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Hegel: a importancia da história, fenomenologia, dialética e a consciencia. IN: Convite a filosofia (Marilena Chauí) A importância da história Um filósofo alemão do século XIX, Hegel, ofereceu uma solução para o problema do inatismo e do empirismo posterior à de Kant. Hegel criticou o inatismo, o empirismo e o kantismo. A todos endereçou a mesma crítica, qual seja, a de não haverem compreendido o que há de mais fundamental e de mais essencial à razão: a razão é histórica. De fato, a Filosofia, preocupada em garantir a diferença entre a mera opinião (“eu acho que”, “eu gosto de”, “eu não gosto de”) e a verdade (“eu penso que”, “eu sei que”, “isto é assim porque”), considerou que as idéias só seriam racionais e verdadeiras se fossem intemporais, perenes, eternas, as mesmas em todo tempo e em todo lugar. Uma verdade que mudasse com o tempo ou com os lugares seria mera opinião, seria enganosa, não seria verdade. A razão, sendo a fonte e a condição da verdade, teria também que ser intemporal. É essa intemporalidade atribuída à verdade e à razão que Hegel criticou em toda a Filosofia anterior. Ao afirmar que a razão é histórica, Hegel não está, de modo algum, dizendo que a razão é algo relativo, que vale hoje e não vale amanhã, que serve aqui e não serve ali, que cada época não alcança verdades universais. Não. O que Hegel está dizendo é que a mudança, a transformação da razão e de seus conteúdos é obra racional da própria razão. A razão não é uma vítima do tempo, que lhe roubaria a verdade, a universalidade, a necessidade. A razão não está na História; ela é a História. A razão não está no tempo; ela é o tempo. Ela dá sentido ao tempo. Hegel também fez uma crítica aos inatistas e aos empiristas muito semelhante à que Kant fizera. Ou seja, inatistas e empiristas acreditam que o conhecimento racional vem das próprias coisas para nós, que o conhecimento depende exclusivamente da ação das coisas sobre nós, e que a verdade é a correspondência entre a coisa e a idéia da coisa. Para o empirista, a realidade “entra” em nós pela experiência. Para o inatista a verdade “entra” em nós pelo poder de uma força espiritual que a coloca em nossa alma, de modo que as idéias inatas não são produzidas pelo próprio sujeito do conhecimento ou pela própria razão, mas são colocadas em nós por uma força sábia e superior a nós (como Deus, por exemplo). Assim, o conhecimento parece depender inteiramente de algo que vem de fora para dentro de nós. No caso dos inatistas, depende da divindade; no caso dos empiristas, depende da experiência sensível. Inatistas e empiristas se enganaram por excesso de objetivismo, isto é, por julgarem que o conhecimento racional dependeria inteiramente dos objetos do conhecimento. Mas Kant também se enganou e pelo motivo oposto, isto é, por excesso de subjetivismo, por acreditar que o conhecimento racional dependeria exclusivamente do sujeito do conhecimento, das estruturas da sensibilidade e do entendimento. A razão, diz Hegel, não é nem exclusivamente razão objetiva (a verdade está nos objetos) nem exclusivamente subjetiva (a verdade está no sujeito), mas ela é a unidade necessária do objetivo e do subjetivo. Ela é o conhecimento da harmonia entre as coisas e as idéias, entre o mundo exterior e a consciência, entre o objeto e o sujeito, entre a verdade objetiva e a verdade subjetiva. O que é afinal a razão para Hegel? A razão é: 1. o conjunto das leis do pensamento, isto é, os princípios, os procedimentos do raciocínio, as formas e as estruturas necessárias para pensar, as categorias, as idéias – é razão subjetiva; 2. a ordem, a organização, o encadeamento e as relações das próprias coisas, isto é, a realidade objetiva e racional – é razão objetiva; 3. a relação interna e necessária entre as leis do pensamento e as leis do real. Ela é a unidade da razão subjetiva e da razão objetiva. Por que a razão é histórica? A unidade ou harmonia entre o objetivo e o subjetivo, entre a realidade das coisas e o sujeito do conhecimento não é um dado eterno, algo que existiu desde todo o sempre, mas é uma conquista da razão e essa conquista a razão realiza no tempo. A razão não tem como ponto de partida essa unidade, mas a tem como ponto de chegada, como resultado do percurso histórico ou temporal que ela própria realiza. Qual o melhor exemplo para compreender o que Hegel quer dizer? O melhor exemplo é o que acabamos de ver nos capítulos 2 e 3 desta unidade. Vimos que os inatistas começaram combatendo a suposição de que opinião e verdade são a mesma coisa. Para livrarem-se dessa suposição, o que fizeram eles? Disseram que a opinião pertence ao campo da experiência sensorial, pessoal, psicológica, instável e que as idéias da razão são inatas, universais, necessárias, imutáveis. Os empiristas, no entanto, negaram que os inatistas tivessem acertado, negaram que as idéias pudessem ser inatas e fizeram a razão depender da experiência psicológica ou da percepção. Ao fazê-lo, revelaram os pontos fracos dos inatistas, mas abriram o flanco para um problema que não podiam resolver, isto é, a validade das ciências. A filosofia kantiana negou, então, que inatistas e empiristas estivessem certos. Negou que pudéssemos conhecer a realidade em si das coisas, negou que a razão possuísse conteúdos inatos, mostrando que os conteúdos dependem da experiência; mas negou também que a experiência fosse a causa da razão, ou que esta fosse adquirida, pois possui formas e estruturas inatas. Kant deu prioridade ao sujeito do conhecimento, enquanto empiristas e inatistas davam prioridade ao objeto do conhecimento. Que diz Hegel? Que esses conflitos filosóficos são a história da razão buscando conhecer-se a si mesma e que, graças a tais conflitos, graças às contradições entre as filosofias, a Filosofia pode chegar à descoberta da razão como síntese, unidade ou harmonia das teses opostas ou contraditórias. Em cada momento de sua história, a razão produziu uma tese a respeito de si mesma e, logo a seguir, uma tese contrária à primeira ou uma antítese. Cada tese e cada antítese foram momentos necessários para a razão conhecer-se cada vez mais. Cada tese e cada antítese foram verdadeiras, mas parciais. Sem elas, a razão nunca teria chegado a conhecer-se a si mesma. Mas a razão não pode ficar estacionada nessas contradições que ela própria criou, por uma necessidade dela mesma: precisa ultrapassá-las numa síntese que una as teses contrárias, mostrando onde está a verdade de cada uma delas e conservando essa verdade. Essa é a razão histórica. Fenomenologia Desde Kant, fenômeno indicava aquilo que, do mundo externo, se oferece ao sujeito do conhecimento, sob as estruturas cognitivas da consciência (isto é, sob as formas do espaço e do tempo e sob os conceitos do entendimento). No entanto, o filósofo Hegel ampliou o conceito de fenômeno, afirmando que tudo o que aparece só pode aparecer para uma consciência e que a própria consciência mostra-se a si mesma no conhecimento de si, sendo ela própria um fenômeno. Por isso, foi Hegel o primeiro a usar a palavra fenomenologia, para com ela indicar o conhecimento que a consciência tem de si mesma através dos demais fenômenos que lhe aparecem. Dialética e consciencia O Espírito começa como um sujeito que se exterioriza no predicado Natureza, isto é, manifestando-se como coisa (substância, qualidade, quantidade, relações de causa e efeito, etc.). Ele é terra, água, ar, fogo, céu, astros, mares, minerais, vegetais, animais. Para conservar-se vivo, o ser natural (a coisa) precisa consumir os seres que o rodeiam: o Espírito como Natureza nega-se a si mesmo consumindo-se a si mesmo (os animais consomem água, plantas, outros animais, ar, calor, luz; as plantas consomem calor, água, luz; os astros consomem energia e matéria, etc.). Essa negação pelo consumo não é transformadora, pois ela se realiza para conservar as coisas. Entretanto, o Espírito se manifesta num outro predicado,a Consciência. Esta também busca conservar-se, mas, agora, o faz não pelo simples consumo das coisas naturais mas pela negação da mera naturalidade delas. O que é essa negação? Quando digo “Isto é uma montanha”, tenho a impressão de que me refiro a uma coisa natural, diferente de mim, existente em si mesma e com características positivas próprias. Entretanto, o simples fato de que chame uma coisa de montanha indica que ela não existe em si, mas existe para mim, isto é, possui um sentido em minha experiência. Suponhamos agora que eu pertença a uma comunidade politeísta, que acredita que os deuses, superiores aos homens, mas dotados de forma humana, habitem os lugares altos. Para mim, agora, a montanha não é mais uma simples coisa, mas a morada sagrada dos deuses. Imaginemos em seguida que somos uma empresa capitalista exploradora de minérios e que haja uma jazida de ferro na montanha. Como empresários, compramos a montanha para explorá-la. Novamente, ela deixou de ser uma simples coisa natural para tornar-se propriedade privada, local de trabalho e capital. Consideremos, por fim, que somos pintores. Nesse caso, a montanha não é nem morada dos deuses, nem propriedade privada capitalista, nem local de trabalho, mas forma, cor, volume, linhas, profundidade – um campo de visibilidade. Sob essas quatro formas: “isto é uma montanha”, “morada dos deuses”, “jazida de minério de ferro/propriedade privada/capital” e “campo de visibilidade”, a montanha como coisa natural desapareceu, foi negada como mera coisa pela consciência e pela ação humanas. Tornou-se não-coisa porque tornou-se montanha- para-nós, significação, ente cultural. Foi consumida- destruída- suprimida-negada pela Cultura. Em termos hegelianos, o Espírito negou-se como Natureza e afirmou-se como Cultura. Negou-se como ser-em-si, tornando-se ser- para-si. Deve- se compreender que a negação dialética não significa a destruição empírica ou material de coisas empíricas ou materiais, e sim a destruição de seu sentido imediato que é superado por um sentido novo, posto pelo próprio espírito. Ao reconhecer-se como movimento interno de posição, negação e supressão de seus predicados (S é Natureza; S é não-Natureza porque é Cultura), o Espírito reconhece-se como sujeito que se produz a si mesmo e que é o movimento de autoprodução de si mesmo (S é Natureza e Cultura porque é o Espírito). Nesse reconhecimento, reconcilia-se consigo mesmo; é, ao mesmo tempo, em si e para si. Como se observa, em Hegel, a lógica não é um instrumento formal para o bom uso do pensamento, mas é ontologia. Os idealismo. IN: Filosofia do Direito (Miguel Reale) O idealismo, especialmente na sua acepção lógica, parte da afirmação de que só conhecemos o que se converte em pensamento, ou é conteúdo de pensamento. Ser, para o idealista, não é outra coisa senão idéia. "Ser" é "ser pensado". Daí a já lembrada afirmação incisiva que fez um dos idealistas modernos, Hegel, exatamente numlivro de Filosofia do Direito: — o que é racional é real, o que é real é racional. Quando Hegel faz esta afirmação, ele a faz, muito embora o conteste, no plano da Teoria do Conhecimento. Que é que se conhece? E a resposta é esta: — nós só conhecemos aquilo que elevamos ao plano do pensamento, de maneira que só há realidade como realidade espiritual. Resumamos: "Ser é ser percebido" — atitude psicológica; "ser é ser pensado" — atitude lógica. Lições de filosofia do direito. (Del Vecchio) “Com o espírito, porém, inicia-se novo processo. Hegel distingue três formas: espírito subjetivo, espírito objetivo, espírito absoluto. Cada uma destas três formas, por sua vez, subdivide-se em três outras formas ou graus. Ao espírito subjetivo corresponde a alma, a consciência e a razão; ao objetivo o direito, a moralidade e o costume; ao absoluto, a arte, a religião e a filosofia” A ideia de justiça em Hegel (Salgado) “Há duas posições teóricas claramente combatidas por Hegel pela sua unilateralidade: o jusnaturalismo, que apresenta como fundamento do direito positivo a razão no modo abstrato e formal do Iluminismo, e o historicismo da Escola Histórica, que fundamenta o direito, não na natureza da coisa, mas na aparência ou contingência fenomenal dos fatos históricos; racionalismo abstrato do direito natural e irracionalismo do historicismo fático ou empírico” Justiça e Direito para Hegel IN: Curso de Filosofia do Direito (Bittar e Almeida) Para Hegel, a Filosofia do Direito possui um objeto, qual seja, a ideia do conceito de direito (Die philosophische Rechtswissenschaft hat die Idee des Rechts, den Begriff des Rechts und dessen Verwirklichung zum Gegenstande), e isso vem declarado desde o princípio em sua obra. A essência do Direito (máxima liberdade) faz-se acontecimento de direito (liberdade concreta), manifestando-se neste ou naquele conjunto de leis, deste ou daquele Estado, desta ou daquela cultura. Assim, surgem as leis, os códigos, o direito positivo, concretizações que são da noção abstrata de Direito. A lei pode, então, ser vista como uma concreção da vontade do Direito. O Direito, abstratamente, é a ordem do todo possível, mas ainda invisível e inexistente socialmente. A lei é esta concreção do Direito e, ainda, este tornar-se para si do Direito, à medida que é por meio da lei que se estabelecem os direitos e os deveres de forma clara e acessível a todos; é ela visibilidade da liberdade abstrata contida na noção de Direito. Hegel: a importancia da história, fenomenologia, dialética e a consciencia. IN: Convite a filosofia (Marilena Chauí) Os idealismo. IN: Filosofia do Direito (Miguel Reale) Lições de filosofia do direito. (Del Vecchio) A ideia de justiça em Hegel (Salgado) Justiça e Direito para Hegel IN: Curso de Filosofia do Direito (Bittar e Almeida)
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