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1 
 
UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO 
GRANDE DO SUL – UNIJUI 
 
 
 
GLADIS BRENDLER VIECILI 
 
 
 
 
 
 
 
COMPREENSÕES 
SOBRE A ALFABETIZAÇÃO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Ijuí 
2009 
 
2 
 
GLADIS BRENDLER VIECILI 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
COMPREENSÕES 
SOBRE A ALFABETIZAÇÃO 
 
 
Dissertação apresentada à Banca de Defesa do 
Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu - 
Mestrado em Educação nas Ciências - Departamento 
de Pedagogia (DePe), da Unijuí – Universidade 
Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do 
Sul, como requisito para obtenção do título de 
Mestre em Educação. 
 
 
 
Orientadora: Profª. Drª. Elza Maria Fonseca Falkembach 
 
 
 
 
Ijuí 
2009 
 
3 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Para minha mãe, Marla, 
professora alfabetizadora. 
Mesmo não estando mais junto 
de nós, deixou gravado em nossas memórias o seu 
grande amor pela educação e pelas pessoas. 
 
4 
 
AGRADECIMENTOS 
 
A cada amanhecer, ergo meus olhos para o alto e agradeço a Deus pela 
oportunidade de viver... 
Agradeço ao Rúbio, querido esposo, que nunca reclamou das infinitas vezes em 
que deixei de estar com ele para me dedicar às leituras e escritas necessárias para esta 
dissertação. 
Agradeço aos meus queridos filhos Gustavo, Priscila e Eduardo, pelo amor e 
pela compreensão... 
Agradeço a meu pai Albino, minha irmã Rosane e a meu irmão Carlos, pelo 
apoio recebido... 
Agradeço aos familiares, vizinhos, colegas de trabalho e amigos que 
entenderam minha ausência durante alguns períodos por estar estudando, lendo ou 
escrevendo. 
Agradeço especialmente a minha querida e amada orientadora professora Elza 
Maria Fonseca Falkembach, que sempre esteve junto comigo nessa caminhada, acreditando 
que eu seria capaz de escrever, mesmo de forma simples, mas segura e deixando uma marca 
pessoal. 
Obrigada a todos! Nunca esquecerei de todo amor, apoio e carinho recebidos ao 
acreditarem que nunca é tarde para realizar o sonho de infância! 
 
5 
 
RESUMO 
 
Esta pesquisa objetiva expor diferentes concepções sobre os atos de ler e escrever. A partir do 
diálogo com autores como Paulo Freire, Lev S. Vigotski, Emília Ferreiro, Magda Soares, Luiz 
Carlos Cagliari, principalmente, fomos adentrando o universo da alfabetização. Este universo 
se mostrou complexo, o que nos levou a escolher algumas das várias perspectivas 
educacionais então representadas para fazerem parte da “roda do diálogo” construída. Por 
isso, abordamos a perspectiva freireana, a vigotskiana e a proposta alfabetizar/letrando, tendo 
o texto como elemento presente desde o início do processo de alfabetização. A opção 
metodológica recaiu sobre a pesquisa bibliográfica, mediante problematização possibilitada 
pelas vivências da pesquisadora educadora, em dois momentos de sua prática profissional – 
uma como alfabetizadora de jovens e adultos e outra como alfabetizadora de crianças. Alguns 
itens fundamentais - leitura e escrita como práticas culturais, a educação uma dimensão da 
cultura e da política, texto/contexto, letramento, processos de ensino e aprendizagem - 
levaram a presumir que a proposta Alfabetizar Letrando é a que mais proporciona elementos 
para a continuidade do processo de alfabetização, demonstrando que o sujeito que aprendeu a 
ler e a escrever conquistou um direito que lhe permite ampliar seus conhecimentos, ou seja, 
dar seguimento ao processo de aprendizagem da leitura e da escrita, rumo à pós-alfabetização. 
 
Palavras - chaves: Alfabetização, letramento, cultura, texto/contexto. 
 
6 
 
ABSTRACT 
 
This research aims to expose different views on acts of reading and writing. Starting primarily 
from dialogs amid authors such as Lev S. Vigotski, Paulo Freire, Emília Ferreiro, Magda 
Soares, Luiz Carlos Cagliari, we have entered the universe of literacy. This universe has 
shown itself to be complex, which led us to choose some of the many educational 
perspectives then represented to be part of the “dialog circle” which has been built. Therefore, 
we approach the Freire and Vigotski perspectives and the teaching the ABCs/teaching by 
lettering proposal, having the text as present element since early learning. The methodological 
choice outweighed the biographical research through questioning made possible by the 
researcher-educator experiences twice in her career: first, as an adults’ educator; second, as a 
children’s teacher. Some essential items such as reading and writing as cultural practices, 
education as a dimension of politics and culture, text/context, lettering, teaching and learning 
processes have all led us to assume the teaching the ABCs/ teaching by lettering proposal is 
the one that most provides the elements for the continuity of the literacy process, 
demonstrating that the subject that has learned to read and write won a right that allows him to 
expand his knowledge, that is, continue with the process of learning reading and writing, 
towards post-literacy. 
 
 
Key words: Literacy, lettering, culture, text/context. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
7 
 
 
SUMÁRIO 
 
INTRODUÇÃO................................................................................................................. 10 
 
1. ALFABETIZAÇÃO.................................................................................................. 15 
1.1. Alfabetização: considerações iniciais........................................................ 15 
1.2. Alfabetização: um conceito em constante transformação na sua significação... 18 
1.3. Métodos de alfabetização na educação brasileira............................................ 22 
 
2. ALFABETIZAÇÃO: LEITURA DE MUNDO PRECEDENDO A LEITURA DA 
PALAVRA.......................................................................................................................... 28 
2.1. Educação na perspectiva freireana................................................................. 29 
2.2. Alfabetização na perspectiva freireana............................................................... 32 
2.3. Método de Alfabetização Paulo Freire................................................................ 36 
 
3. COMO A PESSOA APRENDE A LER E A ESCREVER........................................ 44 
3.1. Relação pensamento e linguagem em Vigotisky ............................................. 45 
3.2. Mediação em Vigotisky .................................................................................46 
 
4. ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO: UM DIÁLOGO DE COMPREENSÕES.... 51 
4.1. Diferenciando os dois conceitos: alfabetização e letramento............................ 52 
4.2. Detalhando a proposta Alfabetizar Letrando..................................................... 56 
4.3. Texto: elemento presente na alfabetização......................................................... 59 
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................ 64 
 
REFERÊNCIAS................................................................................................................ 68 
 
8 
 
INTRODUÇÃO 
 
O futuro com que sonhamos não é inexorável. Temos de fazê-lo, de produzi-
lo, ou não virá da forma como mais ou menos queríamos. É bem verdade 
que temos de fazê-lo não arbitrariamente, mas com os materiais, com o 
concreto que dispomos e mais com o projeto, com o sonho por que lutamos 
(FREIRE, 2006, p. 102). 
 
Desde a infância, o tema alfabetização, ou ensinar a ler e a escrever, esteve 
presente nos meus projetos profissionais. Sempre desejei ser professora, por isso escolhi 
cursar Magistério. Porém, esse “sonho” de ser professora alfabetizadora ficou adormecido 
durante anos para dar lugar ao desejo de ser mãe. 
No ano de 2002, iniciei o curso de Pedagogia na UNIJUÍ e, no ano seguinte, 
aceitei o convite para assumir uma turma de alfabetização de adultos,no município de Ijuí. A 
partir desse momento, muitas questões surgiram sobre o processo de aquisição da leitura e da 
escrita: Como o ser humano aprende a ler e a escrever? O que mudou nas discussões teóricas 
e pedagógicas sobre a alfabetização com a entrada do termo letramento? Quais associações 
podem ser feitas entre essas mudanças e o legado do educador Paulo Freire? A leitura de 
mundo precede a leitura da palavra no processo de ensino e aprendizagem da escrita? Qual o 
papel do educador nesse processo de alfabetização como leitura de mundo precedendo a 
leitura da palavra? Alfabetizar e letrar são processos distintos? O que distingue a alfabetização 
do letramento? Como podemos alfabetizar letrando? Qual o lugar que o texto ocupa na 
alfabetização? Essas são algumas questões que despertaram e intensificaram minha 
curiosidade sobre o assunto, impulsionando-me a estudar e a pesquisar sobre os temas 
alfabetização e letramento, com o objetivo de conhecer e compreender esse processo de 
aquisição da leitura e da escrita. 
Desse modo, posso dizer que foi a partir da necessidade de responder a questões 
surgidas na prática educativa que “tomei consciência” de minha condição de “ser inconcluso”, 
com capacidade de refletir auxiliada pela teoria já disponível, de ressignificar o meu saber 
para encontrar formas de transformar a minha prática educativa. “É exatamente esta 
capacidade de atuar, operar, de transformar a realidade de acordo com finalidades propostas 
pelo homem, à qual está associada a capacidade de refletir, que o faz um ser da práxis” 
 
9 
 
(FREIRE, 1983, p.17). 
Sendo assim, passei a ser desafiada a constituir as produções de vários educadores 
e pesquisadores como objeto de minhas reflexões pessoais e, assim, analisar meu próprio agir 
pedagógico, de modo que possa começar a reinventar a alfabetização, na prática. “A 
reinvenção exige a compreensão histórica, cultural, política, social e econômica da prática e 
das propostas a serem reinventadas” (FREIRE, 2006, p. 81), ou seja, eu preciso conhecer a 
teoria, os estudos que já existem sobre a alfabetização e o letramento, para que subsidiem a 
reformulação, com coerência, de minha “práxis educativa”. Nas palavras de Paulo Freire 
(2006, p. 83), “diminuir a distância entre discurso e a prática é o que denomino coerência”. 
Nessa perspectiva é que desenvolvi esta dissertação de Mestrado intitulada 
Compreensões sobre a alfabetização, buscando ter acesso a estudos de várias áreas do 
conhecimento desenvolvidas por diferentes autores, como Paulo Freire e Lev Vigotski, por 
exemplo, e outros autores contemporâneos e atuais, no intuito de encontrar respostas a 
inquietações, dúvidas, ideias, experiências e novas interrogações acerca das diferentes 
concepções sobre atos de ler e aprender. 
Assim, a proposta principal é compreender o que vem sendo historicamente 
produzido por estudiosos da educação sobre a alfabetização e o letramento, para identificar 
elementos que poderão contribuir para o processo escolar de aprendizagem da leitura e da 
escrita de crianças e de adultos. 
O fato de a minha prática como alfabetizadora de crianças ser iniciante - a partir 
do mês de abril de 2008 e se constituir diferente da alfabetização de adultos, experiência que 
vivenciei no ano de 2003 e 2004 - não me oferece subsídios suficientes para descrever 
processos, mas possibilita elementos para problematizar os percursos que estou vivenciando 
nessa caminhada de ensino e aprendizagem da leitura e da escrita. 
Nesse contexto, a alternativa metodológica escolhida foi a pesquisa teórica, 
animada por análises e sínteses desencadeadas por observações realizadas e questões surgidas 
no exercício da minha prática pedagógica com turmas de alfabetizandos adultos e enquanto 
professora alfabetizadora de crianças em escolas públicas do Município de Ijuí. 
Reconheço ser esta uma proposta metodológica pouco usual no campo da 
educação, pois definiu como ponto de partida a leitura de minha prática como um texto, 
10 
 
exposto sob a forma de perguntas, problematizando-a e mantendo-a como ancoragem para a 
pesquisa bibliográfica, a qual trouxe para o texto as falas dos autores com quem decidi 
dialogar. 
Nesse sentido, “abri a roda do diálogo de compreensões”, convidando 
inicialmente os autores Lev Vigotski, Paulo Freire e, a seguir, autores contemporâneos como 
Emília Ferreiro, Magda Soares, Marlene Carvalho, Luiz Carlos Cagliari, Délia Lerner, Irandé 
Antunes, entre outros pesquisadores e educadores, para se fazerem presentes com suas 
contribuições a esta área da educação: a alfabetização. 
Busco, portanto, neste trabalho, adensar reflexões sobre algumas suposições, 
como: o ser humano, mediante linguagem - elemento básico do seu desenvolvimento como 
ser histórico, social e cultural -, desenvolveu a escrita e a leitura, práticas culturais que 
revelam e registram o conhecimento humano e são necessárias para viver em uma sociedade 
letrada. Afinal, ler e escrever são práticas culturais que expandem enormemente os poderes do 
ser humano e que tornam a “sabedoria do passado analisável no presente e passível de 
aperfeiçoamento no futuro” (VIGOTSKI, 2006, p.26). 
Nessa compreensão, a leitura e a escrita não são concebidas como habilidades 
inatas e, por isso, dependem de processos de ensino e aprendizagem para se tornarem 
conhecimentos pessoais. Assim, o ensino no período da alfabetização deve ser conduzido de 
modo intencional, com vistas a organizar e levar à aprendizagem da leitura e da escrita, 
adequada a situações específicas no contexto das práticas culturais, possibilitando a inclusão 
de fato do sujeito na sociedade letrada onde vive. 
Portanto, nessa perspectiva, a alfabetização é, ao mesmo tempo, uma 
aprendizagem do sistema de escrita e uma forma de interação contextualizada com a 
diversidade cultural presente na sociedade onde o sujeito está inserido. Não corresponde, 
assim, a um mero processo mecânico de decodificação de sinais gráficos sem a preocupação 
maior com a leitura de mundo e a compreensão do texto/contexto. 
Desse modo, a abordagem pedagógica Alfabetizar Letrando, tendo o 
texto/contexto como elemento presente desde o início da alfabetização, é a proposta que 
elegemos para embasar e desenvolver nossas reflexões, auxiliada pelos autores já citados. 
Essa opção decorre das já referidas vivências e do diálogo de compreensões iniciado, que nos 
levam a considerá-la como a que mais se ajusta ao ensino e à aprendizagem da leitura e da 
11 
 
escrita, tanto de crianças como de adultos. 
Iniciamos o primeiro capítulo, “O conceito alfabetização”, buscando, juntamente 
com os educadores Paulo Freire, Luiz Carlos Cagliari e Magda Soares, dialogar sobre as 
modificações que ao longo dos anos tem sofrido o termo alfabetização. Também, trazemos 
uma síntese histórica dos métodos de alfabetização na educação brasileira para, assim, 
compreender as várias concepções presentes. 
No segundo capítulo, “Alfabetização: leitura de mundo precedendo a leitura da 
palavra” são pontuados alguns elementos que estão presentes no Método de Alfabetização 
desenvolvido por Paulo Freire, educador que, desde o período 1957-1964, época em que 
foram desenvolvidas densas experiências de alfabetização de pessoas adultas no Brasil, vem 
apontando novas alternativas para o processo de alfabetização, principalmente para os sujeitos 
adultos analfabetos, provenientes das classes populares. Esses elementos são o significado da 
alfabetização como leitura de mundo precedendo a leitura da palavra, alicerçado no 
texto/contexto e na prescrição do Tema Gerador. 
No terceiro capítulo, “Como a pessoa aprende a ler e a escrever”, procuramos 
compreender como esse processo de aquisição da leitura e da escrita acontece. Os autores 
principais evocados nesse capítulo são Lev Semenovich Vigotsky e Alexander Romanovich 
Luria, pois juntos desenvolveram pesquisas sobre temascomo a relação entre pensamento e 
linguagem, ou a natureza do desenvolvimento humano e o papel da instrução no 
desenvolvimento. Esses elementos estão presentes no processo de alfabetização e letramento 
e, portanto, é imprescindível serem conhecidos. 
No quarto capítulo, “Alfabetização e Letramento: um diálogo de compreensões”, 
autores como Magda Soares, Telma Ferraz Leal, Marlene Carvalho, Moacir Gadotti e Emília 
Ferreiro, nos ajudam a diferenciar os dois referidos conceitos – alfabetização e letramento. À 
medida que fazemos conhecer o surgimento e a história do conceito letramento, procuramos 
explicitar também seu significado. Em seguida, apresentamos as mudanças de significado 
desse recente anglicismo, para, depois, explicitar o que significa optar pela proposta 
Alfabetizar Letrando, que tomamos como ponto de partida do processo de alfabetização 
escolar. 
Nesse capítulo justamente com o item “Texto: elemento presente na 
alfabetização” chamamos ao debate as autoras Marlene Carvalho, Gladis Massini-Cagliari e 
12 
 
Irandé Antunes, entre outras educadoras e educadores, para fundamentar teórica e 
metodologicamente a proposta Alfabetizar Letrando, foco desta dissertação, que tem como 
ponto central o entendimento de que a aquisição da Língua Escrita é algo maior que o 
desenvolvimento de habilidades motoras que não ultrapassam os limites da 
codificação/decodificação, sem a preocupação com o domínio do ato de ler e escrever, como 
exigem as atividades sociais e, também, com a compreensão do que está sendo lido. 
Finalizo perguntando e tecendo algumas considerações sobre a complexidade do 
processo de alfabetização e letramento, que integra a cultura, a leitura de mundo, o 
texto/contexto, processos de ensino e aprendizagem e a leitura e a escrita, como elementos 
presentes antes, durante e após a alfabetização. 
Mais que escrever e ler que a ‘asa é da ave’, os alfabetizandos necessitam 
perceber a necessidade de um outro aprendizado: o de ‘escrever’ a sua vida, 
o de ‘ler’ a sua realidade, o que não será possível se não tomarem a história 
nas mãos para, fazendo-a, por ela serem feitos e refeitos (FREIRE, 1984, 
p.16). 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
13 
 
1 ALFABETIZAÇÃO 
 
A decifração da palavra fluía naturalmente da “leitura” do mundo particular. 
[...] Fui alfabetizado no chão do quintal da minha casa, à sombra das 
mangueiras, com palavras do meu mundo e não do mundo maior dos meus 
pais. O chão foi o meu quadro-negro; gravetos, o meu giz (FREIRE, 2006, 
p.15). 
 
Entender o que significa o processo de alfabetização foi uma das primeiras 
questões postas por nossa prática e que nos levaram a pesquisar sobre esse tema. Como o ser 
humano se constituiu sujeito de linguagem? A leitura e a escrita são práticas culturais ou são 
processos inatos? Quais os elementos presentes nesse processo de ensino e aprendizagem da 
leitura e da escrita? 
Assim, adentramos a teoria em busca de respostas para essas e outras questões 
correlatas. Nessa busca, conhecemos e compartilhamos as ideias e ideais dos educadores 
Paulo Freire, Lei Vigotski, Luiz Carlos Cagliari e Magda Soares, principalmente. 
Neste primeiro capítulo, apresentaremos então algumas ordenações, reflexões e 
afirmações sobre o processo de constituição do ser humano, no qual a cultura, a leitura de 
mundo, o texto/contexto, a leitura da palavra e a escrita são elementos presentes. A seguir, 
traremos as modificações que o conceito alfabetização tem sofrido ao longo dos anos. 
Também, faremos uma síntese histórica dos métodos de alfabetização na educação brasileira 
para, assim, compreender as várias concepções presentes sobre o termo alfabetização. 
 
1.1 Alfabetização: considerações iniciais. 
 
O ser humano não nasce lendo e escrevendo, pois essas práticas culturais 
necessitam de processos de ensino e aprendizagem. A aprendizagem, de acordo com a 
concepção vigotskyana, também faz parte do processo de constituição do ser como humano, 
que é de origem biológica e sociocultural. Os processos elementares são de origem biológica, 
 
14 
 
porém as funções psicológicas superiores1 são de origem sociocultural. Esse processo de 
desenvolvimento não poderia produzir-se, portanto, sem a aprendizagem. Por isso, a 
aprendizagem é um momento intrinsecamente necessário e universal para que se desenvolvam 
na criança características humanas não naturais, como a leitura e a escrita, formadas 
historicamente (VIGOTSKY, 2006, p. 115). 
Nessa acepção, tornar-se humano é uma tomada de consciência de sua 
incompletude, pois o ser humano, que é “pensamento-linguagem”2, sempre e continuamente 
busca refletir sobre si mesmo e, assim, como ser que está no mundo e com o mundo, 
reconhece que sabe que sabe e que pode saber ainda mais. “Agora, sabemos que sabíamos. 
Por saber hoje que sabíamos, podemos saber mais ainda” (FREIRE, MACEDO, 2006, p.64). 
Esse é um “saber que garante que há uma dimensão crítica da consciência e que desloca do 
comportamento instintivo, não-mediado, do tipo estímulo-resposta, dos outros animais, para a 
construção de significados, para a atividade mediada, para a construção da cultura” 
(BERTHOFF, 2006, p. XVI). 
Desse modo, como um ser que sabe que sabe vai transformando a sua realidade, 
ao buscar responder aos múltiplos desafios proporcionados pelo cotidiano, num processo de 
humanização. Ao humanizar-se, o homem educa a si próprio e aos outros, tornando-se um ser 
de relações que constrói e reconstrói conhecimentos. “O conhecimento se constitui nas 
relações homem-mundo, relações de transformação, e se aperfeiçoa na problematização 
crítica destas relações” (FREIRE, 1992, p. 36). 
Portanto, a verdadeira fonte do conhecimento é confrontação entre os homens e o 
mundo. Para Paulo Freire, mundo é o palco de todas as realizações – onde o homem não 
somente vive, mas existe, e sua existência é histórica. Assim, para o homem, o mundo é o 
contexto de sua existência, e ele transforma, com sua ação, este contexto, fazendo dele um 
espaço da cultura e da história (2005, p. 103). É um conceito-chave do pensamento do 
 
1
 Funções psicológicas superiores são relações sociais interiorizadas a partir de ações conscientes, ou 
seja, ações conscientemente controladas, atenção voluntária, memorização ativa, pensamento abstrato, 
comportamento intencional. Os processos psicológicos superiores, expressão utilizada nesse texto, se 
diferenciam de mecanismos mais elementares, como reflexos, reações automáticas e associações 
simples (OLIVEIRA, 1997, p.23). 
2 Pensamento-linguagem é a expressão utilizada por Paulo Freire para designar o homem que é capaz 
de refletir sobre si mesmo e sobre a sua própria atividade, [...] que é um ser da práxis, da ação e da 
reflexão ( 1992, p.39). 
15 
 
educador Freire, para quem a realidade “não é só dado objetivo, o fato concreto, senão, 
também, a percepção que o homem tem dela” (1976, p.32). 
Mundo como um texto a ser lido, compreendido e reescrito nesse processo de 
confrontação do ser humano em sua vivência diária. Ou, nas palavras de Paulo Freire (2005, 
p.104), “para o homem, o mundo é o contexto de sua existência, e ele transforma, com sua 
ação, este contexto, fazendo dele um mundo da cultura e da história”. E, continuando com 
Vigotsky, “o homem não é apenas um produto de seu ambiente, é também um agente ativo no 
processo de criação deste meio” (2006, p.25). 
Nessa perspectiva de viver e conhecer o mundo, o ser humano acaba produzindo 
conhecimentos que atendam às suas necessidades básicas de sobrevivência, mas também que 
respondam à sua curiosidade. Assim, acaba produzindo cultura, que nas palavras de Freire 
(2000, p.117), é o “acrescentamento que o homem faz ao mundo que não fez. A cultura como 
resultado de seu trabalho. Do seu esforço criador e recriador. O sentido transcendental de suas 
relações, [...] aquisiçãosistemática da experiência humana”. Essa experiência pode ser 
sintetizada como uma perspectiva de leitura e de inserção no mundo concreto, ou seja, nas 
relações dinâmicas que vinculam linguagem e realidade no exercício da compreensão do 
contexto da prática, que, por sua vez, pela leitura de mundo, pode ser ampliada. 
Com isso, o homem se reconhece como sujeito cultural e histórico, que se 
expressa por diferentes modos e com diferentes linguagens, quer pertencendo a uma cultura 
letrada ou iletrada, mas com uma necessidade: assegurar a continuidade de sobrevivência da 
espécie humana. Por isso, procura meios de transmitir às novas gerações todo o conhecimento 
culturalmente construído a cada época. Entre esses conhecimentos, estão a leitura e a escrita, 
como práticas culturais que precisam ser ensinadas e aprendidas pelas gerações. 
“A alfabetização e a educação são expressões culturais. Não se pode desenvolver 
um trabalho de alfabetização fora do mundo da cultura, porque a educação é, por si mesma, 
uma dimensão da cultura” (FREIRE, MACEDO, 2006, p.33 e 34). Deriva daí “que a 
educação deva tomar a cultura que a explica, pelo menos em parte, como objeto de uma 
cuidadosa compreensão, com o que a educação se questiona a si mesma” [...] e vai tornando 
claro “que a cultura é uma totalidade atravessada por interesses de classe, por gostos de 
classe”, e a “existência de classes sociais provoca um conflito de interesses. Provoca e dá 
forma a modos culturais de ser e, por isso, gera expressões contraditórias de cultura”. 
16 
 
 Em geral, são os segmentos dominantes de qualquer sociedade que são encarados 
como expressões concretas da nacionalidade e ditam gostos, estilos de vida. Os grupos 
subalternos, que possuem seus próprios gostos e estilos de vida, por seu turno não podem 
falar de si mesmo, como expressões nacionais. “Falta-lhes o poder político e econômico para 
fazê-lo. Só os que têm poder podem generalizar e estabelecer que as características de seu 
grupo são representativas da cultura nacional” (2006, p.33). Assim, as características, os 
diversos tipos de música, de poesia, de linguagem e de visão de mundo pertencentes aos 
grupos considerados subalternos são desconsiderados pelo grupo dominante. 
Desse modo, ensinar ler e escrever é tarefa de uma educação que respeite a cultura 
do educando, “que transcenda a uma compreensão mecânica e estrita do ato de ler, isto é, o 
ato de aprender a palavra de modo a poder, a seguir, lê-la e escrevê-la” (2006, p.36). É, 
também, uma forma de respeitar os diferentes discursos e de pôr em prática a compreensão de 
pluralidade que exige uma transformação política e social onde dizer a palavra seja direito de 
tornar-se partícipe da decisão de reinventar a cultura, dentro da qual se criariam ambientes 
para incorporar, de maneira participativa, todos aqueles discursos que atualmente estão 
sufocados pelo discurso dominante. 
“A legitimação desses diversos discursos legitimaria a pluralidade de vozes na 
reconstrução de uma sociedade verdadeiramente democrática”. [...] “haveria verdadeiro 
respeito por aqueles educandos que ainda não se acostumaram a dizer a palavra para lê-la. 
Esse respeito implica a compreensão e a apreciação das muitas contribuições que os que não 
lêem dão à sociedade em geral” (2006, p.37) Assim, a alfabetização é um processo de 
aprendizagem do sistema de escrita, que deve estar presente no processo de constituição do 
ser humano. 
 
1.2 Alfabetização: um conceito em constante transformação na sua significação. 
 
Durante as últimas décadas, existe uma busca por conceituar o que é 
alfabetização, já que a definição “aprender a ler e escrever” vem sofrendo revisões 
significativas associadas às produções da Filosofia, Psicologia, Linguística e outras áreas do 
conhecimento, que reconhecem o “fato de que a mera leitura e grafia das unidades menores da 
17 
 
língua (letras, sílabas e palavras) não implicava um consequente domínio do ato de ler e 
escrever, como nos exigem as atividades sociais” (SÉRKEZ, MARTINS, 1996, p.9) . 
A leitura e a escrita são atos de comunicação, de interação entre as pessoas e, por 
isso, aprender o domínio do código, sem a preocupação com um trabalho vinculado com a 
escrita de ideias completas passou a ser considerado algo inviável. Por essa razão, o processo 
de aquisição da leitura e a escrita passa pela apropriação do sistema alfabético e ortográfico da 
escrita, num contexto de participação das práticas sociais que envolvem a língua escrita. 
Assim, para aprender a ler e escrever, o sujeito - adulto, jovem ou criança - necessita entender 
a relação estabelecida entre fala e escrita. Precisam conhecer o sistema de regras da escrita 
compreendendo o que estão lendo (decodificar) e sendo capazes de transmitir com clareza 
suas ideias por escrito (codificar), de modo que outras pessoas possam compreender o texto 
escrito. 
Foi a partir da Revolução Francesa (1789-1799) que a alfabetização, nos países 
europeus, passou a se constituir disciplina escolar formal, ou seja, efetivada no âmbito da 
escola, acompanhando o calendário escolar e fazendo surgir vários métodos de alfabetização, 
cartilhas e materiais didáticos específicos. 
 Em nosso país, desde o final do século XIX, especialmente com a Proclamação 
da República (1889), “a escola consolidou-se como lugar necessariamente institucionalizado 
para o preparo das novas gerações, com vistas a atender aos ideais do Estado republicano, 
pautado pela necessidade de instauração de uma nova ordem política e social; e a 
universalização da escola assumiu importante papel como instrumento de modernização e 
progresso do Estado-Nação, como principal propulsora do ‘esclarecimento das massas 
iletradas’” (MORTATTI, 2006). 
Nesse contexto dos ideais republicanos, “saber ler e escrever se tornou 
instrumento privilegiado de aquisição de saber/esclarecimento e imperativo da modernização 
e desenvolvimento social”. Assim, a leitura e a escrita, aprendizagens que se encontravam 
restritas a poucos e que eram transmitidas de forma assistemática “no âmbito privado do lar, 
ou de maneira menos informal, mas ainda precária, nas poucas ‘escolas’ do Império (aulas 
régias), tornaram-se fundamentos da escola obrigatória, leiga e gratuita e objeto de ensino e 
aprendizagem escolarizados” (MORTATTI, 2006). 
 
18 
 
Caracterizando-se como tecnicamente ensináveis, as práticas de leitura e 
escrita passaram, assim, a ser submetidas a ensino organizado, sistemático e 
intencional, demandando, para isso, a preparação de profissionais 
especializados. Desse ponto de vista, os processos de ensinar e de aprender a 
leitura e a escrita na fase inicial de escolarização de crianças se apresentam 
como um momento de passagem para um mundo novo — para o Estado e 
para o cidadão —: o mundo público da cultura letrada, que instaura novas 
formas de relação dos sujeitos entre si, com a natureza, com a história e com 
o próprio Estado; um mundo novo que instaura, enfim, novos modos e 
conteúdos de pensar, sentir, querer e agir (MORTATTI, 2006). 
 
Assim, a tarefa de alfabetizar crianças, a partir desses acontecimentos históricos, 
se constitui como atribuição da escola como instituição responsável pela educação formal de 
crianças e de jovens. 
Por outro lado, a alfabetização de adultos, que hoje no Brasil é entendida como 
alfabetização de jovens e adultos de classes populares, já teve outra conotação, significava a 
educação de ricos. Atualmente, a alfabetização de adultos acontece em ambientes tanto 
formais quanto não formais, como escolas, centros comunitários, igrejas, indústrias e praças. 
Com a escolarização, o processo educativo da alfabetização passou a acompanhar 
o calendário escolar. Como as antigas cartilhas eram simples esquemas, passaram a ser mais 
desenvolvidas. O estudo foi dividido em lições, cada um enfatizando um fato. O ensino 
silábico passou a dominar o alfabético.O método do ‘bá, bé, bi, bó, bu’ começava a aparecer. 
Com poucas modificações superficiais, esse tipo de cartilha passou a ser o modelo dos livros 
de alfabetização (CAGLIARI, 1999, p.21). 
A alfabetização, portanto, era compreendida como um processo mecânico de 
decodificação de símbolos, no qual a pessoa era treinada na capacidade de decodificar os 
sinais gráficos transformando-os em “sons”, e também, na capacidade de codificar os sons da 
fala, transformando-os em sinais gráficos, sem uma preocupação maior com a compreensão 
do texto, do contexto e do uso nas práticas sociais. 
Porém, em consequência dos altos índices que os dados das pesquisas3 sobre 
analfabetismo apresentaram, a alfabetização como processo de codificação e decodificação, 
começou a ser repensada pelos educadores brasileiros. 
 
3
 No Brasil, conforme o Indicador do Analfabetismo no Brasil/INEP, no ano de 1920, 28% dos 
19 
 
Assim, após estudos sobre o assunto, concluiram que um dos problemas dos altos 
índices de analfabetismo brasileiro decorria da forma de conduzir os processos que, no caso, 
estava associada ao entendimento do termo, ou seja, seria alfabetizada aquela pessoa que 
soubesse ler e escrever um bilhete simples. 
Na década de 60, novamente ocorreu uma mudança na forma de entendimento do 
termo: uma pessoa passa a ser considerada alfabetizada se for capaz de ler e escrever, com 
compreensão, uma breve e simples exposição de fatos relativos à vida cotidiana, ou seja, 
atribuiu-se uma visão mais funcional à alfabetização, associando-a às questões do 
desenvolvimento econômico. Assim, a alfabetização era promovida como uma resposta à 
demanda econômica, com foco nas capacidades de leitura e escrita necessárias ao aumento da 
produtividade, na agricultura, na produção industrial ou em outras atividades. Esse enfoque 
estava estreitamente vinculado às necessidades do desenvolvimento econômico nacional, e 
não às necessidades dos alunos em seus contextos locais. 
Nestes mesmos anos 1960, a influência do educador Paulo Freire acrescentou 
dimensões políticas ao processo de alfabetização, enfocando-a como um processo de 
conscientização que ensina as pessoas a perguntar “por que as coisas são como são” e a 
“tomar iniciativas autônomas no sentido de transformá-las”, situando o aluno não mais como 
mero objeto, mas como alguém com capacidade de participar, ou seja, como atores e sujeitos 
do processo. Embora a abordagem de Paulo Freire a princípio fosse vista como uma 
metodologia de aquisição de alfabetização, seu impacto transferiu a alfabetização da sala de 
aula para a arena sociopolítica. 
Com a realização da CONFINTEA V - Conferência Internacional de Educação de 
Adultos , em Hamburgo, Alemanha, no ano de 1997, a alfabetização passa a ser vista como 
um processo ligado ao desenvolvimento individual e social, um direito de todos os seres 
humanos, incluindo-se pela primeira vez, nessa concepção, a conquista da cidadania4. 
 
sujeitos eram alfabetizados e 71,2% eram analfabetos. No ano de 1950, 42% eram alfabetizados e 
57,1% analfabetos, (FERRARO, 2002). Para maiores informações, consultar o site: 
http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censohistorico/1872_1920.shtm 
 
4 Cidadania como apropriação da realidade para nela atuar, participando conscientemente em favor da 
emancipação. “A cidadania não é apenas o fato de ser um cidadão que vota [...]. O conceito de 
cidadania vem casado com o conceito de participação, de ingerência nos destinos históricos e sociais 
do contexto onde a gente está”, é ter voz, “é ser presença crítica na história” (FREIRE, 2001, p.129 e 
131). 
20 
 
Desde então, a concepção de alfabetização se mantém ampla, não se tratando de 
um processo rápido e conclusivo, mas que se estende ao longo da vida. O educando pode 
levar seis ou sete anos de escolaridade para “manejar” o código da leitura e escrita, embora 
um domínio pleno da última requeira 12 anos de escolaridade, segundo as estimativas da 
Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura - UNESCO5 
(UNESCO, 2003, p. 9), um dos órgãos responsáveis pela organização e financiamento das 
CONFINTEA6 - Conferência Internacional de Educação para Todos. 
Portanto, passa-se a admitir que a alfabetização constitui-se a base do aprendizado 
por toda a vida para todos, da aquisição de poder pelos indivíduos e por suas comunidades, 
permitindo que as pessoas participem ativamente, no decorrer de toda a vida, de todo um 
espectro de oportunidades de aprendizado. 
 
1.3 Métodos de alfabetização na educação brasileira 
 
Para entendermos melhor as várias concepções presentes no universo da 
alfabetização brasileira, voltaremos nosso olhar para os métodos, pois as atividades escolares 
equilibram-se entre os processos de ensino e aprendizagem e os métodos, como caminhos 
escolhidos para ensinar. Inclusive, muitos métodos usados pelos alfabetizadores no passado 
permanecem presentes nas práticas pedagógicas das escolas brasileiras. 
O método mais antigo da alfabetização brasileira concebia o ler e o escrever como 
atos mecânicos de decorar a Cartilha. Através dela, igualmente crianças e adultos aprendiam a 
leitura e a escrita decorando o alfabeto. Ou seja, para se alfabetizar, a pessoa memorizava o 
 
5 Para maiores informações sobre o trabalho da UNESCO no Brasil, consultar o site: 
http://www.brasilia.unesco.org/unesco. 
6 Informações sobre a CONFINTEA VI, que se realizou no Brasil e teve como objetivos principais 
Impulsionar o reconhecimento da educação e aprendizagem de adultos como elemento importante e 
fator contribuinte à Educação ao Longo da Vida, onde a alfabetização é o alicerce. Enfatizar o papel 
crucial da educação e aprendizagem de adultos para a realização das atuais agendas e programas de 
educação e de desenvolvimento internacionais (APT, MDMs, UNLD, LIFE e DESD); e renovar o 
momentum e compromisso político e desenvolver ferramentas de implementação para que partam do 
retórico para a ação. Para maiores informações, consultar o site: 
http://www.brasilia.unesco.org/areas/educacao. 
 
21 
 
nome das letras como guia para sua decifração, decorava as palavras-chave, para pôr em 
prática o princípio acrofônico, próprio do alfabeto, e depois começava a escrever e a ler, 
interpretando, nas ‘taboas’ (ou tabuadas), as sílabas da fala com a correspondente forma 
escrita. Notem que a ortografia não tinha vez. O método estava mais voltado à decifração da 
escrita do que ao escrever corretamente (CAGLIARI, 1999, p. 22). 
Era uma educação baseada na transmissão e na memorização de conteúdos, posto 
pressupor que, decorando letras, palavras, fatos e conteúdos, os mesmos fossem “ligar-se” à 
memória dos alunos - considerados aqueles que não tinham “luz própria” -, mediante o 
respaldo do professor, - aquele que tudo sabia, detentor do saber, transmissor de verdades 
imutáveis e de conhecimentos próprios à tradição cultural. 
Durante anos, alfabetizar no Brasil, continuou a ser um processo de decorar as 
sílabas usando o conhecido Método “Ba, be, bi, bo bu”, cujo maior instrumento para a 
condução do processo eram as cartilhas, como a João de Deus ou Cartilha Maternal (1870), as 
Cartilhas do Povo- Para ensinar a ler rapidamente ( 1928) e Upa, cavalinho! (1957). As duas 
últimas foram produzidas pelo educador brasileiro Manoel Bergström Lourenço Filho e 
editadas pela Companhia Melhoramentos, de São Paulo. 
Nas cartilhas, o método usado antes de 1870, foi chamado de Método Sintético, 
que era subdividido em soletração, fônico e silábico. O método de soletração ou alfabético foi 
o primeiro processo empregado universalmentena aprendizagem da leitura. Nele, o ponto de 
partida são as letras na seguinte lógica: primeiro se ensina o nome e as formas das letras 
isoladamente; depois, as sílabas, palavras e frases; para, finalmente, chegar a textos inteiros. 
O método fônico tem como ponto de partida o fonema (som da letra). Primeiro deve-se 
conhecer os fonemas, para em seguida combiná-los formando sílabas, palavras e frases. E o 
método silábico, parte da sílaba, palavras, frases, até chegar a pequenos textos. 
Todos esses métodos de alfabetização descontextualizam a escrita, seus usos e 
funções sociais. Dão ênfase à memorização ao ensinar a leitura de forma mecânica, sem 
compreensão, e enfatizam os aspectos gráficos e psicomotores para a “prontidão” da 
alfabetização, como se o aluno fosse uma tabula rasa ou página em branco que precisa ser 
preenchido pelos conhecimentos repassados pelo professor. 
No início da década de 60, surge no País, mais especificamente para a 
alfabetização de crianças, o chamado período preparatório ou de prontidão, uma metodologia 
22 
 
cheia de atividades lúdicas que o aluno passou a fazer, para desenvolver o controle do traçado, 
a distribuição espacial, a motricidade, a discriminação auditiva e visual, cujo objetivo maior 
era preparar a criança para a alfabetização. “Assim, a estrutura mais rígida e tradicional das 
lições das cartilhas passou a dar lugar a uma metodologia mais leve, mais cheia de atividades 
lúdicas”, de acordo com Luis Carlos Cagliari (2008, p. 219). 
Portanto, com esse tipo de ensino - “faça segundo o modelo” -, o aluno fazia o que 
o professor mandava e o professor fazia o que os livros didáticos mandavam. Isto ocorria de 
tal modo que tudo o que o professor e os alunos deveriam fazer já vinha preparado, inclusive 
com respostas dos exercícios, ou seja, o professor era um mero aplicador dos métodos 
elaborados pelos órgãos governamentais. 
Por outro lado, nesse mesmo período, começou a ganhar corpo o conceito de 
Educação Popular7 que influenciou fortemente a maneira de ser trabalhada a alfabetização de 
adultos, ou seja, de uma forma não infantilizada cujo diferencial era a conscientização, a 
mobilização, a politização dos grupos sociais excluídos e a importância dada à cultura desses 
grupos considerados subalternos pelos segmentos dominantes da sociedade. 
Em geral, os segmentos dominantes de qualquer sociedade encaram como 
expressões concretas da cultura nacional seus interesses particulares, seus gostos, seus estilos 
de vida e depreciam todas as características pertencentes aos grupos subalternos, por serem 
diferenciados dos padrões estabelecidos por eles próprios (FREIRE, MACEDO, 2006, p.34). 
Essa nova visão do processo educativo, oportunizada pelas concepções freireanas, 
marcou de forma determinante a história dos métodos de alfabetização, pois gerou o Método 
de Alfabetização Paulo Freire, que logo no seu início afastou qualquer hipótese de uma 
alfabetização puramente mecânica, haja vista a sua finalidade principal de proporcionar, ao 
homem, meios para superar suas atitudes, mágicas ou ingênuas, diante da realidade. 
Desde logo pensávamos a alfabetização do homem brasileiro, em posição de 
tomada de consciência, [...] realmente ligada á democratização da cultura, 
que fosse uma introdução a esta democratização. Numa alfabetização que, 
 
7 Educação Popular “é a capacidade de organização e estruturação de uma comunidade no 
compromisso e na assunção do processo educacional, sem que o Estado seja excluído de suas 
obrigações” (VASCONCELOS, BRITO; 2006; p. 91). Ou seja, toda educação que se realiza junto a 
setores ou classes populares, uma prática educativa que se propõe a ser diferenciada, isto é, 
compromissada com os interesses e a emancipação das classes subalternas (PALUDO, 2001, p. 82). 
 
23 
 
por isso mesmo, tivesse no homem, não esse paciente do processo, cuja 
virtude única é ter mesmo paciência para suportar o abismo entre sua 
experiência existencial e o conteúdo que lhe oferece para sua aprendizagem, 
mas seu sujeito (FREIRE, 1992, p. 112). 
Porém, com o início do período da Ditadura Militar, no ano de 1964, o Método de 
Alfabetização do educador Paulo Freire foi considerado subversivo e o seu autor foi 
silenciado no Brasil pelos governantes daquela época. 
Nos anos 70 a 80, as contribuições da Psicologia fizeram surgir uma nova 
concepção do homem como energia ativa e criativa - pilares das experiências da Escola Nova, 
que influenciou fortemente a alfabetização. Porém, os métodos permaneceram tradicionais, 
sendo o mais usado o Método Analítico Ideovisual ou Ideográfico, que parte de uma 
motivação (desenho, história, verso, etc.) e apresenta a palavra ligada ao desenho, num 
processo evolutivo para palavração e palavras progressivas. 
Na década de 80, em decorrência dos estudos sobre a Psicogênese de Língua 
Escrita,8 surgiram como elementos inovadores a introdução ou o resgate de importantes 
dimensões da aprendizagem da alfabetização. Com esses estudos, baseados na epistemologia 
genética de Jean Piaget,9 entendia-se que o aluno era o sujeito da aprendizagem. Assim, o 
foco do processo de aprendizagem não ficou mais centrado no como ensinar, mas como o 
aluno aprende e também, nos usos sociais da escrita e da leitura, articulados a uma concepção 
mais ampla de letramento. 
Mas, em contrapartida, ocorreram algumas compreensões equivocadas dessa 
teoria. Na medida em que o foco passou a ser o aluno, o ensino sistematizado e planejado do 
sistema alfabético-ortográfico ficou subestimado em detrimento à faceta psicológica. Assim, 
muitos professores passaram a excluir métodos e técnicas sistemáticos de trabalho, pois 
consideravam que o construtivismo não fazia uso dos mesmos. 
Em outras palavras, muitos educadores negaram os aspectos psicomotores ou 
grafomotores, desprezando seu impacto no processo inicial da alfabetização e descuidaram do 
 
8
 Psicogênese da Língua Escrita - estudo do caminho que o sujeito percorre para se apropriar da língua 
escrita, ou seja, ideias que tentam explicar a aquisição da lectoescrita, desenvolvida pelas educadoras 
Emília Ferreiro e Ana Teberosky (1999). 
9 Consultar: PIAGET, Jean. A Epistemologia Genética. Trad. Nathanael C. Caixeira. Petrópolis: 
Vozes, 1971. 110p. BECKER, Fernando. Ensino e construção de conhecimento. Porto Alegre, Armed, 
2001. 
24 
 
ensino de informações relevantes da tecnologia da leitura e da escrita, como, por exemplo, a 
exploração sistemática do código e das relações entre grafema e fonema, a orientação espacial 
da escrita, imaginando que o aluno por si próprio poderia perceber esses conhecimentos 
estando em contato com os textos (MEC, 2007, p.12). 
Essa interpretação equivocada que foi usada por muitos educadores como um 
método de alfabetização e não como uma teoria de como a criança constrói o processo de 
escrita, denominado Psicogênese da Língua Escrita, prejudicou muitos alunos, “sobretudo os 
que vivem em condições sociais desfavorecidas e que, por isso, só têm oportunidade de 
contato mais amplo com livros, revistas, cadernos e lápis e outros instrumentos e tecnologias 
quando ingressam na escola” (MEC, 2007, p.12). 
Decorrente dos problemas de não aprendizagem da leitura e da escrita, 
ocasionados por essa visão construtivista equivocada, surge, no cenário educacional 
brasileiro, no final dos anos 80, o termo letramento, colocando em evidência o foco nas 
práticas sociais de leitura e escrita que o sujeito vivencia na sociedade. 
De acordo com Magda Soares (2004), é proposta uma diferente concepção de 
alfabetizar, ou seja, alfabetizar letrando. Essa proposta reconhece necessária a especificidade 
da alfabetização, como processo de aquisição e apropriação do sistema da escrita, alfabético e 
ortográfico, mas, também, a importância de que a alfabetizaçãose desenvolva mediante 
vivências variadas que envolvam a leitura e a escrita no contexto de práticas sociais, 
proporcionando, assim, o desenvolvimento de atitudes participativas nos alunos em relação a 
essas práticas. 
Neste contexto, a alfabetização e o letramento são processos singulares, mas 
interdependentes, pois 
a alfabetização se desenvolve no contexto de e por meio de práticas sociais 
de leitura e de escrita, isto é, através de atividades de letramento, e este, por 
sua vez, só se pode desenvolver no contexto da e por meio da aprendizagem 
das relações fonema-grafema, isto é, em dependência da alfabetização 
(SOARES, 2004, p. 14). 
Essa proposta de alfabetizar letrando será detalhada no capítulo quatro, no qual 
iremos diferenciar os dois conceitos – alfabetização e letramento que, mesmo unindo dois 
termos distintos, se complementam, pois alfabetização designa o aprendizado inicial da leitura 
e da escrita, a natureza e o funcionamento do sistema de escrita, em contrapartida, o conceito 
25 
 
letramento pode ser definido como “o estado ou condição que adquire um grupo social ou 
indivíduo como conseqüência de ter-se apropriado da escrita e de suas práticas sociais” 
(SOARES, 2003, p. 31). 
Encerrando este capítulo, podemos dizer que, nos dias atuais, a concepção de 
alfabetização no Brasil continua passando por modificações, decorrentes de todo o processo 
histórico, das reações criadas em decorrência dos índices de educação apresentados pelos 
indicadores de desempenho escolar, como Indicador de Alfabetismo Funcional 
(INAF/Brasil)10 e das várias pesquisas sobre métodos de alfabetização de crianças, jovens e 
adultos, que continuam sendo desenvolvidas pelas diversas instituições de educação no País. 
Também, que a alfabetização, na atualidade, não pode mais ser compreendida 
como mera decodificação e codificação de sinais gráficos ou uma aquisição mecânica da 
leitura e da escrita. Conforme a UNESCO (2003, p.8), a alfabetização no mundo atual é plural 
em diversos sentidos e pode haver a bi alfabetização, em situações de bilinguismo. Assim, 
com o desenvolvimento das linguagens, ela abrange a representação multimodal de linguagem 
e ideias (texto, figura, imagem em movimento, em papel, em meio eletrônico, etc.). Embora 
as comunicações eletrônicas não tenham substituído a alfabetização impressa, o analfabetismo 
e o divisor digital separam incluídos e excluídos das novas linguagens. Portanto, outros 
elementos começam a ser incorporados tendo a visão da linguagem como uma totalidade - 
falar, escutar, ler, escrever, compreender. 
Por fim, nos apropriando das palavras de Paulo Freire, conceituamos a 
alfabetização como ensinar o uso da palavra, mas, também, a leitura de mundo, onde o 
educando terá acesso à cultura escrita, à informação, podendo expressar e defender pontos de 
vista, compartilhar e construir visões de mundo, produzir conhecimento, usufruir do 
patrimônio cultural da humanidade e exercer seu direito de cidadania (2005). 
 
10 INAF/Brasil, responsabilidade do Instituto Paulo Montenegro. Maiores informações consultar o site: 
http://www.acaoeducativa.org.br/portal/images/stories/pdfs/inafresultados2007. Acesso em 05 out 
2009. 
26 
 
2 ALFABETIZAÇÃO: LEITURA DE MUNDO PRECEDENDO A 
LEITURA DA PALAVRA. 
 
Como professora alfabetizadora de adultos e depois de crianças, observamos que a 
leitura de mundo estava presente em cada alfabetizando e em cada alfabetizanda. Mesmo não 
dominando o sistema de escrita, os educandos têm sua própria forma de ler e reler o mundo, 
que é ‘palco’ de suas histórias de vida. 
Assim, com essa expectativa de entender esse processo de leitura de mundo, carregada 
de significações decorrentes das experiências existenciais que congrega, fomos ao encontro da 
obra do educador Paulo Reglus Neves Freire, que sempre afirmou que a leitura de mundo 
precede a leitura da palavra e assim, fomos descobrindo outros elementos que também fazem 
parte do processo de alfabetização, como texto/contexto, cultura, as ideologias presentes, o 
processo dialógico, o significado político e ideológico da educação, a possibilidade de 
conscientização, entre outros, que farão parte deste segundo capítulo da dissertação. 
Neste capítulo buscaremos conhecer algumas das ideias e propostas de Freire para a 
educação, que desde o início dos anos 60 engajou-se nos movimentos de cultura e educação 
popular, participando e influenciando campanhas como “De pé no chão também se aprende a 
ler”, na cidade de Natal, Rio Grande do Norte e o Movimento de Cultura Popular (MCP)11 do 
Recife, Pernambuco. 
A partir dessas experiências, o educador freireano, vem apontando novas alternativas 
para o processo de alfabetização principalmente para as pessoas jovens e adultas, provenientes 
das classes populares, mas também para a alfabetização de crianças. Então, nos perguntamos: 
quais são essas alternativas, proposta por Freire para a alfabetização? 
Como exemplos da preocupação do educador com a alfabetização de adultos, jovens e 
crianças, podemos citar a experiência de alfabetização de adultos de Angicos, iniciada em 
janeiro de 1963 (ARAÚJO FREIRE, 2006, p.142); o Movimento de Alfabetização de Jovens 
 
11 Sobre esse tema Movimento da Cultura Popular (MCP), do Recife, conferir mais detalhes no 
depoimento de Paulo Freire na Décima Segunda Carta, “Minhas Experiências no MCP, no livro 
Cartas a Cristina, escrito por Paulo Freire em 1994. 
 
 
27 
 
e Adultos - MOVA/SP – que se tornou “modelo de educação popular e de alfabetização de 
adultos para muitas das Secretarias de Educação de governos progressistas” (2006, p.301) e o 
trabalho de Freire frente à Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, iniciado em 1989 
(p.287). “Afinal, o espaço pedagógico é um texto para ser constantemente ‘lido’, interpretado, 
‘escrito’ e ‘reescrito’” (FREIRE, 2006, p. 97). 
 
2.1 Educação e alfabetização na perspectiva freireana 
 
Paulo Freire trata enfaticamente da natureza política da alfabetização, vista por ele 
como “um processo eminentemente político que não se satisfaz apenas com a leitura da 
palavra, mas que se dedica também a estabelecer uma relação dialética entre a leitura da 
palavra e a leitura do mundo, a leitura da realidade” (FREIRE, 2001, p. 134). 
Nessa perspectiva, rompe com o mito da neutralidade na educação, ao enfatizar o 
significado da alfabetização, como leitura de mundo precedendo a leitura da palavra, 
possibilitando, assim, o desenvolvimento de uma consciência crítica nos sujeitos considerados 
“analfabetos” pelos setores hegemônicos de uma sociedade elitista e excludente, como tem se 
mostrado a sociedade brasileira. 
Para Freire (1983, p. 27), somos seres inacabados, incompletos, que, por termos 
consciência dessa inconclusão, buscamos nos educar. O inacabamento é condição de todo ser 
vivo, porém, a espécie humana é distinta das demais espécies. Enquanto estas já nascem 
prontas e são determinadas instintivamente em seus modos de ser e de agir, a humana é uma 
espécie “aberta”, sendo que cada indivíduo necessita se fazer, decidir sobre o que virá a ser 
(BOUFLEUER, 2008, p.95). Assim, a educação é possível para o homem, porque este é 
inacabado e sabe-se inacabado. E é esse impulso ontológico - consciência de sua inconclusão- 
próprio de sua natureza humana que o leva a buscar educar a si próprio e aos outros. 
Dessa forma, “a educação tem caráter permanente. Não há seres educados não 
educados. Estamos todos nos educando”, diz Paulo Freire (1983, p.28). Ou seja, o ser humano 
está em processo educativo desde que nasce. E é nessa educabilidade do ser humano que 
reside a raiz mais profunda da politicidade da educação, pois, por ser inacabado, consciente 
28 
 
desse inacabamento e histórico, o ser humano se faz um ser de opção, de decisão(2006, p. 
110), um ser político. 
Esse ser político que, por alguma razão, não pode se apropriar da leitura e da 
escrita, consideradas como instrumentos imprescindíveis para a participação na sociedade 
letrada, é rotulado de analfabeto e impedido de exercer seus direitos políticos, como se, por 
não saber ler e escrever, também não tenha condições de pensar, escolher, opinar. Essa 
condição do analfabeto o exclui de um direito conquistado como cidadão. 
De acordo com o pensamento freireano, a educação, e mais especificamente o 
saber, estão impregnados de ideologias12 que escondem pedagogias que ajudariam os 
educandos a ler e reler o mundo. “Como Freire revelou pela seguinte metáfora: [...] o poder da 
ideologia me lembra aquelas manhãs cheias de orvalho em que a neblina distorce o contorno 
dos ciprestes e eles se tornam sombras de algo que sabemos que está lá, mas não podemos 
realmente definir” (MISIASZEKE; TORRES, 2008, p.222). 
Também a alfabetização, de acordo com o educador freireano, passa 
necessariamente pela escolha, consciente ou não, de uma metodologia como instrumento que 
promova a aprendizagem, pois “não há alfabetização neutra, enfeitadinha de jasmins [...]. O 
processo de alfabetização é um processo eminentemente político, e eu diria, do educador 
saber disso ou não”, diz Freire. E complementa: “o educador pode bater com o pé no chão, 
fazer beicinho, dizer ‘não sou político’, e o trabalho dele é político” (FREIRE, 2001, p.128). 
Portanto, esse processo traz em si uma alta carga de ideologia que pode ser 
determinada pela visão fatalista de interpretar o mundo, mas, também, pode ser influenciada 
por uma visão libertadora comprometida com a construção do homem que busca Ser Mais13. 
 
12
 Freire se agrega aos teóricos marxistas que consideram as ideologias como ideias falsas e distorcidas 
associadas aos interesses das classes dominantes. “As ideologias promovem a miopia para aceitar 
facilmente que o que estamos vendo e ouvindo, é de fato, o que realmente é, e não uma distorção do 
que é” (MISIASZEKE; TORRES 2008, p. 222). Ou seja, “[...] insiste em convencer-nos de que nada 
podemos contra a realidade social que, de histórica e cultural, passa a ser ou a virar ‘quase natural’; 
expressa uma indiscutível vontade mobilizadora; nos nega e amesquinha como gente” (FREIRE, 1996, 
p.21 e 22). 
13 Ser Mais, para o educador Paulo Freire, significa uma valorização do indivíduo como homem que 
procura permanentemente pela liberdade, porém não como uma doação de alguém, e sim como uma 
conquista pessoal. É importante esclarecer que o próprio Freire, insiste que, ao falar do ‘ser mais’ ou 
da humanização como vocação ontológica do ser humano, não está caindo em nenhuma posição 
fundamentalista, mas como “algo que se vem constituindo, sempre processo, sempre devir” (FREIRE, 
2006c, p.99). 
29 
 
“Não hesitaria em afirmar que, tendo-se tornado historicamente o Ser Mais a vocação 
ontológica de mulheres e homens, será democrática a forma de luta ou de busca mais 
adequada à realização humana do Ser Mais” (FREIRE, 2003, p.192). 
Assim, o homem aventura-se curiosamente no conhecimento de si mesmo e do 
mundo, ao mesmo tempo em que luta pela afirmação de ser sujeito, revelando que a natureza 
humana é programada, mas não determinada, por estruturas ou princípios inatos. 
Nem uma nem outra, humanização e desumanização, são destino certo, 
dado, sina ou fado [...] Esta vocação (de Ser Mais), em lugar do ser algo a 
priori da história e, pelo contrário, algo que se vem constituindo na história 
[...], é sempre processo, e sempre devir, passa pela ruptura das amarras reais, 
concretas, de ordem econômica, política, social, ideológica, etc.. que nos 
estão condenando à desumanização (FREIRE, 2006c, p. 99). 
Retomando, conhecer a ideologia presente no processo de alfabetização é, para o 
educador, um fator imprescindível, por ser o processo de alfabetização eminentemente 
político. Se isso é verdade, o melhor então é que o educador saiba, desde o começo, que faz 
política e que, por isso, vai ter que fazer uma opção. Fazer uma opção é difícil, pois implica 
decisão, e “decidir, por sua vez, exige ruptura. Ninguém decide sem romper. Todo processo 
decisório se fundamenta numa ruptura. Não é possível neutralizar-se [...]: toda vez que eu 
opto pela neutralidade eu opto pelo que tem poder e não pelo velho ou pelo fraco” (FREIRE, 
2001, p.128). 
No processo de alfabetização, de acordo com a perspectiva freireana, essa opção 
pode ser trabalhada numa visão de uma educação bancária, mas também numa visão 
libertadora. 
A visão bancária considera o ato de educar como depositar conhecimentos, “em 
que a única margem de ação que se oferece aos educandos é a de receberem os depósitos, 
guardá-los e arquivá-los” (FREIRE, 2005, p.66), tornando as pessoas alienadas, dominadas e 
oprimidas, mais como objetos a serem manipulados do que sujeitos de sua própria história. 
Mas, na perspectiva de uma educação libertadora, que é defendida por Freire, a 
formação do ser humano rompe com os esquemas verticais característicos da educação 
bancária. Assim, oportuniza ao sujeito tomar consciência de sua condição de ser que pensa, 
ser crítico, agente e interveniente no mundo, sabedor de sua capacidade de sujeito capaz de 
30 
 
transformar sua realidade, ou seja, um ser da práxis. “A práxis, é reflexão e ação dos homens 
sobre o mundo para transformá-lo” (FREIRE, 2005, p.42). 
E é nessa perspectiva de uma educação libertadora que o processo de 
alfabetização não pode ser reduzido ao mero lidar com letras e palavras, de forma puramente 
mecânica. Ele transcende essa compreensão, pois passa a ser encarado como uma relação 
entre os educandos e o mundo, mediada pela prática transformadora desse mundo, que tem 
lugar precisamente no ambiente em que se movem os educandos. 
Assim, podemos dizer que o que existe de mais atual e inovador nas ideias de 
Freire é que a aquisição da aprendizagem da leitura e da escrita, ou seja, a alfabetização, não 
pode ser desassociada do processo de politização do ser humano, pois “a alfabetização é um 
ato de educação e educação é um ato fundamentalmente político” e não instrumento de 
opressão, mas de libertação (FREIRE, 2006 a, p.8). 
Para Freire, todo sujeito deve ter voz, ou seja, “a voz é um direito de perguntar, 
criticar, de sugerir. [...] Ter voz é ser presença crítica na história. Ter voz é estar presente, não 
ser presente”. E continua: “foi por isso que eu falei na natureza política da educação como 
uma totalidade, e da alfabetização como um capítulo dela. A alfabetização em si não é sequer 
o começo da cidadania, mas a experiência cidadã requer a alfabetização”, (2001, p.131). 
Assim, continuando o nosso diálogo, buscaremos conhecer como esse educador 
que foi um semeador e um cultivador de palavras, não de quaisquer palavras, mas de palavras 
“grávidas de mundo”, “palavras geradoras” que têm o dom de gerar mundos, de pronunciar 
novas realidades (FREIRE, 2006a, p.20), desencadeava o processo de alfabetização como 
leitura de mundo, tanto para alfabetizandos adultos, quanto para crianças, e sugeria aos 
educadores que “a prática da alfabetização tem que partir exatamente dos níveis de leitura do 
mundo, de como os alfabetizandos estão lendo essa realidade, porque toda leitura de mundo 
está grávida de um saber” (FREIRE, 2001, p.134). 
31 
 
2.2 Alfabetização na perspectiva freireana: um ato de conhecimento e de criação e não 
de memorização mecânica 
 
Desde os anos 60, somos convidados (as), pelo educador Paulo Freire, a ir além 
da rígida compreensão da alfabetização, enquanto “um processo mecânico que enfatiza 
excessivamente a aquisição técnica das habilidades de leitura e da escrita” (FREIRE, 
MACEDO, 2006, p.X) e entendê-la num sentido muito mais amplo, como leitura de mundo 
precedendo a leitura da palavra. Ler apalavra e aprender como escrever a palavra, de modo 
que alguém possa lê-la depois, são precedidos do aprender como escrever o mundo, isto é, ter 
a experiência de mudar o mundo e de estar em contato com mundo. “A leitura de mundo 
precede a leitura da palavra, daí que a posterior leitura desta não possa prescindir da 
continuidade da leitura daquele. Linguagem e realidade se prendem dinamicamente” 
(FREIRE, 2006a, p.11). 
O sujeito, desde que nasce, lê o mundo através de gestos, olhares, expressões 
faciais, do cheiro, do tato, do olfato, ou seja, antes de ler a palavra, o sujeito já vivenciou 
diversas leituras do mundo. 
O bicho gente, muito antes de desenhar e fazer a palavra escrita, falou, disse 
a palavra e, muito tempo antes de escrever, leu o mundo dele, leu a realidade 
dele. Talvez pudesse dizer que, muito antes de escrever a palavra, ele 
escreveu o mundo, isto é, transformou o mundo sobre o qual falou para, 
depois, escrever o falado (FREIRE, 2001, p.136). 
Nesse contexto, qualquer leitura é uma produção de sentido, o sujeito procura 
criar sentidos para o mundo que o rodeia. É no contato com o 'outro' e com o 'mundo' que são 
construídos símbolos, inicialmente muito singulares e próprios, até chegarem a se construir 
em significados compartilhados socialmente. 
A leitura de mundo, fonte da invenção da escrita da palavra, é que terminou 
por levar o bicho gente a registrar em signo o som com que já dizia o mundo. 
Então a alfabetização implica esse ponto de partida e implica voltar a ele. 
[...] O que vale dizer: a alfabetização implica reconhecer o ponto de partida 
da leitura do mundo, implica pensar em que níveis a leitura do mundo está se 
dando ou quais são os níveis de saber que a leitura do mundo revela e a 
partir do aprendizado da escrita e da leitura da palavra que se escreveu voltar 
agora, com o conhecimento acrescido, a reler o mundo. Até diria, a ler a 
leitura anterior do mundo (FREIRE, 2001, p.136 e 137). 
 
32 
 
Assim, a alfabetização assume um significado de legitimar a competência 
linguística e desenvolver a potencialidade criativa individual e social, indo muito além de um 
simples processo de memorização mecânica das palavras, mas como um processo de criação e 
recriação. 
Em outras palavras, a alfabetização, como um conceito e como uma prática social 
historicamente vinculados, assume muitas facetas na sua interpretação devido a seu 
significado político e ideológico. Como ideológica, a alfabetização pode ser encarada como 
uma construção social que está sempre implícita na organização da visão de história do 
presente e do futuro do indivíduo (adulto, jovem e criança), permitindo que os mesmos 
participem da compreensão e da transformação de sua sociedade. E, como domínio de 
habilidades específicas e de formas particulares de conhecimento, a alfabetização torna-se 
uma precondição de emancipação social e cultural. 
Nessa perspectiva, o papel do alfabetizador, seja de adultos, jovens e crianças, 
deve ser o de dialogar com o alfabetizando sobre situações concretas. Não, como um ‘bate-
papo’ desobrigado, mas de forma a expressar seu pensamento e compreender o pensamento 
do outro. 
Por isso, o diálogo, na proposta de alfabetização freireana, principalmente para 
adultos, é uma das categorias centrais por ser um processo dialético-problematizador, ou, nas 
palavras de Freire, “diálogo é o encontro amoroso dos homens que, mediatizados pelo mundo, 
o ‘pronunciam’, isto é, o transformam, e, transformando-o, o humanizam para a humanização 
de todos” (1992, p.43). 
Assim, a alfabetização como processo dialógico, não pode submeter os educandos 
a um pavoroso processo de imposição de signos a priori, sem que se faça nenhuma relação 
desses signos com o que eles vivenciam, lendo o mundo e representando para si em símbolos 
associados a essa leitura anterior da palavra escrita (FREIRE, 2001, p. 139). 
Outra contribuição freireana, para a alfabetização, é a de que o educador respeite 
os níveis de conhecimento que os adultos, os jovens e as crianças trazem para a sala de aula. 
Conhecimentos adquiridos na leitura de mundo de cada um e que terminam por dar certa 
marca ou identidade cultural para esses sujeitos. “É uma leitura que ele aprende a fazer, no 
convívio de sua casa, no convívio de sua vizinhança, de seu bairro, de sua cidade, com a 
marca forte do corte de sua classe social” (FREIRE, 2001, p.140). É uma leitura que a escola 
33 
 
ainda não conseguiu incorporar no seu dia a dia, mas que carrega o processo de construção da 
identidade do alfabetizando. Ou seja, 
[...] essa leitura que a escola despreza totalmente carrega a imagem de um 
processo no qual o aluno, que nos primeiros anos de vida está muito 
centrado nos seus referenciais e começa, por sua própria leitura do mundo, a 
comparar e comparar-se, em se diferenciando, a ir tomando consciência das 
diferenças. Esse é o processo de construção de sua identidade, de sua 
decentração, de sua socialização a partir de suas próprias leituras (FREIRE, 
2001, p. 141). 
De acordo com Paulo Freire, é negativo desrespeitar essa bagagem de vida com 
que o alfabetizando chega à escola, pois é nela que está inserida sua linguagem, sua sintaxe, 
sua semântica, em outras palavras, sua competência linguística. Assim como o saber contar, 
as técnicas, as manhas usadas para defender-se da agressão dos grupos dominantes, enfim, o 
seu saber de experiência feito, termo esse que representa uma importante contribuição para a 
valorização do senso comum, ou seja, para que se perceba criticamente o que nele há de bom 
senso. “Isso significa, em última análise, que não é possível ao(a) educador(a) desconhecer, 
subestimar ou negar os ‘saberes de experiência feitos’ com que os educandos chegam á 
escola” ( FREIRE, 2006c, p.59). 
Para Freire, esse desrespeito para com a leitura de mundo do educando revela 
certa incompetência, por parte do educador, que é ao mesmo tempo científica e política, pois 
o que fazer ou deixar de fazer com esse ‘saber de experiência feito’ do sujeito que chega à 
escola é uma questão político-ideológica. “Vamos às áreas populares com os nossos 
‘esquemas’ teóricos montados e não nos preocupamos com o que já sabem as pessoas, os 
indivíduos que lá estão e como sabem” (FREIRE, 1993, p.58). 
“Negar esse saber é incompetência científica, além de reacionarismo”, diz Paulo 
Freire, e “revela indiscutivelmente uma ideologia elitista e autoritária da escola” (2001, p. 
142). Isso quer dizer que a escola é elitista por aceitar como válido somente o saber que já 
está montado ou pseudamente terminado, o que é um erro cientifico e epistemológico, pois 
nenhum saber está pronto e completo, argumenta o educador freireano. “O saber tem 
historicidade pelo fato de se construir durante a história e não antes da história ou fora dela”, 
ou seja, “o saber novo nasce da velhice de um saber que antes foi também novo [...]. E já 
nasce com a humildade de quem espera que um dia envelheça e suma, para que outro saber o 
substitua” (FREIRE, 2001, p. 143). 
34 
 
Paulo Freire sugere, em seus escritos, que jamais dever-se-ia deixar de considerar, 
para o processo de alfabetização, a ligação daquilo que o sujeito está aprendendo na escola 
com o que ele está aprendendo no mundo, ou seja, no mundo que ele está lendo (FREIRE, 
2001, p. 142). 
Isso não significa que esse saber fique no nível da preservação, de forma a deixar 
que o educando permaneça no nível de saber em que se encontra. Pelo contrário, é partir do 
que o educando já sabe, valorizando esse saber para gerar novos conhecimentos, ou seja, “o 
saber como um processo e não como um produto” (FREIRE, 2001, p. 155). Processo esse que 
leve a uma nova releitura de mundo, capaz de possibilitar uma transformação constante da 
realidade rumo à “humanização dos homens, que rejeita toda forma de manipulação, na 
medida em que esta contradiz sua libertação” (FREIRE, 1992, p. 74). 
Nessecontexto de alfabetização como possibilidade de conscientização14 Paulo 
Freire criou um Método de Alfabetização que foi por ele entendido não como passos a seguir, 
mas no sentido de “um processo cognitivo, no qual está implícita e faz parte toda a sua teoria 
do conhecimento que é eminentemente política, ética, humanista e democrática porque tinha a 
intenção de incluir, para participar da sociedade, todas as pessoas dessa sociedade” [...] Nesse 
processo, o sujeito, para atingir tal nível de consciência crítica, começa em “ler a palavra 
lendo o mundo” (ARAÚJO FREIRE, 2006, p. 332). 
Assim, nosso diálogo com o educador avança no intento de conhecer algumas da 
ideias presentes em seu método de alfabetização, porém sem antes esclarecer que o próprio 
Paulo Freire reconheceu que 
[...] do ponto de vista da alfabetização em si é impossível relegar a um plano 
secundário os estados atuais da sócio e da psicolingüística, a contribuição de 
Piaget, de Vigotski, de Luria; a de Emília Ferreiro, de Madalena Weffort, de 
Magda Soares. Contribuições que, se bem aproveitadas, retificam e 
aprimoram algumas das propostas que fiz (FREIRE, 2003, p.170). 
 
 
14 Conscientização, para Freire, constitui um conceito estruturante da concepção de que a educação, 
como prática libertadora, é um ato de conhecimento, uma aproximação crítica da realidade. A 
conscientização é compreendida, assim, como processo de criticização das relações consciência-
mundo, é condição para a assunção do comprometimento humano diante do contexto histórico-social. 
É através da conscientização que os sujeitos assumem seu comprometimento histórico no processo de 
fazer e refazer o mundo, dentro das possibilidades concretas, fazendo e refazendo também a si 
mesmos (FREITAS, 2008, p.99-100) 
35 
 
2.3 Método de Alfabetização Paulo Freire: da leitura de mundo à leitura da palavra 
 
Durante muitos anos, Paulo Freire preocupou-se com a questão dos déficits 
alarmantes de analfabetismo de pessoas adultas no País, por entender que se constituíam 
obstáculos ao desenvolvimento nacional e da criação de uma mentalidade democrática. 
Mesmo num clima de dúvidas, ambiguidades e medos, o educador foi tomando espaço com 
ousadia, valentia e tenacidade, “acreditando nas pessoas, nos sonhos democráticos, num 
Brasil melhor com a participação das classes populares”, conforme nos conta Ana Maria 
Araújo Freire (2006, p.129). 
Essa “paixão” o levou a, juntamente com um grupo de intelectuais, nos anos de 
1960, organizarem trabalhos educativos. Um desses trabalhos - o Movimento de Cultura 
Popular do Recife - foi desdobrado em programas e projetos de menor amplitude, como os 
Círculos de Cultura e o Centro de Cultura. Essas experiências de educação popular de adultos, 
orientadas por Paulo Freire e desenvolvidas pelo grupo de intelectuais, buscavam, 
principalmente, resgatar a cultura popular (ARAÚJO FREIRE, 2006, p.129). 
Neste contexto, Paulo Freire e seus colaboradores começaram a se perguntar sobre 
a possibilidade de fazer algo, como um método dirigido á alfabetização de adultos, que fosse 
ativo, dialogal, capaz de criticizar o homem através do debate de situações desafiadoras, 
postas diante do grupo. Essas situações teriam de ser existenciais para os alfabetizandos. 
Desde logo pensávamos a alfabetização do homem brasileiro, em posição de 
tomada de consciência, [...] realmente ligada á democratização da cultura, 
que fosse uma introdução a esta democratização. Numa alfabetização que, 
por isso mesmo, tivesse no homem, não esse paciente do processo, cuja 
virtude única é ter mesmo paciência para suportar o abismo entre sua 
experiência existencial e o conteúdo que lhe oferece para sua aprendizagem, 
mas seu sujeito (FREIRE, 1992, p. 112). 
 
Nessa compreensão, começou a ser gestado o Método de Alfabetização Paulo 
Freire, que não pode ser reduzido a puro conjunto de técnicas ligadas à aprendizagem da 
leitura e da escrita, dissociada da concepção de educação libertadora, conscientizadora e ética 
humanista, pois “o ato de alfabetizar tem como intenção maior possibilitar fazer de Seres 
36 
 
Menos, Seres Mais,15 ao permitir que analfabetos e analfabetas resgatem a sua humanidade 
roubada” (ARAÚJO FREIRE, 2006, p. 332) 
Assim, Paulo Freire, a partir de “seu pensar a prática, o óbvio, o cotidiano, o que 
escutava e o que observava”, conforme Ana Maria Araújo Freire (2006, p. 336), e “menos das 
reflexões sobre outras reflexões”, começou a elaborar uma nova maneira de alfabetizar 
adultos. 
Por volta do ano de 1960, Paulo Freire observava seu filho Lutgardes, com 2 anos 
de idade, fazer a “leitura da palavra Nescau”. O menino associava a imagem e a pronúncia de 
Nescau, que vira na propaganda da televisão, com a palavra inscrita num painel de 
propaganda de rua desse alimento que ele conhecia. Desse modo, o menino fazia a relação 
apreendida e aprendida através da televisão, entre a imagem e o som, e a percepção baseada 
na capacidade própria da consciência humana de desvelar a palavra conhecida, mas escrita em 
outro contexto. 
Essas observações reflexivas, mais de forma intuitiva do que científica, levaram 
Paulo Freire a criar um caminho-epistemológico – “chamado Método Paulo Freire de 
Alfabetização – que deu possibilidade aos adultos analfabetos lerem a palavra escrita, já 
anteriormente conhecida pela oralidade” (ARAÚJO FREIRE, 2006, 337). 
Para o educador Freire, é no cotidiano e na possibilidade de interferir no mundo 
superando o rotineiro, que nos fazemos seres históricos, pois é o cotidiano16 que nos dá a 
medida exata do que somos, sentimos e fazemos e, portanto, é nesse espaço-tempo que nos 
constituímos como gente e constituímos a história. Em outras palavras, “[...] a cotidianidade, 
além de resgatar o humano como ser de possibilidade, do quefazer, expõe a possibilidade de 
através desse cotidiano se chegar á maturidade consciente”. Isso acontece, “se pudermos ler 
certo o mundo, carregando assim o verdadeiro sentido e a sabedoria dos gestos, das palavras, 
dos atos, das experiências e dos fatos que o cotidiano nos faz viver (ARAÚJO FREIRE, 2006, 
p. 335). 
 
15 Este é um conceito aberto, que nos leva a interpretar que, para Freire, cada indivíduo, nos coletivos 
sociais que integra, se movimenta, ao seu modo, de um "Ser Menos" a um "Ser Mais". Ao mesmo 
tempo, é um termo que vai revelar o humanismo de Freire e os ideais republicanos (especialmente 
autonomia, liberdade e igualdade...) que incorporou, a partir de vivências radicais, e que provocam e 
concentram tantas críticas ao seu pensamento e produção. 
16 Cotidiano compreendido como situação presente, existencial, concreta, o dia a dia do sujeito 
(FREIRE, 2005, p.100). 
37 
 
Assim, é partindo do cotidiano que os sujeitos - crianças e adultos -, ao se 
conscientizarem e se alfabetizarem, podem ter a possibilidade de transformar o mundo 
decodificando o mundo cotidiano codificado. Foi isso que Paulo Freire fez na sua 
compreensão de educação “ao tomar o óbvio do cotidiano como ponto de partida do sem 
sentido e sem legitimidade superando-o, como um inédito-viável possível de concretização no 
campo do real, do prudente, do coerente para a vida de milhões de brasileiros e brasileiras” 
(ARAÚJO FREIRE, 2006, p. 336). 
O sujeito analfabeto desconhece apenas a linguagem escrita, não é ignorante da 
linguagem oral. Por isso, o Método de Alfabetização proposto por Freire convida os 
analfabetos a saírem da sua apatia e os desafia a compreenderem que eles próprios são 
sujeitos ‘fazedores de cultura’, superando o entendimento e a crença de se terem tornado, 
irremediavelmente, Seres Menos, ou seja, seres aderidos ao mundo incapazes de transcender 
essa condição, pois o seu potencial de mudança parece estar atrofiado em relação à vocação 
ontológica de Ser Mais. Não é sina ou desígnio

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