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o mundo globalizado Nelson Leirner, Sem titulo, da serie Assim e ... se Ihe parece 1(2003). Fotografia (120 x 218 cm). o artista contemporaneo critica como a globaliza<;:ao se da, utilizando a bandeira americana para cobrir 0 mapa-mundi. A globaliza<;:ao e um processo irreversivel, que traz em seu bojo aspectos positivos e negativos. Resta aos parses perifericos denunciar a assimila<;:ao passiva de valores das culturas hegem6nicas e buscar formas alternativas de intercambio mundial. Primeira parte - a que e globalizagao Se olharmos a hist6ria da humanidade, veremos que as sociedades tradicionais mudam muito lentamente, 0 que permite as novas gera<;:oes a adapta<;:ao segura a he- ran<;:arecebida. A extrema rapidez das mudan<;:as, po- rem, tem nos deixado perplexos. Na socie- dade contemporanea, as noticias nao che- gam como antigamente, no "Iombo dos bur- ros"; ao contrario, podem se disseminar ins- tantaneamente por todo 0 globo, pelas infovias. Do mesmo modo, as cren<;:as soli- dificadas perdem a for<;:aque dava segu- ran<;:aas decisoes importantes, enquanto a 82-- diversidade das culturas oferece a possibi- lidade de adesao a ideias mais dfspares, colocando em xeque a visao de mundo com aspira<;:oes a "verdade absoluta". Vivemos 0 tempo da globalizaC;Bo, como se 0 mundo fosse uma grande aldeia.-Globalizac;:ao: "A globalizac;:ao pode ser de- finida como a intensificac;:ao das relac;:6esso- ciais em escala mundial, que ligam local ida- des distantes de tal maneira que aconteci- mentos locais sac modelados por eventos ocorrendo a muitas milhas de distancia e vice-versa." (Anthony Giddens) Ha quem contra-argumente que sem- pre existiu algum tipo de internaciona- lizac;;ao, bastando voltar no tempo para lembrar 0 imperialismo da civilizac;;8.o helenista ou da romana, na Antiguidade, o descobrimento do Novo Mundo e 0 co- mercio das metropoles europeias com as col6nias desde 0 seculo XVI ate 0 XIX, alem da colonizac;;ao de paises africanos e orientais no seculo XIX. No entanto, em epoca alguma se atin- giu tal nivel de inter-relacionamento que agora nos permite falar em um mercado mundial que determina a produc;;ao, a distri- buic;;aoe 0 consumo de bens e em uma cul- tura da "virtualidade real", que liga todos os pontos do globo, modelando comportamen- tos, como veremos na sequencia. Essa transformac;;8.oradical ocorrida nas ultimas decadas deve-se, principalmente, ao impacto das novas tecnologias eletroeletr6nicas, que revolucionaram os meios de comunicac;;ao de massa, tais como radio, televisao, video, jornal, revistas de grande circulac;;ao, redes informatizadas como a internet etc. Os novos meios saG responsaveis pela rapida e ampla difus8.o da informac;;8.o, ao mesmo tempo que tra- zem 0 risco de massificar e homogeneizar, podendo descaracterizar as culturas tradi- cionais e diluir as diferenc;;as individuais. Desde 0 final dos anos de 1960 e mea- dos de 1970, teve inicio a revolw;ao da tecnologia da informa c;;ao, inaugurando 0 mundo novo da sociedade em rede. o sociologo catalao Manuel Castells' cita alguns exemplos de redes, com seus con- juntos de nos interconectados, em que cad a no depende do tipo de rede em que se en- contram. • Rede dos fluxos financeiros globais: mer- cados de bolsas de valores e suas cen- trais de servic;;os auxiliares. • Rede global da nova mfdia: sistemas de TV, estudios de entretenimento, meios de computac;;8.o grafica, equipes para cober- tura jornalistica e equipamentos moveis. • Rede politica que governa a Uniao Euro- peia: conselhos nacionais de ministros e comissarios europeus. • Rede de trafico de drogas campos de coca e de papoula, laboratorios clandes- tinos, pistas de aterrissagem secretas, gangues de rua e institui90es financeiras para lavagem de dinheiro. E assim por diante, poderiamos dar uma infinidade de exemplos. Essa forma inedita de organizac;;ao glo- bal em rede tem exercido influencia capital em varios setores da atuac;;ao humana, ge- rando mesmo um novo tipo de sociedade. As grandes descobertas tecnologicas no campo da automac;;8.o, da robotica e da microeletr6nica transformaram radicalmente nao so as fabricas, como 0 setor de servic;;os, a cidade e 0 campo, as residencias, os trans- portes e a comunicac;;8.o A influencia esma- gadora da midia e da Informatica no cotidia- no das pessoas faz mudar a maneira de sen- tir e de pensar, devido ao predominio da ima- gem e da informac;;8.oabundante e fragmen- tada, fatores que provocam inclusive altera- c;;oesna percepc;;8.ode tempo e de espac;;o. Vejamos 0 que de fato mudou na produ- C;;8.0,na politica, nas relac;;oesinterpessoais e na cultura, entre tantos outros campos que passaram por alterac;;oessignificativas. Comecemos pelas formas de produc;;ao. No mundo do trabalho muitos concei- tos se alteraram, como vimos no capitulo 3, "0 fazer humano", ao discutirmos 0 surgi- mento da sociedade pas-industrial. A ampli- ac;;8.osignificativa do setor de servic;;os,ace- lerada pelo refinamento da sociedade informatizada, deslocou cada vez mais 0 nu- cleo das atividades para a regi8.o urbana. 1 CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede. 5. ed. Sao Paulo: Paz e Terra, 1999. p. 498 (Serie A era da informa- gao: economia, sociedade e cullura, v. 1). Nas fabricas, a produc;ao em massa, tf- pica da rigidez do fordismo, tem sido subs- tituida pela exigencia de maior flexibilida- de, que nao so evita a padronizac;ao dos produtos, como tambem requer um traba- Ihador com formac;ao abrangente, capaz de se readaptar com rapidez a condic;oes sem- pre diferentes. Para tanto, sera preciso uma educac;ao que estimule a iniciativa, a capa- cidade de decisao, a criatividade e a dis- ponibilidade para 0 novo. Do ponto de vista econ6mico, na maior parte do globo predomina 0 modo de pro- duc;ao capitalista. Com a queda do Muro de Berlim, em 1989, e a adesao de muitos pai- ses socialistas a economia de mercado, viu- se fortalecido 0 neoliberalismo, bem como os mecanismos do capital transnacio- nalizado. Por isso, a globalizac;ao, ao lado dos seus beneficios, preocupa sobretudo os paises perifericos, que, por serem eco- nomicamente dependentes, perdem a au- tonomia e se curvam as decisoes externas, que nem sempre vem ao encontro de seus I interesses. Os desequilibrios do sistema transpa- recem no desemprego estrutural resultante da automac;ao e nas ondas migratorias den- tro de um mesmo pais, ou entre nac;oes, recrudescendo as manifestac;oes de xeno- fobia, de rejeic;ao ao estrangeiro. Tambem na produc;ao do saber ocorre intercambio entre as nac;oes, por meio de flu- xos de informac;oes entre as universidades, nos congressos internacionais e pela publi- cac;ao de ampla literatura dos diversos cam- pos do saber. Nao mais solitario, 0 cientista trabalha em equipe, em laboratorios bem montados ~ inclusive com computadores de alta precisao ~ e sob investimentos altfs- simos, que so as grandes corporac;oes e os governos saG capazes de bancar. E bem verdade, na sociedade capita- lista baseada no lucro, a guerra das paten- tes nao da tregua, chegando ao patetico de empresas tentarem registrar a propriedade de material genetico ~ que e patrim6nio da humanidade .. PoHtica e globaliza(fao As questOes anteriores nos remetem ao tema da polftica, ou seja, ao jogo de poder diante do confronto de forc;as no espac;o mundializado. Voltando no tempo, lembra- mos que a modernidade ~ que comec;ou a se configurar no seculo XVII ~, entre outras caracteristicas, foi marcada pelo surgimento das monarquias nacionais, baseadas no conceito de Estado-na93.0, como espac;o unificado e soberano que con centra 0 po- der e detem "0 monopolio da forc;a legitima". Hoje, porem, nao se pode mais falar exclusivamente nesse tipo de central i- dade. Ainda que as nac;oes mantenham sua soberania e nao desaparec;am no mun- do que se globaliza, cada vez mais exis- tem instituic;oes intergovernamentais inte- ressadas em restabelecer 0 equilibrio de forc;as, posta em perigo pelos paises mais poderosos. Esse "forum" mundial nao se restringe aos poderesgovernamentais constituidos, mas esta aberto tambem aos representantes dos variados grupos repre- sentativos da sociedade civil, que lutam por bandeiras as mais diversas ~ ecologia, di- reitos humanos e emancipac;ao dos exclui- dos do poder, como mulheres, negros e gays ~ e extravasam as fronteiras nacionais com reivindicac;oes em termos mundiais. Como exemplos, lembramos a conheci- da atuac;ao da Anistia Internacional na luta pelos direitos humanos e do Greenpeace na defesa do equilibrio ecologico. Do mesmo modo a Organizac;ao das Nac;oes Unidas (ONU), a Organizac;ao dos Estados America- nos (OEA), a Organizac;ao do Tratado do Atlantico Norte (Otan), a Uniao Europeia, 0 Mercosul e eventos como Rio 92, Rio +10, sejam esses organismos de natureza polftica ou econ6mica, refletem a necessidade de as- sembleias com representantes de varios par- ses, para pressionar governos ou mobilizar pessoas, a fim de resolver problemas que in- teressam ao planeta No que se refere estrita- mente a questao da globalizac;ao, saG inume- ros os movimentos de oposic;ao, ou pelo me- nos de reivindicac;ao, de uma globalizac;ao alternativa, mais democratica e menos exciudente, como veremos adiante. Ainda quanta aos poderes, mas na con- tramao dos interesses solidarios, nao pode- mos nos esquecer da influencia politica das ja citadas redes mundiais de narcotrafico, de lavagem de dinheiro da corrupc;ao, bem como das organizac;oes terroristas. E tam- bem de uma "ordem militar mundial" que estimula a industrializac;ao da guerra, com a produc;ao de armas e a promoc;ao de ali- anc;as e ameac;as entre Estados. Outro setor em que notamos mudanc;as fantasticas e 0 das relac:;oes interpes- soais. 0 comportamento dos indivfduos, suas expectativas e os pad roes de sociali- zac;ao tambem foram profundamente alte- rados com a globalizac;ao em curso. Nao s6 devido as transformac;oes ja referidas, que interferem na vida de cad a um de n6s, mas, segundo 0 jurista e fil6sofo italiano Norberto Bobbio, grac;as a maior das revo- luc;oes silenciosas de nossos tempos, que , foi a transformaC;80 das relac;oes entre os sexos, isto e, da relac;ao de generos. E tambem essa a opiniao do historiador Eric Hobsbawm, quando diz que no seculo xx ocorreu uma profunda "revoluc;ao moral e cultural, uma dramatica transformac;ao das convenc;oes de comportamento social e pessoal. As mulheres foram cruciais nessa revoluc;ao cultural que girou em torno das mudanc;as na familia tradicional e nas ativi- dades domesticas de que as mulheres sem- pre tinham sido 0 elemento central". Ao criticar 0 mundo androcentrico - centrado no poder masculino -, a emancipa- c;aofeminina criou outras expectativas sobre os papeis que 0 homem e a mulher desempe- nhavam ate entao na sociedade e no nucleo familiar.Assim, entra em crise 0 patriarcalismo ao se dissolverem as fronteiras entre 0 homem "chefe de familia", "provedor", e a mulher ape- nas "mae" e "dona de casa". Mas atenc;ao: isso nao significa 0 desa- parecimento da instituic;ao familiar, e sim a sua transformac;ao profunda, em direc;ao a outros modelos de relac;oes familiares. Mui- tos deles ainda causam escandalos e te- mores, devido aos div6rcios e casamentos sucessivos, familias sem casamento ofici- ai, adoc;ao de filhos fora do casamento, a "produc;ao independente" da opc;ao monoparental (a crianc;a vivendo s6 com pai ou s6 com a mae), casamento gaye tantas outras formas de constituic;ao familiar. A esse prop6sito, a historiadora e psi- canalista francesa Elisabeth Roudinesco, baseando-se em pesquisas sociol6gicas, acrescenta: "Finalmente, para os pessimis- tas que pensam que a civilizac;ao corre 0 risco de ser engolida por clones, barbaros bissexuais ou delinquentes da periferia, concebidos por pais desvairados e maes errantes, observamos que essas desordens nao saG novas - mesmo que se manifes- tem de forma inedita - e sobretudo que nao impedem que a familia seja atualmente reivindicada como 0 unico valor segura ao qual ninguem quer renunciar. Ela e amada, sonhada e desejada por homens, mulheres e crianc;as de todas as idades, de todas as orientac;oes sexuais e de todas as condi- c;oes". E acrescenta: "A familia do futuro deve ser mais umas vez reinventada".2-"Vejo sinais de uma recomposic;:ao da familia, a medida que milh6es de homens parecem estar prontos para desistir de seus privilegios e trabalhar ao lade das mulheres, para en- contrar novas form as de amar, compartilhar e ter filhos. Na verdade, acredito que a recons- truc;:aodas famflias sob formas igualitarias seja o alicerce necessario para a reconstruc;:ao da sociedade pela base. (... ) A mudam;a mais fundamental das relar:;6es de experiencia na Era da Informar:;ao e sua passagem para um padrao de interar:;ao social construfdo sobre- tudo pela experiencia real da relar:;ao. Hoje em dia, as pessoas mais produzem formas de sociabilidade que seguem modelos de comportamento." (Manuel Castells) 85- 3. A cultura diante dos processos de globaliza~ao o processo de globaliza<;;ao cultural e fortemente marcado pela divulga<;;ao dos valores da industria cultural ocidental, prin- cipalmente da norte-americana. Ou seja: como na economia e na politica, os proces- sos de globaliza<;;ao nao saGsimetricos, nao saG abertos para todos, de modo igualita- rio. Pelo contrario, dao oportunidades para que 0 poder dos pafses centrais se exer<;;a, alargando mercados, trazendo novos valo- res, mod os de vida, sonhos de con sumo. Para melhor compreender esses proces- sos, vamos examinar dois modos complemen- tares pelos quais se produz a globaliza<;;ao. o primeiro deles e 0 que 0 soci610go Boaventura de Sousa Santos3 chama de local/smo global/zado quando deter- minado fen6meno cultural local e globalizado com sucesso. Eo caso da expansao da lin- gua inglesa como lingua mundial, especial- mente na internet; da difusao do fast food como modo de alimenta<;;ao, nao s6 em me- tr6poles, mas tambem nas pequenas cida- des; dos pad roes do cinema comercial de Hollywood, que tambem promove 0 "modo americano de viver" desde 0 final da Segun- da Guerra Mundial; dos pad roes de musica popular; dos parques tematicos etc. o que se globaliza, nesse caso, e a cul- tura dos vencedores, que valorizam as ma- nifesta<;;oesculturais dos pafses centrais em detrimento da cultura dos lugares periferi- coso A vit6ria traz a possibilidade de ditar os termos da integra<;;ao, da competi<;;ao e da exclusao, e aquilo que era pr6prio de um local e universalizado, permitindo-se ate a inclusao de culturas diferentes, mas somen- te como subalternas e alternativas. Na ver- dade, esses processos de acultura<;;ao tan- to podem ser de assimila<;;ao, quanta de in- corpora<;;ao, como vimos no capitulo 1, "0 que e cultura" Veja-se como exemplo os fil- mes brasileiros candidatos ao Oscar, nos pri- meiros anos do seculo XXI, que saG aceitos na competi<;;ao como produ<;;ao subalterna, I alternativa, mostrando a pobreza, a crimi- nalidade, as favelas, os desvalidos sociais e correspondendo a visao que os pafses cen- trais tem do Brasil. o segundo modo de produzir a globaliza<;;ao, ainda de acordo com 0 mes- mo autor, denominado de global/sma locali- zado, e a contrapartida e 0 complemento do anterior, agora visto a partir da 6tica das culturas perifericas. E 0 impacto produzido pelas praticas e pelos imperativos transna- cionais decorrentes dos localismos globalizados sobre as condi<;;oes locais. As culturas locais saG desintegradas, porque a tradi<;;aoe desestruturada e, even- tualmente, reestruturada sob a forma de in- clusao subalterna. Como exemplo desse processo, podemos citar 0 uso turistico de sftios hist6ricos, cerim6nias religiosas, do artesanato, da natureza e da vida selvagem que devem ser restaurados, equipados e estruturados segundo os pad roes e as ex- pectativas dos turistas internacionais. His- t6ria, religiao, artesanato, festas folcl6ricas o mau habito de comer hamburguer, que tern alta taxa de gordura saturada, espalhou- se pelo mundo, tendo chegado ate a China. 3 SANTOS, Boaventurade S. "A linha do horizonte". In: SANTOS, Boaventura S. A globalizac;ao e as ciencias sociais. 2. ed. Sao Paulo: Cortez, 2002. 86-- ou tipicas, culinaria, natureza e vida selva- gem deixam de responder simplesmente as necessidades locais, para atender as ne- cessidades da industria turistica global. As consequencias da globalizagao da cultura - algumas positivas e outras nega- tivas - saG bastante variadas. Do lado positivo, ha hoje uma facilidade de se conhecer outras culturas, seja por meio do turismo; dos restaurantes que oferecem culinaria de diversos parses; dos filmes de diferentes origens - como os indianos, irani- anos, argentinos, suecos, espanh6is, irlande- ses e outros, que fogem do padrao do cine- ma comercial norte-americano -; da televi- SaGpor assinatura, que oferece programas de e sobre varios parses, etnias, usos e cos- tumes de locais e comunidades remotas; sem esquecer que tambem se editam livros de autores do mundo todo em todo 0 mundo. Do lado negativo, a consequencia mais discutida e a possibilidade de que a cultura mundial seja homogeneizada, isto e, que haja o nivelamento de todos os produtos cultu- rais, uma vez que seriam produzidos por um mesmo sistema tecnico, para atender ao mer- cado planetario. (Consultar no capitulo 4 0 item "Cultura de massa") Segundo 0 soci610go Renato Ortiz4, 0 processo de homogeneizagao tambem pode ser visto sob duas 6ticas: a otimista e a pessimista. Na visao otimista, 0 isolamen- to entre os seres humanos de diversas par- tes do mundo seria rompido, levando ao reconhecimento mutuo e a comunhao. Na visao pessimista, traria a padronizagao da conduta e a sociedade apresentaria uma face unidimensional, consumindo os mes- mos objetos simb61icos (mod a, cinema, li- teratura, culinaria, musica etc.) para suprir suas necessidades e seus desejos. Para resolver 0 conflito entre esses pon- tos de vista, Ortiz propoe que a globalizagao seja vista como transversalidade algo que atravessa a cultura local, regional e nacio- nal. A cultura mundializada nao existe ape- nas como ideologia, mas se materializa no cotidiano dos individuos que compartilham os mesmos interesses, as mesmas neces- sidades, 0 mesmo imaginario. Nesse senti- do, nao se cria a unidimensionalidade, mas se da espago para a manifestagao da multiplicidade cultural, em que as reivindi- cagoes locais especificas convivem com a produgao global, que nao pertence aquele territ6rio geografico. 0 particular continua existindo, porem envolto por uma trama que conecta as partes em um todo mais amplo. E necessario destacar que a trans- versalidade nao elimina 0 fato de que a cul- tura global aspira a um lugar de dominagao e pressupoe acomodagoes e conflitos pe- culiares a cada caso. Nao sendo um pro- cesso homogeneo, a sua influencia pode ser maior ou menor, dependendo da forga da cultura local para responder as necessida- des da comunidade, do aces so a informa- gao de outras partes do mundo e do aces- so aos meios de comunicagao. Bonecos do carnaval de Olinda (PE). Ao contrario do carnaval do Rio e de Sao Paulo, 0 de Recife, Olinda e algumas cidades do interior, como Sao Luis de Paraitinga (SP), preserva as tradi<;6es e mantem a par- ticipaC;;aoda populaC;;ao local. 87-- 4. Por uma globalizac;ao alternativa Vivemos hoje um tipo de globaliza<;ao comandado pelas for<;as do capitalismo neoliberal, que, apesar de ser um sistema econ6mico capaz de produzir riqueza e ace- lerar a progresso, com significativo poder politico, mostrou-se incapaz de distribuf-Ia de maneira justa 0 mundo sofre com problemas como fame, mortalidade infantil, falta de sa- neamento basico devido a concentra<;ao de renda e de terras nas maos de poucos A pobreza dos inumeros paises perifericos con- trasta com a situa<;aodas na<;oespoderosas, as quais nao chegam a uma dezena: basta ler nos jornais quando as G7 au G8 - grupo dos sete paises mais ricos mais a Russia - reunem-se para decidir nossos destinos. Alem disso, em nome das for<;as eco- n6micas, as paises se mantem insensfveis - au reagem muito lentamente - aos ape- los dos movimentos ecologicos que denun- ciam as agressoes ao equilibria da nature- za. Nao par acaso, tambem a polui<;ao e um fen6meno global: as chuvas acidas que ocorriam na Suecia e na Noruega na deca- da de 1960, prejudicando a cria<;ao de sal- moes e trutas, resultavam da emissao de gases de industrias da Inglaterra e da Ale- manha. Outro exemplo e a da forma<;ao do buraco na camada de oz6nio da estratos- fera, provocado par certos gases usados na fabrica<;ao de refrigeradores e que mui- tas industrias resistiam a substituir. o descontentamento com a descom- passo entre meios e fins, em que a merca- do e mais importante que a ser humano, estimula a cria<;ao de grupos ecologicos desde ha algum tempo. Em 1996, no Mexi- co, um movimento antiglobaliza<;ao ocorreu no Primeiro Encontro Internacional pela Humanidade e contra a Neoliberalismo. Outras rea<;oes se seguiram, nem sem- pre contra a globaliza<;ao em si, considera- da par muitos um acontecimento irreversivel, mas pela defesa de uma globalizar;ao alter- nativa e democratica, que levasse em conta as reivindica<;oes dos mais diversos segmen- tos sociais que se consideram prejudicados. Encontros como as de Seattle (EUA), Davos (Sui<;a), Genova (Italia), e muitos outros, fo- ram pal cas de protestos de que participa- ram - do lado de fora - representantes de ONGs, centrais sindicais, partidos politicos, grupos de esquerda, estudantes etc. Nessa polemica, mereceu noticia a Forum Economico Mundial que se reuniu em Davos, na Sui<;a, em 2000, e cujo ideario neoliberal se contrapunha ao do Forum So- cial Mundial de Porto Alegre, no Brasil, ins- talado na mesma epoca para priorizar a so- cial, e nao a economico. Como vimos no inicio deste capitulo, a fen6meno da globaliza<;ao trouxe transforma- <;oese impactos tanto positivos quanta nega- tivos, que podemos ver com otimismo au pes- simismo. Tudo dependera de como as for<;as com interesses antag6nicos se confrontem, para que possamos garantir a esperan<;a de que um outro mundo melhor seja possivei. •• V A"W1t ~ Abertura do Forum Social Mundial (2005), em Porto Alegre (RS). 0 primeiro encontro do Forum Social Mun- dial deu-se em 2000, na defesa da globalizac;:ao demo- cr{ltica contra 0 ideario neoliberal e elitista do Forum Econ6mico Mundial de Davos, na Sufc;:a. =111Moderna © Maria Lucia de Arruda Aranha, Maria Helena Pires Martins 2005 Coordena~ao editorial: Maria Raquel Apolinario Edi~ao de texto: Carlos Zanchetta Prepara~ao de texto: Roberta O. Stracieri Fareleiro Coordena~ao de design e projetos visuais: Sandra Botelho de arvalho Homma Projeto grMico: Luiz Fernando Rubio Capa: Luiz Fernando Rubio Foto: Romulo Fialdini Coordena~ao de produ~ao grMica: Andre Monteiro, Maria de Lourdes Rodrigues Coordena~ao de revisao: Estevam Vieira Ledo Jr. Revisao: Lapis Litteris Edi~ao de arte: Renata Susana Rechberger Assistimcia de produ~ao: Enriqueta Monica Meyer, Ricardo Yorio Coordena~ao de pesquisa iconogrMica: Ana Lucia Soares Pesquisa iconogrMica: Maria Helena Pires Martins, Rosana Carneiro As imagens identificadas com a sigla CIO foram fornecidas pelo Centro de InformaGao e OocumentaGao da Editora Moderna. Coordena~ao de tratamento de imjlgens: Americo Jesus Tratamento de imagens: Fabio N. Precendo, Luiz Carlos Costa, Riedel Pedrosa Saida de filmes: Helio P. de Souza Filho, Marcio Hideyuki Kamoto Coordena~ao de produ~ao industrial: Wilson Aparecido Troque Impressao e acabamento: Yangrsf Gratica e Editora Ltda. Aranha, Maria Lucia de Arruda Temas de filosofia I Maria Lucia de Arruda Aranha, Maria Helena Pires Martins. - 3. ed. rev. - Sao Paulo' Moderna, 2005. Capa: ProJ8ctio 2 (1984). de Regina Silveira. 0 que se vel A proje<;Bo impassivel de uma escada mexistente? Ou 0 usa da perspectlva - a visao racionalizada - para cflar a sombra Ironica? (Ver capitulo 10, Segunda partel. Paginas 3 e 4: Bella wrltting, Chaga1l119151. Museu Nacionai de Arte Modema. Centro Georges Pompidou. Dados Internacionaisde Cataloga~ao na Publica~ao (CIP) (Camara Brasileira do Livro, SP, Brasil) 1. Filosofia Estudo e ensino I. Martins, Maria Helena Pires. II. Titulo indices para catalogo sistematico: 1. Filosofia . Estudo e en sino 107 ISBN 85-16-04814-4 (LA) ISBN 85-16-04815-2 (LP) Reprodu<;ao prolblda Art. 184 do C6digo Penal e Lei 9.610 de 19 de feverello de 1998. Todos as direltos reservados EDITORA MODERNA LTDA. 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