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PARASITOLOGIA HUMANA A parasitologia é uma relação ecológica, que tem diferentes pesos e diferentes níveis de interação entre o parasita e o hospedeiro, podendo, desse modo, gerar ou não manifestação clínica que configura uma doença. ● PROCESSOS MIGRATÓRIOS E AS PARASITOSES A Parasitologia usa de uma divisão temporal dos processos migratórios humanos para determinar as características dos processos de dispersão de parasitos pelo mundo. ❖ PERÍODO PRÉ-HISTÓRICO: cerca de 4 mil anos a.C. Hoje a paleoparasitologia é responsável pelo estudo dos parasitos na época anterior à escrita, usando desenhos, pinturas, fósseis, estátuas, e fezes petrificadas. Nesse período temos o início da agricultura, período em que o homem mudou sua realidade e viabilizou o aparecimento de vetores → fundamental para transmissão de parasitos. A parasitologia permitiu refutar a teoria do Estreito de Bering, pelo qual a transição ocupacional Ásia-América ocorreu. Existia outra hipótese que poderia relatar o que de fato aconteceu; de que pequenas navegações ou navegações de longas distâncias foram responsáveis pelo povoamento das Américas, e as evidências para isso são: - Se descobriram fezes mumificadas com presença de ancilostomídeos na região andina antes mesmo da chegada de populações pelo Estreito de Bering. Contudo, ancilostomídeos não são nativos da América do Sul e não seria possível a transmissão em um ambiente hostil de solo congelado como o do estreito de Bering, então foi constatado que o homem tinha chegado antes do que se pensava, pela navegação. Outra evidência é o caso do Ascaris: - Ascaris lumbricoides x Ascaris suum: são dois tipos de parasitos, em que o primeiro tem o homem como hospedeiro e o segundo o porco. São espécies críticas, pois são muito semelhantes, ou possuem origem comum (seriam distintos por origem filogenética ou origem ecológica?). Acreditava-se que o porco havia transmitido o parasito para o ser humano pelo processo de domesticação. Contudo, antes disso, os seres humanos já tinham ascaris em fezes. Então, o homem contaminou o porco, ao passo que o parasito se adaptou a infectá-lo. ❖ PERÍODO DAS GRANDES NAVEGAÇÕES: doenças do Velho Mundo para as colônias, pela imigração europeia e escravidão de africanos; os parasitos se adaptaram à nova realidade e se mantiveram até os dias atuais. Dentre eles estão: - SCHISTOSOMA MANSONI: chegou ao Brasil com os colonizadores por conta da escravidão. Por uma similaridade climática da costa africana com a da América do Sul, houve fechamento do ciclo do verme com o caramujo do gênero Biomphalaria, quando as fezes dos escravos entravam em contato com o ambiente. A esquistossomose é uma infecção duradoura, em que os parasitas estão nos vasos mesentéricos, e podem ficar por anos lá. - WUCHERERIA BANCROFTI: também de origem africana. Os africanos vieram parasitados, e aqui (na região Nordeste) havia um mosquito muito similar ao presente na África, de modo que houve o estabelecimento dessa parasitose. - TAENIA SOLIUM, TAENIA SAGINATA e TRICHINELLA SPIRALIS: herança europeia e asiática. Estão muito presentes nas regiões mais frias da América do Norte e América do Sul, onde os europeus se estabeleceram. OBS: A grande semelhança entre espécies do continente africano com as da América se devem ao processo de deriva gênica (decorrente da deriva continental, nesse caso). As espécies começaram a se diferenciar de acordo com o continente, mas continuaram com similaridades entre si devido a um ancestral comum. ❖ GLOBALIZAÇÃO : Hoje temos desafios para saúde pública mundial, devido às novas possibilidades de fluxo de pessoas devido à maior fluidez das fronteiras. Ao mesmo tempo, houve: melhoria nas condições de moradia e higiene, conhecimento nos mecanismos de infecção das principais parasitoses, desenvolvimento de anti-parasitários. Contudo, ainda existem situações importantes de saúde pública que foram e ainda permanecem ignoradas ao redor do mundo. A exemplo temos: - CRISE MIGRATÓRIA DE 2015-2016: refugiados, com provenientes do Oriente Médio e África saíam de seus países em guerra para buscar abrigo na Europa. O grande fluxo populacional decorrente desse episódio foi observado como questão de segurança internacional, ao passo que o aspecto referente à saúde pública não recebeu a devida atenção. Houve, desse modo, um aumento da mortalidade pelas precárias condições de transporte e contágio de parasitoses (do país de origem ou adquiridas na viagem) a profissionais presentes no controle de fronteiras (militares), que transmitiam a outras pessoas dentro do seu país. - FRONTEIRA MÉXICO-EUA: sul dos EUA apresenta grande número de casos de neurocisticercose. Mexicanos são mão de obra barata, migrando aos EUA muitas vezes ilegalmente e submetidos a péssimas condições trabalhistas, com ocupações como: atividades domésticas, cozinhas de fast food. Eles, por conta de sua dieta (presença de porco em pratos mexicanos), apresentam muitas vezes infecção por Taenia solium; eles podem, então, contaminar o alimento que manuseiam. Essa transmissão ocorre em grande parte pela marginalização dessas pessoas, sem acesso à saúde ou a noções de higiene básica. OBS: Além desses eventos, outros recentes episódios de migração repetem tais cenários. Essas pessoas são forçadas a deixar seu país de origem e destinam-se a locais onde não possuem acesso a condições sanitárias básicas, por razões profissionais, políticas, econômicas e/ou ambientais. Os migrantes frequentemente também encontram obstáculos devido a discriminação, situação legal comprometida, dificuldades idiomáticas e outras barreiras sociais e culturais. Quais são as bases para um alerta epidemiológico mundial? Número de casos? Taxa de letalidade? Custo compreensão/tratamento? Rompimento de barreiras sociais na transmissão? ● DISPERSÃO DE DOENÇAS PARASITÁRIAS NO BRASIL Muitas vezes ocorre pela migração de pessoas em busca de trabalho e/ou melhores condições de vida. Há duas ocasiões de destaque: - CONSTRUÇÃO DA ESTRADA DE FERRO MADEIRA-MAMORÉ: devido a uma migração fora de controle (necessidade de uma grande mão de obra) a uma “nova” região, cujo conhecimento epidemiológico era muito raso, culminou em grande número de mortes por conta da malária. Esses trabalhadores nunca tinham entrado em contato com a doença → falta de imunidade + agressividade da doença = morte rápida. - CONSTRUÇÃO DE HIDRELÉTRICAS NO NORTE DO BRASIL: novo deslocamento de mão de obra a uma região isolada → novos casos de malária. A construção das hidrelétricas também resultou em mudança significativa do local de obras, gerando maior dispersão de vetores e casos ectópicos da doença eclodiram. Devido a tudo isso é necessário o desenvolvimento do conhecimento epidemiológico local, pois doenças parasitárias estão intimamente relacionadas com seus locais de ocorrência. Assim, além de direcionar as atividades que lá se instalarão, é possível alertar a população acerca de medidas profiláticas, de quando procurar por cuidado e tratamentos. Em áreas endêmicas, há processos de busca ativa em que os profissionais envolvidos coma saúde pública são responsáveis por traçar um mapa epidemiológico daquele local. ❖ TURISMO RURAL E TRANSMISSÃO DE PARASITOSES: em áreas rurais, cachoeiras e rios que são utilizados para lazer também são, muitas vezes, local de despejo de esgoto de residências da região, podendo ocasionar contaminação. Houve um caso que virou notícia em Minas Gerais, a poluição fecal de esgotos sem tratamento foi despejada em rios e turistas foram contaminados pelo Schistosoma mansoni. ❖ CARAMUJO AFRICANO (Achatina fulica): um caramujo típico do norte africano chegou ao Brasil na década de 1960 para a implementação de seu consumo como uma espécie mais conhecida e cara (escargot), mas não deu certo. O caramujo passou a ser usado como isca para a pesca, e foi vendido para todo o país, de modo que ele se proliferou pelo território (espécie hermafrodita). Um parasita (Angiostrongylus cantonensis) encontrado em ratos provenientes de embarcações chinesas, cujo hospedeiro intermediário era uma lesma do mesmo país, conseguiu se adaptar a ponto de fechar seu ciclo usando a Achatina fulica como novo hospedeiro intermediário para contaminar roedores no Brasil. Desse modo, se adaptou completamente ao Brasil, e pode ser transmitido para humanos, nos quais é responsável por causar uma meningite eosinofílica, bastante rara.
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