — como os impostos progressivos — que muitas vezes se contrapõem à eficiência
1
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22
alocativa. A escolha, pela sociedade, de uma combinação julgada adequada de eficiência económica
e equidade é tópico estudado na chamada Economia do Bem-Estar, um ramo da teoria económica.
Fatores de produção. Os fatores de produção (ou recursos produtivos) são os elementos
básicos utilizados na produção de bens e serviços, comumente reunidos em três grandes categorias:
terra, capital e trabalho. “Terra” refere-se não apenas às terras em que se pode cultivar, construir
imóveis etc., mas também aos recursos naturais disponíveis, como minérios, ou água. “Capital”
compreende os recursos produzidos pelo homem e destinados à produção de outros bens: máquinas,
equipamentos e edifícios1. Por fim, “trabalho” refere-se ao conjunto de serviços humanos
empregados na produção.
ESCOLHA NO CONSUMO: A LINHA DE POSSIBILIDADES DE CONSUMO (LPO
Tendo em mente a escassez e as escolhas a que os agentes são submetidos e sabendo também
que os mesmos agem sob a maximização dos ganhos, podemos agora fazer uma análise inicial do
comportamento do consumidor em uma economia simplificada.
Para ilustrar esse comportamento, traça-se a Linha de Possibilidades de Consumo (LPC) de
um dado consumidor, com dois produtos que podem ser consumidos por ele. Num eixo estão
determinadas as quantidades possíveis de um produto, e no outro eixo as quantidades de outro
produto. A LPC é a reta que liga os dois eixos, mostrando as combinações possíveis dos dois
produtos de acordo com a renda disponível. Ela é também chamada de “curva de restrição
orçamentária”, justamente porque representa a
restrição imposta pela quantidade de dinheiro
disponível (orçamento) para sua alocação entre a
compra de dois bens distintos.
Tomemos João como exemplo. Digamos que 9
João tenha disponível para alimentação, 6
mensalmente, a quantia de R$150,00. Com esse 3
dinheiro, pode escolher entre duas alternativas, ou
uma combinação delas: comer no Restaurante -
Universitário (RU), por R$2,50, ou comer em uma rede de fast-food, por R$12,50. Sabendo esses
dados, e sabendo que toda essa renda (R$150) é destinada à alimentação de João, podemos traçar sua
a LPC.
Fast-food
A
12
B
C
FT D
E
RU
15 30 45 61
1 Nesse sentido, capital é um conjunto de bens de capital; costuma-se falar, nesse contexto, em “capital físico”. Em outro
sentido, capital é um conjunto de recursos financeiros aplicado a determinado fim, ou disponível para isso. O capital de
uma empresa são os recursos financeiros nela aplicados por seus sócios ou acionistas.
23
O ponto A é aquele em que João escolhe gastar seus R$ 150,00 somente em fast-food, indo
12 vezes ao mesmo e 0 vezes ao RU (R$150/R$12,50 = 12). O ponto E é o oposto, em que João
gasta tudo no RU, 60 vezes, e 0 vezes emfast-food (R$150/R$2,50 = 60). É importante notar que os
pontos descritos na LPC são combinações possíveis, não necessariamente desejáveis. Entre esses
pontos, João poderá escolher a combinação que preferir, podendo, por exemplo, escolher o ponto C,
indo 30 vezes ao RU e 6 vezes ao fast-food, tendo uma combinação com as duas alternativas, ao
invés de uma só.
João poderia, obviamente, escolher comer, por exemplo, 6 vezes no fast-food e apenas 15
vezes no RU, combinação essa que estaria representada pelo ponto F, fora da LPC. Entretanto, como
João é um agente maximizador (opera, portanto, sob a racionalidade do “homem económico”), ele
prefere ter mais bens do que menos (desconsiderando-se a hipótese de guardar esse dinheiro para
gastar com outras coisas, ou para gastar no mês seguinte). Desse modo, escolherá necessariamente
dentre os pontos sobre a LPC, lugar das combinações que utilizam ao máximo seus recursos
disponíveis. Não escolherá um ponto abaixo da linha, e nem um ponto acima da linha, pois este
extrapolaria seu orçamento disponível, e aqui se supõe que uma pessoa não pode gastar mais do que
o orçamento destinado às compras desejadas dos dois bens.
A LPC representa, assim, uma fronteira de consumo, mostrando o consumo máximo possível
de João, dada sua restrição orçamentária. Porém, digamos que ele receba um aumento em seu salário,
e consequentemente dedique parte desse aumento à
sua alimentação, destinando agora não mais R$150,
mas R$175 aos gastos com comida. Teremos, agora,
uma quantidade máxima de fast-food igual a
R$175/R$12,50 = 14, e uma quantidade máxima de
idas ao RU igual a R$175/R$2,50 = 70 (veja
representação ao lado). A LPC é, assim, deslocada
na direção oposta à origem, mostrando que agora
João poderá ir mais vezes tanto ao restaurante fast-
food quanto ao RU, ilustrando que sua capacidade de consumo aumentou. A LPC pode, também, se
deslocar em função da variação dos preços dos bens medidos nos eixos. O aumento do preço de um
bem faz com que possamos, com um mesmo orçamento, comprar menos unidades desse bem. Dessa
maneira, o aumento de preços desloca a LPC, no eixo do bem que sofreu o aumento, em direção à
origem (para a esquerda, no eixo horizontal, ou para baixo, no eixo vertical). Por outro lado, a
redução do preço de um bem, mantido o orçamento, desloca a LPC, no eixo do bem que sofreu a
Fast-food
14
12
70
RU
24
redução do preço, em direção oposta à origem (para a direita, no eixo horizontal, ou para cima, no
eixo vertical).
ESCOLHA NA PRODUCÁO: A CURVA DE POSSIBILIDADES DE PRODUÇÃO
(CPP1
Do mesmo jeito que a LPC demonstra a fronteira de consumo, a CPP demonstra a fronteira
de produção de uma unidade produtiva (ou mesmo de uma economia), em que o produtor escolhe
dentre alternativas, buscando maximizar seus ganhos. Assim como os consumidores, os produtores
tambémtêm uma restrição orçamentária: os recursos de que dispõem para a produção.
Assim como na LPC, na CPP são representados
apenas dois produtos, para facilitar a análise do modelo.
Desse modo, a CPP mostra as combinações possíveis de
produção de dois produtos com as quantidades
disponíveis dos fatores de produção (terra, capital e
trabalhoL e com a tecnologia existente. Para simplificar
ainda mais, utilizaremos a CPP com custos de
oportunidade constantes, tomando-a retilínea (vide em
anexo nota a respeito).
Tomemos um produtor rural como exemplo. Com sua capacidade produtiva, ele é capaz de
produzir de acordo com a CPP acima.
sacos de
milho
A100
B
75
C
50
D25
E sacos
20 40 60 âb de soja
No ponto A, o produtor destina todos os seus recursos à produção de milho (100 sacos),
produzindo 0 sacos de soja. O ponto E mostra a situação inversa, em que há produção somente de
soja (80 sacos), e 0 sacos de milho. Os pontos intermediários da CPP, como B, C e D, mostram
combinações possíveis de produção de soja e milho. Cada ponto intermediário indica, dada certa
produção de soja, qual o máximo de milho que pode ser produzido, e vice-versa.
A CPP reúne os pontos em que o produtor pode
produzir ao máximo, com seus recursos disponíveis. Se a
produção está abaixo de seu potencial, há subutilização de
recursos produtivos; isso é ilustrado pelo P, interno CPP,
na representação gráfica ao lado.
Nesse ponto a produção não é eficiente: seria
possível produzir mais de um dos bens, sem diminuir a
produção do outro.
sacos de
milho
100
A
P
E sacos
80 de soja
25
Já quando o ponto P está sobre a CPP, os fatores de produção estarão sendo plenamente
utilizados; a produção é eficiente. Só se poderá produzir mais milho se se produzir menos soja, e
vice-versa. Diz-se, nesse caso, que se trata de uma situação de pleno emprego (emprego integral dos
fatores disponíveis).
Uma terceira situação seria a de um ponto P fora da área delimitada pela CPP. Como esta
representa uma fronteira máxima de produção, dados os
fatores disponíveis naquele momento, não é possível
produzir em um ponto P, como mostrado ao lado. É uma
situação inatingível — a não ser que haja aumento nos
fatores disponíveis, ou se adotem inovações tecnológicas
nos processos produtivos de soja ou milho, casos em que a
CPP se desloca na direção contrária à origem.
Assim como a LPC, a CPP pode ser deslocada.
Esse deslocamento se dá pelo crescimento da capacidade produtiva de uma economia, como avanços
tecnológicos ou aumento na quantidade de capitais, por exemplo, que deslocam a CPP para a direita
(situação 1). Mas pode, também, ocorrer a situação inversa, em que, por uma eventualidade, como
uma guerra, haja, por exemplo, uma redução dos fatores de produção disponíveis, e a CPP se desloca
para a esquerda (situação 2).
sacos de
milho
100
P
E_ sacos
de soja
ry
SITUAÇÃO 2SITUAÇÃO 1
Sacos de
milho
Sacos de
milho
100
120'
90100
Sacos
de sojaSacos de
80 90 Soja 60 80
Voltando ao nosso exemplo do produtor rural, digamos que ele tenha um aumento em sua capacidade
produtiva. Esse aumento pode se dar de diferentes maneiras.
sacos de
milho- Exemplo 1: Digamos que um novo tipo de fertilizante é
descoberto e o produtor passe a usá-lo. A produtividade 120/"S
100
26sacos
90 de soja80
da terra aumentará tanto em relação ao milho quanto à soja, tendo o produtor sua capacidade
produtiva aumentada em ambos os produtos, como ilustrado a lado.
- Exemplo 2: Digamos que o produtor compre novos
tipos de sementes de soja, oferecidas pela Embrapa, que
germinam num menor período de tempo. Como a
inovação se dá apenas na soja, a capacidade do produtor
aumentará apenas nesse produto, permanecendo igual a
capacidade produtiva de milho, como mostrado no
gráfico.
- Exemplo 3: Digamos agora que o produtor tenha
adquirido uma máquina colheitadeira de milho mais
eficiente. Analogamente ao caso anterior, como a
máquina serve somente para a colheita do milho, a
capacidade de produção aumentará só para esse artigo,
permanecendo igual no caso da soja. A nova CPP sofrerá
então o deslocamento indicado no terceiro gráfico.
Poderia haver também o caso de redução da
capacidade de produção apenas de soja ou apenas de milho (se, por exemplo, ocorresse uma praga
que afetasse só uma das duas culturas). A representação gráfica seria análoga à dos exemplos 2 e 3,
invertendo-se a direção do deslocamento da CPP.
A CPP, assim como outras abstrações económicas, é uma simplificação da realidade, para
facilitar sua análise. Mas tem um papel muito importante para exemplificar os conceitos de escassez
e escolha, entre outros. Um ponto sobre a fronteira de produção (utilização plena dos recursos
produtivos) ilustra claramente uma situação de eficiência económica: só se pode produzir mais de um
dos bens reduzindo a produção do outro. Essa conclusão, apesar de simples e intuitiva, traz
implicações e conclusões mais complexas, algumas das quais serão estudadas posteriormente.
sacos de
milho
100
X sacos
80 -ÿ 90 des°ja
sacos de
milho
120
100
sacos
de soja80
CPP E CUSTO DE OPORTUNIDADE
Você viu acima que as alternativas de alocação de recursos para a produção de dois bens
distintos podem ser representadas graficamente por meio de uma curva de possibilidades de
27
produção (CPP), em que cada ponto da curva representa uma combinação possível de recursos para a
produção de determinada quantidade de um bem 1 e outra quantidade de um bem 2.
Considere a CPP representada ao lado, de um
produtor rural que pode escolher entre produzir apenas
milho, apenas soja ou ainda uma combinação dos dois
bens. Se ele se dedicar apenas à produção de milho,
consegue produzir 100 sacos do grão (ponto A). Caso opte
por produzir apenas soja, consegue produzir 80 sacos
(ponto E). As demais combinações estão representadas por
todos os demais pontos existentes ao longo da reta traçada (a CPP), tais como B, C e D, por exemplo.
Se o produtor se encontrasse na situação do ponto A, produzindo exclusivamente milho, e se
encaminhasse para o ponto B, pode-se observar que ocorreria o seguinte:
• A produção de milho diminuiria de 100 sacos para 75 sacos; e
• A produção de soja aumentaria de 0 sacos para 20 sacos.
Dessa maneira, pode-se dizer que o produtor abriu mão de produzir 25 sacos de milho
(redução de 100 para 75 sacos) para passar a produzir 20 sacos a mais de soja (aumento de 0 para 20
sacos).
sacos de
milho
A100
B
75
C
50
D25
I ! ' E_ sacos
Jo de soja20 40 60
Você já foi introduzido ao importante conceito económico de custo de oportunidade: o custo
de algo medido pela alternativa não adotada. No caso de uma escolha de consumo, o custo de
oportunidade da opção por um bem é dado por quanto se tem que abrir mão de outro bem, para que
se possa desfrutar do escolhido. Se você pensa em ir ao cinema ou estudar em casa, já que não pode
fazer as duas coisas ao mesmo tempo, terá que escolher; nesse caso, o custo de oportunidade de ir ao
cinema é o estudo que deixou de fazer; e o custo de oportunidade de estudar em casa é o filme que
deixou de assistir.
Com o produtor rural do exemplo acima, a lógica é semelhante. Para aumentar a sua
produção de soja, e caminhar do ponto A para o ponto B, ele teve que reduzir a produção de milho,
pois seus fatores de produção (terra, capital e trabalho) são limitados. Em termos de custo de
oportunidade, a questão que se coloca é: para produzir uma unidade a mais do bem 1, quantas
unidades do bem 2 eu terei que sacrificar (ou seja, deixar de produzir)? No caso em análise, temos
que, para produzir 20 sacos a mais de soja, esse produtor teve que abrir mão de produzir 25 sacos de
milho. Para calcular o custo de oportunidade de produção de um saco de soja, basta fazer uma regra
de três simples:
28
20 sacos a mais de soja
1 saco a mais de soja ------25 sacos a menos de milho-------X sacos a menos de milho
25
Resolvendo a regra de três, temos que X = = 1,25 sacos a menos de milho. Isso significa
dizerque, para produzir um saco a mais de soja, abré-se mão de 1,25 sacos de milho. Em resumo, o
custo de oportunidade de um saco de soja é igual a 1,25 sacos de milho.
Se esse produtor já se encontrar no ponto B e desejar agora caminhar em direção ao ponto C,
para produzir 20 sacos a mais de soja, ele terá que diminuir ainda mais sua produção de milho,
caindo de 75 sacos para 50 sacos (redução de 25 sacos). Pode-se perceber que, da mesma maneira
como na situação anterior, o aumento da produção de soja em 20 sacos requereu a redução da
produção de milho em 25 sacos. Isso significa que o custo de oportunidade de produção de 1 saco de
soja continua o mesmo, 1,25 sacos de milho. Se fizermos as contas para passar do ponto C ao ponto
D e do ponto D ao ponto E, o que encontraremos será a mesma coisa: o custo de oportunidade não se
modifica. Isso ocorre porque a CPP é retilínea. Se não o fosse (sendo, portanto, curvilínea),
poderíamos dizer que os custos de oportunidade iriam variar ao longo da curva. Dessa forma, pode-
se dizer que o custo de oportunidade será sempre constante se a curva de possibilidades de produção
for uma reta. Se a CPP for uma curva, o custo de oportunidade irá variar ao longo da curva (mais
abaixo, você verá exemplos de CPPs curvilíneas e da variação dos custos de oportunidade ao longo
da curva).
Uma maneira mais prática de calcular o custo de oportunidade de produção de determinado
bem em uma CPP retilínea, caso se disponha apenas dos valores máximos de produção dos bens nos
dois eixos, é fazer a regra de três com os próprios valores máximos de produção. Assim, para sair do
ponto A e se dirigir diretamente para o ponto E, temos que:
• A produção de soja aumenta em 80 sacos (de 0 para 80); e
• A produção de milho diminui em 100 sacos (de 100 para 0).
Assim, para se calcular o custo de oportunidade de produção de 1 saco de soja, basta fazer a
regra de três com esses valores extremos, como mostrado a seguir:
80 sacos a mais de soja
1 saco a mais de soja
— 100 sacos a menos de milho— X sacos a menos de milho
_ 100 _Assim, encontramos o mesmo valor calculado acima, sendo X
Isso significa dizer que, do mesmo modo que encontrado acima, o custo de oportunidade de um saco
de soja é igual a 1,25 sacos de milho.
1,25 sacos a menos de milho.
80
29
Pode-se também calcular o custo de oportunidade de produção do milho, e o procedimento é
semelhante. No fim das contas, teremos que o custo de oportunidade de produção de um saco de
milho é igual a 0,8 sacos de soja.
CUSTO DE OPORTUNIDADE E TROCAS
A noção de custo de oportunidade tem uma aplicação de grande importância na análise das
trocas entre agentes, que são, evidentemente, um elemento central no funcionamento do sistema
económico. Em particular, esse conceito permite explicar como todas as partes envolvidas em trocas
podem se beneficiar desse comércio — tanto pessoas como países. Na unidade 6 da disciplina, em
Economia Internacional, você verá a importância do custo de oportunidade no contexto do comércio
internacional, e em que sentido todos os países podem sair ganhando com essas trocas. Mas, antes de
passar à análise das trocas comerciais internacionais, discutiremos primeiro uma situação mais
simples, com apenas dois produtores. O produtor Alfa e o produtor Beta são marceneiros e podem
escolher entre produzir cadeiras ou mesas de madeira.
Veja a seguir as CPPs dos dois produtores.
Produtor Alfar\ Produtor Beta
cadeiras cadeiras
AA 1012
BB
56
CC mesasmesas
12
A situação que temos aqui é, portanto, a seguinte:
• O produtor Alfa pode produzir no máximo 12 cadeiras, se ele se dedicar apenas à
produção de cadeiras, ou no máximo 4 mesas, se ele se dedicar apenas à produção de
mesas, ou ainda uma combinação da produção de mesas e cadeiras.
• O produtor Beta pode produzir no máximo 10 cadeiras, se ele se dedicar apenas à
produção de cadeiras, ou no máximo 2 mesas, se ele se dedicar apenas à produção de
mesas, ou ainda uma combinação da produção de mesas e cadeiras.
O que distingue esses dois produtores? Por que têm curvas de possibilidades de produção
diferentes? Por hipótese, eles têm acesso às mesmas tecnologias de produção. Mas cada um deles
30
tem uma determinada dotação de fatores produtivos, que é considerada fixa. Podemos imaginar, por
exemplo, que tenham oficinas de tamanhos diferentes, ou com equipamentos produtivos diferentes,
ou ainda que um dos marceneiros seja mais talentoso que o outro, enquanto artesão, ou enquanto
administrador de seu negócio. De qualquer forma, as possibilidades de produção dos dois
marceneiros, descritas pelas respectivas CPPs, são distintas; esse é o ponto essencial.
Um primeiro conceito a ser introduzido, nesse contexto, é o de vantagem absoluta. Tem
vantagem absoluta na produção de determinado bem aquele produtor que consegue produzi-lo em
maior quantidade. No caso das cadeiras, quem tem vantagem absoluta em sua produção é o produtor
Alfa, que consegue produzir no máximo 12 cadeiras, enquanto o produtor Beta consegue produzir no
máximo 10 cadeiras. Com relação às mesas, o produtor Alfa também possui vantagem absoluta em
sua produção, uma vez que consegue produzir no máximo 4 mesas, enquanto o produtor Beta produz
no máximo 2 mesas. O conceito de vantagem absoluta tem, portanto, relação com a quantidade
produzida e, mais especifícamente, com a produtividade — produtividade de cada produtor, no caso
em foco, de uma empresa ou país, em casos mais gerais. Se ambos os produtores produzem a mesma
quantidade de determinado bem, diz-se que ninguém tem vantagem absoluta na produção daquele
bem, uma vez que a produção de nenhum dos dois ultrapassa a do outro, nesse bem específico.
A ideia de vantagem comparativa. Compreendido o conceito de vantagem absoluta,
passaremos agora ao conceito de vantagem comparativa. A vantagem comparativa está relacionada
ao custo de oportunidade. Para saber quem possui vantagem comparativa na produção em
determinado bem, é necessário calcular os custos de oportunidade de produção daquele bem para
todos os produtores em questão. Na situação acima, dos dois marceneiros,
temos que:
Produtor Alfa Produtor Beta
Produção máxima de cadeiras: 12
Produção máxima de mesas: 4
Produção máxima de cadeiras: 10
Produção máxima de mesas: 2
Custo de oportunidade de
__
4
___
1
produção de uma cadeira 12
~
3
Custo de oportunidade de 2
___
1
produção de uma cadeira
mesa mesa
10 5
Custo de oportunidade de
produção de uma mesa
Custo de oportunidade de
produção de uma mesa =
1Q
== 12 = 3 cadeiras 5 cadeiras24
Tem vantagem comparativa na produção de determinado bem 1 aquele produtor que tiver o
menor custo de oportunidade em sua produção, ou seja, o produtor que deixar de produzir menos
unidades de um bem 2 para produzir o bem 1 (menor custo de oportunidade de produção do bem 1).
Com relação às cadeiras, o custo de oportunidade do produtor Alfa para produção de 1
cadeira é igual a 1/3 de mesa (~ 0,33 mesa), enquanto o custo de oportunidade de produção de 1
31
I
/•>
cadeira para o produtor Beta é igual a 1/5 de mesa (= 0,2 mesa). Quem tem o menor custo de
oportunidade na produção de cadeiras é, portanto, o produtor Beta (visto que 0,2 < 0,33). Assim, o
produtor Beta tem vantagem comparativa na produção de cadeiras.
Já com relação às mesas, o custo de oportunidade do produtor Alfa para a produção de 1 mesa
é igual a 3 cadeiras, enquanto o custo de oportunidade de produção de 1 mesa para o produtor Beta é
igual a 5 cadeiras. Quem tem o menor custo de oportunidade na produção de mesas é, portanto, o
produtor 1 (visto que 3 < 5). Assim, o produtor Alfa tem vantagem comparativa na produção de
mesas.
-
Uma conclusão da maior importância, que pode ser tirada a partir do esquema acima, é que,
havendo possibilidade de troca, os produtores tenderão a se especializar na produção daquele artigo
em que têm vantagem comparativa, pois poderão ganhar com isso. Produzindo mais daquilo que
sabe fazer melhor (mais barato),cada produtor trocará uma parte de sua produção pelo outro artigo,
feito pelo outro produtor (no caso do exemplo, onde só há dois bens e dois produtores); e essa troca
em geral deixará ambos em melhor situação. E o que determina essa possibilidade de ganho, a partir
do comércio, é a vantagem relativa, e não a vantagem absoluta. Vejamos por quê.
Continuando com nosso exemplo dos dois marceneiros, considere uma situação hipotética em
que o produtor Alfa se especializasse inteiramente na produção de cadeiras (produzisse só cadeiras),
pretendendo comprar algumas mesas do outro produtor; e o produtor Beta se especializasse
inteiramente na produção de mesas (sendo igualmente seu objetivo ter certa mistura de cadeiras e
mesas). Teríamos, dessa maneira, que o produtor Alfa produziria, ao todo, 12 cadeiras, e o produtor
Beta, 2 mesas. Se ambos se encontram para fazer uma troca, é evidente que ambos buscarão,
seguindo os princípios do “homem económico”, maximizar seus ganhos e minimizar suas perdas. Se
o produtor Alfa oferece cadeiras ao produtor Beta para trocar por mesas, ele esperará pagar pelas
mesas menos do que ele pagaria se fosse produzi-las (ou seja, desejará pagar no máximo 3 cadeiras
por mesa, que é o custo de oportunidade de produção de 1 mesa para ele).
Da mesma forma, o produtor Beta, recebendo as cadeiras do produtor Alfa e dando em troca
mesas, desejará receber mais cadeiras do que ele deixaria de produzir para fazer 1 mesa (ou seja,
desejará receber no mínimo 5 cadeiras por mesa, que é o custo de oportunidade de produção de 1
mesa para ele). Ora, se um deseja, para não sair perdendo com a troca, pagar no máximo 3 cadeiras, e
o outro, com o mesmo propósito, deseja receber no mínimo 5 cadeiras, pode-se dizer que eles não
chegarão nunca a um acordo.
Por que isso ocorre? Porque a especialização não se deu de maneira economicamente
eficiente. Em lugar de se especializarem naquilo podem fazer melhor (mais barato, com custo de
32
oportunidade menor), fizeram o oposto. Cada um se especializou naquele produto em que não tem
vantagem comparativa. Nessa circunstância, ninguém pode sair ganhando com a troca.
Considere agora a situação em que ambos se especializam naquilo em que de fato têm
vantagem comparativa (o produtor Alfa se especializando na produção de mesas e o produtor Beta.
na produção de cadeiras). Se o produtor Alfa oferecer mesas ao produtor Beta, em troca das cadeiras
que este produz, ele desejará receber pelo menos 3 cadeiras por mesa (que é o custo de oportunidade
de produção de 1 mesa, para ele). Já o produtor Beta, recebendo as mesas do produtor Alfa e dando
em troca cadeiras, desejará pagar no máximo 5 cadeiras por mesa (que é o custo de oportunidade de
produção de 1 mesa para ele). Dessa forma, se um deseja receber no mínimo 3 cadeiras e o outro
deseja pagar no máximo 5 cadeiras, podemos dizer que qualquer valor de cadeiras no intervalo de 3 a
5 (3, 4 ou 5) configurará uma troca possível entre ambos. Se estipularem o valor de 4 cadeiras, por
exemplo, o produtor Alfa sairá ganhando, uma vez que receberá 1 cadeira a mais pela mesa do que
ele poderia produzir caso deixasse de produzir aquela mesa para produzir cadeiras (visto que seu
custo de oportunidade de produção de 1 mesa é igual a 3 cadeiras), e o produtor Beta também sairá
ganhando, uma vez que ele pagará 1 cadeira a menos do que ele teria que deixar de produzir para
produzir 1 mesa (visto que seu custo de oportunidade de produção de 1 mesa é igual a 5 cadeiras).
Dessa maneira, ambos os produtores saem ganhando com a troca comercial, uma vez que os dois se
especializaram na produção daquilo em que possuem vantagem comparativa.
OS GANHOS COM A TROCA
As diferenças nos custos de oportunidade, dando origem às vantagens comparativas, abrem a
possibilidade de trocas, e as trocas podem produzir ganhos para todos. No último exemplo acima (em
que cada um se especializa na produção “correta”), fica claro que a distribuição desses ganhos vai
depender da relação em que se dê a troca, ou seja, do preço que cada produtor obtenha pelo artigo
que vende (o preço, no caso, é medido em unidades do outro bem).
Por exemplo: se a troca se der na proporção de 3 cadeiras por 1 mesa, o produtor Beta
certamente ganha: se quisesse produzir 1 mesa em sua própria oficina, teria que produzir 5 cadeiras a
menos (1 mesa “custaria” para ele 5 cadeiras), enquanto pela troca esse custo baixa 40%, passando
para 3 cadeiras apenas. E o produtor Alfa? Esse nada ganharia com a troca: ele poderia obter 3
cadeiras, sacrificando a produção de 1 mesa, em sua própria oficina. Nesse caso, portanto, os ganhos
do comércio são inteiramente apropriados por Beta.
Mutatis mutandis, é fácil ver que, se a relação de troca for de 5 cadeiras por 1 mesa, todo o
ganho vai para Alfa: antes do comércio, 1 cadeira custaria para ele 1/3 de uma mesa, e com o
comércio ele pode obter 1 cadeira por 1/5 de uma mesa — uma redução também de 40%. Por seu
33
turno, Beta não tem qualquer ganho, pois sua relação de troca continua a mesma, com ou sem
comércio.
Mas se a relação de troca for, por exemplo, 4 cadeiras por uma mesa, ambos ganham: o custo
de 1 mesa para Beta passa de 5 para 4 cadeiras — uma redução de 20% — e o custo de 1 cadeira
para Alfa cai de 1/3 para 1/4 de mesa — redução de 25%. Pode-se dizer que a condição para que
ambos os participantes da troca aufiram ganhos é que a relação de troca fique entre as relações de
transformação internas (os custos de oportunidade na produção) de Alfa e Beta. E ainda: quanto mais
próxima da relação de transformação interna de Alfa for a relação de troca, menor será o ganho de
Alfa, e maior o de Beta. E vice-versa.
Pode-se perguntar: qual a origem dos ganhos com o comércio? Como podem todos ganhar,
se os fatores de produção sãos os mesmos, e estão plenamente utilizados (dado que a produção se dê
sobre a CPP), tanto em Alfa como em Beta, e tanto antes como depois de aberta a possibilidade de
comércio? Qual a mágica?
Não há mágica, de fato. O que acontece é que o comércio melhora a alocação dos recursos
produtivos para o conjunto dos dois produtores. Antes da troca, a produção era eficiente, em cada
unidade produtiva considerada isoladamente, desde que se desse num ponto da CPP respectiva. Mas,
aberto o comércio, isto não é mais verdade; agora, a maximização da eficiência produtiva requer que
cada um se dedique a produzir mais aquilo que faz melhor. Ou seja, é necessário que haja
especialização.2 Agora a eficiência produtiva deve ser analisada no contexto de uma CPP conjunta,
que abranja tanto a CPP de Alfa quanto a de Beta.
Propõe-se que, como exercício, o aluno trace essa CPP conjunta de Alfa e Beta. E mostre que,
com o comércio, pelo menos um dos participantes irá se especializar inteiramente na produção do
bem em que tem vantagem comparativa.
TROCAS E ESPECIALIZAÇÃO: ALGUMAS APLICAÇÕES
Suponha que, além de ser muito demandado como modelo de comerciais, Pedro é também
um excelente alfaiate. Mas apenas porque ele pode costurar muito bem significa que ele deveria fazê-
lo? Para descobrir isso, podemos empregar os conceitos de custo de oportunidade e vantagens
comparativas. Digamos que Pedro consegue costurar um temo completo em um dia, 8 horas de
trabalho. Nas mesmas 8 horas, ele poderia se dedicar a gravar um comercial, e ganhar R$10.000.
Natália, amiga de Pedro, gasta todo um fim de semana para costurar o mesmo temo, e nesse período
poderia trabalhar como garçonete e ganhar R$200.
2 A especialização pode ser total (com produção apenas do bem em que o produtor tem vantagem comparativa) ou apenas
parcial — dependendo da mistura dos dois bens que cada produtor deseja obter.
34
Nesse exemplo, o custo de oportunidade de Pedro para costurar o temo é de R$10.000, e o de
Natália é de R$200. Pedro tem clara vantagem absoluta na produção do temo, porque o faz em
menos tempo. Mas Natália tem vantagem comparativa na produção do temo, porque custo de
oportunidade do tempoempregado nisso é menor. Dessa maneira, não é difícil perceber que Pedro
deveria especializar-se em fazer comerciais, enquanto Natália costura seus temos. Qualquer valor
pago por Pedro a Natália que se situe entre R$200 e R$10.000 será, portanto, benéfico a ambos.
Da mesma forma que pessoas, países podem se beneficiar da especialização, a partir de suas
vantagens comparativas em relação a outros países, um tema que será desenvolvido na 6a unidade do
curso.
Suponhamos, num exemplo, dois países, Brasil e Argentina, produzindo dois produtos,
geladeiras e soja. Tanto um trabalhador brasileiro quanto um trabalhador argentino produzem 200
geladeiras por mês. Mas o trabalhador brasileiro pode produzir 2 toneladas de soja mês, enquanto o
trabalhador argentino consegue produzir apenas 1 tonelada. É fácil perceber que, nessa situação,
nenhum dos dois possui vantagem absoluta na produção de geladeiras, e o trabalhador brasileiro
possui vantagem absoluta na produção de soja. Mas os ganhos do comércio, como visto acima,
baseiam-se não na vantagem absoluta, mas na vantagem comparativa. Assim, pelo fato de o custo de
oportunidade de produção de 1 geladeira ser igual a 1/100 tonelada de alimentos no Brasil e 1/200
tonelada de alimentos na Argentina, a Argentina tem vantagem comparativa na produção de
geladeiras. A Argentina deveria, nesse exemplo hipotético, especializar-se na produção de
geladeiras, produzindo mais desse artigo do que consome, e vendendo geladeiras para o Brasil. E o
oposto para o Brasil, que se especializaria na produção de soja. Por meio da especialização e do
comércio, ambos os países poderiam ter mais soja e mais geladeiras, pagando menos por isso.
Como você verá na unidade 6 do curso, a realidade do comércio entre os países envolve
questões mais complexas do que as apresentadas nesse exemplo. Cada país tem cidadãos com
diferentes interesses, e o comércio internacional pode fazer alguns indivíduos ficarem em pior
situação, mesmo sendo benéfico para o país como um todo. A redução da produção interna de um
bem em que o país X não tenha vantagem comparativa, em benefício da importação desse bem do
país Y, pode causar desemprego nesse setor, em X. O que pode levar a pressões, nesse país, para que
a importação não se dê.
Uma situação como essa está sendo causa, atualmente, de disputa comercial entre o Brasil e
os Estados Unidos: os produtores americanos de algodão, produto em que o Brasil tem clara
vantagem comparativa, resistem em reduzir sua produção, pressionam o governo de seu país e obtém
subsídios que os permitem manter-se no mercado. Embora a Organização Mundial do Comércio
tenha decidido que essa ação está em desacordo com as regras decididas pelos países membros (tanto
35
o Brasil como os Estados Unidos são membros da OMC), a situação permanece, beneficiando um
pequeno, mas poderoso grupo de produtores naquele país, e prejudicando não só os produtores
brasileiros, mas também os consumidores americanos, que têm que pagar mais caro pelo algodão que
consomem. Exportadores brasileiros de produtos agropecuários enfrentam problemas análogos na
União Européia, cuja política agrícola é extremamente protecionista em relação à produção,
comparativamente ineficiente, de países como a França.
Além disso, um país que tenha vantagem comparativa na produção de determinado produto
não está necessariamente destinado a produzi-lo por toda a eternidade. Vantagens comparativas
podem aparecer, ou desaparecer, ao longo do tempo. A dotação de fatores, considerada fixa nos
modelos analíticos, pode na realidade mudar, por várias razões: inovações tecnológicas, novas
descobertas de recursos naturais, economias de escala, etc. A partir dessa noção, vários países,
inclusive o Brasil, adotaram, no século passado, políticas protecionistas (restrições à importação)
visando estimular o desenvolvimento da produção industrial interna. Em nosso caso, essas políticas
contribuíram para o surgimento e expansão de um setor industrial vigoroso; mas deram origem,
também, a problemas e sequelas desfavoráveis, como estudaremos mais tarde no curso.
Apesar de limitações ou obstáculos que sua aplicação possa enfrentar, como princípio de
política económica, a idéia de vantagem comparativa é uma proposição fundamental da teoria
económica. Enunciada pela primeira vez pelo economista inglês David Ricardo, no início do século
XIX (no contexto de uma análise do comércio entre Portugal e a Inglaterra), já aparecia, em embrião,
na “Riqueza das Nações”, de 1776, livro de Adam Smith que costuma ser visto como o primeiro
compêndio abrangente de teoria económica, onde o autor afirmava:
“Eis uma máxima que todo chefe de família prudente deve seguir: nunca
tentar fazer em casa aquilo que seja mais caro fazer do que comprar. O
alfaiate não tenta fabricar seus sapatos, mas os compra do sapateiro. Este
não tenta confeccionar seu traje, mas recorre ao alfaiate. O agricultor não
tenta fazer nem um nem outro, mas se vale desses artesãos. Todos
consideram que é mais interessante usar suas capacidades naquilo em que
têm vantagem sobre seus vizinhos e comprar, com parte do resultado de suas
atividades, ou o que vem a dar no mesmo, com o preço de parte das mesmas,
aquilo de que venham a precisar”. (SMITH, 1985:380)
r~\
O princípio de vantagens comparativas é um argumento importante na crítica às restrições ao
comércio internacional, já que demonstra que o livre comércio maximiza a produção e pode trazer
36
ganhos para todas as partes envolvidas. No passado, esse argumento foi muito utilizado, nos países
mais industrializados, para criticar o protecionismo de países em desenvolvimento em relação a seus
setores industriais emergentes. Hoje, um tanto ironicamente, a mesma crítica é dirigida ao
protecionismo agrícola dos países altamente industrializados. Todos concordam, em princípio, que a
liberalização do comércio internacional é um objetivo desejável; mas os obstáculos políticos à
consecução desse objetivo são evidenciados pelas dificuldades enfrentadas na chamada “Rodada de
Doha” de negociações internacionais de liberalização do comércio, em curso há vários anos, sem que
se chegue a um acordo.
37
I
ANEXO: o custo de oportunidade em CPPs curvilíneas
/"V
Como dito acima, o custo de oportunidade é constante em CPPs retilíneas, e variável em
CPPs curvilíneas. Mas como isso funciona? Tomemos o exemplo dado no início dessa seção, acerca
da produção de milho e soja. Veja abaixo duas representações, uma de uma CPP retilínea e outra de
uma CPP curvilínea.
sacos de
milho
sacos de
milho
A100 A100B
B75
75C C50
50D D25
Í'\E25 sacos
de soja
I ; ; \E sacos
20 40 60 de soja 50 65 75 80
Na CPP retilínea, já vimos que o custo de oportunidade de 1 saco de milho é igual a 0,8 sacos
de soja. Vamos agora calcular os custos de oportunidade de 1 saco de milho para a situação da CPP
curvilínea acima.
Trajeto Custo de Oportunidade
25 sacos de milho a menos (de 100 para 75)
1 saco de milho a menos --
— 50 sacos de soja a mais (de 0 para 50)
W sacos de soja a maisA B
W = 2 sacos de soja
25 sacos de milho a menos (de 75 para 50)------15 sacos de soja a mais (de 50 para 65)X sacos de soja a maisB -> C 1 saco de milho a menos
X = 0,6 sacos de soja
25 sacos de milho a menos (de 50 para 25)
1 saco de milho a menos -
- 10 sacos de soja a mais (de 65 para 75)
Y sacos de soja a maisC D
Y = 0,4 sacos de soja
25 sacos de milho a menos (25 para 0) -
1 saco de milho a menos
5 sacos de soja a mais (de 75 para 80)
- Z sacos de soja a mais
r~\
D -> E
Z = 0,2 sacos de soja
38
Nota-se, portanto, que, em uma CPP não retilínea, como a representada acima (côncava em
relação à origem), à medida que cresce a produção de um dos bens, seu custo de oportunidade
aumenta. O que isso reflete é o fato de que, em várias situações, ocorrem rendimentos decrescentes.
quando se transferem recursos produtivos de uma atividade para outra (por exemplo: remanejar
trabalhadores para uma atividade diferentedaquela que usualmente exercem pode provocar perda de
produtividade, de forma crescente: primeiro se transferem os mais adaptáveis, mas depois será
preciso lançar mão de trabalhadores menos susceptíveis a um retreinamento).
Pode-se pensar numa CPP convexa em relação à origem? Sim, na presença de rendimentos
crescentes na produção. Em várias atividades, um aumento de produção traz redução no custo médio;
fala-se que há rendimento crescente de escala (ou economias de escala).
A suposição de que a CPP seja retilínea traz, no entanto, evidente simplificação no raciocínio
e nos cálculos, sendo essa a principal razão de sua adoção.
39
JSBI OilTeorias do Comércio Internacional
Kl
1011
Kl
siIntrodução à Economia
Universidade de Brasília
JlS
•SS
K
SI
1SK
kÿii
Lívio William Reis de Carvalho, Júlia Soares de Souza
1. Introdução
Sabemos que, historicamente, as sociedades e os países se engajam no comércio entre si,
vendendo e comprando uma infinidade de itens. Sabemos também que é esse tipo de comércio difere
do comércio interno (realizado dentro de cada país) por várias razões: para realizar esse comércio,
em boa parte das vezes, tem-se que vencer distâncias muito maiores que aquelas do comércio
interno, significando maior custo de transporte; principalmente, tem-se que levar em conta que os
países têm moedas diferentes (vamos nos abstrair da experiência da zona do euro). Se uma empresa
brasileira quer comprar (importar) um bem nos Estados Unidos (uma exportação dos Estados
Unidos) ela tem que adquirir dólares. De outra parte, se uma empresa dos Estados Unidos quer
adquirir um produto no Brasil (uma importação dos Estados Unidos e uma exportação brasileira) ela
vai pagar em dólares, que serão convertidos em reais pela empresa brasileira. Isto tudo sem falar nos
contextos institucional e legal diferenciados entre países, o que pode ter implicações para o comércio
entre eles.
Intuitivamente, é possível dizer que deve haver fortes razões para existir o comércio entre os
países, já que tantos países se engajam nesta atividade e alguns já chegaram a travar guerras por
causa de interesses comerciais. Este texto procura dar indicações no sentido de responder a perguntas
do tipo: por que dois países comercializam? Que produtos devem comercializar? Vamos começar por
uma teoria que dominou o comportamento dos países durante séculos: o Mercantilismo.
2. O Mercantilismo
O Mercantilismo pregava dois tipos inter-relacionados de comportamento para os estados
nacionais: a obtenção de superávits nas transações externas e o consequente acúmulo interno das
moedas internacionais do período, ouro e prata. Como é impossível que todos os países tenham
superávit simultaneamente, depreende-se que a doutrina implicava uma noção assimétrica de ganhos
do comércio, de cunho nacionalista. Buscava-se a defesa dos interesses próprios do país, mesmo que
em detrimento dos demais: se o objetivo era obter superávits no comércio externo, um país não
ganharia sem que outros perdessem.
40
O acúmulo de ouro e prata era visto como o instrumento pelo qual os Estados adquiririam
riqueza; para isso, dever-se-ia exportar o máximo e importar o mínimo. Com balança comercial
sempre favorável, o país aumentaria a sua riqueza, pois receberia mais do que despenderia em moeda
internacional.
Assim, durante os cerca de três séculos em que o Mercantilismo foi influente como doutrina
de política económica (do início do século XVI a meados do século XVIII), os países da Europa
Ocidental, que em geral estavam consolidando, nesse período, sua unidade nacional, buscavam
incrementar suas exportações. A obtenção de monopólios era uma forma de maximizar os ganhos do
comércio; nesse sentido, era central o papel do Estado, garantindo exclusividade e privilégios, como
no caso das companhias de comércio. Ganhavam com isso os grupos envolvidos no comércio
externo; estes, por sua vez, contribuíam para o financiamento dos estados nacionais em
consolidação: havia vantagens recíprocas.
O comércio internacional era um elemento fundamental de política económica e visto como o
meio por excelência de acumular riquezas, especialmente no caso de países que — diferentemente da
Espanha, nos séculos XVI e XVII, e Portugal, no século XVIII — não contavam com suprimento
abundante de ouro e prata proveniente de suas colónias.
A política colonialista do período foi diretamente influenciada pela visão mercantilista então
predominante. O objetivo central era explorar ao máximo as riquezas das colónias, visando obter
ganhos por meio da exportação de produtos para o mercado europeu (ou buscar a descoberta de
minas de ouro e de prata). Em decorrência disso, procurava-se impedir o desenvolvimento, nas
colónias, de qualquer atividade produtiva que não conduzisse a ganhos de comércio para as
metrópoles.
O Mercantilismo não foi uma doutrina unificada, mas teve manifestações distintas nos
escritos de vários autores e na prática política de diferentes países, nesse período. São formas de
Mercantilismo o Bulhonismo (de bullion, barra de ouro ou prata), doutrina que defendia o acúmulo
de metais; o Colbertismo, política seguida por Colbert, ministro de Luís XIV, favorecendo a
expansão das exportações e da produção interna na França; o Cameralismo, um equivalente alemão
do Colbertismo.
Na segunda metade do século XVIII — coincidindo com a Revolução Industrial, que
mostrava novas possibilidades de crescimento económico a partir de ganhos de produtividade — a
doutrina mercantilista passou a ser crescentemente criticada. Provavelmente, a crítica mais influente
foi a de Adam Smith, no seu famoso livro de 1776, Investigação sobre a Natureza e Causas da
Riqueza das Nações, que contém uma defesa veemente do livre comércio. Alguns críticos acusavam
de irracional o objetivo de acumulação de metais, falando em um ‘complexo de rei Midas’, o
41
mitológico personagem que obteve o dom de transformar em ouro tudo o que tocasse, e quase morre
de inanição. Mas outro famoso economista, Keynes, defendeu os mercantilistas nesse ponto, em seu
livro de 1936, Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda: o aumento do estoque de moeda (ouro
e prata), fazendo diminuir a taxa de juros, poderia ser visto como uma política de estímulo ao
investimento, em uma época em que os governos não dispunham de outros instrumentos de política
económica visando esse fim.
Contrariamente à visão mercantilista, que focalizava os ganhos de um determinado país, em
detrimento de outros, a teoria que emergiu no início do século XIX com David Ricardo, em seu livro
Princípios de Economia Política e Tributação, de 1817, sustentava que o livre comércio pode ser
benéfico para todos, como veremos a seguir.
3. Teoria das Vantagens Comparativas
Vimos que quando uma pessoa (firma, país) produz algo (bem ou serviço) melhor, mais
eficientemente, com maior produtividade do que outra pessoa (firma, país), dizemos que a primeira
pessoa (firma, país) tem vantagem absoluta na produção deste bem ou serviço em relação à segunda
pessoa (firma, país). Exemplo: se numa jornada de 8 horas (em condições idênticas de trabalho,
especificações de material, ferramentas etc.) Pedro produz 20 kg de cereais, enquanto José produz
apenas 15 kg, dizemos que Pedro tem uma vantagem absoluta sobre José no desenvolvimento desta
atividade.
Vamos supor agora que Pedro e José são dois donos de sítios que produzem carne e cereais.
Vamos supor também que Pedro tenha vantagem absoluta bem marcante na produção de carne e José
tenha essa mesma vantagem absoluta marcante na produção de cereais. Com o passar do tempo,
provavelmente eles chegariam à conclusão que seria melhor Pedro se especializar na produção de
carne e José na produção de cereais e cada um com a venda de seus produtos que excedesse o
consumo de suas respectivas famílias, comprar outros bens.
Examinaremos, agora, o que aconteceria se Pedro tivesse vantagem absoluta na produção de
ambos os bens, com um exemplo bem simples, mostradona tabela abaixo, que apresenta a produção
de carne e cereais por Pedro e José numa jornada de 8 horas de trabalho (4 horas para cada produto):
/ÿ>
Produção Carne Cereais Produção por Hora
Produtor Carne Cereais
Pedro 24 48 6 12
José 8 32 . 2 8
As curvas de possibilidade de produção são mostradas abaixo (em gráficos com escalas
diferentes):
Carne Carne
Pedro José48 16
24 8
cereais cereais
48 96 32 64
Vê-se que trabalhando 4 horas na produção de cada um dos bens Pedro produziria 24 kg de
carne e 48 kg de cereais, enquanto José produziria 8 kg de carne e 32 kg de cereais. Ressalte-se que
Pedro tem vantagem absoluta na produção dos dois bens. Será que numa situação como esta teria
alguma vantagem para Pedro especializar-se em algum produto e propor uma parceria com José? Ou,
já que ele é mais eficiente, não seria melhor para ele continuar produzindo os dois bens e José que
fosse tratar de sua vida? Examinemos os números para responder a estas perguntas.
Para tanto, vamos utilizar um conceito já visto na Unidade 1: o conceito de custo de
oportunidade. Para Pedro, cada hora adicional que ele dedicar à produção de cereais ele deixa de
produzir 6 kg de carne e pode produzir 12 kg de cereais. Ou seja, a relação é de 1 kg de carne para 2
kg de cereais. Diz-se, então, que para Pedro o custo de oportunidade (CO) de 1 unidade de carne em
termos de cereais é 2 ou, se invertermos a direção do cálculo, diz-se que para Pedro o CO de 1
unidade de cereais em termos de carne é 1/2. Agora vamos examinar a questão do ponto de vista de
José. Vemos que para José o CO de 1 unidade de carne em termos de cereais é 4, ou o CO de 1
unidade de cereais em termos de carne é 1/4, como mostrado na tabela abaixo:
J
CO Carne /Cereal CO Cereais / Carne
Pedro 2 lA
José 4 V*
Vê-se que Pedro tem custo de oportunidade menor que o de José em carne, mas José tem
menor CO do que Pedro em cereais. Dito de outra forma: Pedro tem vantagem comparativa na
produção de came, e José vantagem comparativa na produção de cereais.
Nesse caso, se José der (por exemplo) 3 kg de cereais para Pedro em troca de 1 kg de carne,
os dois melhoram de situação. Sem a troca, José, para obter 1 kg de carne, teria que deixar de
produzir 4 kg de cereais (pois essa é sua relação interna de transformação, seu CO). Ou seja, teria um
custo maior. Pedro, por sua vez, para obter 3 kg de cereais, sem a troca, teria que abrir mão de 1,5 kg
de carne (pois seu CO de 1 kg de cereais é 0,5 kg de carne). Ele também teria um custo maior, sem a
troca. Vê-se, então, que ambos claramente ganham com a troca de mercadorias entre eles. É fácil ver
que a condição para que ambos tenham ganhos é que a relação de troca se situe entre as relações
internas de transformação de Pedro e de José.
Quais as lições que podemos extrair deste exercício? A primeira é que a especialização na
produção pode ser vantajosa para as duas partes, cada uma se especializando no bem que produz com
menor custo relativo (custo de oportunidade). A segunda é que, embora Pedro tenha vantagem
absoluta em ambos os bens, há proveito na especialização e na troca porque Pedro tem vantagem
comparativa na produção de came e José na produção de cereais. Ou seja, o que conta são os custos
relativos de cada um deles na produção de um bem em relação ao outro. José é menos eficiente do
que Pedro na produção dos dois bens em termos absolutos, mas é mais eficiente na produção de
cereais do que de came, e isto abre espaço para que haja comércio entre ele e Pedro, com ganhos
para ambos.
Podemos visualizar esses ganhos considerando as possibilidades de consumo antes e depois
do comércio. Sem troca, a Curva de Possibilidades de Consumo (CPC) necessariamente coincide
com a Curva de Possibilidades de Produção (CPP). Suponhamos que inicialmente Pedro consumisse
38 de came e 20 de cereais, e José 8 de came e 32 de cereais (cada um em ponto de sua CPCÿCPP).
Especializando-se inteiramente na produção de came, Pedro poderia trocar com José 10 kg de came
por 30 kg de cereais. Seu consumo saltaria então para 38 kg de came (como antes) e 30 kg de cereais
(em lugar de 20 kg): o ponto B, que antes do comércio seria inatingível. Esse ponto pertence a uma
nova CPC de Pedro, exterior à sua CPP. Por sua vez José, especializando-se inteiramente na
produção de cereais, ficaria, após a troca, com 34 kg de cereais (64 produzidos menos 30 dados em
troca) e 10 kg de carne. Consumiria agora mais de ambos os bens do que antes. O ponto B de sua
nova CPC estaria igualmente fora de seu alcance, antes do comércio. Ver os gráficos abaixo.
Podemos concluir que o bem-estar dos dois, medido pela quantidade de bens que consomem, é maior
após a especialização e a troca do que antes.
camecarne
Pedro José
48 B
16
35
B10
24
8
cereaiscereais
32 3420 30 48 96 64
No exemplo numérico que acabamos de ver, se substituíssemos “Pedro” e “José” por
“Indústria de Carne” e “Indústria de Cereais”, ou por “País A” e “País B”, as conclusões
permaneceriam válidas. Esse exemplo ilustra a chamada Teoria das Vantagens Comparativas,
elemento central da análise do comércio internacional, desde que foi proposta, no início do século
XIX, por David Ricardo, economista inglês descendente de judeus portugueses.
No Anexo 1 - Uma Formalização da Teoria das Vantagens Comparativas, generaliza-se o
exemplo numérico utilizado para o caso de dois produtos e dois países, explicitando-se melhor
algumas hipóteses implicitamente utilizadas, tal como o uso de um só fator de produção, o fator
trabalho.
4. Outras Teorias para Explicação do Comércio Internacional
Por que existem vantagens comparativas? Porque diferentes países têm custos diferentes de
produção, para um mesmo produto. E por que há diferenças de custo? No caso das correntes de
comércio típicas do século XIX, ou períodos anteriores, grande parte da explicação residia em
vantagens naturais ou históricas: países como o Brasil produziam café ou açúcar a custos menores, e
exportavam esses produtos, porque tinham terra e clima favoráveis para isso, enquanto os países que
tinham tido acesso aos enormes ganhos de produtividade trazidos pela Revolução Industrial
exportavam artigos industrializados.
A teoria das vantagens comparativas não leva em conta a dotação diferenciada de fatores
entre os países, que pode ser uma das explicações para os fluxos de comércio. Novas conceituações
foram propostas para explicar tais situações. Vamos resumir uma teoria que abandona a hipótese
simplifícadora da existência de um só fator de produção, o fator trabalho.
4.1. A Teoria da Dotação de Fatores
Essa teoria é conhecida como teoria neoclássica ou de Heckscher-Ohlin-Samuelson (os
economistas que a desenvolveram). No centro da explicação para a existência do comércio
internacional está a diferença na dotação dos fatores de produção capital e trabalho entre os países, e
diferenças na utilização desses fatores entre setores da economia.
São consideradas as seguintes hipóteses para montagem da teoria: existem dois fatores de
produção-capital e trabalho; os países possuem dotação de fatores diferentes; existem produtos que
usam intensivamente mão-de-obra (ou seja, usam grande quantidade de mão-de-obra em relação ao
capital investido) e produtos que usam intensivamente o fator capital (o oposto); há concorrência
perfeita em todos os setores e conhecimento tecnológico disseminado entre os países.
Suponhamos, então, um mundo com dois países (A e B) e dois produtos (alimentos e
máquinas/equipamentos). Do conjunto de hipóteses acima se deduz que as curvas de possibilidade de
produção desses países são diferenciadas, como mostrado no gráfico abaixo:
Máquinas
do país B
CPPdopaéA
/
Por possuir uma dotação maior de mão-de-obra o País A tem condições mais favoráveis de
produzir alimentos, um “bem” cuja produção em geral usa mão-de-obra intensivamente; ao contrário
do País B, que por ser bem dotado do fator capital, tem melhores condições de produzir máquinas,
um “bem”cuja produção em geral exige a utilização intensiva do fator capital. Nestas condições, o
País A tenderá a exportar alimentos e o País B a exportar máquinas.
Como já visto anteriormente, os custos de oportunidade (dados pelas inclinações de suas
respectivas CPPs) dos dois países são bem diferenciados. Para o País A, o custo de oportunidade de
máquinas em termos de alimentos é elevado e para o País B, o oposto: o custo de oportunidade de
alimentos em termos de máquinas é elevado. Há, portanto, oportunidades de comércio, com ganhos
para os dois lados.
Então, a explicação para a diferença de custos de oportunidade entre países e, portanto, para a
possibilidade de comércio internacional, com ganhos recíprocos, baseia-se na diferença de dotação
de fatores entre países. Os países com abundância relativa de mão-de-obra tenderiam a exportar
produtos que usam intensivamente este fator na sua produção, enquanto os países com relativa
abundância de capital tenderiam a exportar produtos que na sua fabricação utilizam intensivamente o
fator capital.
Essa explicação foi incorporada à teoria do comércio internacional a partir da primeira
metade do século XX, como uma extensão da teoria das vantagens comparativas de Ricardo. Com
essa configuração, constitui uma base satisfatória para análise de vários casos de fluxo de comércio
entre países, principalmente no que tange àqueles produtos baseados na disponibilidade física de
fatores. Contudo, algumas características importantes do comércio internacional da atualidade ficam
a descoberto.
4.2. Considerações Sobre as Limitações da Teoria das Vantagens Comparativas
Um ponto a ressaltar na teoria das vantagens comparativas é que essa conceituação conduz à
conclusão de que cada país tenderá a se especializar na produção de bens em que tenha vantagem
comparativa, e importar os demais. No mundo real, no entanto, há várias razões para que a
especialização não se dê de forma tão extremada, assim como há várias circunstâncias que levam um
país a produzir um bem para consumo interno apesar de não possuir vantagem comparativa na sua
produção.
A simplificação de supor apenas um fator de produção (trabalho, no caso da
teoria das vantagens comparativas) ou dois fatores de produção (capital e
trabalho, no caso da teoria da dotação de fatores), e um conhecimento de
técnicas de produção uniforme entre países não é adequada em muitos casos.
Máquinas, equipamentos e também a mão de obra na maioria das vezes
embutem um nível de conhecimento tecnológico que pode diferenciar-se
significativamente entre países; de certa forma, o conhecimento tecnológico, ou
a capacidade de gerá-lo, pode ser considerado um fator de produção em
separado. Assim como os recursos naturais não são, como é evidente,
i)
distribuídos igualmente entre os países, o que pode ser importante para a
produção de certos bens, e para as trocas internacionais destes;
Os registros históricos demonstram que os países costumam proteger a sua
produção interna, seja na agricultura, na indústria ou nos serviços, por razões
independentes das vantagens comparativas (para proteger o nível de emprego
nessas atividades, por exemplo). Este fato introduz um elemento que interfere
diretamente nos fluxos de comércio e nos resultados potenciais em contraste
com um mundo onde não existissem essas interferências;
O mundo não é pontual. Os países são distantes uns dos outros e, portanto, os
custos de transportes não são nulos. Em alguns casos, como o de bens com uma
baixa relação custo do produto/peso, o custo de transporte pode inviabilizar a
comercialização entre países.
No setor serviços há exemplos óbvios de que a comercialização se toma difícil
ou impossível. Como se vai comercializar um conserto de automóvel ou o
serviço de babá ou de uma manicure? Estes constituem os chamados bens não
comercializáveis, onde grande parcela da renda dos países é gasta.
Países têm tamanhos diferentes. Mesmo num modelo simples de dois produtos e
dois países, um deles bem maior do que o outro, é fácil ver que, dependendo das
preferências de consumo no país grande, pode não ser possível ao país menor,
mesmo especializando-se inteiramente no produto em que tem vantagem
comparativa, fornecer toda a quantidade necessária à satisfação da demanda
deste produto no país maior.
ii)
iii)
iv)
V)
De qualquer forma, a teoria das vantagens comparativas é, de forma geral, uma ferramenta
útil para explicar as razões para o comércio entre países, assim como para mostrar os efeitos desse
comércio no bem-estar dos países. Embora ela não seja inteiramente adequada para descrever as
causas e efeitos de todas as formas de comércio entre países, a evidência empírica corrobora seus
principais ditames: a importância da produtividade e a prevalência das vantagens comparativas (e
não das vantagens absolutas) na explicação do comércio.
Além dos pontos ressaltados acima, há algumas características importantes do comércio
internacional, na atualidade, que não são bem descritas pela teoria das vantagens comparativas e suas
extensões. Uma delas é o comércio intraindústria, em que países exportam e importam produtos de
uma mesma indústria (“indústria”, com o significado de setor ou subsetor e não de uma empresa
particular, por exemplo, o termo “indústria farmacêutica” engloba todas as empresas que produzem
48
fármacos). No Brasil, esse tipo de comércio pode ser verificado na indústria aeroespacial: a Embraer
exporta aviões de pequeno e médio porte, enquanto que os aviões de grande porte precisam ser
importados. Na teoria das vantagens comparativas o comércio ocorre entre indústrias distintas e por
isso é chamado de comércio interindústria.
A teoria das vantagens comparativas e suas extensões também não consideram a existência de
ganhos de escala
produção
ou seja, aumentos de produtividade associados ao aumento na escala de
seja para o conjunto de um setor, de uma indústria, ou para uma empresa isolada.
Para entender as correntes de comércio contemporâneas, economistas têm sugerido outras
explicações para diferenças de custo de produção entre países.
4.3. Teoria do Ciclo de Vida do Produto
Esta teoria se deve ao economista Raymond Vemon. Ela relaxa duas hipóteses restritivas
acima mencionadas, ou seja, as hipóteses da concorrência perfeita e da livre disponibilidade do
conhecimento tecnológico.
A teoria nasceu com o intento de analisar os padrões de comércio e dos investimentos
produtivos norte-americanos no exterior do período imediatamente posterior à Segunda Guerra
Mundial até meados dos anos 1960. Por que um produto surge em um país e que fatores contribuem
para que, após certo grau de desenvolvimento, a empresa que o produz tenda a localizar sua
produção em outro país? Esta é uma questão central para Vemon. O modelo trata, portanto, de
inovações em setores industriais voltados para consumidores de alta renda e poupadores de mão de
obra. Jogam papel importante na explicação a capacidade tecnológica das empresas inovadoras,
assim como a identificação de oportunidades de investimento induzidas pela presença de demandas
sofisticadas e com elevado poder de compra.
Na explicação sobre as razões do comércio jogam papel importante o progresso tecnológico
e o poder de monopólio transitório adquirido pelas empresas dos países mais desenvolvidos, que
continuamente lançam no mercado novos produtos incorporando alto conhecimento tecnológico. E
por que nos países mais desenvolvidos? Porque estes países possuem mão-de-obra altamente
qualificada, empresas que regularmente desenvolvem pesquisas e, além disso, têm renda elevada e,
consequentemente, uma estrutura de demanda diversificada.
Numa fase inicial, as empresas inovadoras gozam de poder de monopólio com relação aos
novos produtos que lançam no mercado. Com o passar do tempo, esse poder vai-se diluindo em
decorrência de um processo de imitação desses produtos por parte de outras empresas, inclusive
empresas de outros países. À medidaque os novos produtos vão-se padronizando, sua produção pode
49
passar a ser feita em países menos desenvolvidos, que podem até se tomar exportadores de tais
produtos.
Algumas características atuais do comércio internacional seriam explicadas, então, pelas
diversas fases da vida de um produto: na fase inicial (de desenvolvimento e introdução no mercado)
as vantagens comparativas seriam dos países inovadores (os mais desenvolvidos). Na fase de
maturação entram novos concorrentes no mercado ainda altamente concentrado nos países
desenvolvidos. Com a diversificação da oferta, a concorrência, que essencialmente era baseada na
diferenciação do produto, passa, paulatinamente, a ser mais elástica aos preços.
Na fase pós-maturação ou padronização do produto, o consumo se massifíca e a escala de
produção aumenta perdendo importância os custos vinculados a atividades de inovação (pesquisa,
desenvolvimento dos produtos, testes, adaptações, etc) e ganhando importância as atividades
vinculadas aos custos tradicionais (capital, mão de obra e matérias primas). Estas características
tendem a repercutir nas decisões de localização dos novos investimentos para expansão da produção.
Nesta fase, os países menos desenvolvidos podem oferecer vantagens comparativas para localização
da produção de certas categorias de produtos.
r\
'""‘N
Ciclo de vida dos produtos
País A
inovador
Importações
/ Exportações
Produção InternaO
: Procura Interna
O
PaísB.&ÿN
Emergentes
Exportações
Importações
Produção Interna
Introdução no mercado Maturação Pós-maturação
J 50
Como ilustrado na figura acima, a abordagem de Vemon relaciona as exportações no país
inovador às importações de outros países desenvolvidos e dos países em desenvolvimento,
especialmente nas fases de introdução e maturação do produto. Nesta última fase inicia-se a
produção em outros países desenvolvidos e nos países em desenvolvimento, produção que se
expande na fase seguinte. Na fase de padronização os países em desenvolvimento produzem o
suficiente para atender o mercado interno e para exportar para outros países, inclusive o próprio país
inovador. Esta última fase pode estar relacionada ao processo de substituição de importações e a
estratégias de localização da produção em outros países, por meio de investimentos externos do país
inovador.
Como consideração final a respeito da teoria do ciclo do produto, podemos dizer que ela não
explica os fluxos de investimentos estrangeiros no cenário atual de integração dos mercados em nível
mundial, mas ela rompe com a noção de vantagens comparativas baseadas apenas na dotação de
fatores, introduzindo um componente de dinamismo neste conceito e assim dá conta de explicar
porque, nas estratégias de internacionalização da produção, as empresas multinacionais tendem a se
voltar para países com dotação de recursos naturais e mão de obra barata, características de vários
países ditos em desenvolvimento e/ou emergentes.
4.4. “Teorias” com a Presença de Economias de Escala
Estas “teorias” na verdade são um conjunto de fatores (ou constatações) que ajudam a
explicar o elevado crescimento dos fluxos de comércio. Cada um(a) explora aspectos deste fenômeno
atual e bastante complexo e leva em conta situações específicas reais e difíceis de serem
contempladas, simultaneamente, num modelo formal, tais como: ausência de concorrência perfeita,
comércio intraindústria, existência de economias de escala e de aglomeração, os efeitos da
globalização e da tendência de formação de grandes blocos comerciais, comércio intraempresa etc.
4.4.1. Concorrência Monopolística e Comércio Intraindústria
O modelo de concorrência monopolística considera as seguintes características dos mercados:
•Existência de economias de escala internas a cada empresa;
•Os produtos são ligeiramente diferenciados;
•A entrada no setor é livre.
Com a diferenciação dos produtos, apesar da presença de economias de escala, nenhuma
empresa tem condições de produzir sozinha toda a gama de produtos diferenciados do setor. Nessas
condições, há um forte incentivo para o comércio intraindústria, ou seja, dentro de uma mesma
indústria entre os países, um país exportando um produto, digamos automóveis, e importando outra
variedade do mesmo bem o que é uma característica marcante dos fluxos de comércio na atualidade.
Esta foi uma tendência que se intensificou a partir do último terço do século passado.
Essa característica do comércio, no mundo atual, concentra-se fortemente nas trocas entre
países ricos, que têm uma estrutura produtiva e níveis de renda per capita parecidos. O economista
sueco B. Linder foi quem primeiro chamou a atenção para esse aspecto — exportação e importação
do mesmo tipo de bem explicando-o, fundamentalmente, pela semelhança nos níveis de renda
per capita (e, portanto nos padrões de demanda) e nas estruturas produtivas, onde marcam presença
importante empresas que concorrem entre si num regime de concorrência monopolística.
Concorrência imperfeita, economias de escala e ausência de disseminação tecnológica são,
assim, elementos da realidade do mundo atual que novas teorias explicativas dos fluxos de comércio
procuram incorporar.
Uma característica importante da concorrência monopolística, como vimos antes, é
exatamente a diferenciação dos produtos e a presença de economias de escala, fatores que
corroboram a observação de Linder quanto à pujança do comércio Norte-Norte, baseado nas trocas
intraindústria. Com a ocorrência de muitas empresas produzindo o mesmo tipo de produto, mas com
diferenciações, nenhuma empresa tem capacidade de produzir sozinha todas as variedades
demandadas (levando em conta as economias de escala). Essa particularidade favorece o comércio,
já que as empresas passam a dispor de um mercado mais amplo; favorece também aos consumidores,
já que a maior concorrência entre empresas (e entre variedades do mesmo produto) abre caminho
para reduções de preços; e oferece também um leque mais amplo de produtos para escolha do
consumidor, aumentando, portanto, o seu bem-estar.
Há vantagens para os países? Sim, porque aumenta o volume de comércio entre eles. O
gráfico a seguir ilustra uma situação de queda de preços com o aumento da escala.
Preço e
Custo médio
Custo médio
1Pl
2
Pz
Quantidade
Qz$1
J 52
Antes do comércio, a típica empresa encontra-se no ponto 1 (qi,pi), onde vende qi ao preço
pi. Com a abertura das economias e a entrada de novos produtos no mercado, a empresa pode
aumentar a sua escala e vender mais a preços menores, passando para o ponto 2 (q2,p2) seu equilíbrio
de longo prazo, vendendo q2 ao preço p2, trabalhando, como antes, sem lucros extraordinários, em
razão da livre entrada de concorrentes.
Numa situação de oligopólio valem as mesmas considerações acima, com a diferença de que
é pequeno o número de empresas e de que pode haver a presença de lucros extraordinários, já que
não existe livre entrada no setor.
4.4.2. Comércio Intraempresas e Expansão do Comércio
Algumas breves considerações sobre comércio intraempresas, que é também uma
característica do comércio atual e que favorece substancialmente a expansão do comércio mundial.
Com a expansão das empresas multinacionais no mundo, aumenta também a importância do
comércio intraempresas. Quando essa expansão se avoluma com o processo de globalização, um
produto final fabricado no país A é, às vezes, o resultado da junção de componentes produzidos pela
mesma empresa em vários outros países. Noutras situações, uma empresa produz o produto X no
país A e o exporta para os outros países; produz o produto Y no país B e o exporta para os outros
países; produz Z no país C e o exporta para os outros países, e assim por diante.
Durante o processo de expansão das multinacionais para os países em desenvolvimento, foi
comum exigir dessas empresas o cumprimento de metas de nacionalização do produto, ou seja, que a
empresa tivesse um grau crescente de produção interna no país (como se fez naimplantação da
indústria automobilística no Brasil), ou exigir metas de exportação. As duas situações podem criar
oportunidades para expansão do comércio internacional (embora a primeira possa significar maiores
custos de produção, ao menos temporariamente).
4.4.3. Economias de Aglomeração e Comércio Internacional
Vamos denominar de economias de aglomeração as economias de escala que ocorrem no
setor, na indústria como um todo, para diferenciá-las das economias de escala que ocorrem
intemamente, dentro das empresas. Apesar de essas economias ocorrerem para o conjunto do setor,
isto não significa que as empresas individualmente delas não se beneficiem.
Por que será que quase todas as empresas de informática nos Estados Unidos estão
localizadas, ou pelo menos têm escritório, no Vale do Silício, na Califórnia? Por que a indústria
automobilística no Brasil (pelo menos até pouco tempo atrás) se localizava em São Paulo? A
indústria de calçados principalmente em Franca (SP) e Novo Hamburgo (RS) (até que começassem a
/ÿs
migrar para o Nordeste, há poucos anos)? E em Brasília, no Plano Piloto, por que vendedores de
material elétrico se concentram na 309/310 Sul, e lojas de produtos para noivas na 304/305 Norte e
Conjunto Nacional?
A resposta a essas perguntas é uma só: as vantagens que essas empresas obtêm por estarem
juntas (próximas), as economias externas oriundas da aglomeração geográfica. É interessante
observar que muitas vezes as razões para iniciar-se um conglomerado num certo local têm muito
mais a ver com o acaso ou a história do que com motivos puramente económicos, mas, uma vez
estabelecido o conglomerado, prevalecem as razões económicas e ele tende a ser autossustentado e a
se reforçar a cada nova empresa que a ele se junta.
Paul Krugman mostra vários exemplos desses casos, em seu Geography and Trade: “... a
maioria das análises económicas permanece dominada por um estilo de modelo que eu trato de
TTFE: a ideia que o comportamento da economia é basicamente determinado por suas preferências
(T, de "Tastes"), tecnologia (T, de "Technology") e dotação de fatores (FE, de "Factor
Endowments") — todos dados exogenamente. Em contraposição, temos a ideia de que aspectos
importantes de uma economia são contingentes, determinados pela história e até por acidente”.
Quem primeiro abordou este assunto foi o economista inglês Alfred Marshall, no início do
século passado. Segundo ele, existem três razões para um conglomerado de empresas (cluster) ser
mais eficiente que uma empresa isolada:
i) A capacidade de um conglomerado justificar economicamente a presença de
fornecedores altamente especializados.
Um conglomerado, ao reunir várias empresas, tem escala suficiente para sustentar
fornecedores especializados. A empresa individual não teria essa capacidade, mas ela se
beneficia destas economias porque se liberta da obrigação de ela mesma ter que produzir
intemamente o que lhe é fornecido por terceiros especializados. O conjunto dos
fornecedores especializados, por sua vez, fortalece a concentração e cada nova empresa
que surge no setor e na região fortalece o conglomerado. Nessas circunstâncias, uma
empresa do setor que se estabeleça em outro país, ou mesmo outra região do mesmo país,
não pode contar com estes benefícios e já começa em desvantagem.
ii) A capacidade de um conglomerado justificar o aparecimento de um mercado
comum de trabalho.
r\
1
1 Tradução livre. Trecho original: “(...) most economic analysis remain dominated by a style of model that I like to think
of as TTFE: the idea that the economy’s behavior is basically determined by its (exogenously given) tastes, technology
and factor endowments. In opposition we have the idea that important aspects of an economy are contingent, determined
by history and accident” (Krugman, loc. cit., p.102).
Na mesma linha do raciocínio anterior, o conjunto das empresas de um conglomerado
tem condições de criar um amplo mercado para mão-de-obra com elevada especialização.
Se as empresas estiverem espalhadas territorialmente não se cria este mercado comum
que beneficia tanto as empresas, que diminuem seus custos de recrutamento, quanto os
trabalhadores especializados, que têm maiores facilidades para encontrar emprego. Uma
empresa de fora do conglomerado, ou de outro país, não tem estes benefícios, que se
refletem positivamente em seus custos e em sua produtividade. Por exemplo: existem, na
Suíça, várias instituições voltadas à formação de mão-de-obra especializada nos delicados
mecanismos dos relógios de precisão, ou de luxo, produzidos tipicamente nesse país.
iii) A capacidade de um conglomeradofacilitar os vazamentos de conhecimento.
No mundo moderno, o conhecimento técnico é um fator tão importante quanto, ou até
mais, que outros fatores de produção, principalmente nas indústrias mais inovadoras. Esse
conhecimento técnico pode ser adquirido através de pesquisas, por meio de concorrentes
e, ainda, de maneira informal, pela troca de informações entre técnicos especializados.
Esta última forma pode acontecer com maior facilidade no seio de um conglomerado,
onde a concentração das empresas numa mesma área permite o convívio que favorece
uma troca de informações. Uma empresa de fora desse conglomerado não desfruta de tal
beneficio.
As considerações acima sobre as economias de aglomeração levam à conclusão de que numa
indústria com essas características seguramente haverá retornos crescentes de escala, o que significa
que quanto maior a indústria, menores seus custos. Quanto maior a indústria, menor o preço que as
empresas poderão cobrar.
Vamos examinar agora as consequências das economias de aglomeração para o comércio
internacional.
Uma primeira consequência é que se um país se toma grande produtor de algum bem, em
razão de economias externas de aglomeração, ele certamente terá custos relativamente baixos e
tenderá a permanecer como grande produtor e exportador, ainda que apareçam novos produtores. A
explicação para isto é que os custos associados à ausência de escala nas fases iniciais da produção, e
ainda os custos de entrada no mercado do país novato no setor impedem que este país produza a
preços competitivos.
Os custos de entrada no mercado envolvem ainda outro fator: uma vez firmada a tradição de
certo conjunto de produtores, estes podem às vezes cobrar um sobre-preço pela fama de seus
produtos, seja essa fama justificada ou não. “Relógio suíço”, “chocolate belga”, “perfume francês”,
“gravatas italianas”, “eletrónico japonês” passam a ser sinónimos de qualidade. Isso naturalmente
55
dificulta a entrada de novos produtores. Há no mundo, em alguns nichos de mercado, um comércio
que poderíamos chamar de tradição (assim como relógios suíços, conhaques franceses, casimiras
inglesas, cachaças de Salinas, etc.), que se justifica também pela presença de economias de
aglomeração. No Anexo 2, ilustra-se graficamente uma situação semelhante.
4.4.4. Globalização e Formação de Grandes Blocos Comerciais
Uma das características atuais do comércio internacional é o fenômeno da globalização: a
ampliação, diversificação e sofisticação dos fluxos de comércio numa escala nunca atingida
anteriormente, sendo que 2/3 desse fluxo são transações inter e intraempresas transnacionais.
Um aspecto particular dessa tendência é o avanço significativo dos processos de integração, que
alavancam as trocas internacionais entre grupos de países (North-American Free Trade Agreement -
NAFTA, na América do Norte; União Europeia, na Europa Ocidental; Associação das Nações do
Sudeste Asiático; MERCOSUL, na América do Sul; Comunidade Económica da África Ocidental;
etc.).
5. Conclusão
Existem outros modelos para explicar o comércio internacional, como os que utilizam
empresas oligopolistas como ponto de partida. Os resultados desses modelos vão depender dos
efeitos de economias de escala sobre os custos de produção, da curva de aprendizado das empresas,
do fato de serem os bens homogéneos ou diferenciadose ainda da reação que os concorrentes tenham
em relação às iniciativas de cada um deles.
Para um curso introdutório de economia, no entanto, os modelos apresentados acima, de
forma resumida, são suficientes para mostrar as vantagens do comércio internacional para os países
envolvidos e, ainda, que o elemento central para explicação dessas vantagens está no custo de
oportunidade de um produto em relação a outro, dentro de cada país. São elementos importantes, em
diferentes situações, como vimos, a dotação de fatores do país; a evolução da tecnologia de
produção; a existência de economias de escala internas às empresas; e as economias de escala
oriundas de economias externas às empresas e internas ao setor ou indústria (economias de
aglomeração). De toda sorte, pode-se dizer, de modo geral, que um país exporta certo produto
quando tem vantagem comparativa em sua produção (e não vantagem absoluta), venha de onde vier
essa vantagem.
Para concluir estas notas sobre as teorias de Comércio internacional é interessante fazer duas
referências:
56rv
i) As políticas brasileiras e de outros países da América Latina com relação ao setor
industrial, no período que se seguiu à Segunda Guerra, foram muito influenciadas
por críticas feitas aos modelos tradicionais de comércio por autores como Raúl
Prebisch, um economista argentino. Argumentava-se que os ganhos do comércio
internacional eram assimétricos, em razão das características dos tipos de
mercadorias exportadas em geral pelos países centrais, de um lado (produtos
industriais), e pelos países periféricos, de outro (produtos primários, pouco
processados: alimentos, matérias-primas). O argumento baseava-se nos seguintes
pontos:
•baixa elasticidade-renda da demanda por produtos primários, em contraposição
a uma elasticidade-renda mais elevada dos produtos industrializados;
•baixa elasticidade-preço da demanda por produtos primários;
•retração da procura por várias matérias-primas de exportação dos países
periféricos, em razão de ganhos de eficiência em seu uso e do
desenvolvimento de substitutos industrializados (metal substituído por
plástico, borracha natural por borracha sintética, algodão por tecidos
sintéticos, etc.); e
•baixo valor adicionado dos produtos primários.
O efeito cumulativo dessas características seria a deterioração das relações de troca dos países
periféricos (ou seja, queda no preço de suas exportações em relação ao preço das importações), com
consequente distanciamento cada vez maior entre o nível de renda dos países centrais e dos países
periféricos. Para reverter esta tendência os países periféricos deveriam adotar medidas para
incentivar a substituição das importações, em especial pelo desenvolvimento de seus setores
industriais, a partir de políticas governamentais de incentivo.
Não há dúvida de que a indústria brasileira teve crescimento muito expressivo, especialmente
entre 1950 e 1980, sob o estímulo de várias políticas favoráveis à substituição de importações (o que
sucedeu também, em maior ou menor grau, em outros países da região). Mas as grandes
modificações no comércio internacional no período mais recente tomam as idéias de Prebisch pouco
aplicáveis, especialmente no que se refere às tendências de preços. Basta referir o grande aumento
dos preços do petróleo, desde o início da década de 1970, ou a evolução recente nos preços de
produtos agrícolas e do minério de ferro, sob o estímulo de uma forte expansão na demanda
internacional por esses produtos. A observação das relações de troca do Brasil não mostra uma
I '“V
tendência de queda no longo prazo: há períodos de redução, como na década de 1930 ou no início da
década de 1980, mas outros de crescimento, como ao longo dos últimos 25 anos.
O que é significativo em experiências, como a brasileira, de industrialização com o estímulo
de políticas governamentais, em termos de explicação das correntes de comércio, é que tais políticas
— embora envolvendo muitas vezes ineficiências e distorções — podem em alguns casos modificar
as vantagens comparativas do país. Isso na medida em que os setores que se desenvolvam sob
proteção e estímulo do governo cheguem a alcançar competitividade internacional, a partir do
aproveitamento de economias de escala e obtenção de ganhos de produtividade. Um exemplo nesse
sentido é o caso da EMBRAER, empresa criada pelo governo brasileiro e posteriormente privatizada,
e que é hoje um dos principais produtores mundiais de aviões de porte médio.
ii) Uma avaliação das teorias para explicação dos fluxos de comércio
resumidamente apresentadas mostra que cada uma delas é capaz de explicar
aspectos particulares dos fluxos de comércio.
O que essas referências enfatizam é que, além da dotação de recursos produtivos, fatores
tecnológicos e culturais, economias de escala, etc., atributos construídos por governos, empresas e
pela população, ao longo do tempo, podem contribuir para explicar os fluxos de comércio. Michael
Porter mostrou que muitos elementos do conjunto complexo de atributos que influenciam a
competitividade de indústrias e países podem ser criados e desenvolvidos. Outros podem ser
simplesmente herdados e consolidarem uma tradição pela constituição de conglomerados, que uma
vez estabelecidos historicamente perpetuam as vantagens deles decorrentes, vantagens que se
manifestam em termos dos fluxos de comércio.
ANEXO1-UMA FORMALIZAÇÃO DA TEORIA DAS VANTAGENS COMPARATIVAS2
Vamos, então, supor um país, País A, que produz dois produtos, X e Y. A tecnologia utilizada
por este país é demonstrada através da produtividade do trabalho. Ou seja, o número de horas de
trabalho necessárias para produzir uma unidade do produto, que vamos representar por Cx para o
produto X e CY para o produto Y. Então se:
- LA é a disponibilidade total do fator trabalho
- QXA é a quantidade produzida do produto X pelo País A
- QYA é a quantidade produzida do produto Y pelo País A
2 Ver: Krugman, P. & Obstfeld, M. Economia Internacional - Teoria e Política, 6ed., Pearson Education, 2005.
/V
Podemos escrever a CPP do País A como:
CXa Qxa + Cya Qya =
Onde toda a disponibilidade de trabalho é utilizada.
Numa economia com um só fator, a CPP é uma reta e o país abre mão de um produto para
produzir uma unidade a mais do outro produto, ou seja, o CO é a inclinação da reta da CPP (em
valores absolutos), como mostrado no gráfico abaixo:
Gráfico 1: Adaptado de Krugman e Obstfeld
Qya
la'hya IV V
7T- \ = C0aV cxa
Quantidade
Max. De Y
em A V
V CPPa
Qxa
Quantidade
Max. De X em
Vamos agora introduzir outro País, o País B. Então os requisitos unitários de trabalho deste
país serão, respectivamente CXB e CYB; a disponibilidade total do fator trabalho LB e assim por
diante. Podemos então escrever a CPPB como:
- H , como mostrado no gráfico abaixo:e CObCXb ‘Qxb + Cyb Qyb ~ Cxb
Gráfico 2: Adaptado de Krugman e Obstfeld
/*s
Qyb
Vc,
lÿyb
I A
Cy*
7T- = CObQuantidade
Max. De Y
em B
Cxb
r\ '
CPPb
Qxb
L>/c„ Quantidade Max.
De X em B
Se CXA< CXB, dizemos que o País A tem uma vantagem absoluta na produção de X. Se CYA
<CYB dizemos que o País A tem uma vantagem absoluta na produção de Y. Mas como vimos no
exemplo numérico, não são as vantagens absolutas que determinam os benefícios da especialização e
sim as vantagens comparativas, que são indicadas pelos custos de oportunidade.
Agora se CXA/CYA < CXB/CYB, O que implica que CXA/CXB < CYA/CYB, OS custos relativos
em termos de requisitos unitários de trabalho são menores em relação ao produto X no País A. Ou,
em outros termos, o custo de oportunidade de X em relação a Y é menor no País A. Isto significa
que A tem uma vantagem comparativa na produção de X. Em decorrência, seguem todas as
conclusões: o País A deverá especializar-se na produção de X produzindo a quantidade LA/CXA do
produto X. O País B se especializará na produção de Y, produzindo a quantidade LB/CYB de Y. Com
o comércio, os dois países estarão em melhores condições do que antes. Asquantidades exportadas
de X e Y, assim como os preços de X e Y nos dois mercados vão depender das demandas relativas
•nos dois mercados.
A única situação em que não haverá vantagem com o comércio é se CXA/CYA = CXB/CYB, OU
seja, quando os custos de oportunidade forem iguais. Neste caso, os dois países continuariam
produzindo os dois produtos e não haveria vantagem em especializar-se.
O modelo que acabamos de expor resumidamente pode ser estendido para uma situação com
dois países e vários produtos. Para saber em quais produtos cada país vai se especializar, tem-se de
comparar os gastos salariais unitários para cada produto nos dois países. Então, se WACXA <
WBCXB, O País A deve se especializar na produção de X, onde WA e WB são as taxas de salário nos
dois países e CXA e CXB, OS requisitos unitários de trabalho para a produção de X nos dois países.
ANEXO 2-ECONOMIAS DE AGLOMERAÇÃO E BARREIRAS À ENTRADA
Considera-se o gráfico abaixo
Gráfico 5:Adaptado de Kruqman e Obstfeld
Custo,
Preço
cob
D„
Pi
A
Pz
cua
CM„
<h
Onde:
•CMa é o custo médio do País A, pioneiro no setor
•CMb é o custo médio do País B, novato no setor
•Dm é a demanda mundial pelo produto
Vemos que a demanda mundial pode ser satisfeita tanto pelo País A quanto pelo País B. Só que
o País B, novato no setor poderia produzir a custos mais baixos, e se lhe fosse permitido, ele
atenderia o mercado mundial a um preço p2 < pi. Acontece que na fase inicial de sua participação no
mercado o País B começaria produzindo ao custo COb, bem mais elevado que pi. Assim, ele não
participa do mercado e importa o produto ao preço pi.
Um segundo aspecto a ser examinado é que na presença de economias de aglomeração um país
pode estar numa situação pior com o comércio do que sem o comércio. Suponhamos que o País B na
ausência de comércio e em razão de seus baixos custos médios pudesse atender a sua demanda
interna DB ao preço PB < Pi (o preço cobrado no mercado internacional, que é o preço do país
pioneiro). Nesta situação, o País B estaria pior com o comércio do que na ausência do comércio.
Cabe notar que, mesmo nesta situação, o resto do mundo (o conjunto dos demais países) estaria
melhor com o comércio, mas o País B estaria potencialmente pior. Potencialmente porque continuam
a prevalecer os custos elevados das fases iniciais de produção (COB). Esta é uma situação em que o
61
o
País B poderia, eventualmente, proibir a importação desse bem, ou introduzir pesadas tarifas para
essa importação, iniciando-se um processo de substituição de importações.
62/V
Kl0K
*K0 Os Dois Lados do Mercado: Oferta e Demanda KiBK
KlK0
Kl0K
01K0
Klintrodução à Economia
Universidade de Brasília
0K
01K0
Kl0K
01K0
Lívio William Reis de Carvalho
1. Introdução
Estamos acostumados a ouvir nas rádios ou televisões ou ler nos jornais que devido à grande
quantidade do produto tal no mercado, o preço do mesmo está despencando ou, ao contrário, que
devido à escassez de tal produto, o seu preço está subindo muito no mercado. Estes fatos observados
no dia a dia dos mercados são aceitos como naturais por todos, mesmo aqueles que não tenham uma
vez sequer na vida lido um livro de economia. Este cidadão hipotético, se instado a explicar a razão
de tais resultados, provavelmente responderia: esta é uma questão de lógica, quando há uma grande
quantidade de um produto no mercado, seu preço tende a cair. Já o economista (ou o aluno da UnB
que tenha cursado a disciplina de Inteco) provavelmente responderia: Em mercados competitivos,
quando há excesso de oferta em relação à demanda de um determinado produto ou serviço, seu preço
tende a cair, ou vice-versa, quando há excesso de demanda.
Oferta e Demanda, estes serão os tópicos que iremos abordar neste capítulo. Vamos examinar
quais os elementos utilizados pelos economistas para construir um modelo de comportamento dos
mercados que serve para explicar muitos dos resultados neles observados. Note-se que o economista
(ou o aluno que cursou Inteco) na resposta acima mencionou “mercados competitivos”. A noção de
mercado em economia é simplesmente o conjunto de vendedores e compradores de um bem ou
serviço num determinado local (cidade, estado, sub-região, região, país, mundo). Ou seja, não há
nesta noção uma conotação física como a de um prédio do mercado municipal de certa localidade.
Quanto aos mercados competitivos, por enquanto, aceitemos que são aqueles onde existe um grande
número de vendedores e de compradores de um bem ou serviço com características iguais (ou seja, o
produto ou serviço de um vendedor é igual ao de outro vendedor). Apesar de ser um modelo teórico,
ele é muito útil para explicar uma série de fenômenos nos mercados. Por outro lado, há mercados que
se aproximam bastante de um mercado competitivo, como definido na teoria. De qualquer sorte,
saber um pouco mais sobre oferta e demanda é muito importante, pois já houve quem dissesse, com
certo exagero, naturalmente, que poderíamos facilmente transformar um papagaio num economista,
bastando para tanto, ensiná-lo a falar as palavras “oferta” e “demanda”. Ainda nesta Unidade do
63
Curso vamos examinar outros tipos de mercado, onde existe menor competição e os produtos ou
serviços são diferenciados.
2. O Lado da Oferta
A menos que se explicite o contrário, vamos trabalhar sempre, com mercados competitivos.
Em cursos mais avançados de economia, a oferta é derivada do comportamento dos custos de um
produtor, ou do comportamento do conjunto de custos dos produtores, para a oferta de um setor.
Mais precisamente, do comportamento do custo marginal, que é o acréscimo de custos ao se produzir
uma unidade adicional do produto.
No nosso curso, partindo do princípio da racionalidade do produtor, vamos considerar que ele
estará disposto a oferecer uma quantidade maior de seu produto ou serviço, à medida que o preço
determinado pelo mercado aumenta. Como o produtor tem custos adicionais ao aumentar a
produção, ele só estará disposto a levar ao mercado uma maior quantidade se tiver preços maiores.
'
2.1 Escala de Oferta e Curva de Oferta
Tomemos o mercado de arroz em Tropicália. Muitos mercados do setor agrícola se
aproximam de mercados competitivos. Todos os produtores produzem o mesmo arroz (só existe um
tipo de arroz) e, portanto, não há razões para diferenciação de preço em função de diferenciação de
tipos ou de qualidade. Vamos também nos abstrair da presença de outros produtores na cadeia do
arroz (benefíciadores, supermercados, marcas, etc.) Cada produtor produz, beneficia e vende seu
próprio arroz.
2.1.1 Escalas de Oferta e Curvas de Oferta dos Produtores Individuais
Consideremos as seguintes escalas de oferta de arroz do Produtor 1 e do Produtor 2 (que
poderiam ser as escalas de oferta de arroz do Seu José e do Seu Francisco, ou ainda as escalas de
oferta de arroz das Firmas Arroz Maravilha e Arroz Tio Sebastião):
Tabela 2Tabela 1
Escala de Oferta de Arroz do Produtor 2Escala de Oferta de Arroz do Produtor1
Preço(R$mil/t) Quantidade (t)Preço(R$mil/t) Quantidade(t)
2 82 6
3 103 8
4 124 10
5 145 12
6 166 14
64
Essas escalas de oferta nos dizem que os produtores estariam dispostos a ofertar quantidades
maiores de arroz à medida que os preços sejam maiores. O Produtor 1, por exemplo, ao preço de
R$2mil/t estaria disposto a vender 6 t (8t, o Produtor 2), enquanto se o preço fosse R$6mil/t estaria
disposto a vender 14t (16t, o Produtor 2).
Outra forma de traduzirmos os comportamentos descritos pelas escalas acima, seria
desenharmos gráficos com os dados respectivos. Colocamos as quantidades no eixo das abscissas
(eixo dos X) e os preços no eixo das ordenadas (eixo dos Y), por uma questão de conveniência, como
ficará claro dentro em pouco.
Gráfico1 Gráfico 2
Curva de Oferta de Arroz do Produtor1<7 Curva de Oferta de Arroz do Produtor 2
C1 6
r 5 I 5I« a 4cu **
% 3
§ 2£ 2
1 1
0 0
6 8 10 12 14 8 10 12 14 16
Quantidade (t)
A curva de oferta do Produtor 1 está representada no Gráfico1 e a do Produtor 2 no Gráfico
2. Eles nos contam a mesma história das escalas de oferta dos produtores. O Gráfico 1 nos diz que o
Produtor 1 estaria disposto a vender 6 t ao preço de R$2mil/t, 8 t ao preço de R$3mil/t, aumentando a
quantidade ofertada à medida que o preço aumenta. O Gráfico 2 mostra que o Produtor 2 estaria
disposto a ofertar 8t ao preço de R$2mil/t, lOt ao preço de R$3mil/t, aumentando a quantidade
ofertada para preços maiores até a quantidade de 16t, se o preço alcançasse R$6mil/t. Poderíamos,
ainda, representar as escalas de oferta dos produtores e seus respectivos gráficos por equações
matemáticas que nos mostrariam que os produtores ofereceriam maiores quantidades a preços
maiores (ou seja, que as quantidades ofertadas seriam uma função crescente dos preços: maiores
preços, maiores quantidades ofertadas, variações no mesmo sentido). Assim, teríamos três formas de
mostrar a relação direta entre preços e quantidades ofertadas pelos produtores: as escalas de oferta, as
curvas de oferta e as equações respectivas.
No nosso curso, vamos utilizar com frequência a linguagem gráfica para ilustrar os conceitos
económicos que serão apresentados. É muito importante, portanto, que os alunos procurem dominar
este instrumental. Compare os Gráficos 1 e 2 acima. O Gráfico 1, foi desenhado como manda o
Quantidade de Arroz (t)
65
figurino, com todos os detalhes: título bastante explícito, identificação completa das variáveis em
cada eixo, apresentação das linhas gradientes para facilitar a leitura do gráfico etc. No Gráfico 2,
consideramos que alguns desses quesitos eram desnecessários. Se estamos falando do mercado de
arroz, é claro que a curva de oferta, as quantidades ofertadas e os preços se referem ao produto arroz.
Nos próximos gráficos, vamos simplificar ainda mais. As quantidades estarão representas apenas
pela letra Q e os preços pela letra P.
2.1.2 Escala de Oferta e Curva de Oferta do Mercado
Vimos as escalas de oferta dos produtores 1 e 2 e suas respectivas curvas de oferta. Mas qual
seria a escala de oferta do mercado e a curva de oferta do mercado como um todo? O mercado é
constituído pelo conjunto de todos os produtores (vendedores) e todos os consumidores
(compradores). Então, pelo lado da Oferta, o mercado de arroz em Tropicália é constituído pelo
conjunto de todos os produtores de arroz de Tropicália. É, portanto, a soma das quantidades
produzidas por todos os produtores de Tropicália, para cada preço. A Curva de Oferta de Arroz do
Mercado em Tropicália seria a representação gráfica desta escala. Assim, se tivéssemos mil
produtores, a escala de oferta deste mercado levaria em conta a soma das quantidades que todos os
mil produtores estariam dispostos a vender, a cada preço.
É claro que num mercado competitivo o lado da oferta não pode ser constituído de apenas
dois produtores. Mas apenas para ilustrar o conceito de escala de oferta de mercado, vamos supor
que os dois produtores acima seriam os únicos. A escala de oferta de arroz do mercado seria então:
Tabela 3
Escala de Oferta de Arroz no Mercado de Tropicália
Preço(R$mil/t) Quantidade (t)
2 14
3 18
4 22
265
306
A Tabela 3 mostra, na Coluna 2, a soma das quantidades ofertadas por todos os produtores
(no nosso exemplo, apenas dois), a cada preço. Temos agora então ao preço de R$2mil/t, 14t (6t do
Produtor 1 e 8t do Produtor 2); ao preço de R$3mil/t, 18t (8t do Produtor 1 e lOt do Produtor 2), e
assim por diante.
66
Gráfico 3
Curva de Oferta de Arroz no Mercado de Tropicália7
I 6
w
f; 5
£
o. 4
3
2
1
0
14 18 22 26 30
Quantidade (t)
No Gráfico 3, a soma das quantidades ofertadas a cada preço é representada pela soma
horizontal das quantidades produzidas por todos os produtores, a cada preço. O eixo vertical, dos
preços, permanece o mesmo. Dissemos acima que convencionou-se colocar os preços no eixo
vertical e as quantidades no eixo horizontal. A razão, basicamente, é porque essa representação
toma mais simples a leitura dos gráficos.
2.2 Fatores que Influenciam a Oferta Além do Preço
Nas escalas de oferta e curvas de oferta apresentadas acima, examinamos a relação entre
preços e quantidades ofertadas, inicialmente para os produtores individuais e posteriormente para o
mercado como um todo. Mas será que existem outros fatores que influenciam a oferta? Sim, existem
e são principalmente três: o preço dos insumos, a tecnologia e o número de produtores. No caso dos
produtos agrícolas, como no nosso exemplo acima, poderíamos incluir também as condições
climáticas, mas vamos deixá-las de lado, por enquanto.
2.2.1 A Influência dos Preços dos Insumos
Insumo é tudo que é utilizado para produzir um bem ou serviço. Assim, na produção de arroz
teríamos o preço da terra, das máquinas, da mão de obra, das sementes, dos fertilizantes. Enfim tudo
que contribuísse para a produção de arroz. Numa situação de concorrência perfeita, o preço do
produto é uma dado para o produtor. Então, se o preço de um insumo sobe, isto vai influenciar os
custos do produtor e, certamente, a cada preço de seu produto, determinado pelo mercado, ele
tenderá a oferecer uma quantidade menor do que a que oferecia antes. Ao contrário, se o preço de um
insumo cai, a cada preço de seu produto vigente no mercado, ele tenderá a oferecer quantidades
maiores, agora que tem custos menores. Então, mudança nos preços dos insumos implica mudanças
na escala de oferta e nas curvas de oferta. No caso das curvas de oferta, estas mudanças significam
67
deslocamentos das curvas de oferta. Aumento do preço dos insumos, o produtor oferecerá
quantidades menores a cada preço vigente no mercado, ou seja, deslocamento da curva de oferta para
cima e para a esquerda. Diminuição do preço dos insumos, o produtor oferecerá quantidades maiores
a cada preço vigente no mercado, ou seja, deslocamento da curva de oferta para baixo e para a
direita.
2.2.2 A Influência da Tecnologia
A tecnologia é um aspecto muito importante de qualquer processo produtivo. Às vezes somos
levados a pensar que melhoras tecnológicas significam máquinas mais possantes, mais produtivas.
Mas a tecnologia abrange todos os aspectos da produção. Uma fábrica, por exemplo, pode aumentar
sua produtividade apenas porque descobriu um novo lay-out, uma nova disposição dos elementos de
um processo de produção. No caso da agricultura, melhoras tecnológicas podem vir de um melhor
adubo, de novas sementes, de uma nova forma de plantio etc. Os nossos produtores de arroz, podem
adotar um povo fertilizante, descoberto pela EMBRAPA, e produzir muito mais por hectare.
Então melhoras tecnológicas importam em mudanças nas escalas e curvas de oferta. Assim,
melhoras tecnológicas implicam em deslocamento das curvas de oferta para baixo e para a
direita, ou seja, maiores quantidades ofertadas a cada preço vigente no mercado. Não falaremos de
pioras tecnológicas porque um produtor ao adotar uma tecnologia pior do que a utilizada no
momento, em seu processo de produção, não estaria sendo racional, ferindo um dos princípios
básicos que apresentamos na Unidade 1 do curso.
2.2.3 A Influência do Número de Produtores
Somamos a produção de nossos dois produtores de arroz para obter, a cada preço, a oferta de
mercado. Então, se tivéssemos 200 ou 2000 produtores, é claro que a quantidade ofertada de arroz
seria bem maior, a cada preço. Então, o aumento do número de produtores de um determinado
produto ou serviço implica um aumento da escala de mercado, ou seja, um deslocamento da curva
de oferta, para baixo e para a direita. Teríamos um efeito oposto e, claro, um deslocamento em
sentido oposto para a diminuição do número de produtores.
2.2.4 Resumo da Ópera: Diferença entre Mudanças na Quantidade Ofertada e Mudanças na
Oferta
Quando apresentamos as escalas de oferta e curvas de oferta, estamos examinando a relação
entre preços e quantidades ofertadas, considerando constantes todos os outros fatores que
68
influenciam a oferta (o nosso conceitode coeteris paribus, lembra?1). Assim, estamos tratando de
deslocamentos ao longo da curva de oferta, isto é, mudanças na quantidade ofertada, em razão de
mudanças no preço.
A mudança de qualquer fator que influencia a oferta, que não seja o preço, provoca
uma mudança na oferta, um deslocamento da própria curva de oferta, como vimos acima. É assim
que os economistas diferenciam aumento (diminuição) da quantidade ofertada e aumento
(diminuição) da oferta.
QUADRO RESUMO1
MUDANÇAS EM TIPO DE DESLOCAMENTO
Preço do Produto:
-Aumento:
Ao longo da Curva de Oferta
-Para cima (aumento da Q ofertada)
-Para baixo (diminuição da Q ofertada)-Diminuição:
Preço de Insumo:
-Aumento:
Da Curva de Oferta
-Para cima e para a esquerda (diminuição
da oferta)
Para baixo e para a direita (aumento da
oferta)_
-Diminuição:
Tecnologia:
-Melhoras tecnológicas
Da Curva de Oferta
-Para baixo e para a direita (aumento da
Oferta)_
Número de Produtores:
-Aumento
Da Curva de Oferta
-para baixo e para a direita (aumento da
oferta)
-para cima e para a esquerda (diminuição
da Oferta)_
-Diminuição
ILUSTRAÇÕES GRÁFICAS
Gráfico 4
Deslocamentos ao Longo da Curva de Oferta (Aumento ou Diminuição da Quantidade Ofertada)
1Para lembrar: é uma expressão latina, significando “tudo o mais constante”. Pronuncia-se “céteris páribus”.
69
OFERTA
- Aumento de P
- Deslocamento ao
longo da curva
- Aumento da Q
Ofertada
5 CURVA DE OFERTALU
CL
- Diminuição de P
- Deslocamento ao
longo da curva
- Diminuição da Q
Ofertada
QUANTIDADE
-4 4
Aumento da Q OfertadaDiminuição da Q Ofertada
Gráfico 5
Deslocametos da Curva de Oferta (Aumento ou Diminuição da Oferta)
- Deslocamento para
cima e para a esquerda;
- Diminuição da Oferta
CURVA DE OFERTA 3
CURVA DE OFERTA 15
LU
CL vc CURVA DE OFERTA 2
\
r*N
- Deslocamento para
baixo e para a direita;
- Aumento da Oferta\
QUANTIDADE
70
3. O Lado da Demanda
Em cursos mais avançados, a análise da demanda de um consumidor é derivada da
maximização de sua satisfação pelo consumo de uma cesta de produtos e serviços, sujeita às
limitações estabelecidas por sua renda e pelos preços determinados pelo mercado. A ideia é que o
consumidor tem uma função de utilidade, e é capaz de expressar suas preferências organizando em
ordem de preferência os diversos produtos e serviços de sua cesta de consumo.
No nosso curso, tal qual fizemos quando abordamos o lado da oferta, vamos partir da
premissa de racionalidade do consumidor: ou seja, ele prefere pagar menos do que mais por um
produto ou serviço, prefere consumir mais do que menos. Naturalmente, sujeito aos limites
estabelecidos por sua renda e uma certa noção de saciedade (a utilidade marginal, aquela derivada do
consumo de uma unidade adicional de qualquer produto ou serviço é decrescente) e aos preços
estabelecidos pelo mercado e sobre os quais ele não tem comando.
3.1 Escala de Demanda e Curva de Demanda
3.1.1 Escalas de Demanda e Curvas de Demanda Individuais
Tomemos, mais uma vez, o mercado de arroz em Tropicália, como caracterizado na Seção 2.1
e as escalas de consumo do Consumidor 1 e do Consumidor 2 (que devido às unidades usadas no
exemplo (t), poderiam ser as escalas de demanda de duas pequenas fábricas de alimentos derivados
do arroz ou duas pequenas cooperativas de consumo):
Tabela 4 Tabela 5
Escala de Demanda de Arroz do Consumidor 1 Escala de Demanda de Arroz do Consumidor 2
Preço (R$mil/t) Quantidade (t) Preço (R$mil/t) Quantidade (t)
2 18 2 20
3 14 3 16
4 10 4 12
5 6 5 8
6 2 6 4
Estas escalas de demanda nos dizem que os consumidores estão dispostos a consumir
quantidades maiores à medida que os preços diminuam. Ou seja, há uma relação inversa entre preços
e quantidades: menores preços, maiores quantidades demandadas. O Consumidor 1, por exemplo, ao
preço de R$2mil/t está disposto a comprar 18t; 14t ao preço de R$3/t e somente 2t ao preço muito
71
mais elevado de R$6mil/t. A escala de demanda do Consumidor 2, reflete um comportamento
semelhante.
A representação gráfica das escalas de demanda constituem as curvas de demanda dos dois
consumidores:
Gráfico 6 Gráfico 7
Curva de Demanda de Arroz do
Consumidor1
Curva de Demanda de Arroz do
Consumidor 2
7
7
6
6
I5£ 4 < 5E 4vj-
O'"o 3
aOJ
<£ 2 £ 2
Q-
1 1
00
4 8 12 16 202 6 10 14 18
Quantidade (t) Quantidade (t)
As curvas de demanda de cada consumidor acima representam tal comportamento dos
consumidores, ou seja, quanto menor o preço, maior a quantidade demandada. Ao preço elevado de
R$6mil/t o Consumidor 1 está disposto a comprar apenas 2t e o Consumidor 2, 4t. Já ao preço bem
mais baixo de R$2mil/t, o Consumidor 1 está disposto a comprar a quantidade de 18t e o
Consumidor 2, 20t.
3.1.2 Escala de Demanda e Curva de Demanda de Mercado
A escala de demanda de mercado é o resultado da soma das quantidades demandadas, a cada
preço, para todos os consumidores de um determinado bem ou serviço. No caso específico, todos os
consumidores de arroz de Tropicália. Tal como observamos, quando tratamos do lado da oferta, é
claro que um mercado com apenas dois consumidores não é um mercado concorrencial. Apenas para
exemplificar o conceito de escala de demanda de mercado, supomos que o mercado de arroz em
Tropicália é constituído de apenas dois consumidores. Se o mercado fosse constituído de 2.000 ou
20.000 consumidores, o processo de obtenção da escala de demanda do mercado seria o mesmo:
soma das quantidades demandadas por todos os consumidores, a cada preço determinado pelo
mercado. Com nossa hipótese simplifícadora, a escala de demanda de arroz no mercado de
Tropicália é mostrada a seguir:
S'
72
Tabela 6
Escala de Demanda de Arroz no Mercado de Tropicália
Preço (R$mil/t) Quantidade (t)
2 38
3 30
4 22
5 14
6 6
Vemos então que a demanda de arroz, no mercado como um todo, ao preço mais baixo de
R$2mil/t é de 38t (18t do Consumidor 1 e 20t do Consumidor 2), ao passo que ao preço bem mais
elevado de R$6mil/t é de apenas 6t (2t do Consumidor 1 e 4t do Consumidor 2).
A curva de demanda de arroz no mercado como um todo, apresentada abaixo no Gráfico 8, é
a representação gráfica da escala de mercado acima, mostrando, como não poderia deixar de ser, uma
relação inversa entre preços e quantidades demandadas. Em termos gráficos, corresponde à soma
horizontal das quantidades demandadas, a cada preço, nos gráficos das demandas individuais
mostrados acima (gráficos 6 e 7):
Gráfico 8
Curva de Demanda de Mercado de Arroz em Tropicália
7
6
§5
1 4
a:
o 3
d)
£ 2
1
0
306 14 Quantidadeÿt) 38
3.2 Fatores Que Influenciam a Demanda, Além do Preço
Nas escalas de demanda e curvas de demanda apresentadas acima, examinamos a relação
entre preços e quantidades demandadas, inicialmente para os consumidores individuais e
posteriormente para o mercado como um todo, sob a condição de coeteris paribus, ou seja tudo o
mais constante, só variam os preços. Mas existem outros fatores que influenciam a demanda, no
mercado, além dos preços. São principalmente cinco: a renda do consumidor; o preço dos outros
bens; os gostos ou preferências do consumidor; as expectativas do consumidor; e o número de
compradores.
73
3.2.1 A Influência da Renda do Consumidor
Normalmente ou, digamos, na grande maioria dos casos, o consumidor tende a adquirir uma
quantidade maior de um bem se sua renda aumenta, e a diminuir essa quantidade, se sua renda
diminui. Estes bens são denominados de bens normais. Quando a renda de um consumidor aumenta,
ele tende a aumentar o consumo de alguns bens, pelo menos; e quando sua renda cai, ele tem que
ajustar-se à nova situação, consumindo menos de alguns bens ou, até, de todos os bens.
Existem outros bens, no entanto, dos quais o consumidor diminui a quantidade consumida,
quando sua renda aumenta; e aumenta essa quantidade, quando sua renda diminui. São os chamados
bens inferiores. Não são muitos os exemplos disponíveis desse tipo de bem. Geralmente são bens
que ocupam uma parcela importante da renda do consumidorque, ao ter sua renda aumentada, vê a
possibilidade de diminuir o consumo do bem inferior e assim aumentar o consumo de outro(s)
bem(ns), que em sua avaliação têm melhor qualidade, são preferíveis. No Brasil, a farinha de
mandioca é um bem presente na mesa de quase todas as famílias, principalmente no Nordeste; mas
em famílias de baixa renda costuma ser um componente importante da dieta, como fonte barata de
proteínas. Nesse último caso, quando essas famílias têm aumento de renda, têm agora a possibilidade
de consumir outros alimentos (proteínas animais e vegetais, por exemplo) que antes não consumiam,
ou consumiam pouco; diminuindo assim o consumo de farinha de mandioca. Outro exemplo célebre
é a passagem de ônibus. Quando os consumidores têm aumento significativo de renda, muitos deles
optam por outros meios de transporte (van, táxi, moto, automóvel), principalmente quando os meios
de transporte público são de baixa qualidade, como é o caso da maioria das grandes cidades
brasileiras.
/*v
rs
/*N
3.2.2 A Influência dos Preços dos Outros Bens
Vamos classificar os bens, quanto a este aspecto, em duas categorias: os bens de demandas
não relacionadas e os bens de demandas relacionadas. Os bens de demandas não relacionadas
são aqueles cujas demandas não sofrem a influência uma da outra, não interagem entre si. Por
exemplo, a demanda por material escolar e a demanda por picolés. Os bens de demanda relacionadas
podem ser de duas categorias: os bens substitutos e os bens complementares.
Bens substitutos são aqueles que satisfazem necessidades semelhantes ou parecidas, como
por exemplo, café e chá; manteiga e margarina. Bens complementares são aqueles de consumo
conjunto ou complementar, como por exemplo, pão e manteiga (ou margarina); gasolina (ou álcool
anidro) e automóvel. Vamos examinar um pouco melhor este ponto. Se o preço de um bem que é
substituto de outro sobe, os consumidores tenderão a aumentar o consumo do outro bem, que atende
Se o preço da manteiga aumenta
/"N
/-N
/"V
(ainda que aproximadamente) a mesma finalidade.
74
demasiadamente, as pessoas tenderão a substituí-la pela margarina — e vice-versa. Mas se o preço
de um bem que é complementar a outro aumenta, os consumidores tenderão a diminuir também o
consumo desse outro bem, de uso conjunto com o primeiro. Se o preço da gasolina subir
demasiadamente, muitos consumidores diminuirão o consumo de gasolina e usarão menos o carro —
o consumo dos serviços prestados pelo carro como meio de transporte é, claro, complementar ao
consumo de gasolina (carros passarão a ser usados só nos fins de semana, por exemplo, ou seu uso
trocado por um bem substituto: bicicleta, caminhar a pé para o trabalho).
3.2.3 A Influência dos Gostos ou Preferências do Consumidor
Os gostos ou preferências do consumidor são um dos mais importantes determinantes da
demanda de um bem ou serviço. Essas preferências são ocasionadas por diversos fatores. Às vezes
por razões históricas, por hábitos desenvolvidos anteriormente (o hábito de comer carne, no Brasil,
foi influenciado pela existência de muita terra e pouca gente, no período inicial da colonização, o que
facilitava a criação de gado); por imitação do que está na moda (uso de bonés por adolescentes); pela
influência da propaganda (que tenta convencer o consumidor de que certo produto ou certa marca é
de uso indispensável); e mesmo por razões psicológicas (comprar bilhetes da mega-sena não é uma
decisão “racional”, pois a probabilidade de ganhar é ínfima, mas a sensação de poder ficar rico, antes
do sorteio, é boa) — num leque bem variado de motivações.
Por isso mesmo, os economistas não tentam explicar essas razões, tomando-as como um
dado. Mas as mudanças desses gostos ou preferências têm implicações imediatas para a demanda de
um bem ou serviço. Isto sim, interessa muito de perto ao economista. Se as preferências dos
consumidores por um determinado bem ou serviço por algum motivo aumentam ou diminuem, é
claro que isto repercutirá de imediato na demanda por esse bem ou serviço.
3.2.4 A Influência das Expectativas do Consumidor
O comportamento do consumidor pode ser influenciado pelo que ele espera ou acha que vai
ser o cenário futuro ao seu redor que pode afetá-lo de várias maneiras. Por exemplo, se ele espera
que o preço de um bem vai diminuir (aumentar), poderá adiar (antecipar) o consumo desse bem no
presente. Isso é comum no mercado de ações, nas bolsas de valores: a expectativa de que o preço de
determinada ação subirá faz aumentar a demanda por ela no presente. Ou, digamos, se o consumidor
espera ter um aumento (diminuição) de renda nos próximos meses, isto pode afetar a sua demanda
por certos bens hoje.
75
3.2.5 A Influência do Número de Consumidores
O mercado de um determinado bem em um local é constituído pelo conjunto de consumidores
desse bem. Quando passamos da escala e curva de consumo individual para a escala e curva de
demanda de mercado, nas seções 3.1.1 e 3.1.2, somamos as quantidades demandadas
individualmente. É claro que a entrada de novos consumidores no mercado (porque o bem
considerado ficou na moda, por exemplo), ou a saída de consumidores, impactam diretamente a
demanda total por esse bem.
3.3 Deslocamentos ao Longo da Curva de Demanda e Deslocamentos da Curva de Demanda
Vimos que ao estabelecermos uma escala de demanda, ou quando representamos essa escala
numa curva de demanda, estamos examinando a reação da quantidade demandada de um bem a
variações de seu preço no mercado, apenas. Ou seja, aumento (diminuição) de preço, e consequente
diminuição (aumento) da quantidade demandada. Essa relação inversa entre preço e quantidade
demandada costuma ser chama de Lei da Demanda. Ela é representada por movimentos ao longo da
curva de demanda. “Para baixo”, quando há redução no preço e aumento da quantidade demandada;
e “para cima”, no caso contrário. Não falamos, nesse contexto, em aumento ou redução da demanda,
mas sim em aumento ou redução da quantidade demandada.
Quando estabelecemos uma escala de demanda ou a representamos numa curva de demanda,
como mencionado no parágrafo anterior, examinamos a relação entre preços e quantidades
demandadas no mercado, considerando como constantes todos os outros fatores que influenciam a
demanda deste bem (tenho certeza que vocês se recordam da hipótese de coeterís paribus a que
nos referimos anteriormente): a renda do consumidor, o preço dos bens relacionados, as preferências
do consumidor, as expectativas do consumidor e o número de consumidores no mercado. Quando há
uma mudança em qualquer um desses fatores, significa que toda a escala de demanda muda, ou seja,
a própria curva de demanda muda. Exemplifiquemos com uma mudança na renda do consumidor.
Suponhamos que o consumidor tenha um aumento de renda. Para a grande maioria dos bens (exceto
os bens inferiores, lembra-se?), o consumidor, ao dispor de mais renda, estará agora disposto a
comprar quantidades maiores do que antes, a cada preço. Em termos gráficos, isto significaria um
deslocamento da própria curva de demanda para cima e para a direita (a cada preço, quantidades
maiores). Para uma diminuição de renda, teríamos efeitos exatamente opostos aos que acabamos de
descrever: a curva de demanda se deslocaria para a esquerda e para baixo. Nesse caso, falamos num
aumento ou diminuição da demanda.
Similarmente, a mudança em qualquer um dos outros fatores que influenciam a demanda, e
que são considerados constantes ao se traçar uma curva de demanda, provoca um deslocamento da
—v
76
curva inteira, para cima e para a direita, se a influência for positiva. Ou para baixo e para a esquerda,
se esta influência afetar negativamente a demanda, no sentido de diminuí-la. O Quadro abaixo
resume as diferentes alternativas:
QUADRO RESUMO 2
MUDANÇAS EM TIPO DE DESLOCAMENTO
Preço do Produto:
-Aumento
Ao longo da curva de demanda
-Para cima (diminuição da O demandada)
-Para baixo (aumento da Q demandada)-Diminuição
Rendado Consumidor Da curva de demanda
-Para cima (aumento da demanda) *
-Para baixo (diminuição da demanda) **
-Aumento
-Diminuição
Preço dos Bens Relacionados
-Bens Substitutos
Aumento
Diminuição
-Bens Complementares
Aumento
Diminuição
Da curva de demanda
Para cima (aumento da demanda)
Para baixo (diminuição da demanda)
Para baixo (diminuição da demanda)
Para cima (aumento da demanda)
Preferências do Consumidor
-Aumento
-Diminuição_
Da curva de demanda
-Para cima (aumento da demanda)
-Para baixo (diminuição da demanda)
Expectativas do Consumidor
-De efeito positivo
-De efeito negativo_
Da curva de demanda
-Para cima (aumento da demanda)
-Para baixo (diminuição da demanda)
Número de Consumidores Da curva de demanda
-Para cima (aumento da demanda)
-Para baixo (diminuição da demanda)
-Aumento
-Diminuição
*Para cima significa: Para cima e para a direita; **Para baixo significa: Para baixo e para a
esquerda.
ILUSTRAÇÕES GRÁFICAS
Gráfico 9
Deslocamentos ao Longo da Curva de Demanda (Aumento ou Diminuição da Quantidade
Demandada)
77
o
DEMANDAsy
- Aumento de P
- Deslocamento ao
longo da curva
- Diminuição da Q
demandada
o
ar
0L
A
V
/A
- Diminuição de P
- Deslocamento ao
longo da curva
- Aumento da Q
demandada
CURVA DE DEMANDA
QUANTIDADE
Diminuição da Q Demandada Aumento da Q. Demandada
Gráfico 10
Deslocamentos da Curva de Demanda (Aumento ou Diminuição da Demanda)
-Deslocamento para
cima e para a direita;
- Aumento da Demanda
o
LU
D_
//
/
CURVA DE DEMANDA 3
/
CURVA DE DEMANDA1- Deslocamento para
baixo e para a esquerda;
- Diminuição da Demanda CURVA DE DERMANDA 2
QUANTIDADE
4. O Equilíbrio de Mercado
A noção intuitiva de equilíbrio denota situações em que duas forças se equivalem. Os dois
pratos de uma balança ao conter pesos iguais, por exemplo. Ou, no caso que aqui nos interessa, os
dois lados do mercado. Mercado, como dissemos antes, refere-se ao conjunto de todos os
compradores e todos os vendedores de um determinado bem ou serviço. Então, para exemplificarmos
78
o conceito de equilíbrio de mercado, vamos trazer de volta as escalas de oferta de mercado e de
demanda de mercado de arroz, que vimos nas Tabelas 3 e 6 para a Tabela 7, abaixo:
Tabela 7
Mercado de Arroz: Escalas de Oferta e de Demanda
Preço (R$mil/t) Quantidade Ofertada (t) Quantidade Demandada (t)
2 14 38
3 18 30
4 22 22
5 26 14
6 30 6
Na Tabela 7, vemos que ao preço de R$2mil/t a quantidade ofertada é de apenas 14t,
enquanto a quantidade demandada é de 38t. A quantidade demandada é, portanto, bem maior que a
quantidade ofertada. Nessas situações dizemos que a este preço tão baixo há um excesso de
demanda. Num mercado de concorrência perfeita, quando há excesso de demanda, os compradores
estarão dispostos a pagar maiores preços e a tendência, numa situação como esta é que os preços
aumentem. No outro extremo, ao preço de R$6mil/t, a quantidade ofertada é de 30t e a quantidade
demandada de apenas 6t. A quantidade ofertada é muito maior que a quantidade demandada. Nestas
situações dizemos que a este preço tão elevado há um excesso de oferta. Quando há excesso de
oferta, numa situação de concorrência perfeita, os vendedores estarão dispostos a aceitar preços
menores e a tendência, portanto, é que os preços caiam. Ao preço de R$4mil/t é a única situação em
que a quantidade ofertada é exatamente igual à quantidade demandada (22t). Há um equilíbrio entre
as forças de mercado. Dizemos, então, que R$4/t é o preço de equilíbrio de mercado e 22t é a
quantidade de equilíbrio de mercado. A esse preço o que os vendedores desejam vender é
exatamente igual ao que os compradores desejam comprar. Este é o ponto de equilíbrio do mercado.
Podemos representar graficamente a Tabela 7. Esta representação mostrará as curva de Oferta
e de Demanda do Mercado de Arroz em Tropicália:
79
| /-N
Gráfico 11
Curvas de Oferta e de Demanda de Arroz em Tropicália
!7
g
Curva de Oferta
8.6
QJ
Excesso de Oferta
a
5'
1
4
3
Excesso de Demair-v
2
Curva de Demanda
1
0
0 5 10 15 20 25 30 35 40
Quantidade (t)
Vemos no gráfico acima que a preços maiores que R$4mil/t há excesso de oferta, muitos
vendedores e poucos compradores. Numa situação como essa, num merca do concorrência perfeita, a
tendência é que os vendedores comecem a aceitar preços menores. Ao contrário, a preços menores
que R$4mil/t há excesso de demanda, muita quantidade demandada e pouca quantidade ofertada.
Numa situação como esta, num mercado de concorrência perfeita, a tendência é que os compradores
se disponham agora a pagar preços maiores. A única situação em que os dois lados do mercado estão
satisfeitos, onde o preço que os compradores querem pagar é o mesmo que os vendedores querem
receber (R$4mil/t), assim como a quantidade que os compradores querem comprar é a mesma que os
vendedores querem vender (22t). O mercado está em equilíbrio. Esse é o ponto de cruzamento das
curvas de oferta e de demanda do mercado, denotado no gráfico pela letra “E”.
5. Exercícios De Estática Comparativa
Agora que já dominamos as ferramentas da oferta e da demanda e sua interação no mercado,
podemos fazer alguns exercícios de estática comparativa. Partindo de uma situação de equilíbrio
inicial, verificaremos qual o efeito da mudança de um ou mais daqueles fatores que influenciam a
oferta e/ou a demanda, resultando num novo equilíbrio (uma nova situação, em termos de preço e
quantidade). Faremos isto respondendo a três perguntas:
- A mudança afeta qual lado do mercado (a oferta, a demanda ou ambas)?
- Em que direção se dá esse efeito?
80
/-s
- Qual o novo equilíbrio resultante (qual o novo preço e a nova quantidade)?
Nesses exercícios, comparamos duas situações: uma situação inicial e uma situação final,
resultante do(s) efeito(s) da(s) mudança(s) do(s) fator (es) que pode(m) influenciar a oferta e/ou a
demanda. Não vamos procurar saber como se chegou de um equilíbrio ao outro, ou seja, a dinâmica
do processo. Apenas vamos comparar duas situações estáticas. Estas comparações vão nos fornecer
indicações qualitativas sobre variáveis importantes do mercado (preços e quantidades, por exemplo).
Apesar de se basearem em ferramentas simples, tais exercícios nos ajudam a entender melhor
algumas questões económicas do nosso cotidiano. Para tanto, é necessário que nos lembremos
sempre daquela diferenciação entre deslocamentos ao longo das curvas (de oferta ou de demanda) e
deslocamentos das próprias curvas.
Deslocamento da Curva de Oferta (aumento ou diminuição da oferta)
Suponhamos que a EMBRAPA, após várias pesquisas, encontrou uma nova variedade de
semente de arroz que aumenta significativamente a produção de arroz por hectare plantado.
Respondendo à primeira pergunta: qual o lado do mercado que é afetado? Trata-se de uma mudança
tecnológica que vai afetar a oferta. Segunda pergunta: em que direção? Agora os produtores vão
poder produzir mais por hectare (ao mesmo custo) e vão poder, a cada preço de mercado, oferecer
uma quantidade maior. Estamos falando, portanto, de um aumento da oferta (um deslocamento da
curva de oferta para a direita e para baixo). Terceira pergunta: Qual o resultado em termos de preço e
quantidade no novo equilíbrio?
Gráfico 12
P
O1
O2
E1
P1
I E2I
P2 -I
I
I
D1
Q2Q1
Q
81
A mudança tecnológica não afeta a curva de demanda; temos, então, um aumento da oferta
permanecendo a mesma demanda. Isto significa menores preços (P2<Pi) e maiores quantidades
(Q2>Qi), no novo equilíbrio (E2), como ilustrado no Gráfico 12, acima.
Suponhamos uma nova situação: uma grande estiagem nos estados maiores produtores de
arroz, afetando significativamente a produtividade por hectare. Seria um efeito sobre a oferta oposto
ao que acabamos de ver, com resultados também opostos: aumento do preço e diminuição da
quantidade no novo equilíbrio.
Deslocamento da Curva de Demanda faumento ou diminuição da demandai
A '
Considere o estabelecimento pelo governo de um programa de distribuição de cestasde arroz,
para famílias com renda per capita abaixo de um certo valor. O arroz é um item presente diariamente
na dieta de todo brasileiro, e principalmente daqueles de renda mais baixa. Para efetivar seu
programa, o governo, que não produz arroz, compra o produto no mercado; há, então uma demanda
adicional no mercado. Resposta à primeira pergunta: o lado afetado é o da demanda de arroz;
resposta da segunda pergunta: o aumento do consumo de uma grande quantidade de consumidores
significa um aumento da demanda (um deslocamento da curva de demanda para cima e para a
direita). Resposta à terceira pergunta: como 0 programa não afeta 0 lado da oferta, temos um
aumento da demanda e a mesma oferta, resultando em maiores preços e maiores quantidades
transacionadas, como ilustrado no Gráfico 13, abaixo:
Gráfico 13
P
O1
E2P2
t E\
P1
D2
D1
Q> Q2Q1
82
A introdução do novo programa implica um deslocamento da curva de demanda (aumento da
demanda) de Di para D2. Como a curva de oferta não se altera, temos como resultado no novo
equilíbrio (E2) maior preço (P2>Pi) e maior quantidade (Q2>Qi).
Se tivéssemos, em vez da introdução do programa de distribuição de cestas de arroz, uma
diminuição da renda dos consumidores, provocada, por exemplo, por uma crise na economia,
teríamos no novo equilíbrio resultados opostos ao do nosso exemplo anterior: diminuição da
demanda e queda no preço e na quantidade de arroz.
Deslocamentos simultâneos das Curvas de Oferta e de Demanda (Aumento ou
Diminuição das Curvas de Oferta e de Demanda)
Vamos supor que 0 uso das novas sementes de arroz da EMBRAPA e a introdução do
programa de distribuição de cestas de arroz acontecessem ao mesmo tempo. Qual o lado do mercado
que seria afetado, o da oferta, o da demanda ou ambos? Poderíamos afirmar que os dois lados
seriam afetados: a curva de oferta se deslocaria para a direita e para baixo (um aumento da oferta) e a
curva de demanda se deslocaria para cima e para a direita (um aumento da demanda). Mas e o
resultado final em termos de preço e quantidade no novo equilíbrio? Poderíamos afirmar que a
quantidade final seria maior: tanto a mudança do lado da oferta quanto do lado da demanda
impulsionam nessa direção. Mas a resposta quanto ao preço iria depender do tamanho do aumento da
oferta em relação ao tamanho do aumento da demanda. Se a oferta aumentasse relativamente mais
que o aumento da demanda, o preço diminuiria. Se, ao contrário, a demanda aumentasse
relativamente mais que a oferta, o preço final aumentaria. Se os aumentos da oferta e da demanda
fossem de proporções semelhantes, 0 preço final poderia permanecer o mesmo. As três situações
estão ilustradas no Gráfico 14, a seguir:
Gráfico 14
-Aumento Maior da Oferta (P2<Pi; Q2>Qi)
P
O1
O2
E1
P1 E2I <- -4 -P2
I
I
D2
D1I
83
>Q2Q1
Q
I /*S,
v\
Gráfico 15
- Aumento Maior da Demanda (P2>Pi; Q2>Qi)
P
o1
o2
A '
E2
P2
t E1
P1/ÿ>
i
D2
D1
QQ2Q1
Gráfico 16
-Aumentos de Proporções Semelhantes da Oferta e da Demanda (P2=Pi; Q2>Qi)
P
O1
O2
X
E1 E2
P1=P2
I I
I I
I I
I D2
I I
I D1I
I I
Q2Q1 Q
84
Poderíamos também explorar situações onde houvesse, por exemplo, diminuições em
proporções semelhantes, ou não, tanto da oferta quanto da demanda ou ainda, outras em que as
variações da oferta e demanda se dessem em sentidos opostos. Ficam estas possibilidades como
exercícios de fixação. Para facilitar essa tarefa, apresentamos o Quadro Resumo abaixo, onde
adotamos as seguintes convenções: seta para cima depois da variável (T) significa aumento; seta para
baixo depois da variável (JQ, significa diminuição; um sinal de igual (=) após a variável significa que
ela não muda; e um sinal de interrogação depois da variável (?), significa que ela pode aumentar,
diminuir ou permanecer com o mesmo valor, dependendo das variações relativas da oferta e da
demanda.
QUADRO RESUMO 3
MUDANÇAS NA OFERTA
2 DIMINUIÇÃOSEM MUDANÇA AUMENTOz
<
1
UJ PíQT PTQ!SEM MUDANÇA P= Q=
<z
<o PíQT P?QT PTQ?AUMENTO
z
<
Q
3 PIQí P4ÿQ?DIMINUIÇÃO P?QÍ
6. Conclusão: Oferta e Demanda e Seu Papel na Economia de Mercado
Vimos, então, os dois lados do mercado. O lado da oferta e os principais fatores que a
influenciam; o lado da demanda e os principais fatores que a influenciam; e, o mais importante,
vimos a interação entre esses dois lados do mercado. Acabamos de ver, portanto, como funciona um
mercado concorrencial, utilizando exemplos simples de um mercado hipotético de arroz. É claro que
podemos utilizar esses conhecimentos para qualquer mercado com características análogas.
Na primeira unidade do curso, aprendemos que precisamos estabelecer escolhas em várias
circunstâncias de nossas vidas e, principalmente, na vida económica, já que as necessidades de todas
as sociedades são ilimitadas (são muito grandes e muito variadas) e os recursos disponíveis para
satisfazê-las são escassos (limitados). As sociedades se deparam, então, com a necessidade de
estabelecer uma série de escolhas muito importantes para o seu funcionamento em várias áreas e, em
particular, na área da Economia. Quatro dessas escolhas são cruciais. As coletividades precisam
decidir O QUE PRODUZIR, já que os recursos disponíveis são limitados e não há condições de
produzir tudo que se imaginar; precisam decidir QUANTO PODUZIR: pela mesmo motivo da
85
limitação dos recursos, não há como produzir os bens escolhidos na quantidade que se quiser; e têm
que decidir COMO PRODUZIR, porque os diferentes modos de produzir (as diferentes tecnologias)
têm eficiências (custos) diferentes, o que pode determinar o crescimento ou a extinção de um
produtor; e, finalmente, precisa decidir PARA QUEM PRODUZIR, o aspecto da distribuição da
produção, ou seja quem terá acesso ao que for produzido.
Nas sociedades ditas de mercado, a oferta e a demanda dos bens e serviços que são
produzidos determina o preço desses bens. O sistema de preços funciona então como uma espécie de
sinalizador para a alocação dos recursos entre os vários setores e assim determinando O QUE
PRODUZIR. Se os preços são atraentes no setor de arroz, isto vai atrair recursos para ele e, ao
contrário, esses recursos vão ser afugentados para outros setores, se os preços do arroz não são
atraentes, em comparação com os preços de mercado de outros bens e serviços.
Não costumamos ter noites de insónia, preocupados se na manhã seguinte vai ou não ter pão
na padaria da esquina. Para o dono da padaria, o mercado lhe indica QUANTO PRODUZIR de todos
os tipos de pães. Se um determinado tipo de pão está com vendas baixas, isto é uma indicação para
diminuir a produção. Se, ao contrário, o balconista percebe que vários clientes procuram por um tipo
de pão cujo estoque está se esgotando no meio da tarde, é um sinal de que a produção deve ser
aumentada. Assim, o mercado, seja por injunções da demanda do produto, ou pelo lado da oferta e
demanda dos insumos, também sinaliza com respeito ao QUANTO PRODUZIR, o mesmo valendo
quanto à forma de produzir, ou o COMO PRODUZIR.
O mercado, através do sistema de preços, também define o PARA QUEM PRODUZIR.
Quem tem acesso a determinados bens ou serviços são aqueles agentes (indivíduos, empresas ou
governos) que desejam adquirir estes bens ou serviços e têm condições efetivas de fazê-lo. Nesse
aspecto, o sistema de preços funciona como uma espécie de racionador do sistema, indicando quem
terá acesso a certos bens ou serviços, já que, mais uma vez, não dá para produzir tudo para todos, até
porque um sistema dessa natureza seria muito ineficiente.
Numa economia de mercado não existe uma agência (um governo ou um seu preposto - a
agência central de planejamento) tomando aquelas decisões, quanto ao o que, quanto, como e para
quem produzir. Essas decisões são tomadas por milhares de agentes de forma descentralizada, cada
um pensando nos seus próprios interesses. Lembra da Mão Invisível de Adam Smith, lá dos
princípios básicos de economia da primeira unidade do curso?
/'A
/*\
'ÿ‘V
86
I*1KBKlBK Elasticidade e suas Aplicações BIKB
KlBK
BIKB
KlBK
BIIntrodução à Economia
Universidade de Brasília
KB
KlBK
BIKB
KlBK
Lívio W.R. de Carvalho, Flávio R. Versiani, Bruno P. Rezende e Max Villela
1. Introdução
Na Unidade I de nosso curso de Introdução à Economia, vimos que a Economia é uma
ciência que se preocupa com a alocação de recursos escassos e que o preço é o mais importante
alocador desses recursos. No início desta unidade, vimos que o preço é determinado pelas forças de
oferta e demanda, as quais, por sua vez, condicionam os mercados. Oferta e demanda são
influenciadas por diversos fatores já estudados no texto anterior. Quando há variações nesses fatores,
alteram-se as condições de mercado, provocando respostas da oferta e da demanda a tais variações.
Vimos que essas respostas são representadas graficamente pelo deslocamento das curvas de oferta e
demanda, o que nos permite fazer inferências qualitativas sobre o comportamento das forças de
mercado.
Por exemplo, um evento climático que comprometa grandes plantações de trigo na China tem
o efeito, tudo o mais mantido constante, de reduzir a oferta de trigo no mercado chinês (supondo que
toda a produção de trigo na China se destine ao consumo interno). Graficamente, o comportamento
da oferta de trigo, em decorrência desse fenômeno climático, pode ser representado pelo
deslocamento da curva de oferta para a esquerda (e para cima). Tudo o mais constante, haverá
aumento do preço do trigo e redução da quantidade transacionada desse bem.
Neste momento, interessa-nos estudar ferramentas que nos permitam fazer análises
quantitativas de situações como as dos exemplos anteriores, examinando, por exemplo, a proporção
das variações percentuais do preço e da quantidade demandada de trigo na China. Esse tipo de
análise, que você aprenderá a fazer neste texto, envolve o conceito de elasticidade. Você verá que,
por meio do cálculo e da interpretação do valor encontrado para os diferentes tipos de elasticidade,
será possível não só produzir avaliações mais completas sobre o funcionamento dos mercados, mas
também facilitar a compreensão de algumas situações concretas.
A propósito disso, serão dados exemplos relacionados à economia brasileira, para que você
possa conhecer aplicações práticas da elasticidade. Por exemplo: o Brasil era, no início do século
passado, quase monopolista no mercado internacional de café, assim como hoje em dia os membros
da OPEP (Organização dos Países Produtores de Petróleo) dominam o mercado de petróleo. O que
possibilitou que tenham sido adotadas, em ambos os casos, políticas de controle de preços? Por que
87
tais políticas tiveram efeitos bem diferentes, no café e no petróleo? Você verá que essas questões
podem ser respondidas com os conceitos que aprenderá nesta parte do curso.
2. O conceito de elasticidade
Em Economia, o termo “elasticidade” refere-se a uma medida numérica da sensibilidade da
curva de oferta ou da curva de demanda a uma variação em um de seus determinantes. Em outras
palavras, o conhecimento da elasticidade de uma curva de demanda, por exemplo, permite-nos dizer
o que acontecerá com a quantidade demandada do bem em questão diante da variação de seu preço.
Você já viu, quando estudou oferta e demanda, como ocorrem, qualitativamente, as variações dessas
curvas em função de alterações em seus determinantes (isto é, se as curvas se deslocam ou não e, se
se deslocam, para onde: para a direita ou para a esquerda). A elasticidade permite analisar,
quantitativamente, como essas mudanças ocorrem, medindo a reação de quantidades a preços no
mercado, ou seja, de quanto variam as quantidades em relação às variações nos preços. Com o
exemplo a seguir, isso deverá ficar mais claro.
Suponha que num mercado de pães de queijo, com as curvas convencionais de oferta e de
demanda, ocorra um deslocamento para a esquerda da curva de oferta (causado, por exemplo, por um
aumento no preço do queijo), provocando alta no preço do pão de queijo. Imagine que a variação de
preço do pão de queijo foi de 10% (ou seja, o preço aumentou 10% em relação ao preço anterior -
digamos, de R$1,00 para R$1,10). Já sabemos que, para os bens normais, a quantidade demandada
deve diminuir. Mas qual será a dimensão dessa diminuição? Será que a quantidade demandada
diminuirá os mesmos 10%? Mais de 10%? Menos de 10%? Os mesmos questionamentos podem ser
feitos com relação à quantidade ofertada diante de um aumento de 10% no preço, causado por
aumento na demanda: a quantidade ofertada aumentará também em 10%? Ou mais de 10%? Ou
menos de 10%? As respostas a essas perguntas podem ser dadas por meio do cálculo da elasticidade.
Vamos explorar este conceito primeiro pelo lado da demanda e posteriormente pelo lado da oferta.
3. Elasticidades da demanda
O leitor deve ter reparado que no título desta seção a palavra elasticidade está no plural. A
explicação para isto é que, como já vimos, a quantidade demandada de um bem pode mudar quando
muda o preço deste bem, permanecendo constantes todos os demais fatores que influenciam a
demanda por este bem. Neste caso, a quantidade demandada se altera, mas a curva de demanda
permanece a mesma. Podemos, então, medir a sensibilidade de quantidades de um bem em relação a
variações de preços do próprio bem (as quantidades de pão de queijo em relação a variações de preço
88
do pão de queijo, mantendo-se constantes os preços dos bens relacionados e a renda do consumidor).
É o conceito de elasticidade-preço da demanda de um bem. Mas a quantidade demandada de um
bem pode mudar em razão de mudanças nos outros fatores que influenciam a demanda de um bem
(neste caso em razão de deslocamentos da curva de demanda deste bem, ainda que permaneça a
mesma curva de oferta). Seria, por exemplo, medir a sensibilidade de quantidades de um bem em
relação a variações de preço de outro bem relacionado, ou a variações da renda do consumidor. São
os conceitos de elasticidade-preço cruzada da demanda (sensibilidade das quantidades de pão de
queijo em relação a variações de preços da broa de milho — bem substituto — ou do cafezinho —
bem complementar) e de elasticidade-renda da demanda de um bem (a reação a variações na renda
do consumidor).
3.1 Elasticidade-preco da demanda
Voltemos à pergunta feita anteriormente, com todos os condicionantes que a cercam, como já
explicitados: se o preço do pão de queijo aumenta de R$1,00 para R$1,10 (portanto 10%), de quanto
diminuirá a quantidade demandada de pão de queijo? Mais de 10%? Exatamente 10%? Ou menos de
10%? A resposta dependerá da elasticidade-preço desta demanda.
A elasticidade-preço da demanda de um bem expressa numericamente a sensibilidade
(variações relativas) de quantidades demandadas a mudanças (variações relativas) de preços deste
bem.
Podemos expressar este conceito através de uma fórmula bem simples:
Elasticidade-preço da demanda de um bem (EPd) = Variação Relativa da Quantidade
demandada do bem (ÁQ/Q) dividida pela Variação Relativa do preço do bem (AP/P)
Vamos calcular numericamente a elasticidade-preço da demanda de pão de queijo, supondo a
variação de preços já citada e três situações para a variação da quantidade demandada, como
mostrado nos gráficos e cálculos abaixo:
89
a) A quantidade demandada passa de 90 unidades para 180 unidades
'-V
Cálculo da Elasticidade
P (pf eço do pão de queijo)
EH = AQ/Q+AP/P
=180-90/90+30-60/60
Curva de demanda de pão de queijo
A
60
=90/90+(-30)/60o30
=l~K-0.5)
-ÿ
90 180 Q (quantidade de pão de queijo
por unidade de tempo) = -2
s-\
b) A quantidade demandada passa de 120 para 108 unidades
'ÿs
Cálculo da ElasticidadePA
B
1,10 Curva de Demanda de pão de queijo
EH = 108-120/12ÍH-1,10-1,00/1,00
A
i,o = 12/12(H<>,10 = -1
-ÿ
108 120 Q
o
c) A quantidade demandada passa de 120 para 114 unidades
Cálculo da Elasticidade
P
EH = 114-120/120+1,10-1,00/1,001,10 B Curva de Demanda de pão de queijo'A
= -0,05+0,1 = -0p.A1,0
114 1Z0
Como as variações de preçose quantidades, numa curva de demanda normal, são de sentidos
opostos, a elasticidade-preço da demanda é sempre negativa. Por esta razão utilizamos sempre o
valor absoluto ou módulo IEpdl no cálculo da elasticidade-preço da demanda. í
i Para quem não se lembra, o valor de um número em módulo (valor absoluto do número) é igual ao próprio número, se o
número for maior ou igual a zero; e igual ao oposto do número (o número sem o sinal de menos), se este for negativo.
90
Quando a elasticidade-preço da demanda de um bem é maior que 1 (em módulo), dizemos
que ele tem demanda elástica em relação ao preço, significando que uma pequena mudança no preço
ocasiona uma expressiva mudança na quantidade demandada. Quando a elasticidade-preço da
demanda de um bem é exatamente igual a 1 (em módulo), dizemos que ele tem elasticidade unitária
em relação ao preço, significando que quantidades e preços variam na mesma proporção. E,
finalmente, quando a elasticidade-preço da demanda de um bem é menor que 1 (em módulo),
dizemos que ele tem demanda inelástica em relação ao preço, significando que as variações de preço
não causam grandes mudanças nas quantidades demandadas. Geralmente a demanda de bens de
primeira necessidade costuma se enquadrar nesta categoria.2
Podemos verificar no primeiro exemplo numérico acima que se calculássemos a elasticidade
partindo do ponto B(96; 1,10) para o ponto A(120;l,00), ou seja, se tivéssemos uma diminuição de
preço de 1,10 para 1,00, o resultado seria numericamente diferente do que aquele que encontramos
(2,5 em vez de 2). Isto porque como as variações são discretas, o resultado do cálculo da elasticidade
partindo de um ponto A para um ponto B da curva é diferente do resultado do cálculo da elasticidade
partindo do ponto B para o ponto A. Para resolver esta questão, podemos fazer os cálculos utilizando
o ponto médio (i.e. a média das quantidades e a média dos preços) como está mostrado no Apêndice
I, que também apresenta, para aqueles que gostam de matemática, o cálculo da elasticidade no ponto
(no caso de uma curva de demanda contínua).
3.2 Fatores que influenciam a elasticidade-preço da demanda
O valor da elasticidade-preço da demanda decorre das características de cada bem em relação
às preferências do consumidor, destacando-se duas características: existência de bens substitutos e
importância do bem no orçamento do consumidor.
Disponibilidade de substitutos próximos. Intuitivamente, é fácil perceber que, em face do
aumento do preço de um bem X, caso seja possível substituí-lo por um bem Y relativamente
parecido (não é necessário que o bem seja idêntico, apenas que atenda às mesmas necessidades), é
mais provável que um consumidor deixe de consumir X diante de um aumento significativo em seu
preço, passando a consumir Y. Tomemos, por exemplo, o aumento no preço de um refrigerante de
cola. Caso os consumidores, ou alguns deles, sejam indiferentes entre consumir refrigerante de cola
ou de guaraná, por exemplo, a queda de consumo do primeiro pode ser considerável, no caso de
aumento de seu preço. Por outro lado, se houvesse um aumento no preço de todos os refrigerantes, o
2 Quando pelo contexto ficar claro que estamos falando de variações de preço, diremos apenas: demanda elástica, de
elasticidade unitária, ou inelástica.
91
que o consumidor acostumado a consumir tal bem poderia fazer? Não havendo substitutos próximos
(para o consumidor adepto de refrigerantes), pode-se dizer que a quantidade demandada de cada tipo
de refrigerante teria uma redução menor do que no caso anterior. Assim, podemos dizer que a
demanda por refrigerantes em geral tem menor elasticidade-preço do que a demanda por um dado
tipo de refrigerante.
Disso decorre o fato de que bens mais essenciais tendem a ter demanda mais inelástica, e bens
mais supérfluos tendem a ter demanda mais elástica. O grau de essencialidade do bem se relaciona,
claramente, à existência de substitutos próximos. Os produtos da chamada cesta básica — arroz,
feijão, carne, leite, etc. — não têm, para a maioria das pessoas, substitutos próximos. Um
medicamento específico para certa doença não tem substituto algum (embora possa haver
substituição entre medicamentos de marca e genéricos). Nesses exemplos, é intuitivo que aumentos
de preço tendem a ter pouco reflexo na quantidade demandada: a demanda será relativamente
inelástica. Por outro lado, produtos de baixa ou nenhuma essencialidade (como, por exemplo, capas
para telefones celulares) tendem a ter alta elasticidade-preço de demanda.
Um caso particular é os dos produtos que formam hábito ou dependência. Para grupos de
consumidores específicos — os viciados em drogas, álcool ou fumo, ou os que têm o hábito
arraigado de, por exemplo, tomar café várias vezes ao dia — não existem substitutos para esses
produtos habitualmente consumidos. São, portanto, todos eles, produtos de baixa elasticidade-preço.
Peso do bem no orçamento familiar. Bens com reduzido peso no orçamento familiar tendem a
ser mais melásticos que os demais. Isso porque um aumento em seu preço, por maior que seja, não
representará um ónus muito significativo nos gastos do consumidor. Caixas de fósforo, por exemplo,
tendem a ter demanda inelástica ao preço (a maioria das pessoas nem tem uma ideia precisa do preço
normalmente cobrado por uma caixinha de fósforos Produtos como escovas de dentes ou fio dental
caem na mesma categoria Um outro exemplo é o sal. Um saco de sal, em uma família de cinco ou
seis pessoas, dura semanas, de forma que mesmo um aumento substancial no preço não pesará muito
no orçamento. Nesse caso, acresce que é um produto praticamente sem substitutos; trata-se, assim, de
um bem de demanda tipicamente inelástica ao preço.
/*\
Horizonte de tempo. Cabe considerar também que, para alguns bens, a elasticidade-preço da
demanda varia com o passar do tempo, já que os consumidores poderão se adaptar a aumentos
persistentes de preço, seja mudando seus hábitos de consumo, seja passando a consumir substitutos
que se tomaram disponíveis. Em 1973, logo após o primeiro choque do petróleo (um súbito aumento
no preço internacional do produto, que se refletiu em grande alta no preço da gasolina), os brasileiros
92
não tinham grandes alternativas ao consumo de petróleo e de seus derivados. Ou usavam gasolina, ou
não era possível andar de carro, por exemplo. Com o passar do tempo, entretanto, foi possível
modificar alguns hábitos de consumo, com a compra de veículos com menor consumo de
combustível, maior uso de transporte público, mudança para mais perto do trabalho, etc. E surgiram
possibilidades alternativas, com a adaptação de motores para uso de álcool ou alterações em sistemas
de aquecimento industrial para uso de eletricidade. Ou seja, a curva de demanda por petróleo e
derivados mostrou-se bem mais elástica no longo prazo do que no curto prazo.
Definição do Mercado. Como já referido acima, no caso dos refrigerantes, mercados
amplamente definidos geralmente têm demanda menos elástica aos preços do que mercados
definidos de forma mais restrita. De maneira geral, a demanda por categorias gerais de produtos —
alimentos, refrigerantes, sabonetes — tem demanda menos elástica do que a demanda por um tipo
específico, ou marca específica, de alimento, refrigerante ou sabonete. A possibilidade de
substituição é obviamente maior no segundo caso: basta imaginar sua própria reação a um hipotético
aumento de preço restrito a produtos determinados: miojo, refrigerante marca X, sabonete marca Y.
3.4 Inclinação da Curva de Demanda e Elasticidade-preço
Os exemplos acima podem sugerir que a elasticidade da demanda seria indicada pela
inclinação da curva: curvas “íngremes” representariam uma demanda inelástica, e curvas de menor
inclinação uma demanda mais elástica. Mas essa relação não pode ser generalizada: como veremos
abaixo, segmentos de uma mesma reta têm elasticidades diferentes. Há dois casos extremos de
inclinação que cabe mencionar, no entanto. Umacurva de demanda vertical, como no gráfico abaixo,
significa que a quantidade demandada é a mesma, não importando o preço. A elasticidade-preço da
demanda é igual a zero (Epd = 0), ou seja, a curva de demanda é perfeitamente inelástica.
P
i \
Curva de Demanda
Epd = 0
Q*
No caso de uma curva de demanda horizontal, ao preço determinado pelo ponto onde a curva
de demanda toca o eixo vertical os consumidores comprarão qualquer quantidade. Para preços
93
maiores que esse, a quantidade demandada é zero (e a qualquer preço abaixo, a quantidade
demandada é, conceitualmente, infinita). Diz-se, nesse caso, que a curva de demanda é infmitamente
elástica. O gráfico abaixo ilustra essa situação.
P
Curva de Demanda
Epd = 00
*
Q
Elasticidade-preco ao longo de uma curva de demanda linear. Como a declividade de
uma reta é constante, poder-se-ia imaginar que a elasticidade-preço ao longo de uma curva de
demanda linear seria constante. Mas de fato isto não ocorre, como pode ser visto na tabela e no
gráfico abaixo:
QuantidadePreço Epd
10 0
Preço
9 1 OO
8 2 9 10 1
7 3 4
6
6 4 2,50 Epd=1
4
A(6,4T5 5 1,50
1 Epd<1
2 I
4 6 1,00 l
4 6 8 103 7 0,67 Quantidade
2 8 0,43
1 9 0,25
Como mostrado, a curva começa com elasticidades elevadas (Epd >1). Há um ponto
intermediário de elasticidade unitária e a parte inferior da curva é inelástica (Epd<l). A razão para
isto é que no início da curva as variações relativas das quantidades são muito superiores do que as
variações relativas dos preços, invertendo-se esta relação na parte inferior da curva.
94
3.5 Receita total e elasticidade-preço da demanda
O conhecimento da elasticidade-preço da demanda dos bens que um produtor comercializa é
fundamental para análises económicas que envolvam o cálculo da receita total da venda desses
produtos. Por receita total entende-se a multiplicação do preço pela quantidade vendida:
Receita Total = Preço de Equilíbrio x Quantidade de Equilíbrio (RT = P x Q)
Qual a relação entre a elasticidade-preço da demanda e a receita total? Vamos responder esta
questão, apresentando três situações:
Situação 1-Demanda inelástica
\.
P 4
\
Pi=2
D
¥
ca=25 Ql=30 a
No gráfico acima, aos pontos de equilíbrio Ei e E2 correspondem, respectivamente, os preços
Pi =2 e P2 =3 e as quantidades Qi =30 e Q2 =25. Para você que sabe calcular elasticidades é fácil ver
que se trata de uma demanda inelástica (no trecho da curva considerado). A receita total (preço x
quantidade transacionada) será dada pela área do retângulo OPiEiQi, no primeiro caso, e do
retângulo OP2E2Q2.no segundo.
Quando o preço aumenta de 2 para 3 reais, a quantidade demandada diminui de 30 para 25
unidades, mas a RT aumenta de 60 para 75 reais. Como a demanda é inelástica, a quantidade
demandada diminui menos proporcionalmente do que 0 aumento de preço; assim, a RT aumenta. Ou
seja: um aumento no preço leva ao aumento na receita total. Do mesmo modo, uma redução no
preço, nessa situação, leva à diminuição da receita total. P e RT variam no mesmo sentido.
95
Situação 2-Demanda elástica
Preço
r~\
E*
Pí = 6
Pi =5
Ei
a=40 a=60
Quantidade
Consideremos o exemplo do gráfico abaixo em que Pi = 5, P2 = 6 reais, Qi = 60 e Q2 - 40
unidades (já calculou a elasticidade?). Fazendo uma análise similar à apresentada acima, agora com
uma curva de demanda elástica, podemos concluir que, nessa situação, o aumento do preço implica
uma redução na receita total (300 comparado com 240). Do mesmo modo, a redução do preço leva a
um aumento na receita total. P e RT variam em sentidos inversos.
Situação 3 -Demanda de elasticidade unitária
P
/-S
E2P2=3
EI
Pl=2
>
QQ2=20 Ql=30
Por fim, em uma situação de demanda de elasticidade unitária, (PI=2,QI=30,P2=3 e Q2=20)
podemos ver, pelo gráfico ao lado, que a receita total é a mesma (60) o que nos permite dizer que,
para demandas de elasticidade unitária, a variação do preço não modifica a receita total. O cálculo da
Elasticidade, no caso, deve ser feito no ponto intermediário entre El e E2.
96
/ÿ>
A importância disso, do ponto de vista do vendedor, é óbvia: se ele tiver possibilidade de
aumentar o preço de seu produto, isso lhe trará um aumento na receita de vendas, caso a demanda
seja inelástica (pela existência de poucos substitutos no consumo, por exemplo). Do ponto de vista
do ofertante, a inelasticidade da demanda é vantajosa; ele pode se beneficiar disso, se tiver bom
conhecimento das condições da demanda. A situação ideal, para ele, será aumentar o preço até
atingir o ponto em que a elasticidade é unitária: aí a receita será, tudo o mais constante, a maior
possível.
Dois exemplos podem ilustrar esse fato. Nas eliminatórias de penúltima Copa do Mundo, o
Brasil jogou em Brasília contra o Chile, e o preço das entradas foi muito alto; a arquibancada
mais barata ficava por cerca de 100 reais, a preços de hoje, e as cadeiras numeradas custavam
cinco vezes mais. Houve protestos na imprensa, e prognósticos de que o estádio ficaria vazio. Ao
contrário, o estádio lotou, e houve quem não conseguisse entrar. Os organizadores do jogo estavam
certos em sua avaliação da elasticidade da demanda por entradas para a partida: muita gente estava
disposta a pagar caro pela oportunidade de ver jogar a Seleção.
Situação diferente ocorreu numa apresentação de Chico Buarque na cidade, há alguns anos
atrás. Os preços foram também excepcionalmente altos; vários estudantes protestaram, com cartazes,
na entrada do Teatro Nacional. Resultou que o Teatro ficou parcialmente vazio, coisa rara para um
artista tão popular. Tudo indica que os promotores do evento fizeram, nesse caso, um cálculo errado,
quanto à elasticidade da demanda por entradas para o espetáculo, e provavelmente lucraram menos
do que poderiam ter feito com preços menores (além de impor constrangimento ao cantor, que não
tinha ingerência na fixação dos preços.)
3.6 Elasticidade-preço cruzada da demanda
A demanda de um bem é influenciada pelo preço de outros bens. A elasticidade-preço
cruzada da demanda diz respeito ao efeito da variação do preço de um bem X sobre a quantidade
demandada de um bem Y, quando há uma relação entre o consumo desses bens.
Sendo QY e Px a quantidade demandada de Y e o preço de X, respectivamente, teremos que a
elasticidade-preço cruzada da demanda de Y em relação a X será:
Epcd = AQY/QY + APx/Px
Há duas possibilidades básicas de inter-relação no consumo de dois bens:
97
Bens complementares - são bens comumente usados em conjunto. Assim, o aumento no
preço do bem X, acarretando redução na quantidade demandada desse bem, trará também redução na
demanda pelo bem Y, cujo consumo é associado ao do bem X. Haverá um deslocamento para a
esquerda na curva de demanda por Y. Simetricamente, uma redução no preço de X provocará
aumento na quantidade demandada desse bem e aumento na demanda de Y (deslocamento para a
direita da curva de demanda de Y).
Exemplos de bens complementares: impressoras a jato de tinta e cartuchos de impressão;
sorvete e calda de chocolate; videogames e jogos; entradas de cinema e pipoca. Como as relações se
dão em sentidos opostos (o aumento do preço de um leva à redução no consumo do outro, ou vice-
versa), o valor da elasticidade-preço cruzada da demanda para dois bens complementares será
sempre negativo.
Bens substitutos - são bens que, pela similaridade no uso e nas finalidades, podem ser
substituídos um pelo outro, em função de alterações no preço de um deles. Nesse caso, o aumento do
preço do bem X leva à redução na quantidade demandada por esse bem e ao aumento da demanda
pelo bem Y (deslocamento para a direita da curva de demanda). E uma redução do preço de X traz
um aumento na quantidade demandada desse bem e uma redução na demanda por Y (deslocamento
para a esquerda de sua curva de demanda).
Ingressos de cinema e aluguel de filmes, margarina e manteiga, sorvete efrozen yogurt, por
exemplo, podem ser considerados bens substitutos. Como as relações ocorrem no mesmo sentido
(aumentodo preço de um leva a aumento do consumo do outro, ou vice-versa), o valor da
elasticidade-preço cruzada da demanda de dois bens substitutos é sempre positivo.
No caso de bens cuja demanda não tem inter-relação, a elasticidade-preço cruzada da
demanda é zero.
4. Elasticidade-renda da demanda
Supondo que a renda de um grupo de consumidores aumente em 50%, em quanto se espera
que varie o consumo de vinhos? E de passagens de ônibus? E de sal? A mensuração dessa variação é
feita pela elasticidade-renda da demanda, que indica a sensibilidade da quantidade demandada de
determinado bem a variações na renda de seus consumidores.
A elasticidade-renda da demanda é definida como:
Erd = AQ/Q -*ÿ AR/R
98
No qual R é a renda e Q a quantidade demandada do bem considerado.
Para a grande maioria dos bens, o consumo aumenta (diminui) quando aumenta (diminui) a
renda dos consumidores. Estes são os bens chamados normais (ou superiores). Como consumo e
renda variam na mesma direção, a elasticidade-renda desses bens é positiva.
Mas há os bens ditos inferiores, para os quais um aumento da renda leva a uma diminuição de
seu consumo (e uma diminuição da renda leva a um aumento de seu consumo). Como renda e
consumo variam em direções opostas, a elasticidade-renda destes bens é negativa.
Os bens inferiores têm como característica o fato de terem substitutos que são preferíveis (por
serem de melhor qualidade, por exemplo) mas, por serem mais caros, estão fora do alcance de
consumidores de renda mais baixa. Nesse caso, quando sobe a renda dos consumidores, eles
migrarão para o produto mais caro, e deixarão de consumir os bens considerados inferiores (ou
diminuirão a quantidade consumida destes).
Um exemplo é a carne de segunda (“músculo”). Uma família de baixa renda que tenha
aumento salarial poderá passar a consumir cortes mais macios e saborosos, mas mais caros,
eliminando ou reduzindo as compras da carne mais barata. Da mesma forma, consumidores que, com
aumento de renda, possam comprar um carro, diminuirão seus gastos de passagens de ônibus.
Bens cuja elasticidade-renda da demanda é igual a zero são considerados bens de consumo
saciado. Uma vez que o consumidor já consome o bem em quantidade que considera suficiente, não
importa, no que toca ao consumo desse bem, que sua renda aumente ou diminua.
Adotam-se as seguintes definições, analogamente ao caso anterior:
Se Erd > 1, a demanda é elástica em relação à renda;
Se Erd < 1, a demanda é inelástica em relação à renda;
Se Erd < 0, trata-se de um bem inferior, como vimos.
Produtos alimentícios têm tipicamente, como um todo, baixa elasticidade-renda; quando a
renda aumenta, as pessoas em geral passam a dedicar uma proporção menor de seus gastos com
alimentação, e gastar relativamente mais em outro itens. Entre os alimentos, os de origem vegetal,
como farinha de mandioca, mostram em geral menor elasticidade-renda do que os de origem animal,
como carne e leite. Por outro lado, gastos com turismo e com serviços de saúde particulares
costumam mostrar alta elasticidade-renda.
99
5. Exceções à "lei da demanda"
Quando você estudou princípios de Microeconomia, aprendeu que, como regra geral, os bens
seguem a chamada “lei da demanda” (ou lei da procura), segundo a qual a quantidade demandada
dos bens diminui com o aumento de seu preço, o que implica uma curva de demanda negativamente
inclinada. Essa é a regra geral, que se verifica ser verdadeira na imensa maioria dos casos. Há,
entretanto, algumas exceções à lei da demanda que costumam ser mencionadas.
A primeira delas é a dos chamados bens de Giffen. O rótulo se refere a um economista
escocês desse nome, que observou, na Inglaterra do século XIX, que um aumento no preço de um
artigo básico de alimentação, como o pão ou a batata, podia onerar de tal forma o orçamento de
pessoas de renda muito baixa, a ponto de forçar a redução no consumo de produtos alimentares
superiores, como a carne, e fazer aumentar o consumo do artigo agora mais caro. Vê-se que os bens
de Giffen têm duas características: são bens inferiores (os consumidores prefeririam consumir menos
batata e mais carne, se tivessem renda suficiente) e, além disso, seu consumo é uma parcela
importante do orçamento dos consumidores considerados (de tal forma que um aumento em seu
preço representa, de fato, uma redução sensível na renda disponível do consumidor). Assim, essa
redução de renda (causada pelo aumento no preço da batata) levaria a um aumento no consumo da
batata, um bem inferior. Teríamos uma curva de demanda com inclinação inversa da usual:
ascendente da esquerda para a direita. Uma exceção à lei da demanda.
Podemos pensar num exemplo mais próximo de nós. Suponhamos uma pessoa que mora em
Planaltina de Goiás e trabalha no Plano Piloto, ganhando salário mínimo (R$678,00), e gastando
R$10,00 com as duas viagens diárias de ônibus. Considerando 23 dias úteis por mês, em média, essa
pessoa teria cerca de uma terça parte de sua renda comprometida com transporte. Suponhamos agora
que um prefeito populista, em véspera de eleição, decida subsidiar o preço das passagens de ônibus
para Brasília, que passaria de R$5,00 a R$1,00 apenas. Feitas as contas, veremos que com essa
economia nosso indivíduo teria quase R$200,00 a mais, por mês, para gastar em outras coisas. Sendo
então razoável supor que ele diminuísse seu consumo de passagens de ônibus, usando em alguns dias
do mês um meio de transporte mais cômodo e rápido — e mais caro — como uma van. Redução de
preço causando redução de consumo: o oposto da lei da demanda. A passagem de ônibus, nesse caso,
é um bem de Giffen.
Outro exemplo é associado ao chamado consumo ostentatório: o consumidor pretende,
exibindo seu consumo de bens de alto preço — vinhos caros, obras de arte famosas, joias,
automóveis de luxo — buscar obter status e prestígio social. Nesse caso, uma redução de preço
100
poderia fazer com que tal consumidor se desinteressasse pela compra desses bens, agora acessíveis a
muitas pessoas e, portanto, pouco adequados como indicadores de ascensão social. Essa exceção à lei
da demanda costuma ser chamada de “efeito Veblen”, por referência ao sociólogo americano desse
nome (1857-1929), precursor da Economia Institucional, que analisou tais formas de comportamento
exibicionista.
Mas mesmo quem não busca alcançar status por seus padrões de consumo pode violar a lei da
demanda, na medida em que associe preço a qualidade. Suponhamos que você vai comprar um
relógio de pulso chinês e lhe ofereçam dois modelos, um custando R$20,00 e outro R$50,00. É
possível que você julgue que o mais barato seja muito ordinário, e prefira o mais caro — embora não
tenha qualquer outra indicação de que este seja um produto de melhor qualidade.
Pode-se mencionar ainda outro exemplo de aumento de demanda associado a um aumento de
preço. Em bolsas de valores, é comum que a subida no preço de uma ação induza investidores a
comprá-la, e uma queda no preço afaste compradores desse título. Mas nesse caso não se trata
propriamente de uma exceção à lei da demanda: é que os investidores tomam o aumento de cotação
como sinal de que o papel pode subir ainda mais. A ação estaria hoje mais cara do que ontem, mas
mais barata do que amanhã. Nessa perspectiva, uma alta na cotação seria de fato interpretada como
uma baixa, em relação ao futuro (e o inverso, no caso de uma queda na cotação).
6. Elasticidade-preço da oferta
A elasticidade-preço da oferta mensura a sensibilidade das quantidades ofertadas a variações
no preço dos produtos comercializados — ou, dito de outra maneira, a capacidade de resposta da
oferta diante de fatores que afetem o mercado do produto (um aumento de demanda, por exemplo).
Quando estudamos a oferta, trabalhamos, no caso mais geral, com custos crescentes e,
portanto, curvas de oferta positivamente inclinadas. Assim, o produtor estará disposto a oferecer uma
quantidade maior do bem que produz à medida que os preços sobem (ou, numa outra perspectiva:ele
só produzirá mais caso possa vender a um preço mais alto, pois seus custos unitários de produção são
crescentes). Para menores quantidades, ele pode vender a um preço menor.
A elasticidade-preço da oferta Epo é definida, de forma análoga aos casos anteriores, como a
variação percentual da quantidade ofertada dividida pela variação percentual dos preços:
101
Ep0 = AQQ/QO + AP/P
onde P é o preço do produto e Q0 a quantidade ofertada.
A elasticidade-preço da oferta será sempre um número positivo (ou zero); não faz sentido
económico a possibilidade de redução na quantidade ofertada, com um aumento no preço.
Dizemos que um bem tem:
Oferta elástica, quando sua elasticidade-preço é maior que 1 (Epo >1)
Oferta inelástica quando sua elasticidade-preço é menor que 1 (Epo < 1) e
Oferta de elasticidade unitária quando a elasticidade-preço é igual a 1 (Epo= 1).
r\
No caso de curvas de oferta retilíneas, se a curva cruza o eixo vertical ,trata-se de uma curva
de oferta elástica:o aumento percentual na quantidade ofertada será maior que o aumento percentual
no preço. E se a curva cruza o eixo horizontal, o oposto é verdade: a curva de oferta é inelástica. Nos
dois casos o valor da elasticidade varia ao longo das curvas. Já se a curva passa pela origem, a
elasticidade da oferta é igual a 1 (unitária). Os gráficos abaixo mostram dois casos extremos: uma
oferta perfeitamente inelástica (como a oferta de curto prazo de um produto agrícola após a safra; ou
a oferta de entradas para um determinado espetáculo) e oferta infinitamente elástica (como a de uma
firma que pudesse oferecer seu produto a custo constante, sem limite na capacidade de produção):
Curva de oferta
perfeita mente
inelástica: Epo=0
Curva de oferta
perfeita mente
elástica: Epo= 00
P P
Q QQo
No caso em que a oferta é representada por uma curva, esta pode passar de elástica a
inelástica como ilustrado na tabela e gráfico abaixo. É o caso de produtores, especialmente na
indústria, cuja possibilidade de resposta a aumentos de preços vai diminuindo, à medida que a
capacidade de produção de suas instalações vai sendo ocupada. Quando a plena ocupação é
atingida, aumentos de produção não são mais possíveis, no curto prazo, e a curva se torna
vertical. A tabela e o gráfico ilustram uma situação deste tipo, onde a parte inferior da curva de
oferta tem elasticidade menor que 1, enquanto na porção superior da curva a elasticidade é maior que
1.
102
Preço Quantidade Ofertada GráficoEpo
2 10 p
Epo<l
4 30 2
8 80 1,67 16
16 100 0,25 8
Epo>l
432 110 0,10
2
10 30 so íoo a
6.1 Principais fatores relacionados à elasticidade-preço da oferta
No curto prazo, a elasticidade da oferta de um produtor vai depender da existência ou não de
capacidade ociosa em suas instalações produtivas. Se estas estiverem operando a plena capacidade,
não haverá possibilidade de aumento de produção: a curva de oferta será uma reta vertical e a
elasticidade-preço será zero. No caso em que o aumento de produção é possível, mas a um custo
elevado (pela abertura de um turno de produção noturno, por exemplo), a curva de oferta será muito
“íngreme”, mostrando baixa elasticidade-preço.
A disponibilidade de matérias-primas também influi na elasticidade-preço da oferta. Se não
for possível aumentar as compras de algum insumo essencial, um aumento de produção será, claro,
impossível; e se a oferta de matérias-primas tiver, ela própria, baixa elasticidade-preço, isso se
refletirá no custo de um aumento de produção e, portanto, na elasticidade de oferta do produto
considerado. O mesmo pode ser dito com relação à oferta de mão-de-obra, especialmente de mão-de-
obra especializada: dependendo da situação no mercado de trabalho, pode ser difícil, ou mesmo
impossível, contratar mais trabalhadores, num prazo curto.
Por outro lado, a disponibilidade de estoques do produto aumenta, evidentemente, a
flexibilidade de resposta do produtor a um aumento de preços, tomando mais alta a elasticidade da
oferta.
Para certos bens não reproduzíveis, como quadros de Monet ou de Picasso, a elasticidade-
preço da oferta será zero: é impossível aumentar a quantidade ofertada.
No longo prazo, é possível o aumento da capacidade produtiva e a entrada de novos
produtores (lembre-se que a definição de longo prazo, em Economia, é, justamente, um período
suficientemente longo para que instalações produtivas possam ser expandidas e novas firmas possam
103
entrar no mercado). Assim, a oferta será, tipicamente, mais elástica no longo prazo. A elasticidade
será tanto maior quanto mais fácil seja a entrada (e saída) de novos produtores.
7. Elasticidades da demanda e sua importância: dois exemplos
Vamos tratar nesta seção de dois episódios marcantes, na economia mundial do século
passado, que podemos interpretar melhor usando nossos conhecimentos das elasticidades da
demanda.
7.1 O “choque do petróleo”
Vimos acima que ocorreu em 1973 um extraordinário aumento nos preços internacionais do
petróleo — o chamado “choque do petróleo”. Para isso contribuíram dois fatores: a inelasticidade da
demanda internacional por esse produto, no curto prazo, e o fato de que as circunstâncias do
momento favoreceram a fixação de preços por parte dos ofertantes.
O petróleo representa importante parcela da matriz energética mundial — como fonte de
combustível para veículos (o uso mais importante em países como os Estados Unidos, o maior
consumidor), de geração de eletricidade, aquecimento industrial, combustível doméstico, etc. E é um
produto de substituição difícil ou impossível, no curto prazo. É, portanto, um bem de demanda
inelástica.
A possibilidade de aumento de preços foi dada por razões extraeconômicas: a guerra árabe-
israelense de 1973 deu o impulso para que a Organização dos Países Produtores de Petróleo, fundada
em 1960, passasse então, sob influência dos grandes produtores árabes, a agir como um verdadeiro
cartel — um acordo de produtores visando fixar preços e restringir a concorrência. O que tem feito
desde então, apesar de ocasionais desacordos entre seus membros.
A OPEP age como agiria um monopolista, restringindo a quantidade ofertada de tal forma a
maximizar a receita. O gráfico abaixo ilustra esse propósito: a redução da produção de Qi para Q2
provoca um crescimento da receita de vendas, que passa do valor representado pelo retângulo
OQ1E1P1 para um valor superior, dado por OQ2E2P2, dada a inelasticidade-preço da demanda. Em
princípio, como vimos, numa situação como essa o monopolista buscaria aumentar 0 preço até que a
demanda atingisse elasticidade unitária.
Como se sabe, 0 choque do petróleo, com um aumento de mais de 400% no preço do produto,
em curto espaço de tempo, provocou efeitos profundos na economia mundial, inclusive a brasileira:
queda no crescimento económico, inflação, grande aumento no endividamento externo de muitos
países, e enorme transferências de renda de consumidores para produtores de petróleo. Esses efeitos
104
foram em parte minorados por modificações posteriores na matriz energética, possibilitadas por
mudanças tecnológicas e pela expansão de fontes alternativas de energia, fazendo reduzir a
inelasticidade da demanda por petróleo. A política de estímulo à produção de álcool, no Brasil, com
a criação do Programa Nacional do Álcool-Proálcool, em 1975, foi um esforço nessa direção.
E2P2
Pa
D
Qa CU Q
7.2 Café: a política de “valorização” no Brasil.
O café tem, também, demanda inelástica, mesmo por ser um produto que cria hábito de
consumo. O Brasil tinha, no início do século passado, posição dominante no mercado internacional
de café; poderia, assim, em princípio, como quase-monopolista, adotar uma política similar à seguida
pela OPEP, restringindo a oferta para fazer subir o preço, buscando a maximização da receita.
Ocorre, no entanto, que, diferentemente do caso da OPEP, onde os governos dos países
membros controlam efetivamente a produção de petróleo em seus países, os cafeicultores são muitos,
emvárias áreas do País, o que dificulta a formação de um cartel. Sucede aqui o problema do
“carona” (que estudamos em Microeconomia como uma falha de mercado): para o conjunto dos
produtores é vantajoso que haja uma restrição da produção, mas não para cada produtor individual,
para quem a melhor situação é aquela em que todos os demais reduzem a produção menos ele
próprio — que pegaria carona nos esforços dos outros, vendendo toda sua produção a um preço mais
alto. Generalizando-se esse comportamento — que é, embora nada cooperativo, um comportamento
racional, do ponto de vista da maximização do lucro — toma-se inviável o objetivo de controlar a
produção.
Os cafeicultores pressionaram então pela intervenção governamental, num período de baixa
no preço internacional do produto, na primeira década do século XX. Essa intervenção foi acordada
105
em 1906: parte da safra seria comprada e estocada pelo Governo. O chamado programa de
valorização do café passou por várias fases e formatos nas décadas seguintes, mas essencialmente o
resultado foi o representado no gráfico acima: com a redução da quantidade ofertada, o preço foi
mantido em níveis lucrativos para os cafeicultores.
O objetivo do programa foi atingido; mas há uma diferença fundamental entre os mercados de
petróleo e de café. A demanda por petróleo tem alta elasticidade-renda, de tal forma que, com o
crescimento da renda mundial, o consumo tem aumentado aceleradamente. No período recente, o
forte crescimento da demanda de petróleo pelos países asiáticos, especialmente a China, tem
pressionado o mercado; os preços atingiram, nos últimos anos, o maior nível já registrado, em termos
reais, influenciados também pela redução nas exportações de alguns grandes produtores, como o Irã
e a Líbia. Nesse contexto, há muito espaço para uma política de intervenção nos preços pelo controle
da oferta, que segue sendo praticada pela OPEP.
Em contraste, a demanda por café é pouco elástica a variações de renda. Dessa forma,
enquanto a produção de café aumentava, após 1906, sob o estímulo dos preços altos (tanto no Brasil
como em outros países), a demanda não crescia no mesmo ritmo. Na década de 1920, os estoques do
governo aumentaram muito, o que contribuiu para uma queda drástica do preço do produto, após a
crise internacional iniciada em 1929. O acúmulo de estoques culminou com o famoso episódio da
queima de café pelo governo: nos anos trinta, cerca de 80 milhões de sacas foram assim destruídas.
Uma medida aparentemente irracional, mas que fazia sentido nas condições da época.
Assim, se do lado da elasticidade-preço da demanda os mercados de petróleo e café são
similares, do ponto de vista da elasticidade-renda são inteiramente distintos. A política de
valorização do café, como adotada no início do século passado, foi bem-sucedida no curto prazo mas
trouxe problemas sérios de excesso de oferta, com o passar do tempo.
8. Tributação: impostos indiretos e elasticidades
Por meio dos impostos o governo arrecada os fundos necessários ao financiamento de seus
gastos. Há dois tipos básicos de impostos: impostos diretos, que incidem diretamente sobre a renda
ou património das pessoas e empresas, sendo o mais importante o Imposto de Renda; e impostos
indiretos, que incidem sobre transações, como o Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e
Serviços (ICMS) ou o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), e recaem indiretamente sobre
pessoas ou firmas.
106
Os impostos indiretos, que usualmente são cobrados ad valorem (como uma proporção do
valor do bem ou serviço transacionado), em geral alteram o valor do preço pago pelos compradores e
do preço recebido pelos vendedores, assim como a quantidade transacionada. As alterações nos
preços pagos e recebidos — que afetam a incidência do imposto, ou seja, sobre quem recairá o ônus
de sua cobrança — dependem das elasticidades-preço da demanda e da oferta, como se verá a seguir.
8.1 Imposto cobrado dos produtores
Vamos admitir que o imposto sobre transações é cobrado dos vendedores (como é o caso no
ICMS, principal tributo brasileiro). Partimos de um mercado em equilíbrio entre uma demanda Di e
uma oferta Oi que determinam o preço e quantidade de equilíbrio Pi e Qi (ver o gráfico abaixo). O
lançamento do imposto pode ser visto como um custo adicional de produção. Ou seja, a curva de
oferta se desloca para cima numa distância equivalente ao imposto (R$1,00 por unidade vamos
supor), diminuindo a quantidade ofertada (de Qi para Q2) e aumentando 0 preço para P3.n0 novo
equilíbrio.3 A curva de demanda não muda com a introdução do imposto cobrado dos vendedores; as
condições de demanda permanecem as mesmas.
Para os produtores, o que interessa é o preço efetivo que recebem pelo seu produto; seu
comportamento continua representado pela curva de oferta Oi. Ou seja, eles vão receber dos
consumidores o preço P3 — o novo preço de equilíbrio — mas, como têm que entregar R$1,00 ao
governo, vão produzir no ponto da curva Oi correspondente a P3 menos R$1,00. Essa diferença dá o
preço P2, que é o que os produtores recebem efetivamente.
Resulta que os consumidores vão, após o imposto, pagar um preço P3 maior do que o preço
anterior Pi, enquanto os produtores receberão um preço P? menor do que Pi. Ambos estarão numa
situação pior do que antes do lançamento do imposto. Vemos que o imposto no final é pago parte
pelos compradores e parte pelos produtores. Numa situação de concorrência perfeita, como estamos
supondo, os consumidores, ao pagarem mais do que antes em função do novo equilíbrio, arcam com
parte do imposto, embora ele seja cobrado dos produtores.
3 Embora os impostos indiretos sejam em geral lançados como um acréscimo proporcional ao preço{ad valorem), vamos
supor, para simplificar a representação gráfica, que o imposto seja uma quantia fixa a ser acrescentada ao preço cobrado
pelo produtor. Isso não modifica as conclusões da análise quanto às elasticidades.
107
p
* 02
Ol
P3
PI
I
P2 :
D
>
Q2 Q1 Q
Uma questão interessante é saber quem paga mais: os consumidores ou os produtores? Para
responder a esta questão entram em cena, de novo, os conceitos de elasticidade da demanda e da
oferta.
Podemos contemplar duas situações: uma em que a demanda é muito elástica e a oferta é
inelástica e outra em que a demanda é inelástica e a oferta muito elástica, conforme ilustrado nos
gráficos abaixo:
a) Demanda Elástica e Oferta Inelástica
/ÿ>
b) Demanda Inelástica e Oferta Elástica
0202
P
P01r>
Consumidor 01
P3
P3
Produtor 1PI
PI Consumidor:
P2
ProdutorD
oP2
í ! p2 dl Q
Nas duas sftíiâÿões parte-sfe de um equilíbrio inicial sem o imposto e verifica-se a situação
final, após a introdução do imposto. No primeiro caso (demanda muito elástica e oferta inelástica), os
produtores não reagem muito a variações nos preços (curva de oferta íngreme, mais próxima da
vertical), acontecendo o contrário com os consumidores que reagem muito a variações de preços
(curva de demanda menos inclinada). Como ilustrado no gráfico, o preço pago pelos consumidores
não muda muito, enquanto o preço recebido pelos produtores cai substancialmente. Neste caso, os
produtores pagam a maior parte do imposto.
No segundo caso (demanda inelástica e oferta elástica) os consumidores reagem pouco a
variações de preços (curva de demanda íngreme), enquanto os produtores reagem muito a estas
variações (curva de oferta menos íngreme, mais próxima da horizontal). Vemos no gráfico que o
108
r\
preço pago pelos consumidores sobe substancialmente, enquanto o preço recebido pelos produtores
muda pouco. Os consumidores pagam a maior parte do imposto.
Poderíamos ainda imaginar duas outras situações, uma em que tanto a oferta quanto a
demanda são elásticas em relação a preço, outra em que ambas as curvas são inelásticas. Veríamos
que, em qualquer caso, o lado menos elástico (ou mais inelástico) seria o mais onerado com o
imposto. Você poderá verificar isto traçando seus próprios gráficos.
Resumindo:Demanda Quem Paga Mais
Produtores
Consumidores
Oferta
Elástica Inelástica
Inelástica Elástica
Elástica Elástica Lado de < elasticidade
Inelástico Inelástica Lado de > inelasticidade
Ou seja, na repartição do ônus do imposto, quem tem mais elasticidade se defende melhor.
Em casos extremos, o ônus pode recair sobre um dos lados, apenas: se os consumidores não reduzem
em nada seu consumo, com o lançamento do imposto (demanda perfeitamente inelástica), pagarão
todo o imposto; ao contrário, no caso de uma demanda perfeitamente elástica, só os vendedores
pagarão.
8.2 Imposto cobrado dos consumidores
Suponhamos agora que o imposto seja cobrado dos consumidores. Na situação anterior ao
lançamento do imposto, o equilíbrio de mercado é dado pela interseção entre a demanda Di e a oferta
Oi,que determinam o preço e quantidade de equilíbrio Pi e Qi (ver gráfico abaixo). Com o imposto, a
curva de oferta não muda, pois as condições de oferta não se alteram. Já a curva de demanda sofre
um deslocamento para baixo igual ao valor do imposto: para uma quantidade Qi o consumidor está
disposto a pagar Pi; mas como o governo fica agora com R$1, a importância relevante para o
mercado passa a ser Pi- 1; e assim com todos os pontos da curva de demanda. Assim, a nova curva
de demanda é D2, e na nova posição de equilíbrio o preço e quantidade são P2 e Q2.
Os vendedores recebem o novo preço de equilíbrio P2, inferior ao que recebiam antes do
imposto; e os compradores pagam P2 mais o imposto, ou seja, P3, preço mais alto do que pagavam
antes. A situação é inteiramente simétrica à do caso anterior, em que o imposto é cobrado dos
vendedores: 0 ônus do imposto é repartido entre compradores e vendedores, e as mesmas
observações feitas antes quanto às elasticidades da procura e da oferta, e seu efeito sobre a repartição
desse ônus, poderiam ser repetidas aqui.
109
p o------P3PIP2
r
I D1
D2
Q2Q1 Q
8.3 Elasticidade e montante arrecadado do imposto
Saber a elasticidade-preço da demanda por determinado bem pode ser bastante útil para
gestores públicos que lidam com tributação. O lançamento de impostos indiretos leva, em geral, ao
aumento dos preços para o consumidor, como vimos; e o aumento de preços provoca redução na
quantidade demandada. Essa redução vai ser tanto menor quanto mais inelástica for a demanda pelo
bem. Segue-se, então, que é preferível, do ponto de vista da arrecadação, lançar impostos sobre a
venda de bens de demanda inelástica: nesse caso, a alta no preço derivada do imposto não diminuirá
muito a quantidade demandada.
Essa questão é ilustrada no gráfico abaixo, onde se traçam curvas de demanda para dois bens,
uma inelástica a preços (Di), e outra elástica (DE). O lançamento de um imposto faz a curva de oferta
(que se supõe, simplificadamente, ser idêntica para os dois bens) deslocar-se de Oi para O2. O
montante arrecadado do imposto, no caso do bem de procura inelástica, será dado pela área do
retângulo ABCD, e no caso do bem de procura elástica pela área de EFGH. Fica clara a maior
vantagem do imposto sobre 0 bem de menor elasticidade, na perspectiva da autoridade tributária.
Não é por outra razão que bebidas alcoólicas e cigarros, bens cuja demanda é, em geral,
altamente inelástica, são pesadamente taxados, na generalidade dos países.
o
110
p
02
0i
A
B
0 DE
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>
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8.4 A Introdução de um Imposto sobre os salários
A introdução de um imposto sobre a folha de pagamento (sobre o salário, que é o preço da
mão de obra) vai afetar a demanda de trabalho, deslocando essa curva. Ou seja, a anáhse é
semelhante à que fizemos quando da introdução de um imposto sobre os compradores (no caso,
compradores de mão de obra). Os compradores de mão-de-obra, após a introdução do imposto, vão
demandar a mesma quantidade de mão de obra que demandariam ao longo de sua antiga curva de
demanda, ao novo preço (salário). Isto significa que a quantidade de mão-de-obra demandada é
menor que antes. A situação é ilustrada no gráfico abaixo, onde se vê a diferença entre o salário pago
ao trabalhador (que é menor que o salário de equilíbrio de antes) e o salário pago pelo produtor
(salário do trabalhador mais imposto). Como antes, o imposto será repartido entre o produtor e o
trabalhador. Além disso, os trabalhadores pagam outro preço, que é o menor nível de emprego. Mais
uma vez, que lado paga a maior parte do imposto vai depender das elasticidades da oferta e da
demanda de mão de obra.
Salário
O
Salário pago pelo produtor *~jr
si
Salário recebido pelo trabalhador
M \ 01
! D2
El E2 Emprego
111
I
9. Políticas de preços máximos e preços mínimos
Vamos falar agora de outra forma de intervenção do governo no mercado: a fixação de preços
máximos ou mínimos. Esse tipo de intervenção parte do pressuposto de que, em certos mercados, o
preço de equilíbrio determinado pelo livre jogo da oferta e demanda é mais alto ou mais baixo do que
seria desejável, do ponto de vista do interesse social. Se o preço de equilíbrio em concorrência é
considerado baixo demais, o governo estabelece um preço mínimo; e se o preço de mercado é visto
como muito alto, fixa-se um preço máximo. Essas ações não só alteram os preços a que são feitas as
transações como trazem outras consequências, que em parte dependem das elasticidades da oferta e
da demanda.
9.1 Preços agrícolas e estoques reguladores
Os preços de produtos agrícolas costumam ser sujeitos a oscilações relativamente grandes,
não só em razão de mudanças climáticas como também do ciclo de safras e entressafras. No caso de
uma safra muito abundante, o aumento de oferta tende a puxar os preços para baixo; isso pode trazer
problemas sérios para alguns produtores, especialmente os de menor porte, com a queda inesperada
do valor de mercado de sua produção. Os prejuízos incorridos por tais produtores podem fazer com
que deixem de plantar, no ano seguinte, causando redução de oferta e eventualmente prejudicando o
abastecimento de gêneros alimentícios no país, na safra vindoura.
Para evitar isso, é comum que se adote uma política de preços mínimos, em alguns mercados
agrícolas. O gráfico abaixo ilustra tal situação; podemos supor que se trata do mercado de feijão, por
exemplo. Sem intervenção, o preço de equilíbrio do feijão seria Pe, por hipótese um preço
excessivamente baixo para muitos produtores. O governo fica então um preço mais alto (Pmin), ao
qual todos os produtores podem vender suas safras. A esse novo preço, a quantidade ofertada será
maior do que ao preço de equilíbrio anterior (Qo, em lugar de Qe), e a quantidade demandada será
menor (Qd). Quer dizer: haverá agora um desequilíbrio entre as quantidades ofertada e demandada,
um excesso de oferta (representado pelo segmento Qd Qo, no gráfico). É fácil perceber que o
volume desse excesso de oferta será influenciado pela elasticidade das curvas de oferta e demanda.
Se a curva de oferta é muito elástica, por exemplo, isso trará um grande excesso de oferta, tudo o
mais constante
/"S
O excesso de oferta é normalmente absorvido pelo governo, que garante assim a existência de
uma demanda suficiente para absorver toda a quantidade produzida de feijão, ao preço mínimo
estabelecido. Tal excesso é retirado do mercado e estocado pelo governo.
112
p
o
Pmín
EEiPePi
D
QQd Qe Qo
Na ocasião da entressafra, pode ocorrer uma situação oposta: a redução da oferta empurra
agora os preços para cima, e nesse caso os consumidores é que serão prejudicados. Em tais
circunstâncias, o govemo usualmente intervém para baixar o preço, não mais como comprador, mas
como vendedor do produto em questão, lançando mão do estoque antes acumulado. Como ilustrado
no gráfico abaixo, a entrada no mercado desse estoque corresponde a um deslocamento para a direita
da curva de oferta. Dessa forma, o preço de equilíbrio será puxado para baixo (de PI para P2), o que
atende ao objetivo de proteger os consumidores.
p
Ol
02
PI
P2
D
i
Q
Q1 02
O estoque do produto formado pelo govemotem, assim, um caráter regulador do mercado,
evitando preços muito baixos na safra e muito altos na entressafra. Note que, na ausência desse tipo
de intervenção, poderia ocorrer a entrada no mercado de atravessadores, os quais, com acesso a
crédito, comprariam barato na safra e venderiam caro na entressafra, acumulando grandes lucros, em
detrimento da coletividade de produtores e de consumidores. Evitar isso é um dos propósitos da
política de estoques reguladores.
113
9.2 Preços máximos e tabelamento
Em algumas situações, especialmente quando há restrição de oferta, o governo pode fixar um
limite superior para certos preços. É o que costuma acontecer, por exemplo, em época de guerra: a
redução na oferta de muitos produtos, pela queda na produção e no comércio exterior, provocaria
aumento substancial em seus preços, se o equilíbrio se fizesse pela concorrência, no mercado.
Visando proteger os consumidores de menor poder aquisitivo, é usual que se faça um tabelamento de
preços, principalmente no caso de artigos de consumo mais amplo. O preço fixado, mais baixo que o
de equilíbrio de concorrência, faz com que a quantidade demandada Qd seja maior do que a ofertada
Qo: há um excesso de demanda (ver o gráfico abaixo).
Nesse caso, como não há mercadoria para todos, quem chega mais cedo consegue comprar,
mas muitos vão ficar frustrados. Uma alternativa é o racionamento, segundo algum critério. Uma
forma de racionamento é a fixação de quotas para cada consumidor, ou cada família, o que pode ser
feito com distribuição de cupons ou cadernetas de compra. Em países como Cuba adota-se esse
sistema, para produtos sem oferta suficiente para suprir toda a demanda da população.
/~\
/•“V
/•>
p
o
Pe
Pmáx.
-U>
Q
Qo Qe Qd
O congelamento de preços, às vezes adotado para combater a inflação (como no Brasil em
1986, no Plano Cruzado), é uma medida de tal tipo. Nesse caso, se o preço de determinada
mercadoria fica muito abaixo do preço de equilíbrio, haverá grande excesso de demanda: um vasto
número de consumidores frustrados que estariam dispostos a pagar mais do que o preço congelado.
Essa situação costuma incentivar o desenvolvimento de um mercado paralelo, com transações acima
daquele preço. Foi o que ocorreu com a carne, no Plano Cruzado: era comum que açougues
atendessem fregueses conhecidos pela porta dos fundos, praticando preços acima dos fixados.
Pode-se considerar que liquidações são também uma forma de fixação de preços máximos:
com o propósito de liquidar estoques, negociantes remarcam os preços para baixo, buscando atrair
mais consumidores. É o caso de lojas de roupas que liquidam agasalhos no final do inverno, abrindo
114
espaço para as coleções de primavera e verão. Nesse caso toda a demanda é atendida, com a venda
de mercadorias do estoque (o segmento Qo Qd, no gráfico), enquanto este durar.
9.3 Salário mínimo
Outra forma comum de fixação de preços ocorre no mercado de trabalho, especialmente no
mercado de trabalho não qualificado, com estabelecimento pelo governo de um salário mínimo.
prática adotada na generalidade dos países. O objetivo é claro: trata-se de garantir ao trabalhador
uma remuneração que lhe permita um padrão mínimo de consumo.
O mercado de trabalho pode ser representado graficamente como os demais mercados,
medindo-se no eixo vertical os salários e no eixo horizontal o número de trabalhadores. Quanto mais
alto o salário oferecido, haverá maior número de trabalhadores dispostos a trabalhar (pessoas antes
não empregadas, como donas de casa e estudantes, podem decidir trabalhar), e menor número de
empregos disponíveis (haverá incentivo ao uso de métodos de produção mecanizados, por exemplo).
Ou seja, as curvas de oferta e demanda terão os formatos usuais.
Com a fixação de um salário mínimo, tem-se uma situação análoga ao caso de preços
mínimos agrícolas, ilustrado anteriormente. O salário mínimo é, por definição, superior ao que se
estabeleceria num mercado de concorrência; a intervenção governamental provoca, assim, uma
redução na quantidade demandada de mão de obra, e um aumento na quantidade ofertada. Ou seja,
forma-se um excesso de oferta, tal como no caso do produto agrícola. A diferença é que aqui não há,
regra geral, uma absorção desse excesso pelo governo. Ou seja, a quantidade de trabalhadores
empregados diminui de Qe para Qd (veja o gráfico de preços mínimos), mas os trabalhadores que
continuam empregados receberão agora um salário maior.
9.4 Resumindo
Como vimos, fixam-se preços mínimos quando se supõe que o preço estabelecido num
mercado de concorrência seria baixo demais; e preços máximos quando se supõe que os preços de
mercado seriam altos demais. É evidente que se se estabelecesse um preço mínimo abaixo do preço
de concorrência, isso não teria qualquer efeito: os produtores agrícolas prefeririam vender ao preço
de mercado, em lugar do preço menor oferecido pelo governo; e os trabalhadores estariam felizes em
ganhar mais do que o salário mínimo. Da mesma forma, um preço máximo acima do preço de
mercado não seria efetivo. Preços mínimos efetivos são maiores que o preço de concorrência; preços
máximos efetivos são menores que o preço de concorrência.
115
Pode-se resumir o que vimos nesta seção no seguinte quadro:
Preço
efetivo
máximo mínimo Preço máximo ou
mínimo não efetivo
Preço
efetivo
/—N
Menor que o preço
de equilíbrio
Maior que o preço
de equilíbrio
Igual ao preço de
equilíbrio
Preço
Excesso de
Excesso de oferta
demanda Equilíbrio
Quantidade (Qo>Qd)
(Qo>Qe)
(Qd>Qe) (Qd=Qo)
10. Conclusão
A partir dos exemplos e aplicações do conceito de elasticidade, vistos acima, fica clara sua
importância, e percebe-se como é vantajoso, em muitas circunstâncias, que os agentes económicos
tenham uma avaliação correta — ainda que impressionista — das elasticidades relacionadas aos bens
que vendem, consomem ou tributam, para que possam tomar decisões apropriadas, em cada caso.
r«i
116
APÊNDICE
Fórmula Geral para Cálculo da Elasticidade
ELASTICIDADE- [
A%QÇ ;>
A%
A aplicação dessa fórmula é bem simples. Vejamos os tipos de elasticidade de que trataremos
neste texto:
- ELASTICIDADE-PREÇO DA DEMANDA
-ELASTICIDADE-PREÇO CRUZADA DA DEMANDA
- ELASTICIDADE-RENDA DA DEMANDA
- ELASTICIDADE-PREÇO DA OFERTA
Como empregar a fórmula acima? Simples: basta colocar no retângulo que vem logo após
“elasticidade14 o tipo de elasticidade que você quer calcular (elasticidade-preço, elasticidade-preço
cruzada ou elasticidade renda); na elipse que vem logo após o “da”, se é elasticidade da demanda ou
da oferta; e, na elipse do numerado, se se trata de variação da quantidade demandada ou ofertada. No
retângulo do denominador, colocar a variação do preço do bem (ou do outro bem, no caso da
elasticidade-preço cruzada) ou a variação da renda.
Assim, temos que:
• a fórmula para o cálculo da elasticidade-preço da demanda é:
A%Qd (variação percentual da quantidade demandada)
À%P (variação percentual do preço)
Epd =
• a fórmula para o cálculo da elasticidade-renda da demanda é:
A%Qd (variação percentual da quantidade demandada)
A%R (variação percentual da renda)
Erd =
117
• a fórmula para o cálculo da elasticidade-preço da oferta é:
A%Qo (variação percentual da quantidade ofertada)
Á%P (variação percentual do preço)
Epo =
• a fórmula para cálculo da elasticidade preço cruzada da demanda é:
Epcd = A%Qdi (variação percentual da quantidade demandada do bem 1)/A%P2
(variação percentual do preço do bem 2)
Cálculo da Elasticidade-Preço (da Demanda ou da Oferta) de uma Curva Contínua
Para os alunos com conhecimento de Cálculo: a elasticidade de uma curva pode ser calculada,
sabendo-se a equação da curva, por meio de derivada parcial. Assim, a elasticidade num ponto da
curva será:
/•"S
dx y
= T-x
Como tradicionalmente as quantidades são medidas no eixo do x e os preços no eixo do y,
substitui-se x por Q e y por P, na igualdade acima.
Cálculo da Elasticidade (da Demanda ou da Oferta) peloMétodo do Ponto Médio
Quando a elasticidade é definida não num ponto, como acima, mas num intervalo, como
vimos antes, obtêm-se valores diferentes conforme a direção da mudança de preço ou quantidade.
Por exemplo, uma alteração de 10 para 15 é um aumento de 50%, enquanto de 15 para 10 é uma
redução de 33%; isso se refletirá em números diferentes para a elasticidade.
Para evitar essa discrepância, pode-se adotar o cálculo da elasticidade pelo ponto médio do
intervalo, de acordo com a seguinte fórmula:
E = (AQ/AP) x [(Pi+P2)/2] / [(QI+Q2)/2]
Essas duas últimas fórmulas vão aqui a título de complemento; em nosso curso, vamos nos
ater às definições dadas no corpo do texto.
/*>
118
KlKK
KlKK Estruturas de Mercado KlKK
KlKK
KlKK
KlKK
KlIntrodução à Economia
Universidade de Brasilia
KK
KlKK
KlKK
KlKK
Bruno Pereira Rezende e Flávio Rabelo Versiani
Até agora, temos trabalhado com um modelo de mercado de concorrência perfeita. Esse
modelo, como vimos e revisaremos em seguida, adota um conjunto de hipóteses simplificadoras
quanto às condições em que as mercadorias são ofertadas e demandadas. De fato, a maioria dos
mercados cuja operação podemos observar, no dia a dia — como o mercado de produtos alimentícios,
de transporte urbano, de aluguel de habitações, de bens de consumo durável, etc. etc. — não atende
integralmente àquele conjunto de hipóteses (embora haja mercados que se aproximam razoavelmente
do modelo, como as transações em bolsas de valores ou de mercadorias, ou o mercado de câmbio)1.
Mas o objetivo do modelo de concorrência perfeita não é retratar fielmente a realidade, mas sim
proporcionar uma estrutura teórica simples que nos permita entender melhor as trocas económicas do
mundo real — mesmo quando essas trocas se dêem em condições diferentes das supostas no modelo.
O modelo de concorrência perfeita pode ser útil, por exemplo, para analisar tendências observadas
em cada uma das situações concretas de mercado mencionadas acima.
Há, por outro lado, formas de mercado em que uma ou mais das hipóteses simplificadores do
modelo de concorrência perfeita não é satisfeita. Em disciplinas mais avançadas de Economia, essas
formas são analisadas a partir de modelos teóricos específicos. Num curso introdutório não é
necessário avançar nessa análise; mas é importante definirmos as estruturas de mercado mais
importantes, e notarmos suas características principais. É o que faremos abaixo. Antes, porém,
vamos recordar as hipóteses adotadas no modelo de concorrência perfeita.
1. Concorrência Perfeita
Em um mercado de concorrência perfeita, há quatro pressupostos básicos (além da hipótese,
adotada de forma geral em teoria económica, de que tanto as empresas como os indivíduos buscam a
maximização de seus ganhos: lucros, no caso das empresas, “utilidade”, no caso dos indivíduos):
1 Para recordar: em Economia, diz-se que existe um mercado sempre que compradores e vendedores potenciais de
determinado bem são postos em contato. Não é necessário que esse contato se dê num local físico; ele pode dar-se por
meio de uma rede de computadores, por comunicação telefónica, etc.
119
1) Existem inúmeros compradores e vendedores, cada um deles sem influência sobre a
determinação dos preços (são “tomadores de preço”, no sentido de que suas ações, como
compradores ou vendedores, tomam como dados os preços determinados no mercado);
2) Os vendedores oferecem produtos homogéneos, isto é, produtos sem diferenciação entre si;
3) Não há qualquer obstáculo à entrada ou à saída de vendedores e compradores no mercado;
4) Compradores e vendedores têm livre acesso à informação sobre os preços praticados no
mercado e as transações realizadas sem quaisquer custos.
O ponto essencial do primeiro pressuposto é que a ação individual de um comprador ou de
um vendedor não tem impacto observável na determinação do preço; os preços são fixados num
processo impessoal, resultado do conjunto de ações de todos os compradores e vendedores. Para cada
um destes, o preço de mercado é um dado; e cada comprador e vendedor age independentemente dos
demais, visando apenas seu maior ganho. Para isso, é necessário que haja muitos compradores e
vendedores; mas é importante notar que essa condição pode não ser suficiente. Por exemplo: em
Brasília há, certamente, um grande número de postos de gasolina; mas muita gente supõe que o
comportamento de cada um deles não seja independente dos demais: haveria um processo conjunto
de fixação de preços — um cartel. Nesse caso, apesar de haver muitos vendedores, o pressuposto
número 1 não é satisfeito.
O pressuposto número 2 caracteriza também a impessoalidade das transações: já que todos
vendem o mesmo bem, os compradores não diferenciam entre vendedores: apenas o preço importa
para suas decisões de compra. E como, pelo pressuposto número 4, estão perfeitamente informados
de todos os preços cobrados no mercado, podem sempre optar pelo menor preço. O pressuposto
número 3 garante a ausência de barreiras à entrada de novos participantes no mercado, especialmente
novos produtores, oferecendo preços menores. Tais barreiras podem decorrer, por exemplo, da
existência de cartéis; de processos de produção patenteados; da necessidade de investimentos
vultosos, fora do alcance de pequenos produtores, etc.
2. Monopólio
O monopólio é o caso extremo de não observância do pressuposto número 1: há apenas um
vendedor no mercado. Nessa situação, não há curva de oferta: não tem sentido perguntar ao vendedor
quanto ele oferecerá a cada preço, pois ele sabe que o preço vai depender de sua decisão quanto à
quantidade ofertada. Ou vice-versa: se ele fixa um preço, sabe quanto poderá vender. O monopolista
apenas observa a curva de demanda para seu produto e ajusta a quantidade ofertada (ou o preço) de
120
maneira a alcançar o lucro máximo. Ao contrário do participante num mercado de concorrência
perfeita, o monopolista não é um “tomador de preço”: ele pode impor o preço que lhe seja mais
vantajoso.
Se há apenas um produtor/vendedor, necessariamente existem obstáculos à entrada de outros
concorrentes. Ou seja: o pressuposto número 3, acima, não subsiste. Pode haver várias razões para
isso:
•Proteção legal a inovações. Uma empresa detém a patente de certo processo produtivo e,
portanto, a exclusividade de sua aplicação. A lógica económica da concessão de patentes é o
fornecimento de incentivos à atividade criadora: o introdutor de uma inovação tem garantido, pelo
menos durante certo tempo, o privilégio de explorá-la. Vai no mesmo sentido a atribuição de direitos
autorais.
•Interesse social. Por uma decisão política, atribui-se ao governo, empresa pública ou
concessionária a exploração exclusiva de certa atividade, a partir do suposto de que isso atende
melhor ao interesse da sociedade. Por exemplo: no Brasil, os Correios têm o monopólio do serviço
postal; a Petrobrás, durante certo tempo, tinha o monopólio da exploração e refmo de petróleo.
•Propriedade exclusiva de recurso produtivo. Uma empresa pode deter, por exemplo, a
única reserva de um mineral raro; ou, no caso do comércio, a posse de um ponto de vendas de
localização privilegiada (como um único restaurante em local de grande afluência de turistas).
•Economias de escala. Frequentemente, empresas novas entram no mercado com um nível
de produção inferior ao de empresas já ali estabelecidas. Havendo “economias de escala”
importantes (ou seja, custos médios de produção decrescentes, com o aumento do volume produzido),
esses novos produtores enfrentarão a desvantagem de terem custos de produção mais elevados, em
relação aos produtores existentes. Em certos casos, essa desvantagem é tão grande a ponto de
inviabilizar inteiramente a entrada de outros produtores, além do primeiro que se estabeleça em dado
mercado. Um caso clássico é o da distribuição de água ou de energia elétrica numa cidade: é evidente
que a provisão desses serviços a um novo bairro, por exemplo, poderá exigir apenas, para os
fornecedoresjá no mercado, a instalação de alguns canos ou fios adicionais (ou seja, o custo
marginal da ampliação dos serviços será muito baixo). Mas uma nova empresa teria que investir
pesadamente, na captação de água ou na geração de energia. Nesses casos, costuma-se falar na
existência de um “monopólio natural”.
Da mesma forma como na concorrência perfeita, os casos de monopólios “puros” são
relativamente raros na prática, mas a teoria do monopólio ajuda a entender o comportamento de
121
empresas que se aproximam das condições de monopólio puro. Os economistas falam em empresas
(ou grupos de empresas) com maior ou menor “poder de monopólio”, ou seja: maior ou menor
possibilidade de controlar o preço do bem que fornecem.
Numa economia dinâmica, algumas situações de monopólio costumam ser temporárias. É o
caso de processos produtivos patenteados: sua alta lucratividade muitas vezes estimula o
desenvolvimento de métodos análogos, que possam competir com o original. Isso às vezes dá origem
a disputas, quando os primeiros introdutores alegam que suas inovações foram, de fato, copiadas, e
suas patentes estão sendo infringidas. (Gigantes de tecnologia da informação, como Apple, Microsoft
e Google, frequentemente se envolvem em batalhas judiciais, acusando-se mutuamente de quebra de
patentes). A capacidade do monopolista de fixar o preço de venda é limitada pelas condições da
demanda. Quanto mais inelástica a demanda (isto é, quanto menor a redução da quantidade
demandada em relação a um aumento no preço), mais fácil será, para o monopolista, estabelecer um
preço alto (tudo o mais constante). Isso ajuda a explicar, por exemplo, por que a Confederação
Brasileira de Futebol cobra tão caro pelos ingressos de jogos da Seleção Brasileira em Brasília: a
oportunidade de ver esses jogos aqui é rara, o que toma a demanda inelástica — pouco sensível a
elevações no preço. (A CBF é monopolista de jogos da Seleção).
O fato de que diferentes segmentos da demanda mostrem elasticidades-preço diferentes
explica uma estratégia de maximização dos lucros do monopolista: a discriminação de preços. Ou
seja: a fixação de preços diferentes para o mesmo produto, dependendo da elasticidade da demanda
dos compradores potenciais: quem tem demanda mais inelástica, paga mais. Uma forma de separar
os compradores segundo a elasticidade de sua demanda é, por exemplo, a cobrança de meias-
entradas para estudantes (os quais, tendo em geral menos renda disponível, estarão menos propensos
a pagar preços altos). Ou a prática de vender mais caro passagens de avião para quem faça reserva na
última hora (frequentemente, pessoas que não pagarão a viagem de seu próprio bolso, sendo a
demanda pouco sensível ao preço: homens ou mulheres de negócios, funcionários públicos).
Algumas políticas públicas buscam restringir a capacidade dos monopolistas de fixar o preço
de venda, dentro do propósito de proteger os consumidores. Uma forma disso é o próprio governo,
ou um seu agente, oferecer o produto, como nos serviços postais. (Nesse caso, supõe-se que, deixada
a atividade à iniciativa privada, provavelmente haveria supressão de serviços pouco lucrativos ou
deficitários, mas socialmente desejáveis, como a entrega domiciliar diária de correspondência.) Outra
forma é a regulamentação dos monopólios, envolvendo, por exemplo, regras de fixação de preços, o
que é comum em monopólios naturais, quando entregues a empresas privadas. Essas políticas devem
ser aplicadas com cuidado, equilibrando a repressão a práticas abusivas com a provisão de estímulos
r\
122
à redução de custos e ao aumento de produtividade. Isso é particularmente verdade no caso de
empresas publicas, onde a prevalência de objetivos políticos pode levar à ineficiência produtiva.
3. Concorrência Monopolística
Na concorrência monopolística, a característica principal é a não homogeneidade do produto:
há um grande numero de empresas, com livre entrada no mercado, cada uma oferecendo produtos
similares mas não idênticos. A propaganda é um elemento importante: cada produtor procura
ressaltar, para os consumidores, as qualidades específicas de seu produto, ou seja, diferenciá-lo dos
oferecidos pelos concorrentes. Na medida em que consiga conquistar a lealdade dos consumidores,
terá certa liberdade na fixação do preço (certo poder de monopólio). Mas os competidores estarão
fazendo esforços na mesma direção, e há sempre a possibilidade da entrada de novos produtores.
Alguns exemplos:
• Bebidas, como refrigerantes ou cervejas: são produtos similares, mas, para alguns
consumidores, muito diferenciados; é clara, nesse sentido, a influência da publicidade e
marketing dos produtores.
• Revistas: há, como se sabe, várias publicações, tratando dos mesmos temas, disputando a
preferência dos leitores.
• Bares e restaurantes: a busca da diferenciação envolve não só a qualidade dos produtos e
serviços oferecidos, como tentativas de fixar a imagem do estabelecimento como um ponto
“na moda”.
• Calças jeans: os vários produtos oferecidos no mercado são substitutos próximos; a
propaganda visa ressaltar o prestígio de cada marca entre os consumidores.
No caso de produtos ou serviços como esses, fica claro que a publicidade é um fator-chave,
tomando os mercados menos competitivos e a demanda menos sensível a variações de preço. De
forma geral, a propaganda visa convencer os consumidores de que os produtos são mais diferentes do
que realmente são, em termos objetivos (comparar, por exemplo, calças jeans de grifes famosas com
as vendidas na Feira do Guará). Em certo sentido, a publicidade manipula as preferências, criando
desejos de consumo de forma enganosa. Um contra-argumento é que a maior divulgação de produtos
aumenta o nível de informação dos consumidores, o que pode facilitar a competitividade no mercado
considerado.
123
4. Oligopólio
Nos oligopólios, a oferta é dominada por um pequeno número de grandes vendedores; os
produtos são similares, e a busca de diferenciação é análoga ao caso da concorrência monopolística.
Mas aqui a principal característica é que as empresas concorrentes são conscientes de sua mútua
interdependência, no que toca às decisões de produção, lançamento de modelos, fixação de preços,
etc. É de se esperar que ações de uma empresa provoquem reações das concorrentes, o que dá lugar a
vários tipos de estratégia.
Uma possibilidade é que as empresas busquem agir em conjunto, como um monopólio, seja a
partir de um acordo explícito (formando um cartel); seja designando-se, de maneira informal, uma
empresa-Iíder. que fixa preços e é seguida pelas demais; seja ainda mediante ajustes secretos visando
ações comuns (uma colusão). No entanto, a formação de monopólios por ações como essas é objeto
de restrições ou proibições legais, em nome da defesa da concorrência e dos interesses dos
consumidores. No Brasil, o CADE (Conselho Administrativo de Defesa Económica) é o órgão
governamental com atribuições nessa área, encarregado de fiscalizar e prevenir os chamados abusos
de poder económico.
Além dos obstáculos legais, acordos desse tipo são difíceis de implementar devido à
possibilidade de comportamento oportunista por parte de empresas participantes, que podem julgar
mais lucrativo romper um ajuste do que mantê-lo.
A análise de situações de oligopólio, na literatura económica, abrange vários modelos, desde
a Teoria do Duopólio de Coumot, para mercados com dois ofertantes, exposta no século XIX por
esse economista e matemático francês. Contemporaneamente, o oligopólio mostrou-se um claro
campo de aplicação para a Teoria dos Jogos, desenvolvida a partir da segunda metade do século
passado, que procura modelar a tomada de decisões, sob várias hipóteses, levando em conta
possíveis reações de outros participantes, em condições de informação incompleta. As decisões de
preço e produção de empresas oligopolistas são desse tipo, pois sua lucratividade vai depender das
decisões e reações dos demais produtores do ramo, que não sãoconhecidas a priori.
Como exemplos de oligopólio, podemos citar: empresas montadoras de automóveis,
empresas de transporte aéreo, bancos, grandes redes de supermercados, etc.
5. Monopsônio
O monopsônio é a situação de mercado que se caracteriza pela existência de um único
comprador (chamado monopsonista) para determinado produto, e inúmeros vendedores. A não ser
124
que a oferta seja infinitamente elástica, o preço do produto ofertado vai aumentar, à medida que o
monopsonista aumenta a quantidade comprada.
O exemplo clássico dessa situação é o de uma empresa que seja o único empregador em certa
localidade. Pode-se mostrar que, nessas circunstâncias, tanto o salário pago quanto o número de
empregados contratados tendem a ser menores do que o seriam, em condições de concorrência no
mercado de trabalho.
6. Oligopsônio
O oligopsônio é a estrutura de mercado que se caracteriza pela existência de um pequeno
grupo de compradores e muitos produtores. É, portanto, uma situação simétrica à do oligopólio.
Assim como no oligopólio, pode haver cooperação entre os oligopsonistas, visando chegar a uma
situação mais favorável a todos eles (em detrimento dos vendedores). Cada empresa sabe que seus
custos dependem não só da quantidade que ela demanda, mas das quantidades demandadas pelos
demais compradores. Se os oligopsonistas agem de forma coordenada, reproduzirão a situação de
monopsônio.
Existem oligopsonies nos mercados internacionais de produtos como tabaco ou cacau, onde a
demanda é dominada por um pequeno grupo de grandes empresas processadoras, e há numerosos
produtores. No Brasil, três firmas (Aracruz, Suzano Bahia Sul e Cenibra) compram praticamente
toda a produção de eucaliptos em Minas Gerais e na Bahia, para fabricação de celulose.
125
ISM
BlJfk Externalidades, Bens Públicos e Recursos Comunsiis SI
Zá\«SOI
si*3S
OiliSOl
siIntrodução à Economia
Universidade de Brasília
iS
*1
si
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Ml
Maria da Conceição Sampaio de Sousa, Lívio W.R. de Carvalho
Com colaboração de ítria Aguiar Tonon
1. Introdução
Sob determinadas condições, os mercados privados não asseguram uma alocação de recursos
eficiente no sentido de Pareto. Em particular, em presença de externalidades- negativas e positivas-
e de bens públicos, os preços de mercado não refletem, de forma adequada, o problema da escolha
em condições de escassez que permeia a questão económica. Abre-se, assim, espaço para a
intervenção do governo na economia de forma a restaurar as condições de eficiência no sentido de
Pareto1. Nesse contexto, uma questão importante é definir qual o papel do governo na produção e/ou
provisão de bens e serviços. No que se segue, detalharemos esse ponto.
2. Externalidades
Apenas para rememorar, num mercado concorrencial qualquer, na ausência de externalidades
e de bens públicos, o equilíbrio de mercado é eficiente no sentido de maximizar o valor total para os
consumidores, menos o custo total para os produtores.
Bens públicos e quase-públicos não constituem as únicas exceções que comprometem a
validade do Teorema Fundamental da Economia do Bem-Estar2. A presença de externalidades, uma
outra categoria de falha de mercado, também contribui para explicar por que os mercados privados
nestas condições são ineficientes para alocar os recursos. No que se segue, examinaremos, em
detalhes, essa questão.
Externalidades ocorrem quando o consumo e/ou a produção de um determinado bem afeta os
consumidores e/ou produtores, em outros mercados, e esses impactos não são considerados no preço
de mercado do bem em questão. Nota-se que essas externalidades podem ser positivas (benefícios
externos) ou negativas (custos externos).
1 O conceito de eficiência no sentido de Pareto, criado pelo economista italiano VilFredo Pareto(1848-1923), refere-se a
situações em que não é possível melhorar a situação de um agente económico sem piorar a situação de pelo menos um
dos demais agentes. Modificações que envolvem melhorias na situação de pelo menos um agente económico sem piorar a
dos demais agentes representam Melhorias de Pareto. Portanto, se uma determinada alocação de recursos é eficiente no
sentido de Pareto, não é possível fazer melhorias de Pareto a partir dessa alocação.
2 O Primeiro Teorema Geral da Teoria do Bem-Estar afirma que, na ausência de falhas de mercado, a alocação de
recursos produzida pelo equilíbrio competitivo é eficiente, no sentido de Pareto.
126
Assim, por exemplo, uma empresa de fundição de cobre, ao provocar chuvas ácidas,
prejudica a colheita dos agricultores da vizinhança. Esse tipo de poluição representa um custo
externo, porque é a agricultura, e não a indústria poluidora, que sofre os danos causados pelas chuvas
ácidas. Esses danos não são considerados no cálculo dos custos industriais, que inclui itens como
matéria-prima, salários e juros. Portanto, os custos privados, nesse caso, são inferiores aos custos
impostos à coletividade e, por consequência, o nível de produção da indústria é maior do que aquele
que seria socialmente desejável.
Já a educação gera extemalidades positivas, porque os membros de uma sociedade e, não
somente os estudantes, auferem os diversos benefícios gerados pela existência de uma população
mais educada e que não são contabilizados pelo mercado. Assim, por exemplo, vários estudos,
baseados em diferentes metodologias mostram que a educação contribui para melhorar os níveis de
saúde de uma determinada população. Em particular, níveis mais elevados de escolaridade materna
reduzem as taxas de mortalidade infantil. Outros trabalhos mostram também que a educação
concorre para reduzir a criminalidade. Todos esses benefícios indiretos da educação por não serem
apreçados não são computados nos benefícios privados. Portanto, os benefícios sociais são superiores
aos benefícios privados, que incluem apenas as vantagens pessoais da educação, como por exemplo,
os salários obtidos em função do nível de escolaridade.
Nota-se, ainda, que os produtores podem causar extemalidades sobre consumidores e vice-
versa. Assim, por exemplo, a poluição provocada pela indústria de cobre aumenta a incidência de
tuberculose entre a população. Também, os fumantes contribuem para a disseminação de doenças
entre os não fumantes (fumantes passivos) e, nesse caso, temos a geração de extemalidade de
consumidores para consumidores. Por fim, o uso de automóveis privados congestiona o tráfego e
contribui para reduzir a velocidade do transporte de mercadorias e, portanto, representa um exemplo
de custos externos para os produtores gerados pelos consumidores.
Vamos agora considerar o impacto dessas extemalidades sobre a alocação de recursos. As
extemalidades levam os agentes, não diretamente envolvidos na atividade geradora da extemalidade,
a usarem recursos para corrigir os efeitos dos custos (benefícios) externos, e isso provoca distorções
na alocação de recursos. Assim, por exemplo, os custos de internações hospitalares, decorrentes de
doenças relacionadas à poluição, embora representem, efetivamente, gastos para os doentes, não são
contabilizados nos custos da empresa de fundição de cobre. Ou ainda, os inúmeros benefícios para a
humanidade decorrentes da descoberta da vacina contra a poliomielite não são inteiramente
apropriados pelo seu inventor, o cientista Dr. Albert Sabin, e dificilmente podem ser apreçados. O
Quadro 1 resume esses aspectos e define os benefícios e os custos privados e sociais.
127
Quadro 1: Benefícios e Custos, Privados, Externos e Sociais
Benefícios Privados Externos Sociais
e Custos (A) (B) [(A)+(B)]
A totalidade dos
agentes beneficiados
pelas extemalidades
positivas não paga
por essas vantagens
Soma dos
benefícios privados
e externos
Os ganhos são auferidos apenas
pelos agentes que os financiam
Benefícios
Os agentes que
sofrem as
extemalidades
negativas não são
compensados
Os custos são pagos pelos
agentes beneficiados
Soma dos custos
privados e externos
Custos
Nesse contexto, como o mercado não é capazde levar em conta todos os elementos
constantes do Quadro 1, estamos em presença das chamadas falhas de mercado. O fato de os agentes
económicos ignorarem os custos (benefícios) externos, decorrentes de suas decisões de produção
e/ou consumo e, somente computarem os custos que eles desembolsam ou os benefícios que eles
auferem, faz com que a alocação de recursos, produzida pelo equilíbrio de mercado, seja ineficiente.
Isto porque, no caso das extemalidades negativas, os custos privados subestimam os custos sociais
conduzindo, assim, a uma produção maior do que aquela que seria socialmente desejável. No caso
das extemalidades positivas, como os benefícios privados são inferiores aos benefícios sociais, o
nível de produção correspondente à alocação dos mercados privados ficará aquém daquele que seria
ótimo, do ponto de vista da sociedade.
As curvas de oferta e de demanda podem ajudar a analisar o impacto das extemalidades sobre
a atividade económica. Para tal, vamos considerar que o preço representa a disposição de pagar pelo
bem e, portanto, pode ser visto como o benefício decorrente do consumo de uma unidade adicional
de bem ou serviço, isto é o benefício marginal privado. Podemos, então, renomear a curva de
demanda de mercado como a curva de beneficio marginal privado. A curva de oferta envolve os
insumos exigidos para a produção dos bens e serviços e, portanto, pode ser interpretada como a curva
de custo privado por unidade produzida (custo marginal) 3 A regra de equilíbrio de mercado exige
que a oferta seja igual à demanda e, portanto, que os custos privados sejam iguais aos benefícios
privados. No gráfico 1, isso implica que a quantidade Qo é produzida ao preço Po. Nesse ponto, os
custos e benefícios privados se igualam.
3 O custo marginal de um determinado bem corresponde à variação nos custos totais decorrente da decisão de produzir
uma unidade adicional desse bem.
128
Gráfico 1: Equilíbrio dos Mercados Privados
Preço O (custo marginal privado)
.Eo.
Po
D (benefício marginal privado)
QuantidadeQo
2.1 Externalidades Negativas
Vamos agora considerar o caso de um bem ou serviço que envolva a geração de
externalidades negativas. Esse é o caso, por exemplo, dos custos da empresa de fundição de cobre,
que não está levando em conta os efeitos negativos da poluição. O custo total dessa atividade, para a
sociedade, inclui tanto os custos privados da produção de cobre como os danos causados pelas
externalidades (custos externos) aos agricultores e cidadãos. O gráfico 2 ilustra esse ponto. Nele,
para cada nível de quantidade, o custo externo CE (custo associado à extemalidade) é acrescentado
ao custo privado (CMP) para formar o custo marginal social (CMS). Assim, a diferença vertical entre
as duas curvas representa os custos externos (CE).
Gráfico 2: Externalidades Negativas (Custos Externos) em Mercados Competitivos
CMS = CMP + CE
CPreço
Oferta (CMP)
E*
P*
E
PM
Demanda (benefício
Q* QM 129Quantidade
/*X\
/*\
As curvas de oferta e demanda consideram apenas os custos e benefícios privados excluindo
aqueles associados a terceiros. Nesse caso, no equilíbrio de mercado, a combinação preço-quantidade
é Pm e Qm. Esse equilíbrio não reflete a totalidade dos custos para a sociedade porque não considera
os custos externos. Quando se contabiliza o custo adicional imposto aos agricultores, o preço e a
quantidade transacionada de cobre deveriam ser, respectivamente, P*e Q*. A falha de mercado fica
evidenciada pelo fato de o mercado gerar uma superprodução de cobre e avaliá-la a preços inferiores
aos seus custos totais de oportunidade.
2.2 Externalidades Positivas
Em presença de externalidades positivas, os níveis de produção, associados ao equilíbrio de
mercado, são inferiores àqueles que seriam socialmente ótimos. Assim, por exemplo, a expansão da
educação básica gera benefícios para a sociedade que extrapolam os benefícios auferidos pelos
estudantes e suas famílias. Esses benefícios externos não são considerados na decisão privada de
frequentar a escola porque os estudantes não são compensados pelas vantagens usufruídas pelo resto
da coletividade, decorrente de sua decisão de estudar. Em termos do instrumental da oferta e da
demanda, a curva de beneficio marginal para os estudantes situa-se abaixo da curva de beneficio
social e, portanto, o nível de escolaridade correspondente ao equilíbrio de mercado, Qm é inferior
àquele que seria escolhido caso fossem considerados os benefícios externos dessa atividade (Q*).
/*\
/"ÿS
130
Gráfico 3: Externalidades Positivas (Benefícios Externos) em Mercados
Competitivos
BPreço
Oferta (custo marginal privado)
E>p*
EM,E
PM
Benefício marginal social= Benefício
marginal privado + Benefício de
Externalidade (BE)
Demanda (benefício marginal privado)
QM Q* Quantidade
2.3 Soluções para as Externalidades
A análise desenvolvida nas seções anteriores aponta para a existência de distorções na
alocação de recursos que geram ineficiências tanto na produção como no consumo. Faz-se, pois,
necessário implementar mecanismos capazes de corrigir tais externalidades. Essas soluções podem
ser públicas e privadas e implicam, no jargão dos economistas, a intemalizar as externalidades. No
que se segue discutiremos, em detalhes, as diferentes soluções - privadas e públicas - para o
problema.
2.3.1 - Soluções Privadas
Nesta subseção discutiremos de que modo o setor privado pode atuar na correção das
externalidades. Nesse sentido, discutiremos a intemalização das externalidades por meio de fusões,
sanções sociais e pela negociação de Coase. Em seguida, faremos uma breve digressão sobre os
limites dessas formas de controle de externalidades.
• Fusões
Uma forma clássica de solucionar o problema das externalidades consiste na sua “intemalização”
por meio da coordenação das decisões entre as partes envolvidas. Assim, se a empresa de fundição
de cobre decidisse adquirir o controle das explorações agrícolas prejudicadas pela poluição, então, o
dano causado pelas chuvas ácidas seria agora suportado pela indústria. Nesse caso, os custos
131
externos, derivados da produção excessiva de cobre, ao invés de serem transferidos para os
agricultores, seriam pagos pela nova empresa, composta dos segmentos agrícola e industrial,
reduzindo, assim, seus lucros. Nessa situação, não há incentivo para que a decisão de produzir cobre
e/ou bens agrícolas seja feita separadamente, já que uma influencia a outra. Isto porque a produção
excessiva de cobre acarretaria uma queda nos lucros e, portanto, na oferta do segmento agrícola.
Mais precisamente, os responsáveis pela nova empresa produziriam cobre até o ponto em que os
benefícios marginais gerados por essa produção fossem iguais aos custos adicionais incidentes
sobre sua subsidiária agrícola.
Essa “intemalização” das extemalidades solucionaria, pois, o problema da superprodução de
cobre, responsável pela produção dos efeitos externos negativos. De fato, a rigor sequer esse
problema seria referido como extemalidade já que tratar-se-ia de um problema envolvendo a
tomada de decisões dentro de uma única firma.
• Sanções Sociais
Uma outra forma de implementar a “intemalização” das extemalidade pode ser feita por meio
de sanções sociais apropriadas que penalizem os agentes responsáveis pelas extemalidades negativas
e premiem aqueles que geram extemalidades positivas. Assim, por exemplo, em muitas sociedades,
sujar locais públicos é considerado um comportamento reprovável e contrário ao exercício da boa
cidadania. Nessas sociedades aprende-se, desde criança, que embora seja mais fácil jogar, por
exemplo, cascas de banana e embalagens diversas no chão, isto não é aceitável. Deve-se, pois,
carregá-las até encontrar o cesto de lixo mais próximo. No Japão, pessoas resfriadas que não usam
máscaras de gaze para proteger os demais do vírus da gripe são severamente criticadas. Até mesmo
as religiões têm preceitos morais que induzem as pessoas a levarem em conta os custos ebenefícios
externos de suas atividades. Isto está bem sumariado na regra áurea do cristianismo “Tudo quanto
queres que os outros façam para ti, faze-o também para eles,” incluída nos ensinamentos do Sermão
da Montanha.
Essa censura (ou aprovação) social contribui, em muitos casos, para inibir (estimular) os
comportamentos causadores de extemalidades negativas (positivas) e estimula a adoção de atitudes
que consideram o bem-estar da coletividade eliminando, assim, as ineficiências daí decorrentes.
A
• Direitos de Propriedade e o Teorema de Coase
As extemalidades proliferam, particularmente, em situações em que os direitos de propriedade
não estão bem estabelecidos. Esses direitos correspondem ao conjunto de normas ou regras sociais
(definidas legalmente, ou não) que restringem as ações individuais para preservar o bem-estar da
132
comunidade. A existência desse sistema de normas permite, pois, à parte lesada recorrer ao sistema
legal para obter compensação por danos causados por terceiros. Quanto mais definidos forem esses
direitos de propriedade, mais a comunidade estará protegida de eventuais efeitos externos negativos.
Assim, por exemplo, regras claramente estabelecidas na convenção de condomínio dos edifícios
residenciais, referentes ao uso de instrumentos musicais, podem proteger os moradores contra a
atividade noturna de um enérgico e insone baterista, mesmo talentoso. Por outro lado, quando
ninguém detém os direitos de propriedade, não existem incentivos para os agentes económicos
adotarem comportamentos eficientes, já que não há como puni-los pela adoção de atitudes
predatórias. No exemplo anterior, uma convenção de condomínio pouco clara no tocante ao sossego
deixaria os moradores à mercê do jovem músico e/ou transformaria o condomínio em um mundo
hobbesiano, em que somente os mais violentos (ou os mais espertos) conseguiriam calar o importuno
músico.
Nesse contexto, a “intemalização” das extemalidades pode se fazer por meio da solução
proposta por Coase (1980). Desde que os direitos de propriedade estejam bem definidos,
independentemente de quem os detenha, é possível solucionar o problema das extemalidades
negativas, como as acima exemplificadas, por meio da negociação entre as partes envolvidas, sem
requerer a participação de governo, como poder coercitivo. Esse resultado é conhecido como o
Teorema de Coase (Ronald Coase (I960)). Ele pode ser ilustrado da seguinte forma. Imagine que ao
viajar para Paris, a companhia aérea extravia sua bagagem e só a devolve no Brasil. Ao fazê-lo, ela
lhe impõe sérios inconvenientes (extemalidades negativas), particularmente, se a viagem for no
inverno. Como a convenção da LATA, que rege os transportes aéreos internacionais, garante que a
companhia aérea deve transportá-lo e a sua bagagem, nos limites de peso previamente definidos, fica
claro que cabe à companhia compensá-lo (definição clara dos direitos de propriedade). A companhia
área pode, inicialmente, propor indenizá-lo como base no estipulado pela mesma convenção, que na
maioria dos casos sequer repõe o valor do conteúdo da bagagem. Você decide não aceitar e faz uma
contraproposta: ela deve lhe reembolsar todas as despesas feitas em Paris para substituir o conteúdo
da mala e ainda lhe dar duas passagens de cortesia no mesmo trecho. Depois de algum tempo de
negociação o acordo é fechado, com apenas uma passagem aérea de cortesia. Esse exemplo é um
caso onde o Teorema de Coase se aplica porque os custos de transação são baixos, existem apenas
duas partes envolvidas e os direitos de propriedade estão claramente definidos.
Porém, esse tipo de solução não funciona bem quando as partes envolvidas são numerosas. Para
grandes grupos, as dificuldades de organizá-los para tomar medidas legais são grandes,
particularmente, em razão do problema do “carona” {free rider). Nesse caso, custos de transação
elevados podem comprometer a solução de mercado para o problema das extemalidades em razão da
133
impossibilidade de firmar os contratos estáveis entre aqueles que causam e os que sofrem os efeitos
externos. Assim, por exemplo, quando as extemalidades são provocadas por bens (“males”) públicos,
como a poluição, que envolvem milhões de agentes, é virtualmente impossível que negociações do
tipo sugerido por Coase possam chegar a um acordo satisfatório, a custos relativamente baixos.
Por fim, o Teorema de Coase supõe que é possível identificar a origem dos danos externos e
atribuí-los a determinado(s) agente(s). Ele não se aplicaria, portanto, nos casos em que a
extemalidade está associada à impossibilidade de exclusão (indivisibilidade) como é o caso, por
exemplo, dos recursos comunitários e dos bens públicos puros.
Os limites das soluções privadas anteriormente discutidas decorrem da presença de vários
fatores. Em particular, quando a extemalidade envolve bens públicos puros, a impossibilidade de
exclusão (e sua indesejabilidade) exige a presença de uma força coercitiva que possa assegurar a
provisão do bem ou serviço em questão. Por outro lado, a ausência de direitos de propriedade bem
estabelecidos - como é o caso dos recursos comunitários - faz com que a solução privada não seja
eficiente no sentido de Pareto justificando, assim, a intervenção do estado. Por fim a existência de
informação imperfeita e de custos de transação elevados pode, também, inviabilizar a correção das
extemalidades sem intervenção do governo (ver seções sobre bens públicos e recursos comunitários).
2.3.2 - Soluções Públicas
Dentre as soluções públicas para corrigir as extemalidades destacam-se: a tributação corretiva
(impostos e subsídios), a venda de licenças de poluição, que usam mecanismos de mercado; e o
controle dos efeitos externos mediante o uso de esquemas regulatórios e multas (soluções de
comando e controle). No que se segue, descreveremos, brevemente, essas soluções.
/*Vy
• Impostos e Subsídios Corretivos (Pigouvianos)
A correção das extemalidades pode ser feita mediante o uso da tributação corretiva. Essa forma
de correção é conhecida como tributação pigouviana, em razão de ter sido inicialmente proposta por
Arthur Cecil Pigou (1877-1959), economista inglês responsável pela distinção entre custos e
benefícios sociais e privados e pela ideia de que o governo, mediante o uso de uma combinação
apropriada de impostos e subsídios, poderia corrigir esse tipo de falha de mercado.
Nesse caso, o governo, ao penalizar os agentes causadores das extemalidades por meio da
cobrança de impostos (subsídios, no caso de extemalidades positivas), aumentará os custos desses
agentes fazendo, assim, com que eles considerem os efeitos externos de suas ações. Em termos do
gráfico 2, isto equivale a deslocar a curva de custo marginal (benefício marginal) para cima e para a
esquerda (para baixo e para a direita). Dessa forma, é possível identificar o nível de impostos
134'"V
(subsídios), exigido para que a curva de custo marginal (ou de beneficio marginal) privado coincida
com a curva de custo (benefício) marginal da sociedade corrigindo, assim, o problema de eficiência
decorrente da presença de extemalidades (gráficos 4 e 5).
Gráfico 4: Correção de Extemalidades Negativas (Custos Externos), em Mercados
Competitivos, Mediante o Uso de um Imposto
Custo marginal social (incluindo o custo
marginal de poluição)Preço
Custo Marginal Privado
E*
C
ÊJ/ ........Imposto por unidade sobre a poluição
''fv (custo marginal da poluição):
B
Demanda (benefício marginal)
Q* QM
Quantidade
Na ausência de tributação corretiva, as firmas produzirão em Qm, onde o custo marginal
privado é igual ao benefício marginal. A introdução de imposto por unidade de poluição (custo
marginal de poluição), CB, representa um custo adicional para os produtores, obrigando-os a levar
em conta os prejuízos causados à sociedade pelas extemalidade negativas. Nesse caso é possível
atingir o ponto eficiente em que o custo marginal social iguala-se ao benefício marginal; a produção
é reduzida paraQ*.
Na presença de extemalidades positivas, associadas ao consumo de um determinado bem, o
beneficio marginal social excede o beneficio marginal privado e o consumo desse bem será inferior
àquele que seria socialmente desejável (Gráfico 5). Se o governo subsidia essa atividade, pagando
por cada unidade consumida, a diferença entre o benefício marginal social e o benefício marginal
privado, CB, o consumo desse bem passará a ser Q*, que corresponde à quantidade socialmente
eficiente.
Gráfico 5: Correção de Extemalidades Positivas (Benefícios Externos), em Mercados
Competitivos, Mediante o Uso de Subsídios
135
/ÿ>
-redução da poluiçãoOferta
(Custo Marginal)
/-\
E>— CSubsídio por
unidade
produzida
— B
poluiçãoBenefício Marginal social
Demanda (Benefício Marginal privado)
Q*
• Regulações e Multas
Uma outra forma de o governo lidar com extemalidades negativas, como a poluição, é por
meio da fixação de esquemas regulatórios. Nesse caso, o agente que provoca a poluição é obrigado a
reduzir a produção da atividade que gera a poluição, para os níveis que correspondam à quantidade
socialmente eficiente (Q*, no gráfico 6); caso contrário terá de enfrentar as sanções legais que podem
ir desde o pagamento de vultosas multas até a proibição de continuar funcionando. O problema é
identificar qual o nível de poluição socialmente ótimo. Esse nível exige que se levem em conta todos
os custos associados à redução da poluição, bem como os benefícios dessa redução- por exemplo, a
diminuição dos danos ao meio ambiente.
/S
/*\
Gráfico 6: Lidando com as Extemalidades Negativas
Custos e Benefícios
de Redução da
PoluiçãoPreço
Custo Marginal adicional de
/“S
Custo Marginal privado
Benefício Marginal de
redução da
Quantidade do bem (cuja
produção resulta em poluição)
Q*«- QM
136
Os custos de redução incluem aqueles requeridos para reduzir a poluição, tais como filtros
antipoluentes, bem como os custos adicionais de se utilizar tecnologias “limpas” e os custos em
termos da redução dos lucros decorrente da decisão de reduzir a poluição. Esses custos estão
sumariados na curva de custo marginal adicional da poluição (Gráfico 6). Já, a curva de benefício
marginal de redução da poluição mostra o valor de cada unidade de redução de poluição, expresso
em termos dos benefícios externos, associados à redução dos danos causados pela poluição. Esses
danos incluem as perdas dos agentes económicos afetados adversamente pela produção de
extemalidades negativas, incluindo-se aí, consumidores e produtores, o custo das medidas tomadas
por esses agentes para atenuar esses impactos negativos. Supondo-se que a curva de custo marginal
adicional é crescente e que a curva de benefício marginal é decrescente o nível de redução de
poluição ótimo é aquele em que ocorre quando as duas curvas se interceptam, no ponto Q*.
Gráfico 7: Eficiência na Produção em Presença de Extemalidades Positivas
(Benefícios Externos)
Custo e
benefícios
Custo marginal privado
E>
EM
Benefício marginal social
Benefício marginal privado
Q* Quantidade do bem (cuja produção
resulta em externalidade positiva)
QM
Contrariamente, quando as extemalidades são positivas, o benefício marginal social é maior do
que o benefício marginal privado (no caso da educação, por exemplo), e a quantidade ótima do ponto
de vista social (Q*) é maior que a quantidade que seria resultante do equilíbrio de mercado (QM),
como mostrado no gráfico 7. O governo pode assegurar este resultado através de subsídios ou pela
produção direta.
• A Venda de Licenças de Poluição
Como vimos anteriormente, um órgão de meio ambiente, como o Ministério do Meio
Ambiente ou o EBAMA podem atuar no sentido de diminuir a poluição seja através da cobrança de
137
impostos (os impostos de Pigou), ou através de regulamentação. A imposição de impostos tem a
vantagem de fazer com que os poluidores intemalizem as extemalidades negativas que provocaram.
Mas a dificuldade é descobrir um nível de imposto que assegure os níveis de diminuição da poluição
considerados aceitáveis pela sociedade. Neste sentido, uma regulamentação fixando o nível de
poluição aceitável para uma fábrica poluidora, por exemplo, tem a vantagem de garantir o alcance
deste nível. Mas o poluidor pode não intemalizar a extemalidade e preferir pagar multas, se estas
forem inferiores ao custo de reduzir a poluição. Outra desvantagem da regulamentação é que ao
atingir o nível de redução da poluição fixado pelo órgão regulador, o poluidor não tem nenhum
incentivo para reduzir ainda mais este nível.
Em razão das considerações acima, em alguns países, os órgãos de controle ambiental
passaram a usar o mercado para dar este incentivo que falta na regulamentação, através da criação de
um mercado de compra e venda de licenças de poluição. Com isto, uma empresa que consiga reduzir
substancialmente a poluição que causa pode vender as licenças de poluição que tenha adquirido para
outra empresa que não tenha conseguido esta redução (ou que poderia ter conseguido, mas a custos
mais elevados que o custo das licenças).
Os impostos de Pigou e a venda de licenças de poluição fazem com que os poluidores
intemalizem as extemalidades negativas que geram. Mas a venda de licenças de poluição tem a
vantagem de usar um mecanismo de mercado para atingir um nível de poluição considerado aceitável
pela sociedade.
É interessante notar que o IBAMA pode conseguir o mesmo resultado que seria conseguido
com um imposto de Pigou, através da venda de licenças de poluição, como mostrado no Gráfico 8,
abaixo:
r\
Gráfico 8: Equilíbrio com venda de Licenças de Poluição
Preços
dos
Oferta de licenças de
poluiçãodireitos de
Poluição
P
Demanda por direitos de
produção
Q Quantidade de Produção
138
A oferta de licenças de poluição fixa a quantidade de poluição, o que juntamente com a
demanda por direitos de poluição (licenças) determinam o preço das licenças. No caso do imposto de
Pigou, é como se fosse fixado o preço P das licenças, o que juntamente com a demanda pelas
licenças determinariam a quantidade de poluição. A venda das licenças toma-se mais prática porque
asseguraria ao IBAMA alcançar uma meta determinada de redução da poluição, o que não é
assegurado no caso do imposto de Pigou, já que é difícil conhecer com precisão a demanda pelos
direitos de poluição.
3. Recursos Comunitários, Bens Públicos e Quase-Públicos
Antes de falarmos de recursos comunitários, bens públicos e quase-públicos, é interessante
apontar que os bens de uma economia podem ser classificados em duas características, segundo
sejam excludentes ou rivais. Diz-se que um bem é excludente quando se pode impedir um usuário
(pessoa ou instituição) de utilizá-lo. E um bem é rival quando o fato de alguém usá-lo impede o uso
por outro usuário. O Quadro abaixo resume todas as possibilidades:
Classificação dos Bens quanto ao caráter de Excludência ou Rivalidade:
Rival?
Sim Não
Bens Privados
Monopólios Naturais
• Proteção contra incêndio
• Serviços de Esgoto
• Estrada sem congestionamento (com
pedágio)
• Roupas
• Sapatos
• Automóveis, etc.
• Estrada congestionada (com
pedágio)
Sim
a
£
~c
&
Recursos Comunitários
• Peixes do Mar
• Meio Ambiente
• Estrada Congestionada (sem
pedágio)
Bens Públicos
• Defesa Nacional
• Praça Pública
• Estrada sem congestionamento (sem
pedágio)
Não
Nota: Baseado em Mankiw, op. cit. Cap. 11.
139
Os bens privados são excludentes e rivais. A exclusão se dá através do mercado, ao adquirir
uma roupa excluo a possibilidade de outra pessoa adquiri-la e o fato de usar a roupa impede outra
pessoa de usá-la naquele momento. No uso da estrada congestionada com pedágio a exclusão se dá
através do pedágio. Se o pedágio não for pago, o veículo não pode transitar na rodovia. E, como a
estrada é congestionada, o fato de alguém usar a estrada dificulta o uso por outras pessoas.
Os bens públicos não são nem excludentes nem rivais. O fato de alguém usufruir de uma
praça não exclui a possibilidadede outras pessoas fazerem o mesmo, assim como não se pode
impedir alguém de usar a praça.
Numa situação intermediária ficam os recursos comunitários e os monopólios naturais. Os
recursos comunitários não são excludentes, mas são rivais. Ninguém pode impedir alguém de
usufruir de um rio e nele pescar, mas o fato de alguém fisgar um peixe impede outra pessoa de fazê-
lo.
Os monopólios naturais são excludentes, mas não são rivais. Se alguém usa o serviço de água
e esgotos, outra pessoa também pode usá-los, mas as pessoas podem sim ser excluídas da utilização
desses serviços (um bairro periférico não dotado destes serviços ou as residências não ligadas às
redes de água e esgotos ou, ainda, as pessoas que não pagaram as taxas e os serviços foram cortados).
3.1 - O Problema dos Recursos Comunitários (The Tragedy of the Commons)
Um caso particular de extemalidades é aquele que envolve os recursos comunitários, cuja
propriedade não é individualizada. Um exemplo clássico desse problema é o caso dos pássaros
silvestres, muitos deles, como o galo-de-campina (cardeal do nordeste), hoje ameaçados de extinção,
em razão de uma caça predatória no passado. Para um caçador individual é vantajoso prender um
desses animais, cujo preço de revenda é elevado. Porém, se todos assim o fizerem, este procedimento
conduzirá à extinção da espécie. Por outro lado, não adianta muito se um só caçador resolver poupá-
los porque um pássaro que ele não captura será aprisionado por um outro caçador e, portanto, o
benefício será ínfimo.
Nessa situação, toma-se evidente o conflito entre interesses públicos e privados já que o
beneficio marginal privado (preço de mercado do pássaro) é superior ao benefício marginal social
(que deveria levar em conta o impacto sobre o futuro da espécie). Do ponto de vista do país, mesmo
dos caçadores como um grupo, a estratégia ótima seria limitar a captura para garantir, assim, a
existência dessas aves silvestres.
140
O Governo, por meio do IBAMA, tenta solucionar um problema de recursos
comunitários
Estado de São Paulo, Segunda-feira, 10 de março de 2003
Ibama apreende mais de 300 pássaros em São Paulo
São Paulo - Fiscais do Ibama, em operação conjunta com a Polícia Civil, apreenderam hoje à
tarde cerca de 300 pássaros silvestres, em uma residência, na Vila Joanisa, zona sul de São Paulo.
Entre os animais apreendidos havia pássaro preto grande, galo-de-campina, azulão, cardeal,
canário-da-terra, coleirinha, pássaro-preto e coleira-do-norte.
Os fiscais também apreenderam vinte jabutis e quatro saguis na mesma residência. Segundo o
fiscal do Ibama, Paulo Sérgio Araújo, o responsável pelos animais é João Alves da Rocha, que foi
multado em RS 500,00 por animal e irá responder inquérito por crime ambiental.
No último domingo, também na zona sul, sete pessoas foram presas acusadas de venda ilegal de
aves silvestres, depois da apreensão de 66 canários-da-terra e um pássaro coleirinha pela Polícia
Ambiental.
Maura Campanili
A razão do problema aqui é o fato de ninguém deter a propriedade sobre esses animais, sendo
assim, considerados um recurso “livre”. Nesse caso, as pessoas não consideram todos os custos e
benefícios derivados de suas ações e, portanto, não têm incentivos a usar esses recursos de forma
eficiente. A propriedade conjunta dos recursos conduz, pois, ao seu uso indiscriminado. A solução
para esse tipo de problema requer que o governo atue como se fosse o proprietário desses recursos.
Nesse caso, por meio de esquemas regulatórios, o governo pode restringir a quantidade de aves
silvestres que pode ser apreendida evitando, assim, a extinção desses animais.
Um outro exemplo, célebre, que deu origem à expressão “tragedy of commmons” foi trazido
pelo matemático William Forster Lloyd e depois ampliado por Garret Hardin no ensaio “The
Tragedy of the Commons”4, mas o conceito embora não com este nome, já aparece em escritos de
filósofos gregos da antiguidade5.
O exemplo ilustrativo utilizado por Hardin é o de uma pastagem de uso comum de pastores,
numa pequena aldeia medieval, na Inglaterra. Para cada pastor é vantajoso aumentar o número de
suas ovelhas, só que cada nova ovelha pastando ajuda a degradar a qualidade das pastagens, que são
4 Hardin, Garret. “The Tragedy of the Commons”, Science, vol.162, n 3859, dez 1968, pp. 1243-1248.
5 “Aquilo que é comum para muitos recebe o mínimo de cuidados. Todos pensam principalmente em si mesmos, dificilmente no
interesse comum; e somente quando ele preocupa-se enquanto indivíduo. Além de outras considerações, todos estão mais inclinados a
negligenciar o dever que espera que outro cumpra;” Aristóteles. Política. Livro II, Capítulo EI, 1261b, traduzido do grego por
Benjamin Jowet, em The Politics of Aristotle.
141
finitas. Com a continuidade do uso comunitário das pastagens, termina acontecendo a
superexploração e, em consequência, a depredação completa das mesmas (a tragédia), pelo uso
comum exagerado deste recurso finito.
O conceito pode ser estendido para todos os bens de uso comunitário, tais como a atmosfera,
os oceanos e rios, assim como suas populações ictiológicas e, de forma geral, o meio ambiente e para
todas as situações onde suija um conflito entre os interesses individuais e o bem comum no uso de
um recurso finito. Exemplos ligados à questão ambiental: a superexploração de aquíferos; o
desperdício de água na irrigação; a exploração predatória de atividades agroflorestais e minerais; o
uso de queimadas; a queima de combustíveis fósseis e o aquecimento global; a caça clandestina etc.
No caso dos pastores, a solução do conflito de interesses se deu através da privatização (o
cercamento das propriedades). Mas outras soluções poderiam resolver o dilema: impostos (o
poluidor/degradador pagador); a regulamentação (proibição ou controle da forma de utilização, como
o estabelecimento de cotas de ovelhas -ou de áreas- para cada pastor, concessões condicionadas,
imposição de limites de degradação, a venda de licenças de uso etc).
o*
3.2 - Bens Públicos
Os bens públicos pinos ou, simplesmente, bens públicos, constituem um exemplo extremo de
extemalidade. De fato, a exemplo dos recursos comunitários, a propriedade desses bens não pode ser
individualizada em razão desse bem ou serviço não ser divisível. Além disso, contrariamente, aos
bens privados, o ato de consumir o bem público não reduz a quantidade disponível para o consumo
das outras pessoas. Portanto, os bens públicos puros apresentam duas importantes características: o
consumo desses bens é não excludente e não rival.
A impossibilidade de exclusão (ou a dificuldade, gerada por custos elevados) implica que os
indivíduos não podem ser privados dos benefícios do usufruto do bem e/ou serviço, mesmo se não
tiverem contribuído para o seu financiamento. Um exemplo de bem que apresenta essa característica
é um espetáculo pirotécnico, que pode ser visto pelas pessoas de quintais, jardins e praças públicas.
Isto dificulta a provisão privada desse tipo de evento porque a impossibilidade de exclusão impede
que sejam cobrados ingressos para financiar os custos, incluindo-se aí os lucros do organizador.
Afinal, porque pagaríamos por esse show, se podemos vê-lo gratuitamente? Portanto, nenhum
empresário privado se interessaria pela sua produção e, então, apesar da forte demanda, o espetáculo
poderia não ser produzido. A impossibilidade de exclusão, ao inviabilizar o uso do sistema de preço
para racionar o consumo, reduz os incentivos para o pagamento voluntário dos bens públicos. Essa
relutância em contribuir, voluntariamente, para financiar esses bens é conhecida como o problema do
“carona” (free rider).
142
A não rivalidade no consumo é outra característica do bem público. Isto implica que uma vez
que o bem está disponível, o custo marginal de provê-lo, para um indivíduo adicional, é nulo.
Considere, por exemplo, o caso do espetáculo pirotécnico. O custo do espetáculo, uma vez
determinado, não é alterado pelo fato de um grupo adicionalde turistas decidir vê-lo. Ademais, essa
decisão dos turistas em nada reduz o usufruto do evento pelos habitantes locais. Portanto, o custo
marginal de provisão do espetáculo para esses espectadores adicionais é zero. Isso representa um
franco contraste com os bens privados, que se caracterizam por níveis elevados de rivalidade no
consumo. De fato, quando ocupamos um lugar, por exemplo, no cinema ou no teatro, este lugar
deixa de estar disponível para outras pessoas.
Outros exemplos de bens públicos puros são o sistema de defesa nacional, o conhecimento
científico, um meio ambiente saudável, e governos eficientes. Em comum, esses bens têm o fato de
seu consumo ser não excludente e não rival.
3.3- Bens Quase-Públicos
A definição de bem público, anteriormente discutida, não é absoluta, mas varia com as
condições de uso, de mercado e com o estado da tecnologia. Vejamos por exemplo, o caso da energia
elétrica. Esse serviço, quando usado nos domicílios privados, é um bem eminentemente privado:
caso a conta de energia não seja paga, o serviço é suspenso e, portanto, os usuários são excluídos do
seu consumo. Por outro lado, trata-se de um bem cujo consumo é rival. Quando eu consumo uma
determinada quantidade de quilowatts, ela já não mais está disponível para os demais consumidores.
Por outro lado, quando essa energia é usada para iluminar os locais públicos, ela toma-se um bem
público puro. Isto porque é impossível excluir alguém do benefício da iluminação pública, além de
desnecessário; o custo de prover esse serviço para passantes adicionais é zero. Outro exemplo menos
extremo é o caso das estradas de rodagem. Assim, o uso de uma estrada vicinal, semideserta, pode
ser não rival na medida em que, nela, o tráfego é muito inferior a sua capacidade e, portanto, o custo
marginal de utilização por um veículo adicional é muito baixo. Por outro lado, embora seja possível
excluir os veículos de seu uso por meio da introdução de um pedágio, provavelmente os custos de
instalação e de manutenção desse pedágio serão superiores à arrecadação e, por conseguinte, não
valerá a pena introduzi-lo. Porém, quando a estrada é, por exemplo, a Via Dutra, que liga São Paulo
ao Rio de Janeiro, além do custo de exclusão ser compensatório, a rivalidade no consumo se expressa
por meio do congestionamento. Nesse caso, essa rodovia pode ser vista como um bem privado.
Podemos, assim, pensar que grande parte dos bens satisfaz, apenas parcialmente, as condições
de impossibilidade de exclusão e não-rivalidade no consumo. Os bens que atendem parcial ou
totalmente a pelo menos uma dessas características são chamados de bens públicos impuros ou bens
143
quase-públicos. Utilizando o diagrama proposto por Stiglitz (1987), o Gráfico 8 mostra, no eixo
horizontal, a possibilidade de exclusão e, no eixo vertical, a rivalidade no consumo (custo marginal
de provisão), toma-se claro que, ao invés de uma separação bem marcada, existe um continuum entre
bens públicos e privados. No canto inferior esquerdo desse diagrama, estão os bens públicos puros,
para os quais os custos de exclusão são infinitos e não existe rivalidade no consumo. No canto
superior direito encontram-se os bens privados, para os quais a exclusão é possível a baixos custos e
o custo marginal de provisão é elevado. Os bens públicos impuros (bens quase-públicos) situam-se
entre esses extremos.
Gráfico 9 - Bens Privados e Bens Públicos Puros e Impuros
BENS
PRIVADOS
•PUROS
* Via Dutra
Bombeiros
RIVALIDADE
Defesa Nacional
Iluminação pública Estrada Vicinal
BENS
PÚBLICOS
PUROS
POSSIBILIDADE DE EXCLUSÃO
Assim, serviços de saúde pública, tais como vacina contra doenças infecto-contagiosas,
beneficiam não somente as pessoas vacinadas, mas a população como um todo, já que previnem o
surgimento de epidemias. Ademais, o custo marginal da vacinação é positivo e a exclusão de não
pagantes é possível. Porém, não é possível excluir dos benefícios aliados à redução das epidemias
(nem cobrar por tais benefícios) aqueles que não se vacinaram. Isso toma esses serviços bens
públicos impuros e por essa razão, muitos governos mantêm programas gratuitos de vacinação para
encorajar, e até mesmo obrigar, a imunização maciça da população.
144
Bens Quase Públicos - Zé Gotinha e a erradicação da poliomielite no Brasil
Conheça a história do personagem-símbolo da Campanha de Vacinação e veja porque todas as crianças
menores de 5 anos devem tomar a vacina
O personagem da Campanha Nacional de Vacinacão contra a Paralisia Infantil - que acontece neste
sábado, 23 de agosto, com apoio do McDonald's - foi criado em 1986, pelo artista plástico Darlan Rosa,
mineiro radicado em Brasíliaÿ O Ministério da Saúde realizou um concurso nacional para que o
personagem ganhasse um nome, e crianças do Brasil inteiro escolheram Zé Gotinha.
Desde então, o Zé Gotinha se tomou o símbolo da campanha, que ajudou a erradicar a paralisia
infantil (ou poliomielite) e a manter o vírus causador da doença afastado do país. Anos mais tarde, o
personagem foi adotado também para outras vacinas infantis, com uma cor diferente para cada uma: branco
contra a poliomielite; vermelho contra o sarampo; azul marinho para a vacina contra a tuberculose; azul
claro para a da coqueluche; laranja para difteria, e verde para o tétano.
Mobilização nacional
A Campanha Nacional de Vacinação contra a Paralisia Infantil é realizada em duas etapas anuais
pela Fundação Nacional de Saúde (Funasa), em parceria com as secretarias estaduais e municipais de
Saúde. Neste ano, a primeira etapa aconteceu no dia 14 de junho e, a segunda, será realizada no próximo
sábado, 23 de agosto.
Na segunda etapa da campanha do ano passado, mais de 17,2 milhões de crianças foram vacinadas
contra a poliomielite. O último caso de poliomielite no Brasil foi registrado no município de Sousa, na
Paraíba, em 1989. Nos últimos quatro anos, as Campanhas Nacionais de Vacinação têm alcançado 100%
da meta, vacinando todas as crianças menores de cinco anos. A vacinação é importante porque o poliovirus,
causador da poliomielite, pode ser reintroduzido no Brasil, pois a doença ainda ocorre em outros países.
Em 2001, 18 países registraram casos da doença, entre eles o Haiti, país próximo da América do Sul.
Sala da Imprensa-Notícias - 22/08/03
Outro exemplo de bens quase públicos é o serviço de bombeiros. Nesse caso, existe,
claramente, rivalidade no consumo já que uma equipe que sai para atender uma ocorrência deixa,
imediatamente, de estar disponível para outros casos. Portanto, o custo marginal de provisão desse
serviço é positivo e pode ser bastante elevado. Porém, na forma atual de moradia, onde parte
significativa das pessoas vive em grandes aglomerações urbanas e em condomínios verticais, esse
serviço apresenta, também, dificuldades de excluir os que não contribuem para o seu financiamento.
Ele perde, assim, parte do seu caráter privado sendo por isso, na maioria dos países, oferecido pelos
governos e o seu custo financiado, compulsoriamente, por meio de impostos e taxas.
Podemos agora então resumir nossa argumentação sugerindo que alguns bens quase-públicos
devem ser, prioritariamente, ofertados pelo estado. Quais desses bens enquadram-se nessa categoria
é uma questão aberta, já que a fronteira entre eles está longe de ser consensual.
145
3.4 - Ineficiências Associadas à Provisão Privada de Bens Públicos
Voltemos agora ao exemplo da defesa nacional. A questão é saber qual será o nível eficiente
de provisão desse bem público puro. Suponhamos que, com exceção dos pacifistas, a maioria da
população concorde com a necessidade da existência de um sistema de defesa do território. Porém,
dentre aqueles que o defendem, existem dois grupos distintos: aqueles que acreditam em ataques
externos iminentes e os que imaginam que não serão atacados. Os primeiros estarão dispostos a
contribuir para financiar as forças armadas garantindo, assim, que o país seja defendido em caso de
ataque externo. Já os que imaginam quea possibilidade de serem atacados é pequena tenderão a
pensar que gastos com serviços de defesa nacional não são prioritários e, portanto, se recusarão a
contribuir com o necessário para a provisão desses serviços. Caso eles fossem financiados por esse
tipo de contribuição voluntária, é razoável supor que o montante arrecadado não seria suficiente para
custear um sistema de defesa nacional eficiente, no sentido de dissuadir os inimigos externos. Os
níveis de segurança nacional seriam, pois, inferiores àqueles que seriam obtidos por meio da
provisão pública, financiada compulsoriamente por meio de tributos.
A ineficiência da provisão privada de bens públicos puros pode, ainda, ser ilustrada
utilizando-se o exemplo da estrada vicinal pouco frequentada. Vimos que o custo marginal de uso
dessa estrada, para um veículo adicional, é praticamente nulo e, portanto, não faz sentido racionar a
sua utilização. Podemos ilustrar esse problema supondo-se que o governo decida terceirizar a
administração dessa estrada para uma firma privada, que cobrará pedágio pelo seu uso, essa cobrança
desencorajará o tráfego de veículos (já que agora é preciso pagar pelo uso dessa via) conduzindo,
assim, à subutilização da estrada vicinal. Essa restrição desnecessária representa um custo, em
termos de bem-estar, para a sociedade. É nesse sentido que afirmamos que a provisão privada desses
serviços é socialmente ineficiente.
4. A Importância dos Direitos de Propriedade
Nos exemplos acima ficou explícito que o mercado falha ao fornecer estes tipos de bens e
serviços porque ninguém pode cobrar por fornecer ar puro, aves silvestres ou praças públicas. O que
há em todos estes casos é a dificuldade em atribuir direitos de propriedade para esses tipos de bens e
serviços, como já apontado anteriormente.
Sempre que estes direitos possam ser atribuídos, o mercado aloca os recursos necessários para
sua produção e distribuição de forma eficiente. Em caso contrário, as sociedades dependem do
Governo para produção e distribuição destes bens e serviços e/ou para o estabelecimento de critérios
para sua produção e distribuição, ou ainda para a atribuição de direitos concernentes, seja de forma
permanente ou temporária, e de maneira total ou parcial. E em assim fazendo, assegura que a
146
sociedade estará, geralmente, numa situação melhor, porque estará alocando estes recursos de forma
mais eficiente.
5. Conclusão
Neste capítulo, examinamos os casos em que a intervenção do governo nos mercados* ajuda a
restaurar as condições de eficiência mediante as correções das falhas de mercado - em particular
aquelas decorrentes da existência de bens públicos e extemalidades. Nota-se, porém, que a própria
ação do governo também pode gerar ineficiências - conhecidas como “falhas de governo” e, nesse
sentido, é importante levar em conta, na medida do possível, esses “custos” da intervenção
governamental quando da correção do funcionamento dos mercados privados.
6. Referências Bibliográficas
Coase, R. (1960) "The Problem of Social Cost", Journal ofLaw and Economics.
Hardin, Garret. “The Tragedy of the Commons”, Science, vol. 162, n 3859, dez 1968, pp. 1243-1248.
Kienzle, E. (1989) Study Guide and Readings for Stiglitz's Economics of the Public Sector New
York: Norton Books. Textos selecionados.
Rosen. S. H. (1995) Public Finance. Irwin Press, 4a edição.
Stiglitz, J. A (1988) Economics of the Public Sector. New York: Norton Books.
Mankiw, N. Gregory (2004) Introdução À Economia, São Paulo, Thomson Learning Ltda.
147
Kl£K
Hl
Contabilidade Nacional Kl2K
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•95
Kl
1511
KlIntrodução à Economia
Universidade de Brasília
2K
1511
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Flávio Rabelo Versiani, Lívio William Reais de Carvalho, Bruno Pereira Rezende
1. Introdução
Você está iniciando seus estudos no campo da Macroeconomia, que é o campo da Economia
que estuda as variáveis económicas agregadas, objetivando, por exemplo, determinar os fatores que
influenciam os níveis de produção, de renda e de emprego na economia. Segundo Mankiw1, os
campos de Microeconomia e Macroeconomia podem ser definidos como:
• Microeconomia: “o estudo de como famílias e empresas tomam decisões e como
interagem nos mercados”;
• Macroeconomia: “o estudo de fenômenos que afetam a economia como um todo, tais
como inflação, desemprego e crescimento económico”.
O estudo quantitativo de grandezas macroeconômicas e suas inter-relações — como a
produção total de bens e serviços num país e as transações que daí decorrem — tem uma longa
tradição em Economia. O Tableau Économique, elaborado por François Quesnay, figura mais
importante dos fisiocratas, escola de economistas que floresceu na França na segunda metade do
século XVIII, é comumente mencionado como uma primeira tentativa nesse sentido.
A medida sistemática dessas grandezas desenvolveu-se modemamente a partir da primeira
metade do século passado. Esse desenvolvimento foi influenciado pelas ideias do economista inglês
John Maynard Keynes — que estudaremos na 5a Unidade do curso — em favor da intervenção
governamental na economia, no sentido de obstar uma tendência à subutilização da capacidade
produtiva e ao desemprego. Para intervir, seria preciso acompanhar, por exemplo, a evolução da
produção e do consumo agregados, o que ressaltava a necessidade de um registro organizado de
dados relativos à atividade económica.
A Contabilidade Nacional (também chamada de Contabilidade Social, ou sistema de Contas
Nacionais) promove esse registro. Seu objetivo é proporcionar um quadro estatístico do desempenho
da economia num dado período: quanto se produz, quanto se consome, quanto se investe no aumento
MANKIW, N.G. Introdução à Economia. Trad. A.V. Hastings. São Paulo: Pioneira-Thomson, 2005.
148
da capacidade produtiva, como o investimento é financiado, como os fatores de produção são
remunerados, e assim por diante.
Mais comumente, essas medidas se referem à economia de um país e ao período de um ano,
mas a Contabilidade Nacional pode também se aplicar a regiões e a períodos inferiores a um ano. No
Brasil, as principais grandezas das Contas Nacionais são calculadas trimestralmente, e o IBGE
divulga dados por estado da federação.
Atualmente, a generalidade dos países produz dados relativos à Contabilidade Nacional. A
Organização das Nações Unidas divulga e revê periodicamente um sistema padronizado de Contas
Nacionais, visando tomar o mais possível uniforme as estatísticas dos vários países, facilitando sua
comparabilidade. A última revisão foi publicada em 2008. As Contas Nacionais brasileiras passaram
a ser elaboradas em 1947, pela Fundação Getúlio Vargas, no Rio de Janeiro, órgão não
governamental de pesquisa e ensino. A partir de 1986, o Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), ligado ao Ministério do Planejamento, assumiu essa tarefa.
Valores nominais e reais. Como é intuitivo, os agregados da Contabilidade Nacional, como
os relativos à produção, devem ser medidos em valor, pois não é possível somar toneladas de aço,
sacas de soja e tratamentos dentários. Ocorrendo inflação, surge o problema de comparar valores em
períodos distintos: um aumento no valor de determinada produção, de um ano para outro, poderá
decorrer tanto do aumento na quantidade produzida, que é o que interessa medir, quanto de um
aumento em seu preço. Assim, haverá necessidade de distinguir entre valores nominais, medidos
pelos preços correntes, ou seja, os preços efetivamente verificados no mercado em cada período; e
valores reais, medidos em preços constantes, de tal forma a eliminar o efeito da inflação. Na seção 7
deste texto, veremos, de maneira detalhada, como isso é feito. No próximo texto (“índices de
Preços”), retomaremos a distinção entre valores nominais e valores reais.
Fluxos e estoques. Outra distinção importante é entre variáveis de fluxo e de estoque.
Variáveis de fluxo são medidas por unidade de tempo: produção ou consumo por ano ou por
trimestre, por exemplo. Variáveisde estoque são medidas em um ponto do tempo, como a
quantidade de moeda na economia, ou o nível de preços. A Contabilidade Nacional trabalha
predominantemente com variáveis de fluxo.
Definições e convenções. Para medir as grandezas das Contas Nacionais, é necessário defini-
las de modo preciso e você verá que é importante entender corretamente essas definições. Em alguns
casos, as definições decorrem de convenções, envolvendo certo grau de arbitrariedade. Por exemplo:
convenciona-se, de acordo com o sistema de Contas Nacionais da ONU, que certos tipos de trabalho
não remunerado, notadamente a manutenção do domicílio (preparação de alimentos, limpeza,
cuidado de crianças, etc.) não são considerados na Contabilidade Nacional. A exclusão decorre
149
principalmente da dificuldade de atribuir um valor a essas atividades; como não passam pelo
mercado, não têm um preço objetivamente determinado.
Por outro lado, algumas atividades que também não passam pelo mercado, como a produção
agrícola para consumo próprio, podem ser objeto de estimativa, quanto às quantidades produzidas,
fazendo-se a avaliação pelos preços observados no mercado. Dessa forma, a produção para
autoconsumo em geral é incluída na Contabilidade Nacional.
Limitações das Contas Nacionais. O cômputo das Contas Nacionais depende da existência de
registros estatísticos; mas algumas atividades económicas não dão origem a tais registros. É o que
sucede, obviamente, com atividades ilegais, como o contrabando ou o tráfico de drogas. E também
com a chamada economia informal, que inclui a produção ou prestação de serviços de inúmeros tipos,
individualmente ou em pequenas unidades, sem pagamento de impostos ou inscrição em cadastros
oficiais — como o trabalho de camelos e de vigias de carros em estacionamentos, ou os serviços de
pequenas oficinas mecânicas, na periferia das cidades. A economia informal é importante como fonte
de ocupação e renda, especialmente em economias menos desenvolvidas; mas atividades informais
são também comuns em países mais ricos, como forma de evadir o pagamento do imposto de renda
(um arquiteto não cobra um projeto para seu médico, que por sua vez trata de graça a família
daquele).
No caso da economia informal, é possível, em alguns casos, usar métodos indiretos para
estimar o valor produzido, como é feito nas Contas Nacionais brasileiras. Já a produção e o comércio
ilegais são excluídos, não apenas pela dificuldade ou impossibilidade de mensurá-los, mas também
por um argumento conceituai: a concepção original da Contabilidade Nacional adotou o princípio de
que atividades nocivas não devem ser incluídas, mas apenas a produção que tenha valor positivo para
a sociedade.
Dentro dessa perspectiva de bem-estar social, a Contabilidade Nacional tem uma limitação
importante, destacada pelos ambientalistas: não se levam em conta os custos da atividade produtiva
para o meio ambiente. Um país pode experimentar um rápido crescimento económico em detrimento
da preservação ambiental, com efeitos negativos sobre a sociedade. Algumas tentativas têm sido
feitas no sentido de integrar a questão ambiental nas Contas Nacionais.
É comum que se utilize o produto per capita — o valor total da produção de bens e serviços
de um país, dividido pela população — como indicador de bem-estar económico; mas não é,
certamente, um indicador ideal. Esse dado não leva em consideração, por exemplo, a distribuição de
renda, ou o nível de educação e saúde da população.
Algumas dessas características não avaliadas pelos números da Contabilidade Nacional são
objetos de indicadores específicos. Alguns deles serão estudados na T Unidade, como o índice de
150
Gini, uma medida da desigualdade na distribuição de renda, e o índice de Desenvolvimento Humano
(IDH), que inclui dimensões adicionais na avaliação do crescimento da economia, como os níveis de
educação e saúde.
Outros procedimentos da Contabilidade Nacional são às vezes criticados; um deles é a
convenção de excluir os serviços domésticos do âmbito das Contas, como mencionado acima. Aqui
as críticas costumam partir de uma perspectiva feminista, já que tais serviços são, tipicamente,
desempenhados por donas de casa. Argumenta-se que as atividades das mulheres nos domicílios são
importantes, do ponto de vista da produção, e deviam, assim, ser de alguma forma medidas e
avaliadas. De fato, grande parte dos “produtos” que permitem aos indivíduos exercer sua atividade
produtiva voltada ao mercado, fora de casa, provém de serviços domésticos. A Conferência Mundial
da ONU sobre a Mulher, reunida em Pequim em 1995, aprovou recomendação no sentido de que
essa realidade fosse levada em conta. Propôs-se o desenvolvimento de métodos de avaliação
quantitativa do valor do trabalho doméstico não remunerado, possivelmente por uma contabilidade
complementar à das Contas Nacionais.
Cabe notar que, quando prestados por empregados remunerados, os serviços domésticos
entram nas Contas Nacionais pelo ângulo da renda. No caso do Brasil, atribui-se a cada empregado
ou empregada uma remuneração igual ao salário mínimo. Como veremos a seguir, medir a renda
equivale a medir o produto.
2
2. O PIB e sua medida
Nos noticiários, estamos acostumados a ouvir constantes referências ao Produto Interno Bruto
(PIB), quando se fala do desempenho da economia e de seu crescimento. No que se segue,
trataremos dessa grandeza e de como medi-la.
Vamos por partes: primeiro, a definição de Produto:
Produto é o valor total da produção de bens e serviços da economia em determinado período
de tempo.
O valor, como vimos, é medido pelos preços verificados no mercado (o valor nominal;
falaremos depois no valor real). Por “bens e serviços”, quer-se dizer que o PIB inclui tanto bens
2 Beijing Declaration and Platform for Action, disponível em: www.un.org/womenwatch/daw/beijing/platform.
151
tangíveis (carros, máquinas, roupas, bananas, iPods), quanto serviços intangíveis (cortes de cabelo,
consultas médicas, sessões de cinema, aulas na UnB).
A definição de Produto refere-se a um determinado espaço geográfico: mede-se a produção
feita dentro das fronteiras de um país ou uma região. Se um cidadão brasileiro vai trabalhar em uma
loja defastfood nos Estados Unidos, o valor referente à sua produção faz parte do Produto daquele
país, e não do brasileiro. Da mesma maneira, o valor da produção da rede norte-americana
McDonald’s no Brasil é contabilizado no Produto brasileiro, apesar de a matriz da empresa produtora
estar localizada fora de nossas fronteiras.
Atente-se também para o limite temporal: um veículo produzido em 2011 entrará no Produto
de 2011, independentemente de ser ou não vendido nesse ano. E se um veículo produzido e vendido
em 2011 é revendido em 2012, seu valor não fará parte do Produto de 2012, uma vez que a produção
não ocorreu nesse ano; houve apenas mudança de proprietário.
Quais os bens que devem ser incluídos no cômputo do Produto? Uma breve reflexão nos
mostrará que n|o se pode incluir todos os bens e serviços produzidos, pois de outra forma
incorreríamos no erro da múltipla contagem. De fato, o valor do minério de ferro extraído está
necessariamente contido no valor das chapas de aço com ele produzidas; e o valor da produção
dessas chapas faz parte do valor dos automóveis ou navios nos quais foram incorporadas. Não faria
sentido somar o valor do minério, das chapas de aço e dos automóveis ou navios. Só se deve somar o
valor dos bens e serviços finais.
É importante entendermos corretamente o que se entende por bens finais, recordando o que
vimos na Ia Unidade: são bens — tanto bens de consumo quanto bens de capital — que serão
utilizados tais como produzidos, sem serem transformados ou incorporados em outros bens. O
qualificativo “final” não se refere à natureza intrínseca do bem, mas à forma de sua utilização. Um
parafuso comprado na loja de ferragens, para um conserto doméstico, é bem final; o mesmo parafuso,
quando usado na montagem de um carro,não é bem final; é um bem intermediário. O minério de
ferro utilizado na fabricação de aço é bem intermediário; o minério de ferro exportado é bem final
nas Contas Nacionais do país exportador. Um corte de cabelo é um serviço final; a consultoria de
marketing dada a uma cadeia de lojas é um serviço intermediário: faz parte dos custos de produção
das lojas e, portanto, do preço de venda de seus produtos para o consumidor.
Podemos então chegar a uma primeira abordagem da medida do produto:
Para medir o produto, somamos o valor dos bens e serviços finais.
152
\
Muitas vezes é problemático distinguir, para uma mesma mercadoria, as partes da produção
que se destinam ao consumo final ou ao consumo intermediário. Mas há outra forma de medida do
Produto, a partir dos valores adicionados. Para explicá-la, vamos imaginar um exemplo numérico
bem simples, o de uma economia sem relações com o exterior e sem governo, e com apenas três
setores produtivos.
Os produtos dos três setores dessa economia simplificada são: algodão, tecidos e roupas.
Vamos supor que toda a produção de algodão é usada como insumo para a produção de tecidos, e
toda a produção de tecidos é insumo para a produção de roupas (não há vendas de algodão ou tecidos
no varejo). O setor de algodão, por hipótese, não precisa comprar insumos.
O valor da produção de algodão é 50 unidades monetárias, e como toda a produção é vendida
para a indústria de tecidos, 50 é também o valor dos insumos dessa indústria. O valor da produção de
tecidos é 120, o que significa que a indústria de tecidos adicionou 70 ao valor dos insumos que
adquiriu. Analogamente, a indústria de roupas comprou 120 em insumos da indústria de tecidos e
adicionou 130 a esse valor, de tal forma que o valor de sua produção somou 250. No caso da
indústria de algodão, que não compra insumos, todo o valor de sua produção constitui um valor
adicionado. Veja o quadro a seguir.
Quadro 1. Insumos, valor adicionado e valor bruto da produção numa
economia com três setores (em unidades monetárias)
SETORITEM
Algodão Tecidos Roupas
Compra de insumos 50 120
130Valor adicionado 50 70
50 120 250Valor bruto da produção
O valor adicionado (ou valor agregado) pode ser visto como o valor líquido da produção de
cada indústria, em contraste com o valor bruto da produção, que inclui também o valor de bens
produzidos em etapas anteriores da atividade produtiva.
O Produto dessa economia simplificada é o valor dos bens finais, que são as roupas: 250. Já
sabemos que para medir o Produto não faz sentido somar os valores brutos da produção de cada setor,
pois haveria múltipla contagem. No entanto, se considerarmos apenas os valores adicionados em
153
2.1. O conceito de valor adicionado
cada setor, o problema da dupla contagem fica eliminado, já que, por definição, o valor adicionado
exclui o valor de produção das etapas produtivas anteriores. Assim, como é fácil verificar, a soma
dos valores adicionados em cada setor nos dá o valor de produção dos bens finais:
50 + 70 + 130 = 250 = valor do Produto
A igualdade indica que, para o cômputo do PIB, pode-se tanto observar o valor bruto da
produção do setor que produz o bem final (no caso, o setor produtor de roupas), como somar os
valores adicionados em todas as etapas de produção.
Temos, portanto, uma nova forma de medir o Produto, que evita a necessidade de identificar os bens
finais:
/N
Para medir o produto, podemos somar os valores adicionados em todos os setores
produtivos.
2.2. Valor adicionado e suas partes
O valor adicionado em cada etapa do processo produtivo corresponde à remuneração dos
fatores de produção envolvidos naquela etapa. São os pagamentos a quem contribuiu para
transformar os insumos, adquiridos de outros setores, no produto do setor considerado.
Esses pagamentos podem ser agrupados em quatro categorias: salários, pagos em
remuneração ao fator trabalho; lucros, que são a remuneração do capital investido na atividade
produtiva; juros, remuneração do capital tomado de empréstimo para financiamento da produção; e
aluguéis, remuneração pelo uso de terrenos, prédios ou equipamentos usados na produção. Numa
economia com governo, há uma quinta categoria: os impostos, que são a renda do governo.3
Tomemos o mesmo exemplo simples usado acima, agora com especificação dos rendimentos
pagos em cada setor produtivo, correspondentes ao valor adicionado no setor (veja o Quadro 2).
/"N
Quadro 2. Componentes do valor adicionado numa economia com três
setores (em unidades monetárias)
ITEM SETOR
3 Um lembrete: nos exercícios de Contabilidade Nacional, em provas ou controles de leitura, nem sempre são dados
valores para todos os tipos de rendimentos. Nesse caso, considere que o valor dos rendimentos omitidos é igual a zero.
154
/*>
Algodão Tecidos Roupas
Insumos 50 120
Valor Adicionado 50 70 130
Salários 10 20 30
Lucros 1010 50
Juros 20 20 30
Aluguéis 10 20 20
Valor Bruto da Produção 50 120 250
Vê-se que, em cada setor — indústria do algodão, indústria de tecidos, indústria de roupas —,
o valor adicionado se desdobra nos pagamentos feitos aos fatores produtivos que participaram do
processo de transformação dos insumos em produtos do setor. Pode-se escrever, para cada setor
produtivo, a igualdade:
Valor bruto da produção = valor dos insumos + (salários + lucros + juros + aluguéis)
A expressão entre parênteses, soma dos rendimentos pagos, é o valor adicionado nesse setor.
Já que o Produto pode ser medido pela soma dos valores adicionados em cada setor produtivo,
a expressão acima sugere uma terceira forma de medida do Produto: pela soma dos rendimentos
totais pagos, em todos os setores. No exemplo acima, temos:
Salários totais + lucros totais + juros totais + aluguéis totais =
= (10 + 20 + 30) + (10 + 10 + 50) + (20 + 20 + 30) + (10 + 20 + 20) =
= 60 + 70 + 70 + 50 = 250 = valor do Produto
Anotemos, então:
Para medir o produto, podemos somar os rendimentos pagos em todos os
setores produtivos.
155
Essa nova maneira de medir o Produto chama atenção para um ponto importante: o número
que mede o Produto é o mesmo que mede a renda total gerada no processo produtivo. Podemos
escrever a seguinte igualdade (que é, de fato, uma identidade, resultante das definições adotadas):
Produto = Renda
2.3. Governo e setor externo
Consideramos, até aqui, o caso simplificado de uma economia sem governo e sem relações
com o resto do mundo. Vamos agora introduzir esses dois elementos: governo e setor externo.
Por governo entendem-se as três esferas da administração pública, federal, estadual e
municipal, incluindo autarquias e fundações; mas excluindo empresas públicas (como os Correios ou
a Caixa Económica) ou estatais (como a Petrobrás), que na Contabilidade Nacional são tratadas
juntamente com empresas privadas.
Temos agora três tipos de agentes atuando na economia: indivíduos (ou famílias), empresas e
o governo. Esquematicamente, os indivíduos vendem seus serviços para as empresas ou o governo,
compram bens e serviços das empresas, pagam impostos, detêm o capital das empresas e lhes
emprestam recursos. As empresas produzem e vendem bens e serviços, investem em bens de capital
e pagam impostos. E o governo arrecada impostos, compra bens e serviços das empresas, paga seus
funcionários e fornece à sociedade bens e serviços, gratuitamente (na maioria das vezes), ou lhe
transfere renda.
Com a introdução do resto do mundo, é necessário considerar a compra e venda de bens e
serviços no exterior (importações e exportações). Além disso, pode haver detentores de fatores de
produção que participem da atividade produtiva em determinado país mas residam em outros países.
Por exemplo: acionistas da Fiat brasileira residentes na Itália; um banco sediado em Nova York que
financie a venda de aviões pela Embraer; uma empresa da Alemanha que venda licença de suas
patentes a um produtor no Brasil — ou, ao contrário, empresas brasileiras detendo fatores de
produção em outros países, porsuas filiais ou subsidiárias. Essas situações dão origem a remessas de
rendimentos de fatores de produção entre países; as mais comuns são remessas de lucros, dividendos
e juros.
2.4. Produto e despesa
Para alguns objetivos, é útil considerar o Produto não pelo lado da produção, mas pelo lado
dos dispêndios: a destinação dada aos bens e serviços produzidos. No contexto das Contas Nacionais,
consideram-se os seguintes itens de despesa:
156
Consumo privado. São os bens e serviços comprados pelos indivíduos para satisfação de suas
necessidades e desejos.
Investimento privado. São, principalmente, os bens de capital comprados pelas empresas; o
único investimento feito por indivíduos é a compra de residências novas. Chama-se investimento
líquido o que representa um acréscimo ao estoque físico de capital (máquinas, equipamentos,
construções), fazendo aumentar a capacidade produtiva da economia. O investimento bruto é o
investimento líquido mais os gastos relativos à substituição de equipamento desgastado ou tomado
obsoleto. Esses gastos, que não aumentam a capacidade de produção, são chamados gastos de
depreciação. Assim, investimento bruto menos depreciação é igual a investimento líquido. Para uma
explicação mais detalhada do conceito de depreciação e sua aplicação na Contabilidade Nacional,
não deixe de ler o Anexo I, ao final deste texto.
São ainda também considerados investimentos os estoques de mercadorias existentes nas
empresas no final do período de referência (um ano, um trimestre), descontados os estoques do início
do período. Há certa analogia entre investimento líquido e estoques acumulados: ambos se
relacionam à possibilidade de maior consumo futuro.
Gastos do governo. Aqui entram os gastos de consumo do governo (bens e serviços de uso
coletivo comprados pelo poder público e postos à disposição dos indivíduos) e suas despesas de
investimento (gastos governamentais em construção civil, máquinas e equipamentos).
A razão de considerar em separado os dispêndios do governo e os do setor privado decorre do
fato de que esses grupos de gasto obedecem a motivações distintas. Os gastos privados, tanto de
consumo como de investimento, estão, em princípio, associados a objetivos de maximização:
maximização de lucros, pelos empresários, e maximização do consumo, ou da utilidade do consumo,
pelos indivíduos. Assim, as decisões de consumo e de investimento podem, em geral, ser objeto de
uma explicação analítica, a partir de princípios da teoria económica — como de fato se faz, na teoria
do consumidor e na teoria do investimento. Já as decisões de gastos do governo são de outra natureza,
dependendo mais de opções políticas que de uma lógica económica. A vantagem dessa distinção
ficará mais clara quanto estudarmos a teoria keynesiana, na 5a Unidade.
Exportações líquidas.4 É a diferença entre exportações e importações. As exportações são
gastos efetuados por residentes no exterior em bens e serviços produzidos no país considerado;
constituem, assim, dispêndios de estrangeiros em produtos do país. Mas é necessário subtrair as
importações, já que todos os elementos de dispêndio vistos antes podem conter uma parcela de bens
ou serviços importados — e o que interessa, quando medimos o Produto, é a produção feita no país.
4 Em Economia, o termo “líquido”, em geral, e de forma simplificada, se refere a uma operação de subtração. Assim, a
expressão “exportações líquidas” significa exportações menos importações.
157
Tanto gastos de consumo como de investimento, privados ou governamentais, costumam
incluir importações; e as próprias exportações podem ter um componente de insumos importados.
Quando você importa um iPad dos Estados Unidos no valor de US$400, essa transação aumenta o
consumo privado nessa importância (convertida em reais). É preciso então retirar os US$400 do
cômputo do Produto, ou de outra forma teríamos uma distorção: o Produto ficaria superavaliado. É
por isso que as importações entram com sinal negativo.
Temos, assim, uma nova maneira de exprimir o Produto:
Produto = consumo privado + investimento privado + gastos do governo +
+ exportações- importações
Essa igualdade costuma ser representada sinteticamente por:
P=C+I+G+X-M
E podemos agora acrescentar um elemento à igualdade (ou identidade) vista acima: o valor do
Produto é igual não só ao valor da renda gerada no processo produtivo como também ao valor das
despesas totais:
Produto = Renda = Despesa
2.5. Recapitulando: as três óticas de medida do Produto
A partir do que foi visto acima, vê-se que a medida do Produto pode ser feita por três
abordagens diferentes — ou, como é costume dizer, por três óticas distintas: a ótica da produção, a
ótica da renda e a ótica da despesa (ou ótica do dispêndio ou ótica do consumo).
Ótica da produção. Aqui há duas vertentes:
Produto = soma do valor dos bens finais
ou
Produto = soma dos valores adicionados
Ótica da renda. Lembrando que os valores adicionados são a remuneração dos fatores:
Produto = soma dos rendimentos pagos = salários + lucros + juros + aluguéis
Ótica da despesa. Lembrando que, como foram definidos, os gastos exaurem o Produto:
Produto = soma dos dispêndios = C + I + G+ X-M
158
Conceitualmente, é claro que o valor do Produto obtido por qualquer das óticas será o mesmo.
Em situações concretas, enfrenta-se a questão da disponibilidade de informações, e em geral se usa
uma combinação das várias abordagens. Para uma descrição dos métodos usados na Contabilidade
Nacional brasileira, consulte as notas metodológicas disponíveis no portal do IBGE na internet.5
2.6. O fluxo circular de renda
Pode ser útil, para melhor compreensão das relações entre os agentes económicos, visualizá-
las em um gráfico, comumente incluído em textos didáticos, representando o “fluxo circular de renda”
— as transações que estão por trás das grandezas representadas na Contabilidade Nacional.
Imaginemos uma economia simplificada, sem governo e sem transações com o exterior,
desconsiderando-se também a produção de bens intermediários e a formação de estoques. As
empresas produzem bens e serviços; os indivíduos ou famílias consomem bens e serviços e detêm os
fatores de produção (trabalho, capital, terra), que fornecem às empresas. As empresas, em
contrapartida, remuneram as famílias sob a forma de salários, lucros, juros ou aluguéis. Há, assim,
um ciclo de renda e de dispêndios: a renda flui através dos mercados de fatores de produção,
enquanto a despesa flui através do mercado de bens e serviços. Veja o quadro abaixo.
Quadro 3. Inter-relações de agentes económicos numa economia simplificada
Receita DespesaMERCADO DE BENS
E SERVIÇOS:
-> As empresas vendem
-> As famílias compram
Bens e serviços
vendidos
Bens e serviços
comprados
FAMÍLIAS:
-ÿCompram e
consomem bens e
serviços.
-> São proprietárias
de fatores de produção
e os vendem
EMPRESAS:
“ÿProduzem e vendem
Bens e Serviços
-ÿContratam e utilizam
fatores de produção
MERCADOS DE FATORES
DE PRODUÇÃO:
-ÿ As famílias vendem
-> As empresas compram
Insumos Terra, Capital e
, trabalho
<
Salários, Aluguéis e Lucros Renda
5 http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/economia/contasnacionais/2009/default_SCN.shtm
159
Setas externas: indicam o fluxo de dinheiro
O Produto dessa economia poder ser calculado de três maneiras: somando-se o valor dos bens
e serviços finais vendidos pelas empresas; somando-se a despesa total das famílias com os bens e
serviços vendidos pelas empresas ou somando-se a renda total (isso é, salários, aluguéis, juros e
lucros) paga às famílias pelas empresas.
3. Produto interno e Produto nacional
Nesta seção vamos falar do “I” da sigla PIB: qual é, afinal, a significação do adjetivo
“interno”, nas Contas Nacionais?
Numa economia aberta (que mantém transações com o exterior), vimos que parte do valor
adicionado pode ser remetida ao exterior, como remuneração a fatores de produção residentes ou
sediados em outros países. O Balanço de Pagamentos brasileiro (que vamosestudar na 6a Unidade do
curso) mostra, por exemplo, na conta de “Rendas”, remessas substanciais de lucros, dividendos e
juros ao exterior, o que corresponde à remuneração de investimentos externos no País ou
financiamentos obtidos no exterior. Empresas e indivíduos no Brasil também recebem rendas
decorrentes de valor adicionado no exterior; mas o montante desses recebimentos é menor do que o
das remessas. Nos últimos anos, as rendas recebidas têm sido, em média, cerca de um quinto das
rendas remetidas para outros países. 6
A igualdade entre Produto e Renda continua verdadeira, numa economia aberta, mas agora
uma parcela da renda gerada no País pertence a estrangeiros — e, em contrapartida, uma parte da
renda dos nacionais provém do exterior. Isso deu origem a duas novas definições, estabelecendo duas
subcategorias de Produto:
Produto interno: é a soma dos valores adicionados na atividade produtiva do país, tal como
visto antes; não se leva em conta se os detentores de fatores de produção residem ou não no país
considerado. Em outras palavras, ignoram-se tanto as remessas de rendimentos para o exterior como
os recebimentos de rendimentos do exterior. É a produção no país, dentro das fronteiras nacionais.
Produto nacional: é a soma dos valores adicionados apropriados pelos residentes do país.
Pode-se dizer que é a produção do país. Excluem-se do somatório de valores adicionados as
remessas de rendimentos para o exterior, e adicionam-se os rendimentos recebidos do exterior.
Assim:
6 Dados sobre as transações extemas do País podem ser vistos nos Boletins do Banco Central, disponíveis na internet:
http://www.bcb.gov.br/pec/boletim/banual201l/rel2011cap5p.pdf.
160
Produto nacional = produto interno- renda enviada ao exterior + renda recebida
do exterior
ou
Produto nacional = produto interno- renda líquida enviada ao exterior
Em países como o Brasil, onde as rendas enviadas são maiores do que as recebidas, a renda líquida
enviada ao exterior terá sinal positivo e, portanto, o Produto Nacional é menor que o Produto
Interno.7
Ao contrário, em países que investem muito no exterior, como os Estados Unidos, as rendas
recebidas são maiores que as enviadas, e o Produto Nacional é maior que o Produto Interno. Em
geral se dá mais atenção à grandeza de maior valor; assim, nos Estados Unidos, o item mais
divulgado, quanto ao desempenho da economia, não é o PIB, mas o PNB (Gross National Product,
GNP). É bom ter isso em mente para evitar confusões quando se lê um texto norte-americano de
Economia.
Qual a importância de distinguir Produto Interno de Produto Nacional? Por que introduzir
essas definições na Contabilidade Nacional? Você deve estar pensando: “Apenas para complicar a
vida dos estudantes de Introdução à Economia!”. Na verdade, a distinção decorre essencialmente do
interesse de manter coerência nos conceitos das Contas Nacionais. Se Produto é igual a Renda, então
a soma dos valores adicionados numa economia deveria indicar a renda total dessa economia. Isso é
verdade na economia fechada; mas a abertura da economia introduz uma ambiguidade: Produto e
Renda são iguais, mas a Renda Nacional não é mais igual à soma dos valores adicionados no país.
Para resolver essa ambiguidade é que se introduziram as duas definições, distinguindo Produto e
Renda Internos, de um lado, e Produto e Renda Nacionais, de outro. Os novos conceitos
restabelecem a coerência do conjunto de definições das Contas Nacionais.
4. Produto bruto e Produto líquido
A letra “B” na sigla PIB — Produto Interno Bruto
Produto os gastos relativos à depreciação, destinados a substituir os bens de capital que se
deterioraram ou se tomaram tecnicamente obsoletos.
indica que estão incluídos no valor do
7 A diferença é de poucos pontos percentuais, no Brasil. Por exemplo: o Produto Interno Bruto em 2007 atingiu R$2.598
bilhões, a preços correntes, enquanto o Produto Nacional Bruto foi apenas 2% menor: R$2.543 bilhões. Ver dados no
Boletim do Banco Central.
161
Quando falamos dos gastos de investimento, separamos conceitualmente o investimento
líquido, que representa um acréscimo à capacidade produtiva, do investimento bruto, que é a soma
do investimento líquido mais os dispêndios destinados apenas a repor a capacidade de produção
deteriorada. Uma parte dos bens de capital produzidos e vendidos constitui um aumento da
capacidade produtiva; outra parte se destina apenas a manter a capacidade de produção do estoque de
capital preexistente.
Para cobrir os dispêndios de reposição, as empresas separam uma parcela de sua receita para
compor uma Reserva de Depreciação. É um fundo destinado a custear a reposição dos equipamentos
que vão se deteriorando. Supõe-se que, em cada período, os gastos de reposição são financiados
pelas reservas de depreciação.
O Produto Bruto inclui o investimento bruto e, portanto, os gastos de reposição, enquanto o
Produto Líquido inclui apenas o investimento líquido. Temos a seguinte igualdade:
Produto líquido = produto bruto- reservas de depreciação
Outra vez, podemos nos perguntar sobre a significação dessa definição. E a resposta é
análoga à que vimos no caso de distinção entre Produto Interno e Produto Nacional: trata-se de
preservar a coerência do corpo de definições da Contabilidade Nacional. Antes, vimos que o valor
adicionado em cada setor produtivo é igual à soma dos rendimentos pagos, o que nos permite medir
o Produto pela ótica da renda. Mas as reservas de depreciação introduzem um problema: há uma
parte do valor adicionado que não constitui rendimento, não é paga a ninguém, fica retida na empresa
para custeio da reposição de equipamentos. A solução foi, outra vez, definir duas categorias de
Produto. Assim pela ótica da renda,
Produto bruto = salários + lucros + juros + aluguéis + reservas de depreciação
produto líquido = salários + lucros + juros + aluguéis
Da mesma forma, na ótica da produção,
Produto bruto = soma do valor dos bens finais
ou produto bruto = soma dos valores adicionados
162
Produto líquido = soma do valor dos bens finais- reservas de depreciação
ou produto líquido = somo dos valores adicionados- reservas de depreciação
Lembrando que as reservas de depreciação correspondem ao valor do investimento de
reposição. Para uma explicação mais completa sobre a medida da depreciação nas Contas Nacionais,
leia atentamente o Anexo I, ao final deste texto.
E, pela ótica do dispêndio:
Produto bruto = C + 1 (bruto) + G + X-M
Produto líquido = C + I (líquido) + G + X-M
5. Avaliação do Produto: que preços usar?
Há ainda uma distinção a fazer (a última!) na forma de medida do Produto. O Produto é
avaliado pelos preços vigentes no mercado, como vimos. Numa economia com governo, o preço de
mercado, pago pelos consumidores, inclui os impostos cobrados sobre as transações com bens e
serviços, os chamados impostos indiretos.8 Por outro lado, do ponto de vista dos produtores o preço
relevante é o recebido por eles, antes da incidência de impostos. Tendo em conta as duas
possibilidades de avaliação do produto — ou pelos preços pagos pelos consumidores, ou pelos
preços recebidos pelos produtores —, introduziram-se duas definições: a de Produto a preços de
mercado (que inclui os impostos indiretos) e a de Produto a custo de fatores (que os exclui).
Deve-se notar que o governo às vezes subsidia o consumo de alguns bens essenciais,
principalmente no caso de consumidores de renda mais baixa. O subsídio é como que um imposto
negativo; assim, consideram-se aqui os impostos indiretos menos os subsídios. Assim,
Produto a preços de mercado = produto a custo de fatores + impostos indiretos-subsídios
Calculado a partir da ótica da despesa, ou do valor dos bens finais, teremos o Produto a
preços de mercado. Já pela ótica da renda, ou pela soma dos valores adicionados, teremos o Produto
a custo de fatores.
8 Existem dois tipos básicos de impostos: os impostos diretos, que incidem sobre a renda ou o património de indivíduos e
empresas, dosquais o mais importante é o imposto de renda; e os impostos indiretos, cobrados sobre transações, dos
quais o mais importante, no Brasil, é o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), um tributo estadual.
163
I
6. Recapitulando
Vamos recordar as definições vistas acima:
Produto Interno Bruto (PIB) a preços de mercado
-menos *-
Rendas líquidas enviadas para o exterior
-é igual a-
Produto Nacional Bruto (PNB) a preços de mercado
-menos-
-Depreciação
-é igual a <-
Produto Nacional Líquido (PNL) a preços de mercado
-menos 4-
-Tributos indiretos
-mais -4-
-*. Subsídios ao consumo-
-é igual a 4-
Produto Nacional Líquido (PNL) a custo de fatores
u
UZ
Quando se fala em Renda Nacional, sem outra qualificação, em geral, isso significa 0 Produto
Nacional Líquido a custo de fatores.
7. Produto nominal e Produto real
Vimos acima que se o valor do PIB aumenta de um período para outro, há duas possíveis
explicações para esse fato: ou a economia passou a produzir mais bens e serviços, ou a produção é a
mesma (ou mesmo menor) e os preços aumentaram. Daí decorre um problema no uso do PIB como
indicador da produção de um país: como saber se as alterações do PIB são fruto de mais produção ou
de variação nos preços? É para isso que se faz a distinção entre PIB nominal e PIB real.
164
O PIB nominal avalia a produção de bens e serviços aos preços correntes no período
considerado. O PIB nominal é, assim, o produto das quantidades produzidas no período pelos preços
desse período. 9
O PIB real avalia a produção de bens e serviços, num determinado período, aos preços de um
ano-base — um ano cujos preços de mercado são tomados como padrão para mensuração. Utiliza-se,
portanto, um conjunto dado de preços: diz-se que o PIB é avaliado a preços constantes. Parte-se da
hipótese: qual seria o valor do PIB, no período analisado, se os preços do ano-base tivessem se
mantido? Desse modo, o PIB real é o produto das quantidades produzidas no ano em análise pelos
preços dos bens e serviços observados no ano-base.
O que se altera nas mensurações do PIB nominal e do PEB real são os preços: no primeiro
caso, usam-se os preços do ano corrente; no segundo, os preços do ano-base. A diferença entre o
valor do PIB nominal e do PIB real mostra os efeitos da variação de preços na economia entre o ano-
base e o ano em análise. Ou seja, o efeito da inflação.
Essa noção é fundamental para que você compreenda a ideia de deflacionamento, isto é, a
obtenção de variáveis reais, desconsiderando-se os efeitos da inflação acumulada no período sobre os
preços. O cálculo do Produto real não é única maneira de obter esses valores; há, também, o
deflacionamento por meio dos chamados índices de preços, que serão objeto de estudo no próximo
texto.
Vejamos agora um exemplo numérico.
Suponha uma economia simples em que se produzam apenas dois bens, batata frita e
refrigerante. Os preços e as quantidades produzidas desses bens em 2007, 2008 e 2009 estão
mostrados no Quadro 4.
Quadro 4. Produção e preços numa economia hipotética, 2007-2009
PRODUÇÃO E
PREÇOS ANOS
2008 20092007
R$4,00 R$5,00Preço da Batata Frita R$5,50
Quantidade de Batata 80 80100
9 Nonnalmente, a variação de preços dentro do período de análise (um ano, um trimestre) é pouco significativa, sendo
viável desconsiderar a inflação nesse intervalo. Mas em períodos de inflação muito acelerada, como antes de 1994, no
Brasil, é necessário introduzir mudanças na metodologia da Contabilidade Nacional, tendo em conta as alterações muito
frequentes nos preços.
165
Frita
Preço do Refrigerante R$2,00 R$2,50 R$1,20
Quantidade de
Refrigerante 150 120 200
O PIB nominal (PDBn) é dado pelo produto de preços e quantidades em cada ano considerado.
Desse modo, temos que:
PIBn2oo7= (R$4 x 100) + (R$2 x 150) = R$700
PIBnaoos = (R$5 x 80) + (R$2,5 x 120) = R$700
PIBn2oo9 = (R$5,5 x 80) + (R$1,2 x 200) = R$680
Em termos nominais, a produção da economia teria permanecido constante de 2007 para
2008, sofrendo uma ligeira queda em 2009.
Vejamos agora o PIB real (PEBr). Consideraremos 2007 como o ano-base.
PEBr2oo7= (R$4 x 100) + (R$2x150) = R$700
(No ano-base, é claro, o PIB real coincide com o PIB nominal).
PIBr2008 = (R$4 x 80) + (R$2 x 120) = R$560
PIBr2oo9 = (R$4 x 80) + (R$2 x 200) = R$720
Observe que, se descontarmos os efeitos das variações de preços, teremos uma situação bem
diferente da mostrada pelo PIB nominal: o PIB real em 2008 foi muito menor que o de 2007 (uma
queda de 20%), e não igual a este, como indicariam os valores nominais. E o PIB real em 2009 não
foi menor que o de 2008, mas, ao contrário, substancialmente maior que este (quase 30% maior),
superando o valor do ano-base.
Assim, para termos uma ideia correta do comportamento da economia ao longo do tempo, é
necessário analisar a evolução do PIB real: a comparação de valores nominais é enganosa, se há
alteração nos preços. É interessante notar, por exemplo, que entre 2007 e 2008 houve uma queda
expressiva na quantidade produzida de ambos os bens, e, no entanto, o PIB nominal não variou.
8. Deflator implícito do PIB
Como dissemos anteriormente, você será apresentado, no próximo texto, aos índices de
preços mais usados como medida da inflação, no Brasil, como o índice Nacional de Preços ao
166
Consumidor (INPC), o índice de Preços ao Consumidor Ampliado (EPCA) e o índice Geral de Preços
(IGP). Mas o cálculo do Produto Real fornece também uma medida da variação de preços. É, de
certa forma, a medida mais ampla da inflação, pois se baseia nos preços de todos os bens e serviços
produzidos na economia (enquanto os outros índices têm uma composição específica de bens e
serviços, como você verá). Mas os índices como o IPCA permitem um acompanhamento mais
frequente da variação de preços, mês a mês, ou mesmo semana a semana, o que não é viável no caso
do indicador baseado na medida do Produto.
Vimos que o PIB nominal se baseia nos preços e quantidades do período em análise (um ano,
suponhamos), enquanto o PEB real toma as quantidades desse ano e os preços do ano-base:
PIB nominal = preços correntes x quantidades correntes
PIB real = preços do ano-base x quantidades correntes
Se dividirmos o PIB nominal pelo PEB real, temos:
PEB nominal preços correntes x quantidades correntes preços correntes
PEB real preços o ano-base x quantidades correntes preços do ano-base
Vemos que a razão entre o PEB nominal e o PEB real nos dá a relação entre os preços
correntes e os preços do ano-base. O que é uma medida da variação de preços ocorrida entre o ano-
base e o ano considerado. É o chamado Deflator Implícito do PEB.
Para exprimir o Deflator como um número índice, atribuindo ao período-base o valor 100,
usamos a fórmula:
Deflator PIB nominal
Implícito =
do PIB
x 100
PIB real
Tomemos os exemplos dados acima:
PEBn2007 = R$700; PIBn2008 = R$700; PIBn2oo9 = R$680
PEBr2007 = R$700; PEBr2oos = R$560; PIBr2009 = R$720
O valor do Deflator Implícito do PIB para 2008 e 2009 (sendo 2007 o ano-base) será:
Deflator2oo8 = (700/560)xl00 = 125
167
Deflator2oo9 = (680/720)xl00 = 94,44
O Deflator Implícito do PIB indica que em 2008 o nível de preços foi 25% maior do que em
2007, enquanto em 2009 foi cerca de 5% menor do que no ano-base.
Para dar um exemplo mais concreto: o PIB nominal brasileiro foi, em 2011, R$ 4.143 bilhões.
O PIB real, a preços de 2010, foi R$ 3.873 bilhões. Conclui-se então que o Deflator Implícito do PIB
em 2011, tomando 2010 como base, foi 106,97. O aumento médio de preços em 2011, por essa
medida, foi, portanto, de 6,97% (7%, em números inteiros).10
Para se calcular a taxa de inflação em cada ano, em relação ao ano anterior, basta fazer o
seguinte cômputo:
DIPano 2 " DIPano 1Taxa de Inflação = x 100
DIPano 1
onde DIP é o valor do Deflator Implícito do PIB para o ano indicado.
No exemplo numérico que vimos usando, se você fizer as contas obterá, para o ano de 2009,
uma taxa de inflação de-24,45 %: uma redução de preços nesse percentual.Uma observação fmal: quando se divulgam dados do PIB trimestral, às vezes se apresenta o
“PIB anualizado” ou “a uma taxa anual”. Isso significa apenas que, grosso modo, multiplicou-se o
valor do PIB trimestral por 4, como estimativa de quanto seria o PIB anual caso se mantivessem as
condições de produção no período considerado. Mas para isso é necessário um ajustamento sazonal,
visto que a economia produz mais bens e serviços em determinadas épocas do ano que em outras. No
último trimestre, por exemplo, a produção de certos bens costuma ser maior do que no resto do ano,
devido à maior procura nas festas de fim de ano. Assim, normalmente os dados anualizados do PIB
trimestral são ajustados sazonalmente, de modo a refletir de maneira mais correta qual seria a
produção anual da economia em questão, caso se mantivesse o ritmo de produção do trimestre
considerado, respeitando-se as variações sazonais.
10 Dados em IpeaData: http://www.ipeadata.gov.br/
168
APLICAÇÃO
Medidas do PIB brasileiro
O quadro abaixo apresenta dados recentes das contas nacionais do Brasil; São apresentados
os valores adicionados por setor da economia (agropecuária, indústria, serviços). Além disso, são
apresentados os componentes do PIB brasileiro pela ótica da despesa (consumo das famílias, gastos
do governo, investimento, exportações e importações).
Observando os valores da coluna “PIB”, que se refere aos totais anuais, você pode ter uma
boa ideia dos valores nominais absolutos do PIB brasileiro, a custo de fatores e a preços de mercado.
A rubrica “Investimento” inclui os valores da formação bruta de capital fixo (FBCF) e da
variação de estoque (VE). Na base de dados do IBGE, da qual foram retirados os dados da tabela,
aparecem os valores da FBCF e da VE em separado. Por razões didáticas e para os fins de nosso
curso introdutório, optamos por somar os valores da FBCF+VE e registrá-los, na tabela abaixo, como
“Investimento”.
Consumo
Gastos do
Governo
Período Agropecuária Indústria Serviços das Investimento Exportações Importações PIB
Famílias
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013.1
2013.11
40.958
44.824
47.845
50.782
57.241
66.819
84.251
108.619
115.194
105.163
111.566
127.267
152.612
157.232
171.177
192.653
196.119
59.698
74.379
193.025 508.878 545.735
217.033 568.771 609.294
222.200 595.951 629.994
240.735 636.321 689.376
283.321 681.086 758.941
301.171 750.623 826.468
344.406 844.472 912.058
409.504 952.491 1.052.759
501.771 1.049.293 1.160.611 332.333
539.283 1.197.807 1.294.230 347.976
584.952 1.337.903 1.428.906 397.027
636.280 1.524.311 1.594.067 487.761
719.987 1.707.850 1.786.840 627.497
749.699 1.887.448 1.979.751 577.846
905.852 2.150.151 2.248.624 763.012
972.156 2.366.062 2.499.489 817.261
983.395 2.561.241 2.744.452 776.465
230.201 650.527 722.896
260.860 689.773 740.900
143.812
163.658
166.755
174.412
215.257
234.754
239.351
268.095
55.421
64.056
67.890
100.229
117.691
158.619
208.323
254.770
318.892
324.842
340.457
355.672
414.295
355.653
409.868
492.570
552.843
121.073
151.837
169.604
186.854
202.108
216.174
226.085
258.043
304.044
329.596
373.284
427.553
474.773
539.061
612.105
687.001
797.332
856.647
944.543
212.915
242.431
70.606
84.714
87.471
115.191
138.492
175.748
185.954
205.272
243.622
247.362
271.679
315.217
408.534
360.847
448.752
522.953
615.765
159.148
175.958
843.966
939.147
979.276
1.065.000
1.179.482
1.302.136
1.477.822
1.699.948
1.941.498
2.147.239
2.369.484
2.661.344
3.032.203
3.239.404
3.770.085
4.143.013
4.402.537
1.110.420
1.201.896
212.683
242.686
Quadro 5. Classes de atividade no valor adicionado a custo de fatores e componentes do PIB
pela ótica da despesa, em valores correntes (em milhões de R$)
Fonte: Contas Nacionais Trimestrais em valores correntes, IBGE, Abril/Junho 2013. Disponível em:
http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/indicadores/pib/defaultcnt.shtm.
169
/ÿ>
Algumas comparações internacionais
O quadro abaixo apresenta os valores do PIB de algumas economias selecionadas, incluindo o
Brasil. Os dados estão em milhões de dólares, a preços constantes, para que você possa comparar os
valores. Procure observar o nível de produto do Brasil frente a economias dos países do
MERCOSUL (Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai, Venezuela), do agrupamento BRICS (Brasil,
Rússia, índia, China, África do Sul), dos Estados Unidos e de países europeus constantes da tabela.
Quadro 6. Produto Interno Bruto a preços constantes para economias selecionadas, em milhões de
dólares
2008 2009 2010 2011/’ÿN 2012
328.468Argentina
Austrália
308.740 370.263 448.165 477.036
1.050.361 1.008.728 1.283.352 1.515.468 1.564.566
17.340 19.650Bolívia 16.674 23.949 27.086
Brasil 1.653.538 1.620.165 2.143.035 2.476.651 2.253.728
1.502.678 1.337.577 1.577.040 1.736.869 1.773.288Canadá
Chile 179.627 172.591 216.309 248.592 265.939
China 4.531.831 5.069.470 5.951.462 7.203.784 8.094.362
2.838.376 2.625.240 2.571.225 2.781.435 2.610.779França
Alemanha 3.623.688 3.298.634 3.306.028 3.604.061 3.391.480
Grécia
índia
341.188 321.795 301.065 299.001 256.722
1.294.113 1.334.018 1.678.297 1.897.608 1.857.547
201.660 194.865 217.445 242.920 240.024Israel
2.307.312 2.111.147 2.056.941 2.195.937 2.012.823Itália
4.849.185 5.035.142 5.488.424 5.870.357 5.937.203Japão
Coreia do Norte 12.139 12.38513.337 12.035
1.014.890 1.116.247 1.155.679931.405 834.060Coreia do Sul
1.031.109 1.155.206 1.173.4351.091.981 880.103México
Paraguai
Polónia
Portugal
Rússia
22.89016.887 14.295 18.331 22.731
529.423 469.799 487.528430.912 514.115
251.925 234.084 228.688 237.586 212.265
1.660.848 1.222.646 1.487.516 1.857.770 1.977.996
455.922 597.086 648.599Arábia Saudita
África do Sul
476.305 376.692
363.523273.870 283.012 408.237 390.282
170
Espanha
Suécia
Suíça
Turquia
Reino Único
Estados Unidos
Uruguai
Venezuela
1.593.421 1.455.956 1.389.166 1.478.206 1.350.907
486.159 405.783 463.062 539.387 524.873
529.371 513.975 555.841 666.947 638.408
730.325 614.570 731.144 774.983 791.356
2.648.935 2.183.862 2.266.094 2.429.184 2.432.416
14.314.670 13.995.447 14.518.157 15.092.796 15.698.325
30.366 30.497 39.412 46.710 49.395
315.600 329.419 393.808 315.893 380.118
Fonte: Unctad Statistical Data Base (2013). Disponível em: http://imctadstat.unctad.org/
ANEXO I
A medida da depreciação nas contas nacionais
A Depreciação das Contas Nacionais tem uma contrapartida na contabilidade das empresas.
O empresário sabe que tem que destinar recursos para repor o equipamento desgastado, ou de outra
forma veria a capacidade produtiva de suas instalações diminuir com o tempo; assim, nas
demonstrações contábeis das empresas, deduz-se uma parcela da receita líquida para compor uma
Reserva de Depreciação. Há várias formas de calcular essa reserva; a mais simples seria supor uma
determinada vida útil para o equipamento (por exemplo, dez anos) e reservar, cada ano, uma fração
correspondente do valor do equipamento (um décimo, no exemplo) para sua reposição. Seria uma
aproximação da situação real em que as máquinas vão perdendo gradualmente a capacidade
produtiva, até virarem sucata.
Em princípio, as Reservas de Depreciação das empresas equivalem conceitualmente à
Depreciação da Contabilidade Nacional, e poderiam servir de base para a medida do valor desta
última. Mas há sérios problemas nisso. Sobre as Reservas de Depreciação não incide o imposto de
renda; assim, o cálculo dessas reservas, na contabilidade das empresas, é determinado mais pelas
regras referentes a deduções permitidas do lucro tributável, na legislação do imposto de renda, do
que por critérios objetivos associados ao desgaste e obsolescência do equipamento. Acresce que as
empresas em geral avaliam contabilmente seus equipamentos pelo valor histórico (preço pelo qual
foram adquiridos), enquanto do ponto de vista dasContas Nacionais o valor de reposição seria o
relevante. Ou seja, as Reservas de Depreciação da contabilidade privada são um indicador muito
imperfeito da Depreciação das Contas Nacionais.
171
o
Por tudo isto, o sistema brasileiro de Contas Nacionais optou, durante algum tempo, por
simplesmente estimar a Depreciação a partir de um critério arbitrário: a Depreciação seria 5% do
Produto Bruto. Mais recentemente, contudo, deixou-se inteiramente de lado essa estimativa, de tal
forma que não se registra mais, nas Contas Nacionais brasileiras, o item “Depreciação”. O valor que
aparece, na Conta de Capital, é a “Formação Bruta de Capital Fixo”. Adicionando-se a esse valor a
variação de estoques, tem-se o Investimento Bruto. De certa forma há uma perda de informação
importante, pois o valor que interessa, do ponto de vista do crescimento da economia, é o
investimento líquido. Mas é forçoso reconhecer que as formas disponíveis de avaliar a Depreciação
são muito imprecisas.
''“'N
r\
172
*XX XXX índices de preços BXX
XXX
X
XBH
BIntrodução à Economia
Universidade de Brasília
XX
XXX
BXX
XBEl
kÿi
Flávio Rabelo Versiani, Bruno Pereira Rezende, Michael William Dantas Lima
1. Introdução
Na segunda unidade do curso estudamos a determinação de preços, pela interação da oferta e
procura; vimos como o preço de determinado bem pode tender ao aumento ou à redução, sob certas
circunstâncias. Por exemplo: se um artigo fica na moda, a demanda por ele aumenta, e seu preço
tenderá a subir. Mas sabemos que os movimentos de preços podem também ocorrer de forma
generalizada, ao longo do tempo, havendo períodos de alta geral de preços (o que caracteriza uma
inflação) e, menos comumente, períodos de queda conjunta de preços (uma deflação). Essas
alterações gerais de preços podem afetar profundamente os agentes económicos: a inflação onera o
orçamento dos assalariados, pode levar à falência quem tenha se comprometido a produzir algo por
um valor fíxo, pelo aumento de custos, etc. Isso ressalta a importância de medir as variações gerais
de preços. Esse é o propósito dos índices de preços.
2. Definições Conceituais
2.1. índices de Preços
Um índice de preços é um indicador da variação média de um conjunto de preços, entre um
período tomado como base e o período considerado. Atribui-se ao período-base o índice 100; o valor
do índice para o outro período indicará a porcentagem de aumento ou redução média de preços,
nesse intervalo de tempo.
Por exemplo: o índice Nacional de Preços ao Consumidor (definido abaixo), tendo como base
dezembro de 1993 (INPC=100), foi, em fevereiro de 2009, igual a 3.003,43. Considerando que o
INPC do mês anterior fora 2.994,15, conclui-se que o aumento de preços, medido por esse índice, foi
de 0,31%, entre janeiro e fevereiro de 2009.
Ou seja, o aumento percentual de preços em fevereiro, em relação a janeiro (a taxa de
inflação de fevereiro), medida pelo INPC, foi:
ÍNDICE DE PREÇOS (FEV.)- ÍNDICE DE PREÇOS (JAN.)
TAXA DE INFLAÇÃO (FEV.) = X 100
ÍNDICE DE PREÇOS OAN.)
Não há uma única taxa de inflação, pois há várias maneiras possíveis de construção de um
índice de preços, dependendo do uso que se pretenda fazer desse instrumento de medida.
2.2. Os índices de Preços ao Consumidor
A classe de índices mais conhecida é a dos índices de Preços ao Consumidor (IPCs), também
chamados de índices do Custo de Vida, que expressam a variação de preços dos bens e serviços
consumidos por uma unidade familiar típica.
O cômputo de um índice de preços baseia-se num sistema de ponderação, que define a
importância relativa de cada bem ou serviço no conjunto de preços considerado. No caso do IPC,
utiliza-se o peso relativo de cada item no dispêndio do consumidor. Obviamente, a variação no preço
de um item que constitui boa parte da despesa mensal de um consumidor (como aluguel, ou gastos de
alimentação) terá efeito mais importante, em seu orçamento, do que a de um artigo que pesa pouco
em seus gastos (caixas de fósforos, por exemplo). Assim, os IPCs são médias ponderadas da variação
de preços que afeta um consumidor típico.
Como se define o consumidor “típico”? Isso vai depender do objetivo que preside a
elaboração de cada IPC. Por exemplo: o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (EBGE),
vinculado ao Ministério do Planejamento, produz dois IPCs: o índice Nacional de Preços ao
Consumidor (INPC) e o índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). O INPC se
destina a medir a variação de preços para famílias, com o chefe assalariado, de renda mais baixa (que
são geralmente as famílias mais afetadas pela inflação), procurando cobrir cerca de metade daquelas
famílias. Assim, baseia-se atualmente numa amostra de famílias com o rendimento familiar mensal
de 1 a 5 salários mínimos. Já o IPCA procura medir o movimento geral de preços no mercado
varejista, e assim considera famílias com renda, de qualquer fonte, entre 1 a 40 salários mínimos
(excluindo, dessa forma, famílias de rendas muito baixas ou muito altas, cujos hábitos de consumo
são em geral menos uniformes). As famílias nessa faixa de renda representam mais de 90% do total
de famílias brasileiras.
174
A determinação das ponderações, nos IPCs, é feita por meio de uma Pesquisa de Orçamento
Familiar (POF). aplicada a uma amostra de famílias do nível de renda escolhido. A POF determina o
percentual da despesa mensal, nas famílias da amostra, correspondente a cada bem ou serviço; esse
percentual define o peso a ser aplicado à variação do preço respectivo, no cálculo do índice. No caso
do IBGE, a última POF foi feita em 2002-2003, e sua ponderação implantada em 2006.
A coleta de preços, feita periodicamente (nos principais IPCs, semanalmente) é outra etapa
fundamental. Essa coleta objetiva determinar o preço médio a que cada bem ou serviço é
comercializado, em uma dada localidade.
Há vários outros IPCs calculados no Brasil; por exemplo, índices de cobertura regional ou
local. Além disso, outras entidades que não o IBGE, como a Fundação Getúlio Vargas (FGV) e a
Fundação Instituto de Pesquisas Económicas da Universidade de São Paulo (FEPE-USP), produzem
também seus índices. Essa multiplicidade de indicadores de preços se relaciona com o longo e
intenso processo inflacionário por que passou a economia brasileira, até o Plano Real, em 1994. Nos
dez anos anteriores a 1994, raramente o aumento de preços mensal foi menor do que 10%, e muitas
vezes excedeu 20%. Nesse regime de alta inflação, há grande interesse por parte da população em
saber como variam os preços, pois isso define a evolução do valor real dos rendimentos de cada um
(se meu salário não varia e os preços dobram, meu poder de compra se reduz à metade). Esse
interesse estimulou o surgimento de diversos IPCs, na busca de indicadores que refletissem, da forma
mais acurada possível, a variação de preços (e da renda real) para determinadas parcelas da
população. IPCs eram amplamente utilizados, naquele período, como evidência da perda de poder de
compra dos salários, o que embasava reivindicações de aumentos nos salários nominais que
compensassem tais perdas.
2.3. Outros índices
Além de consumidores, outros grupos têm também interesse no acompanhamento de
variações de preços (especialmente quando a inflação é muito alta). Assim, o índice de Preços por
Atacado flPAt. calculado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), mede a variação média dos preços
de matérias-primas (relevante, por exemplo, para grandes empresas). O IPA é também uma média
ponderada, mas o sistema de ponderação é diferente do usado nos IPCs. O índice Nacional de
Preços da Construção Civil (INCC). calculado também pela FGV, mede, como o nome indica, a
variação dos preços que incidem sobre o custo de construção, ponderados pela incidência relativa no
custo total de uma obra típica (há subíndices para diferentes tipos de obras). E existem também
índices abrangentes, como o índice Geral de Preços fIGPf e o Deflator do PIB. que serão discutidos
abaixo.175
/-S
Veremos abaixo um panorama mais detalhado dos índices de preços mais importantes. Antes,
porém, vamos examinar mais de perto a forma de cálculo de um IPC. Isso nos ajudará a compreender
melhor a significação desse índice.
3. Cálculo do índice de preços ao consumidor
O cálculo do IPC pode se dar, em princípio, de diferentes formas, de acordo com a
metodologia e a ponderação adotadas.
Ponderação. Existem duas maneiras básicas de ponderar os preços dos diversos bens e
serviços, no cálculo de um índice de preços: ou se toma, para ponderação, a estrutura de consumo do
período-base (o que os estatísticos chamam de “critério de Laspeyres”), ou a estrutura de consumo
do ano atual (“critério de Paasche”). A literatura técnica discute as vantagens e desvantagens teóricas
desses critérios (e de outros que têm sido propostos); na maioria das vezes, no entanto, considerações
de ordem prática (em particular, a complexidade e custo de realização das Pesquisas de Orçamento
Familiar), fazem com que se adote uma ponderação com base no passado. Enquanto não se faz uma
nova POF — o que pode levar vários anos mantêm-se as ponderações derivadas da POF anterior.
(No caso do IBGE, por exemplo, as últimas POFs foram feitas em 1987-1988, 1995-1996 e 2002-
2003).
Em situações concretas, portanto, os cálculos têm características comuns. A compreensão de
como é calculado o IPC para uma pequena cesta hipotética de consumo, com dois ou três bens
apenas, facilita o entendimento desses cálculos. Vamos supor um índice calculado por ponderação a
partir do ano base, o que será apresentado a seguir.
Considere as seguintes informações a respeito do consumo de uma cesta de bens simplificada
de um consumidor típico, em 2008 e 2009:
2008 2009
Quant. Quant.Preço Preço
Refrigerante 2,00 2,50 47
9Sanduíche 3,00 6 2,00
Batata Frita 4,00 2 4,00 3
Tomando 2008 como o ano base, vamos utilizar para ponderação as quantidades consumidas
nesse ano. Percorremos, então, os passos que se seguem:
1) Cálculo da despesa com cada bem da cesta de consumo, em 2008.
2) Cálculo do percentual da despesa total correspondente a cada bem, em 2008 (o que define
a ponderação).
176
3) Cálculo dos índices parciais (variação percentual no preço de cada bem).
4) Cálculo do IPC: média ponderada dos índices parciais.
2008 2009
índices dePreço Quant. Preço Quant. Despesa
em 2008
Pesos
(participação
de cada bem
na despesa
total em
Cálculo do
(RS) (R$) IPC (médiapreço
parciais
(2008=100)
(R$) ponderada
dos índices
parciais)
2008)
Refrigerante 2,00 7 2,50 4 14,00 0,35 125 43,75
Sanduíche 3,00 6 2,00 9 18,00 0,45 66,7 30,00
Batata Frita 4,00 2 4,00 3 8,00 0,20 100 20,00
Totais 40,00 1,00 93,77
Siga os passos no quadro acima.
1° passo. Primeiramente, calculamos a despesa do consumidor com cada bem. Isso pode ser
feito multiplicando-se as colunas “preço” e “quantidade” no ano base (2008). A despesa com
refrigerante, portanto, é igual a 7 x R$2,00 = R$14,00, e assim sucessivamente. Está terminada a
primeira etapa do cálculo do EPC. A segunda etapa refere-se ao cálculo do peso de cada bem na cesta.
2° passo. Para calcular o peso do bem na cesta, basta dividirmos a despesa individual do bem
pelo somatório de todas as despesas. Somando-se R$14 + R$18 + R$8, temos uma despesa total de
R$40. Assim, os pesos de cada bem podem ser calculados dividindo-se a despesa com esse bem por
40. Para o refrigerante, por exemplo, o peso será igual a: 14/40 = 0,35. Devemos fazer o mesmo para
os demais bens.
3° passo. Agora, devemos calcular a variação do preço de cada bem da cesta de 2008 para
2009 (ou seja, os índices de preço parciais). Para fazer isso, devemos dividir o preço do bem em
2009 pelo preço do bem em 2008 e multiplicar o valor resultante por 100. Para o refrigerante,
teremos: 100 x 2,50/2,00 = 125. Fazendo isso para os demais bens, agora só resta calcularmos a
média ponderada desses índices parciais.
4° passo. O IPC, ou seja, a média ponderada dos índices parciais, é obtido multiplicando-se
cada um desses índices (obtidos no 3o passo) pelo respectivo peso (obtido no 2o passo) e somando
esses produtos. Assim, para o refrigerante teremos: 0,35 x 125 = 43,75. Procedendo da mesma
maneira para os demais bens, e somando os resultados, chegamos ao número final, mostrado na
177
célula inferior da última coluna, na tabela acima: o valor do IPC em 2009 é igual a 43,75 + 30,00 +
20 = 93,75.
O que isso significa? Nosso IPC passou de 100, em 2008, para 93,75, em 2009. O
consumidor típico gastaria, em 2009, uma quantia menor (6,25% menor), para comprar a mesma
cesta de consumo que comprava em 2008.
De fato, no entanto, nosso consumidor típico em geral não compraria as mesmas quantidades
que antes: ele tenderia a reduzir seu consumo do que ficou mais caro, e comprar mais do que ficou
mais barato, como indicado na curva de demanda usual (o que é exemplificado na tabela acima).
Com os dados da tabela poderíamos também calcular um EPC utilizando a ponderação dada pelas
quantidades consumidas no ano presente (2009); os passos a seguir seriam inteiramente análogos.
Quem se der ao trabalho de segui-los, verá que o resultado será inferior ao obtido acima: o IPC
calculado pelo “critério de Paasche” (ponderação pelo ano corrente) é, em números redondos, 85,1
(em vez de 93,75). Isso é o que geralmente acontece, justamente por causa do efeito da variação de
preços sobre a quantidade demandada: os bens que aumentaram de preço (e tiveram redução na
quantidade demandada) tenderão a ter ponderação maior, pelo critério do ano base (quando eram
mais demandados). Costuma-se dizer que a ponderação pelo ano base tende a exagerar aumentos de
preços (e a ponderação pelo ano corrente tende a mascará-los).
Esse tipo de consideração leva os estatísticos a discutirem os prós e contras da ponderação
pelo ano base ou pelo ano corrente (ou de outras metodologias possíveis), no cômputo de um IPC.
Mas isso não precisa nos preocupar aqui. Pois, como se disse acima, nos casos concretos se usa,
quase sempre, a ponderação a partir de uma dada POF, pela maior praticidade e menor custo. Ou
seja: a generalidade dos IPCs se baseia numa ponderação passada.
Para quem gosta de fórmulas, o cálculo pelas duas ponderações pode ser representado como
/-> se segue:
Ponderação pelo ano base:
Sendo:
I (pc x qb)
IPCB = X pc - preço no ano corrente
I (pb x qb) 100
Pb - preço no ano basePonderação pelo ano corrente:
qc - quantidade no ano
corrente
I (Pc x
IPCc= -%}-
/-N
X
MPbX íoo
qb - quantidade no ano base
178
Os resultados do cômputo das fórmulas serão, evidentemente, os mesmos obtidos a partir dos
passos indicados acima. Mas atenção: caso se peça que você mostre o peso relativo de cada bem na
cesta, você deve fazer o cálculo passo a passo, para determinar essas ponderações.
Em uma tentativa de se diminuir as distorções entre os índices de Laspeyres e Paasche,
propôs-se a utilização do índice de Fischer. Este é definido pela média geométrica1 entre os valores
calculados pelos critérios de Laspeyres e de Paasche, o que dá como resultado uma maneira mais
correta para calcular as variações em volume do PIB entre dois períodos consecutivos, bem como o
cálculo da inflação anual que afeta o PIB. Em resumo, temos:
índice de Fischer = V(IL x
sendo IL o valor do índice de Laspeyres e IP o valor do índice de Paasche.
4. Problemas e limitações dos índices de preços
Como a maioria dos métodos e ferramentas utilizados em ciências sociais, o IPC apresenta
alguns problemas e limitações. Cabe indicar aqui três dessas limitações.
Dois deles envolvem a questão da ponderação utilizada. Como visto acima, os IPCs em geral
trabalham, durante certo período, com uma cesta fixa de consumo, determinada por uma Pesquisa de
Orçamento Familiar. Disso decorrem problemas: a substituição de itens de consumo, consequente â
variação de preços, e a introdução de novos bens na cesta de consumo.
Em primeiro lugar, como dito acima, mudanças de preçostendem a provocar uma
substituição de itens de consumo por outros: quanto maior o preço de um bem, maior será a procura
por bens mais baratos que possam substituí-lo, na cesta de consumo (caso existam esses substitutos
próximos). Baseado em cesta de consumo fixa, um BPC pode apontar uma variação de preços que
distorce a realidade. Por exemplo: se ocorre um grande aumento no preço do arroz, é possível que os
consumidores diminuam o consumo desse artigo e aumentem, por exemplo, suas compras de
macarrão. Nesse caso, pode-se dizer que o efeito do aumento do preço do arroz sobre o bem-estar do
consumidor será exagerado, quando se usa um índice baseado no consumo de arroz no ano base.
Em segundo lugar, a introdução de novos bens pode também trazer distorções. O IPC baseado
numa Pesquisa de Orçamento Familiar de anos atrás não medirá o gasto dos consumidores com bens
que foram introduzidos desde então. Enquanto não houver uma nova POF, o IPC ficará defasado,
especialmente em períodos que presenciam grandes inovações na composição do consumo da família
típica. A comparação entre as duas últimas POFs feitas pelo IBGE (a de 2002-2003 e a de 1995-
1996) ilustra isso: verificaram-se alterações significativas na estrutura de consumo, em todas as
1 Neste caso, a média geométrica é dada pela raiz quadrada do produto dos dois índices.
179
A
faixas de renda, com o aumento de importância, por exemplo, de gastos com telefones celulares,
computadores, locadoras de vídeo, lan houses, etc.
Em terceiro lugar, deve-se notar que os IPCs não indicam mudanças de qualidade. Um
produto pode, com o passar dos anos, manter o mesmo preço, mas ter seu valor de uso
substancialmente aumentado, ou gerar um fluxo maior de serviços, como resultado de incrementos
de qualidade. Ou o preço pode subir, sem que de fato isso decorra de um processo inflacionário, já
que a qualidade também aumentou. Se um artigo é mais caro, mas tem maior durabilidade,
envolvendo menores gastos de conserto e reposição, no fim das contas pode resultar mais barato;
mas isso não será refletido no IPC, como habitualmente computado. O contrário também é válido:
quedas de qualidade não são, igualmente, detectadas.
Além dos três problemas supracitados, relacionados ao IPC, o uso de índices de preços pode
também envolver outros tipos de problemas, derivados, por exemplo, de características de seu
cálculo. Nesse sentido, a metodologia de cálculo do índice Geral de Preços, da Fundação Getúlio
Vargas, muito utilizado por nós (e sobre o qual falaremos a seguir), tem sido criticada recentemente
por vários economistas; ver, sobre isso os textos de Roberto Macedo e Paulo Rabello de Castro,
disponíveis na página do curso de Introdução de Economia (pasta “Material Complementar”).
5. índices gerais de preços
O índice Geral de Preços tlGPt
A Fundação Getúlio Vargas, instituição fundada em 1944, produz desde aquela época vários
índices de preços, destacando-se um IPC (inicialmente restrito ao Rio de Janeiro e agora com
cobertura nacional), o índice de Preços por Atacado ÍIPAI e o índice Nacional de Preços da
Construção Civil ONCC). já mencionados acima. Com base nesses três índices, a FGV elabora o
índice Geral de Preços, como um indicador-síntese da inflação no País. O IGP é uma média
ponderada do IPA (com peso de 60%), BPC (peso de 30%) e INCC (peso de 10%). Estabelecidas em
1950, período em que a produção de estatísticas económicas era ainda incipiente no Brasil, essas
ponderações pretendiam representar, grosso modo, a importância relativa, no PIB, do valor
adicionado nas atividades ligadas à produção e comercialização por atacado (IPA), no comércio de
varejo e serviços de consumo (IPC), e na construção civil (INCC). É evidente que tais proporções,
ainda que fossem aproximadamente corretas naquele período, perderam desde muito uma relação
próxima com as Contas Nacionais. A aplicação, ainda hoje, desse critério original de ponderação está
muito associada à ampla utilização do IGP, desde os anos iniciais de seu cômputo, como indicador da
inflação (especialmente na correção de valores em contratos de obras públicas e de aluguéis, e em
transações financeiras). Dado esse uso generalizado, uma mudança no cálculo do IGP poderia afetar,
180
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num dado momento, usuários do índice em vários setores da economia. De certa forma, a
manutenção de uma mesma metodologia, por mais de meio século — embora sem nenhuma lógica
económica —, é vista pelo mercado como um fator de credibilidade do IGP.
Por outro lado a correção monetária pelo IGP pode trazer distorções, em certos casos. A
grande ponderação atribuída ao IPA toma o IGP muito sensível a variações na cotação do dólar, pois
muitas matérias-primas têm seu preço diretamente relacionado ao preço no mercado internacional.
Com isso, o IGP pode se afastar consideravelmente de outros indicadores, como o INPC, em
períodos de grande desvalorização (ou valorização) do real. Essa é o foco de críticas que têm sido
dirigidas ao IGP, como as mencionadas nos textos citados acima.
A FGV computa duas séries de IPAs, que dão origem a dois IGPs: a série “disponibilidade
interna” e a série “oferta global”. A primeira (a mais usada) exclui alguns produtos que são
basicamente de exportação.
O índice Geral de Preços de Mercado ÍIGP-IVP
Os resultados mensais do IGP, assim como da maioria dos índices de preços, são divulgados
nos primeiros dez dias do mês subsequente. Assim, a correção monetária de um valor feita no final
de um determinado mês (o que é comum em certos contratos, como os de aluguel) teria que usar o
índice do mês anterior; no período de alta inflação, antes de 1994, isso causava problemas. A FGV
passou então a calcular um novo índice, que em lugar de se basear no levantamento de preços do
primeiro ao último dia do mês, parte do cotejo de preços apurados entre o dia 20 de um mês e o
mesmo dia do mês seguinte. Dessa forma, o índice relativo a março, por exemplo (na verdade,
relativo ao período de 20 de fevereiro a 20 de março), estará disponível já no final de março. Esse
novo índice é o IGP-M, amplamente usado, até hoje, no mercado financeiro.
O Deflator do PIB. O cômputo do Produto Interno Bruto, como parte da elaboração das
Contas Nacionais pelo IBGE, tem como subproduto um índice geral de preços da economia: o
Deflator do PIB. O PIB é calculado inicialmente a preços correntes; em seguida, procede-se ao
cálculo da variação real da produção em relação ao ano anterior (descontada a inflação), setor a setor
da economia, com a utilização de índices de preços setoriais, o que converge na determinação do PIB
a preços constantes.
A relação entre o PIB nominal (a preços correntes) e o PIB real (a preços constantes) define o
Deflator do PIB:
Deflator do PIB = PIB NomÍnalx IQQ
PIB Real
181
r\
O Deflator é, assim, uma média da variação de preços de todos os bens e serviços produzidos
no país, ponderada pela participação relativa, no PIB, do valor adicionado por cada um desses setores
produtivos. Nesse sentido, pode ser considerado o índice de preços mais abrangente da economia.
6. Os índices de preço brasileiros: visão de conjunto
O Brasil se destaca intemacionalmente pelo considerável número de índices de preços,
particularmente IPCs, calculados no País; como vimos, isso é uma herança de nosso passado
inflacionário. Mesmo após o fim da alta inflação, manteve-se essa multiplicidade de indicadores,
pois continuou a haver demanda do público por eles. Algumas mudanças intempestivas na
metodologia dos índices oficiais de inflação, anos atrás, despertaram em alguns a desconfiança de
que houvesse uma manipulação deliberada desses índices, por parte do governo. Mesmo que
ninguém ponha em dúvida, hoje em dia, a correção técnica dos índices do IBGE, permanece a
preferência de certos usuários por índices elaborados por instituições independentes. As mais
importantes dessas são a FGV e a FIPE-USP, já mencionadas, e o Departamento Intersindical de
Estatística e

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