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EPIDEMIOLOGIA DOS ACIDENTES OFÍDICOS NOTIFICADOS NO MUNICÍPIO DE CAPITÃO POÇO, PARÁ, BRASIL.

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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DA AMAZÔNIA 
CURSO BACHARELADO EM BIOLOGIA 
 
 
 
FRANCISCO NILDO SILVEIRA BENTO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
EPIDEMIOLOGIA DOS ACIDENTES OFÍDICOS NOTIFICADOS NO MUNICÍPIO 
DE CAPITÃO POÇO, PARÁ, BRASIL. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
CAPITÃO POÇO – PA 
2019 
 
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FRANCISCO NILDO SILVEIRA BENTO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
EPIDEMIOLOGIA DOS ACIDENTES OFÍDICOS NOTIFICADOS NO MUNICÍPIO 
DE CAPITÃO POÇO, PARÁ, BRASIL. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Trabalho apresentado à Universidade Federal 
Rural da Amazônia (UFRA) como requisito 
básico para Trabalho de Conclusão de Curso 
(TCC). 
Orientadora: Drª Annelise Batista 
D’Angiollela. 
Co-orientador: Prof. Dr. Bruno da Silveira 
Prudente 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
CAPITÃO POÇO – PA 
2019 
 
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AGRADECIMENTOS 
 
Acima de tudo Deus, por ter me dado força para superar cada obstáculo encontrado durante 
essa jornada árdua. 
Aos meus pais, Hildo e Maria, pelo apoio e por fazerem de mim o que sou hoje. 
À minha esposa pela compreensão e paciência diante das ausências e estresses e ao meu filho 
que a cada sorriso que dava me enchia de vontade de continuar buscando sempre o melhor 
para sua vida. 
À minha família e amigos, por de certa forma estarem sempre dispostos a me ajudar. 
À Prof.ª.: Drª. Annelise Batista D’angiolella, pela orientação, dedicação e apoio 
À Secretaria Municipal de Saúde, em especial a enfermeira Andrielle Nayara Ramos Reis por 
sua colaboração em fornecer os dados necessários à minha pesquisa. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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RESUMO 
 
No Brasil, aproximadamente 29.000 casos de envenenamentos por serpentes são reportados a 
cada ano, em que 4,31% dos casos evoluem para o óbito do paciente. Assim, o presente 
estudo buscou caracterizar o perfil clínico e epidemiológico dos acidentes ofídicos notificados 
entre os anos de 2010 e 2017 na Secretaria de Saúde do município de Capitão Poço, Nordeste 
do Pará. Os dados obtidos foram analisados através de estatística descritiva usando o software 
Microsoft Excel (versão 2010). Foram registrados 244 acidentes ao longo dos oito anos 
estudados, com as maiores taxas de envenenamento sendo observadas durante a estação 
chuvosa. Onde a maioria dos acidentes ocorreu na zona rural, com homens adultos, com faixa 
etária entre 20 e 39 anos sendo os mais acometidos principalmente nos membros inferiores 
por serpentes do gênero Bothrops. Dor, sangramento e edema foram as manifestações locais 
mais frequentes, sendo a maior parte dos acidentes classificada como leve, com 95,9 % dos 
casos evoluindo para cura do paciente. Diante disso, o estudo evidenciou a necessidade de 
conscientização da população com relação à importância do uso da indumentária adequada 
para a realização do trabalho em zonas rurais, bem como a necessidade de treinamento para os 
profissionais da saúde, para que os mesmos possam estar mais preparados para atender os 
pacientes e preencher de maneira adequada as fichas de identificação. 
Palavras-chaves: Acidente ofídico, Serpentes, Amazônia. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
7 
 
ABSTRACT 
In Brazil, approximately 29.000 reports of snake envenoming occur each year, with 4,31% of 
cases evolving to patient death. This study aimed to describe the clinical and epidemiological 
profile of snakebites occurred in Capitão Poço, northeastern Pará, between the years of 2000 
and 2017. The data was obtained from database with the Secretariat of the Municipality of 
Capitão Poço Health and were analyzed using simple descriptive statistics on Microsoft Excel 
(version 2010). There were 244 cases of snakebites reported along the eight years, with the 
regional rainy season coinciding with higher snakebite rates. The majority of these accidents 
occurred in rural areas, where adult men were most affected in the lower limbs by Bothrops 
snakes. Pain, bleeding and edema were the most common local manifestation symptoms, with 
95,9 % of accidents evolving to patient healing. The present study highlights the importance 
of awareness of the population in relation to suitable clothing for working in rural zones. 
Also, flaws in the serum therapy as well as filling in the forms were identified, showing the 
need for training of personnel involved as well as improving the notification system. 
 
Key-words: Snakebites, Snakes, Amazônia. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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LISTA DE FIGURAS 
CAPÍTULO 1 – REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 
FIGURA 1 – Distribuição global das serpentes peçonhentas. 
FIGURA 2 – Representação das fossetas labial (a) e loreal (b), indicadas pelas setas 
vermelhas, presente em espécies da família Boidae e Viperidae, respectivamente. 
FIGURA 3. Tipos de Dentição das Serpentes. 
FIGURA 4 – Bothrops atrox (Jararacaquinha-do-rabo-branco). 
FIGURA 5 – Manifestações locais de picada por Bothrops. 
FIGURA 6 – Caudisona durissa (Cascavel). 
FIGURA 7 – Manifestações sistêmicas de picada por Caudisona. 
FIGURA 8 – Lachesis muta (Surucucu ou Pico-de-jaca). 
FIGURA 9 – Micrurus lemniscatus (coral verdadeira). 
FIGURA 10 – Philodryas argentea (cobra-cipó). 
CAPÍTULO 2 – EPIDEMIOLOGIA DOS ACIDENTES OFÍDICOS NOTIFICADOS NO 
MUNICÍPIO DE CAPITÃO POÇO, PARÁ, BRASIL 
FIGURA 1 – Localização geográfica do município de Capitão Poço, Estado do Pará, Brasil. 
FIGURA 2 – Variação mensal da pluviosidade e do número de acidentes ofídicos notificados 
entre os anos de 2010 a 2017, no município de Capitão Poço, Pará, Brasil. 
FIGURA 3 – Registro de notificações relacionadas aos acidentes ofídicos, segundo a zona de 
ocorrência, registradas na Secretária de Saúde de Capitão poço, Pará, no período de 2010-
2017. 
 
9 
 
FIGURA 4 – Distribuição dos 244 casos de acidentes ofídicos notificados na Secretaria 
Municipal de Saúde de Capitão Poço (PA), de janeiro de 2010 a dezembro de 2017, de acordo 
com o nível de escolaridade. 
FIGURA 5 - Notificações de acidentes ofídicos, segundo região anatômica acometida, 
registradas na Secretária de Saúde de Capitão poço, Pará, no período de 2010-2017. 
FIGURA 06 – Notificações de acidentes ofídicos, segundo a gravidade dos acidentes e o 
tempo até o atendimento. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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LISTA DE TABELAS 
CAPÍTULO 1 – REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 
Tabela 01 - Indicação do número de ampolas de soros antiveneno para tratamento de 
acidentes ofídicos de acordo o Ministério da Saúde. 
CAPÍTULO 2 – EPIDEMIOLOGIA DOS ACIDENTES OFÍDICOS NOTIFICADOS 
NO MUNICÍPIO DE CAPITÃO POÇO, PARÁ, BRASIL. 
Tabela 01 - Distribuição dos casos de acidentes ofídicos notificados na Secretaria Municipal 
de Saúde de Capitão Poço (PA), de janeiro de 2010 a dezembro de 2017, de acordo com a 
faixa etária e o sexo do acidentado. 
Tabela 02 - Distribuição dos casos de acidentes ofídicos notificados na Secretaria Municipal 
de Saúde de Capitão Poço (PA), de janeiro de 2010 a dezembro de 2017, de acordo com a 
ocupação e se tem relação com o trabalho. 
Tabela 03 - Distribuição dos casos de acidentes ofídicos notificados na Secretaria Municipal 
de Saúde de Capitão Poço (PA), de janeiro de 2010 a dezembro de 2017, de acordo 
Manifestações locais e sistêmicas identificadas nas fichas de notificações do SINAN. 
Tabela 04 – Dados ignorados ou não preenchidos 
Tabela 05 - Distribuição dos casos de acidentes ofídicos notificados na Secretaria Municipal 
de Saúde de Capitão Poço (PA), de janeiro de 2010 a dezembro de 2017, de acordo com o 
tipo de acidente e a soroterapia instituída. 
 
 
 
 
 
 
 
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SUMÁRIO 
CAPÍTULO 1 – REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 
1. INTRODUÇÃO GERAL ............................................................................................... 13 
1.1 – OFIDISMO..............................................................................................................13 
1.1.1 OFIDISMO NO BRASIL ..................................................................................... 13 
1.2 – SERPENTES: BIOLOGIA, ECOLOGIA, CLASSIFICAÇÃO DOS ACIDENTES 
OFÍDICOS E SOROTERAPIA INDICADA .................................................................... 15 
1.2.1 - CARACTERÍSTICAS BIOLÓGICAS E ECOLÓGICAS .................................. 15 
1.2.2 – SERPENTES PEÇONHENTAS E DE IMPORTÂNCIA MÉDICA ................... 17 
1.2.2.1 – SERPENTES DO GÊNERO BOTHROPS (JARARACAS) ............................ 18 
1.2.2.2 – SERPENTES DO GÊNERO CAUDISONA (CASCÁVEIS) ........................... 21 
1.2.2.3 – SERPENTES DO GÊNERO LACHESIS (SURUCUCUS) .............................. 22 
1.2.2.4 – SERPENTES DO GÊNERO MICRURUS (CORAL VERDADEIRA)……….22 
1.2.2.5 – ALGUMAS SERPENTES DA FAMÍLIA DIPSADIDAE .............................. 25 
1.3 – EPIDEMIOLOGIA DOS ACIDENTES OFÍDICOS NO BRASIL ........................... 27 
2 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................ 28 
CAPÍTULO 2 - EPIDEMIOLOGIA DOS ACIDENTES OFÍDICOS 
NOTIFICADOS NO MUNICÍPIO DE CAPITÃO POÇO, PARÁ, BRASIL. 
1– INTRODUÇÃO ............................................................................................................. 32 
2 – OBJETIVOS................................................................................................................. 34 
2.1 – OBJETIVO GERAL ................................................................................................ 34 
2.2 – OBJETIVOS ESPECÍFICOS ................................................................................... 34 
3 – MATERIAL E MÉTODOS ......................................................................................... 34 
3.1 – ÁREA DE ESTUDO ............................................................................................... 34 
3.2 – OBTENÇÃO DOS DADOS .................................................................................... 35 
3.3 – ANÁLISE DOS DADOS ......................................................................................... 36 
4 – RESULTADOS ............................................................................................................ 37 
5 – DISCUSSÃO................................................................................................................. 44 
6 - CONCLUSÃO 
………………………………………………………………………………………………...48 
7 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................ 48 
 
 
12 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
CAPÍTULO 1 – REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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1. INTRODUÇÃO GERAL 
1.1 – OFIDISMO 
O ofidismo é o quadro de envenenamento em humanos decorrente da inoculação de 
toxinas através das presas de serpentes. O envenenamento ocorre quando a serpente consegue 
injetar na sua presa o conteúdo de suas glândulas de veneno (MELGAREJO, 2009; 
ARAGUAIA, 2017; SINAN, 2017). 
Os acidentes ofídicos representam um alarmante problema mundial de saúde pública, 
onde segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde) provocam aproximadamente 40.000 
mortes por ano (SWARROP, 1954). Em países tropicais, há uma maior frequência deste tipo 
de acidente devido à alta incidência de florestas, e a precariedade dos serviços públicos como 
o saneamento básico (PINHO; PEREIRA, 2001; BONAN et al., 2010). De acordo com a 
Organização Mundial da Saúde (OMS), aproximadamente 2,5 milhões de pessoas sofrem 
acidentes ofídicos no mundo por ano, e no Brasil, são cerca de 29.000 casos ocorridos 
anualmente, com uma média de 125 óbitos registrados (BERNARDE, 2014; GUIMARÃES et 
al., 2015), com a maior incidência de casos por habitantes ocorrendo na região amazônica 
(ARAÚJO et al., 2003). É possível que tais números estejam subestimados devido à grande 
dificuldade de acesso e a precariedade dos sistemas públicos de saúde, que fazem com que 
muitos acidentes não sejam sequer registrados (BERNADE & GOMES, 2012). 
 
1.1.1 OFIDISMO NO BRASIL 
Os primeiros relatos de acidentes ofídicos no Brasil foram feitos ainda na época do 
descobrimento, por volta de 1560, porém o primeiro estudo epidemiológico sobre o tema no 
país foi realizado mais de 300 anos depois, em 1901, quando o médico, cientista e 
imunologista Vital Brazil, então diretor do recém-criado Instituto Butantan, levantou o 
número de óbitos por picadas de serpentes peçonhentas no Estado de São Paulo (Brazil, 
1901). Ainda no mesmo ano, Vital Brazil produziu os primeiros tubos de soros 
antipeçonhentos para o consumo, e desde então passou a distribuir, junto com as ampolas de 
soro, o Boletim para Observação de Accidente Ophidico, para ser preenchido com os dados 
14 
 
referentes ao acidente que levou ao uso desse antiveneno. Através desses boletins, vários 
outros trabalhos relacionados ao tema foram realizados (VAZ, 1950; CAMARGO; 
SANT’ANNA, 2004). 
Por muitos anos, o estudo sobre ofidismo no Brasil esteve centralizado na região 
sudeste, e somente a partir de 1985, com a “crise do soro” e um aumento significativo no 
número de acidentes ofídicos, que o Ministério da Saúde (MS) assumiu a responsabilidade em 
coordenar a produção e distribuição de soros antiveneno (SAV), bem como a capacitação de 
recursos humanos e vigilância epidemiológica (CAMARGO; SANT’ANNA, 2004). Sendo 
assim, em 1986 foi criado o Programa Nacional de Ofidismo que, mais tarde, passou a se 
chamar Programa Nacional de Controle de Acidentes por Animais Peçonhentos. Porém, 
somente a partir de 1987, com a obrigatoriedade da notificação dos acidentes ofídicos, os 
primeiros estudos regionalizados de epidemiologia dos acidentes ofídicos aconteceram 
(SINAN, 2017). A partir de então, o governo passou a apoiar e financiar os primeiros projetos 
regionalizados sobre a distribuição das serpentes no país (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 1998), 
sendo o primeiro direcionado para a região Sul e Sudeste e, a partir de 1998, o segundo, para a 
região Nordeste (LIRA-DA-SILVA et al, 2009). 
O Sistema de Informações de Agravos de Notificação (SINAN), adotado no país 
desde 1995 (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 1998), é um dos métodos nacionais usados para o 
controle de dados de acidentes ofídicos (BOCHNER; STRUCHINER, 2002). Apesar de estar 
presente em âmbito nacional, o SINAN sofre, desde sua criação até os dias atuais, com a falta 
de dados por parte dos municípios e estados, dentre outros fatores, como as dificuldades de 
acesso aos serviços de saúde nas regiões mais remotas do país, em especial na região Centro-
Oeste, Nordeste e Norte (VILAR et al., 2004). 
O tratamento recomendado pelo Ministério da Saúde para acidentes ofídicos consiste 
na administração, o mais rapidamente possível, do soro antiofídico por via intravenosa, onde a 
quantidade de soro inserido depende da gravidade do acidente (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 
2001). É recomendado que a soroterapia seja complementada com o uso de analgésicos, 
antibióticos e hidratação (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2001). A soroterapia é extremamente 
importante, mas sua eficácia depende muito do tempo decorrido entre o envenenamento e a 
aplicação do soro antiofídico e, quanto mais rápido a soroterapia, maiores são as chances de 
redução da letalidade e os efeitos sistêmicos decorrentes dos envenenamentos por serpentes 
peçonhentas (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2001; PICOLO et al., 2002). 
15 
 
1.2 – SERPENTES: BIOLOGIA, ECOLOGIA, CLASSIFICAÇÃO DOS ACIDENTES 
OFÍDICOS E SOROTERAPIA INDICADA 
1.2.1 - CARACTERÍSTICAS BIOLÓGICAS E ECOLÓGICAS 
As serpentes são vertebrados pertencentes ao filo Chordata, subfilo Vertebrata, classe 
Reptilia, sendo bem próximas filogeneticamente dos lagartos e anfisbenas, com os quais 
partilham à ordem Squamata (FRAGA et al., 2013). São encontradas em quase todo o mundo 
(Figura 1), com exceção dos polos, habitando principalmente regiões temperadas e tropicais, 
onde ocupam praticamentetodos os ambientes disponíveis (terrestres, subterrâneos e 
arbóreos, até as águas continentais e oceânicas) (KASTURIRATNE et al., 2008). 
 
 
 
 
 
 
 
 
FIGURA 1. Distribuição global das serpentes. Retirado de WHO, 2007. 
Esses animais são caracterizados por possuírem um corpo alongado e ápodo 
(ocasionalmente podendo apresentar vestígios de cintura pélvica), revestido por escamas 
epidérmicas, os olhos com pupila vertical ou circular, um par de narinas localizadas na região 
lateral da cabeça, e a mandíbula dividida em duas metades ligadas por um ligamento 
articulado, podendo mover-se independentemente, e facilitando a deglutição presas maiores 
que o seu diâmetro (POUGH et al., 2003). Além disso, as serpentes possuem língua bífida, 
usada para percepção química e tátil, sendo também responsável por captar partículas de 
cheiro, levando-as a região palatar, onde localiza-se o órgão de Jacobson ou vômero-nasal 
(MELGAREJO, 2009). São animais ectotérmicos, fazendo o uso de fontes externas de energia 
16 
 
para controlar a variação térmica do corpo, expondo-se ou evitando o contato com o sol, para 
elevar ou diminuir a temperatura corporal, processo conhecido como termorregulação 
(PINHO; PEREIRA, 2001; MELGAREJO, 2009). 
Algumas serpentes apresentam órgãos termorreceptores que as ajudam a encontrar 
fontes de calor e presas endotérmicas, dentre as quais podem ser destacadas as fossetas labiais 
(depressões nas escamas labiais de alguns Boídeos, Figura 2a) e a fosseta loreal (orifício 
localizado entre o olho e narina dos Viperídeos, Figura 2b) (BERNARDE, 2017). 
 
 
 
 
 
FIGURA 2. Representação das fossetas labial (a) e loreal (b), indicadas pelas setas 
vermelhas, presente em espécies da família Boidae e Viperidae, respectivamente. Fontes: 
http://npabombeiro.blogspot.com e http://npabombeiro.blogspot.com. 
Entre as serpentes, algumas espécies são ovíparas, outras vivíparas, e algumas ainda 
são ovovivíparas (BERNARDE, 2017). Logo após a postura dos ovos, na maioria das vezes 
as fêmeas, abandonam os ovos, com exceção de algumas espécies, que realizam o que para 
alguns autores é considerado como cuidado parental, como é o caso da surucucu-pico-de-jaca 
(Lachesis muta – Linnaeus, 1766), que se enrola junto aos ovos até o momento da eclosão 
(SOUZA, 2007; MELGAREJO, 2009). Após o nascimento os filhotes se dispersam a procura 
de abrigo, água e alimento (CANTER et al., 2008). 
Quanto aos hábitos alimentares, todas as espécies são carnívoras, alimentando-se de 
diversas presas, desde invertebrados (como onicóforos, formigas e camarões) a vertebrados 
variados (como peixes, anfíbios, aves e seus ovos, outros répteis, e mamíferos, 
preferencialmente roedores) (CANTER et al., 2008). A preferência alimentar varia entre as 
espécies, sendo algumas mais seletivas em relação ao tipo de presa (chamadas de 
especialistas), outras predam diversos grupos animais (chamadas de generalistas) 
(BERNARDE, 2017), e algumas espécies chegam até a predar indivíduos da mesma espécie 
(MOSMANN, 2001). 
a b 
http://npabombeiro.blogspot.com/
http://npabombeiro.blogspot.com/
17 
 
Para matarem suas presas, algumas serpentes enrolam-se ao redor do corpo da presa 
realizando um processo chamado constrição, em que as presas são mortas por asfixia. 
Espécies constritoras não possuem presas modificadas, ou seja, dentes inoculadores, como é o 
caso de espécies da família Boidae como jibóias e sucuris. Por outro lado, outras espécies 
fazem o uso da inoculação de veneno através de presas, cuja morfologia e localização na 
cavidade bucal varia entre os diferentes grupos (CANTER et al., 2008). 
As dentições encontradas entre as serpentes podem ser de quatro tipos: áglifa - quando 
não há a presença de dentes modificados em presas; opistóglifa – presas de tamanho variado, 
fixas, situadas na região posterior do maxilar; proteróglifa – presas pequenas, fixas, situadas 
na região anterior do maxilar; e solenóglifa – presas grandes, móveis, situadas na região 
anterior do maxilar (Figura 3) (MELGAREJO, 2009). 
 
 
 
 
 
 
FIGURA 3. Tipos de Dentição das Serpentes. Fonte: Instituto Butantã 
 
1.2.2 – SERPENTES PEÇONHENTAS E DE IMPORTÂNCIA MÉDICA 
 
As serpentes peçonhentas ou de importância são animais que apresentam glândulas 
que produzem toxinas que podem ser inoculadas por presas (dentes modificados) dos tipos 
solenóglifa, proteróglifa e opistóglifa, acarretando em envenenamentos que necessitam de 
intervenção médica (LIRA-DA-SILVA, 2009). 
São conhecidas no mundo cerca de 2.900 a 3.000 espécies peçonhentas, distribuídas 
em 465 gêneros e 20 famílias, e dentre estas somente 10 a 14% destas são de interesse médico 
18 
 
(BÉRNILS, 2009; BERNADE & GOMES, 2012). No Brasil, cerca de 392 espécies já foram 
catalogadas (BÉRNILS; COSTA, 2015), das quais 63 espécies são peçonhentas, que 
apresentam glândulas produtoras de toxinas e presas inoculadoras de veneno (BERNADE; 
GOMES, 2012). As espécies das famílias Viperidae (Bothriopsis, Bothrocophias, 
Bothropoides, Bothrops, Rhinocerophis, Lachesis e Caudisona) e Elapidae (Micrurus e 
Leptomicrurus) (BERNADE, 2011) são todas com importância médica, além de alguns 
gêneros da família Dipsadidae, mas o veneno geralmente causa somente manifestações locais, 
sem muita gravidade, e geralmente seus acidentes não levam o paciente à morte. Contudo, 
existem algumas exceções para as espécies Philodryas olfersii (Lichtenstein, 1823), P. 
patagoniensis (Girard, 1857), P. viridissimus (Linnaeus, 1758) e Clelia plumbea (Wied-
Neuwied, 1820) (=Boiruna sertaneja) para as quais já foi comprovado que seus venenos 
causam o óbito (LIRA-DA-SILVA, 2009). 
1.2.2.1 – SERPENTES DO GÊNERO BOTHROPS (JARARACAS) 
O gênero Bothrops, pertencente à família Viperidae, possuem fosseta loreal, escamas 
do dorso são quilhadas e da cabeça são bem pequenas e numerosas (MELGAREJO, 2009). 
Esse gênero é composto por aproximadamente 30 espécies que estão distribuídas ao longo do 
território nacional (MELGAREJO, 2009). São popularmente conhecidas como jararaca, 
ouricana, jararacuçu, urutu-cruzeira, jararaca-do-rabo-branco, malha-de-sapo, patrona, 
surucucurana, combóia, caiçara entre outras e (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2005) são 
responsáveis por 90% dos acidentes ofídicos no Brasil (BERNADE & GOMES, 2012). 
As serpentes desse gênero habitam principalmente zonas rurais e periferias de grandes 
cidades, com predomínio em ambientes úmidos como matas e áreas cultivadas e locais onde 
se tenha maior facilidade para proliferação de roedores (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2001). 
Na Amazônia, a espécie mais frequentemente encontrada é a jararaca (Bothrops atrox - 
Linnaeus, 1758) (Figura 4), que habita principalmente beiras de rios e igarapés (FRAGA et 
al., 2013). Essas serpentes são mais ativas nos períodos noturnos ou crepusculares e durante 
os meses quentes (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2001). A maioria das espécies deste gênero 
apresenta reprodução sazonal, com o acasalamento ocorrendo geralmente no outono, e o 
nascimento dos filhotes ocorrendo no final do verão (ALMEIDA et al., 2016). Porém os 
ciclos reprodutivos podem variar de acordo com a área de ocorrência, podendo ser pouco 
sazonais ou contínuos em áreas com clima quente e úmido ao longo do ano (que é o caso da 
Amazônia) e sazonais onde há sazonalidade climática (PIZZATTO, 2006). Segundo Zelanis 
19 
 
et al., 2010, ocorre uma variação ortogenética nessas espécies, onde os venenos de adultas e 
filhotes possuem atividades hemorrágicas similares, porém o veneno de adultos é mais letal 
em roedores. Já a atividade coagulante de filhotes é dez vezes mais potente comparadas às 
serpentes adultas, sendo este especializado para agir em animais ectotérmicos, principalmente 
em anuros. 
 
 
 
FIGURA 4. Bothrops atrox (Jararacaquinha-do-rabo-branco) Fonte: Paulo Sérgio Bernarde 
 
Acidentes causados por esse tipo de serpentes são chamados de acidentes botrópicos,os quais são responsáveis por 86,23% dos casos ocorridos no Brasil (BOCHNER; 
STRUCHINER, 2002), onde as principais atividades do veneno são proteolítica (lesões locais 
e destruição tecidual), coagulante (incoagulabilidade sanguínea por consumo de fibrinogênio) 
e hemorrágica (liberação de substâncias hipotensoras e provoca lesões na membrana basal dos 
capilares por ação de hemorraginas) (PINHO; PEREIRA, 2001; MELGAREJO, 2009; 
BERNARDE, 2012). 
A vítima de acidente com essa classificação pode desenvolver um quadro clínico que 
depende muito da quantidade de veneno inoculado, da localização da picada, da idade e, 
especialmente, do tempo decorrido entre o acidente e o atendimento médico (MINISTÉRIO 
DA SAÚDE, 2001). Há diferenças entre o quadro clínico de uma pessoa acometida por um 
20 
 
filhote de Bothrops, onde veneno é predominantemente coagulante, e do adulto, que possui 
veneno com maior ação proteolítica e menor ação coagulante (PINHO; PEREIRA, 2001). 
Algumas manifestações locais são evidenciadas nas primeiras horas após a picada, 
com a presença de edema, dor e equimose na região da picada, sendo que o caso pode evoluir, 
e produzir sangramentos e bolhas com conteúdo seroso ou sero-hemorrágico e dar origem à 
necrose cutânea. As principais complicações locais são decorrentes da necrose e da infecção 
secundária que podem levar à amputação do membro (Figura 5) (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 
2001). 
 
FIGURA 5. Manifestações locais de picada por Bothrops Fonte: Paula, 2010. 
Existem ainda algumas manifestações sistêmicas comuns, como sangramentos na pele 
e mucosas (gengivorragia, e quimoses longe do local da picada), hematúria, hematêmese e 
hemorragia em outras cavidades, o que pode determinar risco ao paciente, bem como 
hipotensão decorrente de sequestro de líquido no membro picado, e ainda hipovolemia 
consequente a sangramentos, que podem contribuir para a instalação de insuficiência renal 
aguda (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2001). 
O tratamento específico consiste no uso precoce, por via endovenosa, das doses (nº 
de ampolas) recomendadas do soro antibotrópico (SAB) ou, na falta deste, das associações 
antibotrópico-crotálico (SABC) ou antibotrópico-laquético (SABL), em ambiente hospitalar, 
de acordo com a avaliação inicial da gravidade (Tabela 1) (PINHO; PEREIRA, 2001). 
21 
 
1.2.2.2 – SERPENTES DO GÊNERO CAUDISONA (CASCÁVEIS) 
 
As serpentes do gênero Caudisona, assim como Bothrops, também fosseta loreal, 
escamas do dorso são quilhadas (MELGAREJO, 2009), são facilmente identificadas pela 
presença de um guizo ou chocalho na extremidade da cauda (PINHO; PEREIRA, 2001). No 
Brasil, há a ocorrência apenas de uma espécie do gênero (Caudisona durissa - Linnaeus, 
1758), popularmente conhecida como Cascavel (Figura 6). Estão amplamente distribuídas 
geograficamente, com ocorrência desde os cerrados do Brasil Central, regiões áridas e 
semiáridas do Nordeste, até os campos e áreas abertas do Sul, Sudeste e Norte (FRAGA et al., 
2013). 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
FIGURA 6. Caudisona durissa (Cascavel) Fonte: Paulo Sérgio Bernarde 
Acidentes causados por esse tipo de serpentes são chamados de acidentes crotálicos, 
são responsáveis por cerca de 7,7% dos acidentes ofídicos no Brasil. Entre as espécies que 
causam acidentes ofídicos no país, esse é o gênero que apresenta maior letalidade, com 1,8% 
dos casos evoluindo para óbito (BERNARDE, 2012). As principais atividades evidenciadas 
no veneno de Caudisona são neurotóxica, miotóxica e coagulante (MELGAREJO, 2009). 
O veneno crotálico praticamente não produz lesão local, mas acarreta dor e edema 
usualmente discretos e restritos ao redor da picada, bem como é comum a ocorrência de 
eritema e parestesia (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2001). Contudo, esse veneno apresenta 
algumas manifestações sistêmicas de atividade neurotóxica, com ação periférica, causando 
22 
 
paralisia flácida da musculatura esquelética, principalmente ocular, facial (Figura 7) e às 
vezes, da respiração, podendo evoluir para insuficiência respiratória; atividade coagulante, 
provocando a ocorrência de sangramento e distúrbios da coagulação por consumo de 
fibrinogênio; e atividade miotóxica sistêmica, causando rabdomiólise generalizada, podendo 
evoluir para insuficiência renal aguda (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2001). 
O tratamento específico recomendado é a administração via endovenosa do soro 
anticrotálico (SAC) ou soro antibotrópico-crotálico (SABC) (BRASIL, 2001). Os pacientes 
devem ser bem hidratados para prevenir a insuficiência renal (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 
2001). 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
FIGURA 7. Manifestações sistêmica de picada por Caudisona Fonte: Paula, 2010 
1.2.2.3 – SERPENTES DO GÊNERO LACHESIS (SURUCUCUS) 
 
O gênero Lachesis é popularmente conhecido como surucucu pico-de-jaca (Lachesis 
muta – Linnaeus, 1766) (Figura 8), também apresenta fosseta loreal, possui escamas eriçadas 
na região ventral da cauda e pode alcançar 3,5 m de comprimento (MELGAREJO, 2009), 
sendo considerada a maior serpente peçonhenta das Américas (BERNARDE, 2017). Além 
disso, elas habitam tanto áreas florestais da Amazônia, como da Mata Atlântica e de alguns 
enclaves de matas úmidas do Nordeste (LIRA-DA-SILVA, 2009; MINISTÉRIO DA SAÚDE, 
2001). 
23 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
FIGURA 8. Lachesis muta (Surucucu ou Pico-de-jaca) Foto: Paulo Sérgio Bernarde. 
 
Acidentes causados por esse tipo de serpentes são chamados de acidentes laquéticos, 
os quais são responsáveis por 9,17% dos casos (BOCHNER; STRUCHINER, 2002), sendo 
três vezes mais letal do que o acidente botrópico e apresentando metade da letalidade do 
acidente crotálico. As principais atividades do veneno são proteolítica (atividade inflamatória 
aguda), hemorrágica, coagulante e neurotóxica (MELGAREJO, 2009; BERNARDE, 2012). 
Tanto as manifestações locais como as sistêmicas são confundidas com as 
apresentadas pelo quadro clínico ocasionado pelo veneno botrópico, sendo, na maior parte dos 
casos, difícil o diagnóstico diferencial (BORGES, 1999). Contudo, o veneno de Lachesis se 
diferencia clinicamente pela presença de alterações vagais como náuseas, vômitos, cólicas 
abdominais, diarreia, hipotensão e choque (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2001). 
O tratamento para o envenenamento laquético é baseado na gravidade do acidente que 
é classificado como moderado ou grave, por conta da grande quantidade de veneno que 
geralmente é introduzida pela serpente (Tabela 1) e, consiste na administração via endovenosa 
do soro antibotrópico-laquético (SABL) (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2001). 
 
1.2.2.4 – SERPENTES DO GÊNERO MICRURUS (CORAL VERDADEIRA) 
24 
 
O gênero Micrurus, conhecidos popularmente por coral, coral verdadeira ou boicorá 
(Figura 9) é os representante da família Elapidae, até pouco tempo atrás, Leptomicrurus, 
também era considerado um gênero dessa família, porém alguns trabalhos como por exemplo, 
Lee, at al., (2015), propõem um novo arranjo taxonômico para essas serpentes, onde deixam 
de existir, tornando-se sinônimo de Micrurus (LEE et al., 2015). Estes animais não 
apresentam fosseta loreal, a pupila do olho é redonda e as escamas dorsais são lisas 
(BERNARDE, 2009). No Brasil são conhecidas aproximadamente 22 espécies, com ampla 
distribuição geográfica (BERNARDE, 2009). Por possuírem hábitos crípticos e apresentarem 
presas fixas e pequenas, esses animais apresentam menor número de acidentes ofídicos 
registrados (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2001). 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
FIGURA 9. Micrurus lemniscatus – Linnaeus, 1758 (coral verdadeira) Foto: Paulo Sérgio 
Bernarde 
Acidentes causados por esse tipo de serpentes são chamados de acidentes elapídicos 
são responsáveis por 0,86% dos acidentes ofídicos no Brasil (BERNARDE, 2012). A 
ocorrência é tão pequena em relação aos outros acidentes ofídicos, que geralmente não são 
expressas em trabalhos científicos (BERNARDE, 2012). O veneno das serpentes desse grupoé neurotóxico com substâncias de baixo peso molecular (neurotoxinas) sendo rapidamente 
absorvidas e difundidas para os tecidos, o que explica a precocidade dos sintomas de 
envenenamento (MELGAREJO, 2009). Este veneno produz bloqueio neuromuscular (pós-
sináptico) levando à paralisia muscular, competindo com a acetilcolina (Ach) pelos receptores 
colinérgicos, atuando de modo semelhante ao curare e também atua na junção neuromuscular 
25 
 
(pré-sináptica), bloqueando a liberação de Ach pelos impulsos nervosos, impedindo a 
deflagração do potencial de ação (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 1998; PINHO; PEREIRA, 
2001). 
Quanto as manifestações locais, pode haver discretas dores e parestesia na região da 
picada, não havendo lesões evidentes (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2001). Por outro lado, 
podem ocorrer fácies miastênica ou neurotóxica como manifestações sistêmicas, que consiste 
na expressão clínica mais comum do envenenamento por coral verdadeira, e as possíveis 
complicações são decorrentes da progressão da paralisia da face para músculos respiratórios 
(MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2001). O acidente elapídico é considerado muito grave, podendo 
causar a morte da vítima em curto intervalo de tempo (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2001).O 
tratamento específico recomendado é a administração via endovenosa do soro antielapídico 
(SAE). Que deve ser administrado na dose de 10 ampolas (Tabela 1). Nos casos com 
manifestações clínicas de insuficiência respiratória, é fundamental manter o paciente 
adequadamente ventilado, seja por máscara e AMBU (reanimador manual), intubação 
traqueal e AMBU ou até mesmo por ventilação mecânica (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2001). 
 
1.2.2.5 – ALGUMAS SERPENTES DA FAMÍLIA DIPSADIDAE 
Muitas espécies da família Dipsadidae apresentam dentição áglifa (Figura 10), não 
oferecendo, portanto, qualquer risco à saúde humana. Embora existam também espécies desta 
família que são opistóglifas, porém o veneno dessas serpentes é geralmente pouco eficiente 
em humanos, com exceção de Philodryas olfersii, P. patagoniensis, P. viridissimus e Clelia 
plumbea (=Boiruna sertaneja), que já apresentaram registro de acidente com óbito no 
SINAN, sendo por tanto de importância médica e registrados de acidentes com os gêneros 
Helicops, Xenodon e Oxyrhopus, mas que não levaram o paciente a óbito, picadas causa 
apenas traumatismo local, como dor, edema e equimose, porém sem alteração da coagulação 
(MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2001). 
26 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
FIGURA 10. Philodryas argentea (cobra-cipó) Foto: Paulo Sérgio Bernarde 
Em um estudo epidemiológico dos acidentes por serpentes consideradas não 
peçonhentas, feito por Hess e Squaiella-Baptistão (2012), onde foram analisados os casos de 
acidentados por P. patagoniensis de 1959 a 2008, os autores constataram que esse veneno é 
capaz de induzir edema, dor, com inflamação aguda, necrose de músculo esquelético, 
ocasionando mionecrose dos tipos coagulativa, miolítica e mista após 24h da inoculação 
(HESS; SQUAIELLA-BAPTISTÃO, 2012). 
O tratamento consiste apenas no uso de anti-inflamatórios da classe não esteroidal, e a 
dor severa é geralmente tratada com analgésicos opioides, pois uso do soro antiofídico nesses 
casos é altamente não recomendado, para não expor os pacientes aos riscos de reações 
adversas (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2001; HESS; SQUAIELLA-BAPTISTÃO, 2012) 
(Tabela 1). 
TABELA 1 - Indicação do número de ampolas de soros antiveneno para tratamento de 
acidentes ofídicos de acordo o Ministério da Saúde 
Classificação e n° de ampolas 
Tipo de acidente Leve Moderado Grave Tipo de Soro 
Botrópico 2 – 4 4 – 8 12 SAB, SABL ou SABC 
Crotálico 5 10 20 SAC ou SABC 
Elapídico * * 10 SAE 
Laquético * 10 20 SABL 
27 
 
1.3 – EPIDEMIOLOGIA DOS ACIDENTES OFÍDICOS NO BRASIL 
 
Acontecem no Brasil aproximadamente 20.000 casos por ano de acidentes com 
serpentes peçonhentas, e uma média de 125 óbitos (BERNARDE, 2014), sendo a maioria dos 
acidentes ocorridos no país é provocado por serpentes do gênero Bothrops (MINISTÉRIO DA 
SAÚDE, 2001), e na Amazônia, a espécie Botrhops atrox, é a responsável pela maioria dos 
envenenamentos (SILVA; BERNARDE; ABREU, 2015). O perfil geral dos acidentados desta 
região é representado por trabalhadores rurais do sexo masculino, com idade economicamente 
ativa, e os membros inferiores são as regiões mais acometidas por picadas (BORGES; 
SADAHIRO; SANTOS, 1999; GUIMARÃES et al., 2015; LIMA; CAMPOS; RIBEIRO, 
2009; MORENO et al., 2005; NASCIMENTO, 2000; WALDEZ; VOGT, 2009), que está de 
acordo com o padrão apresentado por outros estudos realizados nas outras regiões do país 
(BONAN et al., 2010; BRITO; BARBOSA, 2012; SARAIVA et al., 2012; DE PAULA, 
2010). 
Apesar de já ser considerado um grande problema de saúde pública, os acidentes 
ofídicos ainda são pouquíssimo estudados na Amazônia, sobretudo na região nordeste do 
Pará, onde o numero de estudos dessa natureza são ainda são ainda menores. Diante disso, o 
presente estudo tem o objetivo de apresentar o perfil epidemiológico do ofidismo no 
município de Capitão Poço, Pará. 
 
 
 
 
 
 
 
28 
 
2 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 
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31 
 
 
 
 
 
 
 
CAPÍTULO 2 - 
EPIDEMIOLOGIA DOS ACIDENTES 
OFÍDICOS NOTIFICADOS NO 
MUNICÍPIO DE CAPITÃO POÇO, 
PARÁ, BRASIL. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
32 
 
1– INTRODUÇÃO 
Os acidentes ofídicos representam um importante problema de saúde pública devido à 
alta frequência em que ocorrem e à sua elevada morbimortalidade, principalmente em países 
tropicais (PINHO, 2001; WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2007). Estima-se que 
anualmente ocorram cerca de 2.500.000 acidentes relacionados a serpentes peçonhentas no 
mundo, dos quais 125.000 levam o paciente a óbito (MACHADO, 2012). No Brasil, são 
registrados aproximadamente 29.000 casos de envenenamentos por serpentes a cada ano, com 
4,31% dos casos evoluindo para óbito do paciente (BERNARDE, 2014; GUIMARÃES et al., 
2015). Entre as regiões do país, a região amazônica apresenta a maior incidência de casos por 
habitantes (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2007; BERNARD; GOMES, 2012). 
O Brasil apresenta atualmente 63 espécies de serpentes peçonhentas (BÉRNILS; 
COSTA, 2015) distribuídas em quatro famílias (Viperidae, Elapidae, Colubridae e 
Dipsadidae), cujos envenenamentos são classificados como botrópico (MELGAREJO, 2003), 
causado por picadas de serpentes dos gêneros Bothriopsis, Bothrocophias, Bothropoides, 
Bothrops e Rhinocerophis popularmente conhecidas como jararacas e responsáveis por 
86,23% dos casos; crotálico, causado por picadas de serpentes anteriormente pertencentes ao 
gênero Crotalus e recentemente alocada no gênero Caudisona (BERNARDE, 2011), 
conhecidas popularmente como cascavéis e responsáveis por 9,17% dos casos; laquético 
causado por picadas de serpentes do gênero Lachesis conhecido popularmente como 
surucucu-pico-de-jaca e responsável por 3,72% dos casos; e elapídico causado por picadas de 
serpentes do gênero Micrurus, conhecidos popularmente por corais-verdadeiras e 
responsáveis por 0,86% dos casos (BERNARDE, 2012). 
De acordo com Pardal (1997), os gêneros de serpentes peçonhentas estão distribuídos 
geograficamente pelo país da seguinte forma: Bothrops e Micrurus são encontrados em todo o 
Brasil, em áreas de floresta, campos e descampados; o gênero Lachesis está associado as áreas 
florestadas da Mata Atlântica e da Amazônia; o gênero Crotalus não ocorre em florestas, 
sendo encontrado em campos, áreas secas, arenosas e pedregosas. Existem registros dessa 
última serpente em algumas regiões da Amazônia, onde existem áreas de campos, como na 
Ilha do Marajó, Santarém e no norte do Amapá, que são considerados enclaves de savana na 
Amazônia (MELGAREJO, 2003). 
A grande dimensão territorial da Amazônia, seus fragmentos florestais ocasionados 
pela acelerada urbanização, a situação precária (sem o mínimo de segurança) das atividades 
33 
 
agrícolas (sobretudo da agricultura familiar), somado às dificuldades de acesso aos serviços 
de saúde pública (PARDAL, 2000), podem dificultar o registro e o tratamento desses 
acidentes, fazendo com que haja ainda subnotificação de registros (MINISTÉRIO DA 
SAÚDE, 2001). 
Segundo Bochner (2003),que analisou o registro de acidentes ofídicos ao longo de 
100 anos (de 1900 até o ano 2000), o perfil epidemiológico se manteve inalterado ao longo 
deste período, onde a maioria dos pacientes acometidos por picadas de serpentes peçonhentas 
são indivíduos do sexo masculino, trabalhadores rurais, com idade entre 15 a 49 anos, que tem 
principalmente os membros inferiores atingidos, sendo serpentes do gênero Bothrops as 
responsáveis pela maioria dos acidentes, cuja letalidade é de 0,45%. 
No Brasil, segundo o Portal da Saúde do Ministério da Saúde (2014), a taxa de 
incidência de acidentes ofídicos é de 13,4 casos para cada 100.000 habitantes, com 120 
mortes registradas (letalidade de 0,44%), sendo a região Norte a que mais apresenta acidentes 
(35,5%), seguida das regiões Nordeste (22,7%), Sudeste (22,2%), Centro-Oeste (10,5%) e Sul 
(9%) (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2014). 
Com diferenças regionais, o ofidismo apresenta sazonalidade marcante, relacionada a 
fatores climáticos e da atividade humana no campo, com predomínio de incidência nos meses 
chuvosos e quentes (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2001). Um estudo realizado em um dos 
estados da região Amazônica, feito por Moreno (2005), mostrou que 51,4% dos casos 
ocorreram nos cinco primeiros meses do ano, sobretudo no mês de abril. Isso se deve, 
provavelmente, ao período caracterizado por altas temperaturas e elevados índices 
pluviométricos, uma vez que, nesta região, a estação seca ocorre principalmente de julho a 
setembro, enquanto a estação chuvosa ocorre principalmente de janeiro a março (MORENO 
et al., 2005; WALDEZ; VOGT, 2009; BERNARDE; GOMES, 2012; SINIMBU, 2012; 
GUIMARÃES et al., 2015; SILVA, et al., 2016). 
O presente estudo foi realizado no município de Capitão Poço, Mesorregião Nordeste 
Paraense, na Amazônia oriental, que possui uma economia voltada principalmente para 
agricultura, apresentando uma grande produção de citros e pimenta do reino (IBGE, 2017), 
concentrando a maior produção de laranja do norte do Brasil (SAGRI, 2017). Por se tratar de 
uma região principalmente rural, que apresenta intenso fluxo de pessoas no campo, o encontro 
34 
 
com serpentes é frequente, o que aumenta a probabilidade da população ser acometida por 
acidentes ofídicos (MORENO et al., 2005). 
Dessa forma, o presente estudo buscou caracterizar o perfil epidemiológico dos 
acidentes ofídicos notificados na Secretaria de Saúde do município de Capitão Poço de forma 
que o presente estudo possa fornecer subsídios para a elaboração de campanhas de 
conscientização e educação populacional que visem minimizar esse grave problema de saúde 
pública. 
2 – OBJETIVOS 
2.1 – OBJETIVO GERAL 
Descrever aspectos epidemiológicos dos acidentes ofídicos registrados entre os anos 
de 2010 e 2017 no município de Capitão Poço, Pará, Brasil. 
2.2 – OBJETIVOS ESPECÍFICOS 
 Avaliar a incidência de acidentes ofídicos entre 2010 e 2017, no município de Capitão 
Poço, Pará. 
 Evidenciar o perfil social das pessoas acometidas por acidentes ofídicos entre 2010 e 
2017, no município de Capitão Poço, Pará. 
 Verificar quais as espécies de serpentes responsáveis pelos acidentes ofídicos no 
município de Capitão Poço, Pará. 
 Caracterizar espacialmente e temporalmente a dinâmica dos acidentes ofídicos entre 
2010 e 2017, no município de Capitão Poço, Pará. 
 Descrever os principais aspectos clínicos dos acidentes ofídicos registrados entre 2010 
e 2017, no município de Capitão Poço, Pará. 
3 – MATERIAL E MÉTODOS 
3.1 – ÁREA DE ESTUDO 
O presente estudo foi realizado no município de Capitão Poço, Pará, Brasil, cuja sede 
encontra-se localizada nas coordenadas 01º44'47" S e 47º03'34" O, a 73 metros altitude 
35 
 
(IBGE, 2017). O município limita-se ao norte pelo município de Ourém, a leste pelos 
municípios de Santa Luzia do Pará e Garrafão do Norte, ao sul pelos municípios de Ipixuna 
do Pará e Nova Esperança do Piriá e a oeste pelos municípios Aurora do Pará, Mãe do Rio e 
Irituia (Figura 01). Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o 
município possui uma área de 2.714,85 Km² que abriga uma população de aproximadamente 
51.893 habitantes (IBGE, 2017). 
As atividades econômicas desenvolvidas no município são, em sua maioria, agrícolas, 
voltadas para o cultivo de limão, laranja, mel, pimenta-do-reino, feijão, mandioca, frutas e 
legumes (IBGE, 2017). A cidade é considerada a maior produtora de laranja do norte do 
Brasil, atividade esta que gera uma renda de aproximadamente 50 milhões de reais por ano e 
cerca de 30 mil empregos temporários diretos e indiretos (SAGRI, 2017). Além da 
agricultura, atividades como pecuária e extração vegetal (madeira) e mineral (seixo e areia) 
também contribuem com a economia local e nacional (HOMMA et al., 2014). 
 
 
 
 
 
 
 
 
FIGURA 01. Localização geográfica do município de Capitão Poço, Estado do Pará, 
Brasil. 
 
3.2 – OBTENÇÃO DOS DADOS 
Para realização do presente estudo, foram consultadas fichas de notificação do Sistema 
de Informação de Agravo De Notificação – SINAN, utilizadas pela Secretaria de Saúde do 
https://pt.wikipedia.org/wiki/Instituto_Brasileiro_de_Geografia_e_Estat%C3%ADstica
36 
 
município de Capitão Poço para registro de acidentes ofídicos (ANEXO). Foram avaliadas as 
notificações realizadas entre janeiro de 2010 e dezembro de 2017. 
De cada ficha de notificação avaliada foram extraídas informações referentes ao tempo 
e espaço, tais como: mês e ano de ocorrência dos acidentes, além da zona de ocorrência dos 
mesmos (rural ou urbana). Também foram registradas qual o gênero de serpente responsável 
pelo acidente, além de características socioeconômicas do paciente acometido, tais como 
idade, sexo, escolaridade e ocupação, e ainda relacionado ao paciente, foram obtidas 
informações sobre o local do corpo onde ocorreu a picada, e características do acidente, como 
o tempo decorrido entre o acidente e o atendimento, a classificação do caso (leve, moderado 
ou grave), terapia instituída e evolução do caso. Os dados foram digitalizados utilizando o 
software Microsoft Excel
®
, versão 2010. 
Para comparação entre a quantidade de acidentes ocorridos em cada mês ao longo do 
período estudado e a pluviosidade, os dados de precipitação média mensal dos oito anos 
estudados foram obtidos através da estação meteorológica do INMET instalada na 
Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA), campus Capitão Poço. 
 
3.3 – ANÁLISE DOS DADOS 
Para verificar possíveis diferenças no número de acidentes entre os meses amostrados, 
os dados obtidos entre 2010 e 2017 foram inseridos em um modelo anual geral representado 
por doze meses. Ou seja, em caso de registro de acidente em janeiro de todos os oito anos 
estudados, o mês de janeiro, no modelo geral, seria representado por oito repetições. O longo 
dos doze meses, a quantidade de acidentes em cada repetição foi testada quanto as premissas 
estatísticas de normalidade e homocedasticidade. Posteriormente, foi realizado o teste não 
paramétrico de Kruskal-Wallis (H), seguido por um teste a posteriori de comparação múltipla. 
Tais testes foram realizados considerando um nível de significância de 5% (Zar, 2010), 
utilizando o pacote vegan do software R versão 3.4.4 (R Core Team, 2018). 
A variação mensal no número de acidentes foi visualmente comparada com a 
precipitação média mensal dos oito anos estudados. A comparação do número de acidente 
entre as demais variáveis (ex. sexo, idade, local da picada, entre outros) fora realizada apenas 
de maneira descritiva. 
37 
 
4 – RESULTADOS 
Foram registrados 244 acidentes ofídicos no total, resultando em uma média de 35 
acidentes por ano. O maior número de envenenamentos por serpentes foi observado em 2013 
que apresentou 22,54% (n = 55) do total de acidentes entre os anos de 2010 e 2017. O 
segundo ano com maior número de agravos foi o ano de 2010, quando foram notificados 
21,31% (n= 52) doscasos, seguido pelos anos de 2014 com 17,21% (n = 42), 2016 com 
11,48% (n = 28), 2017 com 10,25% (n = 25), 2015 9,84% (n = 24) e 2012 com 7,38% (n = 
16). É importante ressaltar que as fichas de notificação referente ao ano de 2011 e as do 2º 
semestre de 2012 não foram localizadas na Secretária de Saúde do município e por esse 
motivo, não foram contabilizadas no presente estudo. Embora tais dados encontrem-se 
disponíveis no Sistema de Informação de Agravo de Notificação – SINAN, não foram 
considerados, uma vez que incongruências entre estas diferentes bases de dados tem sido 
reportada em estudos anteriores (SARACENI et al., 2005; SANTA RITA et al., 2016) 
Considerando os oito anos de estudo como um todo, o mês de março apresentou o 
maior número de acidentes (19,26%; n = 47), seguido pelos meses de fevereiro (10,25%; 
n=25), abril (9,43%; n = 23), maio (9,02%; n =22), novembro (9,02%; n =22), janeiro (8,20%; 
n =20) e junho (8,20%; n =20). Os meses com menor número de acidentes foram setembro 
(4,92%; n=12), outubro (4,92%; n=12), agosto (5,33%; n =13), julho (5,74%; n =14) e 
dezembro (5,74%; n =14). Não houve evidencias de diferenças significativa no número de 
acidentes considerando os doze meses como um todo (H11;71 = 17,9; p > 0,05), no entanto 
foram registradas diferenças significativas no número de acidentes ocorridos no mês de março 
em comparação com os meses de janeiro, abril, julho, agosto, setembro, outubro e dezembro; 
bem como entre o número de acidentes ocorrido no mês de setembro em relação aos meses de 
fevereiro e junho (Figura 02). 
O gênero Bothrops foi o responsável por 97,54% (n=238) dos acidentes registrados. 
Foram reportados ainda 2,05% (n=5) casos ignorados e apenas um caso (0,41%) foi atribuído 
a espécies que não são de importância médica. Acidentes crotálicos e elapídicos não foram 
notificados no período estudado. Embora todos os acidentes tenham sido classificados como 
botrópicos, três pacientes apresentaram sintomas referente à síndrome vagal, observada 
apenas em acidentes laquéticos. 
 
38 
 
 
 
 
FIGURA 02. Variação mensal da pluviosidade e do número de acidentes ofídicos notificados 
entre os anos de 2010 a 2017, no município de Capitão Poço, Pará, Brasil. 
Quanto ao tipo de ambiente onde ocorreram os acidentes, é possível observar, para o 
conjunto de dados como um todo, um maior número de acidentes nas zonas rurais (n=213; 
89,12%) do que nas zonas urbanas (n=26; 10,88%) do município (Figura 03). Em quatro 
casos (1,67%) essa informação não foi preenchida no formulário e em um caso (0,42%) foi 
ignorada. Analisando cada mês individualmente, verificou-se um maior número de acidentes 
ocorridos na zona rural no mês de março (n=37; 17,37%), enquanto o menor índice de 
acidentes nesse local foi observado no mês de outubro (n=9; 4,23%). Quanto à zona urbana, 
mais acidentes foram observados também no mês de março (n=10; 38,46%) enquanto a menor 
incidência foi verificada no mês de novembro, onde nenhum acidente foi registrado durante 
os meses estudados. 
 
 
 
 
 
 
 
FIGURA 03. Registro de notificações relacionadas aos acidentes ofídicos, segundo a zona de 
ocorrência, registradas na Secretária de Saúde de Capitão poço, Pará, no período de 2010-
2017. 
39 
 
Pessoas do sexo masculino foram mais acometidas pelos acidentes (n=204; 83,6%) do 
que o sexo feminino (n=40; 16,4%). A maioria dos acidentes acometeu adultos com idade 
entre 20 e 39 anos (n=98; 40,2%), seguida por crianças e jovens com idade entre 1 e 9 anos 
(n=74; 30,3%), adultos com idade entre 40 e 59 anos (n=51; 20,9%) e idosos com idade 
superior a 60 anos (n=21; 8,5%) (TABELA 01). 
Tabela 01 - Distribuição dos casos de acidentes ofídicos notificados na Secretaria Municipal 
de Saúde de Capitão Poço (PA), de janeiro de 2010 a dezembro de 2017, de acordo com a 
faixa etária e o sexo do acidentado. 
FAIXA ETÁRIA 
 ♀ ♂ TOTAL 
 N % N % N % 
0 a 4 2 0,8 1 0,4 3 1,2 
5 a 14 10 4,1 34 13,9 44 18,0 
15 a 19 6 2,5 21 8,6 27 11,1 
20 a 39 7 2,9 91 37,3 98 40,2 
40 a 59 12 4,9 39 16,0 51 20,9 
60 a 64 1 0,4 8 3,3 9 3,7 
65 a 69 1 0,4 4 1,6 5 2,0 
70 a 79 
>80 
1 
0 
0,4 
0 
3 
3 
1,2 
1,2 
4 
3 
1,6 
1,2 
TOTAL 40 16,4 204 83,6 244 100,0 
 
De acordo com o grau de escolaridade, verificou-se que a maioria das vítimas não 
completou o ensino fundamental (54,92%; n=134), enquanto em 17,21% dos casos essa 
informação não foi preenchida na ficha de notificação, seguido por analfabetos (11,07%; 
n=27), pessoas com ensino médio completo (5,74%; n=14), ensino médio incompleto (4,10%; 
n=10), em 4,10% (n=10) dos casos essa informação foi ignorada, em 2,46% dos casos as 
pessoas apresentaram fundamental completo (n=6) e em apenas um caso (0,41%) a vítima 
apresentava nível superior (Figura 04). 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
40 
 
FIGURA 04 - Distribuição dos 244 casos de acidentes ofídicos notificados na Secretaria 
Municipal de Saúde de Capitão Poço (PA), de janeiro de 2010 a dezembro de 2017, de acordo 
com o nível de escolaridade. 
 
A maioria dos acidentes ocorreu com agricultores (n=148; 60,7%), em seguida 
estudantes foram mais acometidos (n=54; 22,1%) e por último, aposentados (n=12; 4,9%). As 
demais ocupações somadas representaram 3% dos casos analisados (n=9) e em 8,6% dos 
casos essa informação foi ignorada (n= 21). Na maioria dos casos, a relação entre o trabalho e 
o acidente foi ignorada (n=124; 50,8%), em 83 casos (34%) não houve relação com trabalho, 
em 34 casos (13,9%) houve relação com o trabalho e por fim, em três registros (1,2%) essa 
informação não foi preenchida (TABELA 02). 
 
 
TABELA 02 - Distribuição dos casos de acidentes ofídicos notificados na Secretaria 
Municipal de Saúde de Capitão Poço (PA), de janeiro de 2010 a dezembro de 2017, de acordo 
com a ocupação e se tem relação com o trabalho. 
OCUPAÇÃO 
ACIDENTES RELACIONADOS AO TRABALHO 
Ignorado Não 
Não 
Preenchida 
Sim Total % 
Agente comunitário de saúde 0 1 0 0 1 0,4 
Agricultor/Lavrador 69 47 2 30 148 60,7 
Aposentado 9 3 0 0 12 4,9 
Autônomo 0 1 0 0 1 0,4 
Do Lar 1 0 0 0 1 0,4 
Doméstica 0 1 0 0 1 0,4 
Estudante 35 19 0 0 54 22,1 
Funcionário Público 1 0 0 0 1 0,4 
Ignorada 7 9 1 4 21 8,6 
Motorista 1 0 0 0 1 0,4 
Orientadora Social 1 0 0 0 1 0,4 
Professor 0 1 0 0 1 0,4 
Servente de Pedreiro 0 1 0 0 1 0,4 
Total 124 83 3 34 244 - 
% 50,8 34,0 1,2 13,9 100 - 
41 
 
Os membros inferiores foram os mais atingidos, sendo o pé (n=167; 68,44%) e a perna 
(n=39; 15,98%) as áreas mais afetadas, já membros como a coxa e o dedo do pé, registraram 
índices bem baixos (n=2; 0,82%) e n=1; 0,41%) respectivamente, quanto aos membros 
inferiores, a mão (n=19; 7,79%) e os dedos da mão (n=8; 3,28%) foram as áreas com o maior 
número de picadas, tendo ainda o ante-braço (n=4 1,64%), o braço (n=2; 0,82%) e o tronco 
com (n=1; 0,41%). E ainda um (0,41%) em que essa informação não foi preenchida, como 
mostra a figura 05. 
 
 
 
 
 
 
 
 
FIGURA 05. Notificações de acidentes ofídicos, segundo região anatômica acometida, 
registradas na Secretária de Saúde de Capitão poço, Pará, no período de 2010-2017. 
Na maior parte dos casos, manifestações locais foram as alterações clínicas mais 
encontradas, com dor e edema sendo os sintomas mais frequentes (99,59%; n=243). Com 
relação às alterações sistêmicas, manifestações hemorrágicas (2,87%; n=7) foram as mais 
observadas, seguidas das manifestações vagais (náuseas e vômitos) (1,23%; n=3), de 
manifestações miolíticas/hemolíticas (0,82%; n=2), renais (0,82%; n=2) e neuroparalíticas 
(0,41%; n=1) (TABELA 03). 
 
 
 
 
 
 
 
42 
 
TABELA 03 - Distribuição dos casos de acidentes ofídicos notificados na Secretaria 
Municipal de Saúde de Capitão Poço (PA), de janeiro de 2010 a dezembro de 2017, de acordo 
Manifestações locais e sistêmicas identificadas nas fichas de notificações do SINAN. 
MANIFESTAÇÕESLOCAIS Valor absoluto Percentual 
Dor 243 99,59 
Edema 240 98,36 
Equimose 9 3,69 
Outros 3 1,23 
MANIFESTAÇÕES SISTÊMICAS Valor absoluto Percentual 
Neuroparalíticas 1 0,41 
Hemorrágicas 7 2,87 
Vagais 3 1,23 
Miolíticas/Hemolíticas 2 0,82 
Renais 2 0,82 
 
A maior parte dos acidentes foi classificada como leve (90,98%; n=222), seguido pelo 
grau moderado com 18 casos (7,38%) e dois casos (0,82%) considerados como graves. 
Apenas em um caso (0,41%) essa informação foi ignorada e em outro (0,41%) não foi 
preenchida. Os resultados apontam ainda que, em praticamente metade dos casos (44,3%; 
n=108), o tempo decorrido entre a picada até o atendimento ambulatorial foi a maioria entre 1 
e 6 horas, (1 a 3; n=108) e (3 a 6; n=108), equivalente a mais de 70% dos casos e que a 
maioria dos casos evoluiu para cura (95,90%; n=234). Em nove casos (3,69%) essa 
informação não foi preenchida e um caso (0,41%) foi ignorado (FIGURA 06). 
 
 
 
 
 
 
FIGURA 06. Notificações de acidentes ofídicos, segundo a gravidade dos acidentes e o 
tempo até o atendimento. 
43 
 
As análises da também mostraram uma grande quantidade de dados ignorados ou que 
simplesmente não foram preenchidos pelo profissional de saúde responsável pelo atendimento 
dos pacientes, durante o período estudado. Onde variáveis como: se o acidente tem algum tipo 
de relação com o trabalho (n= 124), a ocupação (n=21), o tipo de acidente (5), tempo 
decorrido picada/atendimento (n=3) classificação do caso (n=1) e evolução do caso (n=1) 
(Tabela 04), não tiveram o preenchimento mais indicado pelo Ministério da Saúde. 
TABELA 04 – Dados ignorados ou não preenchidos 
DADOS IGNORADOS NO PREENCHIMENTO DA FICHA 
VARIÁVEIS QUANTIDADE 
Acidente relacionado ao trabalho 124 
Ocupação 21 
Escolaridade 10 
Tipo de acidente 5 
Tempo decorrido picada/atendimento 3 
Classificação do caso 1 
Evolução do caso 1 
Total 165 
 
Com relação à soroterapia, dos 238 casos atribuídos como acidentes botrópicos, 
grande parte foi tratada com soro antibotrópico (n=203; 85,29%), havendo 32 casos (13,45%), 
em que nenhum soro antiofídico foi administrado. Houve uma situação (n=01; 0,42%) em que 
a soroterapia instituída foi o soro antibotropicolaquético SABL, e uma (n= 01; 0,42%) em que 
essa informação não foi preenchida. Em um caso de acidente identificado como botrópico, foi 
instituído o soro antiescorpiônico (TABELA 05). 
 
 
 
 
 
44 
 
TABELA 05 - Distribuição dos casos de acidentes ofídicos notificados na Secretaria 
Municipal de Saúde de Capitão Poço (PA), de janeiro de 2010 a dezembro de 2017, de acordo 
com o tipo de acidente e a soroterapia instituída. 
 
SAB SABL SAEs Nenhum 
Não 
preenchida 
Nº de casos 
V.A. % V.A. % V.A. % V.A. % V.A. % V.A. % 
Acidente 
botrópico 
203 85,29 1 0,42 1 0,42 32 13,45 1 0,42 238 97,54 
Acidente 
laquético 
0 0,00 0 0,00 0 0,00 0 0,00 0 0,00 0 0,00 
Não 
peçonhenta 
0 0,41 0 0,00 0 0,00 1 0,00 0 0,00 1 0,41 
Informação 
ignorada 
4 80,00 0 0,00 0 0,00 1 20,00 0 0,00 5 2,05 
Informação 
não preenchida 
0 0,00 0 0,00 0 0,00 0 0,00 0 0,00 0 0,00 
Total 207 84,84 1 0,41 1 0,41 34 13,93 1 0,41 244 100 
SAB - soro antibotrópico; SABL - soro antibotropicolaquético; SABC - soro antibotropicocrotálico; SAEs - soro 
antiescorpiônico V.A. - valor absoluto. 
 
 
5 – DISCUSSÃO 
O município de Capitão Poço apresentou uma quantidade expressiva de acidentes 
ofídicos, com uma média equivalente a 35 acidentes/ano, o que equivale a 59,4 
acidentes/100.000. Levando-se em consideração que o município tem aproximadamente 
51.893 habitantes (IBGE, 2014) e que o coeficiente de incidência de acidentes na região Norte 
é de 52 acidentes/100.000 habitantes (PAULA, 2010), os números apresentados são 
relativamente altos. 
Os acidentes ofídicos foram mais frequentes nos meses de janeiro, fevereiro, março, 
abril, maio, junho e novembro, que correspondem aos meses com os maiores índices 
pluviométricos na região Amazônica. Nesse período, ocorreram 73,38% dos agravos 
registrados no município de Capitão Poço, nos anos estudados. Esse fato destoa do indicado 
pela Fundação Nacional da Saúde, que sugere a ausência de sazonalidade marcante na 
distribuição mensal dos acidentes ofídicos na região amazônica, onde os mesmos tenderiam a 
ocorrer de maneira uniforme durante todo o ano (ARAÚJO et al., 2003; MINISTÉRIO DA 
SAÚDE, 2001). Contudo, estudos prévios realizados em vários estados da Amazônia 
brasileira já haviam demonstrado que meses com altas temperaturas e elevados índices 
pluviométricos correspondem também ao período de maior incidência de acidentes ofídicos, 
contrapondo as informações da Fundação Nacional de Saúde (MORENO, et al., 2005; 
WALDEZ; VOGT, 2009; BERNARDE; GOMES, 2012; SINIMBU, 2012; GUIMARÃES et 
45 
 
al., 2015; SILVA, et al., 2016). Esses meses coincidem também com o período em que as 
atividades rurais são intensificadas na região devido principalmente ao período de colheita e 
limpeza das áreas cultivadas, o que provavelmente provoca uma maior exposição da 
população à fauna ofídica, aumentando também os riscos de acidentes (MORENO et al., 
2005; NASCIMENTO, 2000; WALDEZ; VOGT, 2009). 
A estação chuvosa no município de Capitão Poço, inicia-se em meados do mês de 
novembro e, de acordo com alguns agricultores da região, é também neste período em que a 
colheita de espécies cítricas, muito cultivadas no município, é realizada. Nesse mesmo mês, 
porém, na primeira quinzena, período final da estação seca, pequenos produtores também 
realizam a limpeza manual das suas áreas de cultivo, o que também pode favorecer o encontro 
com as serpentes (FEITOSA; MELO; MONTEIRO, 1997). Assim, o alto número de acidentes 
ocorridos no mês de novembro aqui evidenciado pode estar relacionado ao maior fluxo de 
trabalhadores nas áreas rurais, seja realizando a colheita, ou preparando a área para (limpeza e 
queima do roçado) para novas plantações. 
Assim como em outros estudos (BERNARDE, 2014; CAMPBELL; LAMAR, 2004; 
GUIMARÃES; PALHA; SILVA, 2015; SILVA; BERNARDE; ABREU, 2015), a grande 
maioria dos acidentes foi atribuída ao gênero Bothrops. Serpentes desse gênero tem uma 
ótima capacidade de se adaptar a diferentes tipos de ambientes (BERNARDE, 2014), sendo 
frequentes nos mais variados ecossistemas, tanto em zonas rurais, como urbanas (MORENO 
et al., 2005). 
É importante destacar que a identificação do tipo de acidente geralmente é feita com 
base em sintomas clínicos, já que dificilmente o animal é capturado e levado junto com o 
paciente para fornecer uma identificação precisa. Sendo assim, incertezas ou incongruências 
relacionadas a este quesito podem ocorrer (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2001). 
Por Capitão Poço ser um município basicamente rural, já era esperado que a maioria 
das notificações durante o período de estudo fossem atribuídas a casos ocorridos na zona 
rural, tendo agricultores como as maiores vítimas. Esse público encontra-se mais susceptível 
ao encontro com serpentes, corroborando com o que foi visto em muitos outros estudos 
epidemiológicos sobre acidentes ofídicos no Brasil (GUIMARÃES; PALHA; SILVA, 2015; 
MORENO et al., 2005; NASCIMENTO, 2000; WALDEZ; VOGT, 2009) 
46 
 
O maior número de acidentes envolvendo indivíduos do sexo masculino, moradores ou 
trabalhadores da zona rural, com idade economicamente ativa entre 20 e 59 anos, mostra que 
o ofidismo é um importante problema de saúde ocupacional na região, devido à maior 
exposição deste público às serpentes e consequentemente a possíveis acidentes ofídicos 
(BOCHNER; STRUCHINER, 2003; MORENO et al., 2005). Esse mesmo padrão também foi 
verificado em outros estudos realizados em diferentes regiões do Brasil, como Borges (1999), 
Nascimento (2000), Nicoleti (2000) e Bochner; Struchiner (2003). 
No presente estudo, os membros inferiores foram os mais atingidos, com mais da 
metade de todos os casos notificados no período estudado evidenciandoo pé como a área 
mais acometida pelas picadas. Esse fato possivelmente está relacionado ao hábito terrestre da 
serpente Bothrops atrox, bastante frequente e abundante na região, que é de pequeno e médio 
porte, o que pode limitar a altura alcançada pelo seu bote (D’AGOSTINI; CHAGAS, 2011). 
Além disso, verificou-se que a não utilização de equipamentos de proteção individual (EPI) 
tem sido determinante para essa grande ocorrência dos acidentes, sobretudo no que diz 
respeito aos resultados obtidos à respeito das regiões posteriores do corpo, como a mão e o 
dedo da mão, que também foram regiões bastante acometidas por picadas de serpentes, como 
esses membros são bastante utilizados durante limpeza do solo, o uso de EPI’s facilmente 
evitariam uma boa parte desses acidentes. 
Em relação ao grau de escolaridade das vítimas, os resultados deste estudo coincidem 
com os encontrados em outros trabalhos como Guimarães, Palha e Silva (2015) que 
realizaram um estudo na ilha de Colares, no estado do Pará, e como verificado por Moreno 
(2005) em Rio Branco, no Acre, onde pessoas que possuíam apenas o nível fundamental 
incompleto foram as mais acometidas por esse tipo de acidente, reforçando a hipótese de que 
os trabalhadores rurais deixam de estudar para ajudar no sustento da família (PAULA, 2010). 
As manifestações locais mais frequentes caracterizaram-se por dor, sangramento e 
edema, que correspondem ao quadro clínico mais frequente em acidentes botrópicos e 
laquéticos de acordo com a literatura (BORGES, 1999; PARDAL et al., 2000; MORENO et 
al., 2005). 
Do total de casos registrados, três casos que foram classificados como acidente 
botrópico, apresentaram manifestações sistêmicas vagais caracterizados pela ativação do 
sistema nervoso autônomo parassimpático causando sintomas como hipotensão arterial, 
47 
 
bradicardia, tontura, escurecimento da visão, vômitos, cólica abdominal e diarreia (Brasil, 
2001), que são descritos como típicos de envenenamento por Lachesis (MINISTÉRIO DA 
SAÚDE, 2003, BERNARDE, 2017). Destes três casos, um recebeu soro 
antibotrópicolaquético (SABL), um caso foi tratado com soro antibotrópico (SAB) e o outro 
não foi tratado com nenhum tipo de soro antiofídico. Em um outro caso classificado como 
acidente botrópico, foi administrado o soro antiescorpiônico. Esse fato evidencia 
incongruências relacionadas à aplicação do tratamento adequado, bem como o despreparo da 
equipe no preenchimento das fichas, gerando dúvidas acerca da identificação dos 
envenenamentos ou das informações contidas nas fichas e mostra a necessidade de 
qualificação dos profissionais que prestam assistência a esses pacientes. Outros estudos como 
os de Guimarães; Palha; Silva, (2015); Moreno (2005) e Souza (2013), demonstraram que 
aplicações inadequadas do soro acontecem com certa frequência. 
Quanto à gravidade dos casos, a maioria foi classificado como de grau leve, seguido 
por grau moderado e apenas um caso grave. Para Nicoleti (2000), a gravidade do caso é 
determinada de acordo com o número de ampolas de soro utilizadas no tratamento, reforçando 
que o tempo transcorrido entre a picada e o atendimento é decisivo para a determinação da 
gravidade do caso (MORENO et al., 2005; BERNARDE, 2012).Durante as analises das 
fichas, verificou-se que nenhum paciente foi a óbito ou apresentou qualquer tipo de sequela, 
mesmo tendo apresentado um caso grave, porém fica difícil afirmar que todos tiveram sucesso 
total no tratamento, já que em nove fichas essa informação não foi preenchida e em uma foi 
simplesmente ignorada . Neste estudo, na maioria dos casos classificados como leve, as 
vítimas receberam atendimento entre uma e seis horas após o acidente, confirmando que a 
rápida procura por atendimento aumenta a probabilidade de cura dos pacientes (BORGES et 
al.,1999; MORENO et al., 2005). 
Os nossos dados também evidenciaram uma alta incidência de itens ignorados ou não 
preenchidos nas fichas, em todas as categorias. Isso dificulta a realização de estudos mais 
detalhados, podendo, inclusive, gerar incertezas quanto aos padrões observados, e, portanto, 
dificultar a formulação e aplicação de políticas mais direcionadas ao combate desse 
importante problema de saúde pública (BERNARDE; GOMES 2012; DA SILVA, 2016). O 
que novamente reforça a necessidade de treinamento e capacitação dos profissionais da área, 
não somente quanto ao preenchimento das fichas de notificações, como também em relação 
ao ofidismo de maneira geral (BERNARDE; GOMES 2012). 
48 
 
6 – CONCLUSÃO 
Os resultados obtidos neste estudo não diferem dos encontrados por outros autores, em 
diferentes regiões do Brasil, mostrado que o perfil geral das vítimas corresponde a homens 
adultos, agricultores, com idade economicamente ativa de 20 a 59 anos, atingidos com maior 
frequência nos membros inferiores, sendo o gênero Bothrops responsável pela maioria dos 
acidentes ocorridos no período estudado. 
É necessário que haja uma melhor conscientização da população com relação à 
importância do uso da indumentária adequada para a realização do trabalho em zonas rurais a 
fim de reduzir a quantidade de acidentes observados na região. 
Também é importante que cursos de capacitação sejam ofertados no município e 
adjacências para os profissionais da saúde, para que os mesmos possam preencher de maneira 
adequada as fichas de identificação dos acidentes e possam estar mais preparados para 
reconhecerem os diferentes tipos de envenenamento, prestando assim o atendimento correto. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
7 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 
ADEPARÁ - Agência de Defesa Agropecuária do Estado do Pará. ADEPARÁ: CAPITÃO 
POÇO É DESTAQUE NA PRODUÇÃO AGROPECUÁRIA. Disponível em: 
49 
 
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DESTAQUE-NA-PRODUCAO-AGROPECURIA. Acesso em: 30 de junho de 2017. 
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http://brasilescola.uol.com.br/biologia/serpentes.htm. Acesso em 30 de junho de 2017. 
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Curitiba: Anolis Book, 2012.320p. 
BERNARDE, P. S. Serpentes peçonhentas e acidentes ofídicos no Brasil. São Paulo: 
Anolis Books. 2014 
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Sul, Alto Juruá, Estado do Acre, Brasil. Acta Amazonica, Acre, 2012, vol. 42(1) 65:72. 
BERNARDE, P.S. Acidentes ofídicos. Herpetofauna. Consultado em 18 de dezembro de 
2018. 
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Herpetologia. 2009. Disponível em http://www.sbherpetologia.org.br/. Acesso 19/12/2018. 
BOCHNER, R. & STRUCHINER, C. J. Acidentes por animais peçonhentos e sistemas 
nacionais de informação. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, 2002. 
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100 anos no Brasil: uma revisão. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, 2003. 
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