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Apostila revisão constitucional 1

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CAPÍTULO 1 
TEORIA DA CONSTITUIÇÃO 
SUMÁRIO • 1. Introdução; 2. Concepções de Constituição; 2.1. Introdução; 2.2. Constituição 
sob o prisma sociológico; 2.3. Constituição sob o aspecto político; 2.4. Constituição em sen­
tido jurídico; 2.5. Concepção culturalista da Constituição (a busca por alguma conexão entre 
os sentidos anteriormente apresentados); 3. Classificação das Constituições; 3.1. Quanto à 
origem; 3.2. Quanto à estabilidade (mutabilidade ou processo de modificação); 3.3. Quanto 
à forma; 3.4. Quanto ao modo de elaboração; 3.5. Quanto à extensão; 3.6. Quanto ao con­
teúdo; 3.7. Quanto à finalidade; 3.8. Quanto à interpretação; 3.9. Quanto à correspondência 
com a realidade = critério ontológico; 3.10. Quanto à ideologia (ou quanto à dogmática); 3.11. 
Quanto à unidade documental (quanto à sistemática); 3.12. Quanto ao sistema; 3.13. Quanto 
ao local da decretação; 3.14. Quanto ao papel da Constituição (ou função desempenhada pela 
Constituição); 3.15. Quanto ao conteúdo ideológico (ou quanto ao objeto); 3.16. Outras clas­
sificações; 4. Aplicabilidade das normas constitucionais; 4.1. Introdução; 4.2. A classificação 
de José Afonso da Silva; 4.3. A classificação de Maria Helena Diniz; 4.4. A classificação de Uadi 
Lammêgo Bulos; 4.5. Críticas; 5. Princípios instrumentais de interpretação da Constituição 
e das leis; 5.1. Princípio da supremacia da Constituição; 5.2. Princípio da interpretação con­
forme à Constituição; 5.3. Princípio da presunção de constitucionalidade das leis; 5.4. Prin­
cípio da unidade da Constituição; 5.5. Princípio da força normativa; 5.6. Princípio do efeito 
integrador; 5. 7. Princípio da concordância prática ou harmonização; 5.8. Princípio da máxima 
efetividade ou da eficiência (intervenção efetiva); 5.9. Princípio da conformidade funcional 
ou justeza; 6. Elementos da Constituição; 7. Quadro sinótico; 8. Questões; 8.1. Questões ob­
jetivas; 8.2. Questões discursivas; Gabarito questões objetivas; Gabarito questões discursivas 
1. INTRODUÇÁO 
O vocábulo "Constituição" tem no verbo latino constituere sua origem etimológica e 
sua conformação semântica, vez que o mesmo exterioriza o ideal de constituir, criar, deli­
mitar abalizar, demarcar. O termo exprime, pois, o intuito de organizar e de conformar 
seres, entidades, organismos. 
É nessa acepção que se pode considerar a Constituição enquanto o conjunto de nor­
mas fundamentais e supremas, que podem ser escritas ou não, responsáveis pela cria­
ção, estruturação e organização político-jurídica de um Estado. 
De acordo com Georges Burdeau2, a Constituição é o Estatuto do Poder, garantidora 
da cransformação do Estado - até então entidade abstrata - em um poder instituciona­
lizado. É o que permite a mudança de perspectiva que ocasiona o abandono do clássico 
pensamento de sujeição absoluta às imposições pessoais de governantes, para a obediência 
voltada a uma entidade (Estado), regida por um documento: a Constituição. 
1. BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 27. 
2. BURDEAU, Georges. Droit constitutionnel et institutions politiques. 71 ed. Paris: Générale de Droit et de Jurispru­
dence, 1965. 
27 
NATHAUA MASSON 
Torna-se, pois, a Constituição, um documento essencial, imprescindível. Todo Estado 
a possui. Porque todo Estado precisa estar devidamente conformado, com seus elementos 
essenciais organizados, com o modo de aquisição e o exercício do poder delimitados, com 
sua forma de Governo e Estado definidas, seus órgãos estabelecidos, suas limitações fixa­
das, os direitos fundamentais do homem e as respectivas garantias asseguradas. 
Em suma, a Constituição é a reunião das normas que organizam os elementos cons­
titutivos do Estado}. 
Ressalte-se, todavia, estarem o termo "Constituição" e sua conceituação permanen­
temente em crise', já que os estudiosos não acordam quanto à uma definição, existindo 
uma pluralidade de concepções que fornecem noções acerca do assunto. Não se espera, no 
entanto, que algum dia seja diferente. Como Constituições são organismos vivos\ docu­
mentos receptivos aos influxos da passagem do tempo, em constante diálogo com a dinâ­
mica social, sempre haverá alguma dificuldade em sua delimitação, haja vista sua mutação 
constante, seu caráter aberto e comunicativo com outros sistemas. 
Quanto ao Direito ConstitucionaL é um dos ramos do Direito Público, a matriz que 
fundamenta e orienta todo o ordenamento jurídico. Surgiu com os ideais liberais atentan­
do-se, a princípio, para a organização estrutural do Estado, o exercício e transmissão do 
poder e a enumeração de direitos e garantias fundamentais dos indivíduos. Atualmente, 
preocupa-se não somente com a limitação do poder estatal na esfera particular, mas tam­
bém com a finalidade das ações estatais e a ordem social, democrática e política. 
Em uma análise pormenorizada, pode-se estudar o Direito Constitucional tendo por 
base três perspectivas distintas: o Direito Constitucional geral, o Direito Constitucional 
especial e o Direito Constitucional comparado. 
A primeira atém-se à definição de normas gerais para o Direito Constitucional, esta­
belecendo, por exemplo, conceitos (significado para locuções essenciais à compreensão da 
disciplina, como "Direito Constitucional", "Constituição", "poder constituinte", dentre 
outras), classificações e métodos de interpretação das Constituições. 
A segunda ocupa-se em escudar a Constituição acuai de um Estado específico. A 
terceira é rida como um método descritivo de análise e se subdivide em três categorias de 
estudo: critério temporal ou vertical, o qual compara Constituições de um mesmo Esta­
do, elaboradas em épocas diferences (ex: comparação entre a Constituição da República 
Federativa do Brasil de 1988 com a Constituição do Império de 1824); critério espacial ou 
horizontal, que se atém à comparação de Constituições vigentes em Estados distintos, que 
podem ou não ser contíguos (ex: comparar a nossa acuai Constituição com as Constitui­
ções de outros países da América Latina ou com a Constituição da Nova Zelândia); por 
fim, critério baseado na forma de Estado elegida (ex: comparar as Constituições dos países 
que adoram como forma de Estado a federada). 
3. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo. 281 ed. Malheiros, 2006, p. 38. 
4. BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 27. 
5. BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 27. 
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TEORIA DA CONSTITUIÇÃO 
2. CONCEPÇÕES DE CONSTITUIÇÃO 
2.1 . lntroduçáo 
Partindo da premissa de que a definição precisa do vocábulo "Constituição" é tarefa árdua, 
eis que o termo presta-se a mais de um sentido, reconhece-se uma gama variada de concepções 
que tencionaram desvendá-lo, cada qual construída a partir de uma distinta forma de entender 
e explicar o Direito. Em que pese serem rodas muito diversas e possuírem bases teóricas muitas 
vezes opostas, são de grande valia doutrinária, pois foram possivelmente adequadas em algum 
momento histórico (ou segundo um específico prisma de análise) e fornecem os elementos para 
a síntese dialética que o constitucionalismo contemporâneo oferta hoje. 
Far-se-á referência, nos irens seguintes, aos sentidos e as concepções de maior reper­
cussão que disputam a conceituação adequada do termo. 
2.2. Constituição sob o prisma sociológico 
Ao conceito sociológico associa-se o alemão Ferdinand Lassalle que, em sua obra 
"A essência da Constituição", sustentou que esta seria o produto da soma dos fatores 
reais de poder que regem a sociedade. 
Segundo esta concepção, a Constituição é um reflexo das relações de poder vigentes em 
determinada comunidade política. Assemelhada a um sistema de poder, seus contornos são 
definidos pelas forças políticas, econômicas e sociais atuantes e pela maneira como o poderestá distribuído entre os diferentes atores do processo político. Isso significa que Constituição 
real (ou efetiva) é, para o auror, o resultado desse embate de forças vigentes no tecido social. 
Oposta a esta, tem-se a Constituição escrita (ou jurídica) que, ao i ncorporar num 
texto escrito esses fatores reais de poder, os converte em instituições jurídicas. Todavia, 
essa Constituição escrita não passa de um mero "pedaço de papel", sem força diante da 
Constituição real, que seria a soma dos fatores reais de poder, isto é, das forças que acuam 
para conservar as instituições jurídicas vigentes. 
Como num eventual embate entre o texto escrito e os fatores reais de poder estes últi­
mos sempre prevalecerão, deverá a Constituição escrita sempre se manter em consonância 
com a realidade, pois, do contrário, será esmagada (como uma simples " folha de papel ") 
pela sua incompatibilidade com o que vige na sociedade. 
O autor exemplifica a essencial consonância entre o texto escrito e a realidade fática 
com uma interessante metáfora: 
Podem os meus ouvintes planear no seu quintal uma macieira e segurar no seu cronco um 
papel que diga: "Esca árvore é uma figueira". Basrar.í esse papel para transformar em figueira 
o que é macieira? Não, nacuralmenre. E embora conseguissem que seus criados, vizinhos e 
conhecidos, por uma ra:z.ão de solidariedade, conflrma!>sem a inscriç.ío existente na árvore 
de que o pé planeado era uma figueira, a plama continuaria sendo o que rea.lmeme era e, 
quando desse &ucos, demuiriam estes a f.íbula. produ1indo maçãs e não figos.'' 
6. FERDINAND, Lassalle. A Essência da Canstituiçãa. 91 ed. Brasília: Lumen Juris, 2009, p. 21. 
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NATHALIA MASSON 
Por outro lado, quando há inequívoca correspondência entre a Constituição real 
e a escrita, estaremos diante de uma situação ideal, em que a Consticuição é compatível 
com a realidade que ela pretende normatizar. Deste modo, para Ferdinand Lassale, só é, 
pois, eficaz aquela Constituição que corresponda aos valores presentes na sociedade. 
2.3. Constituição sob o aspecto político 
A percepção de Carl Schmitt, elaborada na clássica obra "Teoria da Consticuição", 
ventila um novo olhar sobre o modo de se compreender a Constituição: não mais arraigada 
à distribuição de forças na comunidade política, agora a Consticuição corresponde à "de­
cisão política fundamental" que o Poder Constituinte reconhece e pronuncia ao impor 
uma nova existência política. 
Sob o prisma político, portanto, pouco interessa se a Consticuição corresponde ou 
não aos fatores reais de poder, o importante é que ela se apresente enquanto o produto de 
uma decisão de vontade que se impõe, que ela resulte de uma decisão política fundamental 
oriunda de um Poder Constituinte capaz de criar uma existência política concreta, tendo 
por base uma normatividade escolhida. 
Para o autor, a compreensão do vocábulo "Consticuição" passa ainda pela aceitação de 
que o documento constitucional é um conjunto de normas que não estão conectadas por 
nenhuma unidade lógica. Os dispositivos só se assemelham no aspecto formal, pois estão 
todos inseridos num mesmo documento e não podem ser alterados por lei ordinária; sob 
o ponto de vista material os dispositivos integrantes da Consticuição variam: enquanto 
uns são cruciais para a comunidade (porque referem-se à estrucuração do Estado ou aos 
direitos fundamentais), outros só estão ali para se protegerem de uma modificação por lei 
ordinária, pois não trazem conteúdo de grande relevância jurídica e política. 
A leicura que o autor faz dessa diversidade de normas na Constituição cria uma dico­
tomia que as divide em "constitucionais" (aquelas normas vinculadas à decisão política 
fundamental) e em "leis constitucionais" (aquelas que muito embora integrem o texto 
da Consticuição, sejam absolutamente dispensáveis por não comporem a decisão política 
fundamental daquele Estado). 
Desta forma, constitucionais são somente aquelas normas que fazem referência 
à decisão política fundamental, consticuindo o que hoje denominamos de "normas ma­
terialmente consticucionais". Todos os demais dispositivos inseridos na Consticuição, mas 
estranhos a esses temas, são meramente leis consticucionais, isto é, nos dizeres atuais: so­
mente formalmente consticucionais. 
2.4. Constituição em sentido jurídico 
Na percepção jurídica a Consticuição se apresenta enquanto norma superior, de obe­
diência obrigatória e que fundamenta e dá validade a todo o restante do ordenamento 
jurídico. 
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TEORIA DA CONSTITUIÇÃO 
Esta concepção foi construída a panir das reses do mestre austríaco Hans Kelsen, 
que se tornou mundialmente conhecido como o autor da Teoria Pura do Direito. Obser­
ve-se, porém, que a teoria pura não é somente o título de uma obra e sim de um empreen­
dimento que tencionava livrar o Direito de elementos estranhos à uma leitura jurídica de 
seu objeto - isco é, visava desconsiderar a influência de outros campos do conhecimento 
como o político, o social, o econômico, o ético e o psicológico, uma vez que estes em nada 
contribuíam para a descrição das normas jurídicas - possibilitando que o Direito se elevas­
se à posição de verdadeira ciência jurídica. 
Kelsen estruturou o ordenamento de forma estritamente jurídica, baseando-se na 
constatação de que toda norma retira sua validade de outra que lhe é imediatamente 
superior. 
Segundo o autor, no mundo das normas jurídicas uma norma só pode receber vali­
dade de outra, de modo que a ordem jurídica sempre se apresente estruturada em normas 
superiores fundantes - que regulam a criação das normas inferiores - e normas inferiores 
fundadas - aquelas que tiveram a criação regulada por uma norma superior. 
Essa relação de validade culmina em um escalonamento hierárquico do sistema 
jurídico, uma vez que as normas nunca estarão lado a lado, ao contrário, apresentarão 
posicionamentos diferenciados em graus inferiores e superiores. 
Para exemplificar sua teoria, Kelsen sugere que pareamos de um fenômeno jurídico 
individual, como uma sentença. Acaso se pergunte por que a mesma é obedecida, o autor 
soluciona a questão remerendo o questionador ao código que autoriza ao juiz decidir o 
caso através da prolação da decisão - já que o código funciona como norma superior fun­
dante que confere validade jurídica à sentença. 
Mas a esca pode seguir-se outra pergunta, relativa à razão de o código ser válido. Por 
mais uma vez Kelsen nos remete a norma superior que dá validade ao código: o legislador 
está devidamente autorizado pela Constituição a editar as leis; desce modo, ao fazê-lo, está 
obedecendo a Constituição. 
Esta última, todavia, também compõe o sistema normativo e, como rodas as outras 
normas, depende que algo lhe confira validade: se uma norma somente adquire cal status 
a partir de uma outra norma, será preciso admitir que existe uma norma fundamentando 
a Conscicuição'. 
Pode ser que a acuai Constituição vigente em determinado Estado renha sido criada 
mediante uma lei autorizada pela Constituição anterior, recirando sua validade desce do­
cumento. Mas este último também pode cer sua validade questionada e assim sucessiva­
mente, até se chegar à primeira Conscicuição daquele Estado, provavelmente criada através 
da emancipação de um Estado freme a outro - revolução ou declaração de independência. 
7. SGARBI, Adrian. Hans Ke/sen. Ensaias Introdutórias. 11 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 13. 
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NATHALIA MASSON 
Ainda assim, frente a essa primeira Constituição (que não esteja em disputa e seja, 
portanto, eficaz8), a questão da validade permaneceria imperiosa, principalmente porque 
se não for devidamente resolvida, toda a cadeia de fundamencação deixa de fazer sentido: 
afinal, acaso se perca o fundamenco da Constituição, esta não estará apta a validar mais 
nada, os códigos perderiam seu suporte e, porconseguince, os atos que nele se fundamen­
tam também. O sistema desmoronaria. 
Essa cadeia de validade ou hierarquia do Direito deve, portamo, encontrar um ponco 
final sob pena de se chegar ao infinito, já que toda norma dependerá de uma superior e 
assim indefinidamente. 
A busca por esse último alicerce da ordem normativa levou Kelsen a construir a teoria 
da norma fundamental, que irá justificar a validade objetiva de determinada ordem ju­
rídica positiva. Chega-se a esta norma básica quando não se admite um único passo para 
trás na cadeia de validade jurídica, pois ela será a norma superior por excelência, única a 
não depender de outra que lhe dê suporte. 
E esta independência é característica que decorre do próprio sentido que ela possui: 
não é um documento factual, mas sim algo pressuposto. Kelsen explica melhor: 
A norma que representa o fundamenro de validade de uma ourra norma é, em face 
de�ra. uma norma superior. Mas a indagação do fundamento de validade de uma nor­
ma não pode, cal como a investigação da causa de um determinado efeiro, perder-se 
no inrerminável. Tem de terminar numa norma que se pressupõe como a última e 
a mais elevada. Como norma mais elevada, ela cem de ser pressuposta, visco que nfo 
pode ser posta por uma auroridade, cuja competência reria de se fundar numa norma 
ainda mais elevada. [ . . . ) Uma cal norma, pressuposra como a mais elevada, será aqui 
designada como norma íundamenral. [ . . . ) Todas as normas cuja validade pode ser 
reconduzida a uma e mesma norma fundamenral formam um sisrema de normas, 
uma ordem normativa. A norma fundamental é a fonre comum da validade de rodas 
as normas penencenres a uma e mesma ordem normativa, o seu fundamento de va­
lidade comum''. 
Ao se valer, pois, dessa pressuposição - de que há uma norma básica, através da qual 
todas as outras podem ser idencificadas numa sequência de atribuição de validade -, Kel­
sen demonstrou se submeter à inAuência de Kanc no que diz respeito a aceitação de que em 
todo ramo do conhecimento haverá de se reconhecer alguma pressuposição10• 
Para finalizar a análise da concepção jurídica, deve-se dizer ainda que foram desenvol­
vidos dois sentidos para o vocábulo "Constituição": 
8. Para nosso autor a Constituição deixa de ser considerada em disputa e torna-se globalmente eficaz quando as 
normas estão sendo obedecidas, isto é, servindo de parâmetro para as condutas, ou quando as normas não são 
devidamente observadas, mas os funcionários estão efetivamente punindo, através da aplicação de sanções, 
aqueles transgressores 
9. KELSEN, Hans. Teoflo Puro do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 2003, p. 217. 
10. "Segundo Kant, o trabalho de se encontrar os elementos universais do conhecimento não se dá sem alguma 
pressuposição, através da qual todo o resto obtém sentido" (SGARBI, Adrian. Teoflo do Direito. 11 ed. Brasília: 
Lumen Juris, 2007, p. 48). 
32 
TEORJA DA CONSTITUIÇÃO 
(i) no primeiro, lógico-jurídico, "Constituição" significa a "norma fundamental 
hipotética", que não é posta, mas sim pressuposta, e que positiva apenas o comando "obe­
deçam a Constituição positiva"; 
(ii) o segundo, jurídico-positivo, traz "Constituição" como norma positiva supre­
ma, que fundamenta e dá validade a todo o ordenamento jurídico, somente podendo 
ser alterada se obedecidos ricos específicos. 
Em conclusão, a concepção puramente normativa da Constituição não considera se o 
documento constitucional é estabelecido por alguma vontade política, tampouco se reflete 
fielmente os fatores reais de poder que regem a sociedade. Ao contrário, vê a Constituição 
enquanto um conjunto de normas jurídicas prescritivas de condutas humanas, devidamen­
te estruturadas e hierarquizadas num ordenamento escalonado, que encontra seu funda­
mento de validade definitivo e último na norma fundamental, ponto de convergência de 
todas as normas integrantes do sistema jurídico e fundamento de validade transcendental 
de roda a estrutura normativa. 
2.5. Concepção culturalista da Constituição (a busca por alguma conexão en­
tre os sentidos anteriormente apresentados) 
Esta acepção desenvolve-se a partir da consideração de que a Constituição é um pro­
duto da cultura, pois assim como a cultura é o resultado da atividade criativa humana, o 
Direito também o é. 
Para esta concepção, a Constituição se fundamenta simultaneamente em fatores 
sociais, nas decisões políricas fundamentais (frutos da vontade política do poder consti­
tuinte) e também nas normas jurídicas de dever ser cogentes. Com isso, congrega rodas 
as concepções anteriores, criando o ambiente jurídico favorável ao surgimento de uma 
Constituição total, com aspectos econômicos, morais, sociológicos, filosóficos e jurídicos 
reunidos com o firo de construir uma unidade para a Constituição. 
Esse conceito de Constituição total agrega, numa mesma e unitária perspectiva, 
variados aspectos (econômicos, morais, sociológicos, filosóficos e jurídicos), o que afasta 
a visão estreita acarretada pelo isolacionismo das acepções anteriormence escudadas. 
Para a teoria culruralista não parece adequado explicar a Constituição como um mero 
fato social, como pretenderam os adeptos da concepção sociológica. Isso porque em que 
pese as perspectivas social, econômica e história influenciarem, claro, o desenvolvimento 
da ordem jurídica, esta última não se reduz a um simples produto das infraestruturas so­
ciais. Também a limitação da Constituição à decisão política fundamencal tem sua impor­
tância - especialmente no que se refere à robustez conferida à doutrina do poder originário 
enquanto tradução da vontade polírica da nação - mas não explica satisfatoriamente o 
conceito. Por último, a percepção jurídica também não parece, aos partidários da leitura 
culturalista, uma acepção completa haja vista se dissociar em demasia das bases empíricas 
que a produziram, desconsiderando completamente a realidade social concreta que ela visa 
normatizar. 
33 
NATHALIA MASSON 
É nesse sentido que alguns aurores têm demonstrado inequívoca predileção pelo cul­
turalismo como forma de entender e explicar o conceito de Constituição. De acordo com 
Dirley: "Devemos, porém, confessar que a concepção de Constituição como faro cultural 
é a melhor que desponta na teoria da Constituição, pois tem a virtude de explorar o texto 
constitucional em rodas as suas potencialidades e aspectos relevantes, reunindo em si ro­
das as concepções - a sociológica, a política e a jurídica - em face das quais se faz possível 
compreender o fenômeno constitucional ".1 1 
3. CLASSIFICAÇÃO DAS CONSTITUIÇÕES 
Não de maneira uníssona, a doutrina, no intuito de classificar as Constituições, apresen­
ta variados critérios tipológicos, alguns meramente formais, outros pretensamente substan­
ciais12. Na tentativa de sistematizar os mais usuais utilizados pelos diversos autores pátrios, 
analisaremos, a seguir, os considerados tradicionais e úteis à compreensão adequada do tema. 
3. 1 . Quanto à origem 
(A) Democrática 
Igualmente denominada promulgada, popular ou votada, esta Constituição tem seu 
texto construído por intermédio da participação do povo, de modo direto ou indireto (por 
meio de representantes eleitos). Homenageia o Princípio Democrático na medida em que 
confirma a soberania popular, demonstrando que Governo legítimo é aquele que se cons­
trói afirmando a vontade e os interesses de seus governados. 
Nos dizeres de José Afonso da Silva, são promulgadas "as Constituições que se origi­
nam de um órgão constituinte composto de representantes do povo, eleitos para o fim de 
as elaborar e estabelecer"13. Como exemplo desta tipologia, podemos citar as Constituições 
brasileiras de 1891, 1934, 1946 e 1988. 
(B) Outorgada 
Considera-se outorgada (ou imposta, ditatorial, autocrática e carta constitucional) 
a Constituição que é construída e estabelecidasem qualquer resquício de participação 
popular, sendo imposta aos nacionais como resultado de um aro unilateral do governante. 
O povo não participa do seu processo de formação, sequer indiretamente. Nos dizeres de 
Kildare "outorgada é a Constituição em que não há colaboração do povo na sua elabora­
ção: o Governo a concede graciosamente"14. 
11. CUNHA JÚNIOR, Dirley. Curso de Direito Constitucionol. 6! ed. Salvador: Juspodivm, 2012, p. 95. 
12. MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet; COELHO, Inocêncio Mártires. Curso de Direito Consti­
tucional. S! ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 61. 
13. SILVA, José Afonso da. Cursa de Direita Constitucional positivo. 28íl ed. Malheiros, 2006, p. 41. 
14. CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direita Constitucional: teoria da estada e da Constituição. Direito constitucionol 
positivo. 14! ed. rev. atual. e ampl. Belo Horizonte: Dei Rey, 2008, p. 273. 
34 
TEORIA DA CONSTITUIÇÃO 
Usualmente são Constituições ditatoriais e, como exemplo, podemos citar a Constitui­
ção francesa de 1814, que Luís XVIII, valendo-se de poderes de monarca absoluto, outorgou 
ao país, bem como as Constituições Brasileiras de 1824, 1937, 1967 e a EC nº 1/1969. 
Historicamente, cal tipologia deriva de uma concessão de poder em que o governante 
(rei, imperador, ditador), em benefício do povo, se auto limita, desfazendo-se de seu poder, 
até então absoluto. Esclarecedora é a lição de Paulo Bonavides: 
(C) Cesarista 
A Consricuição outorgada represenca, na rela do consricucionalismo, um largo esboço 
de limitação da autoridade do governance, o rei, príncipe ou Chefe de Estado, enfeixa 
em suas mãos poderes absoluros, mas consente unilateralmente em desfazer-se de uma 
parcela de suas prcrrogarivas ilimitadas em proveiro do povo, que entra assim no gozo 
de direiros e garancias, ranro jurídicas como políricas, aparencemence por obra apenas 
em graça da munificência reaJI�. 
Similarmente à outorgada, a Constituição intitulada cesarista cem seu texto elaborado 
sem a participação do povo. No encanto, e diferentemente daquela, para entrar em vigor 
dependerá de aprovação popular que a ratifique depois de pronta. 
Nada obstante a população ser chamada ao processo de formação do documento 
conscicucional, não há que se falar em cexco democrático exatamente porque cal integração 
se dá apenas formalmente, através da concordância popular a um documento já pronto, 
inteiramente formatado, sem nenhuma possibilidade de inserção de conteúdo novo. 
No mesmo sentido desces ensinamentos, José Afonso da Silva16 também a fasea o cará­
ter popular dessas Constituições, vez que a participação dos indivíduos, nesses casos, não 
é realmente democrática - afinal ocorre no intuito de conferir aparência de legítima (de 
roupagem democrática) à tirânica e autoritária vontade do detentor do poder. Nas palavras 
do autor, na classificação quanto à origem, pode-se agregar às ordinárias tipologias de 
"promulgada" e "outorgada" um 
ourro ripo de Constituição, que não é propriamente ourorgada, mas tampouco é democrá­
tica, ainda que criada com a parricipação popular. Podemos chamá-la Consriruição cesarista, 
porque formada por plebiscito popular sobre um projeto por um imperador (plebisciro na­
poleônico) ou um ditador (plebiscito de Pinocher, no Chile). A parricipação popular, nesses 
casos, não é democrática, pois visa apenas ratificar a vontade do detentor do podcr1". 
(D) Dualistas (ou convencionadas) 
Também intituladas pactuadas, as Constituições dualistas - absolutamente antiqua­
das em face do conscicucionalismo contemporâneo - são formadas por cexcos constitucio­
nais que nascem do instável compromisso (ou pacto) entre forças opositoras, no caso entre 
15. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 15' ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 89. 
16. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 251 ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 42. 
17. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo. 281 ed. Malheiros, 2006, p. 41-42. 
35 
NATHALIA MASSON 
o monarca e o Poder Legislativo (representação popular), de forma que o texro constitu­
cional se constitua alicerçado simultaneamente em dois princípios antagônicos: o monár­
quico e o democrático. 
De acordo com Paulo Bonavides 
A Consciruiçáo pacruada é aquela que exprime um compromisso instável de duas forças 
políricas rivais: a realeza absoluta debilitada, de uma pane, e a nobreza e a burguesia, em 
franco progresso, doutra. Surge encáo como cermo dessa relação de equilíbrio a forma 
insrirucional da monarquia limitada18. 
Em resumo, as Constituições dualistas são o produto desse precário diálogo entre a 
monarquia enfraquecida de um lado e a burguesia em franca ascensão de outro, represen­
tando um texto que limita o poder do rei - já que o submete aos esquemas constitucio­
nais19 - e acaba por cristalizar as chamadas "monarquias constitucionais" ou "representati­
vas", em claro abandono das "monarquias absolutas". 
3.2. Quanto à estabilidade (mutabilidade ou processo de modificação) 
(Li) Imutável 
Reconhecida também pelos termos "granítica", "intocável" e "permanente" (ou, iro­
nicamente, "utópica", segundo Pontes de Miranda20), é uma Constituição dotada de uma 
fantasiosa pretensão à eternidade. Não permite qualquer mudança de seu texto, pois não 
prevê procedimento de reforma, e baseia-se na crença de que não há órgão constituído 
com legitimidade suficiente para efetivar alterações num texto criado por uma "entidade 
suprema e superior" (normalmente considerada divina). 
Atualmente escá completamente em desuso e é apenas uma reminiscência histórica 
- porquanto inimaginável na atualidade um documento constitucional que ignore, em 
absoluto, os influxos sociais e políticos. 
Essa é também a posição de José Afonso da Silva, para quem a estabilidade das Cons­
tituições é importante para assegurar certa permanência e durabilidade das instituições, 
mas não deve ser absoluta, significando imutabilidade. Na percepção do auror: 
Não há Consricuição imucável diance da realidade social cambianre, pois não é ela ape­
nas um inscrumenro de ordem, mas deverá-sê-lo, também, de progresso social. Deve-se 
assegurar cerca estabilidade conscirucional, ( . . . ) mas 5em prejuízo da consranre, canro 
quanro possível, perfeita adaptação das consriruiçóes às exigências do progresso, da evo­
lução e do bem-esrar social" ' 1 • 
18. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. lSi ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 89. 
19. MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 261 ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 11. 
20. MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet; COELHO, Inocêncio Mártires. Curso de Direita 
Constitucional. 5! ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 62. 
21. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo. 28! ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2006, p. 
41-42. 
36 
TEORIA DA CONSTITUIÇÃO 
A doutrina enumera as leis fundamentais antigas, como o Código de Hamurabi e a 
Lei das XII Tábuas, como exemplos de Constituições imutáveis22• 
(B) Transitoriamente imutável 
Visando preservar a redação original de seu texto nos primeiros anos de vigência, 
determinadas Constituições impedem a reforma de seus dispositivos por cerco período. 
Foi o que fez a Constituição Imperial de 1824, que estabeleceu, no are. 1742·1 que seu texto 
somente poderia ser modificado após 4 anos de sua vigência. 
Em verdade, parece-nos que esta relativa e temporária imutabilidade nada mais é do 
que uma mera limitação temporal ao poder de reforma - o que coma desnecessária referida 
classificação. 
(C) Fixa 
Igualmente inciculada silenciosa - já que não há em seu texto o procedimenco de 
modificação de seus dispositivos -, reconhece a possibilidade de seu texto sofrer refor­
ma, porém apenas pelo órgão que a criou (poder constituinte originário).Hoje tidas 
por relíquias históricas, podem ser exemplificadas pelo Escacuco do Reino da Sardenha 
de 1 848 (que depois vem a ser a Constituição da Itália) e a Constituição Espanhola 
de 187624• 
Em reforço ao conceico apresentado, Kildare preceitua serem as Constituições fixas 
"aquelas que somente podem ser alteradas por um poder de competência igual àquele que 
as criou, isco é, o poder constituinte originário"2�. 
(D) Rígida 
A alteração desta Constituição é possível, mas exige um processo legislativo mais com­
plexo e solene do que aquele previsco para a elaboração das demais espécies normativas, in­
fraconsticucionais. Tais regras diferenciadas e rigorosas são estabelecidas pela própria Cons­
tituição e comam a alteração do texco constitucional mais complicada do que a feitura das 
leis comuns. 
Temos como exemplo de Constituição rígida a Constituição Federal de 1988, que 
exige o respeico a um procedimento bem mais severo e rigoroso do que aquele estabelecido 
para a consrrução da legi�lação ordinária para a aprovação de suas emendas constitucionais 
22. NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 51 ed. São Paulo: Editora Método, 2011, p. 111. 
23. Art. 174, Constituição Imperial de 1824: "Se passados quatro annos, depois de jurada a Constituição do Brazil, se 
conhecer, que algum dos seus artigos merece roforma, se fará a proposição por escripto, a qual deve ter origem 
na Camara dos Deputados, e ser apoiada pela terça parte delles". 
24. BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 43. 
25. CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional: teona do estado e do Constituição. Direito constitucional 
positivo. 141 ed. rev. atual. e ampl. Belo Horizonte: Dei Rey, 2008, p. 274. 
37 
NATHALIA MASSON 
- conforme dispõe o are. 60, CF/88, há que haver a aprovação em cada Casa do Congresso 
Nacional, Câmara dos Deputados e Senado Federal, em dois turnos, em cada qual sendo 
necessária a obtenção da maioria de 3/5 dos componentes da Casa respectiva. 
Há, todavia, uma leve divergência doutrinária a respeito desta classificação. Alexan­
dre de Moraes emende ser a Constituição de 1988 superrígida, pois, além de suscetível a 
processo legislativo diferenciado, possui, segundo o autor, normas imutáveis (as cláusulas 
pécreas, constantes do are. 60, § 4°, CF/88). Nos dizeres do aucor "a Constituição Federal 
de 1988 pode ser considerada como superrígida, uma vez que em regra poderá ser altera­
da por um processo legislativo diferenciado, mas, excepcionalmente, em alguns pomos é 
imutável (CF, are. 60, § 4° - cláusulas pétreas)"26• 
Percebe-se, pois, que o autor identifica diferences graus de rigidez, concebendo, pois, 
uma rigidez que extrapola o comum. Assim, na sua percepção, já que a Constituição brasi­
leira de 1988 possui, no are. 60, § 4°, cláusulas imodificáveis, intituladas cláusulas pétreas, 
teria um cerne fixo que a caracterizaria enquanto superrígida. 
Não é este, todavia, o entendimento da doutrina majoritária, que compreende a Cons­
tituição de 1988 enquanto rígida, sob a justificativa de que o que caracteriza a rigidez é 
exatamente o procedimento diferenciado de alteração - marcado por quorum de vocação 
qualificado, rejeição ao turno único, ampliação das discussões - e não a existência de um 
núcleo insuperável, insuscetível à ação restritiva ou aboliciva do poder reformador, que 
pode existir ou não nos documentos rígidos. 
Por fim, outro exemplo de Constituição notadamence rígida é a dos Estados Unidos 
da América, que somente pode ser modificada se a proposta de alteração for aprovada por 
2/3 dos componentes das duas Casas do Congresso (Câmara de Representantes e Senado) 
e se, depois disso, for ratificada por crês quartos dos Estados da Federação nas Assembleias 
Legislativas ou em Convenções estaduais27• 
(E) Flexível 
Contrapõe-se à rígida, uma vez que pode ser modificada por intermédio de um proce­
dimento legislativo comum, ordinário, não requerendo qualquer processo específico para 
sua alteração. 
O impacto mais relevante da adoção de um texto classificado como flexível é a 
inexistência de supremacia formal da Constituição sobre as demais normas, afinal rodas 
são elaboradas, modificadas e revogadas por rito idêntico. Nesse sentido, a própria lei 
26. MORAES, Alexandre. Direito Constitucionol. 15! ed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 41. 
27. CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional: teoria do estado e do Constituição. Direito constitucionol 
positivo. 14! ed. rev. atual. e ampl. Belo Horizonte: Dei Rey, 2008, p. 275. 
38 
TEORIA DA CONSTITUIÇÃO 
ordinária contrastante com o teor do cexco conscicucional, o alcera28• Por outro lado no­
ra-se, entre o cexco conscicucional e o restante do corpo normativo, supremacia material, 
de conteúdo - sendo constitucionais as normas que regulamentam a estrutura política 
do Estado. 
Tradicionalmente a doutrina aponta a Constituição inglesa como exemplar de cexco 
Aexível29. Outros cexcos flexíveis são os da Nova Zelândia, da Finlândia e da África do Sul3°. 
(F) Transitoriamente flexível 
Possuidora de Aexibilidade temporária, autoriza durante cerco período a alteração de 
seu cexco através de um procedimento mais simples, baseado no rico comum; vencido este 
primeiro estágio, passa a somente permitir a modificação de suas normas por intermédio 
de um mecanismo diferenciado, quando, então, passa a ser considerada rígida. 
Porque cal Constituição não é ao mesmo tempo flexível e rígida (é primeiro flexível, 
e depois passa a condição de documento rígido) não pode ser intitulada semirrígida ou 
semiflexível (tipologia apresentada no icem seguinte). Conscicui uma forma autônoma, 
cunhada doucrinariamence para dar conta de Constituições como a de Baden, de 1947 ou 
a da I rlanda de 1937-�1• 
(G) Semirrigida 
Estamos diante de uma Constituição semirrígida - também conhecida como semi­
flexível - quando o mesmo documento conscicucional pode ser modificado segundo ricos 
distintos, a depender de que ripo de norma esteja para ser alterada. Neste ripo de Consci­
cuição, alguns artigos do cexco (os que abrigam os preceitos mais importantes) compõem a 
parte rígida, de forma que só possam ser reformados por meio de um procedimento dife­
renciado e rigoroso, enquanto os demais (que compõe a parte flexível) se alteram seguindo 
processo menos complexo, menos dificulcoso. 
Nossa Constituição Imperial de 1824, em virtude da previsão constante do art. 178u, 
era assim considerada, conforme assegura Kildare: 
28. SILVA, Jose Afonso da. Curso de Direito Constitucionol positivo. 281 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2006, p. 
41-42. 
29. "Embora se faça referência à Constituição inglesa, trata-se da Constituição do Reino Unido, que vige na Inglater­
ra, País de Gales, Escócia e Irlanda do Norte. Com efeito, através dos atos da União (acts of Union), de 1706 a 
1800, respectivamente, foram abolidos os parlamentos escocês e irlandês, surgindo o Reino Unido, sendo que 
o Parlamento em Westminster é composto de membros que representam os eleitorados de todos esses países, 
com competência para elaborar as leis para toda e qualquer parte do Reino Unido". (CARVALHO, Kildare Gonçal­
ves. Direito Constitucional: teoria da estado e da Constituição. Direito constitucional positivo. 141 ed. Rev. Atual. 
e ampl. Belo Horizonte: Dei Rey, 2008, p. 274). 
30. BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 43. 
31. BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 43. 
32. Art. 178, Constituição Imperial de 1824: "É só Constitucional o que diz respeito aos limites, e attribuições respec­
tivas dos Poderes Politicos, e aos Direitos Políticos, e individuaes dos Cidadãos. Tudo, o que não é Constitucional, 
póde ser alterado sem as formalidades referidas, pelas Legislaturas ordinárias".39 
NATHALIA MASSON 
No Brasil, a Consriruiçáo do Império de 1824 caracrerizava-se pela semi-rigidez. É o 
que seu artigo 178 dispunha que se consideravam como constitucionais apenas as ma­
rérias que se referissem aos limices e rribulaçóes do poder polírico e aos direitos políricos 
e individuais dos cidadãos. Tudo o mais, embora figurasse na Consriruição por não ser 
consrirucional, podia ser alrerada por lei ordinária33• 
3.3. Quanto à forma 
(A) Escrita 
Escrita é a Constituição na qual todos os dispositivos são escritos34 e estão inseridos de 
modo sistemático em um único documento, de forma codificada - por isso diz-se que sua 
fonte normativa é única. A elaboração do texto pelo órgão constituinte se dá num momen­
to único, "de um jato", conforme o magistério da doutrina35. Segundo o autor português 
). ). Gomes Canotilho estas Constituições são instrumentais e conferem ao documento 
constitucional vantajosos atributos, tais como o efeito racionalizador, o efeito estabilizante, 
a segurança jurídica, a calculabilidade e a publicidade das normas36• 
(B) Não escrita 
É aquela Constituição na qual as normas e princípios encontram-se em fontes nor­
mativas diversas, todas de natureza constitucional e de mesmo patamar hierárquico, sem 
qualquer precedência de uma sobre as demais. 
Contrariamente às Constituições escritas - onde todas as normas constitucionais po­
dem ser encontradas em um único documento - nas Constituições não escritas, em razão 
de as fontes normativas constitucionais serem múltiplas, as normas constitucionais estão 
esparsas e podem ser encontradas canto nos costumes e na jurisprudência dos Tribunais, 
como nos acordos, convenções e também nas leis. 
Atenção para um equívoco corriqueiro, que deve ser evitado: a Constituição não es­
crita não possui somente normas não escritas. Ao contrário, é formada pela junção destas 
com os textos escritos! Como exemplo, além das Constituições de Israel e a da Nova Ze­
lândia, podemos mencionar a Constituição inglesa37• 
No mais, sobre a (reduzida) importância da classificação apresentada neste item, pre­
ceitua Gilmar Mendes que quanto à forma, 
33. CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional: teoria do estado e da Constituição. Direito constitucional 
positivo. 14! ed. rev. atual e ampl. Belo Horizonte: Dei Rey, 2008, p. 276. 
34. José Afonso da Silva reconhece a existência de conexão entre o conceito de Constituição dogmática e o de Cons­
tituição escrita, bem como entre o de Constituição histórica com o de Constituição não escrita. Na percepção 
dele a Constituição dogmática é sempre escrita, e a histórica necessariamente não escrita. (SILVA, José Afonso 
da. Curso de Direito Constitucional positivo. 28! ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2006, p. 41.) 
35. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo. 28! ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2006, p. 41. 
36. CANOTILHO, J . J. Gomes. Direito Constitucionol. 6! ed. Coimbra: Almedina, 1993, p. 62. 
37. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucionol positivo. 28! ed. Malheiros, 2006, p. 41. 
40 
TEORIA DA CONSTITUIÇÃO 
uma classificação cuja utilidade parece restringir-se a complementar a singularidade da 
experiência conscicucional inglesa-, as constituições são escritas ou não escritas, confor­
me se achem consolidadas em texco formal e solene, ou se baseiem em usos e costumes, 
convenções e textos esparsos, bem assim na jurisprudência sedimentada em corno desses 
elementos de índole conscicucional18• 
3.4. Quanto ao modo de elaboração 
(A) Dogmática 
Também denominada ortodoxa, traduz-se num documento necessariamente escrito, 
elaborado em uma ocasião certa, historicamente determinada, por um órgão competente 
para tanto. Retrata os valores e os princípios orientadores da sociedade naquele específico 
período de produção e os insere em seu texto, fazendo com que ganhem a força jurídica de 
dispositivos cogentes, de observância obrigatória. 
Percebe-se que a inserção dos valores e princípios que regulam a vida em sociedade em 
determinado momento histórico no texto maior os transforma em dogmas - não por ourra 
razão as Constituições assim formadas recebem a denominação de dogmáticas. 
(B) Histó1·ica 
Sempre não escrita, é uma Constituição que se constrói aos poucos, em um lento 
processo de filtragem e absorção de ideais por vezes contraditórios; não se forma de uma 
só vez como as dogmáticas. Em verdade, é o produto da gradativa evolução jurídica e 
histórica de uma sociedade, do vagaroso processo de cristalização dos valores e princípios 
comparrilhados pelo grupo social. Corno exemplo contemporâneo de Constituição histó­
rica, temos a inglesa. 
Sobre essa classificação (quanto ao modo de elaboração), uma consideração final é per­
tinente: em termos de estabilidade pode-se dizer que a histórica é mais duradoura e sólida, 
enquanto a dogmática apresenta sensível tendência à instabilidade. Isso porque enquanto a his­
tórica é resultado de uma paulatina maturação dos diferentes valores que existem na sociedade 
- o que resulta num texto demoradamente pensado e acordado pelas distintas forças políticas 
atuantes - a dogmática, no mais das vezes, sedimenta valores contingenciais, interesses passa­
geiros, e estes, conforme vá se alterado o tecido social, vão se tornando obsoletos, inadequados, 
o que acarreta a necessidade de seguidas modificações do texto para que a indispensável corres­
pondência entre a Constituição e a realidade a ser normatizada seja mantida. 
3.5. Quanto à extensão 
(A) Analítica 
Igualmente apresentada como "prolixa" (ou "longa'', "ampla'', larga", "extensa"), sua con­
fecção se dá de maneira extensa, ampla, detalhada, já que regulamenta rodos os assuntos con­
siderados relevantes para a organização e funcionamento do Estado. Referida Constituição 
38. MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet; COELHO, Inocêncio Mártires. Curso de Direito 
Constitucional. 51 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 62. 
41 
NA IHALIA \IASSON 
não se preocupa em cuidar apenas de matérias constitucionais, essenciais à formação e 
organização do aparelho esraral e da vida em sociedade; ao conrrário, descreve os porme­
nores da vida no Estado, através de uma infinidade de normas de conteúdo dispensável 
à estruturação estatal. Segundo a doutrina, é uma Constituição que se desdobra "numa 
infinidade de normas no afã de constitucionalizar todo o conjunto da vida social"19• Por 
resultado, temos uma Constituição inchada, com número sempre volumoso de artigos. 
Como exemplo pode-se citar a Constituição do Brasil de 1988, a de Portugal ( 1976) 
e a da Espanha (1978). 
Já que cada vez mais temos Constituições analíticas em vigor, os autores se debruça­
ram sobre as razões que levam os Estados a construírem documenros constitucionais tão 
longos e detalhados. Conforme André Ramos Tavares ensina, 
(B) Concisa 
a indiferença, que se cem formado em desconfiança, quanro ao legislador ordinário; a 
estacura de cercos direitos subjecivos, que estão a merecer proteção juridicamente di­
ferenciada; a imposição de certos deveres, especialmente aos governances, evirando-se 
o desvio de perder e a arbicrariedadc; a necessidade de cercos insticucos sejam perenes, 
garantindo, assim, um sentimento de segurança jurídica decorrente da rigidez consti­
cucional.•0 
Sintética (concisa, sumária ou reduzida) é a Constiruição elaborada de forma breve, 
com preocupação t'.1nica de enunciar os princípios básicos para a estruturação estatal, man­
tendo-se restrita aos elementos subsrancialmence constitucionais. 
Por ser um documento sucinto, elaborado de modo bastante resumido, seu texto se 
encerra após estabelecer os princípios fundamentais de organização do Estado e da socie­
dade. Tem-se como exemplo desse tipo de Constituição a dos Estados Unidos da América, 
de 1787, possuidora de apenassete artigos originais (redigidos em 4.400 palavras, tão 
somente!). 
Parcela da doutrina vê virtudes nestas Constituições em razão da sua maior duração 
ao longo do tempo, "por serem mais facilmente adaptáveis às mudanças da realidade, dado 
o seu caráter principiológico, sem que haja necessidade de constante alteração formal do 
seu rexto"·11• 
Outros juristas42, no entanto, destacam ser corriqueira a exaltação das vantagens das 
Constituições sintéticas (como é a dos Estados Unidos) e as críticas às Constiruições ana­
líticas, como a nossa de 1988 e tantas outras, cujo textos, considerados volumosos, e dera­
lhistas, dificultariam as interpretações atualizadoras e obrigariam o constiruince derivado 
a sucessivos esforços de revisão. No entanto, conforme adverte Gilmar Mendes "convém 
39. MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet; COELHO, Inocêncio Mártires. Curso de Direito 
Constitucionol. 51 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 63. 
40. TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucionol. 61 ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 73. 
41. CARVALHO, Kildare Gonçalves de. Direito Constitucionol. 111 ed. Belo Horizonte: Dei Rey, 2005, p. 203. 
42. MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet; COELHO, Inocêncio Mártires. Curso de Direito Consti­
tucional. 51 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 63. 
42 
TEORIA DA CONSTITUIÇÃO 
não perdermos de vista que as Constituições - assim como o direico, em geral, e as demais 
coisas do espírico - refletem as crenças e as tradições de cada povo, valores que não podem 
ser trocados por modelos alienígenas"H. 
Nesse sentido, segundo Gisela Maria Bescer a evidente prolixidade e inequívoca ex-
tensão do nosso texto são um reflexo perfeito das 
virrudcs e os defeitos do povo brasileiro. E se ela é exccnsa, é porque não somos sutis a pon­
to de termos regras claras e objetivas com paralela economia de palavras. Não, não somos 
dados à sutilezas; nós somos explíciros, minudentes e repetitivos, e bem por isso precisamos 
inserir e repetir no texto constitucional regras que pareceriam óbvias em outras culruras. Se 
a Consriruiçáo é "exagerada", é porque nós brasileiros, somos exatamente assim: exagerados, 
expansivos, largos nos sorrisos e nas maneiras. Somos abundantes nas cores, nos decores, 
das mesas postas, na volupruosidade da exibição dos corpos masculinos e femininos. Somos 
furcos na exposição de nossas vaidades, mas cambém na administração do que vem de fora. 
Falamos alro, furamos filas, mas também somos exuberante solidários, acolhedores, hospi­
taleiros, sensíveis, emotivos. Um sem-número de outros defeitos e qualidades poderiam ser 
descritos, mas os listados já nos bastam para provarmos uma tese irrefutável: a tese de que 
a Constiruiçáo é o nosso retrato. A Consciruição modelo, dos Estados Unidos, enxuta na 
forma, breve, objetiva, calvez não nos çirva porque somos de uma exuberante extroversão, daí 
que para nós só poderia ser mesmo uma Constituição do tipo generosa.•• 
3.6. Quanto ao conteúdo 
(A.) Material 
Definida a partir de critérios que envolvam o conteúdo das normas, em uma Cons­
tituição deste tipo considera-se constitucional coda norma que tratar de matéria constitu­
cional, independentemente de estar cal diploma inserido ou não no texto da Constituição. 
A doutrina ainda não pacificou a definição do que seja ou não matéria conscicucional, 
entrecanco parece-nos existir acordo no que tange ao reconhecimento de que alguns assun­
tos seriam indispensáveis a um texto constitucional, por serem essenciais à organização e 
estruturação do Estado. Este rol mínimo seria formado, ao menos, pelos seguintes temas: 
estruturação da forma de Estado, regime, sistema e forma de Governo; repartição de atri­
buições entre os entes escacais; direicos e garantias fundamentais do homem. 
(B) Formal 
Nesta acepção, constitucional são rodas as normas inseridas no cexco da Constitui­
ção, independentemente de versarem ou não sobre remas tidos por conscirncionais, isco é, 
assuntos imprescindíveis à organização política do Estado. Em outros termos, são consti­
tucionais os preceicos que compõe o documento constitucional, ainda que o conteúdo de 
alguns desces preceitos não possa ser considerado materialmente constitucional. 
43. MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet; COELHO, Inocêncio Mártires. Curso de Direito Consti­
tucionol. 51 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 63. 
44. BE5TER, Gisela Maria. Direito Constitucional -fundamentos teóricos, p. 115-116, opud CARVALHO, Kildare Gon­
çalves de. Direito Constitucional. 111 ed. Belo Horizonte: Dei Rey, 2005, p. 295. 
43 
NATHALIA MASSON 
Assim, nas Constituições formais teremos alguns dispositivos só formalmente cons­
titucionais (estão inseridos no documento, mas no que se refere ao conteúdo não podem 
ser considerados constitucionais), enquanto outros serão formal e materialmente constitu­
cionais, em razão de estarem no texto da Constituição e tratarem de matéria considerada 
constitucional. 
No mais, as explicações postas acima permitem as seguintes conclusões: 
(i) o sentido formal de uma Constituição só é possível se ela for escrita, ou seja, se 
possuir todas as suas normas agregadas em um único documento - afinal é justamente 
este texto codificado e sistematizado que reunirá a totalidade das normas e princípios 
constitucionais; 
(ii) na acepção formal, como só podem ser consideradas constitucionais as normas 
integradas ao texto da Constituição, rodas as demais normas, independencemence do 
conteúdo delas, serão consideradas infraconsticucionais, isto é, inferiores à Constitui­
ção; 
(iii) rodas as normas infraconstitucionais, independentemente da matéria que regu­
lem, são inferiores à Constituição, por isso lhe devem respeito e obediência; 
(iv) qualquer norma infraconstitucional que contrarie a Constituição será considerada 
inconstitucional. Nesse sentido, mesmo que uma norma infraconstitucional de conteúdo 
marerialmeme constitucional afronte o previsto numa norma constitucional que não tenha 
conteúdo materialmente constitucional (isco é, seja só formalmente constitucional), esta últi­
ma prevalecerá, por ser a Constituição - com todas as suas normas - um documento superior 
aos demais. 
(v) Por último, não há hierarquia normativa entre as normas constitucionais; todas 
possuem o mesmo status, a mesma dignidade normativa, independentemente de qual seja 
seu conteúdo. 
3.7. Quanto à finalidade 
(A) Garantia 
Também denominada "Constituição-quadro'', restringe o poder escacai, criando esfe­
ras de não ingerência do poder público na vida dos indivíduos. Por possuir um corpo nor­
mativo repleto de direitos individuais oponíveis ao Estado, diz-se que traz para os sujeitos 
liberdades-negativas ou liberdades-impedimentos, que estabelecem espaços de não atuação 
e não interferência estacai na vida privada. 
A doucrina4� aponta que a Constituição garantia é um documento com "olhar" di­
recionado ao passado, pois se preocupa em garantir os direitos já conquistados outrora, 
protegendo-os em face de uma possível (e indesejável) interferência do Estado. 
45. FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 221 ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 12-13. 
44 
TEORIA DA CONSTITUIÇÃO 
(B) Balanço 
Igualmente intitulada "Constituição-registro", é própria dos regimes socialistas - as 
Constituições de 1924, 1936 e 1977 da extinta União das Repúblicas Socialistas Soviéticas 
são exemplos. Esta tipologia constitucional, cujo "olhar" se volta para o presente, procura 
explicitar o desenvolvimento acuai da sociedade e ser um espelho fiel capaz de traduzir os 
patamares em que se encontram a economia e as inscicuições políticas. 
Nos dizeres de Manoel Gonçalves Ferreira Filho 
(C) Dirigente 
é a Consriruiçáo que descreve e regisrra a organização polírica esrabelecida. Na verdade, 
segundo essadourrina, a Consriruiçáo regisrraria um esrágio das relações de poder. Por 
isso é que a URSS, quando alcançado novo esrágio na marcha para o socialismo, adora­
ria nova Consriruiçáo, como o fez em 1 924, a 936 e 1977. Cada uma de rais Consrirui­
çóes faria o balanço do novo esrágio.16 
Contrapondo-se à Constituição-garantia, consagra um documento engendrado a par­
tir de expectativas lançadas ao fucuro, arquitetando um plano de fins e objetivos que serão 
perseguidos pelos poderes públicos e pela sociedade . .t. marcada, pois, pela presença de 
programas e projetos voltados à concretização de certos ideais políticos. 
Comum em seu cexto é a presença de normas de eficácia programática, destinadas aos 
órgãos estatais com a inequívoca finalidade de fixar os programas que irão guiar os poderes 
públicos na consecução dos planejamentos traçados. Tal qual a Constituição de Weimar, 
de 1919, e a Constituição da República Portuguesa, de 1976, a nossa acuai Constituição da 
República é um dos clássicos exemplos utilizados para apresentar a Constituição dirigente. 
Por último, vale informar que o termo "dirigence" foi cunhado pelo autor português 
J. ] . Gomes Canotilho, em referência à Constituição Porcuguesa de 1976 que, possuidora 
de inúmeros preceitos de caráter programático, visava guiar a ação dos poderes estacais 
no intuito de realizar o programa nela comido, voltado para a implantação de um Estado 
socialista. Observe-se, no entanto, e de acordo com o que nos informa Kildare, que "a se­
gunda revisão da Constituição de Portugal, promulgada em 7 de julho de 1989, eliminou 
do seu texto inúmeros preceicos de caráter socialista e promoveu uma Aexibilização da 
"Constituição econômica'"4�. 
3.8. Quanto à interpretação 
(A) Nominalista 
Possuidora de normas tão precisas e inteligíveis que dispensa, para ser compreendida, 
qualquer outro mécodo interpretativo que não o gramatical ou literal. Todas as possí­
veis ocorrências constitucionais da vida fática já possuem, previamente, resposta no cexco 
46. FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 221 ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 13. 
47. CARVALHO, Kildare Gonçalves de. Direito Constitucional. 111 ed. Belo Horizonte: Dei Rey, 2005, p. 204-205. 
45 
NAIHALIA MASSON 
constitucional: basta aplicar na literalidade a norma jurídica cabível na hipótese que solu­
cionada está a controvérsia. 
Atualmente é impensável um documento constitucional com dispositivos de conteú­
do tão exaro e certo que dê conta de abraçar toda a colossal realidade fática (excessivamente 
complexa) a ser normatizada. A importância dessa tipologia constitucional hoje é, portan­
to, meramente histórica. 
(B) Semântica 
Em sentido inverso à nominalista, Constituição semântica é aquela cujo texto exige 
a aplicação de uma diversidade de métodos interpretativos para ser realmente entendido. 
Nesta tipologia, onde se enquadram os documentos constitucionais atuais, a interpretação 
literal (ou gramatical) não é suficiente para a compreensão e deve ser aliada a diversos 
outros processos hermenêuticos no intuito de viabilizar uma ampla assimilação do docu­
mento constitucional. 
Finalmente, cumpre informar que algumas precauções devem ser romadas no estudo 
do tema "classificações", pois diferentes aurores se valem de idênticos vocábulos para obter 
conclusões muito particulares. É o que se passa com os termos "nominalista" e "semânti­
ca": utilizados neste irem para dar coma das espécies de Constituições segundo a aplicação 
(ou não) de diferentes processos hermenêuticos para o entendimento de seu texro, serão 
apresentados no próximo item com outra, e absolutamente, diversa significância - como 
termos que, juntamente com o vocábulo "normativa", compõem a classificação das Cons­
tituições segundo a correspondência com a realidade, de Karl Loewenstein. Além dis­
so, a doutrina noticia48 que o professor português J. ]. Gomes Canorilho também utiliza 
os termos "semântica" e "normativa" de maneira inusitada e inovadora: "semânticas", na 
percepção do autor, são aquelas Constituições "de fachada", não possuidoras de justiça e 
bondade em seus conteúdos, meramente formais, e "normativas" são as Constituições que 
preveem direitos e garantias fundamentais e limitam o poder do Estado, fazendo-o com 
efetiva bondade - um altruísmo e benevolência que materialmente orientam a produção 
de rodo o texto. 
3.9. Quanto à correspondência com a realidade = critério ontológico 
Desenvolvido em meados do século XX pelo alemão Karl Loewenscein, este critério 
pretende avaliar o grau de comunicabilidade entre o texto constitucional e a realidade 
a ser normatizada, partindo de uma teoria ontológica das Constituições. Eferivamente 
diference das classificações apresentadas até aqui - que se propunham a analisar os disposi­
civos conscicucionais em si mesmos, sem escabclccer qualquer conexão ou correspondência 
com o mundo externo - esta classificação se define a partir de um parâmetro extrínseco à 
48. NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 51 ed. São Paulo: Método, 2011, p. 117. 
46 
TEORIA DA CONSTITUIÇÃO 
Constituição, já que o intuito do autor é examinar o documento constitucional conside­
rando sua maior ou menor proximidade com a realidade do processo de poder. Vejamos 
quais são as (três) modalidades que surgem a partir dessa tipologia classificarória: 
(A) Normativa 
Nesta Constituição há perfeita sintonia entre o texto constitucional e a conjuntu­
ra política e social do Estado, de forma que a limitação ao poder dos governantes e a 
previsão de direitos à população sejam estritamente observadas e cumpridas. O texto 
constitucional é de tal forma eficaz e seguido à risca que, na prática, vê-se claramente 
a harmonia entre o que se estabeleceu no plano normativo e o que se efetiva no mundo 
fárico49. O resultado é o reconhecimento de que há verdadeira correspondência entre 
o que está escrita na Constituição e a realidade, afinal, os processos políticos de poder 
se submetem às normas constitucionais, sendo por elas guiados. Um bom exemplo é a 
Constituição Americana de 1787. 
(B) Nominativa 
Esta já não é capaz de reproduzir com exara congruência a realidade política e social 
do Estado, mas anseia chegar a este estágio. Seus dispositivos não são, ainda, dotados de 
força normativa capaz de reger os processos de poder na plenitude, mas almeja-se um dia 
alcançar a perfeita sintonia entre o texto (Constituição) e o contexto (realidade). Daí :id­
vém a virtude principal desce ripo de Constituição: na sua função prospectiva, de almejar 
num futuro próximo a adequação ideal entre normas e realidade fática, é bastante edu­
cativa. Outro ponto de destaque é que, assim como a Constituição normativa, é dotada, 
inequivocamente, de valor jurídico. 
Nossa Constituição de 1988 (aliás, como roda Constituição nominal) nasceu com 
o ideal de ser normativa - isso porque saíamos de uma época ditatorial (Constituição se­
mântica), que somente legitimava o poder autoritário, com o intuito de construir um texto 
absolutamente comparível com a nova realidade democrática que se instaurava - mas, 
obviamente, não conquistou essa finalidade, pois ainda hoje existem casos de absoluta 
ausência de concordância enrre o rexro constitucional e a realidade. É, pois, um exemplo 
de Constituição nominal (ou nominalista). Outros exemplos: as Constituições brasileiras 
de 1934 e 1946. 
49. Uma boa metáfora, apresentada pelo próprio Loewenstein (e citada por Dirley - Curso de Direito Constitucio­
nol. 6t ed. Salvador: Juspodivm, 2012, p. 128) refere-se à vestimenta, pois, nos dizeres do autor, a Constituição 
normativa é aquela que tal qual uma roupa que "cai muito bem" e se assenta perfeitamente ao corpo, adorna 
precisamente a realidade. 
47 
NATHALIA MASSON 
(C) Semântica 
É a Constituição que nunca pretendeu conquistar uma coerênciaapurada entre o tex­
to e a realidade, mas apenas garantir a situação de dominação estável por parte do poder 
autoritário. Típica de estados ditatoriais, sua função única é legitimar o poder usurpado 
do povo, estabilizando a intervenção dos ilegítimos dominadores de fato do poder políti­
co. Por essa razão é tida corno um simulacro de Constituição, afinal trai o significado do 
vocábulo "Constituição" que é, necessariamente, um documento limitador do poder, com 
finalidade garancisca, e não um corpo de normas legitimadoras do arbÍtrio. 
Não faltam exemplos na nossa história constitucional de documentos semânticos: 
além da Carta de 1937, ternos as de 1967 e a EC nº 1 11969. 
Esquematicamente: 
. "' 
Pretende 
avaliar o grou de 
comunicabilidade 
entre o texto 
Quanto à correspondAncla com a realidade 
(critério ontológico • Karl Loewenstein) 
• constitucional e o 
realidade o ser 
normatizada 
NORMATIVA 
Há perfeita sintonia entre 
o texto constitucional e 
a conjuntura politica e 
social do Estado; o texto 
constitucional é de tal forma 
eficaz e seguido à risca que, 
na prática, vê-se claramente 
a harmonia entre o que 
se estabeleceu no plano 
normativo e o que se efetiva 
no mundo tático 
NOMINATIVA 
Incapaz de reproduzir 
com exata congruência a 
realidade política e social 
do Estado, mas anseia 
chegar a este estágio -
almeja-se um dia alcançar 
a perfeita sintonia entre 
o texto (Constituição) e o 
contexto (realidade) 
SEMÃNTICA 
Nunca pretendeu 
conquistar uma coerência 
apurada entre o texto e 
a realidade, mas apenas 
garantir a situação de 
dominação estável por 
parte do poder autoritário 
- trai o significado do 
vocábulo "Constituição" 
3.10. Quanto à ideologia (ou quanto à dogmática) 
(A) Eclética (ou hete1·ogênea) 
O convívio harmônico entre várias ideologias é a marca central de seu texto. Nesta 
tipologia constitucional, por não haver urna única força política prevalente, o texro cons­
titucional é produto de urna composição variada de acordos heterogêneos, que denota 
pluralidade de ideologias (muitas vezes colidentes) e sinaliza a ocorrência de possíveis 
duelos (judiciais, legislativos e administrativos) entre os diversos grupos políticos, a se­
rem pacificados pelos operadores jurídicos. 
48 
TEORIA DA CONSTITUIÇÃO 
Alguns autores50 aproximam a Constituição eclética da compromissória (inclusive 
considerando os termos sinônimos), vez que seu texto é formatado a partir dos compro­
missos constitucionais firmados entre os distintos, e muitas vezes antagônicos, partici­
pantes do processo político, numa tentativa de firmar dispositivos conciliatórios. Nossa 
Constituição de 1988, assim como a portuguesa de 1976, é exemplo fiel desse tipo de 
texto. 
(B) Ortodoxa 
Esta Constituição é construída tendo por base um pensamento único, que afasta 
o pluralismo na medida em que descarta qualquer possibilidade de convivência entre 
diferences grupos políticos e distintas teorias. Só há espaço para uma exclusiva ideologia 
- não há espaço para conciliação de doutrinas opostas. São exemplos a Constituição da 
China, de 1982, e a da extinta União Soviética, de 1977. 
3. 1 1 . Quanto à unidade documental (quanto à sistemática) 
Esta classificação só tem algum sentido para as Constituições escritas, pois é o tex­
to escrito que será unitextual (dando origem à Constituição orgânica) ou pluritextual 
(estabelecendo a Constituição inorgânica). Passemos ao significado de cada uma delas. 
(A) Orgânica 
Constituição orgânica é aquela disposta em uma estrutura documental única, na 
qual todos os dispositivos estão articulados de modo coerence e lógico. Não há espaço 
para identificação de normas constitucionais fora da Constituição - esta última exaure 
os dispositivos constitucionais, não sendo possível a existência de normas com valor 
constitucional que estejam fora de seu texto. 
Em resumo, nas Constituições orgânicas temos um documento único que concen­
tra todos os preceitos constitucionais, não existindo normas constitucionais esparsas no 
ordenamento jurídico. Pode-se dizer que todas as Constituições brasileiras são exemplos 
desta tipologia. 
(B) Inorgânica 
Em contraposição à unitextual, temos a pluritextual (ou inorgânica) que é formada 
por diversas estruturas documentais, ou seja, suas normas estão dispersas em variados 
documencos, pois diferences textos irão compor o que denominaremos "Constituição". 
A doutrina apresenta como exemplar desta tipologia a Constituição da França de 
1875 - esta última concebida a partir da reunião de diferences documentos, isto é, não 
apenas os 89 artigos do texto compõem as normas constitucionais, mas também seu 
50. NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 5t ed. São Paulo: Método, 2011, p. 118. 
49 
NATHALIA MASSON 
preâmbulo, sendo que ele remete para a Declaração dos Direitos de 1789 e ao preâmbulo 
da Constituição de 1946. 
Como a doutrina nunca é uníssona na utilização dos termos, lembremos que Bo­
navides51 intitula a Constituição orgânica de codificada, distinguindo-a da legal, aqui 
nominada inorgânica. Nos dizeres do autor 
as Constiruições escritas se apresentam tecnicamente debaixo de duas formas: Cons­
tiruições codificadas, de adoção mais frequente, e Constituições legais, de ocorrência 
mais rara. Constiruições codificadas são aquelas que se acham contidas inteiramente 
num só texro, com seus princípios e disposições sistematicamente ordenados e arti­
culados em títulos, capítulos e seções, formando em geral um único corpo de lei"�2• 
Na sequência, o autor apresenta as Constituições legais como 
aquelas Constiruições escricas que se apresentam esparsas ou fragmentadas em vários 
rexros. Haja vista, a rírulo ilustrativo, a Constituição francesa de 1 875. Compreen­
dia ela Leis Consrirucionais, elaboradas em ocasiões distintas de atividade legislativa, 
como as leis de estabelecimento dos poderes. Tomadas em conjunto passaram a ser 
designadas como a Constiruiçáo da Terceira República�1. 
Também Pinto Ferreira54 se vale de termos distintos aos aqui usados: para o autor, as 
Constituições orgânicas se equivalem às reduzidas e as inorgânicas às variadas. 
3. 12. Quanto ao sistema 
Esta classificação, concebida por Diogo de Figueiredo Moreira Neco55, divide os 
textos constitucionais em principiológicos e preceituais, a depender da preponderância 
de regras ou princípios, vale dizer, do grau de abstração das normas que predominam. 
(A) Principiológica 
Nesta os princípios ganham relevo, são as normas que preponderam. E como prin­
cípios possuem grau de abstração significativo, para serem concretizados necessitarão de 
mediação legislativa ou judicial. A doucrina56 considera nossa acuai Constituição como 
representante desta modalidade. 
51. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 18! ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 87. 
52. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 18! ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 87. 
53. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucionol. 18! ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 88. 
54. Conforme Pinto Ferreira, apud CARVALHO, Klldare Gonçalves de. Direito Constitucional. 11 ª ed. Belo Horizonte: 
De1 Re� 2005, p. 202. 
55. MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Mutações do direito administrativo. 2000, p. 81, apud LENZA, Pedro. Di­
reito Constitucional esquematizado. 16! ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 94. 
56. FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 4! ed. Salvador: Juspodivm, 2012, p. 44; MO­
RAES, Guilherme Pena de. Curso de Direito Constitucional. 3! ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 67. 
50 
TEORIA DA CONSTITUIÇÃO 
(B) Preceituai 
Constituído conferindo primazia às regras, o texto da Constituição preceituai pos­
sui normas com alto grau de precisão e especificidade, o que permiteuma imposição 
direta e coercitiva de seus dispositivos. Em virtude da predominância de normas com 
grau superior de deccrminabilidade, as Constituições preceituais rendem a ser excessiva­
mente decalhiscas. A Constituição mexicana de 1917 é eirada pela doutrina pátria como 
exemplo. 
3.1 3. Quanto ao local da decretação 
(A) Heteroconstituiçáo (ou Constituição heterônoma) 
Raras são as Constituições que não se originam no Estado que irão viger, surgin­
do em Estado diverso daquele em que o documento vai valer, ou então elaboradas por 
algum organismo internacional. A heceroconsticuição é, por isso, bastante incomum e 
causa justificável perplexidade, afinal o documento constitucional vai ser feiro fora do 
Estado onde suas normas produzirão efeitos e regerão normativamente a realidade fácica. 
São exemplos de Constituição hecerônoma as de países como Nova Zelândia, Ca­
nadá e Austrália, pois, como integrantes da Commonwea!th, suas Constituições foram 
aprovadas por leis do Parlamento Britânico. Igualmente pode ser eirada a Constituição 
cipriota, produto de acordos feitos em Zurique, na década de 1960, entre Grécia, Tur­
quia e a Grã-Bretanha. 
(B) Autoconstituição 
Também intitulada autônoma, é a Constituição elaborada dentro do próprio Estado 
que irá estruturar normativamente e reger. Em regra, as Constituições são desce ripo -
inclusive a nossa acuai, de 1988. 
3.14. Quanto ao papel da Constituição (ou função desempenhada pela Cons­
tituição) 
A função que será desempenhada pela Constituição no ordenamento jurídico dá 
origem, segundo Virgílio Afonso da Si lva57, à Conscicuição-lei, à Constituição-moldura 
e à Conscicuição-fundamenco (ou Conscicuição-cotal). Estas se diferenciam a partir da 
maior ou menor liberdade de atuação atribuída ao legislador ordinário em relação ao 
cexco constitucional, isco é, se distanciam frente à capacidade e autonomia que o legisla­
dor possui (ou não) em conformar a ordem jurídica. 
57. SILVA, Virgílio Afonso. A constitucionolização do direito: os direitos fundomentols nos relações entre particulares. 
São Paulo: Malheiros Editores, 2005, p. 111-115. 
51 
NATHALIA MASSON 
(Li) Constituição-lei 
Inviável em documentos rígidos e consagradores do princípio da supremacia formal 
da Constituição - como é o caso do nosso texto de 1988 -, nesta acepção tem-se Cons­
tituições equiparadas às demais leis do ordenamento, desprovidas de status hierárquico 
diferenciado. Nesse sentido, como as normas constitucionais estão em idêntico patamar 
da legislação ordinária, não possuindo superioridade em relação a estas, não são capazes 
de moldar a atuação do legislador e funcionam, unicamente, como diretrizes não vin­
culantes. 
Em suma, na Constituição-lei a estrutura constitucional é formada por normas que 
se situam no mesmo nível das demais que compõem o ordenamento, de forma que a 
Constituição não é vista como parâmetro ordenador do agir legislativo mas, tão somen­
te, como um conjunto de recomendações e orientações indicativas, que não necessaria­
mente serão observadas e cumpridas. 
(B) Constituição-moldura 
Numa interessante metáfora, nesta concepção a Constituição é só a moldura de 
um quadro vazio, funcionando como limite à atuação do legislador ordinário, que não 
poderá atuar fora dos l imites previamente estabelecidos. Assim como num quadro a 
pintura está restrita aos limites da moldura que o guarnece, também no ordenamento a 
atuação legislativa estaria circunscrita ao perímetro estabelecido pela Constituição. Des­
sa forma, a preocupação da jurisdição constitucional seria, tão somente, a de verificar se 
o legislador agiu dentro dos contornos da moldura constitucional, isto é, se o "desenho" 
legislativo está dentro do quadro ou se extrapolou as bordas definidas. Seguindo com a 
representação simbólica, é como se não importasse o que o legislador ilustrou no quadro, 
ao contrário, o que interessa é saber se ele se manteve dentro dos limites do quadro! 
Virgílio aponta58 que esta acepção não é novidade, apesar de recentemente ter sido 
fortemente resgatada pela doutrina alemã, especialmente no intuito de fornecer outra 
opção à teoria dos princípios de Robert Alexy. É também, e nocadamente, uma modali­
dade intermediária entre a apontada no item anterior (Constituição-lei) e a que a seguir 
será estudada (Constituição-fundamento). 
( C) Constituição-fundamento 
Vista enquanto lei fundamental, esta Constituição diferencia as normas constitu­
cionais das demais, na medida em que as situa num plano de superioridade valorativo 
que as torna cogentes para legisladores e indivíduos. Nas precisas palavras de Virgílio "a 
Constituição é entendida como lei fundamental, não somente de toda a atividade estatal 
58. SILVA, Virgílio Afonso. A constitucionalização do direito: os direitos fundamentais nas relações entre particulares. 
São Paulo: Malheiros Editores, 2005, p. 115. 
52 
TEORIA DA CONSTITUIÇÃO 
e das atividades relacionadas ao Estado, mas também a lei fundamental de roda a vida 
social "59. 
A atuação do legislador, neste caso, torna-se significativamente abreviada, vez que 
seu papel está reduzido a interpretar as normas constitucionais e efetivá-las. O espaço 
de conformação do ordenamento jurídico do legislador fica, pois, encurtado, na medida 
em que sua atividade legislativa resume-se a um "mero instrumento de realização da 
Constituição"60. 
3.15. Quanto ao conteúdo ideológico (ou quanto ao objeto) 
Proposta por André Ramos Tavares61, esta classificação visa identificar o conteúdo 
ideológico que permeia a construção do texto constitucional. 
(A) Liberal 
Tendo como exemplos clássicos a Constituição dos EUA, de 1787 e a francesa, de 
1791 , Constituições liberais são aquelas que correspondem às já mencionadas Constitui­
ção-garantia. Visam, pois, delimitar o exercício do poder estatal, assegurar liberdades 
individuais, oponíveis ao Estado, e as garantias que assegurem a realização dos direitos 
por pane dos indivíduos. São Constituições que veem o Estado circunscrito às funções 
de repressão e proteção, despossuído de políricas de desenvolvimento social e econômi­
co62. 
(B) Social 
Típicas de um constitucionalismo pós liberal, as Constituições soc1a1s passam a 
consagrar em seus textos não só direitos relacionados à liberdade, mas também prerro­
gativas de cunho social, cultural e econômico. A atuação do Estado deixa de ser mera­
mente negativa, como era nas Constituições liberais, para se tornar positiva, na medida 
em que fica claro que as políticas estatais são eficientes vetores para o alcance de uma 
igualdade material. Como muitas vezes as normas que celebram o agir estatal, na conse­
cução de fins previamente traçados e delineados, são normas programáticas, definidoras 
de planos para o futuro, é natural a associação entre a Constituição liberal e a dirigente. 
59. SILVA, Virgílio Afonso. A constitucionalização do direito: os direitos fundamentais nas relações entre particulares. 
São Paulo: Malheiros Editores, 2005, p. 112. 
60. SILVA, Virgílio Afonso. A constitucionalização do direito: os direitos fundamentais nas relações entre particulares. 
São Paulo: Malheiros Editores, 2005, p. 113. 
61. TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. 6! ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 74. 
62. MORAES, Guilherme Pena de. Cursa de Direito Constitucional. 3! ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 66. 
53 
NATHAUA MASS01'\ 
3. 16. Outras classificações 
Ademais das classificações já sistematizadas, os consticucionalistas pátrios apresen­
tam outras que nos parecem úteis ao entendimento do tema. 
(Li) Suave 
Pensada pelo jurista italiano Gustavo Zagrebelsky6·1, "Costituzione mire" (ou leve, 
soft, dúctil) é aquela que, numa sociedade extremamente diversificada e fragmentada 
por interesses plurais, não prevê um único modo de vida e o estabelece como parâmetro

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