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Revista Interdisciplinar de Ensino, Pesquisa e Extensão vol. 4 n°1 392 MULHERES ENCARCERADAS: A REALIDADE DAS MULHERES NOS PRESÍDIOS BRASILEIROS 1 BILIBIO, Gabrielli Dall Molin; BITENCOURT, Camila Barboza; BRUM, Eduarda Martins de; CORREA, Julia Batista; FAVERO, Itauana Benachio; FLORES Karine de Rocha; LOPES, Vitória de Fátima Barros 2 ; OLIVEIRA, Aline Cristina de; ROESLER, Gabriele Maidana; SILVA, Nicole Soares da 3 ; SOUTO, Raquel Buzatti Souto 4 . RESUMO O presente artigo é resultante das pesquisas realizadas no grupo de estudos que teve como tema central a realidade das mulheres nos presídios brasileiros. A pesquisa foi qualitativa, eminentemente bibliográfica. Também foi utilizada a pesquisa quantitativa a partir de investigações coletadas na análise de documentários da situação das mulheres nessa condição de encarceramento. Foi possível estudar a realidade dos presídios brasileiros nas especificidades femininas devido a situação de desigualdade de gênero de nossa sociedade, entender quais são os principais motivos que levam a maioria das mulheres cometerem algum delito e como que elas são tratadas pela custódia do Estado durante suas penas. Nesse sentido pretende-se analisar alguns assuntos mais específicos no qual as detentas convivem diariamente no sistema carcerário como a gravidez, a questão da guarda de seus filhos, homossexualidade, a violência e as diferentes maneiras que estas mulheres são tratas pelo Estado. Palavras-Chaves: Mulheres. Realidade. Presídios. ABSTRACT This article is the result of research conducted in the study group that had as its central theme the reality of women in Brazilian prisons. The research was qualitative, eminently literature. It was also used quantitative research from research collected in the documentary analysis of the situation of women in this condition incarceration. It was possible to study the reality of Brazilian prisons in female characteristics due to gender inequality situation of our society, to understand what are the main reasons why most women commit a crime and how they are handled by state custody during his feathers . In this sense we intend to analyze some specific issues in which the inmates live daily in the prison system as pregnancy, the issue of custody of their children, homosexuality, violence and the different ways that these women are dealest state. KEYWORDS: Women. Reality. Prisons. 1 Artigo fruto da pesquisa realizada no Grupo de Estudos intitulado: “Mulheres encarceradas: a realidade das mulheres presas nos presídios brasileiros”, sob a orientação da Professora Raquel Buzatti Souto. 2 Acadêmica monitora do Grupo de Estudos. 3 Acadêmicas do 2º Semestre do Curso de Direito da Universidade de Cruz Alta – UNICRUZ. 4 Professora Orientadora do presente Grupo de Estudos. Endereço Eletrônico: rsouto@unicruz.edu.br. Revista Interdisciplinar de Ensino, Pesquisa e Extensão vol. 4 n°1 393 1. INTRODUÇÃO O presente artigo trata-se da pesquisa que foi objeto de estudo ao longo do semestre 2016/01 no grupo de estudos intitulado “Mulheres encarceradas: a realidade das mulheres presas nos presídios brasileiros”. A pesquisa teve como escopo principal analisar e conhecer a realidade das mulheres nos presídios brasileiros, uma vez que as suas condições são precárias e insalubres devido a problemática gerada pela condição de desigualdade de gênero de nossa sociedade. Para se tentar alcançar resultados com a pesquisa realizada, a metodologia utilizada foi a qualitativa, eminentemente bibliográfica, bem como se tentou realizar uma pesquisa quantitativa a partir de investigações coletadas na análise de documentários acerca da real situação dos presídio com relação as mulheres. Nesse contexto a motivação para o presente estudo e tendo como objeto de investigação a realidade das mulheres em situação de encarceramento, baseando-se na atual situação em que vivem as mulheres que estão sob custódia do Estado, haja vista a realidade de total desrespeito e desconsideração aos direitos humanos para com as detentas, assegurados pela Constituição Federativa do Brasil de 1988. A pesquisa pretende-se destacar a evolução do sistema penitenciário feminino no Brasil, o perfil das mulheres encarceradas, a gravidez e a incerteza do cuidado com seus filhos e a triste realidade atrás das grades. Portanto, a maioria das mulheres que estão nos presídios enfrentam situações que desrespeitam a sua dignidade humana e assim elas acabam se encontrando em situações que ferem os Direitos Humanos, sendo desrespeitados os direitos fundamentais e as garantias constitucionais deixando as mulheres em total condição de vulnerabilidade carcerária. 2. A EVOLUÇÃO DO SISTEMA PENITENCIÁRIO FEMININO NO BRASIL Antigamente a prisão era um lugar apenas utilizado para garantia de que não houvesse fuga antes dos julgamentos, pois a sanção aplicada aos condenados era extremamente cruel ou até de morte. Somente após a idade média, com o aumento da criminalidade, é que começou a se pensar na prisão como um local de privação de liberdade dos indivíduos. Foi no Código Penal de 1810, que a prisão passou a fazer parte do conjunto de punições. Revista Interdisciplinar de Ensino, Pesquisa e Extensão vol. 4 n°1 394 Porém, naquele tempo, não havia nenhuma noção de humanidade nessas penas. Foi graças a movimentos de pensadores que este desumano cenário começou a se modificar. Com o Iluminismo, o movimento pela humanização no aprisionamento ganhou força e passou a ser considerada a ideia de que os detentos deveriam cumprir suas penas dentro de condições dignas e humanas. Para que assim as prisões passassem de “castigo” para um local de recuperação do infrator. Nesse sentido Amaral (2013, p.1): Com a edição da Lei nº 7.210 de 11 de julho de 1984, o Brasil passou a afirmar que o preso é um sujeito de direitos, esteja ele cumprindo pena (preso definitivo), ou aguardando julgamento (preso provisório). Essa tomada de postura pública e garantista foi resultado de longo e sofrido caminho traçado ao longo da história do homem. Os sistemas carcerários estão em constantes evoluções, assim como antigamente, hoje continua perdurando dentro dos presídios crueldades como violência, assédio e estupro, tanto no presídio masculino, feminino ou misto. Mesmo com todos os progressos obtidos com o passar do tempo, ainda há muito que fazer para alcançar a humanização. Não é nenhum segredo que o sistema penitenciário brasileiro encontra-se numa gravíssima situação de desleixo, basta uma análise rápida para constatar-se as condições desumanas e de violências encontradas na maioria esmagadora dos presídios. Um sistema que deveria servir para reabilitar e reintegrar socialmente os indivíduos serve apenas para isolá-los e corrompê-los ainda mais. O descaso do Estado com a situação penitenciária não é uma situação exclusivamente atual, ela vem de anos. Dentro desse cenário, as mulheres encarceradas sofreram e permanecem sofrendo ainda mais que os homens. A primeira prisão feminina do Brasil foi inaugurada em 1937 5 , em 1824 foi determinadas que as prisões fossem seguras e limpas, o que quer dizer que, durante mais de 100 anos as mulheres presas no Brasil não tinham sequer um presídio direcionado a elas. Ainda assim, é raríssimo encontrar um presídio feminino realmente construído com esse fim, pois em sua maioria, são adaptações de prédios já existentes, como antigos conventos, colégios ou unidades para adolescentes, o que obviamente não fornece condições dignas. Em diversas partes do país, principalmente no interior, ainda não existem prisões 5 E apenas se pensou numa penitenciária feminina porque seria alcançado um cenário mais pacífico nos presídiosmasculinos, pois na concepção deles, era a presença das mulheres alvoroçava os homens. Revista Interdisciplinar de Ensino, Pesquisa e Extensão vol. 4 n°1 395 exclusivamente femininas, assim, dentro dos presídios direcionados e estruturados ao público masculino (que geralmente encontram-se também em situação precária), é reservado um espaço isolado para o público feminino. Assim assevera Cerneka, 2009, p.66 É claro que existem localidades que nem essa adaptação há. Ademais, enfrentamos situações de tortura e ausência total desconsideração das necessidades femininas, como aquela de Abaetetuba, PA,onde uma jovem de quinze (15) anos permaneceu por mais de vinte (20) dias numa cela junto com trinta (30) homens. Não podemos nem devemos nos iludir: a cela mista de Abaetetuba não é caso isolado. Há muitas outras “Abaetetubas” no país. 3. PERFIL DAS MULHERES ENCARCERADAS NO BRASIL A mulher presa no Brasil hoje em sua maioria é jovem, em situação de vulnerabilidade social, mãe solteira, afrodescendente e condenada por envolvimento com tráfico de drogas (ou entorpecentes). Ela apresenta um vínculo tão forte com a família que prefere permanecer em uma cadeia pública, insalubre, superlotada e inabitável, mas com chance de receber a visita de sua família e filhos, a ir para uma penitenciária distante, onde poderia eventualmente ter acesso à remição da pena por trabalho ou estudo, e a cursos de profissionalização, além de encontrar melhores condições de habitabilidade. 6 Pode-se identificar um perfil da mulher presa adaptando dados do DEPEN a esses dois estudos. Segundo o Ministério da Justiça, em 2006 eram 10.139 presas em São Paulo e no Rio de Janeiro, de um total de 22.273 mulheres presas. O perfil da mulher presa é significativamente diferente daquele do homem preso. 7 De acordo com o Censo Penitenciário de São Paulo, 54% das mulheres presas se declararam solteiras e 12%, separadas, divorciadas ou desquitadas, enquanto 56% dos homens se declararam casados ou com companheira. O estudo da Superintendência de Saúde e da Secretaria de Estado de Administração Penitenciária do Rio de Janeiro demonstrou que a grande maioria dos presos (87,8% entre as mulheres e 86,4% entre os homens) se declarou solteira. No RJ, consta que 84% das mulheres são mães, enquanto somente 66% dos homens são pais. Para os homens, 88,64% dos filhos está com a mãe, porém, a mulher presa não apenas fica longe dos filhos, mas, também, preocupa-se com sua situação econômica. Somente 16,3% dos filhos ficam com o pai. A mulher presa apresenta uma grande preocupação em relação aos parentes, vizinhas ou 6 Dados retirados com a leitura do livro “ Presos que menstruam” da Nana Queiroz 7 Fonte retirada no site <http://www.justica.gov.br/noticias/estudo-traca-perfil-da-populacao-penitenciaria- feminina-no-brasil/relatorio-infopen-mulheres.pdf> Revista Interdisciplinar de Ensino, Pesquisa e Extensão vol. 4 n°1 396 instituições que estão criando seus filhos. A perda do vínculo com a família é uma constante preocupação da mulher presa. À proximamente 47% delas não recebem visitas ou as recebem menos de uma vez por mês. Cerca de 40% das mulheres foram condenadas por tráfico de entorpecente, delito considerado hediondo, conforme rol que consta da Lei nº 8072/90 (Dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do art. 5º, inciso XLIII, da Constituição Federal, e determina outras providências.), que proíbe a progressividade no sistema de cumprimento de penas e a fixação de prazos maiores para a obtenção do livramento condicional. Observa-se, entretanto, que o percentual é bastante variável entre os estados da federação.8 É importante salientar que os dados apontam para presas em situação vulnerável na sua sociedade, carente de: subsídios, família que lhe de suporte e á ajude. Na maioria dos casos são mulheres pobres e negras, não que as ricas e brancas não cometam delitos, mas destas poucas são presas, pois cometem crimes muito bem elaborados e de grau superior em relação a grande parte das encarceradas. No que tange à destinação dos estabelecimentos, apenas por força da publicação do lançamento do INFOPEN de junho de 2014, foi possível quantificar os tipos de estabelecimentos prisionais brasileiros. Os dados levantados mostram que há 1.070 unidades masculinas, o que configura um percentual de 75%. Nas outras destinações, há o indicativo de 238 estabelecimentos mistos (17%) e 103 estabelecimentos femininos (7%), significando, assim, que a maior parte das mulheres estão em estruturas mistas. (SANTOS e VITTO, 2014, p.5). No Brasil, a partir do século XXI, notou-se o aumento da população carcerária feminina em cerca de 42 %, como mostram alguns dados recentes. É tendência de todo e qualquer cidadão questionar por quais motivos dados como estes crescem cada vez mais no país, e isso acontece de forma condenatória pela maioria da população, haja visto que, muitas pessoas acabam “ julgando” os casos , sem conhecer a realidade das mulheres em questão. É necessário salientar que 90% dos casos relatados são de mulheres presas por crimes como furto e tráfico de drogas, ou seja, na maioria dos casos não encontram outra saída, a não ser o mundo do crime para sobreviver e efetivamente criar seus filhos e de certa forma sustentar sua família. O aumento da população carcerária feminina de 567% em 15 anos é um número assustador. Assustador e preocupante. Principalmente por que as vagas, juntamente com as estruturas dos 8 Fonte retirada no site <http://www.ajd.org.br/documentos_ver.php?idConteudo=4> Revista Interdisciplinar de Ensino, Pesquisa e Extensão vol. 4 n°1 397 presídios não acompanham essa demanda, deixando essas mulheres vulneráveis e esquecidas pelo sistema prisional. Os estabelecimentos prisionais, na maioria das vezes, possuem sérios problemas na estrutura física, gerando assim situações de superlotação, ambiente insalubre e falta de estrutura para mulheres gestantes, como a falta de berçários e de celas separadas para mulheres com filhos. Também não há celas o suficiente para fazer a separação das detentas por crimes, por faixa etária ou pelo tamanho da pena que irão cumprir. A falta de profissionais especializados, voltados para atender as necessidades específicas das mulheres também é um problema. Isso vem desde agentes penitenciários, enfermeiras e médicos ginecologistas como a saúde da mulher requer. Há ainda situações de maus tratos, abusos físicos e psicológicos, violência sexual, ameaças e exploração de suas forças de trabalho. Uma pesquisa feita pela Comissão Parlamentar de Inquérito do Sistema Carcerário analisou a situação das penitenciárias femininas no Brasil levando em conta critérios como: estrutura física do prédio, vagas por cela versus quantidade de detentas, ambiente insalubre entre outros aspectos, conseguindo assim, apontar entre elas a melhor e a pior penitenciária feminina no Brasil. 4. PROBLEMAS ENFRENTADOS PELAS MULHERES ENCARCERADAS Um dos problemas que norteiam as mulheres encarceradas é a questão atinente a gravidez. O tratamento para com as gestantes do sistema prisional é alarmante, uma vez que elas não recebem o devido acompanhamento médico, pré-natal e nem mesmo na hora do parto. Os motivos pelos quais as detentas estão encarceradas são os mais variados e sejam quais forem eles, tratá-las de forma cruel significa ferir direitos humanos, dessa forma passando por cima de direitos intrínsecos a qualquer cidadão. A sociedade não pode simplesmente fechar os olhos para o fato de que muitas dessas detentas além de seres humanos com direitos são gestantes, ou seja, requerem determinado cuidado e atenção, pois estão gerando uma vidainocente dentro de si, sendo assim necessitam de um ambiente propício a uma gestação saudável e tranquila. A realidade das penitenciárias brasileiras não permite que tais gestantes tenham uma gravidez sem riscos, umas vez que o local onde se alojam não é higiênico, as alas são superlotadas fazendo com que muitas tenham que dormir até mesmo no chão, o Revista Interdisciplinar de Ensino, Pesquisa e Extensão vol. 4 n°1 398 acompanhamento médico é quase que inexistente, o momento do parto é indiferente para muitos dos agentes penitenciários, visto que eles ignoram o sofrimento das mesmas e há casos de partos que são feitos dentro dos presídios, tendo como alegação a falta de viaturas para levá-las até o hospital. Sem contar as agressões que elas sofrem por parte dos policiais ou desses agentes o que é excessivamente prejudicial, pois muitas se encontram em estágio avançado de gravidez. As condições de vivência oferecidas são precárias, sem contar a pressão emocional que sofrem abalando demasiadamente o seu estado psicológico, levando-as a se reprimirem e dificultando o seu período de gestação. A maneira como muitas gestantes são tratadas gera revolta, uma vez que as mesmas sentindo fortes contrações se encontram com pés e/ou mãos algemados na cabeceira ou ao pé da cama. Atitude humanamente lastimável, pois além de já estarem sentindo dores, as algemas podem machucar ainda mais. A ativista Heidi Cerneka 9 faz seu comentário a respeito desse tratamento no livro “Preso que Menstruam” 10 onde relata: “Tem mulher que até dá a luz algemada na cama. Como se ela pudesse levantar parindo e sair correndo.[...] Porque mesmo que ela pudesse levantar, qualquer policial com uma perna só andaria mais rápido que ela.”. O estado de fragilidade em que se encontram não permitiria qualquer pensamento de fuga, desabilitadas de movimentos até mesmo por causa da anestesia, também somado ao momento mágico do nascimento de um bebê que foi gerado no seu próprio ventre as deixariam sensibilizadas, fazendo com que o instinto materno tomasse o lugar de qualquer outro sentido. Segundo a Lei nº 13.257/16 11 , do Estatuto da Primeira Infância, que alterou o Art. 318 do Código de Processo Penal, abrindo duas hipóteses com relação à possível prisão domiciliar, quando se tratar de gestantes ou mãe com filho menor de 12 anos incompletos. Salvo que para a tomada desta Lei cada caso será analisado pelo juiz e ele decidirá se é cabível tal medida, onde o acusado será posto em prisão domiciliar se não oferecer riscos à ordem pública e sua prisão preventiva seja dispensável. Esse fato pode ser determinante para muitas presas, já que elas terão a oportunidade de sua gestação ser no local desejado, longe 9 Ativista americana que trabalha há 13 anos, com a causa da mulher presa, no Brasil na Pastoral Carcerária. 10 Livro da escritora Nana Queiroz que fala sobre o cotidiano das prisões femininas no Brasil, onde dá voz às presas (e às famílias delas), desde os episódios que as levaram à cadeia até o cotidiano no cárcere. 11 Lei nº 13.257 de 08 de Março de 2016 - Dispõe sobre as políticas públicas para a primeira infância e altera a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), o Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, a Lei nº 11.770, de 9 de setembro de 2008, e a Lei nº 12.662, de 5 de junho de 2012. http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/312561592/lei-n-13-257-de-08-de-marco-de-2016 Revista Interdisciplinar de Ensino, Pesquisa e Extensão vol. 4 n°1 399 das celas, pois muitas entram em depressão e em estado de rejeição por ficarem expostas a um lugar tão desconfortável; terão liberdade para seguir a rotina que acharem melhor; total responsabilidade quanto ao compromisso de acompanhar o crescimento do bebê; aprenderão a ter a consciência de agir de tal maneira que ajude no desenvolvimento do feto até o momento de darem a luz, e por fim poderão recorrer à ajuda de familiares e da comunidade em que vivem, caso essa seja a sua vontade. Analisando-se essa realidade, é indiscutível que o contexto onde as reeducandas estão inseridas seja de grande dificuldade para o desenvolvimento do feto, para uma gravidez tranquila e até mesmo para a saúde da futura mãe. Um grande problema que existe, está voltado para a problematização da pressão psicológica que sofrem, dificultando que elas mantenham o bom senso, e não entrem na temida depressão. Outra questão em debate é a de que políticas de governo devam ser criadas para se fazer valer os direitos básicos dessas mulheres, assegurando sua cidadania. É inegável que a sociedade como um todo ainda precise caminhar muito para acabar com o prejulgamento e o senso comum de que por serem detentas, elas devam ser tratadas com repúdio, porque sim, elas possuem seus direitos e acima de tudo são seres humanos que estão gerando outra vida que precisará de todo carinho e atenção para não sofrer com o preconceito de ter nascido no cárcere. Outro tipo de problema que também assola a realidade das mulheres presas é com relação as crianças que são afastadas das mães encarceradas, pois o ato criminoso acaba se desdobrando para seu filho, que acaba nascendo dentro dos presídios, e que passam sua fase inicial de vida dentro da prisão (normalmente até o período final da amamentação), onde após esse tempo as crianças são retiradas de suas mães sem benevolência, tendo certeza que a penalidade da mãe se iniciou naquele momento, no momento da separação. Após isso, a criança é entregue a avó, uma total desconhecida até então. Em alguns casos vão para casas de acolhimento, onde ficam sob responsabilidade da justiça, esta que decide sobre o seu futuro. Como foi evidenciado, além do distanciamento dos filhos, existe também o enfraquecimento da relação familiar, o qual muitas vezes é determinado pela vergonha do ente familiar ou por culpa pela parente presa, o que torna um dos motivos do distanciamento, da omissão e da falta de esperança e busca de auxilio. Mesmo com as leis (Lei de Execução Penal, art. 89) que asseguram o direito da criança permanecer com a mãe durando o período de amamentação, são poucos os presídios que possuem locais destinados ao cuidado e ao desenvolvimento da criança que está junto à mãe Revista Interdisciplinar de Ensino, Pesquisa e Extensão vol. 4 n°1 400 apenada. A falta de adequação do local as necessidades da criança faz com que ele também acabe sendo aprisionado, pois não usufruem do seu direito. Apesar de todos os contras, é possível perceber que mesmo com esses possíveis prejuízos, as mães acreditam que o melhor para o bebê é ficar preto da progenitora, mesmo que em cárcere privado. Isso está relacionado com a questão de que essas crianças são vistos como a única posse e vinculo que a mulher ainda possui, que proporciona suporte a elas enquanto realizam o cumprimento da pena, sendo assim, elas sentem que a presença dos filhos poderá auxiliar a enfrentar a pena, diminuindo o sofrimento causado pela ruptura da liberdade. Por fim, podemos destacar a questão da homossexualidade, que surge entre mulheres, seja por carência ou conveniência. Mediante a uma perspectiva de gênero é necessário entender por qual motivo as mulheres adotam essa postura, o objetivo geral é compreender que tipos de privilégios tais mulheres adquirem como resultado da adoção de padrões de comportamentos tipicamente masculinos. Na sociedade em que se vive, é inegável o fato de alguns homens, seja em ambiente prisional ou fora dele, serem imbuídos de algumas regalias, como, por exemplo, poligamia, uso legitimado da força, status, segurança, (re)conhecimento, e por diversas vezes aconstituição de gangues e hierarquias de comando. Partindo deste pressuposto, pode-se obter então algumas justificativas, perante as quais torna-se mais fácil o entendimento da razão de incorporar esta conduta, pois: a identidade masculina está associada ao facto de possuir, tomar, penetrar, dominar e afirmar-se, se necessário pela força. “A identidade feminina, ao facto de ser possuída, dócil, passiva, submetida” (BADINTER, 1993, p.99) A chamada “homossexualidade situacional” descreve a presente cena: diante de uma circunstância necessária, a materialidade, a condição financeira e as dependências de variadas ordens se sobressaem no momento de tomar esta decisão; aproximar-se de alguém que possua uma conjuntura mais elevada dentro do presídio pode proporcionar vantagens e trazer benefícios para quem, em determinado ponto, precisa de auxílio. Assim preceitua Padovani, 2014, São relações que implicam em afeto, manutenção da vida cotidiana dentro da prisão, tanto por meio de troca financeira, afetiva, de uma dar suporte para outra, como um casal. É a possibilidade de encontros sexuais e afetivos que as pessoas têm lá dentro, e aí se é homoafetiva ou heteroafetiva acho que perde o sentido... é muito mais a possibilidade de encontros pessoais, e ali são aquelas pessoas que estão disponíveis, mais do que uma carga muito forte entre homossexualidade e heterossexualidade. Revista Interdisciplinar de Ensino, Pesquisa e Extensão vol. 4 n°1 401 Trocar sexo com carcereiros também é comumente visto como um meio de conseguir algum objeto de necessidade, sendo assim, um arranjo social programado e planejado. Via de regra, a humanidade tem como ponto de partida, ver a mulher como um ser dotado de sentimentalismo e questões que envolvam predominantemente causas emocionais; destarte, é de praxe ignorar planos e estratégias a respeito desse modo de conduzir a vida em ambiente carcerário, considerando que todas as ações sejam praticadas unicamente por falta de afeto e estrutura emotiva. A homossexualidade em prisões femininas é por múltiplas respostas, comportamento adotado em razão de ser um meio pelo qual as detentas possam atenuar suas vidas dentro do ambiente e ter um mínimo de dignidade perante necessidades pessoais, em um local que, indiscutivelmente, foi feito de homens para homens, sem nenhuma consideração com a natureza feminina e suas exigências. 5. CONCLUSÃO Ao finalizar o presente artigo, constata-se, no contexto atual, a situação a qual se encontram as mulheres nos presídios brasileiros é grave. Em nossa sociedade, encontra-se diversas expressões do senso comum como “Bandido bom é bandido morto” e dessa forma, encontram-se as mulheres que sempre foram submissas e acabam sendo tratadas com total desrespeito aos Direitos Humanos. Afinal, o principal o objetivo do sistema prisional é ressocializar o cidadão para que não cometa algum delito novamente, mas não é isso que acontece as prisões acabam sendo uma escola do crime, logo ao sair da prisão a maioria dos ex- presidiários acabam cometendo um crime novamente. Ao retratar a realidade das mulheres, nota-se que a maior parte delas vem das camadas mais pobres de nosso corpo social, por consequência conviveram em famílias desestruturadas em um país desigual a qual possui condições pequenas para quem nasceu nas classes mais baixas da sociedade. O caminho para o tráfico de drogas, furtos, assaltos e até mesmo sequestros torna-se uma maneira para essas mulheres saírem dessa condição social, essas mulheres não nasceram bandidas tornaram-se bandidas e dessa forma, a sociedade que também sofre com o aumento da criminalidade acaba se tornando vítima dessas mulheres. Nota-se que o Estado não atua para acabar com a violência que está presente no sistema penitenciário e pior ainda se for mulher. Os princípios de direito que podemos encontrar na nossa atual Constituição Brasileira são quebrados diariamente, principalmente pelo fato dessa Revista Interdisciplinar de Ensino, Pesquisa e Extensão vol. 4 n°1 402 realidade ser escondida, mas a maioria dos cidadãos tem alguma noção do que realmente acontece dentro das grades, todavia não se incomoda com isso, pois nossa sociedade infelizmente tem a cultura de pensar que tudo isso está acontecendo com essas pessoas, porque elas simplesmente pediram para estar ali ao cometer um crime. A questão é que o cárcere feminino possui diversos erros, mas que podem ser resolvidos para que essas mulheres saiam dos presídios cidadãs melhores. Para que aja uma melhora nas condições vividas dentro do sistema penitenciário feminino deve-se acreditar na ressocialização e reeducação das carcerárias para prevenção da criminalidade na sociedade. E o principal que haja a garantia de seus direitos já que nunca devemos esquecer que apesar dos males cometidos por essas mulheres elas nunca deixaram de ser seres humanos e principalmente antes de julgar devemos entender o motivo que as levou para trás das grades. O Brasil está entre os países mais ricos do mundo, entretanto a desigualdade socioeconômica é a principal realidade convivida diariamente pelo povo brasileiro. Assim, o crescimento tentar criminalidade aumentar e dessa forma as condições dos presídios se tornam muitas vezes desumanas. Nesta condição, encontram-se as mulheres que mesmo com a intensa luta pela igualdade de direitos o Estado as trata como homens. Os crimes relacionados à questão das drogas são o principal motivo que leva as mulheres para prisão no território brasileiro. Em muitos dos casos as detentas são usuárias de drogas e acabam sendo confundia como “traficantes”. Pode-se notar que a maioria dos delitos é provocada pelas condições financeiras a qual muitas mulheres encontram no mundo do tráfico para conseguir melhorar sua situação financeira. REFERÊNCIAS AMARAL, Prado do Claúdio. Evolução histórica e perspectivas sobre o encarcerado no Brasil como sujeito de direitos. Disponível em: <http://www.gecap.direitorp.usp.br/index.php/2013-02-04-13-50-03/2013-02-04-13-48- 55/artigos-publicados/13-artigo-evolucao-historica-e-perspectivas-sobre-o-encarcerado-no- brasil-como-sujeito-de-direitos> Acesso em: 22 mai.2016 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. 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Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2016-mar-12/stj-usa-lei-concede- prisao-domiciliar-mae-filho-pequeno> Acesso em: 13 jun. 2016 REPÓRTER JUSTIÇA. Mulheres na prisão. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=BjsEPH6q3p>. Acesso 19 mar.16.
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