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Abuso do Direito e Ato Ilícito Paulo Nader – Capítulo 34 CP – Art. 23 CC – Art. 186; 187; 188 e 927 CPC - Art. 79 e 80 Ato ilícito é a conduta humana violadora da ordem jurídica. Só pratica ato ilícito quem possui dever jurídico. A ilicitude implica sempre a lesão a um direito pela quebra do dever jurídico. Para a configuração do ilícito concorrem os elementos: conduta, antijuridicidade, imputabilidade e culpa. Os dois primeiros são os elementos objetivos do ato e os demais, os subjetivos. O ilícito é sempre uma conduta humana, ainda que instrumentalmente a lesão ao direito se faça pela força de um ser irracional ou outro meio. A antijuridicidade significa que a ação praticada é proibida pelas normas jurídicas. A imputabilidade é a responsabilidade do agente pela autoria do ilícito. Enquanto na esfera criminal a conduta antijurídica de um menor não torna imputável o seu pai ou responsável, o contrário se passa no âmbito civil, em face da culpa in vigilando. Conscientemente não deseja o resultado, mas não impede o acontecimento. A culpa pode decorrer de negligência, imperícia ou imprudência. A negligência revela-se pelo descaso ou acomodação. O agente do ato possui um dever jurídico e não toma as medidas necessárias e que estão ao seu alcance. Na imperícia, a culpa se manifesta por falhas de natureza técnica, pela falta de conhecimento ou de habilidade. A imprudência se caracteriza pela imoderação, pela falta de cautela; o agente revela-se impulsivo, sem a noção de oportunidade. A consequência para a prática dos atos ilícitos é a reparação dos danos ou a sujeição a penalidades, previstas em lei ou em contrato. O Código Civil brasileiro, no caput do art. 186, define ato ilícito: “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. Tal definição é complementada pelo artigo seguinte, onde se considera ilícito o ato praticado com abuso de direito. Para situações especiais, o Código Civil dispensa o elemento culpa na caracterização do ato ilícito, conforme o texto do parágrafo único do art. 927: “Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outem.” Categorias de ilícito: o civil e o penal. No primeiro o descumprimento do dever jurídico, contratual ou extracontratual, contraria normas de Direito Privado e tem por consequência a entrega de um bem ou de uma indenização. Ocorre o ilícito penal quando a conduta antijurídica enquadra-se em um tipo de crime definido em lei. Em face do princípio da reserva legal, não pode haver crime e nem pena sem lei anterior. CLASSIFICAÇÃO DO ELEMENTO CULPA Segundo Alessandro Groppali, o elemento culpa apresenta a seguinte classificação: Intensidade da Culpa. Sob este aspecto a doutrina distingue três graus: culpa grave, leve e levíssima. Conteúdo da Culpa. Quando a culpa decorre da violação de um dever jurídico omissivo, ela se diz in faciendo. O agente não deve praticar ato, não obstante, o realiza. Configura esta espécie a culpa do comerciante que vende bebida alcoólica a menor, apesar da proibição legal. A culpa se diz in non faciendo (ou in omittendo) quando o agente deixa de praticar um ato a que estava obrigado. O médico que deixa de prestar socorro a um paciente; o pai que nega assistência material ou intelectual ao filho, incidem nesta espécie. Critérios de Avaliação. O sistema jurídico pode adotar dois critérios distintos de aferição da responsabilidade: in abstracto ou in concreto. Pelo primeiro, a avaliação da culpa se faz tendo em vista o comportamento do bom pai de família (bonus pater familias), sem levar-se em conta o condicionamento próprio do agente. O segundo critério – culpa in concreto – consiste na verificação do nível de discernimento, cultura ou aptidão da pessoa. Nas legislações modernas, prevalece o critério da culpa in abstrato. Em alguns casos, porém, a própria lei determina se levem em consideração as condições particulares do agente. Natureza da Relação. A culpa pode ser contratual ou extracontratual. Ocorre a primeira quando o agente deixa de cumprir uma obrigação assumida em um contrato. Contratual (artigos 389 e 395 do CC), com base no adimplemento da obrigação, e, extracontratual ou aquiliana, oriunda do descumprimento direto da lei (artigos 186 e 927 CC). Agente. A culpa pode originar-se de um fato próprio ou de um fato de outrem. A primeira hipótese é quando o indivíduo, possuindo capacidade de fato e agindo por sua conta, pratica a violação de um dever jurídico. Exemplo: o eleitor que não participa nas eleições. Ocorre a culpa por fato de outrem quando o responsável pelo ato ilícito não participa pessoalmente no evento. A sua culpa deriva de uma omissão quanto ao controle da causa eficiente do ilícito. Apresenta três modalidades: a) culpa in vigilando: é a responsabilidade específica dos pais e tutores, que têm o dever de orientar e acompanhar os filhos e pupilos (Art. 932 CC); b) culpa in eligendo: é a responsabilidade dos patrões, em relação aos atos praticados por seus empregados; c) culpa in custodiendo: é a responsabilidade assumida pelo dono de um animal ou de coisa inanimada, de cuja força resulta um evento considerado ilícito (Art. 936-939 do CC. A culpa se funda na falta de diligência do proprietário quanto ao controle e fiscalização de seus pertences. Ver Art. 943 do CC. EXCLUDENTES DO ILÍCITO No art. 188, o Código Civil brasileiro apresenta três excludentes para a ilicitude: legítima defesa, exercício regular de um direito reconhecido, estado de necessidade. Vejam Também os Artigos 23; 24 e 25 do CP. Exclusão de ilicitude Art. 23 - Não há crime quando o agente pratica o fato: I - em estado de necessidade; II - em legítima defesa; III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito. Excesso punível Parágrafo único - O agente, em qualquer das hipóteses deste artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo. Estado de necessidade Art. 24 - Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se. § 1º - Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo. § 2º - Embora seja razoável exigir-se o sacrifício do direito ameaçado, a pena poderá ser reduzida de um a dois terços. Legítima defesa Art. 25 - Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem. Legítima Defesa. Esta medida é de natureza especial e extraordinária, pois o caminho natural para a defesa dos direitos é a via judicial. A atualidade ou iminência de uma agressão injusta não comporta ou admite quaisquer gestões. A reação moderada, a título de defesa, além de direito, é dever moral. Quando há esbulho, por exemplo, em que o proprietário se vê privado da posse de qualquer bem, a lei permite a reação incontinenti. Consoante Clóvis Beviláqua, “a autodefesa destina-se a evitar o mal da violação do direito. A autossatisfação ou justiça particular propõe-se a restaurar o direito, que a agressão injusta fez sucumbir”. Exercício Regular de um Direito. O direito subjetivo é para ser exercitado. A sua utilização normal, de acordo com a sua finalidade, não caracteriza qualquer ilícito. Assim, o proprietário que ajuíza uma ação de despejo contra uma empresa, ao reaver o imóvel, nenhuma responsabilidade tem quanto a eventuais prejuízos sofridos pela locatária, em decorrência da paralisação temporária de atividade devido à mudança. Estado de Necessidade. Esta excludente foi definida pela lei civil no item II do art. 188: “adeterioração ou destruição da coisa alheia, a fim de remover perigo iminente.” No estado de necessidade apresenta-se um conflito entre direitos pertencentes a titulares distintos. Para tutelar o direito próprio, alguém destrói ou inutiliza o bem jurídico de outrem. Esta ação é ilícita apenas se não excede os limites indispensáveis à remoção do perigo. Conforme Machado Paupério discrimina, os requisitos do estado de necessidade são os seguintes: “que exista um perigo atual e inevitável para um bem jurídico qualquer do agente ou de outrem; que não tenha sido o perigo provocado voluntariamente pelo agente; que, finalmente, não se possa exigir, de maneira razoável, o sacrifício do bem que está ameaçado, e que compense este a destruição da coisa alheia”.
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