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RESPONSABILIDADE DO ESTADO Sumário: 12.1 Definição e desdobramentos: 12.1.1 Dano certo; 12.1.2 Dano especial; 12.1.3 Dano anormal; 12.1.4 Agentes públicos; 12.1.5 Atuação na qualidade de agente público – 12.2 Evolução histórica: 12.2.1 Irresponsabilidade; 12.2.2 Responsabilidade subjetiva; 12.2.3 Responsabilidade objetiva – 12.3 Responsabilidade do Estado no Brasil: 12.3.1 Evolução histórica; 12.3.2 Perfil atual – 12.4 Pontos polêmicos: 12.4.1 Denunciação da lide; 12.4.2 Ação direta contra o agente; 12.4.3 Atos legislativos e judiciais; 12.4.4 Responsabilidade por dano ambiental e nuclear; 12.4.5 Responsabilidade por danos resultantes de atentados terroristas; 12.4.6 Prescrição; 12.4.7 Notários – 12.5 Questões correlatas. 12.1 DEFINIÇÃO E DESDOBRAMENTOS De início, cumpre estabelecer uma definição desse instituto, o que se faz nos termos seguintes: trata-se de uma obrigação atribuída ao Poder Público de ressarcir os danos causados a terceiros, pelos seus agentes, quando no exercício de suas atribuições. Da definição oferecida, merecem destaque alguns pontos, a começar pela obrigação conferida ao Poder Público de ressarcir danos causados a terceiros. Com efeito, oportuno destacar que o dano indenizável será somente aquele que apresentar as seguintes características: certo, especial e anormal. 12.1.1 Dano certo É o dano real, existente, não podendo o Estado ser acionado em razão de danos virtuais, presumidos; aqueles que podem vir a acontecer ainda que sejam fortes os indícios nesse sentido. Assim, se uma determinada pessoa vem experimentando prejuízos por diversos anos em seu imóvel por força de enchentes, sem que o Poder Público tenha esboçado, ao menos, qualquer providência, não poderá ela ingressar com medida judicial, em caráter preventivo, com base em suposições acerca do que poderá vir a acontecer no ano seguinte. Estes danos concretos podem ser materiais ou morais, abrindo-se, inclusive, a possibilidade de cumulação dos dois em uma mesma ação, matéria esta objeto da Súmula 37 do STJ. Confira-se: “STJ Súmula nº 37 – 12/03/1992 – DJ 17.03.1992 Indenizações – Danos – Material e Moral – Mesmo Fato – Cumulação São cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundos do mesmo fato”. 12.1.2 Dano especial Dano especial é o que se contrapõe à noção de dano geral, vale dizer, aquele que atinge a coletividade como um todo, devendo, pois, ser individualizado. 12.1.3 Dano anormal É aquele que ultrapassa os problemas, as dificuldades da vida comum em sociedade, causando esses prejuízos atípicos. 12.1.4 Agentes públicos Seguindo pela definição proposta, tem-se que o dano que apresentar essas características só será indenizável pelo Estado quando provocado por agentes públicos. A utilização dessa expressão, vale dizer, agentes públicos, não ocorreu de maneira aleatória, mas, ao contrário, propositalmente, visto que abrange todas as pessoas que estão dentro da estrutura da Administração Pública. Com efeito, essa expressão abarca os chamados agentes políticos (aqueles que formam a vontade superior do Estado, sem com ele manter uma relação profissional), os servidores públicos, expressão que acaba por englobar os funcionários públicos (os que titularizam cargos), os empregados públicos (os que titularizam empregos públicos) e os contratados em caráter temporário com base na previsão contida no art. 37, IX, da CF. De igual sorte, acaba por envolver também os chamados particulares em colaboração com o Estado, que, embora não estejam dentro da sua estrutura, acabam integrando o conceito em razão da prestação temporária de serviços públicos. A importância do conhecimento dessas expressões, “agente público”, “servidor público”, “funcionário público”, resulta da abrangência de cada uma delas, não sendo outra razão pela qual a Constituição Federal, pela primeira vez, lançou mão da expressão “agentes públicos”, a teor do disposto no art. 37, § 6.º, que será melhor analisado em seguida. Nesse sentido, importante destacar, desde logo, que ao utilizar essa expressão, a Constituição teve por objetivo privilegiar a parte mais fraca dessa relação jurídica, vale dizer, a vítima, passando a mensagem de que se tiver ela sofrido um dano causado por qualquer pessoa que se encontre dentro da estrutura da Administração, poderá ingressar em juízo com ação de indenização em face do Estado. 12.1.5 Atuação na qualidade de agente público Por derradeiro, importante observar que o Estado só poderá ser acionado para ressarcimento dos danos que apresentarem as características mencionadas, desde que provocados por agentes públicos, mas somente quando no exercício das suas atribuições. Em outras palavras, inviável o pedido de indenização ante o Estado se o agente público causador do prejuízo a terceiros estiver agindo na condição de um simples particular, fora, portanto, do exercício das suas atribuições. Cita-se, a título de exemplo, a situação em que uma pessoa é atropelada por um veículo dirigido por um agente público durante um final de semana, sem que ele estivesse no exercício de suas atribuições. Nesse particular, oportuno registrar ser de importância secundária encontrar-se o agente público de folga, por ocasião do dano causado a terceiros, desde que o tenha causado lançando mão das prerrogativas do seu cargo ou, em outras palavras, agindo nesta qualidade, a teor do disposto no art. 37, § 6.º, da CF. No mesmo sentido, se um policial convocado para fazer a segurança de um evento esportivo, se envolve em briga com um torcedor, o Estado poderá ser acionado em juízo por ele. Ao contrário, se foi assistir ao evento esportivo na qualidade de torcedor e se envolveu em briga com outro, neste caso o Estado não poderá ser acionado em juízo. Desenvolvidos os itens necessários em vista da definição proposta, cabe agora buscar resposta para a pergunta mais importante a ser feita neste capítulo, vale dizer, qual o modelo de responsabilidade do Estado consagrado em nosso ordenamento jurídico? Para tanto, partiremos de início para breves notícias envolvendo as fases de evolução desse instituto no âmbito mundial, para depois procurarmos verificar como ocorreu essa evolução aqui no Brasil e como ela está hoje em nossa Constituição. 12.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA 12.2.1 Irresponsabilidade A primeira fase de evolução do instituto foi denominada fase da “irresponsabilidade do Estado”, em que o Poder Público não respondia por qualquer tipo de prejuízos causados a terceiros. Essa fase, que experimentou seu auge na época do Absolutismo no continente europeu, está bem representada pela seguinte frase, acolhida por nossa melhor doutrina: “The King can do no wrong” (O Rei não pode errar jamais). 12.2.2 Responsabilidade subjetiva A segunda fase de evolução dessa teoria é a chamada fase da “responsabilidade subjetiva”, em que o Estado, que até então não respondia em hipótese alguma pelos prejuízos causados a terceiros, passa a responder com base no conceito de culpa. Essa culpa, por sua vez, poderia recair sobre um agente ou, então, se caracterizar como anônima naquelas situações em que não se conseguisse vislumbrar alguém especificamente responsável pela lesão causada a terceiros. Por seu turno, se anônima a culpa, poderia apresentar três variantes, na forma a seguir descrita: • o serviço não funcionou; • o serviço funcionou tardiamente; • o serviço funcionou de maneira defeituosa. Esta etapa de evolução também é caracterizada por uma frase retirada de decisões proferidas de forma reiterada pelo Conselho de Estado na França, vertida nos seguintes termos: “faute du service”, traduzida por culpa do serviço. Em uma primeira aproximação, verifica-se que esta teoria, que leva em consideração os danos causados por um serviço, se apresenta, como visto, quando ele foi prestado ou foi executado de forma defeituosa, causando danos. Dentro desse contexto, pode-se ampliar esta situação, concluindo que essa expressão se aplica para as hipóteses resultantes de omissões praticadas pela Administração, outra não sendoa razão pela qual parte da doutrina entende que, nessa situação, a responsabilidade do Estado poderia ser subjetiva, como se verá melhor mais adiante. 12.2.3 Responsabilidade objetiva A terceira e última fase de evolução desse instituto é denominada “responsabilidade objetiva”, em que o Estado, que anteriormente respondia com base no conceito de culpa, continua a responder, só que agora com base no conceito de “nexo de causalidade”. O denominado nexo causal representa a relação de causa e efeito existente entre o fato ocorrido e as consequências dele resultantes. Assim, sempre que se verificar uma estreita relação entre o fato ocorrido e as consequências por ele provocadas, torna-se possível o acionamento do Estado para a recomposição dos prejuízos, sem a necessidade de comprovação de culpa ou dolo para a caracterização de sua responsabilidade. Surgem como exemplos a perda de um carro levado por uma forte inundação, a perda de uma casa em razão de enchentes, a perda de um parente em razão de uma transfusão de sangue mal realizada em um hospital público, a perda de um familiar durante uma rebelião ou mesmo como resultado de uma briga entre detentos. De comum entre todas essas situações mencionadas está o fato de que elas apresentam uma íntima relação entre as circunstâncias descritas e os prejuízos delas resultantes, caracterizando-se o que se convencionou chamar de nexo causal. Aliás, outra coisa não representa o nexo causal senão a inversão do ônus da prova, que, como regra geral, cabe a quem alega, mas que no caso fica a cargo da própria Administração Pública. Essa modalidade de responsabilidade pode apresentar-se sob duas variantes, vale dizer, a do risco integral e a do risco administrativo, ambas apresentando como pressuposto a caracterização do nexo de causalidade. 12.2.3.1 Risco integral Entende-se por risco integral aquela situação em que o Estado responde por qualquer prejuízo causado a terceiros, ainda que não tenha sido o responsável por ele, o que faz com que, uma vez acionado, não possa invocar em sua defesa as chamadas “excludentes” ou “atenuantes” de responsabilidade. Isso porque responde por qualquer prejuízo causado a terceiros, pouco importando saber se foram eles originários de eventos provocados pela natureza, pelo homem ou mesmo se resultado de culpa exclusiva de quem o experimentou. De outra forma, as excludentes ou atenuantes de responsabilidade são aquelas situações que, como o próprio nome diz, afastam por completo a responsabilidade do Estado, podendo também atenuá-la, conforme o caso. Surgem como situações típicas caracterizadoras dessas excludentes ou atenuantes, como visto, aquelas decorrentes de eventos provocados pela natureza ou pelo homem ou por culpa exclusiva da vítima. 12.2.3.2 Risco administrativo A modalidade de risco administrativo é aquela em que o Estado só responde por prejuízos que tiver ocasionado a terceiros, podendo ter sua responsabilidade afastada nas hipóteses em que o dano foi causado por eventos da natureza, pelo homem ou por culpa exclusiva da vítima. Dizendo de maneira diferente, naqueles países que adotarem a responsabilidade objetiva na modalidade de risco administrativo, o Estado, uma vez acionado, poderá invocar em sua defesa as chamadas excludentes ou atenuantes de responsabilidade. Compreender qual o perfil da responsabilidade presente em cada Estado assume enorme importância, na medida em que permite a compreensão acerca dos requisitos a serem preenchidos para que o Estado possa ser acionado. A título de exemplo, naqueles países que adotam o risco administrativo, o Estado pode procurar afastar por completo sua responsabilidade devido a prejuízos causados por um furacão, uma tempestade de enormes proporções, um ato de vandalismo ocasionado pelo homem, o que não se verifica naqueles Estados em que o risco é integral. Dentro desse contexto, pode-se mencionar a hipótese envolvendo transfusão de sangue feita em vários hospitais públicos e particulares, inexistindo prova de quando, quem ou como ocorreu a contaminação, implicando em exclusão de responsabilidade. Nesse sentido: – TJSP, 9.ª Câm. de Direito Público, ACív 093.719-5/5-00/SP, rel. Des. Yoshiaki Ichihara, v.u., j. 07.02.2001. Verificadas as principais fases de evolução do instituto da responsabilidade do Estado, cabe averiguar agora como se desenvolveu ele em nosso País e como se apresenta agora regulamentado em nossa Constituição. 12.3 RESPONSABILIDADE DO ESTADO NO BRASIL 12.3.1 Evolução histórica A CF/1937, em seu art. 158, assim regulamentava o tema: “Art. 158. Os funcionários públicos são responsáveis solidariamente com a Fazenda nacional, estadual ou municipal por quaisquer prejuízos decorrentes de negligência, omissão ou abuso no exercício dos seus cargos”. Percebe-se da redação oferecida pela CF/1937 que a intenção do constituinte foi a de estabelecer uma responsabilidade solidária entre os funcionários públicos e a Administração, desde que o prejuízo tivesse sido ocasionado por estes quando no exercício de suas atribuições. Cogitando-se de solidariedade, isto implica na necessidade da Fazenda Pública e do funcionário causador do prejuízo responder com base no mesmo fundamento. Nesse sentido, apontando a Constituição para prejuízos decorrentes de negligência, omissão ou abuso, conclui-se que, sob a égide da Constituição de 1937, a responsabilidade do Estado e do funcionário era subjetiva. Outrossim, não se visualiza na redação do dispositivo constitucional reproduzido, nenhuma referência à propositura de uma ação regressiva por parte da Fazenda Pública resultante de condenação imposta pelo Judiciário. Esta ausência de referência se apresenta lógica, tendo em vista a previsão de solidariedade, o que torna desnecessária a propositura de ação de regresso contra o funcionário responsável. Percebe-se, pois, que o perfil apresentado por esta Constituição se revela totalmente divorciado daquele apresentado pela Constituição de 1988, ora em vigor, demandando, assim, uma análise das alterações produzidas nas Constituições posteriores. A CF/1946, em seu art. 194, trazia a seguinte redação: “Art. 194. As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis pelos danos que os seus funcionários, nessa qualidade, causem a terceiros. Parágrafo único. Caber-lhes-á ação regressiva contra os funcionários causadores do dano, quando tiver havido culpa destes”. A redação do Texto Constitucional de 1946 aponta para uma diretriz diferenciada em relação à anterior analisada, porque desaparece o instituto da solidariedade, surgindo em seu lugar a possibilidade de o Estado, representado aqui pelas pessoas jurídicas de Direito Público interno, ingressar com ação regressiva contra os funcionários causadores do dano, desde que caracterizada a sua culpa e, por óbvio, desde que tenham causado prejuízo no exercício das suas atribuições. Trata-se, como se vê, de uma alteração significativa na medida em que acaba por impedir o que antes se revelava possível, ou seja, a propositura de uma ação de responsabilidade contra o Estado e o funcionário responsável pelo dano em caráter solidário. Portanto, com a promulgação da Constituição de 1946, desaparecendo a solidariedade entre a Fazenda Pública e o funcionário, resulta nítida a conclusão segundo a qual o fundamento para a responsabilização de um e de outro passa a não ser mais o mesmo. Sendo assim, a partir dessa Constituição, inaugura-se, no Brasil, a etapa da responsabilidade objetiva do Estado e a da responsabilidade subjetiva do funcionário, apurada em sede de ação regressiva. Claro que para que se cogite da propositura dessa ação regressiva pelas pessoas jurídicas de Direito Público interno, o pressuposto é que tenham sido elas condenadas na ação contra elas proposta pela vítima. Essa diretriz, como se poderá observar, foi mantida pelas Constituições posteriores, a começar pela de 1967, que tratou do tema em seu art. 105, cuja redação a seguir se reproduz: “Art. 105. As pessoas jurídicas dedireito público respondem pelos danos que os seus funcionários, nessa qualidade, causem a terceiros. Parágrafo único. Caberá ação regressiva contra o funcionário responsável, nos casos de culpa ou dolo”. Como se observa, a disciplina estabelecida em relação a esse tema pela CF/1967 em praticamente nada diverge daquela inaugurada pela de 1946, exceção feita à inclusão, entre os requisitos para a propositura de ação regressiva contra o funcionário, do dolo, visto que, até então, somente se verificava em casos de caracterização de culpa. Por seu turno, a EC 1/1969 disciplinou o tema em seu art. 107, da seguinte forma: “Art. 107. As pessoas jurídicas de direito público responderão pelos danos que seus funcionários, nessa qualidade, causarem a terceiros. Parágrafo único. Caberá ação regressiva contra o funcionário responsável, nos casos de culpa ou dolo”. Fácil de se observar que a redação oferecida por essa Constituição em nada difere daquela verificada na CF/1967, mantendo-se, pois, a diretriz estabelecida pela CF/1946, segundo a qual a medida judicial buscando a reparação de danos deveria ser oferecida contra as pessoas jurídicas de Direito Público, que, uma vez condenadas, poderiam ingressar com ação de regresso contra o funcionário responsável nas hipóteses de culpa ou dolo. Passado em revista o processo de evolução histórica do instituto em nosso País, cumpre agora averiguar qual o perfil por ele assumido na Constituição em vigor, o que se fará a seguir. 12.3.2 Perfil atual Atualmente, a matéria está disciplinada no art. 37, § 6.º, da CF, cuja redação a seguir se reproduz: “Art. 37. […] […] § 6.º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”. A redação oferecida pelo Texto Constitucional em vigor, não obstante manter a estrutura anteriormente estabelecida a partir da CF/1946, acabou por trazer importantes inovações. Assim, em primeiro lugar, começa por demonstrar quais as pessoas que responderão pelos danos ocasionados a terceiros, vale dizer, aquelas que poderão ser acionadas: as pessoas jurídicas de Direito Público e as de Direito Privado prestadoras de serviços públicos. Observa-se, nesse particular, um acréscimo em relação às Constituições anteriores, que só admitiam essa possibilidade para as pessoas jurídicas de Direito Público. Ao assim proceder, a atual Constituição alargou as possibilidades em relação àqueles que podem assumir a responsabilidade pelos prejuízos causados a terceiros, contemplando, também, as pessoas jurídicas de Direito Privado, desde que sejam elas prestadoras de serviços públicos. Percebe-se, portanto, que o critério adotado pelo Texto Constitucional para estabelecer quais são as pessoas que poderão ser acionadas pelos prejuízos causados a terceiros, na forma do disposto no § 6.º do art. 37, não foi, em absoluto, o da sua localização, pouco importando estarem elas dentro ou fora da estrutura da Administração Pública. Ao contrário, o critério prestigiado foi o da natureza da atividade por elas desenvolvida. Responderão na forma desse dispositivo constitucional somente aquelas que forem prestadoras de serviço público. Nunca será demasiado lembrar que as pessoas jurídicas de Direito Público somente poderão ser criadas para a execução de serviços públicos, respondendo sempre na forma do dispositivo em análise em razão dos prejuízos causados a terceiros. Essa circunstância, entretanto, não se verifica com as pessoas jurídicas de Direito Privado, uma vez que, como também poderão ser criadas para a exploração de atividade econômica, só responderão pelos prejuízos causados a terceiros, na forma do § 6.º do art. 37, se forem prestadoras de serviços públicos. Essa conclusão assume importância enorme, pois passa a permitir que os particulares os quais estejam executando serviços públicos, na qualidade de concessionários, permissionários ou autorizatários, possam ser acionados pelos prejuízos causados na forma do dispositivo. Neste particular, oportuno registrar decisão de extrema importância proferida por nossa Corte Suprema no Recurso Extraordinário 591.874, mudando sua orientação anterior, para reconhecer a responsabilidade objetiva de concessionária de serviços públicos em relação aos danos causados a não usuários.Nesta decisão, o STF reconheceu também que, em nome do princípio da isonomia e em razão da redação dos arts. 37, § 6.º, da Constituição Federal, e 25 da Lei 8.987/1995, não se pode diferenciar o usuário do não usuário do serviço, para efeito de responsabilização do causador do dano. Em outras palavras, assume caráter secundário para efeito de configuração da responsabilidade objetiva quem causou o dano (se pessoa integrante ou não da Administração), bem como quem sofreu o dano (se usuário ou não do serviço). Assume relevo, sim, saber qual a atividade desenvolvida quando da configuração do dano. Com efeito, em se tratando de prestação de serviços públicos, a responsabilidade será sempre objetiva, quer estivesse à frente da execução a Administração Pública ou tenha ela sido transferida para particulares (concessionários, permissionários). A referida decisão da Corte Suprema foi tomada quando da análise de recurso interposto por uma empresa de transporte coletivo, condenada em instâncias inferiores pelo atropelamento de um ciclista que veio a falecer e teve sua repercussão geral reconhecida por unanimidade. Pela importância da nova orientação estabelecida em agosto de 2009, oportuna a transcrição da ementa do referido julgado: “Constitucional. Responsabilidade do Estado. Art. 37, § 6.º, da Constituição. Pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público. Concessionário ou permissionário do serviço de transporte coletivo. Responsabilidade objetiva em relação a terceiros não usuários do serviço. Recurso desprovido. I – A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público é objetiva relativamente a terceiros usuários e não usuários do serviço, segundo decorre do art. 37, § 6.º, da Constituição Federal. II – A inequívoca presença do nexo de causalidade entre o ato administrativo e o dano causado ao terceiro não usuário do serviço público é condição suficiente para estabelecer a responsabilidade objetiva da pessoa jurídica de direito privado. III – Recurso extraordinário desprovido” (RE 591.874, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Tribunal Pleno, j. 26.08.2009, Repercussão Geral, DJ 18.12.2009, Ementário vol. 02387-10, pp. 01820). Dentro desse contexto, para uma melhor visualização das diretrizes estabelecidas no art. 37, § 6.º, da Constituição, oportuna a elaboração do seguinte esquema: Da mesma forma, poderíamos concluir que nem todas as pessoas que integram a estrutura da Administração Pública responderão na forma prevista no dispositivo constitucional ora analisado. É o que se verifica, destarte, com as empresas públicas e as sociedades de economia mista criadas para a exploração de atividades econômicas, excluídas que foram do comando constitucional. Aliás, como visto anteriormente, essas pessoas, quando exploradoras de atividade econômica, respondem pelas obrigações civis contraídas com terceiros basicamente pelo mesmo regime previsto para a iniciativa privada, vale dizer, com fulcro nos conceitos de culpa ou dolo, na forma prevista pelo art. 173, § 1.º, II, da CF. Confira-se: “Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei. § 1.º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre: […]II – a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários”. Cumpre observar, outrossim, que a forma de responsabilização de particulares prevista no art. 927 do CC é subjetiva, vale dizer, baseada nos conceitos de culpa e dolo. Nesse sentido ainda, oportuno consignar que no mesmo dispositivo, agora em seu parágrafo único, admite-se, também, a responsabilidade objetiva na forma ali estabelecida. Confira-se: “Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”. Oportuna também a referência ao Código de Defesa do Consumidor, que estabelece a responsabilidade objetiva do fornecedor de serviços, consoante se verifica da redação de seu art. 14: “Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”. De toda sorte, nada obstante as oscilações do legislador, o certo é que a empresa pública e a sociedade de economia mista exploradoras de atividade econômica foram excluídas da regra do art. 37, § 6.º, da CF e responderão pelos danos causados a terceiros da mesma forma que a iniciativa privada, com as variantes verificadas. De início, pela diretriz oferecida pela atual Constituição Federal, as ações visando à recomposição de danos causados pelos agentes públicos, quando, agindo nessa qualidade, deverão ser respondidas pelas pessoas jurídicas de Direito Público e pelas de Direito Privado prestadoras de serviços públicos e não por seus agentes. Essa linha de raciocínio se consolida por meio de regra básica de hermenêutica, segundo a qual o conteúdo de um parágrafo, de um inciso, de uma alínea só poderá ser compreendido em consonância com o do caput do artigo. Nesse sentido, o caput do art. 37 relaciona, entre os princípios que norteiam toda a atividade administrativa, o da impessoalidade, segundo o qual – e este é apenas um de seus desdobramentos – toda a atitude tomada por um agente público tem por objetivo representar a Administração que, por sua vez, representa os interesses da coletividade, questão abordada quando da análise desse princípio nos capítulos iniciais desta obra. Sob esse aspecto, não se cogitaria da possibilidade de propositura de ação judicial diretamente contra o agente responsável pelo ato, não sendo outras as conclusões atingidas pelo constitucionalista José Afonso da Silva (1998, p. 645-651): “O princípio ou regra da impessoalidade da Administração Pública significa que os atos e provimentos administrativos são imputáveis não ao funcionário que os pratica, mas ao órgão ou entidade administrativa em nome do qual age o funcionário. Este é um mero agente da Administração Pública, de sorte que não é ele o autor institucional do ato. Ele é apenas o órgão que formalmente manifesta a vontade estatal. Por conseguinte, o administrado não se confronta com o funcionário X ou Y que expediu o ato, mas com a entidade cuja vontade foi manifestada por ele. É que a ‘primeira regra do estilo administrativo é a objetividade’, que está em estreita relação com a impessoalidade. Logo, as realizações administrativo-governamentais não são do funcionário ou autoridade, mas da entidade pública e em nome de quem as produzira. […] Por isso é que a responsabilidade, para com terceiro, é sempre da Administração, como veremos logo mais”. Mais adiante, o renomado publicista reitera as conclusões atingidas no trecho acima da seguinte forma: “A obrigação de indenizar é da pessoa jurídica a que pertencer o agente. O prejudicado há que mover a ação de indenização contra a Fazenda Pública respectiva ou contra a pessoa jurídica privada prestadora de serviço público, não contra o agente causador do dano. O princípio da impessoalidade vale aqui também (Silva, 1998, p. 645-651)”. Cumpre observar, sem embargo, que essa tese, embora derivada da própria Constituição, não é pacífica em nossa melhor doutrina e jurisprudência. Seguindo pela redação oferecida pelo dispositivo constitucional, vê-se que as pessoas jurídicas ali relacionadas responderão pelos danos que os seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros. A análise do trecho do dispositivo se restringe ao resgate de ideias importantes que foram desenvolvidas no início do capítulo. A primeira delas se refere às características do dano indenizável, vale dizer, certo, especial e anormal, desde que praticado por um agente atuando nessa qualidade. Isso quer dizer, repita-se uma vez mais, que não basta ter sido o dano ocasionado por um agente público, visto que se revela também imprescindível ter ele agido no exercício das suas atribuições. A redação até este ponto desenvolvida bem está a demonstrar que a responsabilidade do Estado em nosso ordenamento jurídico é objetiva, apresentando-se na modalidade de risco administrativo. Em outras palavras, baseia-se ela no conceito de nexo de causalidade, permitindo ao Estado, uma vez acionado pelo terceiro lesado, invocar em sua defesa as chamadas excludentes ou atenuantes de responsabilidade. Sem embargo, oportuna a referência quanto à existência de precedentes jurisprudenciais apontando para a incidência da variante do risco integral, responsabilizando-se o Poder Público por não ter garantido a segurança do cidadão como contrapartida dos impostos já elevados que é obrigado a suportar. Nesse sentido: – TJ/RJ, 17.ª Câm. Civ, ACiv 21505/2000/RJ, rel. Des. Raul Celso Lins e Silva, j. 25.04.2001. Oportuno registrar aqui a existência de divergência doutrinária encabeçada por Celso Antônio Bandeira de Mello, para quem a responsabilidade do Estado no Brasil só será objetiva se o prejuízo causado a terceiros for resultado de um ato praticado por um agente público. Se decorrente de prejuízos causados por força de omissão praticada pelo Poder Público, entende ser a responsabilidade subjetiva, sendo necessária, portanto, a comprovação de culpa. São suas estas palavras: “As afirmações doutrinárias e jurisprudenciais no país, caracterizando genericamente a responsabilidade pública como de natureza objetiva, não distinguem entre comportamentos comissivos e omissivos do Estado. Isto se deve, quanto menos em parte, a que supõem, erroneamente, que é responsabilidade objetiva a responsabilidade por faute du service, ou seja, a que tem lugar quando o serviço não funcionou, funcionou mal, ou funcionou tarde, segundo a fórmula clássica oriunda da sistematização de Paul Duez e acolhida pela jurisprudência administrativa francesa. Em realidade, a faute du service apresenta-se, antes, em geral, como uma ‘forma publicizada de noção de culpa’, para usar a expressão feliz de Francis Paul Benoit. Assim, parece-nos que é preciso distinguir, como ensinou Oswaldo Aranha Bandeira de Mello, entre atos comissivos, nos quais a responsabilidade é objetiva, e atos omissivos, em que a responsabilidade depende de dolo ou culpa, ou seja, do descumprimento de um dever jurídico. Julgamos necessário acrescentar, entretanto, que também haverá responsabilidade objetiva nos casos de guarda de coisas ou pessoas perigosas, o que é demandado pela ideia de risco-proveito, e naqueles outros nos quais, mesmo não sendo o Estado o próprio autor do dano, uma atuação positiva sua concorreu decisivamente para fazê-lo eclodir. Fora daí, o que pode ocorrer são casos de ‘culpa presumida’, em que caiba ao Poder Público o ônus de provar que nela não incidiu. Vale observar que, em despeito das afirmações teóricas da doutrina e jurisprudência brasileiras, na prática, as soluções que apresentam praticamente coincidem com o esquema lógico que consideramos correto,pois as decisões judiciais, embora mencionando responsabilidade objetiva nos casos de dano por comportamento omissivo, estão sempre a fundamentar-se largamente na culpa, por negligência ou imprudência do Poder Público, por deixar de acorrer tempestiva e eficientemente para impedir evento danoso a terceiro (Mello, 1993, p. 140)”. As decisões proferidas por nossos Tribunais, como se disse, longe estão de pacificar o tema, refletindo, ao contrário, as incertezas de nossa melhor doutrina. Nesse sentido: – RDA 137/233; RTJ 55/50; – STF, RE 109.615, j. 28.05.1996, DJU 02.08.1996; – ARE 697802 AGR/CE Rel. Min. Dias Toffoli, 25.09.2012; – RE 691678 AGR/PB Rel. Min. Carmen Lúcia, 11.09.2012; – RE 695887 AGR/PB Rel. Min Luiz Fux, 11.09.2012; – RE 633138 AGR/DF Rel. Min. Luiz Fux, 04.09.2012; – AI 855343 AGR/MG Rel. Min Luiz Fux, 21.08.2012; – RE 603626 AGR/MS Rel. Min. Celso de Mello, 15.05.2012; – RE 677283 AGR/PB Rel. Min. Gilmar Mendes, 27.04.2012; – AI 830461 AGR/PA Rel. Min. Ellen Gracie, 28.06.2011. Dentro desse contexto, oportuna a transcrição de trecho de decisão proferida pelo STF, sintetizando a questão nos seguintes termos: “(…) Teoria do risco administrativo, consagrada em sucessivos documentos constitucionais brasileiros desde a Carta Política de 1946, confere fundamento doutrinário à responsabilidade civil objetiva do Poder Público pelos danos a que os agentes públicos houverem dado causa, por ação ou por omissão. Essa concepção teórica que informa o princípio constitucional da responsabilidade civil objetiva do Poder Público, faz emergir, da mera ocorrência do ato lesivo causado à vítima pelo Estado, o dever de indenizá-la pelo dano pessoal e/ou patrimonial sofrido, independentemente de caracterização de culpa dos agentes estatais ou de demonstração de falta do serviço público (RTJ 55/503, 71/99, 91/377, 99/1155 e 131/417 – (RE 109.615 RJ, Rel. Min. Celso de Mello, Primeira Turma, j. 28.05.1996, Repercussão Geral, DJ 02-08-1996 PP-25785 Ementário vol. 01835-01 pp. 00081)” (grifo nosso). A amplitude atingida por este tema fez com que as decisões proferidas por nossos tribunais fossem as mais variadas. Desta forma, pedimos vênia ao leitor para sistematizá-las conforme a matéria discutida. a) Responsabilidade do Estado em relação aos detentos: – STF, RE 84.072, rel. Min. Cunha Peixoto, j. 19.11.1976, DJU 13.05.1977; – TJSP, ACív 224.506-1, rel. Des. Correa Lima, j. 02.05.1995; – TJSP, ACív 130779-1, rel. Alvaro Lazzarini, j. 05.03.1991; – TJSP, ACív 76.924-5, rel. Des. Sidnei Benetti, j. 23.08.2000; – STF, 2.ª T., RE 372.472/RN, rel. Min. Carlos Velloso, j. 04.11.2003, DJU 28.11.2003. Essas decisões envolvendo morte de detentos que estavam sob a tutela do Estado demonstram a tendência dos nossos Tribunais na adoção da teoria da responsabilidade objetiva com base no nexo de causalidade, admitindo, ademais, a invocação das excludentes ou atenuantes de responsabilidade por força da variante do risco administrativo. Aliás, oportuno registrar que o fundamento para a caracterização desse nexo de causalidade está na redação do art. 5.º, XLIX, que obriga o Estado a zelar pela integridade física e moral dos presos. b) Responsabilidade do Estado em decorrência de atividade policial: – TJRJ, ACív 6.786/00, rel. Des. Raymundo Cardoso, j. 29.08.2000; – TJSP, ACív 192.765-1, rel. Des. Leite Cintra, j. 23.06.1993; – TJRJ, ACív 4.311/97, rel. Des. Martinho Campos, j. 25.05.1999. Essas três decisões consolidam a tendência pela responsabilidade objetiva do Estado na medida em que relevam a um plano secundário a origem dos disparos por arma de fogo, considerando apenas a caracterização do nexo causal. c) Responsabilidade do Estado resultante de caso fortuito / força maior: – TJSP, ACív 219.774-1, rel. Des. Barbosa Pereira, j. 05.08.1994; – TJSP, ACív 97.568-1, rel. Des. Fonseca Tavares, j. 16.08.1989; – TJSP, ACív 64569-5/2, rel. Des. Torres de Carvalho, j. 22.05.2000; – JTJSP 89/202; – RT 275/319; – RT 455/74; – TJSP, 9.ª Câm. de Direito Público, ACív 79.861-5/SP, rel. Des. Rui Cascaldi, v.u., j. 13.09.2000, JTJ 237/69. Essas decisões mostram comportamentos diferentes de nossos Tribunais por força das características diversas apresentadas pelos casos submetidos a sua análise. Com efeito, na primeira delas entendeu-se pela não caracterização de força maior, uma vez que o prejuízo foi ocasionado por queda de árvore em vista do estado de deterioração de suas raízes. Na segunda decisão, a responsabilidade do Estado, em que pese caracterizada por força da sua omissão no trabalho de desassoreamento de rio, foi atenuada em vista das fortes chuvas. Por fim, a terceira decisão caracteriza hipótese excludente de responsabilidade na medida em que atribui, com exclusividade, às fortes chuvas o fato causador do dano. A propósito deste tema, confira-se ainda as seguintes decisões: – TJRS, 9.ª Câm. Cív., ACív 70012194130, rel. Des. Odone Sanguiné, j. 14.09.2005, DJU 27.09.2005; – TJDF, 4.ª T. Cív., ACív 20050150080730, rel. Des. Humberto Adjuto Ulhôa, j. 27.10.2005, DJU 06.12.2005, p. 143; – RJTJSP 28/93. Nestas decisões, com base na variante do risco administrativo, afasta-se a responsabilidade do Estado por força da caracterização da culpa exclusiva da vítima, que deixou de tomar as cautelas devidas para a proteção do seu patrimônio, ou em razão da presença de um índice pluviométrico elevado na região, único responsável pelo dano ocasionado, ou, ainda, por culpa da vítima, ao instalar suas atividades em região sujeita a frequentes inundações. d) Ação regressiva contra o agente causador do dano: Essa questão, disciplinada na parte final da redação do § 6.º do art. 37, não foi incluída até aqui para a determinação do perfil da responsabilidade do Estado, por referir-se a uma relação jurídica totalmente diferente, visto que envolve de um lado o Estado e de outro o agente público, responsável pelo dano causado a terceiros. Por certo, o pressuposto para que o Estado possa se voltar contra o agente responsável pelo dano causado a terceiros é que tenha sido ele condenado na primeira relação jurídica em virtude da ação de indenização contra ele proposta. Preenchido esse pressuposto, uma vez que não faria sentido o Estado voltar-se contra o agente se não houvesse sido condenado na primeira relação jurídica, o agente será responsabilizado, desde que comprovada sua culpa ou dolo. Trata-se, pois, de uma nova relação jurídica que exige, para uma eventual condenação, requisitos totalmente diversos daqueles previstos no momento de se tentar responsabilizar o Estado. Efetivamente, enquanto a responsabilização deste depende da caracterização do nexo causal, a condenação do agente depende, como visto, da caracterização de culpa ou dolo. Sem embargo, cumpre registrar a possibilidade aberta por nossos tribunais da propositura de ação de indenização em face do Estado e do agente. Nesse sentido: – STF, RE 90.071-3, Pleno, recorrente: Sade. Sul Americana de Engenharia S.A., recorrido: Arceu Chaise. Esse acórdão, publicado em 1981 (RT 544/81), já naquele momento refletia a tendência de nossos Tribunais, em particular de nossa Suprema Corte, acolhendo a possibilidade de o agente público ser acionado com a pessoa jurídica, configurando, aliás, hipótese de litisconsórcio facultativo típico. Nesse particular, em vista da importância da qual se reveste o tema ora em discussão, entendemos oportuna a transcrição de um trecho do voto vencedor proferido pelo então relator Min. Cunha Peixoto, nos termos a seguir reproduzidos: “A Constituição, destarte, estatuiu que as pessoas de direito público interno são civilmente responsáveis pelos danos que seus funcionários nessa qualidade causarem a terceiros, permitindo-lhe, porém, voltar-se contra o autor do dano, quando este agiu com culpa ou dolo. Abandonou o princípio da solidariedade para adotar o da ação regressiva. 4. Há, pois, uma única dívida e duas responsabilidades: a da Administração perante o lesado, em princípio, baseada na teoria do risco administrativo, e a do autordo dano, com fundamento na teoria da culpa. Quem deve ao lesado, em princípio, é aquela; mas este também é responsável pela dívida, desde que tenha agido com culpa ou dolo”. Essa afirmativa, todavia, não leva, data venia, ao extremismo de Hely Lopes Meirelles (1999, p. 610) de que a ação só pode ser ajuizada contra a autoridade pública responsável, não sendo possível a inclusão do servidor na demanda, pois não há dúvida de que existe conexão entre as duas ações: contra a Administração e a desta contra o autor do dano. Daí lecionar Pontes de Miranda (1987, p. 544), em escólio ao art. 106 da CF/1967: “O Estado, réu na ação, pode requerer a citação do funcionário público, ou pessoa que exerce o cargo; porque há conexão de causas. Bem assim fazê-lo cita o autor. Há litisconsórcio facultativo. 5. Por outro lado, a norma visa à proteção do lesado. Propondo ação apenas contra a Administração, compete-lhe provar apenas a materialidade do fato e o nexo de causalidade. Isto é, que do ato praticado pelo funcionário lhe adveio dano. Nada mais. Se dirigir o pleito contra o funcionário, terá também de demonstrar a culpa ou dolo do autor do dano. E a interpretação do dispositivo constitucional, no sentido de permitir, facultativamente, admissibilidade da ação também contra o funcionário, autor do dano, sobre não acarretar nenhum prejuízo, quer à Administração, quer ao funcionário, mais se coaduna com os princípios que disciplinam a matéria. Isto porque a Administração, sobre não poder nunca isentar de responsabilidade seus servidores, uma vez que não possui disponibilidade sobre o patrimônio público, não se prejudica com a integração do funcionário à lide, uma vez que a confissão dos fatos alegados pelo autor, por parte do funcionário, afetaria apenas sua defesa e não a da Administração, cuja responsabilidade se baseia na teoria do risco administrativo. Ao funcionário interessa intervir na ação não só para assegurar o justo valor da indenização, mas também para evitar as despesas de dois processos: o movido contra a Administração e o desta contra ele. A letra e o espírito do art. 107, que reproduz os arts. 194 da CF/1946 e 105 da CF/1967, permitem a participação do funcionário no processo, uma vez que o Poder Público executado por ato de seu representante, lesivo a terceiro, tem direito de exigir, diante do princípio da regressividade, do autor do dano aquilo que pagou ao prejudicado”. Percebe-se, pois, que mesmo sob a égide da Constituição de 1967, o STF adotava entendimento no sentido de admitir a denunciação da lide ao agente público quando da propositura de ação visando a reparação de danos experimentados por terceiros. Sem embargo, cumpre observar ser esta uma matéria cujas diretrizes se alternam muito com o passar do tempo. Nesse sentido, não admitindo o litisconsórcio: – STF, RE 327.904/SP, rel. Min. Carlos Britto, j. 15.08.2006. e) Dano moral: – TJSP, 8.ª Câm. de Direito Público, ACív 049.742-5/2-00/Guarulhos, rel. Des. Paulo Travain, v.u., j. 09.12.1999, RT 778/246. O referido acórdão discutiu a responsabilidade do Estado em razão de resultado equivocado de exame laboratorial fornecido por ambulatório público apurando que a autora era possuidora do vírus HIV, o que não restou comprovado posteriormente. Assim, não obstante reconhecer a caracterização do nexo de causalidade, acabou por acolher parcialmente a medida judicial proposta por entender não comprovada a existência de dano material ao paciente que recebeu o resultado incorreto. Sem embargo, uma vez que caracterizado o fundamento que em tese rende ensejo à responsabilização do Poder Público, concluiu pela viabilidade do ingresso de ação judicial pleiteando reparação por eventuais danos morais provocados pelo erro cometido pelo Estado. f) Colisão com viatura policial: – TJSP, 9.ª Câm. de Direito Público, ACív 071.333-5/2-00/SP, rel. Des. Rui Cascaldi, v.u., j. 09.08.2000, RT 783/266. No referido acórdão discutiu-se questão relacionada à responsabilidade do Estado resultante de acidente de trânsito envolvendo viatura policial que, atendendo situação de emergência, cruzou o farol vermelho com a sirene ligada. Em vista das características apresentadas, vale dizer, utilização pelo agente público que conduzia a viatura de todas as cautelas necessárias como sirene e por tratar-se de situação de emergência, não vislumbrou o Tribunal de Justiça de São Paulo a possibilidade de sua responsabilização. g) Erro médico: – TRF, 2.ª Região, 2.ª T., AP 97.02.17297-7/RJ, rel. Des. Federal Paulo Espírito Santo, v.u., j. 08.09.1999, RT 775/402. Neste julgado discutiu-se a responsabilidade do Estado em decorrência de erro médico praticado em hospital público que levou paciente operado de apêndice à condição de tetraplégico, surdo e mudo. A conclusão atingida foi pela responsabilização do Poder Público com base na teoria da responsabilidade objetiva por força da configuração do nexo de causalidade pela íntima ligação entre a conduta do agente público, no exercício de suas atribuições, e o dano experimentado pelo paciente. De registrar-se, ainda, que a responsabilização do Estado restou consolidada por ter o procedimento médico se desenvolvido em hospital público, sendo, outrossim, de nenhuma relevância ter o agente público agido com culpa ou dolo ao causar o dano. Essa situação, infelizmente, multiplica-se em nosso país por força das péssimas condições de nossos hospitais, bem como do sistema de saúde em geral, e também de muitos dos profissionais que atuam nessa área, por força da formação que receberam nos bancos universitários. Dentro desse contexto, e apenas para efeito de exemplificação, registre-se a situação envolvendo erro médico configurado em uma operação de sinusite realizada em hospital público que levou o paciente a um estado de coma. Nesse sentido: – TRF, 2.ª Região, 2.ª T., ACív 99.02.20871-1/RJ, rel. Des. Federal Castro Aguiar, v.u., j. 03.05.2000, RT 783/445. Uma vez mais verifica-se no caso vertente a aplicação da teoria da responsabilidade objetiva do Estado, consoante visto no julgado anterior em decorrência de dano ocasionado por ato praticado por agente público, em hospital público. De se chamar a atenção para o fato de que o simples erro médico não se revela suficiente para a caracterização da responsabilidade do Estado, sendo também necessária a configuração do nexo de causalidade para demonstrar a íntima relação de pertinência entre o fato ocorrido e as consequências dele resultantes. 12.4 PONTOS POLÊMICOS 12.4.1 Denunciação da lide Sobre o assunto, o primeiro ponto a ser abordado refere-se à possibilidade ou não de o Estado, uma vez acionado pelo particular lesado, denunciar à lide o agente responsável pelo dano. Essa questão, como alertado anteriormente, longe está de tornar-se pacífica, razão pela qual nos propomos aqui a fixar os principais pontos da controvérsia, sem prejuízo de emitirmos ao final nossa opinião. Para autores do porte de Celso Antônio Bandeira de Mello e Hely Lopes Meirelles, a possibilidade de denunciação da lide se revela inexistente, tendo em vista que os fundamentos para a responsabilidade do Estado e do agente são diversos, o que, inquestionavelmente, dificultaria o embasamento da futura decisão judicial. São suas estas palavras: “Revendo posição anteriormente assumida, estamos em que tem razão Weida Zancaner ao sustentar o descabimento de tal denunciação. Ela implicaria, como disse a citada autora, mesclar-se o tema de uma responsabilidade objetiva – a do Estado – com elementos peculiares à responsabilidade subjetiva – a do funcionário. Procede sua assertiva de que, ademais, haveria prejuízos para o autor, porquanto ‘procrastinar o reconhecimento de um legítimo direito da vítima, fazendo com que este dependa da solução de um outro conflito intersubjetivo de interesses (entre o Estado e o funcionário), constitui um retardamento injustificado do direito do lesado, considerando-se que este conflito é estranho ao direito da vítima, não necessário para a efetivação do ressarcimento aque tem a vítima direito’ (Mello, 1999, p. 692)”. __________ “A reparação do dano causado pela Administração a terceiros obtém-se amigavelmente ou por meio da ação de indenização, e, uma vez indenizada a lesão da vítima, fica a entidade pública com o direito de voltar-se contra o servidor culpado para haver dele o despendido, através da ação regressiva autorizada pelo § 6.º do art. 37 da CF. O legislador constituinte bem separou as responsabilidades: o Estado indeniza a vítima; o agente indeniza o Estado, regressivamente (Meirelles, 1999, p. 592)”. Posição intermediária é aquela assumida por Maria Sylvia Zanella Di Pietro, para quem a denunciação da lide, em matéria de responsabilidade do Estado, só terá lugar naquelas situações em que a ação proposta se baseia na culpa do agente público. Em contrapartida, quando a ação proposta se fundar na culpa anônima do serviço ou na responsabilidade objetiva, a denunciação da lide não poderá ser utilizada. São suas palavras: “Quando se trata de ação fundada na culpa anônima do serviço ou apenas na responsabilidade objetiva decorrente do risco, a denunciação não cabe, porque o denunciante estaria incluindo novo fundamento na ação: a culpa ou dolo do funcionário, não arguida pelo autor; Quando se trata de ação fundada na responsabilidade objetiva do Estado, mas com arguição de culpa do agente público, a denunciação da lide é cabível, como também é possível o litisconsórcio facultativo (com citação da pessoa jurídica e de seu agente) ou a propositura da ação diretamente contra o agente público (Di Pietro, 2003, p. 537)”. De se registrar também que a Lei 8.112/1990 (o Estatuto dos Servidores Públicos Federais), em seu art. 122, § 2.º, parece não admitir a possibilidade de denunciação da lide, como se verifica da redação a seguir: “Art. 122. […] […] § 2.º Tratando-se de dano causado a terceiros, responderá o servidor perante a Fazenda Pública, em ação regressiva”. Ainda sobre o tema, oportuno também registrar que os nossos Tribunais, longe de pacificarem o entendimento sobre o assunto, acabam por demonstrar uma tendência no sentido de admissão da denunciação da lide, como fazem ver os seguintes julgados, todos do STJ: “(…) 1. ‘Conforme jurisprudência assentada na 1.ª Seção desta Corte, no ERESP 313.886/RN, rel. Min. Eliana Calmon, DJ 22.03.2004, ‘a denunciação da lide ao agente do Estado em ação fundada na responsabilidade prevista no art. 37, § 6.º, da CF/1988 não é obrigatória, vez que a primeira relação jurídica funda-se na culpa objetiva e a segunda na culpa subjetiva, fundamento novo não constante da lide originária’’ (REsp 537.688/DF, 1.ª T., rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJU 02.05.2005) (AgRg no Ag. 731148/Ap; AgRg no AgI 2005/0213820-7, rel. Min. Denise Arruda, DJU 31.08.2006, p. 220)”. __________ “1. Não é obrigatória a denunciação à lide do agente, nas ações de indenização baseadas na responsabilidade civil objetiva do Estado (REsp 650190/MG e 2004/0041372-4, rel. Min. Castro Meira, DJU 05.04.2006, p. 175)”. __________ “(…) 1. ‘A denunciação da lide, como modalidade de intervenção de terceiros, busca aos princípios da economia e da presteza na entrega da prestação jurisdicional, não devendo ser prestigiada quando susceptível de pôr em risco tais princípios’ (REsp 43367/SP, 4.ª T., rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJU de 24.6.1996) (REsp 770590/BA; REsp 2005/0125548-4, rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJU 03.04.2006, p. 267)”. __________ “3. A denunciação da lide ao agente do Estado em ação fundada na responsabilidade prevista no art. 37, § 6.º, da CF/1988 não é obrigatória, vez que a primeira relação jurídica funda-se na culpa objetiva e a segunda na culpa subjetiva, fundamento novo não constante da lide originária. 4. Não perde o Estado o direito de regresso se não denuncia a lide ao seu preposto (precedentes jurisprudenciais) – REsp 661696/PR e 2004/0069021-4, rel. Min. Eliana Calmon, DJU 10.10.2005, p. 311”. __________ “1. Não é obrigatória a denunciação à lide de servidor público nas ações de indenização fundadas na responsabilidade civil objetiva do Estado. Precedentes (REsp 237180/RN; REsp 1999/0099974-6, rel. Min. João Otávio de Noronha, DJU 22.08.2005, p. 184)”. __________ “1. Esta Corte perfilhou entendimento de que não é obrigatória a denunciação à lide do agente, nas ações de indenização baseadas na responsabilidade civil objetiva do Estado, mesmo em casos de acidente de trânsito (REsp 91202/SP; REsp 1996/0018740-1, rel. Min. Castro Meira, DJU 13.12.2004, p. 268)”. __________ “I – É entendimento assente nesta Corte Superior de que a denunciação à lide do agente causador do dano, em ações de indenização por responsabilidade civil do Estado, não seria obrigatória, permanecendo a possibilidade de a Administração exercer seu direito de regresso, posteriormente, em ação apropriada (AgRg no Ag. 471590/PR; AgRg no AgI 2002/0114535-3, rel. Min. Francisco Falcão, DJU 08.09.2003, p. 225)”. __________ “A denunciação da lide ao agente do Estado em ação fundada na responsabilidade prevista no art. 37, § 6.º, da CF/1988 não é obrigatória, vez que a primeira relação jurídica funda-se na culpa objetiva e a segunda na culpa subjetiva, fundamento novo não constante da lide originária” (REsp 184.571/SP, rel. Min. Eliana Calmon, DJ 13.08.2001). A não aceitação da litisdenunciação não impede o exercício do direito de regresso, tendo em vista que a Constituição Federal assegura esse direito ao Estado para que, em ação própria, obtenha o ressarcimento do prejuízo. Recurso especial não conhecido (REsp 448409/SP; REsp 2002/0089359-1, rel. Min. Franciulli Netto, DJU 04.08.2003, p. 269)”. Essa tendência, sem embargo, verificada no STJ, não elimina a possibilidade de decisões em sentido contrário, ficando na dependência das características apresentadas em cada caso concreto. Confira-se: “Se a autora não fundou a ação na culpa do agente policial, mas apenas na responsabilidade objetiva do Estado, não nega vigência ao art. 70, III, CPC, o acórdão que indeferiu a denunciação à lide alvitrada pelo réu (STJ, 2.ª T., REsp 55.913/RS, rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro, DJU 13.03.1995, RJTJRS 171/32)”. Apresentadas as diversas correntes doutrinárias e jurisprudenciais, temos para nós que a melhor solução é aquela oferecida pela Professora Maria Sylvia Zanella di Pietro, que aponta para a possibilidade de denunciação da lide tão somente para aquelas situações em que tanto o agente quanto o Estado respondam com base no mesmo fundamento pelos danos causados. 12.4.2 Ação direta contra o agente De outra parte, necessário também mencionar a existência de divergências quanto à possibilidade de o particular lesado ingressar com a ação diretamente contra o agente responsável pelo dano causado. Enquanto parcela de nossa doutrina, liderada por Hely Lopes Meirelles, rejeita essa possibilidade com base na redação oferecida pelo Texto Constitucional, outra, encabeçada por Celso Antônio Bandeira de Mello, admite essa perspectiva. Procura o eminente jurista fundamentar sua tese na circunstância de que o dispositivo constitucional não teve sua redação idealizada para a proteção do agente causador do dano, mas sim para atender aos interesses do particular lesado. Nesse sentido, entende o administrativista que não admitir a possibilidade de o particular lesado escolher contra quem pretende propor ação significaria reduzir substancialmente as suas possibilidades, além de proteger de maneira indevida o agente que o causou. São suas palavras: “A norma visa a proteger o administrado, oferecendo-lhe um patrimônio solvente e a possibilidade da responsabilidade objetiva em muitos casos. Daí não se segue que haja restringido sua possibilidade de proceder contra quem lhe causou dano. Sendo um dispositivo protetor do administrado, descabe extrair dele restrições ao lesado. A interpretação deve coincidir com o sentido para o qual caminha a norma, ao invés de sacar dela conclusões que caminham na direção inversa, benéfica apenas ao presumido autor do dano.[…] Daí a conclusão de que o preceptivo é volvido à defesa do administrado e do Estado ou de quem lhe faça as vezes, não se podendo vislumbrar nele intenções salvaguardadoras do agente. A circunstância de haver acautelado os interesses do lesado e dos condenados a indenizar não autoriza concluir que acobertou o agente público, limitando sua responsabilização ao caso de ação regressiva movida pelo Poder Público judicialmente condenado (Mello, 1999, p. 691)”. 12.4.3 Atos legislativos e judiciais Existe a possibilidade de o Estado responder por danos causados a terceiros em razão de atos legislativos e judiciais, sem que se possa cogitar do enfraquecimento da Separação entre os Poderes. Não fosse suficiente a redação oferecida pelo § 6.º do art. 37, em especial quanto à utilização da expressão “agentes públicos” – o que por si só estaria abrangendo tanto os Magistrados quanto os agentes políticos –, a própria CF reiterou essa diretriz ao estabelecer no art. 5.º, LXXV, a responsabilidade do Estado em relação ao condenado por erro judiciário. Confira-se: “Art. 5.º […] […] LXXV – o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença”. Em relação, outrossim, aos atos legislativos, temos para nós que a linha de raciocínio não pode ser outra no sentido de abrir se a possibilidade de responsabilização do Estado, desde que, por óbvio, tenha ocorrido o reconhecimento da inconstitucionalidade da lei pelo Poder Judiciário, pela via de ação direta, por gerar efeitos erga omnes ou pela via de exceção ou defesa, desde que o Senado Federal, acionado pelo STF, imprima à decisão os mesmos efeitos, valendo-se da previsão estabelecida no art. 52, X, da Lei Maior. 12.4.4 Responsabilidade por dano ambiental e nuclear Não fosse suficiente a redação do § 6.º do art. 37 da CF para caracterizar a responsabilidade do Estado para os prejuízos resultantes de ações nucleares, a confirmação surge por meio da redação oferecida pelo art. 21, XXIII, d, como se vê: “Art. 21. Compete à União: […] XXIII – explorar os serviços e instalações nucleares de qualquer natureza e exercer monopólio estatal sobre a pesquisa, a lavra, o enriquecimento e reprocessamento, a industrialização e o comércio de minérios nucleares e seus derivados, atendidos os seguintes princípios e condições: […] d) a responsabilidade civil por danos nucleares independe da existência de culpa”. A redação do dispositivo constitucional demonstra claramente que a responsabilidade do Estado por danos resultantes de atividades nucleares é objetiva, ou seja, tem por base a caracterização do nexo de causalidade. O mesmo se verifica em relação à sua responsabilidade por danos ambientais, por força da redação oferecida pelo art. 225 da CF: “Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”. Embora o dispositivo reproduzido não tenha especificado a forma de responsabilização do Estado por força de danos ambientais, a matéria está pacificada em nossos Tribunais. Nesse sentido: – TJSP, Ag. 38.159-5, rel. Des. José Santana, j. 06.08.1997; – TJRO, ACív 97.002524-6, relatora Desembargadora Zelite Andrade Carneiro, j. 20.02.1998; – TJPR, ACív 16.414, rel. Juiz Airvaldo Stela Alves, j. 07.02.2000; – TJSP, ACív 5.578-5, rel. Des. Antonio Villen, j. 04.03.1998. Assim, resulta clara a responsabilidade objetiva do Estado em matéria ambiental, revelando, de igual sorte, a impossibilidade de denunciação da lide ao agente por ele responsável em vista dos regimes diferenciados, com base na redação oferecida pelo art. 14, § 1.º, da Lei 6.938/1981, que a seguir se reproduz: “Art. 14. […] § 1.º Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente (grifo nosso)”. Destarte, enquanto a responsabilização do Poder Público tem por base o nexo de causalidade, a do agente tem por lastro a caracterização da sua culpa ou dolo. Por outro lado, cumpre observar que, embora pacífica a responsabilidade objetiva do Estado, o mesmo não se pode dizer em relação ao risco ser integral ou administrativo, porque objeto de divergências entre a doutrina e a jurisprudência. Sem embargo, não se pode deixar de registrar a existência de opiniões em sentido contrário abraçando a tese da responsabilidade subjetiva do Estado em que pese a diretriz estabelecida no art. 14, § 1.º, da Lei 6.938/1981. Nesse sentido, procuram lastrear a conclusão partindo da premissa de que, em se tratando de omissão praticada pelo Poder Público, a única possibilidade aberta pela Constituição seria a da responsabilidade subjetiva. Sob esse aspecto, uma legislação ordinária não poderia contrariar a diretriz estabelecida pela Lei Maior, sob pena de subversão de hierarquia de normas jurídicas, pois implicaria interpretar a Constituição à luz da lei, o que não se admitiria. Nesse contexto, cumpre apenas registrar não ser esse, como visto, o entendimento que tem sido adotado por nossos Tribunais. 12.4.5 Responsabilidade por danos resultantes de atentados terroristas A abertura de um tópico específico para cuidar dessa hipótese justifica-se por tratar-se, talvez, da única a comportar, de modo inquestionável, a modalidade de risco integral por força de expressa disposição legal. Com efeito, a matéria está disciplinada na Lei 10.744/2003 que dispõe sobre a assunção, pela União, de responsabilidades civis perante terceiros no caso de atentados terroristas, atos de guerra ou eventos correlatos, contra aeronaves de matrícula brasileira operadas por empresas brasileiras de transporte aéreo público, excluídas as empresas de táxi aéreo. A questão do risco integral é explicitada nos termos do art. 1.º, a seguir reproduzido: “Art. 1.º Fica a União autorizada, na forma e critérios estabelecidos pelo Poder Executivo, a assumir despesas de responsabilidades civis perante terceiros na hipótese da ocorrência de danos a bens e pessoas, passageiros ou não, provocados por atentados terroristas, atos de guerra ou eventos correlatos, ocorridos no Brasil ou no exterior, contra aeronaves de matrícula brasileira operadas por empresas brasileiras de transporte aéreo público, excluídas as empresas de táxi aéreo”. Nesse contexto, para dissipar quaisquer dúvidas que possam impedir a assunção desta responsabilidade pela União, o legislador houve por bem definir alguns conceitos importantes, consoante se verifica nos §§ 3.º, 4.º e 5.º do art. 1.º citado, a seguir reproduzidos: “§ 3.º Entende-se por atos de guerra qualquer guerra, invasão, atos inimigos estrangeiros, hostilidades com ou sem guerra declarada, guerra civil, rebelião, revolução, insurreição, lei marcial, poder militar ou usurpado ou tentativas para usurpação do poder. § 4.º Entende-se por ato terrorista qualquer ato de uma ou mais pessoas, sendo ou não agentes de um poder soberano, com fins políticos ou terroristas, seja a perda ou dano dele resultante acidental ou intencional. § 5.º Os eventos correlatos, a que se refere o caput deste artigo, incluem greves, tumultos, comoções civis, distúrbios trabalhistas, ato malicioso, ato de sabotagem, confisco, nacionalização, apreensão, sujeição, detenção, apropriação, sequestro ou qualquer apreensão ilegal ou exercício indevido de controle da aeronave ou da tripulação em voo por parte de qualquer pessoa ou pessoas a bordo da aeronave sem consentimento do explorador”. Por fim, cumpre anotar que a responsabilidade para atestar a legitimidade dessas despesas foi entregue para o Ministro de Estado da Defesa, nos termos do art. 3.º. Confira-se: “Art.3.º Caberá ao Ministro de Estado da Defesa, ouvidos os órgãos competentes, atestar que a despesa a que se refere o art. 1.º desta Lei ocorreu em virtude de atentados terroristas, atos de guerra ou eventos correlatos”. 12.4.6 Prescrição A matéria, principalmente após o advento do Código Civil de 2002, está a merecer um cuidado todo especial em razão das disposições ali contidas que parecem, num primeiro momento, negar validade aos diplomas legais até então disciplinadores do tema. Destarte, o Dec. 20.910/1932 preconizou em seu art. 1.º o prazo de cinco anos para a prescrição das dívidas passivas da União, Estados, Municípios e Distrito Federal e para qualquer direito ou ação contra a Fazenda, contados da data em que verificado o fato em que se fundarem. Confira-se: “Art. 1.º As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem”. Essa diretriz foi reafirmada pelo Dec.-lei 4.597/1942 que a estendeu, em seu art. 1.º, para as autarquias e entidades e órgãos paraestatais criados por lei e mantidos mediante impostos, taxas ou quaisquer contribuições. Por seu turno, a Lei 9.494/1997 ratificou em seu art. 1.º-C a prescrição em cinco anos para obter indenização dos danos causados por agentes de pessoas jurídicas de Direito Público e de pessoas jurídicas de Direito Privado prestadoras de serviços públicos. Confira-se: “Art. 1.º-C. Prescreverá em cinco anos o direito de obter indenização dos danos causados por agentes de pessoas jurídicas de direito público e de pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos”. De outra parte, de se registrar também a diretriz estabelecida pela Súmula 119 do STJ, segundo a qual: “A ação de desapropriação indireta prescreve em 20 (vinte) anos”. Cumpre observar, ainda, que o Código Civil em vigor trouxe algumas novidades em relação ao tema, consoante se verifica na redação do art. 206, § 3.º, V. Confira-se: “Art. 206. Prescreve: […] § 3.º Em três anos: […] V – a pretensão de reparação civil”. A leitura do dispositivo legal autoriza uma conclusão inicial segundo a qual o prazo prescricional para as ações contra a Fazenda Pública seria único, de três anos. Sem embargo, essa análise inicial não resiste a uma interpretação sistemática do diploma civil, a demonstrar que esses prazos podem experimentar variações, de acordo com as características peculiares de cada caso concreto, em razão da regra estabelecida no art. 2.028. Confira-se: “Art. 2.028. Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada”. Nesse contexto, irretocáveis os comentários estabelecidos pelo ilustre Procurador do Estado de São Paulo Luiz Duarte de Oliveira, A prescrição no novo Código Civil – uma análise interdisciplinar, 1. ed., Saraiva, 2005, p. 56. Confira-se: “Pode-se concluir, portanto, que a prescrição liberatória das pretensões dirigidas em face das Fazendas Públicas será sempre a de menor prazo, não podendo ultrapassar, em qualquer hipótese, os cinco anos instituídos pelo Dec. 20.910/1932. Nessa senda, não havendo óbice à aplicação dos prazos prescricionais inferiores a cinco anos, trazidos pelo atual Código Civil, em relação às Fazendas Públicas, há de se perquirir sobre a existência de algum conflito intertemporal de normas, a demandar o emprego do seu art. 2.028, verbis: ‘Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada’. De início, chegamos a acreditar efetivamente que sim, pois as ações de responsabilidade civil movidas em face do Estado, por exemplo, que prescreveriam no prazo de cinco anos (Dec. 20.910/1932, art. 1.º) passariam, doravante, a prescrever em três (art. 206, § 3.º, V). Com isso, todos os prazos prescricionais que, iniciados na vigência do anterior Código Civil, ainda estivessem em curso na data da vigência da nova codificação, deveriam se submeter à regra daquele art. 2.028. Contudo, melhor examinando a questão, verifica-se que, em verdade, o novo Código não tratou de reduzir o prazo das pretensões indenizatórias. Cuidou, sim, de enunciar uma nova modalidade de pretensão que deveria contar com prazo prescricional diferenciado. Ausência de similitude entre o objeto da regra do art. 1.º do Dec. de 1932 e o do art. 206, § 3.º, V, referenda assertiva. Sem conflito intertemporal a ser solucionado, as pretensões indenizatórias em face das Fazendas Públicas – apenas para aproveitar o exemplo – que tenham por objeto evento danoso ocorrido até a entrada em vigor do atual Código Civil (0:00 horas do dia 10.01.2003), prescreveram em cinco anos, na forma instituída pelo Dec. 20.910/1932. Já aquelas pretensões ressarcitórias, estribadas em dano ocorrido após a vigência da codificação, terão prazo prescricional trienal, como quer a nova lei civil”. Dentro desse contexto, percebe-se nitidamente a existência de diversos posicionamentos relacionados a este tema, em especial a partir de 2002, com a entrada em vigor do novo Código Civil. De se registrar, ainda, que nossos Tribunais, em especial o STJ, mantém entendimento no sentido da aplicação da prescrição quinquenal a todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda Federal, Estadual ou Municipal, seja qual for a natureza (AgRg no REsp 969.613-AC). 12.4.6.1 Prescrição para ação regressiva Ainda sobre este tema, oportuno registrar que as discussões noticiadas no item anterior não se aplicam quando a prescrição for em favor da Fazenda, uma vez que, para recompor o seu patrimônio, dela não se cogita, a teor do disposto no art. 37, § 5.º, da CF. Confira-se: “§ 5.º A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento” (grifo nosso). Em outras palavras, tem-se que a ação de regresso da Administração em face do servidor é imprescritível, conclusão que se atinge em vista do interesse público a ser preservado. 12.4.7 Notários A questão relativa à responsabilidade do Estado acerca dos atos praticados pelos notários demanda uma análise do perfil constitucional e legal atribuído a esse tema, a começar pela transcrição do art. 236 da Lei Maior. Confira-se: “Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público. § 1.º Lei regulará as atividades, disciplinará a responsabilidade civil e criminal dos notários, dos oficiais de registro e de seus prepostos, e definirá a fiscalização de seus atos pelo Poder Judiciário. § 2.º Lei federal estabelecerá normas gerais para fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro. § 3.º O ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos, não se permitindo que qualquer serventia fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de remoção, por mais de seis meses”. A leitura do dispositivo reproduzido deixa entrever que a atividade notarial retrata modalidade de serviço público cuja titularidade, portanto, fica reservada a Administração que, no entanto, por delegação, a transfere para particulares que vão exercê-la em caráter privado. Outrossim, em que pese o parágrafo terceiro preconizar o ingresso por meio de concurso público, não se vislumbra nenhuma referência acerca da titularização de cargos públicos, o que exclui os notários do conceito de servidor público, pelo menos em sentido estrito. Em outras palavras, os notários, ainda que considerados servidores públicos em sentido amplo, não poderiam, por exercerem atividades em caráter privado, por delegação do Poder Público, titularizar cargos em caráter efetivo. De seregistrar, ainda, que a jurisprudência do STF tem os serviços notariais e de registro como espécie de serviço público. Nesse contexto, cumpre observar que, em 2005, o STF mudou sua orientação a respeito desse tema por ocasião do julgamento da ADI 2602, proposta pela Anoreg, a qual buscava o reconhecimento da inconstitucionalidade de norma editada pelo Poder Judiciário de Minas Gerais que determinava a aposentadoria compulsória de notários e registradores das serventias extrajudiciais. Por maioria, os Ministros julgaram procedente a ADI, destacando-se, nesse particular, o voto proferido pelo Min. Carlos Britto, por suas importantes considerações acerca da natureza dessa atividade. Confira-se: “I – serviços notariais e de registro são atividades próprias do Poder Público, pela clara razão de que, se não o fossem, nenhum sentido haveria para a remissão que a Lei Maior expressamente faz ao instituto da delegação a pessoas privadas. É dizer: atividades de senhorio público, por certo, porém obrigatoriamente exercidas em caráter privado (CF, art. 236, caput). Não facultativamente, como se dá, agora sim, com a prestação dos serviços públicos, desde que a opção pela via privada (que é uma via indireta) se dê por força de lei de cada pessoa federada que titularize tais serviços; II – cuida-se de atividades jurídicas do Estado, e não de atividades simplesmente materiais, cuja prestação é traspassada para os particulares mediante delegação (já foi assinalado). Não por conduto dos mecanismos da concessão ou da permissão, normados pelo caput do art. 175 da Constituição como instrumentos contratuais de privatização do exercício dessa atividade material (não propriamente jurídica) em que se constituem os serviços públicos”. Mais adiante, o eminente Ministro arremata sua linha de raciocínio acerca da natureza jurídica da atividade notarial nos seguintes termos: “Numa frase, então, serviços notariais e de registro são típicas atividades estatais, mas não são serviços públicos, propriamente. Categorizam-se como atividade jurídica stricto sensu, assemelhadamente às atividades jurisdicionais. E como função pública lato sensu, a exemplo das funções de legislação, diplomacia, defesa nacional, segurança pública, trânsito, controle externo e tantos outros cometimentos que, nem por ser de exclusivo domínio estatal, passam a se confundir com serviço público. […] Enfim, as marcantes diferenciações pululam a partir do próprio texto da Magna Carta Federal, permitindo-nos a serena enunciação de que as atividades notariais e de registro nem se traduzem em serviços públicos nem tampouco em cargos públicos efetivos”. Nesse contexto, diante desse precioso aporte jurisprudencial, surge agora a questão da responsabilidade pelos atos praticados no exercício dessa atividade, que foi delineada no § 1.º, o qual, por seu turno, acabou por transferi-la para o legislador ordinário. Nesse sentido, foi editada a Lei 8.935/1994, que regulamentou o art. 236 da CF, dispondo sobre serviços notariais e de registro, da qual destacamos os dispositivos que fazem referência à questão da responsabilidade. Confira-se: “Art. 22. Os notários e oficiais de registro responderão pelos danos que eles e seus prepostos causem a terceiros, na prática de atos próprios da serventia, assegurado aos primeiros direito de regresso no caso de dolo ou culpa dos prepostos. Art. 23. A responsabilidade civil independe da criminal. Art. 24. A responsabilidade criminal será individualizada, aplicando-se, no que couber, a legislação relativa aos crimes contra a administração pública. Parágrafo único. A individualização prevista no caput não exime os notários e os oficiais de registro de sua responsabilidade civil”. A leitura desses dispositivos legais permite concluir que os notários e oficiais de registro responderão por atos praticados pelos seus prepostos que causem danos a terceiros e por sua vez, em razão da natureza dessa atividade, possível a responsabilização do Estado, não sendo outra a posição adotada por nossa jurisprudência. Nesse sentido: – RE 209.354-AgRg, rel. Min. Carlos Velloso, DJU 16.04.1999; – ADIn 1.378-MC, rel. Min. Celso de Mello, DJU 30.05.1997; – RE 201.595, rel. Min. Marco Aurélio, DJU 20.04.2001; – RE 212.724, rel. Min. Maurício Corrêa, DJU 06.08.1999; – STJ, 2.ª T., REsp 439465/MS, rel. Min. Paulo Medina, v.u., j. 15.10.2002, DJU 09.12.2002. QUADRO SINÓTICO DEFINIÇÃO: – Obrigação atribuída ao Poder Público de ressarcir os danos causados a terceiros, pelos seus agentes, quando no exercício de suas atribuições. REQUISITOS: DANO CERTO: – É o dano real, existente, não podendo o Estado ser acionado em razão de danos virtuais. DANO ESPECIAL: – É o que se contrapõe à noção de dano geral, vale dizer, aquele que atinge a coletividade como um todo, devendo, pois, ser individualizado. DANO ANORMAL: – É aquele que ultrapassa os problemas, as dificuldades da vida comum em sociedade, causando esses prejuízos atípicos. AGENTES PÚBLICOS: – Esta expressão abrange todas as pessoas que estão dentro da estrutura da Administração Pública. – Espécies: 1. Agentes políticos: aqueles que formam a vontade superior do Estado, sem com ele manter uma relação profissional. 2. Servidores públicos: a) Funcionários públicos: os que titularizam cargos. b) Empregados públicos: os que titularizam empregos públicos. c) Temporários: contratados por prazo determinado com base na previsão contida no art. 37, IX, da CF. 3. Particulares em colaboração com o Estado: aqueles que, embora não estejam dentro da estrutura administrativa, acabam integrando este conceito em razão da prestação temporária de serviços públicos. NESTA QUALIDADE: – O Estado só poderá ser acionado para ressarcimento dos danos provocados por agentes públicos, mas somente quando no exercício das suas atribuições e, não, atuando como um simples particular. EVOLUÇÃO HISTÓRICA: FASE DA IRRESPONSABILIDADE: – O Poder Público não respondia por qualquer tipo de prejuízos causados a terceiros. – Este período é caracterizado pela frase “The King can do no wrong” (O Rei não pode errar). RESPONSABILIDADE SUBJETIVA: – O Estado, que até então não respondia pelos prejuízos causados a terceiros, passa a responder com base no conceito de culpa. – Uma culpa anônima, eis que recaindo não sobre um agente em especial, mas sobre o serviço que resultou no dano por que: * Não funcionou; * Funcionou tardiamente; * Funcionou de maneira defeituosa. – Este período é marcado por uma frase resultante de decisões proferidas pelo Conselho de Estado na França: “Faute du service” (culpa do serviço). – Geralmente utilizada quando o dano é resultante de omissões praticadas pelo Poder Público. RESPONSABILIDADE OBJETIVA: – O Estado, que anteriormente respondia com base no conceito de culpa, continua a responder, só que agora com base no conceito de “nexo de causalidade”. – O denominado nexo causal representa a relação de causa e efeito existente entre o fato ocorrido e as consequências dele resultantes. – Exemplos: • Perda de um carro levado por uma forte inundação; * Perda de uma casa em razão de enchentes; * Perda de um parente em razão de uma transfusão de sangue mal realizada em um hospital público; * Perda de um familiar durante uma rebelião ou mesmo como resultado de uma briga entre detentos. VARIANTES: 1. Risco Integral: o Estado responde por qualquer prejuízo causado a terceiros, ainda que não tenha sido o responsável por ele.
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