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APS - Dispensa Coletiva - Maria Bastos de Jesus


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Maria Bastos de Jesus - R.A.: 8397202 – Turma 003207C02
Prof.: Renato Negretti Cruz – Direito Protetivo Coletivo do Trabalho 
A (Des)Necessidade de regulamentação da dispensa coletiva no Brasil: Uma análise sob a ótica do valor social do trabalho e da dignidade da pessoa humana
No Brasil atual, é comum nos depararmos com notícias, sendo amplamente divulgadas ou no boca a boca, sobre dispensas coletivas. Ou seja, da demissão em massa de um número considerável de trabalhadores com a justificativa de que a empresa esteja passando por dificuldades econômicas no país ou mesmo por causas de disciplina da empresa, como adaptação tecnológica e financeira. No mundo do empreendimento, os riscos econômicos ficam com o empregador, segundo o artigo 2º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e nesse caso, não deve passar para o empregado esses riscos, nem mesmo em época difícil. Mesmo assim, vemos muitas greves e reações de empregados porque as empresas reagem às crises com cortes de custo, demissões em massa, fechamento de estabelecimento, etc.
O artigo 6º da Constituição Federal coloca em destaque que o trabalho é um direito social. E por meio do ordenamento jurídico, o valor social é assegurado que o cidadão exerça a sua dignidade e liberdade. Por causa dessa garantia, apareceram os direitos trabalhistas por meio da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que sela um acordo à relação do emprego, conduzido em conformidade com os princípios básicos do direito trabalhista. É válido ressaltar que o contrato de trabalho pode ser extinto por diversas causas. 
O fim do contrato de trabalho previsto na CLT pode ocorrer de várias formas: por decisão do empregador, por decisão do empregado, iniciativa de ambos, desaparecimento dos sujeitos, ou quando há o decurso do prazo determinado em contrato. A dispensa é uma declaração disposto de um só lado, unilateral, feita pelo empregador ao empregado, para que o contrato de trabalho seja encerrado sem justa causa. 
Para que essa decisão tenha efeito, é preciso alguns requisitos, como destaca BONFIM (2015, p. 1024), “a declaração de vontade receptícia, a capacidade do empregador e do empregado, a legitimidade de quem emite a declaração, e a homologação do recibo de quitação no órgão competente. Destaca-se ainda que a dispensa é efetivada quando o empregado é notificado e tem plena consciência da dissolução do contrato, desse modo, independe da sua vontade.”
A dispensa pode ser interpretada de modo arbitrário, quando não há um motivo para que o empregado seja dispensado: sem justa causa, quando o motivo seja de capacidade, financeiro ou econômico e com justa causa, que é uma falta grave por parte do empregado. Quanto à quantidade, pode ser individualmente ou até mesmo coletivo, que atinge um número considerável de empregados dispensados. 
Mas, antes da aprovação da lei 13.467/2017 (reforma trabalhista), a dispensa coletiva não era regulamentada no Brasil. Tanto que o ordenamento constitucional regula somente a dispensa individual, como é visto nos artigos 7º, I, da CF e 10, II, do ADCT da Constituição Federal Brasileira. 
Segue os trechos dos artigos abaixo:
“Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
I - relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos;
Art. 10. Até que seja promulgada a lei complementar a que se refere o art. 7º,
I, da Constituição:
II - fica vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa:
a) do empregado eleito para cargo de direção de comissões internas de prevenção de acidentes, desde o registro de sua candidatura até um ano após o final de seu mandato;
b) da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.”
A dispensa coletiva pode ser descrita como “dispensa em massa” e “dispensa geral”. A lei 13.467/2017 foi o primeiro ponto legal interno a tratar sobre a questão do coletivo, mesmo que não tenha determinado regras legais para atribuir melhor sobre o caso. Para Nelson Mannrich (2000, p. 555), a dispensa coletiva é a “ruptura diferenciada do contrato de trabalho de natureza objetiva, de iniciativa patronal, decorrente de causas homogêneas que, durante um determinado período de tempo, atinge certo número de trabalhadores.”
No caso, a dispensa coletiva pode ser classificada como uma cessão de contratos de trabalho múltiplo em determinado espaço organizacional, por parte do empregador, e por motivos objetivos, como causas econômicas, de modo para organizar o espaço, adaptação tecnológica e situação financeira da empresa/prestador. 
Diferentemente da dispensa individual, que afeta não somente o empregado dispensado, mas também o redor dele (como a família), a dispensa coletiva pode afetar a própria ordem social local, assim, fazendo com que outras dispensas podem interferir a ordem econômica local. E dependendo do tamanho da cidade, outras empresas podem ficar prejudicadas ao vender seu produtos e/ou serviços, fazendo com que aconteça outros tipos de dispensas e prejudicando a economia local. 
Uma demissão coletiva em uma organização e região pode gerar novas demissões coletivas, causando um efeito imediato e prejuízos para o próprio estado e população local. Também, logicamente, haverá consequência individual para o empregado dispensado, na parte moral, saúde e financeira. Um exemplo: uma montadora de carros resolve encerrar as atividades da sede nacional localizada em uma cidade cujo desenvolvimento aconteceu graças ao trabalho da empresa. É organizado uma dispensa coletiva, que culminou no fechamento de vagas na área metalúrgica e até mesmo alguns estabelecimentos que dependiam da demanda de pessoas que passavam pela montadora, fecharam as portas. 
Houve um caso emblemático na Justiça Brasileira envolvendo a Empresa Brasileira de Aeronáutica (Embraer), fabricante de aviões comerciais, executivos, agrícolas e militares. Em 2009, ela foi processada pelo Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos, que pediu para que uma dispensa coletiva seja suspensa por parte da empresa. A Embraer alegou “necessidade de corte nos custos perante a atual crise econômica do país”. Com isso, ela demitiu diversos trabalhadores e divulgou dados indicando que 20% do total da folha de funcionários, alcançando 4.273 postos de trabalho, seriam dispensados. Na época, a Embraer tinha 22.000 empregados.
Até 2009, a jurisprudência predominante nos tribunais trabalhistas aplicava à dispensa coletiva o mesmo tratamento da dispensa individual, cuja lei facilita ao empregador a decisão de dispensar o empregado sem justa causa. No caso da Embraer, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) concluiu que não houve abuso na demissão dos 4.273 trabalhadores. Justificando assim com os contratos, que venceram no dia 19 de fevereiro (dia que houve a dispensa coletiva) e não em 13 de março (dia que tentou uma conciliação). 
A maioria da turma concluiu que não houve abuso porque a negociação entre Embraer e sindicatos aconteceu após as demissões e a empresa ainda garantiu benefícios não previstos em lei, como a prorrogação do plano de saúde e indenização adicional de acordo com o tempo de casa de cada empregado. 
Mas, os ministros do TST, mesmo dando causa ganha para o empregador, fizeram uma ressalva para futuros casos: antes de fazer demissão coletiva, as empresas devem negociar com os sindicatos. 
No caso da Embraer, os sindicatos resolveram recorrer à Justiça para reivindicar a recontratação dos empregados. O que pode levar ao debate é de como a lei pode ir à favor de uma organização em se tratando de uma dispensa, seja coletiva ou individual. Os sindicatos possuem um papel fundamental no diálogo, mas muitos deles são de difícil relacionamento com as organizações por terem uma postura firme e acreditarem que o confronto direto pode ajudar a conseguir os objetivos buscados. E pela falta de consenso, recorrem aos tribunais, que avaliam o caso minuciosamentee chega a uma conclusão definitiva.
Segue a seguir parte da conclusão definitiva do TRT sobre o caso Embraer (Recurso Ordinário em Dissídio Coletivo n° TST-RODC-309/2009-000- 15-00.4): 
“Passo à análise. 
Quanto ao pedido das partes de declaração de nulidade das dispensas efetuadas, observa-se que a Corte Regional já havia declarado a abusividade do procedimento das suscitadas ao praticar a dispensa coletiva sem nenhuma negociação coletiva prévia com as entidades sindicais. 
Entretanto, no julgamento do recurso ordinário das suscitadas, esta Seção decidiu afastar a declaração de abusividade das dispensas, vencidos este Relator e a Ministra Kátia Arruda, o que prejudica a análise do pedido dos suscitantes. 
No que concerne à reintegração pleiteada, é necessário ressaltar que o texto constitucional, ao vedar a dispensa arbitrária, impõe que a lei complementar preverá indenização compensatória, dentre outros direitos (art. 7o, I), não conferindo aos trabalhadores prejudicados o direito à reintegração. Por essa razão, a concessão desse benefício seria extrapolar a restrição prevista constitucionalmente, o que não é permitido ao aplicador do direito. ” 
Em 2017, o Congresso Nacional aprovou a Lei 13.467/2017, a Reforma Trabalhista. A lei mudou regras com relação ao plano de carreira, remuneração e jornada de trabalho. O objetivo dela, segundo os autores da PL é flexibilizar o mercado e deixar a relação entre trabalhadores e empregados mais simples. Segundo a consultoria legislativa do Senado Federal indica, a lei ainda não confirmou as expectativas porque a lei sozinha não teria a capacidade de melhorar o mercado, porque teria que estar associado a outros aspectos da economia. 
Na dispensa coletiva, a Reforma Trabalhista inovou no ordenamento jurídico ao dispor expressamente sobre a dispensa. Ao inserir o artigo 477-A na CLT, a lei dispõe de que a dispensa, seja individual ou coletiva, não seja necessária a autorização prévia de órgãos sindicais ou organização de acordo coletivo para efetivação. O artigo 447-A, da CLT, introduzido na nova lei, estabelece a equiparação para todos os fins de dispensa: coletiva, individual e plúrima. 
O legislador inapropriadamente equipara as dispensas imotivadas coletivas, individuais e plúrimas como se fossem “figuras jurídicas passíveis de equiparação”, esquecendo que os efeitos da dispensa coletiva geram grande impacto não somente na vida empresarial, mas também de toda a comunidade. Na prática, pode-se distinguir dispensa coletiva e individual, pois atinge a um único funcionário, diferente daquela que estabelece várias demissões num determinado tempo.
Na lei, as dispensas coletivas fazem com que o empregador rescinde o vínculo com vários empregados por razões objetivas. Nesse caso, a demissão deve ser analisada pelo ângulo dos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos, e os direitos mais elevados da dignidade do ser humano. A legislação mudou para equipar as modalidades coletiva, individual e plúrima para todos os fins, seja qual for a justificativa. Ou seja, na dispensa coletiva, o impacto é equipará-la com as outras modalidades.
Mas, mesmo que a intenção da lei era inovar nas negociações, órgãos de defesa do trabalhador, como a Organização Internacional do Trabalho, consideram um “retrocesso” por desrespeitar a Constituição Federal, que garante que todo o trabalhador possui direitos, principalmente em negociações. No caso do coletivo, não envolver sindicatos de trabalhadores e debates com outros membros para chegar a um consenso de acordo. 
Referências Bibliográficas
Aprovada em 2017, reforma trabalhista alterou regras para flexibilizar o mercado de trabalho. Agência Senado. Disponível em: <https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2019/05/02/aprovada-em-2017-reforma-trabalhista-alterou-regras-para-flexibilizar-o-mercado-de-trabalho>. Acesso em: 16 out. 2019.
BOMFIM, Vólia. Direito do trabalho. 11ª ed. ver. e atual. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2015.
FUKUOKA, Nelma Karla Waideman; ALMEIDA, Victor Hugo. A (DES)NECESSIDADE DE REGULAMENTAÇÃO DA DISPENSA COLETIVA NO BRASIL: UMA ANÁLISE SOB A ÓTICA DO VALOR SOCIAL DO TRABALHO E DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. Revista Eletrônica do Curso de Direito da UFSM, Santa Maria, RS, v. 12, n. 1, p. 104-134, abr. 2017. ISSN 1981-3694. Disponível em: <https://periodicos.ufsm.br/revistadireito/article/view/23705>. Acesso em: 16 out. 2019. 
MANNRICH, Nelson. Dispensa coletiva: da liberdade contratual à responsabilidade social. São Paulo: LTr, 2000. 
TST confirma decisão favorável à Embraer em demissões. O Estado de S. Paulo. Disponível em: <https://economia.estadao.com.br/noticias/geral,tst-confirma-decisao-favoravel-a-embraer-em-demissoes,416580>. Acesso em: 16 out. 2019.
TST decide que demissão em massa na Embraer não foi abusiva. ConJur. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2009-ago-10/tst-decide-demissao-massa-embraer-nao-foi-abusiva>. Acesso em: 16 out. 2019.