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A Hora de Deus 1 Amedeo Cencini A HORA DE DEUS A CRISE NA VIDA CRISTÃ Prefácio de Dom Gianfranco A. Gardin EDB EDIÇÕES DEHONIANO BOLONHA A Hora de Deus 2 A HORA DE DEUS «Crise» é uma palavra que não necessita ser explicada. Se mais é essa que explica. Está se tornando uma forma de chave de leitura da atual identidade da vida sacerdotal e religiosa. A crise é um componente normal da vida humana, acompanha-a como amigo que incomoda, rompe certos equilíbrios e as vezes é também devastadora: é um amigo crítico. É aquilo que determina a passagem de uma fase a outra da vida. A crise afeta a todos: qualquer homem e mulher como os fundadores de comunidades; todos são chamados a ter atenção com a experiência de um deserto que inesperadamente invade o próprio ser em diferentes maneiras. Não é o clássico acidente de percurso que afeta só a alguns, os mais fracos e pecadores. Falaremos referindo-nos a realidade do mundo que crer, e as suas expressões peculiares que são: vida sacerdotal e religiosa. Para ajudar a viver a crise, para que se torne ocasião de crescimento, a nível humano e como passagem do Eterno na vida do crente: como hora de Deus. AMEDEO CENCINI é sacerdote e religioso canossiano, professor de pastoral vocacional e formação ao discernimento na Universidade Salesiana, além de psicologia aplicada ao curso de formadores na mesma universidade e na Universidade Gregoriana. Ensina ainda no curso de teologia e direito organizado pela Congregação para a vida consagrada. Desde 1995 é consultor da Congregação para a vida consagrada e as sociedades de vida apostólica. Nas EDB1 dirige, com A. Manenti, a coleção Psicologia e formação. Já publicou: Vocazioni, dalla nostalgia alla profezia. L’animazione vocazionale alla prova del rinnovamento, EDB 1992; Amarás o Senhor teu Deus. Psicologia do encontro com Deus, EDB 132009; Psicologia e formação. Estruturas e dinamismos, em colaboração com A. Manenti, EDB 122003; Viver reconciliados. Aspectos psicológicos, EDB 142009; Vita consacrata.Itinerario formativo lungo la via de Emmaus, San Paolo 21994; a trilogia Por amor, EDB 42001; Com amor, EDB 22004; No amor, EDB 42006; Os sentimentos do Filho. O caminho formativo na vocação presbiteral e consagrada, EDB 52005; Fraternidade a caminho. Rumo à alteridade, EDB 22002; Dalla relazione alla condivisione. Verso il futuro..., EDB 2002; Virgindade e celibato hoje. Para uma sexualidade pascal, EDB 22006. Todos estes volumes foram traduzidos em diversos idiomas. 1 Edições Dehoniano Bolonha A Hora de Deus 3 Prefácio Para os que tem sobre os ombros algumas décadas de vida religiosa ou presbiteral a palavra crise lembra provavelmente alguma coisa obscura, um tipo de vírus danoso que se esconde nas dobras do espírito, em suma uma desgraça de esconjurar. Nos ambientes formativos de um tempo, um condiscípulo que manifestava indifernça ou desempenho no âmbito, por exemplo, da oração, ou do estudo ou da disciplina, levantava a pergunta, sussurrando baixinho: “talvez ele está em crises?”. De fato, o modelo que se silhueta diante de cada formando ou formanda, como referimento luminoso e decisivo (aquele que Cencini chama de o “eu ideal”), havia os traços de uma figura de fé sem dúvidas, de vocação sem incertezas, de obediência sem hesitações, de pureza sem fragilidade, de oração sem distrações, de disciplina sem infrações. Porém sucessivamente se começou a perguntar se, por faltas de privações, não permaneceriam, enfim, privados de uma pessoa “normal”, e se o formando perfeito não se reduzia a uma espécie de simulacro sem vida, sem história, sem consciência, sem coração: enfim sem humanidade. É verdade, por outro lado, que o pedido, muitas vezes confuso e pressionado, de “humanização”, de “ normalidade”, de realismo, que nasceu por causa de reações aos modelos incontaminados apenas citados, pode ter dado a impressão de reivindicações decompostas, ou concessões ao relaxamento, ao individualismo, ao secularismo, ao modismo e superficialismo; como efeito de um desorientamento difundido. O pedido de transfusões abundantes de sangue “humano” nas artérias “angélica” do perfeito seminarista ou religioso(a), pode haver levantado excessivamente o limite de atenção sobre o que entrava maciçamente no organismo dos organismos dos institutos ou das comunidades ou dos singulares indivíduos. Quase dizendo: desde que tenha na etiqueta daquilo que se ingere o termo “humano” tudo pode ser introduzido. Por esta razão os pedidos não param e nós nos perguntamos: talvez está bom, pelo contrário, é melhor, uma fé duvidosa, uma oração um pouco às cegas, meio no escuro, uma obediência que coloca qualquer razoável resistência, uma castidade não preservada da fragilidade, etc? O presente volume do padre Amedeo Cencini ajuda a clarear esta situação, que descrevi com cores fortes, quase exagerando; uma situação não desprovida de incertezas e de interrogativas muitas vezes difíceis: que encontram portanto neste texto respostas de grande equilíbrio e de experiente realismo. Um tal realismo faz reconhecer que um percurso formativo (bem entendido seja de formação inicial ou permanente) absolutamente linear e fluente, que procede olimpicamente isento de obstáculos de várias naturezas, não somente é impensável, mas mesmo que houvesse um assim, deveríamos considerar suspeito. Até fazer concluir que quem não experimentasse nunca uma crise seria como quem leva dentro de si uma doença do qual simplesmente não conhece os sintomas , e portanto mais sutis que um mal com manifestações evidentes. Por isso - adverte Cencini - se é problemático o fato de que se dê muitas crises, não é menos problemático o fato que existiriam muitos presbíteros e consagrados/as que deveriam estar nas crises e não estam. Ele escreve: Tem alguns que dizem que o verdadeiro problema da vida religiosa ou sacerdotal não são as situações críticas - objetivamente problemáticas - dos padres, frades e freiras, quanto aquela A Hora de Deus 4 grande quantidade de pessoas “consagradas” que vivem subjetivamente tranquila, impassivas e impertubavéis, situações objetivamente críticas, ou gente sem crises quando na verdade deveríam estar em crise. E em outro lugar, a propósito deste “exército de padres e consagrados que... não estiveram nunca, não estam e nunca estarão em crises, observa provocatoriamente que “seria uma bom para eles mesmos e para quem tem a sorte de viver junto deles, que aceitassem estar em crise, em uma bela crise, pelo menos uma vez!”. E então, aplausos para crise? Abençoadas crises? A resposta - é aquela usual diante das perguntas complexas - depende! Depende? Eis que, Cencini nos explica precisamente o que provoca em nós uma crise, se compreende já pelo título do livro: “A hora de Deus”. Ele explica através de um percurso amplo e penetrante. Nos oferece uma análise aprofundada e bem articulada, minunciosa no precisar e confirmar princípios irrenunciáveis e decisivos, e ao mesmo tempo, consciente da variedade e complexidade dos possíveis acontecimentos onde não a crise, mas as infinitas e diversas crises que podem tomar forma nas pessoas. Após, necessárias precisões terminológicas, na primeira parte do volume a realidade da crise é descrita em seu lado objetivo (aquilo que objetivamente põe o sujeito em dificuldade) e o outro lado subjetivo, (aquilo que a pessoa experimenta e o grau de consciência do seu problema). Interessante é a descrição de uma ampla tipologia de crises, com seus possíveis efeitos sobre o sujeito, e as modalidades com as quais elas precisam ser abordadadas ou o tipo de “luta” que elas exigem. Uma segunda parte da obra entra nos conteúdos das crises, tendo em vista grandes áreas na qual estas solidamente sãoencontradas: aquela da identidade, aquela da afetividade- sexualidade, aquela da vocação e de sua fidelidade. Aqui a atenção para com a realidade torna-se posteriormente muito próxima, pois mediante a uma série de exemplificações (tirada de sua vasta experiência adquirida “neste campo” pelo autor). E assim ao leitor é oferecido uma considerável riqueza de ensinamentos para a vida, que são ensinamentos espirituais para a vida quotidiana do presbítero ou da pessoa consagrada. Na terceira parte são abordadas algumas maneiras para aproximar-se adequadamente às crises e para superá-las: se trata então de reconhecê-las e precavê-las, sem negá-las e sem pretender evitá-las e ser capaz de passar por elas com êxito positivo. Aqui as indicações são particularmente preciosas. Gostaria de apontar alguns entre os vários motivos para os quais se recomenda a leitura do texto e não somente as eventuais “vitímas” ou “beneficiários” (segundo os êxitos) da crise mas também as pessoas que tem o dever de formar, guiar ou acompanhar espiritualmente ou que oferecem qualquer ajuda àqueles que experimentam a crise. Se deve reconhecer – e este é um primeiro prestígio desta obra – que o livro de Cencini representa uma ajuda preciosa na prática de uma verdadeira formação permanente. Também aqueles que não estão atravessando o traiçoeiro mar das crises pode encontrar aqui ferramentas muito utéis para uma leitura interior de si mesmo, para gerenciar uma normalidade que não é – A Hora de Deus 5 para os “normais” – desprovida de incertezas, zonas cinzentas, mesmo as situações apenas inquietantes. Qualquer um que lêia estas páginas será difícil não encontrar ali qualquer coisa de si, tirando delas luzes para a quotidiana condução de uma existência que seja animada por um projeto de vida cristã, sacerdotal, religiosa – definido e exigente. Este é um ponto, sobre o qual vale a pena insistir. Todo o texto pressupõe uma concepção séria e ampla da formação permanente. Se esta é “ainda entendida” – aponta Cencini – de modo redutivo e superficial como se fosse simplesmente alguns cursos de atualização que fazemos ocasionalmente, apenas para manter o nível de tensão interna do presbítero ou para que não perca o último trem do renovamento teológico, e esteja atualizado, então o discurso sobre crise permanece circunscrito em momentos ou circunstâncias particulares, ou em casos difíceis quando não patológicos. Porém se nos colocarmos na prospectiva da vida como chamado a ser aquilo que um Outro nos revelou, provocando assim uma tensão constante em direção de uma identidade nunca completamente bem compreendida e assumida, então afirma Cencini, “a crise é componente normal e positivo de um processo de formação permanente”. O qual se compõe de “dois elementos estreitamente conexos entre eles. De um lado é a consciência da diferença, dentro de si, entre ideal e realidade que durante toda a vida será um constante caminho formativo; enquanto, por outro são apenas aqueles que levam a sério tal caminho (formação permanente) que poderão perceber as lacunas e fazer as escolhas consequentes para preenchê- las. Calocada nesta visão da formação permanente a crise impele então para aquele “novo” (novas verdades, nova escuta do evangelho, assumir novamente a própria vocação, novos desafios acolhido pela própria história ou pela comunidade com qual se compartilha o caminho...) que coloca em discussão aquilo que era (muito) tranquilo, óbvio repetitivo, indiscutível. A crise torna- se deste modo o “espinho na carne” de uma fidelidade que a crise mesma a revela como frágil, não resistente, ou que é reduzida a pura repetição e que perdeu seu dinamismo; e portanto, ao fim, não é mais verdadeira fidelidade uma vez que não se permanece fiel, porém tenta tornar-se fiel continuamente e o Deus de ontem – observa Cencini – pode passar ser idolo de hoje. Entendida deste modo, a formação permanente faz com que o futuro seja sempre o fruto de um trabalho consumado no presente, que frequentemente adiquire o caráter de “crises”, do juízo ou do momento “descriminante”, do cume a ser superado com dificuldade porém que conduz a novos panoramas e pois a novos caminhos, talvez ainda íngrimes ou terrenos acidentados: porém estes permanceriam desconhecidos e inacessíveis sem o superamento daquela passagem decisiva. É que todo o discurso de Cencini – e aqui está outro mérito da obra – representa uma forte ajuda a superar a concepção da crise como inimiga ameaçadora ou como noite assustadora, fazendo perceber que ao contrário é amiga estimulante mas ao mesmo tempo incômoda, possível início do nascimento de uma nova luz que vai permitir ver e saborear coisas novas. Isto não significa que a crise seja boa em si. A sua positividade é somente possível, não automática: não é suficiente que a crise aconteça. A história de tantas pessoas, por fim, dizem que A Hora de Deus 6 as crises os levaram a fazer escolhas erradas, ou mostrando vias de regressões, de involuções e não de crescimento. A preocupação do autor que percorre todo o livro é aquela de indicar as condições porque a crise torna-se verdadeiro tempo de graça, caminho saudável . A este respeito Cencini insiste em um conceito que aprecia muito, já citado em outros livros escritos por ele : aquele conceito de docibilitas. Se trata daquela disponibilidade a aprender, a “deixar-se ensinar” por alguém ou por alguma coisa, que é atitude fundamental e a “condicio sine qua” não da mesma forma permanente. A docibilitas consente a crise de colocarnos em discussão e de transformar-se em ocasião para reposicionarmos diante da nossa identidade: o que somos e o que deveríamos ser. Graças a docibilitas a crise se torna um campainha do alarme que toca, questões candentes das quais é necessário dar respostas que não sejam iludentes; nos abre a frente um dilema no qual se deve decidir qual estrada tomar. Podemos aprender com o grande livro da vida e da experiência, mesmo das experiências em si negativas. Cencini nos leva a entender que no momento de crise, quando são colocadas certas dimensões decisivas da pessoa, a vida em si, se encontra discípulos atentos, “afáveis”, que transforma em sabedoria. Acontece então não somente porque a história em geral é mestra da vida (historia magistra vitae como no velho ditado), mas que a minha história seja mestra da minha vida. Tudo isto tem um preço. De fato, as coisas de valor – como todos sabem – tem normalmente um preço elevado. E isto é explícito por Cencini sobretudo no capítulo, muito interessante, em que a experiência de crise é descrita como o momento de luta. Se trata, no fundo, de uma dimensão importante da vida espiritual cristã, talvez muito esquecida. O antigo tema do “combate espiritual”, estimado pela espiritualidade monástica dos primeiros séculos, que é recuperada com atenção para compreender juntos os aspectos psicológicos e espirituais, não facilmente destinguivél. Sem luta se cai na inércia ou no vício insidioso ao mal. Pouco a pouco a maneira de viver, perde o poder de quem luta, cai em uma passiva adequação as situações, conduzindo não mais a forma a vida segundo aquilo que se pensa, mas a pensar naquilo que se vive. Porém seja a assumindo em profundidade as convicções vitais sempre carente de ser reassumidas, seja conformando a vida a tais convicções: passam através de tensões nas quais se combatem forças hostís, internas e externas; Deus pode assim tornar, para aquele que o procura com ardor, uma espécie de misterioso adversário, como aquele que Jacó teve que lutar “até o romper da aurora” (Gn 32,25). A crise da qual esta obra trata, põe em causa, falávamos antes: as dimensões decisivas da pessoa. Já mencionamos ao fato que Cencini a reconduz aos âmbitos da identidade da afetividade, “vocacional”. Os problemas relativos as últimas duas dimensõessão em geral frequentemente tratados sobretudo em publicações que abordam temáticas formativas. Cencini abordam-nas com amplitude e abundantes constatações, reflexões e indicações. Porém ao meu ver, merece particular atenção o primeiro âmbito, menos considerado, que no texto é apresentado com o título “Crise em busca da verdade” (capítulo sete). A Hora de Deus 7 Neste tempo relativista, em que a verdade se dissolve em oponiões ou sensações, mesmo a pessoa cansagrada pode viver crises de verdade: não somente no que diz respeito as verdades em que acredita, mas também em relação àquelas – que são talvez as mesmas vistas por um outro ângulo – vividas, praticadas, assumidas, escolhidas. Se pensa depois a insuficiente consciência e acolhida da verdade da própria identidade, da própria história, da própria experiência de Deus, da maneira de colocar-se de frente ao outro. Na incerteza criada pelo prevalecer do sentir sobre o pensar, do instinto sobre discernimento, o autor sublinha o perigo de passar – assim ele escreveu em um subtitulo do capítulo sete – “Da confusão ao exílio à desordem”: ou da insuficiente percepção daquilo que somos, até mesmo nos encontrarmos exilados, longe da verdade, chegando assim a uma situação de subversão dos valores fundamentais. Por isso, aonde oferece indicações inteligentes e concretas para poder “atravessar” positivamente a crise, Cencini estimula não somente uma total sinceridade consigo mesmo (e obviamente aqueles que pedem ajuda) mas também a passagem da sinceridade à verdade. Obviamente se trata aqui da verdade daquilo que somos e fomos, e daquilo que se vive e se experimenta; porém esta verdade em si, para ser integral, deverá ser colocada no interior de outras verdades, incluindo a Verdade que é “a luz verdadeira que ilumina cada homem” (João 1,9). Mencionei somente alguns temas, quase beliscando aqui e ali no riquíssimo texto de Cencini. Muitos outros eu gostaria de sublinhar ao leitor: por exemplo algums problemas tratados no capítulo nove, dedicado a “crise de fragilidade vocacional”; tema atual, sobretudo neste tempo em que os compromissos definitivos e globais parece ser sempre mais árduo, onde encontramos protagonistas cada vez mais medrosos e dotados de baixa resistência. Estou contente ou pelo menos busco fazer entender que a leitura desta obra pode beneficiar muitos. Para conculir, parece-me que algumas linhas de Cencini dizem eficazmente na síntese o conteúdo deste seu trabalho. Ele escreve: “Não se pode reduzir a crise a um fato somente moral- comportamental nem somente a uma tentação diabólica ou uma passagem eventual da existência, destinada mais cedo ou mais tarde a concluir-se. É ou refere-se ainda um modo de entender a vida, a fé e a própria consagração de um modo mais ou menos realista. Vive bem a vocação não somente aqueles que aguentam e resistem no texte, mas quem através desta cresce na compreensão da própria identidade, que se revela progressivamente no tempo, também através das crises, e escolhe ser criativamente fiel. Não é talvez a crise uma chamada, uma “segunda chamada”? Talvez bastaria esta idéia – em outras palavras – vamos fazer deste trabalho de Cencini um instrumento precioso, esperamos que esteja nas mãos de muitos: a crise pode passar a ser uma “segunda chamada” que estimula uma resposta mais consciente, mais verdadeira, mais convencida que a primeira. GIANFRANCO A. GARDIN, ofm conv Secretário da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica. Roma, 13 de Outubro 2009 A Hora de Deus 8 INTRODUÇÃO Agora é comum. Ao ponto que não se pode nem mesmo falar de vida religiosa ou sacerdotal, e nem mesmo de vida de fé ou de realidade cristã em geral, sem se abordar aquela palavra tão breve, quanto clara e imediata no seu significado, subitamente entendida por todos: crise. Esta pequenina palavra não nessescita de ser explicada, pois ela mesma se explica; está de fato se tornando uma chave de leitura, que serve para dar uma idéia da atual identidade da vida sacerdotal e religiosa, como se fosse impossível comprender adequadamente hoje estas duas opções de vida (ou até mesmo a vida cristã em geral) sem perceber a profunda situação de dificuldade, de crise, claro, na qual ambas parecem estar. Por isso, vou dizer imediatamente, não me lamento, de jeito nenhum, nem me parece ser inoportuno. A crise é componente normal da vida humana, a acompanha como amigo fiel, ainda que amigo pertubador, rompe certos equilíbrios e as veses é até mesmo devastante, mas é uma amiga ... crítica. É isso que determina a passagem de uma fase a outra da vida, antes, nos recorda a psicologia evolutiva, se a evolução é um dos parámetros do desenvolvimento humano (conjuntamente com a alteridade e temporalidade),2 a crise representa uma “situação de desenvolvimento”,3 isto é, aquilo que provoca de fato o ser humano a dar um passo adiante. Enquanto há crise há ... vida, ou há desenvolvimento ou pelo menos a sua possibilidade, diríamos. Seja sobre o plano psicológico ou espiritual. A crise diz respeito a todos: o homen e a mulher, qualquer um que seja, como também os eremitas, místicos, homens e mulheres de grande espiritualidade, fundadores de comunidades, todos são chamados a passar pela experiência de um deserto que improvisamente invade o próprio ser em diversos modos. Não, não é um simples e eventual acidente de percurso, que concerne somente alguns, os mais fracos e pecadores. Portanto, se as coisas estão como estão, de um lado não podemos deixar de falar, de crise, visto que ela invade, quase como um processo de globalização de si mesma; e falaremos sobretudo referindo-se a realidade do mundo cristão, e aquelas suas expressões peculiares que são a vida religiosa e sacerdotal. Do outro lado o problema é aquele de ver como é acolhida, interpretada e vivida esta situação de crise, a nível institucional e a nível pessoal. E é isso que se propõe neste estudo. Em particular buscando evidenciar, antes de tudo, o significado da crise, em que consiste, ou, quais são as áreas mais sensíveis, ou vulneráveis, para entender como ela hoje seja percebida por cada indivíduo que a sofre, e tentar ver enfim, como viver e como ajudar viver as crises4 para que se tornem ocasião de crescimento, no plano humano e não só no plano humano, bem como passagem do Eterno na vida do fiel, como a HORA DE DEUS. Um livro como este, há uma dedicação implícita obrigada, que é mais que uma simples e convencional formalidade, porque não pode ser escrito pensando senão, naqueles tantos irmãos e irmãs, leigos ou consagrados, que sofreram crises, as vezes compartilhando-as, ou as vezes retendo e tentando reter tudo dentro de si, quase com vergonha de abri-se e de fato arriscando não ver mais uma saída; àqueles que souberam reconhecer a visita de Deus, àqueles que através da crise experimentaram uma grande solidão, mesmo por parte dos homens, como se fossem pessoas a ficar distantes; àqueles que viveram a crise como momento de fraqueza, de tal forma a não mais conseguir levantar-se, como aqueles que acolheram dentro de si a potência inédita da graça... Sobre tudo àqueles que eu pude aproximar no momento da crise, buscando ser uma 2 Cf. F. Imoda, Sviluppo umano. Psicologia e mistero, Casale Monferrato 1993, 77-106. 3 Imoda, Sviluppo umano, 96-106 4 Sem entrar nos méritos de um discorso mais propriamente pedagógico ou terapêutco, que pode ser objeto de uma sucessiva reflexão. A Hora de Deus 9 forma de ajuda para eles, e também àqueles que não conseguí ajudá-los. Este livro é como se fosse escrito por todas essas pessoas. Se eu pudesse, eu queria chegar até eles, para revermos juntos aqueles momentos. Se a vida (presente) frequentemente é a melhor explicação da vida (passada), agora poderíamos entendermelhor também o sentido das crises passadas, e procurar entender hoje, aquilo que naquela época era obscuro e escondido, ou que parecia simplesmente e somente humano, ou que parece ser impossível e insuportável. A Hora de Deus 10 Primeira Parte A Crise: Definições e destinções Iniciamos com a explicação dos termos, para não nos encontrarmos falando de alguma coisa pensando que todos entendam sobre o assunto, mas que, ao invés podemos definir de vários modos, e que o leitor pode então interpretar diferentemente em relação ao significado que dá o autor que o escreveu. Veremos então que para definir corretamente o conceito de crise ocorre descompor o termo pelo menos em duas partes ou componentes: um objetivo e outro subjetivo. O primeiro a acentuar o elemento problemático que determina a dificuldade do sujeito, o segundo para colocar em evidência como e quanto o sujeito mesmo seja consciente da própria situação crítica. Mas a distinção não termina aqui; e não se detém aqui simplesmente porque não basta tomar consciência da crise, ocorre ver como o sujeito enfrenta a própria situação crítica (se a enfrenta), ou seja o confronto e quais os tipos de confrontos. Capitulo 1 Problemática objetiva das crises Primeiramente uma crise, de qualquer um tipo, nos leva a um problema, ou uma situação em qualquer modo conflitual, presente objetivamente na pessoa desde algum tempo, provocando transtornos, incômodo sobre o indivíduo, habitualmente mais consciente do encômodo e não da sua raiz. A primeira coisa a fazer, então, é procurar indenticar este problema ou esta situação problemática, e possivelmente não só nas suas expressões exteriores, mas também na sua origem profunda. O conceito de “problemática”, por sua vez, se encontra longo um continuum que vai de um máximo a um mínimo de encômodo interior, de objetiva gravidade, de percepção subjetiva, de possibilidades de controle e de gestão... Experimentamos então a esborçar um possível significado desta expressão, observando em particular os limites ou as outras zonas conceituais com a qual se confronta, sempre na grande área do deságio ou do encômodo do mundo interior intrapsíquico do sacerdote e do consagrado(a), porque pelo menos nos sirva como indicação geral para iniciar o discurso. Portanto ainda não, neste momento, para confrontar o argumento complexo das causas, das situações problemáticas. 1. Nível problemático O nível ou o grau de profundidade ao qual se coloca o problema psicológico pode ser diferente. Envolvendo assim diferentemente tanto quanto as várias faculdades intrapsíquicas e espirituais: mente, sentimentos, vontades, liberdades, responsabilidades, sensos internos e externos, consciência de si ... Segundo o nível de profundidade teremos então várias problemáticas psicológicas ou que em diferentes modos são vizinhas ao mundo psicológico do indivíduo. Será importante saber primeiramente distinguir e identificar a natureza do problema apresentado.5 Que pode ser por causa da: 1.1 Problemas de psicopatólogia. 5 Sigo em parte neste parágrafo as classificações e indicações oferecidas pela CEI (Conferência Episcopal Italiana), Linee comuni per la vita de nostri seminari (Regras comuns para a vida dos nossos seminarios), Roma 1999, 15. A Hora de Deus 11 Pretendemos falar de psicopatologia latente ou manifestada, mais ou menos grave, isto é, de problemas derivados de distúrbios ou sintomas psíquicos estruturais e de natureza clínica, de origem remota, em relação a área do pensamento (esquizofrenia, paranóia...) ou de afeto (depressão, esterias...) ou dos comportamentos (obsessões compulsivas, manias, fobias, transgressões encontroláveis...). Nós já dizemos “distúrbios ou sintomas psíquicos estruturais”, isto é, presentes em modo estável nas pessoas, continuamente e “de natureza clínica”, ou seja não controlável pelo sujeito somente com as suas forças e por sua espontânea iniciativa. Tais problemas podem haver limitações consequentes graves relacionado a liberdade e o estado de consciência e responsabilidade do sujeito, como podem ser, por exemplo, casos de pedofília e de efebofilia ou de abusos e violências sexuais, ou formas obssesivas de dependência afetiva-sexual, o qual é uma expressão de uma carência mais ou menos sistemática de controle do instinto, do impulso sexual (no sentido heterosexual e homossexual) àquele agressivo (destrutivo e autodestrutivo, das tendências ao suicídio, a formas sérias de anoréxia e bulimia, de mania nevrótica do acúmulo, talvez com episódios de cleptomania, a manias de perguições etc...).6 Esta parece ser uma problemática psiquiátrica. A alternativa para o discernimento geral deste primeiro estado está entre a sanidade mental e a doença. 1.2 Problemas evolutivos São manisfestações de fragilidades ligadas a um atraso ou a uma incapacidade de solução dos problemas evolutivos, do tipo no primeiro desenvolvimento como é o caso : - de uma infância problemática, por causa de uma privação afetiva, com vários traumas e carências, ou – o contrário – de uma excessiva gratificação emotiva com consequente dependência e exigências7 (e teremos então padres puer aeternus {eterna criança} sempre necessitados de proteção e calor), ou por precariedade e pobreza do ambiente familiar de origem, ou mais particularmente, por ausência física e psicológica dos pais ou de um dos dois (talvez com a falta de identificação com o genitor do mesmo sexo e possível homossexualidade estrutural); - ou de uma pré-adoscência nunca resolvida e bloqueada em uma das suas fases: do auto- erotismo narcisista{é aquele que pratica o culto da sua própria pessoa} (o “Padre narciso”, necessitado em estar sempre no centro, ou o “Padre Belo” ou de qualquer modo atraente em busca de atenção dos outros, ou a tendência a masturbação), ou do homo-erotismo com possibilidade de uma tendência homossexual (Neste caso o nível é não estrutural, na maioria das vezes);8 - ou de uma adolescência persistente, ao qual o sujeito adulto é ainda sem uma identidade positiva e estável, e então a pessoa perenemente tensa entre a busca de um ponto de referimento exterior a qual depende e a incapacidade de abandonar-se e confiar no outro, ou seja de pertencer (o assim chamado padre “Adultoescente” adulto no registro cívil e adolescente segundo a idade psicológica, incapaz, por exemplo, de assumir responsabilidade, inconfiável, superficial, inconstante e egocentrico...). Nestas situações é possível a presença de sintomas as vezes semelhantes a aqueles psicopatológicos, isolados e com uma menor frequência, ou de atos ligados a um cedimento impulsivo que contudo não é obsessivamente presente e com o tempo sempre mais controlável 6 Se recorda a importância de ter uma atenção global da complexidade da situação, nestes casos. Tal atenção é a respeito do mistério do ser humano; ainda que se ferido, ou talvez sobretudo quando é ferido, o ser humano é parte de um mistério, ou de uma dimensão misteriosa que não pode ser reduzida simplesmente ao seus comportamentos, nem é por estes desmentidos. 7 Já Freud acreditava que não somente as privações afetivas, mas até mesmo um excesso de gratificações pudesse ser causa de distúrbios na personalidade. 8 Um dos elementos distintivos entre a homossexualidade estrutural e não estrutural, como veremos melhor no capitolo 8, é exatamente a diferênça da origem: A primeira nasce na fase infantil, a segunda na fase da pré-adolescente. A respeito da distinção entre a homossexualidade estrutural e não estrutural, cfr. A. CENCINI, Quando a carne é fraca. A Hora de Deus 12 (por exemplo; algumas formas de abuso no álcool, de excesso ao se alimentar, ou até mesmo a tendência homossexual...).Este poderia ser um problema psicológico mais que essencialmente psiquiátrico, radicada a uma certa profundidade e com tendência a permanecer constante, portanto interna ao indivíduo e não ligada a circunstâncias exteriores, mais possível de tratamento e reduz em um âmbito psicoterapêutico. Aqui a pergunta para o discernimento poderia ser esta alternativa: estilo infantil ou adulto de vida? 1.3. Problemas de (in) disponibilidade para a formação permantente Uma terceira categoria problemática é apresentada pela dificuldade do progresso de adaptação às diversas idades e situações existênciais, como a diversas provocações e oportunidades oferecidas pela vida. São problemas, em outras palavras de formação permanente, ou a criação de obstáculos na segunda etapa do desenvolvimento, nos anos suscessivos ao primeiro desenvolvimento (ou a formação inícial), aquele que deveria durar toda a vida. Não é de fato, simples e despercebida a passagem de uma fase existencial a outra, por exemplo da idade da adolescência à juventude, da juventude a idade adulta, do estado de maturidade psicofísica e da produtividade àquela do progressivo retiro, culminante na velhice com todos os seus limites, os desáfios, os cansaços e tudo que comporta esta idade... Ou, ainda possamos recolocar nesta categoria aqueles problemas que nascem das situações contigentes, mais ou menos provocantes e traumáticas, que normalmente acompanham o percurso vital particularmente do padre ou do consagrado: escolhas particulamente significativas da vida, desáfios ambientais, mudanças não muito agradáveis de cargo ou funções, fracasso apostólico, sentimento de inutilidade pessoal e insignificância da propria mensagem, determinadas pressões culturais e sociais, dificuldades nos relacionamentos (rejeição da própria pessoa por parte dos outros, maledicências e calúnias...), crises afetivas (sentimento de solidão, enamoramento...), dificuldades na obediência, transferimentos inesperados (com a retirada de um ambiente familiar e inserção em um ambiente novo), acidentes particulares, enfermidades de uma certa seriedade, perda de pessoas queridas... São somente alguns exemplos de dificildades determinantes – normalmente – de um evente externo ou por outros sujeitos, mais que poderão acordar antigas (ou talvez adormecidas até então), problemas internos na pessoa, mais ou menos graves, de imaturidade psicológica ou espiritual. E é esta imaturidade que impedirá de desfrutar destas situações como ocasiões de maturação, e também de sentir-se responsável e protagonista inteligente da própria formação, que deveria continuar no tempo. É o problema de docibilitas, ou da pessoa docibilis, que «aprendeu a aprender», livre para aprender com a vida por toda a vida, por cada circunstância existêncial como por cada pessoa, nas situações favoráveis e nos insucessos, até ao último dia da existência; docibilitas que é muito mais que docilitas, e que deveria ser o objetivo da primeira formação. Visto que toda a existência da pessoa seja uma continua formação.9 Seja esta área como também a anterior, podemos fazê-la reentrar na problemática psicológica, porém se trataria, em cada caso, de uma problemática sobretudo reagente que destaca-se como resposta menos livre e pouco madura a um certo tipo de provocação da realidade ou a dificuldades normais da vida humana ou como resposta somente passiva que revela a incapacidade de desfrutar criativamente da situação, ou de acolher a potencialidade formativa para deixar-se depois educar-se e formar-se. A não docibilitas, como já foi falado implicitamente, é esta ausência de entregar-se ou escassa disponibilidade diante das ocasiões de crescimento que a vida oferece continuamente. Não é sempre fácil de reconhecer, porque em condições «normais» 9 Sobre este argumento cf. A. CENCINI – Il respiro della vita. La grazia della formazione permanente.C.Balsamo, 2003, 34-41. A Hora de Deus 13 tais indivíduos parecem estar bem, mas na realidade... o eletrocardiograma está quase reto, não tem fantasia nem paixão, de tal maneira que não sabem colher nunca em torno de si mesmo os desáfios ou os apelos particulares, e assim acabam vivendo como se a formação (permanente) fosse algo que compete somente a instituição a oferecer e não fosse ao invés, o primeiro dever e responsabilidade do sujeito. Para verificar a presença deste tipo de problema, a questão central refere-se sobre a disponibilidade formativa da pessoa ou sobre a sua abertura em deixar-se formar pela vida para toda a vida, ou seja: somente docilis ou docibilis? ou seja, formação ou frustação permantente? 1.4. Problemas de inconsistência vocacional Os problemas de inconsistência e integração vocacional indicam dificuldades muito comuns, a maioria das vezes ligadas a presença de necessidades inconscientes, ou daquelas exigências impulsivas que resultam prevalecentes e dominantes, e absorvem e desviam as energias da pessoa, chegando a condicionar o seu estilo de vida o seu modo de ser, e colocando-o em contraste com as mesmas escolhas existências. A inconsistência inconsciente, na área da sua... competência fecha e bloqueia normalmente o indivíduo dentro de um horizonte de procura de si mesmo e da própria gratificação, ou defesa de si pelas situações que percebe ser ameaçadoras, e estas o impedem de se deslocar segundo dinâmicas de auto-doação motivadas pelo amor e por uma prospectiva transcendental da vida. Dinâmicas e prospectivas que, no caso do sacerdote e consagrado(a), correspondem as suas escolhas explícitas e declaradas da vida (além da natureza intrínseca da vocação sacerdotal e religiosa), mas que vem de alguma forma desmentida e contrastada interiormente por estímulos exatamente o contrário da escolha feita (normalmente com raizes inconscientes). A inconsistência vocacional é exatamente este contraste interno, como uma fenda intrapsíquica que coloca o sujeito em contradição consigo mesmo, tornando-o incoerente naquilo que realiza, pouco convencido das suas (convicções), menos apaixonado com os seus idéais, e portanto não convincente naquilo que fala e instável nas suas operações. As suas energias, de fato, não seguem todas, a mesma direção transcendente, mas são desviadas em direção a outros objetivos, dobradas sobre o seu próprio “EU” e sobre as suas economias subjetivas (= necessidades psicológicas), enfraquecendo inevitávelmente a pessoa, ou impedindo-a de amar com todo o seu coração e com toda a sua mente, com todas a suas forças. É o indivíduo que tem olhos, mas não «vê», tem ouvidos mas não «escuta»... ou vê e escuta com uma atenção e sensibilidade comandadas por forças instintivas que ainda não foram evangelizadas. E que irão expor facilmente este indivíduo a crises, exatamente quando tais expectativas não serão gratificadas. Um exemplo: um indivíduo com pouca auto-estima, ou que não identificou aquilo que da em modo substancioso e estável a certeza da própria positividade, se colocará dentro de uma certa necessidade de sinais desta positividade pessoal, mas sem necessariamente estar consciente (do tipo se não for ajudado em tal sentido), será portanto levado a fazer certas coisas, ainda que boas, ligadas ao seu ministério, sobretudo ou ainda para agradar tais exigências da auto-estima, buscando consentimentos, aplausos, confirmações, promoções, visibilidade, títulos de estudo, diversos sinais de considerção positiva... e fazendo um drama quando tudo isso não acontece, diante então dos fracassos e insucessos (também no plano moral-espiritual), ou vivendo com uma contínua competição e vendo os outros como rivais (os juízes), ou desperdiçando energias em invejas e ciúmes, terminando talvez por não aceitar-se (tornando nervoso e agressivo) e sentir-se insatisfeito (= complexo de inferioridade). Frequentemente tal pessoa poderá ainda ser uma pessoa correta e eficiente em relação ao comportamente,mas será interiormente dividida e ineficaz em relação ao testemunho evangélico. É claro que se a tendência é incosciente, o indivíduo não fará quase nada para mantê-la sobre A Hora de Deus 14 controle, e esta tender-se-à persistir e ripertir-se, crescerá e tornará sempre mais invasora e prepotente. Determinará destorsões perceptivas (em relação ao “EU” e a própria identidade, em relação a Deus e a sua imagem, criando finalmente até mesmo problemas na leitura da Palavra, e no relacionamento com o outro, da comunidade e do sentido da relação); e criará além disso o fenomêno das expectativas irreais (com relação ao futuro, ao trabalho apostólico, até mesmo da vida consagrada e sacerdotal). Podem reentrar aqui, ou encontrar aqui uma explicação para muitas das crises religiosas e sacerdotais de deferentes fenomenologia com êxito negativo, ou em particular as crises precoces de fidelidade dos religiosos, e jovens sacerdotes, frequente a pouquissima distância do gesto de doação definitiva de si mesmo, ambas determinadas da constatação (final ou imediata nestes últimos casos) que uma certa gratificação é sempre mais improvável ou aparece mesmo impassível, enquanto a sua ausência, ao mesmo tempo, é sentida como insurpotável, mas fazemos reentrar também neste nível aqueles modos absolutamente inautênticos de ficar na instituição fazendo um ninho ao seu interno, ou seja encontrando um modo e um sistema para gratificar-se, habitualmente na própria infantilidade e imaturidade, sem cometer grandes transgressões (normalmente, ou estando atento para encobertá-las) e preenchendo a vida de comprometimentos. 10 Esta também é uma problemática psicológica, carecterizada – além da constância do problema – do seu enraizar-se no inconsciente, que causa um obstáculo no processo de libertação do próprio indivíduo. Aqui a pergunta discriminável seria: tensão egocentrica ou auto-transcendente da vida? E depois (ou ainda antes): conheço-me ou não conheço-me nas minhas motivações de fundo? 1.5. Problemas de caráter espiritual Este tipo de problema refere-se a área dos valores, a modalidade concreta de vivê-los, e antes ainda, a visão clara do caminho vocacional pessoal. Aqui temos um salto de qualidade com respeito aos níveis anteriores, não porque não existem mais problemas, mas porque estes são diferentes e visto que muda em cada caso, o modo de confrontá-los. Tais dificuldades, de fato, são ligadas a uma normal dificuldade de viver o Evangelho e as suas exigências, o relacionamento com Deus e as suas pretensões sobre o coração humano, ou as ocupações ligadas a própria escolha vocacional, aos votos, a regra que escolheu como regra de vida etc... cansaço normal, e que – se refletirmos bem – deveria crescer na vida de um crente, já que deveria ser o caminho normal de uma pessoa que levou a sério o empenho de santidade, e que adverte cada vez mais o duc in altum (avançar mar-a-dentro Lc 5.1-11) ligado ao próprio chamado. Estes problemas normalmente se colocam a um nível consciente, a pessoa portanto se da por conta e é suficientemente livre para decidir resolvê-los, ou seja escolher a via do bem e superar a tentação da mediocridade e dos comprometimentos, para escolher ser virtuoso e não cair no pecado. A alternativa, portando, aqui é entre a virtude e o pecado, entre a santidade e a mediocridade. A este nível, e pelo fato que a pessoa aqui vive na plenitude das suas faculdades, é possível provar – sobre o lado negativo – não somente o sentido psicológico da culpa, mas também a consciência teológica do pecado, com a dor e o rigor que a implica; a mesma situação de dificuldade não é vivida como prova somente psicológica, mas como prova espiritual, como vamos dizer melhor mais adiante, ou seja como luta com Deus, e com um Deus que é diferente daquele 10 São os famosos nesters (do inglês nest=ninho) da pesquisa do instituto de psicológia da Gregoriana: Indivíduos inconsistentes que não saem da instituição (como os drop-out), mas permanecem graças as suas espertezas “mais ou menos” de adaptar-se e de acomodar-se (da série “se não toda a torta, pelo menos uma pequena fatia...”), as vezes também fazendo tortas de pouco bom gosto e contentando com gratificações miseráveis. Retorneremos mais a frente sobre isso. A Hora de Deus 15 que o crente trás na sua imaginação, um Deus que é não somente amigo afável, confiável, mas “rio traiçoeiro”, um Deus que não está sempre ali para responder com as expectativas do orante, para o contentar, porém frequentemente se mostra ausente, e as vezes até mesmo não responde ou responde com um silêncio que desconcerta e que é duro aceitar.11 A prova espiritual ou a luta com Deus propõe novamente ao homem continuamente a escolha clássica e dramática da vida, entre o bem e o mal, luta travada entre a atração do primeiro e obscuridade fascinante do segundo, como dois abismos que abrem-se diante ao mistério da sua liberdade. Quem vive neste nível e leva a sério a vida espiritual, ou aquela que Rahner chama “a dificuldade de crer”, por isso mesmo expermentará a cada dia a dificuldade e a realidade problemática do crescimento na vida espiritual, e advertirá muito mais que os outros, então, a mesma realidade da tentação,12 reconhecendo os truques e as periculosidades. Como nos conta as histórias dos santos.13 Alguns entres os santos ou talvez muitos (quem pode quantificar com certeza sobre isso?) foram muito além disto que estamos dizendo aqui, e expermetaram no máximo grau aquela ausência de Deus que torna cruciante, aquele silêncio que a criatura sente-se angustiada, quase até mesmo vendo-se distante, como o pior dos pecadores: é a experiência conhecida como “noite escura da alma”, ou “noite do espírito”, ou a “noite da fé”, como João Paulo II chamou a experiência de Maria14, experiência não muito comum a todos os crentes, mas a uma categoria particular entre eles: os místicos (de S. Bernado a S. Catarina de Sena, de s. João da Cruz a S. Teresa de Avila, de S. Teresinha do Menino Jesus15 a beata madre Teresa de Calcuta,16 de Chiara Lubich até mesmo João Paolo II, segundo alguns, nos últimos anos de sua vida),17 mas experiência sempre condunzida a esta catégoria de problemas, quase no seu extremo. Nesta noite até mesmo a fé tornar-se uma angustiante incerteza, e o que antes constituia fonte de alegria para o espírito humano torna-se agora escuridão e trevas. É uma das provações entre as mais terríveis, que requer da alma um exercício de pura fé, da fé nua, mas que enfim produz nesta uma grande purificação, para torná-la ainda mais morada onde Deus pode habitar. Quando e como Ele quiser. Além desta experiência extrema, privilégio e provação para poucos, os problemas ligados a vida espiritual são problemas que todos, pelo menos em parte conhecemos e que pelo menos em alguns momentos da vida (se espera) nós particurlamente o vivemos, problemas que chamam a atenção constante de quem está empenhado em um caminho de crescimento espiritual, como de quem acompanha em um caminho de formação. Mas nem sempre existe a capacidade de distinguir este tipo de problemas com aqueles precedentes, de natureza mais explicitamente psicológica. Frequentemente o problema espiritual 11 Durante o encontro com os jovens italianos em Loreto no mês de agosto de 2007, Bento XVI, deu uma resposta a uma pergunta de uma jovem sobre o mistério de Deus: “Todos nós, ainda que crentes, conhecemos o silêncio de Deus”. Pelo fato que somos crentes... 12 “Filho se te apresentares para servir o Senhor, prepara-se para a tentação” (Eclo 2,1). 13 “As grandes aspirações são sempre acompanhada de terríveis tentações” (L. BOFF, Francisco de Assis. Uma alternativa humana e cristã, Asis 1982, 191; cf. Também A. CENCINI, Vida consagrada. Intinerário formativo durante o caminho de Emaus, Cinisello Balsamo 2002, 29-33).14 João Paulo II, Redemptoris Mater 17c : EV 10/1315. 15 Este trecho autobiografico de S. Teresinha ajuda a entender o que é a noite do espírito: “ Minha dileta Celina, não sei se estás ainda na mesma disposição de espírito do outro dia, mas te citarei assim mesmo uma passagem do Cântico dos Cânticos, que exprime perfeitamente o que é uma alma imersa na aridez e que nada a consegue alegrá-la nem consolá-la: “Eu desci ao jardim das nozes, para ver as frutas do vale, para observar se a vinha fosse florida e se as romãs ja haviam amadurecido. Não sabia mais estava... A minha alma ficou totalmente agitada por causa dos carros de Aminadab” (Ct 6, 10-11). É esta a imagem das nossas almas: nós descemos nos férteis vales ao qual o nosso coração ama ser alimentado, o vasto campo das escrituras que muitas vezes se abre diante de nós para doar-se a nós os seus ricos tesouros, este vasto campo parece-nos ser um deserto árido e sem água. Não sabemos mais, nem mesmo aonde estamos: em um lugar de paz, de luz, não encontramos somente a tribulação ou, pelo menos as trevas. Mas, como a esposa, sabemos a causa das nossas provações. A nossa alma é pertubada por causa dos carros de Aminadab. Não estamos ainda na nossa pátria e a provação deve nos purificar como o ouro no cadinho. De vez em quando pensamos que estamos abandonados; Ai de mim! Os carros, os barulhos que nos afligem estão fora de nós ou dentro de nós? Não sabemos! Mas Jesus sabe bem” ( de uma carta a irmã Celina do 6 de julho 1894). 16 Foi notável a sensação da publicação das cartas e memórias de irmã Teresa, por parte do Postulador (B. KOLODIEJCHUK, Madre Teresa. Seja a minha luz, Milão 2008, 201-202), com a inacreditável revelação da sua noite espiritual ao qual ela viveu por cerca de cinquenta anos! Algumas de suas expressões nos ajudam a enteder o sentido que ela mesma deu a este tempo de provação estrema. “Se é agradavel a Vós Senhor, se a minha dor e o meu sofrimento, a minha escuridão e separação vos dar ó Senhor uma gota de consolação, meu caro Jesus, faz de mim aquilo que o Senhor quiser e por todo o tempo que quiser, sem olhar os meus sentimentos e a minha dor... Eu sou tua. Marque em minha alma e sobre a minha vida os sofrimentos do teu coração. Não se importe com os meus sentimentos, não se importe com a minha dor ... Se a minha separação de Vós, leva outros a Vós e se nos seus amores eles se aproximarem de Vós e isso vos traz alegria e prazer, então Jesus eu estou disponível, com todo o meu coração, a sofrer tudo o que for necessário que eu sofra, não somente agora, mas por toda eternidade, se possível” 17 Cf. F. CIARDI, “A noite tempo de provação. A experiência dos Santos”, em Nova humanidade 30(2008), 165-187. A Hora de Deus 16 convive com aquele psicológico, tornando um problema espiritual conjuntamente com uma inconsistência vocacional. Em síntese: Esta descrição nos colocou diante de um quadro muito vasto dos possíveis motivos ou raizes, a nível teórico, das situações de crises, dando nos – em suma – três diferentes características desta crise: existe por um extremo a crise determinada por um problema do tipo patológico (o ponto 1.1), diante do qual a pessoa parece impotente e que necessita obviamente da intervenção de um especialista; existe ainda uma vasta área, que abrange os três pontos sucessivos da nossa análise descritiva (1.2, 1.3, 1.4), a qual a crise aparece provocada por um problema psicológico de diferente gênero, e que põe em causa em modos e proporções diferentes a liberdade e responsabilidade do sujeito, e será uma problemática ou ligada a dificuldades evolutivas no passado (1.2), ou a uma menor liberdade interior de deixar-se formar pela vida presente (1.3), ou a inconsistência e imaturidade mais ou menos inconsciente (1.4): tal área está no limite de um lado com a patologia ou os problemas psiquiátricos, e do outro com problemas de natureza espiritual que constitui a terceira característica das crises: as crises “nomais”, sinal de uma personalidade substancialmente íntegra, sobre o plano psicológico e espirítual, crises determinantes pelas leis de crescimento, seja psicológico ou espiritual (veja mais a frente o Quadro 1). Mas a nossa não é uma indagação têcnico-teórica, e sim mira a identificar corretamente o problema na medida em que este pode facilitar uma intervenção para ajudar. Ocorre então dar uma passo a mais para delimitar mais precisamente estas áreas e comprendê-las de maneira mais profunda, sua especificidade e sua natureza. 2. Dimensão da liberdade Nos perguntamos então: qual é o grau de liberdade dos diferentes níveis problemáticos que acabamos de ver? A sensação, de fato, é que a cada um deles exista um correspondente nível de liberdade da pessoa, com consequente responsabilidade.18 2.1 Terceira dimensão: liberdade ausente No nível da patologia não existe liberdade: O psicótico não é livre para compreender e para querer, pelo menos na zona interessada a sua patologia, e interpreta a realidade segundo um rito ou um rítmo compulsivo que o distância inexoravelmente da realidade e do qual está mais ou menos praticamente oprimido. Assim o neurótico obssesivo-compulsivo, que – compreendendo que não vale a pena lavar as mãos cem vezes ao dia e mesmo não querendo fazer – é interiormente “obrigado” a fazê-lo; ou pior ainda o psicótico paranóico, que vê inimigos por todos os lugares se sente atacado por qualquer um, sem alguma possibilidade de convencê-lo do contrário. Mesmo também o sacerdote pedófilo poderia ser enquadrado nesta categoria ou dimensão (pelo menos em relação a tendência pedófila) e deixando-se ser condicionado por alguma coisa que lhe impõe e que ele não pode dominar (obviamente não todos os casos de pedofilia se encaixam neste grupo, existe ainda o pedófilo que poderia ter escolhido não ser pedófilo).19 18 Tomo como ponto de partida, neste paragrafo, a partir da intituição de Rulla; Cf. RULLA – F. IMODA – J. RIDICK, Antropologia da vocação cristã, 1: Bases interdisciplinares,Bologna 1997, 492-493. 19 Outra distinção possível no campo das desordens psíquicas seria esta: Psicose, como perda do contato com a realidade e refúgio em um mundo subjetivo, na qual a psicose se impõe de tal maneira em que o sujeito não poder fazer nada para contestá-la, nem mesmo para reconhecê-la como tal. Neurose, que provocaria um distúrbio no contato com a realidade mas sem um dobrar-se absolutamente no subjetivo ou com um dobrar-se relativo, por isso o neurótico pode combater até um certo ponto a sua neurose e sendo consciente sofre com ela. Desvio na personalidade, enfim, o que estão dizendo um distúrbio relativamente relevante, leve, que não tira nem o contato com a realidade nem a capacidade de controle, porém lhe coloca um limite, como veremos melhor mais a diante. Diz algo verdadeiro a piada segundo o qual o neurótico constrói castelos no ar e o psicótico vive la dentro, enquanto o psiquiátra ou psicólogo cuida de receber o aluguel sendo mais ou menos ganancioso dependendo do grau de distúrbio de personalidade... A Hora de Deus 17 Evidentemente aqui, se não existe a liberdade, não tem nem menos responsabilidade subjetiva, pelo menos imediata e direta, nem bem ou mal do ponto de vista moral da consciência subjetiva. Poderá existir um senso de culpa, mas fortemente condicionado (com excesso ou com defeito) variadamente contaminado pela síndrome mental ou afetiva do qual o sujeito sofre. Enquanto não poderá existir uma consciência de pecado verdadeiramente dita. A este nível, em uma última análise, existe somente um discurso de sanidade ou enfermidade psíquico-mental para considerar.20 Porém é sempre importante fazer uma analise, indispensável ali onde levantam-se dúvidas legítimas sobre tudo no momento do discernimento vocacional inicial e para a admissãoas ordens e aos votos.21 Certo, uma psicose pode manisfestar mais tarde, e então seram considerados dentro das possibilidades rigorosas medidas preventivas de contenção (por exemplo: não colocar um sacerdote com tendências a pedofilia para visitar e receber normalmente sem algum controle as crianças e pre-adoscentes). 2.2 Primeira dimensão: Liberdade Plena Se no outro extremo desta descrição colocamos a problemática espiritual, como sugere o nostro esquema descritivo, veremos que a situação se inverte completamente: E neste nível existe liberdade, a pessoa é capaz de entender o que seria bom fazer e que é capaz de fazê-la. Se não faz o bem, mas o mal, o indivíduo nem é consciente; é responsável, portanto, das ações e das transgressões. Sente a dor e a sofre. Visto que conhece, pelo menos em teoria, além do estado dos comportamentos e dos sentimentos, para reconhecer ainda as motivações que lhe impulsam a agir, em outras palavras não se detém na sinceridade subjetiva, mas sabe colher a verdade objetiva do seu ser e do seu agir. Aqui existem o bem e o mal, portanto, o virtuoso e o pecador. Isto é, aqui, rigorasamente falando, existe vida moral: o ato assume uma verdadeira conotação moral. Tal dimensão provavelmente não representa obviamente a ponto de excluir as outras dimensões a permanência habitual do nosso viver e dos nossos atos, mas é apenas uma dimensão possível, não somente ideal, para ser procurada constantemente ou pelo menos em parte (as vezes mínima) está presente já nos nossos atos. 2.3 Segunda dimensão: Liberdade relativa No meio existe a situação ligada ao problema que chamamos psicológico. E é este que mais nos interessa, que diz respeito a maioria das nossas ações. Aqui a liberdade não é nem completamente ausente, nem completamente presente, mas relativa. É uma situação intermédia, determinada como tal pela presença do inconsciente que lhe escurece em parte ou confunde, mais ou menos, a percepção do sujeito, impedindo-o de entender lucidamente a motivação real que o impulsiona a agir, ou o que na verdade está ao centro do seu coração, dos seus interesses, desejos, escolhas..., além das suas afirmações ou das “boas intenções” ao qual ele mesmo acredita sinceramente ou da aparência externa daquilo que faz. Um inconsciente, como eu disse, que escurece e impede em parte, não o todo; tornando a pessoa menos atenta e menos vigilante para entender aquilo que acontece dentro de si, depois de um longo processo que não é irreversível; 20 Não abordamos aqui a complexa questão da possibilidade da santidade nestes casos. Mas podemos dizer somente que, se a santidade consiste na liberdade e radicalidade com a qual a criatura acolhe a ação de Deus sobre si, não pode excluir absolutamente que um fiel com problemas psicóticos possa usufruir deste grau, seja por um mínimo, de liberdade que lhe sobrou ao máximo das suas possibilidades, e alcança assim um certo nível de santidade, aquele a ele acessível. Talvez não será um nível alto objetivamente, mas subjetivamente tal pessoa deu o máximo de si. A História nos apresenta neste sentido diversos exemplos. 21 É bom recordar que não pode receber validamente a ordenação “quem sofre de qualquer forma de loucura ou de outra enfermidade psíquica, com a qual, consultados os peritos, é constatado a incapacidade de desenvolver de modo apropriado o ministério” (CDC 1041 § 1). A Hora de Deus 18 diminui a sua liberdade, não a elimina pela raiz; orienta e as vezes deforma uma certa sensibilidade, mas não cancela a possibilidade de reacordar-la e reanima-la...22 A liberdade do sujeito, nesta segunda dimensão, permite chegar a sinceridade, não a verdade. E é liberdade relativa e portanto reduzida, por isto, uma vez que permite reconhecer os próprios sentimentos e sensações (talvez para depois negá-los, arriscando de se tornarem analfabetos sentimentais, porém ao menos em teoria existe aqui a possibilidade de reconhecer os próprios sentimentos), mas não de ir além, de captar e decifrar as motivações profundas, as intenções subterrâneas e as atrações do coração (ao menos que não seja ajudado explicitamente neste sentido), em suma a verdade. É claro que este límita (não exclui) a liberdade, não a liberdade assim chamada indispensável, isto é, a capacidade de agir e escolher em geral, mas somente aquela inicial e mais... secreta, assim sendo frequentemente é desconhecida até mesmo pelo sujeito, ou nunca considerada seriamente. Podemos dar algum exemplo desta (não) liberdade, ou liberdade reduzida, que é frequentemente o modo de ser da nossa liberdade, nunca absoluta e frequentemente somente relativa (mesmo se isto nos encomoda não queremos aceitá-lo e temos a tendência a ingnorá-lo). De fato frequentemente corremos o risco de não ter: - A liberdade de sentir, de perceber toda a realidade, mesmo nos aspectos mais inquietantes e provocantes, como os apelos ou os “sinais dos tempos”. Como nos diz o episódio evangélico do bom samaritano, quando um sacerdote e um levita “viram” um infeliz mas sem a liberdade de sentir-se por ele chamados e provocados a parar, para ajudá-lo. - A liberdade para amar aquilo que fazemos e de fazê-lo por amor, um poco como Marta que faz um gesto de serviço, mas demostra não amá-lo, de fazer não somente por amor; mas se lamenta, e fica nervosa com sua irmã, um pouco também com Jesus que não intervem, e enfim até consigo mesma “obrigada” (por causa da falta de liberdade) a fazer os trabalhos mais humildes sem ser notada, como não servisse a nada. - A libertade de comover-se, diante do belo de sentir-se atraido pela verdade, evidentemente porque faltar uma certa sensibilidade quando gostos e interesses da pessoal vão em outras direções, que não sejam aquelas da beleza ou da verdade. A comoção (do cum-movere – mover-se com) indica o envolvimento total das energias afetivas e intelectuais, mas se tiver dispersão das energias para outros objetivos, não poderá ter alguma comoção por aquilo que dizemos de ter colocado ao centro da vida. - A liberdade de... entender aquilo que se lê, se vê e se sente, ou seja de entendê-lo em profundidade, de descobrir o fragmento da verdade que permanece consigo, sentindo a verdade não somente em si mesmo, mas também por aquilo que diz a minha vida, e portanto convicente. Poderíamos chamá-la a liberdade de deixar-se convencer, onde por muitas vezes o medo de dizer a verdade causa obstáculos. - A liberdade de amar e de deixar-se amar, que pareceria fácil liberdade, mas que muitas vezes se choca com o medo de se envolver no relacionamento, com medo do outro, com medo de seus próprios sentimentos e os dos outros, de abandonar-se ao amor, de sentir-se responsável pelo amor recebido...; - A liberdade de entregar-se totalmente a Deus, mas também aos outros, porque mais uma vez se teme o outro, em geral aquele Outro que se entregou totalmete a nós em um ato de amor total. Estranho dizer isto, mas as vezes diante ao amor de Deus sentimos uma vertigem, aquela parte infantil de cada um de nós que se manifesta e então desejaríamos que Deus nos amasse menos. - A liberdade para deixar-se ser lido e transpassado pela Palavra, de deixar a Palavra dizer a verdade, aquela Palavra que é a Verdade, que nos sonda como nenhuma outra, e diante da qual 22 Sobre o sentido do inconsciente e sobre o seu possível influxo se expressou assim Wojtyla em uma de suas obras: “... na realidade parece que seria impossível entender e explicar o ser humano, o seu dinamismo como também o seu agir consciente e as suas ações, se nós baseássemos as nossas considerações somente sobre a consciência. Sobre este ponto, parece que a potencialidade do subconsciente aparece primero; esta é primária (antecedente) e mais indispensável da consciência para a interpretação do dinamismo humano, como também para a interpretação do agirconsciente” (K. Wojtyla,The acting person, Dordrecht 1979, 93). A Hora de Deus 19 muitas vezes desencadeia ainda o medo de estar nu, estar transparente, de ser revelado o que somos (e que as vezes não sabemos), ou o medo de ter que mudar, e assim nossa leitura é tão superficial quanto monótona, leitura que nunca se torna dilectio23 (= amor). - A liberdade de pedir o máximo de si ou de se converter, visto que nos iludimos (e a ilusão é já redução de liberdade) que a mediocridade seja a preferida ao invés da radicalidade, que a sensação de bem-estar pessoal deve ser o critério de cada escolha e de cada avaliação da consciência ou não somos ainda livres para acreditar que a maior alegria estar no dom de si e não no usar os outros para seus próprios intereses. - A liberdade de descobrir o cêntuplo prometido por Jesus e apreciá-lo, primeiro porque a dependência de gratificação imediata não abre à esperança (na realidade nós não acreditamos o suficiente nesta promessa), segundo, porque os nossos sentidos aprenderam apenas um tipo de gratificação, antigo e pagão, e portanto não são ainda capazes de aproveitar o dom que Deus nos dá continuamente, mas nem mesmo de perceber esta dádiva. - A liberdade de sentir-se bem-aventurado naquelas situações indicadas por Jesus no discurso da montanha, visto que parece-nos impossível encontrar a alegria na humilhação, na maledicência, na perseguição..., e porque normalmente colocamos o foco mais sobre os comportamentos indicados por Jesus (sermos mansos, pacientes, pacíficos ...) do que sobre a experiência de bem- aventurança contidas nestas virtudes, porém as vezes escondidas, mas prometidas por Jesus. - A liberdade de provar os sentimentos do Filho ou de desejar os desejos de Deus, uma vez que já nos parece muito mudar os comportamentos ou nos orgulhamos por fazer tantas coisas para o reino de Deus, e enquanto isso deixamos que no nosso coração vivem sentimentos e desejos que estão longes daqueles do Filho, sem percebermos o sútil farisaismo implícito nestes sentimentos e desta maneiras fosse impossível evangelizar sentimentos e impulsos ... 24 3. No coração do problema Ficamos muito tempo nestes exemplos, não só porque frequentemente não damos devida atenção nem importância a estas liberdades, mas porque isto nos ajuda a compreender a natureza destes problemas psicológicos que podem levar-nos a uma situação de crise, ao coração do problema, que é sempre e sobre tudo problema de liberdade. 3.1 Falta de liberdade e frustração Uma crise é normalmente ligada a uma menor liberdade, diretamente ou indiretamente. Liberdade entendida como modo para crescer plenamente, pleno porque exprime um envolvimento integral do homem, quando age com todo o coração, com toda a alma, com todas as forças e com toda a sua sensibilidade. O homem é livre quando e visto que pode fazer apelo a todas as suas enengias e recursos; por esta razão podem agir independentemente, sem a necessidade de ser forçado. A expressão máxima da liberdade (e do modo de intender a liberdade) é fazer as coisas por amor, experimentando o sabor típico de quem tem lentamente aprendido a fazer as coisas por amore. Tal típica expressão de liberdade é seguida, declinável em várias formas, como demonstramos – negativamente – com as exemplificações precedentes. Quando ao contrário não tem este envolvimento total, ali não tem crescimento nem terá liberdade, pelo contrário ao invés do gosto livre e libertador para fazer as coisas por amor existirá a preocupação contrária, aquela de fazer as coisas para ser amado ou de pensar somente em si mesmo, de viver as relacões para curar as próprias feridas, para obter um resto de atenção, para 23Cf. A.Cencini, A vida ao ritimo da Palavra. Como deixar-se formar pela Escritura, Cinisello Balsamo 2008. 24 Sobre a necessidade de conhecimento de si mesmo e das próprias inconsistências cf. A. Cenceni, A arvore da vida. Para um modelo de formação inicial e contínua, CINISELLO Balsamo 2005,251-253. A Hora de Deus 20 axibir-se de frente aos outros e de ser considerados melhores que os outros, por ilusão de conquistar felicidade fazendo os próprios interesses... Todas as formas de não liberdade que aumentam ainda mais o nível de frustração. E a frustação como sabemos é sempre antecâmara da crise, um padre frustrado é sempre um padre em risco. Tornando a nossa subivisão, parece que a possibilidade desta frustração seguirá em teoria uma evolução exatamente contrária a presença da liberdade: por isso será máxima nos casos de psicopatologia, relativamente intensa nos três casos que tínhamos indicado de liberdade relativa e mínima ou ausente em quem vive apenas problemas espirituais. Mas, na prática, talvez as coisas são um pouco diferentes. Nos casos de psicopatologia o senso de frustração é difícilmente identificável, poderá ser intensa no mais auto nível, mas também ausente, sendo ligada ao gênero e ao tipo de consciência do sujeito. Enquanto é evidente o sentido de frustração para quem vive em uma situação de liberdade reduzida, na medida em que será reduzida a liberdade por causa da inconsistência, como vimos nos exemplos relatados. Assim como não podemos excluir a presença da frustração para quem vive os problemas normais legados a vida espiritual, por experiência seja da própria fraqueza ou seja pelo mistério inacessível do divino. Portando é importante para nós chegarmos a esta conclusão: o problema objetivo de tipo psiquiátrico ou psicológico ou espiritual que está na origem de uma crise incide regularmente sobre a liberdade do sujeito, reduzindo-a, e criando um sentimento de frustração que tira vagarosamente o gosto de viver e de viver a própria consagração. E, é já uma crise, ou situação que frequentemente conduz à uma crise. Há portanto, no começo uma limitacão objetiva, em que o sujeito percebe e sofre as consequências, mas normalmente sem entender a origem. 3.2. Falta de Liberdade e a sensação estranha Dizíamos também que, pelo que parece, a maioria da nossas ações ou do nosso quotidiano não exprime a liberdade plena, mas uma liberdade parcial e relativa, superficial e reduzida. Isto significa que normalmente aquilo que fazemos é de natureza composta, implica, isto é, vários estímulos motivacionais nem todos com origem consciente. Normalmente, somos levados a ignorar as motivações que nos criam mais problemas, que diminuiria a nossa estima, que tem raízes profundas no nosso passado, que refere-se a um costume bem enraizado... 25 De fato, não a conhecemos e não conhecendo-a, não podemos controlá-la. Daí duas consequências: ante de tudo não somos – ainda uma vez – livres para agir como quisermos, sofremos pressões internas, mais e antes mesmo daquelas externas; e isso nos faz sentir como estranhos a nós mesmos, como se habitássemos em um corpo ou em uma psique que não nos pertence de modo que vemos o bem que deveríamos fazer e, em seguida escolhemos o mal. Isso aumenta a sensação de frustração. Ou, outra conseqüência já em parte mencionada, fazemos as coisas, mas com uma certa divisão interna, não com todo o coração, com toda a mente, com todas as forças, e corremos o risco de nos tornarmos incoerentes, não porque somos obviamente falsos e contraditórios, mas porque uma força ou uma atração ou um medo que nós ignoramos nos impede de envolver todas as nossas energias, como dizíamos, de “cum-movere” cada componente psíquico para uma direção, como gostaríamos. Não é necessariamente maldade, antes é basicamente falta de liberdade, mas que implica um menor controle pelo sujeito sobre sua vida, uma sensação de ego-alienante em relação a si mesmo, como uma desorientação interior. Que muitas vezes leva à crise. 25 É interessante notar que já São Tomas na sua Suma Teológica (I-II), falando dos atos da pessoa humana, teria ditoque “na maioria dos casos” o agente pode estar completamente inconsciente do influxo de distorções produzidas por suas lutas “emotivas” sobre suas percepções, sobre suas escolhas e ações... que devem não obstante serem consideradas plenamente como “ato humano”(cf.K.Baumann, “The Concept of Human Acts Revisted By St.Thmas and the Unconscious in Freedom”, in Gregorienum 80[1999]1, 151 e162) A Hora de Deus 21 Também aqui se trata de uma limitação objetiva, que o indivíduo pode perceber sobretudo pelos problemas que lhe cria, mas sem poder intervir sobre a verdedadeira causa. E isto cria inevitavilmente tensões que muitas vezes explodem em uma verdadeira crise. Com uma imagem gráfica, tentamos sintetizar o que foi considerado até aqui. 1 Quadro - Área e limites de problemas psicológicos, Problemas Conteúdo Alternativa Natureza Liberdade de Psicopatologia transtornos psicótico- neuróticos sanidade ou patologia? clínico- psiquiátrica Ausente (3° dim.) do obstáculos ao desenvolvimento Interrupção ou regresso evolutivo estilo infantil ou adulto? Psicológica Relativa (2°dim.) de não formação permanente indisponibilidade formativa dicilis o docibilis? Psicológica Relativa (2°dim.) de inconsistências vocacionais conflito interno inconsciente egocêntrico ou auto- transcendente? psicológica Relativa (2°dim.) de qualidade de vida espiritual incoerência e mediocridade santo ou pecador? espiritual Completo (1°dim.) Como podemos ver o aspecto objetivo de uma situação de crise é bem complexo, mas é possível também delineá-lo especificando o tipo de problema ao qual a pessoa sofre. É isto que tentamos fazer neste capítulo. Deixando a parte alguns aspectos para depois em seguida retornar sobre aqueles mais práticos na identificação do problema, aonde surge a tensão, e os sinais que esta nos proporciona. Por enquanto foi considerado apenas o fundo de um evento crítico, ou como já dissemos, o seu coração. E nós o identificamos na falta de liberdade com o sentimento de frustração e de estranheza que dela procede. Se o homem é feito para ser livre, e trás dentro de si uma necessidade de liberdade que não pode ser suprimida, não é difícil compreender que tal falta conduz lentamente à uma crise, mas é possível e necessário compreender melhor as etapas posteriores. A Hora de Deus 22 Capitulo 2 A Crise Vimos o lado objetivo do nosso tema, ou pelo menos procuramos entender um pouco a coisa em si; gostaríamos agora de ver o problema do ponto de vista do sujeito que vive o problema. Uma coisa é o problema em si, considerado por um ponto de vista intrínseco, por seu conteúdo e várias características (seriedade, componentes, diagnósticos, prognóstico, terapia...), outra coisa é observar o nível de consciência da pessoa, que poderia ser completamente ou parcialmente ausente. E dentro deste entendimento, uma coisa é entender a raiz do problema (já falei um pouco sobre isso no capítulo precedente), e outra coisa é entender a gravidade da situação ou perceber o apelo a uma mudança até o ponto de decidir-se a fazê-la. No caso, por exemplo, sobre problemática psiquiátrica, evidentemente o sujeito não tem consciência da própria situação clínica; ao contrário, o estado de inconsciência é exatamente o elemento substancial do quadro sintomático clínico, é um dos seus sinais mais evidentes e decisivos. Mas não só isto é típico do nível mais grave da nossa descrição. Também nos outros níveis do problema psicológico e espiritual é possível, como vimos no capítulo precedente, uma diminuição do grau de consciência, do estado de inconsciência geral (até mesmo este grau é possível) a situação de quem não se deu conta da seriedade da sua situação, da gravidade do que está vivendo, para si, e talvez também para os outros. Ou não o “sofre” suficientemente nem o combate; como também é possível o caso de quem está oprimido e dilacerado, perdeu a esperança de sair fora desta realidade que vive. Neste caso, no excesso como no defeito, existem problemas no estado de consciência e na formação da consciência. Alguns dizem que o verdadeiro problema da vida religiosa ou sacerdotal não seriam as situações críticas, objetivamente problemáticas, dos padres, freis e freiras, mas aquela massa de gente “consagrados” que vive subjetivamente tranquila, que não é pertubada e nem pertuba ninguém. Situação objetivamente crítica, são aquelas pessoas que não estão em crise, porém deveriam estar. Ou ainda consagrados e consagradas que si sentem desconcertados, quando percebem que algo não vai bem nas suas vidas, mas não tem a capacidade de entender a raiz do problema em si, ou intuindo que teriam crises, buscam imediatamente um modo de empurrá-las para o exterior, para longe de sua responsabilidade, esperando e iludindo-se de tal modo poder eliminar o sentido da necessidade pessoal de passar por uma crise. Ou seja, em última análise, é o problema da consciência, não simplesmente no sentido de fenômeno cognitivo-psicodiagnóstico ou de informação mais detalhada sobre o próprio nível de (im)maturidade, mais como sensibilidade interior, vigilância e atenção, todos componentes da consciência e que tem haver com o processo de formação desta mesma consciência. Aspectos, enfim, graves e importantes da nossa vida, que não veremos certamente tudo aqui, mais que podemos começar a encontrar já nesta primeira tentaviva de análise. 1. Conceito de crise Talvez existe uma sutileza terminológica que leve em conta a distinção que estamos fazendo, e que portanto nos poderá ajudar a entender melhor e a especificar mais precisamente o sentido do termo. Ao que parece o termo “problema” ou “problemática” nos envia mais a ideia objetiva da questão, enquanto um outro termo muito usado hoje, ou seja “crise”, nos leva a pensar mais a percepção subjetiva da crise em si, e consequentimente a sua vivência pessoal. A Hora de Deus 23 Eis porque neste paragráfo introduzimos o conceito de “crise”, como conceito provavelmente mais abrangente que “problema”: ao passo que, quando se diz que alguém “há um problema” especificando que um outro “está em crise”. Quero sublinhar que a crise é quase um modo de ser, no qual alguém se encontrar completamente envolvido da cabeça aos pés, como se estivesse mais ou menos dominado. Enquanto que “problema” poderia permanecer externo a consciência do sujeito que parece até mesmo poder dominar melhor. Se em seguida voltarmos ao quadro prospectivo número 1, veremos que existe uma crescente do ponto de vista da consciência crítica, a partir da situação patológica, quando tal consciência é mínima, até mesmo alcançando os problemas de vida espiritual, que são maiores. Uma passagem que evidentemente interessa também a área da problemática psicológica, antes passa através desta, e logo é importante focalizar não somente o plano do diagnóstico. Vamos portanto definir melhor, antes de tudo, o conceito de crise e os seus componentes fundamentais, para depois passar no próximo capítulo, para a descrição de alguns modos subjetivos de viver a crise em si, ou a consciência do próprio problema. 1.1. Proposta de definição A vida, também aquela dos que se consagram ao Senhor ou que se entregam a um grande ideal, é feita de crises e situações difíceis. “A fè nasce no coração de uma crise”26 ou – como disse Merton – “inesperadamente a vida se move em direção a crise e o mistério”27. Afirmação significativa ao estabelecer uma ligação entre crise e mistério, já que nos faz pensar que a crise, qualquer crise, seja aberta ao mistério, seja na sua origem ou no seu êxito final, e nós não estaremos certos com as nossas distinções e explicações pretender eliminar o componente misterioso da crise. Crise, na realidade, de um ponto de vista etimológico28, significa um estado decisivo, situação de vida aberta para diversas possibilidades. O termo
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