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2 - A proposta educacional do MST _ Alessandra Silva

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Entrelaçando 
Revista Eletrônica de Culturas e Educação 
N. 6 • V.2 • p. 13-28 • Ano III (2012) • Set.-Dez. • ISSN 2179.8443 
 
Caderno Temático V 
Educação, Escolas e Movimentos Sociais do/no Campo 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A PROPOSTA EDUCACIONAL DO MST E A CONSTRUÇÃO DA 
EDUCAÇÃO DO CAMPO 1 
 
Alessandra Almeida e Silva.2 
 David Romão Teixeira3 
 
 
RESUMO 
 A pesquisa sobre a proposta educacional do MST apontou que em meio às contradições da 
atualidade a Pedagogia do MST deixa clara a sua vinculação a um novo projeto de sociedade, e que 
essa proposta de educação está sendo construída no seio da luta de classes com a participação de 
homens, mulheres, crianças, jovens trabalhadores e trabalhadoras do campo, sujeitos construtores 
da própria história e que estão construindo uma nova página na luta de classes do Brasil. Já as 
políticas públicas para educação do campo, puderam ser analisadas de dois pontos de vista 
diferentes: o dos Movimentos sociais, que vê nessas conquistas estratégia para garantir inicialmente 
acesso à educação, mas fundamentalmente para a Universalização de uma educação de classe na 
perspectiva da emancipação humana. 
Palavras- chave: Educação do MST. Educação do Campo. Reforma Agrária. 
 
ABSTRACT 
Research on the educational proposal MST pointed out that amid the contradictions of modern 
pedagogy MST makes clear its connection to a new project of society, and that this education 
proposal is being built within the class struggle involving men, women, children, young workers 
and workers in the field, subject of the story itself and builders who are building a new page in the 
class struggle in Brazil. Since public policies for rural education, could be analyzed from two 
different points of view: that of social movements, who sees these achievements strategy to ensure 
access to education initially, but fundamentally for Universal one class education from the 
perspective of emancipation human. 
 
Keywords: MST Education. Rural Education. Agrarian Reform. 
 
1
 O texto é parte da Monografia da autora (SILVA, 2012) para a conclusão do curso Especialização em Educação do 
Campo, UFRB/CFP - 2012 
2 Graduada em Pedagogia da Terra – UNEB/PRONERA. Especialista em Educação do Campo e Desenvolvimento 
Territorial do Semiárido Brasileiro CFP/UFRB. 
3
 David Romão Teixeira Professor Assistente Centro de Formação de Professores Universidade Federal do Recôncavo 
da Bahia-UFRB 
A proposta educacional do MST e a construção da Educação do Campo 
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O MST E A LUTA PELA EDUCAÇÃO 
 
A preocupação com a educação no Movimento Sem Terra está presente desde a origem do 
próprio MST, desde as primeiras ocupações já se lutava por escolas para os filhos e filhas das 
famílias acampadas. A princípio a discussão se concentrava em garantir escola para as crianças, 
mas, a partir do próprio desenvolvimento do MST, das relações criadas pela condição real das 
famílias, oriundas das lutas, dos enfrentamentos, dos violentos despejos, da perseguição por 
pistoleiros, polícia etc., garantir escola não só se tornou um desafio como definir que tipo de 
educação teria as crianças sem terra se tornou centro dos debates, isso porque as contradições 
vividas por essas famílias se refletiam na escola (e não podia ser diferente), os professores que ali 
estavam em grande parte não eram oriundos da luta e isso contribuía muito para que os mesmos 
tratassem as ações dos e das sem terra como ato de vandalismo. Por conta disso, o movimento 
identificou a necessidade de formar educadores e educadoras da Reforma Agrária, que 
compreendessem e fizessem parte da luta, foi então que deu início aos cursos de formação de 
educadores e educadoras do MST, com cursos de Magistério, Pedagogia, Letras, tendo os Encontros 
de Educadores e Educadoras como passos decisivos para iniciar a construção da Proposta Educativa 
do MST. É notório já nos primeiros registros sobre a luta pela educação no MST o desejo de ter 
uma escola diferente 
Uma das primeiras discussões do MST acerca da Escola foi que tipo de escola era necessário 
para as crianças acampadas e assentadas. De uma coisa já se tinha ciência: o modelo educacional 
hegemônico não atendia aos propósitos de educação do movimento muito menos à proposta de 
sociedade que defendia e defende. “Como a educação e a formação estão sempre em relação com a 
sociedade e/ou o projeto de sociedade em que se inserem, para o MST, educar é fundamentalmente 
formar para transformar a sociedade”. (DALMAGRO, 2011, p. 45). 
Num primeiro momento a preocupação entre o grupo que discute a educação, é não destoar o 
processo educativo da luta, para esse grupo, o objetivo da escola é “ser um instrumento de 
continuidade da luta através das crianças” (MST, 2005). O movimento então se empenhou em 
construir uma proposta de educação própria, com elementos que contrapõe os objetivos da atual 
escola, que visa “fornecer os conhecimentos e o pessoal necessário à maquinaria produtiva em 
expansão do sistema capitalista”. (SÁDER, 2005). 
As escolas se configuram enquanto espaço de poder, por isso é espaço de disputa, ocupar esse 
espaço, tem sido um dos objetivos do movimento em geral que considera a escola e a educação 
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instrumentos importantes na luta pela transformação social. A formação da consciência se dá na 
prática, nas lutas, mas a escola também tem o papel de trabalhar a consciência de classe, da classe 
trabalhadora. É nesse sentido que Mészáros (2005, p. 61) destaca que o papel da educação é de 
importância vital para romper com a internalização predominante nas escolhas políticas 
circunscritas à ‘legitimação constitucional democrática’ do Estado capitalista que defende seus 
próprios interesses. 
 
É preciso, no entanto, fazer um esforço para compreender o que leva um Movimento de Luta 
pela Terra ter a educação em sua pauta de luta e de organicidade, e nessa mesma lógica 
compreender o porquê do MST defender outro modelo de escola e de Educação como alerta 
Dalmagro 
Não é possível entender a escola no MST sem entender o próprio MST, ou seja, a 
natureza, os objetivos, a historia desse movimento social. O MST não se faz etéreo 
no tempo e no espaço, ele próprio é determinado/possibilitado pela materialidade 
de nossa época. A escola igualmente é uma construção histórica. Nosso objetivo é 
refletir acerca de qual escola tem sido necessária à luta dos Sem Terra e, nesta 
medida [...] identificar se e como o MST tem apontado a construção de uma escola 
superior à atual. (DALMAGRO, 2011, p.45) 
 
 
A educação é na visão do um instrumento indispensável nesse processo de luta, com tarefas 
específicas, como destaca o Coletivo Nacional de Educação 
 
A organização de que fazemos parte está cada vez maior e mais complexa. A luta 
dos trabalhadores cresce em necessidade e força [...]. A educação precisa assumir 
as tarefas que lhe cabem neste processo de fortalecimento da nossa organicidade, 
de clareza do projeto político dos trabalhadores e de construção prática e cotidiana 
da sociedade da justiça social e da dignidade humana [...] (MST, 2005, p.159-160). 
 
 
Dessa forma, a educação proposta pelo Movimento está ligada a um projeto político e uma 
visão de mundo que tem como objetivo romper com a atual lógica da sociedade capitalista podemos 
constatar essa afirmativa com o que diz os princípios filosóficos da educação do MST, onde a 
educação éconsiderada “uma das dimensões da formação, entendida tanto no sentido amplo da 
formação humana, como no sentido mais restrita de formação de quadros”, essa educação tem a 
transformação social como horizonte “um processo pedagógico que se assume como político”, uma 
educação de classe que “não esconde o seu compromisso em desenvolver a consciência 
revolucionária tanto nos educandos como nos educadores (MST, 2005). 
Um elemento constitui-se como um grande dilema e um entrave nessa tentativa de construir e 
implementar uma proposta diferente de educação: as escolas reivindicadas pelo MST e 
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conquistadas são controladas pelo Estado, estas possuem um currículo e proposta pedagógica 
pensada sob a lógica da atual sociedade, como reflete Freitas, 
 
No caso do MST, o problema reaparece com a agravante de que a educação 
fundamental está, em sua maior parte, na dependência do ensino regular de caráter 
capitalista – disputado em alguns lugares-, mas sob controle do Estado. [...] o MST 
tem que ter uma estratégia formativa mais ampla [...] para garantir que seu conceito 
de formação não se restrinja ao conceito de educação centrado exclusivamente na 
escola capitalista [...]. (FREITAS, 2011, p.118-126) 
 
 
Ao se colocar numa posição contrária a organização da sociedade capitalista, lutando pelo 
acesso a terra, denunciando por meio de suas mobilizações o caráter destrutivo da sociedade 
capitalista, tendo como horizonte a Reforma Agrária, e a transformação social, o MST tem 
acumulado experiências formativas e educativas de grande valor, e é para essa dimensão formativa 
que o Movimento precisa se atentar e usar a seu favor, como apontou Freitas, “onde houver 
possibilidade de a escola integrar esta cadeia formativa construída pelo Movimento, certamente 
poder-se-á ir mais longe”, (FREITAS, 2011, p.127). 
Relacionar a experiência de luta e organização proporcionada pelas ações do movimento se 
tornou uma prática e vem fazendo com que os e as militantes reconheçam no próprio movimento um 
caráter formativo e educativo. As mobilizações, os enfrentamentos, são elementos que contribuem para 
o avanço da consciência, para uma compreensão mais avançada da realidade e principalmente desperta 
o desejo de mudança, esses elementos são fundamentais no processo de formação da classe 
trabalhadora. 
Foi com base nessas inquietações e na tentativa de construir algo novo que o MST por meio do 
Setor de Educação elaborou produções coletivas surgidas das experiências de educação nas áreas de 
assentamento e acampamento, e ainda tendo como orientação as experiências já acumuladas de grupos 
ou de pessoas4 que no processo de construção de uma nova sociedade tinham com objetivo romper 
com o modo tradicional de educação e construir uma proposta educativa com valores humanistas, 
tendo a coletividade e a auto-organização como bases, e ainda resgatando a centralidade do trabalho no 
processo formativo5. Trata-se se cartilhas, boletins, revistas, que trazem a proposta de educação do 
MST, com reflexões teóricas e metodológicas, relatos de experiências etc. 
A proposta educativa do Movimento Sem Terra, segundo Araújo (2007) “não se encerra na 
escola”, se pauta em princípios filosóficos da educação, que demonstram que essa proposta tem 
 
4
 Dentre as influencias mais diretas destaca-se o Educador Paulo Freire, com seu método de Educação Popular 
5
 Dentre as experiências destaca-se a experiência Russa na revolução de 1917, em especial as escolas Comuna 
(PISTRAK) e ainda as experiências do Educador Anton Makarenko. 
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como finalidade construir algo novo. Isso pôde ser observado nas produções (cadernos, boletins) da 
Educação do MST, que em sua elaboração destaca a importância da relação da produção do saber 
com a produção da vida. De acordo com Araujo (2007) essas produções começaram a ser 
sistematizadas no início dos anos 90, elaborando a fundamentação teórico-coletiva da proposta 
político-pedagógica para as escolas de ensino fundamental. 
Ao apropriarmos dos primeiros textos sobre a educação elaborados pelo MST, o que podemos 
observar é que já existe desde aí a preocupação com a relação entre a educação com o processo 
produtivo, nesse texto, o Coletivo diz que a base da escola alternativa para os Assentamentos está 
na relação entre a escola e a produção, e essa preocupação não foi algo que veio de fora, foi fruto da 
participação dos pais, da comunidade, nas discussões sobre a educação. A ligação da escola com as 
discussões sobre a produção no assentamento impulsionaram o debate sobre a importância do 
trabalho na formação das crianças sem terra, e mais que isso, o trabalho que se discutia era o 
trabalho coletivo, por meio das cooperativas agrícolas que estavam sendo implementadas nos 
assentamentos, fruto do debate do MST sobre a Cooperação Agrícola. 
A proposta de escola que se pretendia construir nessa época é segundo Caldart (1990) “uma 
autêntica revolução educacional”, pois segundo a autora já de início propõe uma educação 
diferente, e o que é mais importante, constrói uma escola com vínculo orgânico com o Movimento e 
com o campo, algo inédito na educação brasileira. A autora acrescenta ainda que se trata da revisão 
das formas tradicionais de fazer, de pensar e de dizer a educação do povo , “demonstrando na 
prática quem pode e deve ser o sujeito das mudanças fundamentais para a nossa educação” 
(CALDART, 1990). 
Mas que escola diferente é essa? Segundo o Coletivo Nacional de Educação6 do MST, a 
diferença está nos objetivos da escola, que não podiam estar separados ou distantes da realidade do 
assentamento, ajudando no avanço da luta. “A escola deve ser essencialmente prática, fornecendo 
conhecimentos capazes de influenciar no trabalho e na organização da nova vida” (MST, 2005, p. 
18). 
Espaço de debates e deliberações acerca dos rumos e das estratégias da luta, o 6º Encontro 
Nacional do MST, ocorrido em Piracicaba, SP no ano de 1991 aprovou as linhas políticas e as 
orientações para a educação nas escolas do MST. As linhas políticas afirmavam entre outras 
questões que era preciso desenvolver uma educação com base na realidade, nas experiências 
acumuladas, e preparar crítica e criativamente para a participação nos processos de mudanças da 
 
6
 O Coletivo Nacional de Educação do MST é formado por representantes (militantes) do movimento dos Estados nos 
quais o MST está organizado. 
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sociedade, de forma coletiva, construir conhecimentos científicos mínimos para o avanço da 
produção, ampliando e fortalecendo a relação entre escola e assentamento. 
A contribuição dos pedagogos socialistas (Krupskaia, Pistrak, Makarenko), das perspectivas de 
construção de uma nova sociedade, e também da educação nos fundamentos socialistas e humanistas: o 
coletivismo, o trabalho coletivo, o trabalho socialmente útil, o trabalho como princípio educativo, a 
solidariedade, a organização e a auto-organização dos estudantes, a relação teoria e prática, são 
presentesna pedagogia do MST. Dalmagro (2011) reconhece também essa relação da pedagogia do 
MST com as teorias marxistas e socialistas, quando observa que “os documentos do setor de educação 
do MST aproximam-se da concepção marxista do trabalho, entendo-o como fundante da educação e 
em sua dimensão contraditória na sociedade capitalista”. 
A autora chama atenção para a luta do MST que está para além da conquista da terra, e a 
centralidade que a educação tem nesse processo de luta enquanto instrumento de formação e 
transformação da consciência, tendo o trabalho como elemento formador. De fato o trabalho possui 
caráter formativo se compreendido enquanto fundante do ser social, no entanto não podemos perder 
de vista que o trabalho hoje assume a forma predominante de trabalho assalariado , que sob o 
capitalismo, aliena, oprime, explora. Sob a lógica do capital, o trabalho foi e está sendo organizado 
numa forma que degrada o ser humano, numa lógica destrutiva. Na explicação de Marx: “antes de 
tudo, o trabalho é um processo de que participa o homem e a natureza, processo em que o ser 
humano, com sua própria ação, impulsiona, regula e controla seu intercâmbio material com a 
natureza” (MARX, 1982 in ANTUNES, 2005 p.202). 
Essa dimensão humanizadora do trabalho não é encontrada na forma de trabalho imposta pela 
sociedade capitalista onde a divisão social do trabalho configura-se por dois grupos antagônicos: os 
detentores dos meios de produção e os expropriados desses mesmos meios, a quem resta vender a 
sua força de trabalho. Ainda nas palavras de Marx o trabalho sob a lógica do capital é descrito como 
algo que deprecia a vida humana, que a destrói. 
 
A própria vida aparece apenas, reducionistamente, como meio de existência. O 
trabalho, criador da vida, aparece como negação da vida... Há [...] uma clara 
dissociação entre o trabalho e a vida do trabalhador, sendo, aquele, não mais vida, 
mas meio de vida. Assim, aquilo que seria a totalidade genérica se converte em 
parte dilacerante e degradante, pois, na medida em que o “trabalho alienado subtrai 
ao homem o objeto de sua produção, furta-lhe igualmente a sua vida genérica, a sua 
objetividade real como ser genérico, e transforma em desvantagem a sua vantagem 
sobre o animal, porquanto lhe é arrebatada a natureza, o seu corpo orgânico” 
(MARX, 1989, p. 165). 
 
 
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Nesse contexto a sociedade capitalista e sua luta constante de se manter na hegemonia vêm 
historicamente se valendo de vários mecanismos de controle da sociedade, dentre eles está a 
educação que vem desenvolvendo duas funções simultaneamente: “fornecer os conhecimentos e o 
pessoal necessário à maquina produtiva do capital e gerar e transmitir um quadro de valores que 
legitima os interesses dominantes” (MÉSZÁROS, 2005,p. 35,grifo do autor). Num processo de 
internalização dos valores da sociedade capitalista, como o individualismo, a competitividade, 
inculcando nos trabalhadores naturalidade dos fatos, num processo de conformação com a miséria, 
com a violência, com o desemprego, enquanto uma minoria se beneficia, uma grande massa 
definha. É nesse sentido que Mészáros (2005) aponta a educação como fundamental para contribuir 
para o processo de emancipação, 
Mészáros chama a atenção também para a necessidade de conquista da emancipação humana, 
se faz imprescindível universalizar o trabalho e a educação, o referido autor afirma que “não pode 
haver uma solução efetiva para auto-alienação do trabalho sem que se promova, 
conscienciosamente, a universalização do trabalho e da educação” (MÉSZÁROS, 2005, p. 67). 
Além disso, o autor deixa claro a urgência de “lançar-se pelo caminho que nos conduz a uma ordem 
social qualitativamente diferente” (Idem, p.76). Esta urgência se caracteriza pelo momento histórico 
que estamos, nas palavras do autor, 
 
A nossa época de crise estrutural global do capital é também uma época histórica 
de transição de uma ordem social existente para outra, qualitativamente diferente. 
Essas são as duas características fundamentais que definem o espaço histórico e 
social dentro do qual os grandes desafios para romper a lógica do capital, e ao 
mesmo tempo também para elaborar planos estratégicos para uma educação que vá 
além do capital, devem se juntar. Portanto, a nossa tarefa educacional é, 
simultaneamente, a tarefa de uma transformação social, ampla e emancipadora. 
Nenhuma das duas pode ser posta à frente da outra. Elas são inseparáveis. A 
transformação social emancipadora radical requerida é inconcebível sem uma 
concreta e ativa contribuição da educação no seu sentido amplo (MÉSZÁROS, 
2005, p. 76). 
 
Os desafios estão postos, sem ter clareza da necessidade de superar a sociedade de classes não 
se pode fazer grandes mudanças, trazer a centralidade do trabalho enquanto elemento fundante do 
ser, e lutar em prol de uma nova realidade, superando a atual divisão social do trabalho, e rompendo 
com a lógica da propriedade privada, são os grandes desafios histórico da humanidade. 
Diante da importância do trabalho enquanto elemento fundante do ser social é que destacamos 
o caráter formativo que o trabalho tem para o MST, ao mesmo tempo em que atentamos para os 
limites e avanços do mesmo com relação ao entendimento dessa categoria no processo educativo do 
movimento, chamando atenção para a necessidade de maior aprofundamento teórico para de fato 
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compreender a dimensão formativa do trabalho. Isso por que o MST limita a importância do 
trabalho às atividades práticas demandadas pelos assentamentos e acampamentos, não há na maioria 
das vezes uma proposta de superação da relação de trabalho ali existente, mais uma vez nos 
reportamos às reflexões de Dalmagro (2011), para a autora há no conjunto dos documentos, o 
acento no trabalho do campo e do assentamento e as necessidades imediatas de formação para o 
trabalho demandadas pelo MST. 
Destacamos a importância de relacionar a educação com a produção da vida, compartilhamos 
com o mesmo pensamento de Dalmagro (2011) quando a mesma afirma que a relação trabalho - 
educação possibilita uma formação de fato humanizadora, unir saber e fazer é fundar uma educação 
omnilateral, “desenvolvendo as múltiplas potencialidades humanas hoje sufocadas” (DALMAGRO, 
2011). Sobre as limitações do Movimento Sem Terra com relação ao trabalho, a autora destaca: 
 
Entendemos que a escola do MST, ao formar para o trabalho, precisa conhecer e 
problematizar as forças existentes de produção, desde as artesanais e manuais até 
as mais complexas. É preciso analisar o sentido em que elas se colocam e sob o que 
se sustentam, avançando no intuito de dominar a tecnologia e a ciência embutidas 
nos processos produtivos, seja para incorporá-las ou rejeitá-las... (DALMAGRO, 
2011, p. 51) 
 
Em meio às contradições da atualidade a Pedagogia do MST deixa clara a sua vinculação a 
um novo projeto de sociedade, essa proposta de educação está sendo construída no seio da luta de 
classes com a participação de homens, mulheres, crianças, jovens trabalhadores e trabalhadoras do 
campo, sujeitos construtores da própria história e que estão construindo uma nova página na luta de 
classes do Brasil e do Mundo. 
 
 
 
 
 
 
EDUCAÇÃO DO CAMPO: das reivindicações às políticas públicas 
 
De forma direta ou indireta a questão da terra é o que poderia ser chamado de espinha dorsal 
da maioria dosproblemas sociais brasileiro. De 1500 a 1930, o Brasil vivenciou o modelo 
agroexportador, A relação com a terra nesse período era a de concessão de uso, dado pela coroa 
aqueles que tivessem capital para investir e produzir o suficiente para exportação. Os colonizadores 
perceberam a fertilidade das terras brasileiras e desenvolveram a prática da monocultura, para 
abastecer o mercado europeu, chegando a exportar mais de 80% do que era produzido aqui (Stedile, 
2011) utilizando da mão de obra escrava. 
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Ainda utilizando as análises de Stedile, de 1930 até 1964 se dá o período da substituição de 
importações, nacional desenvolvimentismo ou industrialização dependente. Período marcado pela 
“abolição da escravidão”, esse é o mesmo período em que é criada a Lei de Terras, a terra vira uma 
mercadoria, tem acesso quem pode pagar. 
A Lei de Terras foi então, o batistério do latifúndio no Brasil. Ela regulamentou e consolidou 
o modelo da grande propriedade rural, que é a base legal, até os dias atuais, para a estrutura injusta 
da propriedade de terras no Brasil, afirma Stedile. Com a “abolição”, sem condições de acesso a 
terra, os então ex-escravos foram formar as periferias das cidades, deram origem às favelas de hoje, 
local de terras mais baratas por causa da sua formação geográfica. 
Diante desse resgate histórico, cabe-nos agora situar a educação para com os povos do campo 
nos cenários acima descritos. Como desde o período de colonização até os dias atuais se deu o 
processo educativo desses povos? Certamente, as condições reais de vida se refletiam também no 
quesito educação, saúde, emprego etc. 
 
Até a década de 1920, a educação rural situa-se no contexto de dependência às 
idéias trazidas da Europa, de onde procediam os colonizadores e “as iniciativas 
mais consistentes de formação dirigidas às populações do meio rural deram-se nos 
setores de ensino médio e superior, especialmente neste último” (CALAZANS, 
1993, p.18) 
 
 
No período de 1910 – 1920, surge o Ruralismo Pedagógico, as ideias centrais dos defensores 
dessa proposta era promover a fixação do homem no campo (ARAUJO, 2011). Nesse período os 
pressupostos da chamada Escola Nova sob as influencias do filosofo americano John Dewey 
defendidos pelos “pioneiros da educação7” influenciaram as discussões para um projeto de 
educação rural no Brasil. O papel da escola, de acordo com essa proposta centra-se na formação de 
indivíduos “adaptados” aos interesses do país. O ruralismo pedagógico, segundo Calazans (1993), 
pregava a socialização do indivíduo para que pudesse viver de forma harmoniosa no meio social e 
natural. Diante desse quadro é possível notar que não há nada de específico na educação para os 
povos do campo, somente em 1934, na chamada Era Vargas, a educação para as populações rurais é 
mencionada, e o objetivo era conter o movimento migratório e elevar a produtividade, (CNE/CEB, 
2002, p. 9). Nas constituições de 1937 e 1946 e nas Leis de Diretrizes e Base da Educação 1961-
1971, fica claro o caráter utilitarista da produção agrícola dado à educação rural como pode ser 
visto a seguir: 
 
 
7
 Anísio Teixeira, Fernando de Azevedo e Lourenço Filho 
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A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1961, em seu art. 105, 
estabeleceu que “os poderes “Públicos instituirão e ampararão serviços e entidades 
que mantenham na zona rural escolas capazes de favorecer a adaptação do homem 
ao meio e o estimulo de vocações profissionais (BRASIL, 2007, p.11). 
 
 
E continua atendendo a interesses internacionais nos anos que seguem como explicar a 
criação de uma comissão Brasileiro-Americana de Educação das Populações Rurais? Se 
analisarmos o período histórico em que isso ocorreu 1945-1964 poderíamos relacionar essa 
iniciativa com dois fatos: o primeiro está relacionado com a intenção de frear as ideias socialistas 
que se tornavam cada vez mais eminentes na America Latina, e a segunda, é claro, à necessidade de 
vendas de insumos químicos, as indústrias agrícolas precisavam não só de mão de obra barata, mas 
pessoas que consumissem seus produtos. 
Só a partir da década de 1930, é que a formação escolar para os povos do campo entram em 
“evidência”, atrelada às modificações no mundo agrário no crescente desenvolvimento industrial e 
do avanço capitalista que intensificou o processo migratório e a necessidade de mão de obra 
qualificada para atender às demandas da industrialização e modernização urbana e rural. 
 
Nesta perspectiva, ocorrem os primeiros programas de escolarização, sob 
responsabilidade do poder público, com o intuito de reverter o quadro de 
analfabetismo, fixar o homem no campo, atender às exigências de qualificação da 
força de trabalho e adequar a classe trabalhadora rural à ordem capitalista de 
produção industrial. . (MOREIRA DE SOUZA, apud CALAZANS, 1993:18-19) 
 
 
Não podemos deixar de citar que em meio a esse avanço capitalista no campo, existiram 
mobilizações dos trabalhadores, estes não ficaram inertes assistindo de camarote as desventuras que 
lhes eram impostas, temos exemplos como as Ligas Camponesas, nas ULTABs, o Movimento de 
Educação de Base (MEB) da CNBB, os Centros Populares de Cultura (CPC) da UNE e o 
Movimento de Cultura Popular (MCP), coordenado por Paulo Freire, são experiências que 
alavancaram o processo de resistência às imposições capitalistas, seja na luta pela terra ou no campo 
da educação. Mesmo tendo sido perseguidas e reprimidas pela ditadura Militar (1964-1985), 
posteriormente tiveram forte influência nos movimentos de construção da educação nos 
movimentos sociais, como o MST e, posteriormente, na construção conceitual da educação do 
campo. 
E é com essa base histórica, de contradições, que surge a Educação do Campo, das 
necessidades vivenciadas pela classe trabalhadora do campo organizada nos movimentos sociais do 
campo que em suas trajetórias demarcam uma concepção de sociedade, desenvolvimento rural, 
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educação e campo, contrapondo a concepção hegemônica que vê o campo como atrasado, como um 
simples produtor de mercadoria. 
A Educação do Campo nasce no contexto das lutas dos movimentos sociais do campo, fruto 
da contradição da organização da sociedade, que para se manter, exclui e explora a classe 
trabalhadora, o debate acerca da Educação do campo ganhou nesses últimos anos destaque no 
cenário nacional, e merece de fato ser levado em conta se analisado do ponto de vista da sua 
construção histórica e dos sujeitos que desencadearam esse processo. Em termos de datas e marco 
“oficiais” a Educação do Campo nasce em julho de 1997, quando é realizado o Encontro Nacional 
de Educadores e Educadoras da Reforma Agrária (I ENERA), é importante ressaltar que embora 
tenha tido como protagonistas os povos do campo, em especial, do Movimento dos Trabalhadores 
Rurais Sem Terra (MST), esse encontro contou com a parceria da Universidade de Brasília (UnB), 
o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), a Organização das Nações Unidas para 
Educação, Ciência e Cultura(UNESCO) e a Conferência Nacional de Bispos do Brasil (CNBB). O 
destaque para as parcerias está no fato de numa luta histórica organismos internacionais como 
UNICEF e UNESCO, organismos estes a serviço dos interesses do capital, agora parceiros de uma 
luta daqueles historicamente excluídos e marginalizados. Estes organismos internacionais estarão 
presentes nos demais Encontros Seminários que discutirão a Educação do Campo que sob o 
discurso de colaborar com os países pobres para o seu desenvolvimento impõe suas políticas por 
meio de pacotes e metas que indicarão o nível de desenvolvimento para futuros investimentos neste 
país (SILVA, 2010). 
Essa observação não anula a importância dos últimos acontecimentos a respeito da Educação 
do Campo no Brasil, mas, alerta para que enquanto classe analisemos o real interesse desses 
organismos internacionais em ações como Educação do Campo. 
Diante da importância desse encontro, os organizadores atentaram para a necessidade de dar 
continuidade ao debate, agora para construir uma proposta de Educação voltada para os povos do 
campo, atendendo suas especificidades, em 1998, foi realizada então a I Conferencia Nacional por 
uma educação Básica do Campo, tendo como tarefa inicial compreender que tipo de educação está 
sendo oferecida para os povos do campo tendo como desafio “perceber qual educação está sendo 
oferecida ao meio rural e que concepção de educação está presente nessa oferta” (KOLLING; 
NÉRI; MOLINA, 1999, p. 23). Nesse evento se consolida a “construção de uma proposta de 
educação que levasse em consideração a realidade do campo e que buscasse lutar por educação 
básica para o campo e colocar a sua importância para garantias de direitos básicos” (ALVES, 2012). 
A proposta educacional do MST e a construção da Educação do Campo 
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A aprovação das Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo 
(Parecer n. 36/2001 e Resolução n. 1/2002 do Conselho Nacional de Educação) permitiu novas 
iniciativas governamentais e de instituições de ensino acerca do tema. Cursos como Licenciaturas e 
pós-graduações em educação do Campo, programas de financiamentos dentre outros surgem nesse 
cenário como algo inédito, e de fato é. Num país onde o campo passou e passa por um processo 
histórico de negação e de exclusão, garantir no mínimo, acesso a escola para crianças, jovens e 
adultos camponeses, não pode ser considerado algo irrelevante. Se somarmos aí o fato de que o que 
hoje se configura enquanto lei, é fruto das lutas dos próprios camponeses e camponesas organizados 
em Movimentos Sociais do Campo, a relevância se torna ainda maior. 
De acordo com Alves (2012) a última conquista em termos de políticas públicas é o Programa 
Nacional de Educação do Campo – PRONACAMPO, o objetivo é formar agricultores em 
universidades e em cursos técnicos para que apliquem os conhecimentos adquiridos em ações que 
elevam a produtividade nas pequenas propriedades e garantir a distribuição de renda. O programa 
atenderá escolas rurais e quilombolas. 
Pela primeira vez, na história, pode–se dizer que existe uma possibilidade de inserir no 
cenário das políticas educacionais brasileiras, a questão da Educação do campo, num movimento 
nascido da luta social, especificamente da luta social do e no campo. 
 
MST: ENTRE TENSÕES E CONTRADIÇÕES DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO DO 
CAMPO 
 
O MST pautou desde o início a luta pelo acesso à escola, e construiu uma proposta de 
Educação que tem como objetivo romper com a atual lógica educacional capitalista, no entanto, 
esbarra nas contradições da realidade concreta – as escolas que conquistam são financiadas e 
organizadas pelo Estado. Mesmo em meio a essas contradições, essa Pedagogia tem uma 
importância histórica no processo de luta do movimento. 
No ano de 2004, o MST fez 20 anos, e o Setor de Educação elaborou o Boletim da Educação 
nº 09 – Educação no MST – Balanço dos 20 anos. Muitas reflexões foram feitas e sistematizadas 
nessa obra, os avanços do movimento na educação, os entraves e limites, os desafios, dentre esses 
desafios estava o de ampliar a luta por educação, envolvendo outras comunidades e movimentos 
sociais do campo, e isso ocorre por dois motivos centrais, primeiro o MST parte do entendimento 
que “os sem terra não são os únicos excluídos da escola, e ainda para conseguir escolas de educação 
fundamental completa era preciso uma articulação maior com outras comunidades do campo, 
A proposta educacional do MST e a construção da Educação do Campo 
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porque isso representaria uma pressão maior” (MST, 2004. P. 18). É também nesse período que o 
MST destaca a importância da luta pela educação no e do campo, e a importância das alianças bem 
como a firmeza em garantirem-se enquanto sujeitos históricos da construção dessa proposta 
O MST em 2004, já percebia pela experiência que acumulara no embate contra o Estado 
Burguês que essa não seria uma tarefa fácil, e que mesmo reivindicando direitos, o Estado 
articularia em torno dos seus interesses. Em meio às conquistas, forjadas pela luta, os movimentos 
que defendem a Educação do Campo enquanto instrumento de formação e emancipação, contrapõe 
o que o Estado tem colocado como propostas de educação, isso demonstra que da forma como está 
concebida a Educação do Campo, do ponto de vista das garantias legais, em especial no âmbito das 
políticas e programas e a forma como esses são conduzidos e por quem são conduzidos não só tem 
sido alvo das críticas e indignação dos integrantes desses movimentos e entidades, como tem sido 
pauta dos encontros e reuniões que debatem a Educação do Campo, como foi o caso do último 
Fórum de Educação do Campo ocorrido em Brasília, de 15 a 17 de agosto desse ano de 2012, tendo 
como documento final um manifesto, que dentre outras coisas denuncia as manobras do Estado para 
manter sob sua tutela o controle. 
Em estudos anteriores, atentamos para a importância de construir uma proposta de educação 
da e para a classe trabalhadora, e nessa perspectiva, vemos as conquistas da Educação do Campo 
como importantes e de certa forma cruciais para o quesito acesso, mas sabemos dos limites do que 
hoje se configura enquanto política de governo para educação do campo, bem como as contradições 
entre o que defendem os movimentos sociais e o que de fato ocorre. 
 
A grande indagação diante desse avanço no campo das conquistas é como o debate 
sobre Educação do Campo configurado hoje enquanto política de Estado pode 
ajudar na conquista da emancipação dos povos do Campo? O Coletivo Nacional de 
Educação do MST ao fazer o Balanço dos 20 anos da Educação no movimento já 
se atentava para o fato de que é imprescindível relacionar a luta pela Educação do 
campo aos processos de formação e transformação. É urgente e necessária a 
construção um projeto de educação voltada para os interesses da classe 
trabalhadora, uma educação que tenha como objetivo contrapor toda essa lógica da 
destruição em nome desse falso desenvolvimento, que não se contenha com 
pequenas reformas ou adaptações, mas que se proponha ir além, ajudando a 
construir uma nova sociedade de homens e mulheres verdadeiramente livres 
(SILVA, 2012, p.6). 
 
 
A proposta educativa do MST apresenta a necessidade de lutar pela transformação social e a 
importância de associar a educação a esse processo de transformação, e é nos Princípios Filosóficos 
da Educação que podemos observar isso mais claramente, em específico no primeiro princípioque 
traz a “educação para a transformação social”. 
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Algumas experiências de Movimentos Sociais, especificamente do MST trazem à tona 
algumas possibilidades de propostas de educação que apontam para a construção de uma nova 
realidade. Para o MST o processo educativo não pode se encerrar nas quatro paredes da escola e 
nem se resumir a ela, e por esse motivo considera os vários momentos e atividades desenvolvidas 
pelo movimento como educativos. 
Nesses debates sobre escola e educação, está claro que não basta permitir o acesso à escola, e 
ainda, que a Educação do Campo não deve se desvincular do projeto histórico da classe 
trabalhadora, pautando-se em referências teóricas que apontem a superação do atual modo de 
produção. 
E é esse caráter de educação de classe que as propostas de educação do MST e da Educação 
do campo devem ter, pensando para além das reivindicações imediatas, de acesso ao direito, da 
escola enquanto território “do campo” (BOGO, 2010). 
 
O instrumento organizativo deveria ser o portador da consciência da classe que 
define o perfil do sujeito individual e coletivo que deve preparar para alcançar suas 
finalidades estratégicas; estas por sua vez, não se alcançam fragmentadamente por 
setores sociais. Significa dizer que, não poderá haver “uma escola do campo” com 
boa educação, se este processo não estiver inserido na perspectiva de um processo 
de mudanças mais amplas, por isto, falar em “sujeitos coletivos” ou em “educação 
emancipadora”, sem um projeto de mudanças, é uma grande ingenuidade (BOGO, 
2010). 
 
 
O processo de transformação social exige sujeitos conscientes, que possam na prática agir de 
forma coerente, para tanto precisam conhecer profundamente a realidade em que estão inseridos, 
para poder transformá-la. Dominar as técnicas, deter os conhecimentos, é nesse processo de luta, 
instrumento fundamental. Nesse sentido, os povos que se encontram engajados num processo de 
luta, construindo novos valores estão um passo à frente, e a Educação do Campo, se utilizada para 
além do que propõe as ações governamentais, evitando assim que seja definida por esses 
organismos e não contribua para a classe trabalhadora para seu processo de emancipação, como 
alerta Vendramini 
 
A luta por uma educação do campo corre o risco de ficar atrelada ao âmbito do 
Estado e das políticas públicas, perdendo a dimensão fundamental da educação 
como estratégia de interiorização de valores contrapostos à lógica individualista, 
liberal, competitiva, funcional que nos conforma e que cria um consenso 
generalizado em torno do consumo. (VENDRAMINI, s/d, p. 5) 
 
 
A proposta educacional do MST e a construção da Educação do Campo 
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Não se pode perder de vista o fato de que a educação sozinha não fará a transformação social, 
ela tem um papel fundamental nesse processo como reflete MÉSZÁROS (2005, p. 32) “A 
transformação social emancipadora radical requerida é inconcebível sem uma concreta e ativa 
contribuição da educação no seu sentido amplo”. E é nesse sentido que se faz necessário relacionar 
educação e produção do viver, vendo o processo educativo como elemento de construção desse 
novo jeito de viver e de produzir, novas relações entre homem e natureza e entre os seres humanos, 
(SILVA, 2010) uma educação que ajude a desconstruir essa lógica do individualismo e da 
competitividade impregnada em nós pelos valores dessa sociedade tão desumana. 
 
REFERÊNCIAS 
 
ALVES, Felipe Silva. O papel das lutas de massa na organização e Formação humana dos 
trabalhadores Sem Terra. Monografia de final do curso Pedagogia da Terra, Universidade do 
Estado da Bahia, Campus IX, Teixeira de Freitas BA, 2010. 
ARAUJO, M. N. R. As contradições e as possibilidades de construção de uma educação 
emancipatória no contexto do MST. Tese de doutorado (UFBA), 2007. 
ANTUNES, Ricardo (org.). A dialética do Trabalho – São Paulo: Expressão Popular, 2004. 
BOGO, Ademar. A escola do campo em busca do campo para ser escola, 2011. Mimeo. 
CALAZANS, Maria Julieta Costa. Para compreender a educação do Estado no Meio Rural: 
traços de uma trajetória. In: THERRIEN, Jaques, DAMASCENO, Maria Nobre (orgs) Educação 
e escola no Campo, Papirus, 1993. 
CALDART, Roseli Salete (org.) Caminhos para a transformação da escola: reflexões desde 
práticas da licenciatura em educação do campo. 1ª edição. São Paulo, Expressão popular, 2010. 
DALMAGRO. Sandra. A escola no contexto das lutas do MST. Tese (Doutorado em Educação), 
Florianópolis, SC: UFSC, 2010 
 
KOLLING, Edgar J., Irmão Nery, MOLINA, Mônica C. (org.). Por uma Educação Básica do 
Campo – A educação Básica e o movimento social do campo, Brasília: Articulação por uma 
Educação do Campo, 1999. 
MÉSZÁROS, István. A Educação para Além do Capital. São Paulo: Boitempo, 2005. 
MST. Boletim da Educação nº 09, Educação no MST Balanço dos 20 anos, 2004. 
______. Dossiê MST Escola, ITERRA, 2005. 
A proposta educacional do MST e a construção da Educação do Campo 
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SILVA, Alessandra Almeida. A relação trabalho educação na Proposta Pedagógica do MST. 
Monografia de final de curso Pedagogia da Terra. Teixeira de Freitas BA: Universidade do 
Estado da Bahia, Campus IX, 2010. 
VENDRAMINI, Célia Regina; MACHADO, Ilma Ferreira, (Org.). Escola e Movimento Social: 
experiências em curso no campo brasileiro. 1ª edição. São Paulo, Expressão Popular, 2011. 
_______. Educação e trabalho: reflexões em torno dos movimentos sociais do Campo. Cad. 
Cedes, Campinas, vol. 27, n. 72, p. 121-135, maio/ago, 2007. Disponível em 
http://www.cedes.unicamp.br . Acesso em: 17/10/2009.

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