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IMPRESSÕES LIGEIRAS, E SOB O ENFOQUE
COLETIVO-SINDICAL, ORIUNDAS DOS
ARTIGOS 2° E 30 DA MEDIDA PROVISÓRIA
(MP)N° 927/2020
Marcus de Oliveira Kaufmann
Doutor e mestre em Direito das Relações Sociais (Direito do Trabalho) pela
PUC/SP, além de ser advogado e sócio do escritório Paixão Côrtes e
Advogados Associados. É bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da
Universidade de Brasília. É membro efetivo do IBDSCJ – Instituto Brasileiro de
Direito Social Cesarino Júnior e da ABRADT – Academia Brasiliense de Direito
do Trabalho.
A) INTRODUÇÃO ACERCA DA ONTOLOGIA DO DIREITO DO
TRABALHO
Representando o pacote “antidesemprego” anunciado pelo
Governo Federal há alguns dias, a recém-editada MP 927/20 (DOU
de 22/03/2020, Edição 55-L, Seção 1 – Extra, página 1), surgida no
interstício de menos de dois dias depois de editado o Decreto
Legislativo n° 6/2020 (DOU) de 20/03/2020, Edição 55-C, Seção 1),
altera, já em regime de calamidade pública, reconhecida e
vigente no Brasil até 31/12/2020, diversas normas de natureza
trabalhista e, agora, na alcatifa de alterações propugnadas para
a estrutura do Direito Coletivo do Trabalho – na linha de normas
que, sem calamidade, já alteraram tal estrutura desde a chamada
“Reforma Trabalhista” –, insere curiosa situação de modificação
da dinâmica de interação entre as fontes de produção de normas
trabalhistas.
O mundo que ensejou o surgimento, forte e prestigiado, do
clássico Direito do Trabalho, era um mundo de desenvolvimento
da acumulação capitalista que necessariamente dependia, para
manter a própria produção de proteção aos trabalhadores, de um
sistema tutelar regrado pelo Estado. Muito embora esse mesmo
mundo, hoje, já não seja o mesmo, uma vez que impregnado de
um capitalismo que está se desgarrando de seu ápice
desenvolvimentista, em que há uma crise estrutural
incentivadora de um modelo de produção centrado em formas
produtivas flexibilizadas e desregulamentadas e, ainda, de uma
crescente inibição do Estado Social, atingido por uma tendência,
também, de descentralização normativa, não se deve, de toda a
sorte, desconsiderar que os sustentáculos do Direito do Trabalho
concebido quando forte era o Estado são os pilares por meio dos
quais, em um novo mundo, se combate a degradação social.
Enquanto se vive em um modelo capitalista, a tônica do
Direito do Trabalho, que só se explica se integrado a esse modelo,
é a da, não tanto a regulação de conflitos, mas a de incentivar e
propiciar uma adequada e proporcional proteção ao trabalhador,
sem aniquilamento empresarial, segundo a principiologia que se
construiu pela sua história, revelada no princípio da norma mais
favorável, específico do Direito do Trabalho porque “em nenhuma
outra disciplina jurídica e em nenhum outro caso, ao menos no
Brasil, admite-se a aplicação de norma inferior com desprezo da
hierarquicamente superior”1.
O princípio da norma mais favorável é representativo, dir-se-
ia, da própria ontologia do Direito do Trabalho, sua razão de ser,
sua gênese, e, também, da axiologia dos valores trabalhistas,
enquanto sistema imposto pelo Estado, razão pela qual jamais o
sistema jurídico trabalhista poderia se espelhar em modelos
kelsenianos, fechados, mas, sim, em modelos dinâmicos,
autopoiéticos, em que, a todo instante, a aplicação da norma
mais favorável transita, livremente, desde a leitura do direito
positivo, do ordenamento jurídico positivo, até as cadeias de
linguagem que a ciência do direito dispõe para o estudo da
realidade normativa.
Talvez em nenhuma outra disciplina da enciclopédia jurídica
se tenha concretizado uma facilidade de construção do sistema
jurídico em tal grau. Pelo princípio da norma mais favorável, a
leitura do direito positivo, objeto da ciência do direito, confere, ao
jurista, ao cientista do direito, tudo o que precisa para o seu
discurso descritivo, de modo a formar o sistema jurídico
trabalhista sem problemas de consistência.
Dito isso, algumas das inovações trazidas pela MP 927/20,
mesmo em regime de calamidade pública, parecem, sem
dúvidas, tentar obstaculizar aquele livre trânsito que o princípio
da norma mais favorável apresenta para trafegar desde a ciência
do direito à leitura do direito posto.
B) DA INSERÇÃO DA VOZ COLETIVA INTERMEDIADA,
NECESSARIAMENTE, PELA PARTICIPAÇÃO SINDICAL,
PROFISSIONAL OU ECONÔMICA
Nem se arriscaria, aqui, a criticar a opção feita pelo legislador
ordinário no que diz respeito à alteração capitaneada no artigo
620 da CLT, na redação oriunda da “Reforma Trabalhista” –
quanto à prevalência do acordo coletivo de trabalho sobre a
convenção coletiva de trabalho, em temário que ainda requer uma
mais profunda reflexão –, uma vez que se coaduna, bem
consideradas as opiniões divergentes, com as experiências que se
verificam, na Europa continental, no sentido de se prestigiar,
cada vez mais, e lá desde a década de 90, a negociação coletiva
que tende à empresa, por abrangências materiais e territoriais
mais delimitadas, menores, ao mesmo tempo em que se
impulsiona o fomento a participação das entidades de
representação coletiva em diversos níveis de negociação, tudo
em paralelo ao impulso dado a novas representações coletivas de
trabalhadores, de perfil unitário e não sindical também atuando,
em coordenação, em diversos níveis de negociação.
Se não pela negociação coletiva e pelo seu caminhar em
direção à empresa, o máximo que se experimentou, no famoso
relatório da comissão capitaneada por Alain Supiot2, foi o
incremento, de um lado, de organizações competentes para
alguma negociação, paralelas à sindical, das quais, por uma
aproximação ainda muito frágil, se poderia indicar a comissão
de representação dos empregados de que tratam os artigos 510-A
e seguintes da CLT, desguarnecidas de um mínimo direito à
informação; e, de outro, dos níveis possíveis de negociação para
uma estrutura articulada desde os setores mais amplos do
espectro confederativo até a realidade do local de trabalho,
muitas vezes melhor tratadas por entidades de perfil unitário, e
não sindical, em coordenação e articulação de competências com
as clássicas entidades sindicais naqueles níveis de representação
e de negociação.
Como o Brasil só se aproximou, pela realidade oriunda a
partir da “Reforma Sindical”, da experiência de negociações
tendentes à empresa, no que é simbólico o disposto no artigo 620
da CLT, mas com fantasioso trato do que seria um alargamento
das entidades capazes da negociação coletiva em vários níveis de
negociação ou em variados níveis setoriais, a realidade que
impera, ainda, é a realidade de a voz coletiva só poder ser vertida,
para o Direito do Trabalho, mediante a participação efetiva das
entidades sindicais e mediante a expressão da função negocial.
A lógica, inclusive, imperante, é a da prevalência do negociado
sobre o legislado, observadas os limites constitucionais e,
também, as omissões constitucionais.
Se o princípio da proteção, expresso na vertente da norma
mais favorável, é da ontologia do Direito do Trabalho, a sua
manifestação, para o Direito Coletivo do Trabalho, só pode ser
espelhada em relação ao Direito Individual, uma vez que faces de
uma mesma moeda. Para o Direito Individual do Trabalho, o
princípio protetivo e da norma mais favorável se expressa pela
via heterônoma, pelo Estado, pela norma posta sob aquela
vertente. Para o Direito Coletivo do Trabalho, o princípio protetivo
se expressa na autonomia privada coletiva e na ação coletiva
desenhada a partir e para a negociação coletiva.
C) ALGUMAS CURIOSIDADES NORMATIVAS DA MP 927/20: OS
ARTIGOS 2° E 30
As explicações que foram feitas balizam a análise, que se quer
empreender, aqui, acerca do disposto nos artigos 2° e 30 da MP
927/20.
Dispõe, o artigo 2°, que, no estado de calamidade pública (e
que não é estado de sítio, frise-se, para os fins dos artigos 137 e
seguintes da Constituição Federal), empregador e empregado
poderão firmar acordo individual escrito, para garantir a
manutenção do vínculo empregatício, e que prevalecerá sobre
quaisquer instrumentos normativos,legais e negociais,
“respeitados os limites estabelecidos na Constituição”.
Os exemplos da MP 927/20 para o enaltecimento do acordo
individual escrito em um primeiro plano e para, em outro
fenômeno cada vez mais presente no direito positivo, a potestade
do empregador em um segundo plano, nesse sentido, são vários:
(i) no artigo 4°, quando se prevê que o empregador poderá, a seu
critério e no âmbito do teletrabalho, alterar o regime presencial
para o teletrabalho, independentemente da existência de acordos
individuais ou coletivos; (ii) no artigo 14, § 2°, quando se prevê,
no que concerne ao banco de horas, que o empregador
determinará a compensação do saldo de horas
independentemente de convenção ou acordo individual e coletivo
de trabalho; e (iii) no já revogado artigo 18, § 1°, inciso I3, quando
se previa, ao contrário da normatização já conhecida do artigo
476-A da CLT, que a suspensão do contrato de trabalho por até
quatro meses se dará para a participação do empregado em
curso ou programa de qualificação profissional não presencial,
de duração igual à da suspensão, independente de qualquer
autorização coletiva ou individual.
A prevalência do negociado sobre o legislado, na estreiteza
pensada para acordos individuais, talvez só se tenha encontrado
na hipótese do empregado “hiperssuficiente” tratado no
parágrafo único do artigo 444 da CLT, mas sem ter se espraiado
por demais e para outros institutos trabalhistas. Isso porque os
limites para aquela prevalência foram inseridos nos artigos 611-A
e 611-B da CLT, obviamente, sempre, mediante a negociação
coletiva para os fins reformistas pretendidos.
Salvo as exceções, que confirmariam a regra, a negociação
coletiva se porta, no ordenamento jurídico brasileiro, como
última barreira jurídica, padronizada para os intuitos
flexibilizantes, no âmbito do Direito Coletivo do Trabalho, para
permitir o trânsito da aplicação do princípio da aplicação da
norma mais favorável, ainda que setorialmente considerada,
quando da leitura do direito posto pelo jurista, eliminando, do
sistema jurídico trabalhista, problemas de consistência sob o
ponto de vista lógica formal.
Se a negociação coletiva passou, no estrangeiro, a servir como
importante ferramenta para a flexibilização das normas
trabalhistas aplicadas setorialmente, de preferência no âmbito
da empresa, também serviu como ferramenta para uma melhor
gestão da empresa, mas, como se vê, ainda assim, a negociação
sempre se deu coletivamente e não individualmente, até para
comportar a hipótese do caput do artigo 444 da CLT.
O disposto no artigo 2° da MP 927/20 afeta, portanto,
sobremaneira, a dinâmica de atuação do princípio da norma
coletiva e inverte a lógica da prevalência da negociação coletiva
sobre o legislado, interferindo na ontologia do Direito do
Trabalho e, dir-se-ia, na autonomia da ação coletiva das
entidades sindicais, podendo configurar, no limite, prática
discriminatória, de natureza antissindical, de origem estatal,
quando da formulação da hipótese, por afronta à disposição do
artigo 4° da Convenção n° 98 da Organização Internacional do
Trabalho (OIT), segundo o qual deverão ser tomadas, pelos
Estados, medidas apropriadas às condições nacionais para
fomentar e promover o pleno desenvolvimento e utilização dos
meios de negociação voluntária entre empregadores ou
organizações de empregadores e organizações de trabalhadores
ou organizações de empregadores e organizações de
trabalhadores com o objetivo de regular, por meio de
“Convenções”, “os termos e condições de emprego”.
Fora dos meandros do princípio da adequação setorial
negociada, nesse contexto, parece, inclusive, um tanto quanto
descuidada (para não dizer “irônica”), na MP, a observação final,
no artigo 2°, de que se deverão observar os limites
constitucionais, uma vez que as exceções constitucionais,
independentemente de decretação, ou não, de estado de
calamidade, estão textualmente previstas e se efetivam não por
negociação individual, mas, sim, por negociação coletiva (artigo
7°, incisos VI, XIII e XIV, da Constituição Federal).
Em outra vereda, o artigo 30 da MP 927/20 dispõe que
convenções coletivas de trabalho e acordos coletivos de trabalho,
vencidos ou vincendos em até 180 (cento e oitenta) dias contados
de 22/03/2020, poderão ser prorrogados pelo prazo de 90
(noventa) dias, a critério unilateral e exclusivo do empregador,
sem, evidentemente, qualquer deliberação ou mínima
participação dos trabalhadores envolvidos, e de suas entidades
sindicais representativas, a respeito de eventual interesse na
prorrogação, ou não. O impacto é muito forte porque afeta, já
agora, as datas-bases que se fixam para os meses de abril a
setembro de 2020.
Esse artigo 30 já tem despertando inúmeras dúvidas porque,
como já é público e notório, vários sindicatos, representativos de
categorias profissionais e econômicas, entabularam, nos últimos
dias, antes, até, do reconhecimento do estado de calamidade,
normas coletivas tratando de medidas de combate à pandemia,
mormente para a preservação dos vínculos empregatícios
mediante a utilização do arsenal e instrumental jurídico já
previsto e de certa forma sedimentado na prática da leitura da
legislação trabalhista, como, por exemplo: a redução da jornada
de trabalho mediante a diminuição proporcional do salário; a
utilização, sob o aspecto coletivo, da suspensão do contrato de
trabalho na hipótese do artigo 476-A da CLT (e mediante
negociação coletiva); a instituição de férias coletivas na hipótese
do artigo 139 da CLT (inclusive com previsão de flexibilidade para
certos regramentos burocráticos); a instituição da redução de
salários em até 25% (vinte e cinco por cento) na hipótese do
controverso artigo 503 da CLT (quando confrontado com o artigo
7°, inciso VI, da Constituição Federal); a instituição, mediante
negociação coletiva, da instituição de licenças remuneradas e
não remuneradas (e, na omissão coletiva, com observância do
disposto no artigo 474 da CLT); e a instituição do banco de horas
coletivo na hipótese do artigo 59 da CLT (observadas as exceções
relativas ao banco de horas individual para a compensação em
um período de até seis meses, quando se poderá formalizar por
acordo individual escrito; e ao banco de horas em que se permite
a compensação horária no próprio mês, quando se admite o
acordo individual tácito ou expresso – artigo 59, §§ 5° e 6°, da
CLT).
Esses casos envolvem instrumentos coletivos de trabalho
aperfeiçoados, muitas vezes com grande rapidez graças aos
esforços de todos os envolvidos no combate à pandemia e na
busca pela preservação do emprego, antes, portanto, da vigência
da MP 927/20, mas que estarão vigendo sob a égide da MP 927/20.
O estado de calamidade reconhecido pelo Congresso Nacional,
agora inserto na MP 927/20, revogaria as normas coletivas já
vigentes anteriormente à sua edição e que possuem vigência sob
a égide da MP?
A preocupação adentra o campo da dúvida prática quando é
factível a hipótese de o empregador, arvorando-se em sua
potestade e diante das prerrogativas que a MP 927/20 concedeu
para a entabulação de acordo individual, poder concluir pela não
prorrogação da norma coletiva já sob o império da MP.
O problema, que poderia ser pensado como característico de
categorias profissionais, é, também, grave para entidades
sindicais de categorias econômicas que lutam por fixar a sua
representatividade sindical após a “Reforma Trabalhista”.
Quid juris?
D) ALGUMAS CONCLUSÕES POSSÍVEIS
Por tudo o quanto aqui exposto, quer-se crer que a conduta
mais segura, para entidades sindicais patronais ou obreiras, que
tenham entabulado instrumentos coletivos de trabalho com
pactuação de cláusulas de combate à pandemia antes do advento
da MP 927/20, seja a de, por termo aditivo ao instrumento
coletivo de trabalho, ou por convenção ou acordo coletivo de
trabalho, reiterar e ratificar os termos da norma coletiva
disposta antes do advento da MP, agora para frisar que o que
antes se negociou coletivamente valerá, sem titubeios, em
contexto de calamidade e tambémsob o império da MP 927/20,
até o termo final da norma coletiva.
Poder-se-á dispor, ainda, em termo aditivo de instrumento
coletivo de trabalho ou de novo instrumento de reiteração e
ratificação da norma coletiva anterior à MP, da necessidade de a
prorrogação da norma coletiva só se dar após deliberação
assemblear de empregados e empregadores no contexto da
negociação coletiva, a fim de obstar a prerrogativa de o
empregador deliberar, unilateralmente, a respeito da
ultratividade da norma coletiva ou não, o que impediria mais
um ataque ao princípio da autonomia privada coletiva e, assim,
um mínimo de segurança jurídica, ainda que em clima de
calamidade, aos sujeitos coletivos de trabalho de representações
profissionais e econômicas.
Talvez um dos bens mais relevantes, em crises estruturais,
como a da calamidade brasileira, seja o da segurança jurídica, ou
da segurança jurídica coletiva, principalmente no que tange ao
respeito à negociação coletiva, aos seus sujeitos coletivos de
trabalho e à força normativa de suas disposições, elevadas ao
patamar constitucional de reconhecimento e tutela.
Afinal, assim como não é dado, ao particular, mesmo em
calamidade, descumprir a norma heterônoma porque se arvorou
na prerrogativa de não a cumprir; não é dado, ao particular,
representado coletivamente e sujeito destinatário de normas
coletivas de trabalho, unilateralmente prorrogar, ou não, norma
coletiva entabulada sob o manto da boa-fé objetiva e lealdade
após o advento da MP 927/20.
O estado de calamidade não pode chegar ao ponto de destruir
a segurança jurídica coletiva, sob pena de mais calamidade
institucional. Não é dada, a uma MP, de nítida feição precária,
dispor a respeito do afastamento de instrumentos coletivos de
trabalho de estatura e proteção constitucional.
Mesmo que anteriores à MP 927/20, os instrumentos coletivos
de trabalho entabulados não foram revogados pela só disposição
do artigo 30 da MP e estão livres da potestade do empregador
quando de sua prorrogação, ou não, nos prazos estabelecidos
naquele artigo 30.
Convém, apenas, como acima se sugeriu, que as entidades
sindicais profissionais e econômicas tomem o cuidado, porque a
insegurança é reinante4, por intermédio de termo aditivo ao
instrumento coletivo de trabalho ou por intermédio de acordo
coletivo de trabalho ou convenção coletiva de trabalho,
ratifiquem e reiterem normas coletivas produzidas
anteriormente à MP 927/20 e que tendem a viger já sob o seu
império, destacando o seu caráter normativo e cogente mesmo
no contexto da calamidade decorrente da pandemia.
1 SILVA. Luiz de Pinho Pedreira da. Principiologia do Direito do Trabalho. 2ª ed. São
Paulo: LTr, 1999, p. 65.
2 E da qual surgiu o precioso livro intitulado “Transformações do Trabalho e Futuro do
Direito do Trabalho na Europa” (Coimbra, 2003).
3 De tanta repercussão negativa na data de 23/03/2020, o Governo Federal, mediante uma outra
medida provisória, a MP 928/2020 (pelo artigo 2°), dada a público no calar da noite de
23/03/2020 (DOU de 23/03/2020, Edição Extra-C), revogou o artigo 18 da MP 927/20.
4 Essa constatação é flagrante no próprio texto da MP 927/20. No revogado artigo 18, por
exemplo, embora a suspensão do contrato individual de trabalho ensejasse a
imposição independentemente de acordo coletivo de trabalho e de convenção coletiva
de trabalho, o seu § 4°, inciso II, regia a hipótese em que se o curso de qualificação
profissional não fosse viabilizado, o empregador estaria sujeito às sanções previstas
naqueles mesmos, dispensados, acordo coletivo de trabalho e convenção coletiva de
trabalho!
MEDIDA PROVISÓRIA 927/2020 –
CORONAVÍRUS – RELAÇÃO DE TRABALHO
Mauricio Reis
Advogado no escritório Rocha e Barcellos Advogados.
Foi publicada, dia 22/3, a MP 927/20, que trata da flexibilização
de diversos dispositivos legais em matéria de trabalho para o
enfrentamento da crise de coronavírus.
Abaixo os principais pontos tratados nesta MP.
TELETRABALHO
Mesmo antes da edição da MP a maioria das empresas adotou
o regime de teletrabalho nas atividades que comportam tal tipo
de execução, notadamente nas atividades administrativas.
Segundo a MP, o regime pode ser adotado independentemente
da existência de acordos individuais ou coletivos, dispensado o
registro prévio da alteração no contrato individual de trabalho.
A comunicação deve ser feita com 48 horas de antecedência.
O mais importante, considerando que a maioria das empresas
já adotou o home office, é atentar para a necessidade de que a
situação seja formalizada e regulada em aditivo escrito em até 30
dias contados da mudança para o teletrabalho.
DA ANTECIPAÇÃO DAS FÉRIAS INDIVIDUAIS
Durante o período de calamidade pública o empregador pode
antecipar as férias individuais do empregado, ainda que o
período aquisitivo a elas relativo não tenha transcorrido,
notificando-o com 48 horas de antecedência.
O período de férias não poderá ser inferior a 5 dias corridos.
Os trabalhadores que pertençam ao grupo de risco do
coronavírus (covid-19) serão priorizados para o gozo de férias,
individuais ou coletivas.
Para estas férias, o empregador poderá optar por efetuar o
pagamento do adicional de um terço de férias após sua
concessão, até a data em que é devido o 13º salário e o pagamento
do abono pecuniário de 10 dias, caso solicitado pelo empregado,
está sujeito à concordância do empregador.
Ao pagamento destas férias extraordinárias, não se aplica o
disposto no artigo 145 da CLT, ou seja, o empregador poderá fazer
o pagamento até o quinto dia útil do mês subsequente ao início
do gozo das férias.
DAS FÉRIAS COLETIVAS
A concessão de férias coletivas não precisa observar o prazo de
comunicação com antecedência de 15 dias, bastando 48 horas.
Os empregadores estão dispensados da comunicação prévia
ao órgão local do Ministério da Economia e a comunicação aos
sindicatos representativos da categoria profissional.
DA ANTECIPAÇÃO DE FERIADOS
Os empregadores poderão antecipar o gozo de feriados não
religiosos federais, estaduais, distritais e municipais e deverão
notificar, por escrito ou por meio eletrônico, o conjunto de
empregados beneficiados com antecedência de 48 horas,
mediante indicação expressa dos feriados aproveitados.
Para os feriados religiosos, é necessária a concordância do
empregado, mediante acordo escrito.
DO BANCO DE HORAS
Fica autorizada a criação de um banco de horas por meio de
acordo coletivo ou individual formal. A compensação deve
ocorrer no prazo de até dezoito meses, contado da data de
encerramento do estado de calamidade pública.
A compensação de tempo para recuperação do período
interrompido poderá ser feita mediante prorrogação de jornada
em até 2 horas, que não poderá exceder 10 horas diárias.
DA SUSPENSÃO DE EXIGÊNCIAS ADMINISTRATIVAS EM
SEGURANÇA E SAÚDE NO TRABALHO
Durante o período de calamidade pública fica suspensa a
obrigatoriedade de realização dos exames médicos ocupacionais,
clínicos e complementares, exceto dos exames demissionais.
O exame demissional poderá ser dispensado caso o exame
médico ocupacional mais recente tenha sido realizado há menos
de 180 dias.
Também fica suspensa a obrigatoriedade de realização de
treinamentos periódicos dos empregados, previstos nas NRs.
As comissões internas de prevenção de acidentes poderão ser
mantidas até o encerramento do estado de calamidade pública e
os processos eleitorais em curso poderão ser suspensos.
DO DIRECIONAMENTO DO TRABALHADOR PARA QUALIFICAÇÃO
O contrato de trabalho poderá ser suspenso, pelo prazo de até
4 meses, para participação do empregado em curso ou programa
de qualificação profissional não presencial oferecido pelo
empregador ou por entidades responsáveis por qualificação.
Não é necessário negociação coletiva e, embora o pagamento
de salários fique suspenso, o empregador poderá pagar, durante
o período, uma ajuda compensatória mensal, sem natureza
salarial. O valor da ajuda será definido livremente entre
empregado e empregador, via negociação individual. O
empregado, por sua vez, terá direitoaos benefícios
voluntariamente concedidos pelo empregador, que não
integrarão o contrato de trabalho, como, por exemplo, vale
alimentação, plano de saúde etc.
Não poderá haver trabalho durante o período de qualificação,
sob pena de serem devidos os salários e encargos de todo o
período, sem prejuízo da aplicação de multas.
DO FGTS
O empregador não precisa pagar nas datas previstas
ordinariamente as contribuições ao FGTS relativas às
competências de março, abril e maio de 2020, com vencimento
em abril, maio e junho de 2020.
O recolhimento destes meses poderá ser feito em até 6
parcelas, sem atualização, multa e encargos.
OUTRAS DISPOSIÇÕES EM MATÉRIA TRABALHISTA
Os casos de contaminação pelo coronavírus (covid-19) não
serão considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação
do nexo causal.
As normas coletivas que vencerem em 180 dias poderão ter
sua vigência prorrogada.
Por fim, e muito importante, é esclarecer que foram
convalidadas todas as medidas trabalhistas anteriormente
adotadas por empregadores em relação ao cororonavírus, desde
que não contrariem os termos da MP.
O CONTRATO DE TRABALHO FRENTE À
PANDEMIA DE CORONAVÍRUS:
POSSIBILIDADES LEGAIS COM O FIM DE
PRESERVAR OS POSTOS DE TRABALHO
Afonso Almeida
Advogado Trabalhista do escritório MoselloLima Advocacia. Especialista em
Direito Constitucional, Administrativo e Tributário pela Universidade Estácio
de Sá.
Em dias de pandemia do coronavírus, inúmeros são os
questionamentos acerca dos reflexos nos contratos de trabalho.
Os mais pessimistas defendem que ocorrerão demissões em
massa decorrentes da ausência de demanda por mão de obra ou
pela falência de empresas (de pequeno, médio e até grande
porte). Há quem resguarda certo otimismo, no sentido de que em
tempos de crise, alguns setores da economia necessitarão de
força de trabalho, como nas empresas de saúde, indústria
farmacêutica e outros.
Otimista ou pessimista, fato é que a hodierna crise mundial
afeta diretamente nosso país (como não poderia ser diferente),
fazendo com que Empresas e Empregados unam esforços para
que sejam mantidos os postos de trabalho e a continuidade da
atividade empresarial, de forma a garantir a vida, saúde e
incolumidade física e psicológica dos agentes envolvidos.
Em meio a essa problemática, trazemos algumas
possibilidades para que haja o enfrentamento da crise, inclusive
com as alterações trazidas pela MP 927/20.
FÉRIAS COLETIVAS
A Empresa poderá conceder férias coletivas, seja para todos os
empregados, para determinados estabelecimentos (filiais, por
exemplo) ou setores da empresa (administrativo, operacional,
oficina etc.).
O art. 139, parágrafos segundo e terceiro da CLT1 estabelece que
que o Empregador deverá comunicar ao Ministério da Economia
Local (antigo Ministério do Trabalho e Emprego) a data de início
e término das férias, bem como quais estabelecimento e grupos
de empregados serão abrangidos pela medida. A inobservância
ao prazo para comunicação estabelecido ensejaria fiscalização e
aplicação por parte do Ministério da Economia e, eventualmente,
a aplicação de multa.
Entretanto, a MP 927/20 de 22 de março, trouxe significativa
alteração: o empregador poderá conceder férias coletivas a seus
empregados, devendo notificá-los com antecedência mínima de
48 horas, sendo dispensada a comunicação prévia dos sindicatos
das categorias e do Órgão local do Ministério da Economia. Não
mais é necessária a observância dos limites anuais e relativos
aos dias corridos de férias, ficando afastada, por ora, a aplicação
do art. 139, § 1º da CLT.
Dizeres outros, é permitido que o empregador conceda férias
coletivas, comunicando tão somente os empregados atingidos
com antecedência mínima de 48 horas, dispensada a
comunicação formal ao Órgão local do Ministério da Economia e
os Sindicatos.
FÉRIAS INDIVIDUAIS
Há a possibilidade de concessão de férias individuais aos
empregados, inclusive àqueles que não tenham passado pelo
período aquisitivo, como se verá oportunamente.
Concernente ao gozo das férias individuais, temos que: (i) a
comunicação prévia ao empregado foi reduzida de 30 dias para
48 horas; (ii) o tempo mínimo do período de gozo será de 5 dias;
(iii) o pagamento das férias poderá ser feito até o quinto dia útil
do mês subsequente ao início do gozo das férias2; (iv) o abono
(terço de férias) poderá ser pago até a data da última parcela do
13º salário do ano corrente; (v) a conversão de um terço das férias
em abono pecuniário (art. 143 da CLT) dependerá de concordância
expressa do empregador, devendo o requerimento por parte do
empregado ser feito em até 48 horas antes do início do gozo das
férias; (vi) os funcionários tidos como integrantes do grupo de
risco terão prioridade.
Inovação trazida também pela MP 927/20, refere-se à
possibilidade de antecipação de férias individuais, mesmo não
tendo havido a transcorrência do período aquisitivo. No caso de
férias em que já se cumpriu o período de aquisição, aplicam-se
as regras dispostas alhures.
Relativo à antecipação de férias em que não houve o
cumprimento integral do período aquisitivo, sem prejuízo das
ressalvas anteriores, importante ter em mente que esse instituto
tem ligação direta com questões de saúde e segurança do
trabalhador. Dessa forma, a antecipação das férias cujo período
aquisitivo não foi integralmente cumprido, pode ocasionar o
labor por dois, três, quatro ou mais anos sem gozar férias, o que
é contraindicado, mormente sobre a possibilidade de aumento
de casos de doenças de cunho ocupacional ou acidentes de
trabalho.
Desse modo, considerando a urgência e excepcionalidade do
momento, a concessão das férias seria providência que visa
preservar a vida, a saúde e a incolumidade física dos
empregados e da população, além de assegurar os postos de
trabalho e a renda.
LICENÇA REMUNERADA E COMPENSAÇÃO
A Lei 13.979/20, que trata justamente das excepcionalidades
decorrentes do coronavírus, prevê medidas de afastamento,
quarentena e restrição de circulação. Em seu Art. ٣º, § ٣º, a
referida Lei prevê o abono dos dias de falta do empregado, em
consequência das medidas preventivas para fins de controle,
nesse caso, da pandemia.
Noutros dizeres, o contrato de trabalho dos empregados
atingidos pela quarentena ou isolamento, mesmo que não
infectado, mas como medida de prevenção, ficará interrompido.
Dessa forma, por se tratar de interrupção do contrato de
trabalho, deverá o Empregador arcar com os salários e demais
obrigações pecuniárias.
No entanto, caso a licença seja superior a 30 dias
consecutivos, o empregado não mais terá direito às férias,
iniciando novo período aquisitivo após o fim desse afastamento
(art. 133, inciso III, da CLT).
A Empresa poderá celebrar ajuste por escrito com os seus
colaboradores, prevendo que o período de licenciamento servirá
como compensação das horas extras anteriormente laboradas
ou, ainda, adotar a regra do artigo 61, § 3º3, da CLT, que prevê que
o empregado, mediante a interrupção da prestação de serviços,
poderá prorrogar a jornada diária por até 2 horas extras
(respeitando o limite de 10 horas por dia), por um período de até
45 dias, para compensar o período de afastamento.
TELETRABALHO (HOME OFFICE)
Previsto nos artigos 75-A e seguintes da CLT e com alterações
trazidas pela MP 927/20, o teletrabalho é o serviço prestado
preponderantemente fora das dependências da Empresa por
meio de tecnologias da informação e comunicação, os quais, por
sua natureza, não sejam considerados como trabalho externo.
Nesse caso, não há necessidade de novas contratações no
regime de teletrabalho. Com efeito, a alteração do regime
presencial para o teletrabalho e vice-versa poderá ser feita por
iniciativa exclusiva do empregador, dispensada as formalidades
de registro prévio por meio de aditivo contratual
Entretanto, as alterações para o regime de teletrabalho ou a
reversão deverá ser precedida de notificação com antecedência
mínima de 48 horas, por escrito ou por meio eletrônico. Nesse
particular, vale registrar que os equipamentos e a infraestruturapara a realização do trabalho remoto ou home office poderão ser
fornecidos pelo empregador, sem que isso configure salário ou
integre o contrato de trabalho.
Lado outro, não havendo o fornecimento dos equipamentos e
infraestrutura, o período normal da jornada de trabalho deverá
ser considerado como tempo à disposição e, portanto, haverá a
necessidade de remuneração.
Merece atenção, ainda, que o tempo despendido na utilização
de aplicativos ou outros programas de comunicação fora do
horário ou jornada de trabalho, não será considerado como
tempo à disposição do empregador, salvo se acordo individual ou
coletivo contiver previsão em sentido contrário.
Por fim, é permitida também aos estagiários e aprendizes a
aplicação do regime de teletrabalho, desde que observadas as
disposições da Medida Provisória e leis específicas.
REDUÇÃO SALARIAL E DA JORNADA DE TRABALHO
Não por acaso vista por derradeiro, a Constituição Federal
permite4 a redução dos salários por meio de negociação coletiva.
Assim, é possível que o ACORDO COLETIVO ou a CONVENÇÃO COLETIVA E
TRABALHO estabeleçam a redução da jornada de trabalho com a
consequente adequação da remuneração devida.
A adequação poderá abranger a jornada (tempo/horas) ou dias
de trabalho, sendo vedado o trabalho em regime extraordinário,
sob pena de nulidade do novo regime. Importante repisar que
redução feita por meio de negociação coletiva deverá observar os
princípios constitucionais da dignidade humana e vedação ao
retrocesso.
Para a negociação coletiva, o Sindicato convocará assembleia
geral e, caso não haja a celebração de acordo, a Empresa poderá
submeter os termos à Justiça do Trabalho. A nosso sentir, o art.
503 da CLT não foi recepcionado pela Carta Republicana,
mormente porque essa trouxe previsão expressa de que a
redução salarial só será possível mediante negociação coletiva.
Na mesma esteira segue a Lei 4.923/65, de modo que os
critérios nela previstos (à exceção do caput do art. 2º) não serão
aplicados. Isso porque o critério de flexibilização escolhido pelo
legislador constituinte foi a negociação coletiva, sendo essa
específica e mais acurada no que diz respeito à defesa dos
empregados e à saúde da empresa.
Todavia, não há empecilho para a adoção dos critérios da
supramencionada lei, desde que sejam feitos por instrumento
coletivo de trabalho (acordo ou convenção).
Considerando o contexto e a motivação da adoção dessa
medida, principalmente no que diz respeito ao zelo pela saúde
dos colaboradores e das pessoas da sociedade em geral,
entendemos que a aplicação de multa ou ações judiciais que
discutam a (i)legalidade das férias concedidas poderá ser
dirimida, com base nos princípios da razoabilidade,
proporcionalidade, supremacia do interesse público/coletivo
sobre o privado.
1 “§ 2º – Para os fins previstos neste artigo, o empregador comunicará ao órgão local do
Ministério do Trabalho, com a antecedência mínima de 15 (quinze) dias, as datas de
início e fim das férias, precisando quais os estabelecimentos ou setores abrangidos
pela medida.
§ 3º – Em igual prazo, o empregador enviará cópia da aludida comunicação aos
sindicatos representativos da respectiva categoria profissional, e providenciará a
afixação de aviso nos locais de trabalho.”
2 Afastou-se temporariamente a aplicação do art. 145 da CLT, o qual prevê que “o
pagamento da remuneração das férias e, se for o caso, o do abono referido no art. 143
serão efetuados até 2 (dois) dias antes do início do respectivo período.”
3 “Art. 61 – Ocorrendo necessidade imperiosa, poderá a duração do trabalho exceder do
limite legal ou convencionado, seja para fazer face a motivo de força maior, seja para
atender à realização ou conclusão de serviços inadiáveis ou cuja inexecução possa
acarretar prejuízo manifesto.
[...] § 3º – Sempre que ocorrer interrupção do trabalho, resultante de causas
acidentais, ou de força maior, que determinem a impossibilidade de sua realização,
a duração do trabalho poderá ser prorrogada pelo tempo necessário até o máximo de 2
(duas) horas, durante o número de dias indispensáveis à recuperação do tempo
perdido, desde que não exceda de 10 (dez) horas diárias, em período não superior a
45 (quarenta e cinco) dias por ano, sujeita essa recuperação à prévia autorização da
autoridade competente.” – destacamos.
4 Art. 7ª, VI, Constituição Federal.
IMPACTOS DO COVID-19 NAS RELAÇÕES DE
TRABALHO
Adalberto Pimentel Diniz de Souza
Advogado do escritório Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques
Sociedade de Advogados.
Rafael Meng Nóbrega
Advogado do escritório Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques
Sociedade de Advogados.
O Governo Federal promulgou, em 22.3.2020, a MP 927/20, para
enfrentamento do estado de calamidade pública deflagrado pelo
Coronavírus (Decreto Legislativo 6/20). Essencialmente, a MP
flexibiliza a adoção de providências urgentes pelos empregadores
dispensando as negociações com sindicatos de categoria, que
poderiam atrasar tais providências.
Todas as disposições trazidas já têm precedente em nosso
direito trabalhista. São elas: suspensão do contrato para
qualificação, antecipação de férias individuais e coletivas,
antecipação de feriados, teletrabalho, banco de horas, e
diferimento para saque do FGTS.
Vejamos como devem ocorrer as medidas.
LAY-OFF
Essa previsão causa maior alvoroço, pois permite a suspensão
dos contratos de trabalho (inclusive do pagamento de salário).
No período, a empresa deve oferecer cursos de qualificação
online aos empregados e manter benefícios.
Conhecido na doutrina como lay-off, o instituto já tinha
previsão na CLT, no art. 476-A. A novidade é que se dispensa a
autorização em norma coletiva para tanto, isto é, torna supérflua
a participação do sindicato na regulamentação da matéria.
Ocorreu que o Presidente, por meio de publicação em sua
conta pessoal do Twitter, determinou a revogação do art. 18 da
MP 927/20. Assim, é possível que a matéria de suspensão dos
contratos fique sujeita exclusivamente ao regime da CLT, cuja
diferença é a previsão do lay-off em norma coletiva.
Por certo, a medida seria adotada por inúmeras empresas.
Porém, cabe ressalvar o ônus ao empregador de prestar os cursos
de qualificação. Essa condição impede que pequenos negócios,
responsáveis por fatia significativa da empregabilidade no Brasil,
se habilitem para a adoção do lay-off.
DA ANTECIPAÇÃO DAS FÉRIAS COLETIVAS E INDIVIDUAIS E DE
FERIADOS
A nova MP ainda permite a antecipação de férias individuais e
coletivas, que não poderão ser gozadas em período inferior a
cinco dias e poderão incidir sobre o período aquisitivo ainda
incompleto. Já quanto aos funcionários da saúde, ao contrário, o
empregador poderá suspender as férias em curso, mediante
notificação por escrito.
Com relação ao terço constitucional que incidiria sobre as
férias antecipadas, o empregador poderá pagá-lo somente junto
do 13º salário, sendo ainda que o pagamento das férias poderá ser
realizado até o 5º dia útil do mês subsequente.
Também poderão ser adiantados feriados. Se antecipadas as
férias coletivas, ficará dispensada a notificação ao Ministério da
Economia e aos respectivos sindicatos.
TELETRABALHO
O teletrabalho, ou trabalho à distância, também já tinha
previsão na CLT, nos arts. 75-A e seguintes, desde a aprovação da
Reforma Trabalhista. Nos termos da MP 927/20, este regime
ficará condicionado à notificação prévia do empregado, por prazo
de 48h, sendo que quaisquer gastos com equipamentos e
infraestrutura ficarão a cargo do empregador. A novidade neste
tópico está relacionada à possibilidade de teletrabalho para
estagiários e aprendizes.
BANCO DE HORAS
Durante o estado de calamidade pública, os empregadores
poderão interromper suas atividades. Neste caso, as horas não
trabalhadas constituirão de regime especial de compensação de
jornada, por meio de banco de horas, estabelecido por meio de
acordo coletivo ou individual formal, para a compensação no
prazo de até dezoito meses, contado da data de encerramento do
estado de calamidade. Mais uma vez, a medidaindepende de
notificação às autoridades e ao sindicato.
FGTS
Sob a vigência da MP, ainda, fica suspensa a exigibilidade de
recolhimento do FGTS, que constituirá débito para pagamento
parcelado em até seis vezes mensais. De todo modo, persiste a
obrigação de declarar as informações sociais.
MEDIDAS DE SEGURANÇA E SAÚDE DO TRABALHO
Por último, o recente diploma suspende a realização de
exames ocupacionais e de treinamentos em saúde e segurança.
Permite ainda a prorrogação da jornada acima do limite legal,
mesmo para as atividades insalubres.
REDUÇÃO DA JORNADA
Afora a MP 927/20, cabe lançar luz sobre outras prerrogativas
ao alcance das empresas para superação da crise. Nesse sentido,
artigo 503 da CLT permite a redução geral dos salários em até
25%, observado o salário mínimo da região. O dispositivo permite
reduzir os encargos ao empregador, mas pode conflitar com o
art. 7°, VI, da Constituição, portanto é recomendável que a
redução esteja ancorada em instrumento coletivo.
Neste ponto, o governo já prometeu a edição de Medida
Provisória que permitirá redução de salário proporcional à
jornada, em até 50%, e que deverá otimizar a aplicação do
instituto. Por ora, não se sabe os encargos que serão impostos ao
empregador como contrapartida.
PDV
Outra estratégia ao alcance do empregador consiste na
propositura de um Plano de Demissão Voluntária, nos termos do
art. 477-B, da CLT, a fim de enxugar sua folha salarial e sanear a
saúde financeira da empresa.
POSSIBILIDADES E LIMITES NA MOBILIZAÇÃO
DE INSTITUTOS TRABALHISTAS NO
CONTEXTO DA CRISE PANDÊMICA À LUZ DA
MP 927/20
Gáudio Ribeiro de Paula
Sócio-fundador da Maschietto & De Paula Sociedade de Advogados e vice-
presidente da RedeJur – Associação de Escritórios de Advocacia Empresarial.
Em um emblemático domingo, já no final da noite, a
comunidade jurídica trabalhista foi, enfim, apresentada à MP
927/20, publicada no dia 22 de março de 2020 como uma das
respostas institucionais à crise desencadeada pela propagação do
COVID-19 em território nacional.
No epicentro das perturbações socioeconômicas resultantes
da pandemia, patrões e empregados aguardavam sequiosos
alguma manifestação oficial do Estado Brasileiro quanto às
dúvidas que pairavam em torno de diversos temas trabalhistas,
sobretudo aqueles relativos aos efeitos da paralisação da
atividade econômica em diversos segmentos.
O que se viu foi o fruto de um consenso construído de
maneira apressada, como só acontece em cenários de grave
comoção social.
De um lado, a MP trouxe alguma luz e amparo jurídico no
tocante à possibilidade de se mitigar o rigor de diversas regras
que poderiam atuar como obstáculos para se imprimir alguma
flexibilidade a institutos trabalhistas que poderiam amenizar os
duros impactos da retração abrupta das atividades laborais, por
razões de ordem pública.
Foi o que se deu quanto ao teletrabalho, especialmente útil
ante o isolamento social imposto e para cuja implantação
passou-se a exigir apenas uma notificação prévia de 48 horas
(art. 4º, § 2º, da MP 927/20).
Também foi o quanto se verificou relativamente à
antecipação de férias individuais e à concessão de férias
coletivas, em relação às quais atuava como dificultador o prévio
aviso de 30 e 15 dias, respectivamente, exigidos pela CLT (arts. 135
e 139, § 2º, da CLT). Tais prazos foram reduzidos drasticamente
para 48 horas, em ambos os casos (arts. 6º e 11 da MP 927/20).
O diploma elasteceu, igualmente, o prazo para pagamento da
remuneração das férias até o quinto dia útil do mês subsequente
ao do início de sua fruição (art. 9º da MP 927/20), assim como do
terço constitucional, o qual poderá ser pago em conjunto com 13º
salário (art. 8º da MP 927/20).
Na mesma direção flexibilizante, institui-se a possibilidade de
aproveitamento e antecipação dos feriados, mediante simples
cientificação no prazo de 48 horas, com ressalva para os de
natureza religiosa, quanto aos quais se requer concordância do
trabalhador (art. 13 da MP 927/20).
Ainda nessa esteira foi dilatado o prazo para compensação de
jornada em banco de horas para 18 meses, prescindindo-se da
intervenção sindical para esse fim (art. 14 da MP 927/20).
A suspensão de exames médicos ocupacionais, com ressalva
do demissional (art. 15 da MP 927/20) e de treinamentos
periódicos previstos nas NRs (art. 16 da MP 927/20), ao lado do
diferimento do recolhimento do FGTS (art. 19 da MP 927/20),
figuram como últimos exemplos da maleabilidade normativa
empreendida.
De outro lado, a Medida Provisória ofereceu lastro jurídico
para a dilatação da jornada dos heroicos profissionais de saúdes
mesmo em atividades insalubres e escalas 12X36 (art. 26 da MP
927/20), autorizando a compensação das horas extras no prazo de
18 meses (art. 27 da MP 927/20).
Afastou, ainda, o reconhecimento do contágio pelo vírus
(COVID-19) como doença ocupacional, a não ser que esteja
comprovado o nexo de causalidade entre a enfermidade e o
desenvolvimento da atividade laboral (art. 27 da MP 927/20).
Garantiu a sobrevida de instrumentos coletivos com prazo de
vigência expirado ou em vias de expirar, a critério do
empregador e por um lapso de até 90 dias (art. 30 da MP 927/20).
A par de outras medidas de menor relevância, fixou, enfim,
como diretriz para a fiscalização do trabalho o papel orientador,
com ressalva para casos de maior gravidade, como acidentes
fatais e exploração de trabalho análogo ao de escravo (art. 30 da
MP 927/20).
Todas as referidas medidas foram recebidas com algum
entusiasmo por empresários e gestores de empresas, embora
tenham atraído críticas formuladas por parte dos magistrados
trabalhistas1 e procuradores do trabalho2.
Entretanto, ao disciplinar aquela que talvez pudesse ser a
principal solução para a interrupção forçada das atividades
empresariais, a MP findou por frustrar a expectativa tanto de
empregados como de empregadores.
Com efeito, o “direcionamento do trabalhador para
qualificação profissional” passou a contar com prazo de até 4
meses (antes era de 2 a 5 meses), podendo ser implementado por
simples acordo individual, o que outrora encontrava-se
condicionado à negociação coletiva (art. 18 da MP 927/20).
Ao impor ao empregador o ônus de eventual pagamento de
“ajuda compensatória” durante o período da suspensão
contratual, desonerou completamente o Estado de sua cota-
parte, tornando insustentável o uso de tal mecanismo.
Não por acaso, antes de se completarem 24 horas da
publicação da MP 927/20, o preceito veio a ser revogado por outra
medida provisória (MP 928/20, art. 2º), diante da ingente pressão
política que se exerceu contra os termos da resposta legiferante.
No enfrentamento desse que se tornou o maior desafio global
das últimas décadas, as medidas mais brandas mostraram-se
ineficientes para a contenção do crescimento exponencial do
contágio e seus trágicos consectários, consoante se verificou na
lamentável experiência italiana.
À semelhança do que se passa com as estratégias sanitárias,
as linhas de ação quanto à crise no mercado de trabalho devem
passar por uma intervenção firme e ágil, oferecendo rápido
socorro a trabalhadores e patrões, antes que se alcance um
“ponto de não-retorno” e postos de trabalho sejam extintos de
modo mais definitivo.
1 A Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (ANAMATRA) divulgou
nota com teor fortemente crítico
[https://www.anamatra.org.br/imprensa/noticias/29459-anamatra-se-manifesta-
sobre-o-teor-da-mp-927-2020 – acesso em 23/03/20]. Cumpre notar que a Associação
Brasileiro de Magistrados do Trabalho (ABMT) posicionou-se em sentido mais neutro
quanto às novas disposições normativas, afirmando o compromisso de uma análise
técnica e imparcial dos eventuais conflitos surgidos na aplicação da MP 927/20
[http://www.abmtrab.com.br/n.php?ID=83&T=nota-p-blica-a – acesso em 23/03/20].
2 A nota da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT) foi
especialmente dura quanto à Medida Provisória, ao afirmar que o diploma “submete o
trabalhador à caridade empresarial” [http://www.anpt.org.br/imprensa/noticias/3642-para-procuradores-do-trabalho-mp-927-2020-submete-o-trabalhador-a-caridade-
voluntarista-empresarial – acesso em 23/03/20].
RELAÇÕES TRABALHISTAS EM TEMPOS DA
PANDEMIA DO CORONAVÍRUS
Sergio Eduardo Canella
Advogado sócio do escritório Brandão Canella Advogados Associados.
A MP 927/20, publicada no diário oficial em 22 de março de
2020, permite a flexibilização de algumas regras trabalhistas. O
objetivo da Medida Provisória, segundo informações do Governo
Federal, é tentar apresentar ações para combater os efeitos da
pandemia de coronavírus sobre a economia brasileira e evitar o
desemprego em massa.
O Congresso Nacional deve votar a aprovação do texto em até
120 dias para que este se transforme em Lei.
Porém, as medidas já estão valendo, tais como:
1. Teletrabalho, home-office e utilização de banco de horas;
2. A antecipação de férias individuais com a comunicação
prévia de 48 horas, sendo que o período concedido não pode
ser inferior a 5 (cinco) dias corridos. As férias podem ser
concedidas mesmo que o período aquisitivo não tenha
transcorrido integralmente e, por opção do empregador, o
adicional de um terço das férias poderá ser pago ao
empregado em período posterior;
3. A concessão de férias coletivas, também com o aviso-
prévio de 48 horas;
4. Antecipação de feriados não religiosos. Para isso é
necessária a notificação do empregado com antecedência de
48 horas, por escrito ou por via eletrônica, com a relação dos
feriados que serão antecipados. Essa compensação pode ser
usada no banco de horas. Para feriados religiosos é
necessária a concordância escrita do empregado;
5. As empresas podem retardar o pagamento do FGTS dos
próximos 3 meses (abril, maio e junho). O recolhimento
destas parcelas poderá ocorrer a partir de julho de 2020 em
até seis parcelas. Esse benefício foi autorizado para todas as
empresas, independentemente do número de empregados,
do regime de tributação, natureza jurídica, ramo de
atividade ou de adesão prévia;
6. Suspensão de exigência administrativa em segurança e
saúde do trabalho, como por exemplo a autorização do
trabalho em regime 12 por 36 em ambiente insalubre,
mediante acordo individual.
Lembrando que a suspensão do contrato de trabalho sem
a contraprestação do pagamento de salário, diante da
grande polemica que se instalou entre políticos, partidos e
entidades de classes, foi revogada no o dia 23 de março de
2020, pelo Presidente da República.
A REVOGAÇÃO DO ART. 18 DA MP 927/2020 E A
MANUTENÇÃO DA POSSIBILIDADE DE ADOÇÃO
DO LAY OFF MEDIANTE AJUSTE INDIVIDUAL
ENTRE EMPREGADOS E EMPREGADORES
Daniel Sebadelhe Aranha
Sócio do Sebadelhe Aranha & Vasconcelos. Presidente da AATRA-PB –
Associação dos Advogados Trabalhistas da Paraíba. Diretor do CESA PB –
Centro de Estudos das Sociedades de Advogados, Seccional Paraíba.
Mateus Souto Maior Caldas Ribeiro
Sócio do Sebadelhe Aranha & Vasconcelos. Especialista em relações de
trabalho. Consultor.
Dentre as medidas de enfrentamento ao estado de
calamidade pública decorrente da epidemia de COVID-19,
elencadas pela MP 927/20, de 22.3.2020, a suspensão da relação de
emprego em caso de direcionamento do trabalhador para
qualificação profissional apresentava-se como a mais viável aos
empregadores, já que suspenso o contrato de trabalho inexiste
obrigação de pagamento ou de antecipação de salário ou mesmo
de adimplemento de quaisquer verbas trabalhista.
A repercussão negativa da MP 927/20, sobretudo quanto a dita
suspensão de salários, não é consequência da natural e massiva
inclinação dos empresários pela aplicação da medida, já que a
qualificação profissional como causa de suspensão do contrato
de trabalho foi instituída há quase duas décadas, pela MP 2.164-
41, de 24.8.2001, que acrescentou o art. 476-A da CLT, redação
ainda vigente.
A rejeição popular decorre da previsão contida no § 5º, art. 18,
da MP 927/20, o qual isentava o Governo Federal de conceder a
bolsa-qualificação prevista no art. 476-A da CLT, abrindo espaço
para a possibilidade daqueles empregados direcionados para
qualificação profissional permanecerem sem qualquer amparo
financeiro.
Pressionado pela opinião pública, a Presidência da República
revogou o art. 18, caput e parágrafos, da MP 927/20, desta feita
através da publicação da MP 928, de 23.3.2020.
Ocorre que a revogação parcial da MP 927/20 não impede, em
princípio, que as empresas adotem, como forma de preservar os
postos de trabalho, a suspensão do contrato de trabalho para
qualificação profissional, já que a norma de regência é o art. 476-
A da CLT, dispositivo não revogado e que está em plena produção
de efeitos jurídicos.
Também permanece em vigor o inciso VII do art. 3º da MP
927/20, que integra o direcionamento do trabalhador para
qualificação profissional no rol das medidas de enfrentamento
ao estado de calamidade pública decorrente da epidemia de
COVID-19.
Com a revogação do art. 18, caput e parágrafos, da MP 927/20,
a regra geral para a suspensão da relação de emprego para
qualificação profissional voltou a ser o art. 476-A da CLT, que
impõe formalidades para adoção da medida, tais como a
negociação coletiva, comunicação com antecedência mínima de
15 dias.
Contudo, o art. 2º da MP 927/20, expressamente concede
autorização a empregados e empregadores para definição de
medidas e concessões necessárias, mediante ajuste individual
escrito, para evitar a rescisão contratual durante o período de
calamidade decorrente da epidemia de COVID-19. A parte final do
referido dispositivo deixa claro que as disposições ajustadas
nesse pacto excepcional prevalecem sobre as disposições
contidas na CLT e nos instrumentos coletivos.
Sob a perspectiva da preservação da relação de emprego, com
respaldo no art. 2º da MP 927/20, as formalidades previstas no
art. 476-A da CLT, tais como a negociação coletiva e comunicação
com antecedência mínima de 15 dias, podem ser flexibilizadas,
desde que de comum acordo entre empregado e empregador,
possibilitando, destarte a então “vedada” suspensão da relação de
emprego para qualificação profissional.
Não se pode perder de vista que a finalidade e o bem jurídico
tutelado pelo art. 476-A da CLT ao impor autorização sindical,
qual seja, preservação dos interesses do trabalhador, serão
atingidos com o ajuste particular, já que este tem como objetivo
único, desde que firmado com boa-fé e probidade, evitar o seu
desemprego e consequente desassistência sua e de seus
familiares.
Aliás, a boa-fé, em todo esse duro processo epidêmico, possui
sobrelevada relevância, afinal sem solidarização de todos os
players que orbitam em torno do contrato de emprego, se
valendo de razoabilidade e proporcionalidade, os danos ao País
serão bem mais profundos.
Eis a exegese que se extrai do disposto na Lei 13.874/2019, a
qual possui denso conteúdo principiológico que deve ser aplicado
a panorama social vivido e que impacta obrigatoriamente no
direito do trabalho. Não há como não se interpretar a suspensão
momentânea do contrato de emprego, às expensas do Estado,
nos moldes propostos, como um grito em favor da ordem
econômica, ex-vi art. 170 da Carta Magna, mas que respeita os
direitos sociais mínimos estabelecidos no art. 7º da Constituição
Federal, motivo pelo qual o que está em jogo é o interesse público
com o lay off, e não das partes contratantes (art. 8º da CLT).
Portanto, fechado o parêntese, com a revogação do § 5º, art. 18,
da MP 927/20, prevalece a obrigação ao Governo Federal para
concessão de bolsa-qualificação prevista no art. 476-A da CLT,
sem prejuízo de outras medidas pecuniárias emergenciais, de
natureza indenizatória, que possam vir a ser concedidas pelo
Poder Público.
Instituído o lay off, poderá, ainda, o empregado manter ou
conceder benefícios como vale-alimentação, cesta-básica e até
complementação pecuniária, sem que caracterize salário ou
integre de forma definitiva ao contrato de trabalho, conforme §3º
do art. 476-A da CLT.
E mais, após a suspensão contratual, o empregado não poderá
ser demitido nos três meses subsequentes ao retorno dasatividades, sob pena de pagamento de indenização
compensatória de no mínimo o valor equivalente a sua
remuneração, conforme §5º do art. 476-A da CLT.
Com isso, pelo que se percebe, o Governo Federal não
conseguiu vedar a instituição de lay off pelos empregadores que
devem utilizar o instituto com parcimônia e atenção, desde que
se encaixe na sua atividade empresarial e em seu modelo de
negócio.
E não venha o Governo Federal alegar criação de obrigação
nova de concessão de benefício assistencial, uma vez que o
instituto em defesa vige no ordenamento jurídico há quase 20
anos, sem qualquer eiva de inconstitucionalidade.
Enfim, em um momento de tamanha repercussão social, sem
precedentes na história nacional, chegou a hora do Poder Público
arregaçar as mangas, sair do misto de letargia e ineficiência que
o acomete a fim de assumir a responsabilidade que lhe é
inerente, por disposição constitucional, e encontrar soluções
urgentes, eficazes que mantenham vivos empresas e empregos.
MEDIDA PROVISÓRIA DO PACOTE
ANTIDESEMPREGO
Erika Mello
Advogada do escritório Pires & Gonçalves – Advogados Associados,
especialista em Direito Trabalhista.
A tão esperada MP 927/20, conhecida como “Pacote
antidesemprego” foi, enfim, publicada. Contudo, ela deixou de
fora disposições específicas, que antes tinham sido divulgadas,
sobre a flexibilização da redução de salários e jornadas em até
50%. Ambas por acordo individual entre empregado e
empregador.
Neste cenário, a MP 927/20 não trouxe muitas alternativas
para as empresas que não têm como abrir mão da força de
trabalho, mesmo que reduzida. Isso porque todas as demais
medidas previstas (férias, banco de horas, antecipação de
feriados, suspensão do contrato de trabalho) tornam o
empregado indisponível ao empregador. Na realidade, ela exclui
aqueles que não têm como abrir mão da força de trabalho (ainda
que reduzida), que precisam do mínimo de empregados para a
manutenção de atividades que garantam a continuidade do
negócio e, consequentemente, a manutenção da renda dos
trabalhadores.
Continuamos, na maioria dos casos, na situação “8 ou 80”:
manutenção integral do contrato de trabalho sem flexibilização
ou dispensa dos empregados. Existem informações de edição de
uma nova MP que tratará desse tema, mas, por enquanto, não
temos nada concreto.
O governo focou, anteriormente, na possibilidade de
suspensão do contrato de trabalho por 120 dias, com
obrigatoriedade de direcionamento dos empregados para curso
ou programa de qualificação profissional. Durante esse período,
não haveria pagamento de salário e seria dada como facultativa
a fixação do que a MP chamou de “ajuda compensatória mensal
sem natureza salarial”, sendo que também não foi definido o
valor mínimo de tal “ajuda”. A MP previa, ainda, que durante a
suspensão do contrato fossem mantidos os benefícios
voluntariamente concedidos pelo empregador, como plano de
saúde.
Um dos grandes pontos de fragilidade da MP 927/20 foi
exatamente a forma proposta pelo Governo para suspensão do
contrato de trabalho, o que levou o presidente da República, Jair
Bolsonaro, a publicar, no mesmo dia da publicação da MP 927/20,
a MP 928, revogando especificamente o art. 18 da MP 927/20, que
previa a suspensão. Isso em virtude da extrapolação, com relação
à Constituição Federal, da permissão de retirada integral dos
salários dos empregados, impactada ainda, pela inexistência de
outras medidas de equilíbrio com relação à renda dos
trabalhadores submetidos a essa medida. Ou seja, ignorou-se o
fato de que o trabalhador sem renda é o consumidor que não
consome; logo, a economia, já brutalmente impactada seria
ainda mais comprometida.
Os demais itens tratados na MP 927/20 continuam válidos e
apenas tornaram menos burocráticas outras medidas já
existentes de possível ajuste nos contratos de trabalho
(teletrabalho, trabalho remoto, férias individuais e coletivas).
Um ponto positivo para os empregadores foi a disposição, no
art. 36 da MP 927/20, de reconhecimento de validade das medidas
trabalhistas já adotadas, que acompanhem o que foi autorizado
na MP, no período de 30 dias anteriores à sua edição. Isso traz
segurança jurídica a diversas ações que as empresas já tinham
implementado em caráter de urgência, com objetivo principal de
resguardar a saúde e a segurança dos trabalhadores diante da
pandemia da Covid-19.
IMPACTOS DA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 927/20
PARA ENFRENTAMENTO DO ESTADO DE
CALAMIDADE PÚBLICA
Rafael Tedrus Bento
Sócio do escritório Luz & Tedrus Bento Advogados, mestrando em Direito
Internacional pela PUCCAMP, especializado em Direito do Trabalho pela
PUC/SP e especializado em Direito Empresarial pelo INSPER.
Vinicius Medeiros Rossi
Advogado do escritório Luz & Tedrus Bento Advogados, especializando em
Direito Civil pela Damásio Educacional, formado pela PUCCAMP.
Com o advento do vírus Covid-19 e o decreto de estado de
calamidade pública nacional, muitos empregadores
modificaram a forma da prestação de serviços do empregado
sem uma regulamentação, porém, fez-se necessária a instituição
de uma norma para reger os contratos de trabalho.
O Presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, por meio
da MP 927/20 trouxe algumas diretrizes, para os empregadores e
empregados, que podem ser tomadas sem que desvirtue a
finalidade do contrato de trabalho em curso.
A regulamentação traz a necessidade da preservação do
emprego e da renda, assim, seus dispositivos somente possuem
eficácia durante o período em que estiver decretado o estado de
calamidade pública, abrindo possibilidade para a existência de
acordos individuais por escrito, entre empregado e empregador,
para garantir o emprego.
A medida provisória traz a superioridade dos acordos
efetuados a qualquer outra norma, seja ela coletiva ou legislação
vigente, colocando a possibilidade de serem adotadas as medidas
de: teletrabalho, antecipação de férias individuais, concessão de
férias coletivas, aproveitamento e a antecipação de feriados,
banco de horas, suspensão de exigências administrativas em
segurança e saúde no trabalho, direcionamento do trabalhador
para qualificação e o diferimento do recolhimento do Fundo de
Garantia do Tempo de Serviço.
No mesmo dia da Publicação da MP, o Presidente da República
determinou a revogação do artigo que estabelece a suspensão do
contrato de trabalho por início de curso telepresencial.
TELETRABALHO
O teletrabalho, regulamentado pelos artigos 4º e 5º da medida
provisória, demonstram a possibilidade de o empregador colocar
seus empregados em trabalho remoto ou à distância, sem se
confundir com trabalho externo.
Os obreiros precisam ser notificados com pelo menos 48 horas
de antecedência, de forma escrita ou eletrônica, vez que não
terão alteração do registro. Além disso, as necessidades de
infraestrutura e suas despesas para o desempenho da atividade
deve ser firmado por meio de contrato escrito prévio ou em 30
dias da data da mudança da forma de prestação da atividade.
Salienta-se que os empregadores podem instituir o regime de
teletrabalho para os indivíduos que possuem cargo de menor
aprendiz, bem como aos que laboram como estagiários para
experiência profissional.
FÉRIAS ANTECIPADAS
Da mesma maneira, é possível que seja antecipada as férias
individuais de cada funcionário (artigos 6º ao 10), por ser esta
uma escolha do empregador, sendo obrigado a comunicar com
48 horas de antecedência por meio escrito ou eletrônico,
declarando o período de férias que será usufruído pelo
trabalhador.
As férias individuais não podem ser inferiores a 5 dias
corridos, porém, fica autorizada a possibilidade de ser concedida
as férias mesmo que o período aquisitivo não tenha ocorrido, ou
seja, não é necessário a existência de férias vencidas, além de
que, é possível a antecipação de períodos futuros de férias, mas
com a necessidade de um acordo individual escrito com o
empregado.
FÉRIAS PARA GRUPO DE RISCO
Ainda, existe a proteção aos trabalhadores que são vistos
como grupo de risco pelo contágio da patologia, sendo que estes
possuemprioridade para a concessão das férias individuais, por
outro lado, podem os empregadores de profissionais da saúde
suspenderem as férias ou licença não remunerada de seus
obreiros, respeitando a comunicação com antecedência de 48
horas, por meio formal.
Em caso de concessão das férias individuais, o empregador
tem a opção do pagamento do terço de férias após o empregado
já ter saído de férias, até a data que for devida a gratificação
natalina, havendo a possibilidade de conversão do terço de férias
em abono pecuniário, mas com prévia concordância do
empregado, em relação a remuneração de férias, poderá o
empregador pagar até o 5º dia útil do mês posterior ao início das
férias.
Em relação a rescisão contratual, os valores devidos em
relação as férias do período de calamidade pública deverão ser
acrescidas aos as demais verbas rescisórias.
FÉRIAS COLETIVAS
Existe ainda, a possibilidade de o empregador conceder férias
coletivas (artigos 11 e 12), com aviso prévio de 48 horas ao
conjunto de funcionários, com máximo de períodos anuais e
limite mínimo de dias corridos, sem qualquer necessidade de
notificação ao ministério da economia e aos sindicatos da
categoria.
ANTECIPAÇÃO DE FERIADOS
A medida provisória prevê também a possibilidade de
antecipação de feriados federais, estaduais, distritais e
municipais (artigo 13), que não sejam de cunho religioso, com
aviso prévio de 48 horas de forma escrita ou eletrônica, com
expressa indicação do feriado antecipado, no entanto, caso seja
necessária a antecipação de feriados religiosos deve existir
autorização e concordância do empregado, por meio de acordo
individual escrito.
BANCO DE HORAS
Em continuidade, é previsto a possibilidade de utilização de
banco de horas (artigo 14), podendo ser instituído por acordo
coletivo ou individual, colocado formalmente aos empregados,
pela interrupção das atividades, constituindo um regime especial
de compensação de jornada, em até 18 meses, após o estado de
calamidade pública, com prorrogação de jornada de até 2 horas,
que não exceda 10 horas diárias.
EXAMES MÉDICOS OCUPACIONAIS
Fica suspensa as exigências administrativas em segurança e
saúde no trabalho (artigos 15 ao 17), para redução de contágio,
assim, os exames médicos ocupacionais, clínicos e
complementares, ficam suspensos, sendo que os exames que
ficaram suspensos devem ser feitos no prazo de 60 dias após o
estado de calamidade.
Os exames demissionais ficam mantidos de forma geral,
podendo ser dispensado pelas empresas se existir exame
ocupacional efetuado dentro do prazo de 180 dias, afastando sua
obrigatoriedade.
TREINAMENTOS
Os treinamentos previstos nas normas regulamentadoras, da
mesma maneira, ficam suspensos, autorizando a possibilidade
de treinamentos online, com observância do empregador dos
conteúdos práticos, além de que, as comissões internas de
prevenção de acidentes (CIPA), poderão ser mantidas até o final
do estado de calamidade pública, suspendendo os processos
eleitorais.
SUSPENSÃO DO TRABALHO PARA QUALIFICAÇÃO (REVOGADA)
Existe ainda, a possibilidade de direcionamento do
trabalhador para qualificação (artigo 18), suspendendo o contrato
de trabalho pelo prazo de quatro meses, para a participação em
curso ou programa de qualificação profissional, não presencial,
oferecido pelo empregador.
A suspensão não depende de qualquer acordo ou convenção
coletiva, sem ligação ao sindicato, podendo ser feito o acordo
individualmente ou em grupo, porém, será registrado o período
de suspensão na CTPS dos obreiros. Neste período, é facultado ao
empregador em conceder ajuda compensatória mensal, sem
natureza salarial, com valor definido no acordo efetuado.
Cumpre destacar que se o curso não for ministrado ou houver
trabalho durante o período de suspensão, fica descaracterizada o
instituto, sujeitando o empregador a sanções salarias, encargos e
penalidades previstas no acordo.
FUNDO DE GARANTIA POR TEMPO DE SERVIÇO
O Fundo de Garantia por Tempo de Serviço ficará com sua
exigibilidade de recolhimento suspensa (artigo 19), nos meses de
março, abril e maio do ano corrente, os recolhimentos do período
poderão ser feitos de forma parcelada, sem atualização, multas
ou encargos, em até 6 parcelas mensais, a partir de julho de
2020.
DOENÇA OCUPACIONAL
Importante mencionar ainda que existindo o caso de
contaminação pelo Covid-19 (coronavírus), não será considerada
como doença ocupacional (artigo 29), exceto se for demonstrado
o nexo de causalidade da atividade a contaminação, recaindo
ônus de comprovação ao empregado.
PRAZO PARA APLICAÇÃO DAS MEDIDAS
As medidas tomadas pelos empregadores que não contrariam
as determinações da medida provisória estão convalidadas,
desde 30 dias antes da data da regulamentação, sendo ainda
facultado a estes a prorrogação dos acordos e as convenções
coletivos vencidos ou vincendos dentro no prazo de 180 dias da
data de vigor da medida presidencial, podendo ser prorrogado
por 90 dias.
Diante disso, foram instituídas as medidas para a
regulamentação de diretrizes trabalhistas aos empregadores e
empregados, para que não houvesse qualquer informalidade dos
períodos de quarentena da pandemia, legitimando qualquer
medida tomada pelos empregadores.
(DA SUSPENSÃO) DO CONTRATO DE
TRABALHO
A DOSE DO REMÉDIO QUE IRIA MATAR O PACIENTE
José Carlos Manhabusco
Advogado sênior da banca Manhabusco Advogados.
Em 22 de março de 2020, o Presidente da República editou a
MP 927/20 que dispõe sobre as medidas trabalhistas para
enfrentamento do estado de calamidade pública reconhecido
pelo Decreto Legislativo 6, de 20 de março de 2020, e da
emergência de saúde pública de importância internacional
decorrente do coronavírus (covid-19), e dá outras providências. O
ato está amparado no artigo 62 da Constituição Federal.
É verdade que estamos vivendo em estado de calamidade
pública, tendo em vista a propagação incontrolável do vírus. O
mundo está sendo atacado por algo que não se sabe a proporção
da sua malignidade. Não importa quem é o responsável. Todavia,
os danos são incalculáveis à humanidade, especialmente aos
idosos (mais frágeis).
Também é verdade que todos devem dar a sua cota de
sacrifício (Poder Judiciário, Poder Legislativo, Poder Executivo,
Forças Armadas, Fundos Partidários, auxílios de todos os tipos...),
não importando a sua condição e/ou status, seja financeira,
social etc. Todos devem contribuir na mesma proporção.
Veja-se alguns dispositivos da CLT que tratam da questão:
Artigos 468; 472; 476-A. Logo, há previsão da Carta Laboral da
possibilidade de alteração, suspensão e interrupção do contrato
de trabalho. No entanto, há ressalvas na própria CLT: “Art. 9º.
Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de
desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos
na presente Consolidação”; “Art. 444. As relações contratuais de
trabalho podem ser objeto de livre estipulação das partes
interessadas em tudo quanto não contravenha às disposições de
proteção ao trabalho, às convenções coletivas que lhes sejam
aplicáveis e às decisões das autoridades competentes”.
Tudo que consta no texto encontra-se devidamente
fundamentado, bem assim de maneira compreensiva.
“As empresas poderão suspender o contrato de trabalho de seus
funcionários por até quatro meses, período em que eles ficarão
sem trabalhar nem receber salário, mas deverão fazer um curso
online de qualificação profissional. O texto prevê uma série de
mudanças que, segundo o governo, tem o objetivo de evitar o
desemprego em massa durante o período de calamidade pública,
decretado até 31 de dezembro em razão do novo coronavírus.
Segundo a MP, o empregador poderá conceder ao empregado
ajuda compensatória mensal, sem natureza salarial, durante o
período de suspensão contratual, com valor definido livremente
entre as duas partes, via negociação individual. A empresa será
obrigada a oferecer cursos de qualificação online ao trabalhador e
a manter benefícios, como o plano de saúde. A medida provisória
permite, ainda, que empresas atrasemo recolhimento do FGTS,
flexibiliza o regime de home office, libera a antecipação de férias
individuais mesmo que o trabalhador ainda não tenha trabalhado
o tempo exigido para desfrutar do descanso mensal, facilita a
https://congressoemfoco.uol.com.br/economia/governo-e-congresso-discutem-suspensao-de-contrato-de-trabalho-durante-pandemia/
https://congressoemfoco.uol.com.br/economia/bndes-anuncia-r-55-bilhoes-para-combate-ao-coronavirus/
concessão de férias coletivas e o uso do banco de horas e permite a
antecipação de feriados não religiosos”1.
É importante destacar que, segundo a MP, à suspensão dos
contratos não dependerá de acordo ou convenção coletiva, ou
seja, os acordos individuais entre patrões e empregados estariam
acima das leis trabalhistas, desde que a Constituição Federal não
seja descumprida (?).
É certo também que no período de validade da MP, o
empregador não pagará salário e o empregado deixa de
trabalhar.
De acordo com a MP, caso o empregador não forneça o curso
de qualificação, o contrato de trabalho não será considerado
suspenso e a empresa fica obrigada a pagar salário e recolher
encargos trabalhistas.
O período de validade da MP é de 120 dias, mas deve ser
aprovada pelo Congresso Nacional, caso em que, se não
submetida e aprovada, perde a sua validade.
Estão previstos na MP: “a antecipação das férias individuais de
seus funcionários mesmo que o tempo de aquisição ainda não
tenha sido completado, com aviso antecipado de 48 horas; os
trabalhadores do grupo de risco como idosos e pessoas com
doenças crônicas serão priorizados; o empregador pode prorrogar
o prazo para o depósito do 1/3 proporcional das férias, ou seja até,
até 20 de dezembro, coincidindo com o 13º salário; o valor das
férias, sem o terço constitucional, poderá ser feito até o quinto dia
útil no mês seguinte que o trabalhador sair de férias; e caso o
contrato de trabalho seja suspenso antes desta data, o empregador
deve quitar os valores na rescisão; a postergação de recolhimento
do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) por três meses;
com relação aos meses de março, abril e maio poderão ser
parceladas e pagas sem a incidência de multa; para a suspensão
do contrato, o empregador deve oferecer um curso de qualificação
online ao trabalhador e que benefícios como o plano de saúde
sejam mantidos; a empresa poderá conceder uma ajuda
compensatória mensal, “sem natureza salarial”, “com valor
definido livremente entre empregado e empregador, via
negociação individual”; a suspensão do contrato precisa ser
registrada em carteira”2.
Pois bem.
A questão é que esse sacrifício não deve ser suportado, apenas,
pelos trabalhadores de um modo geral ou, apenas, pelos seus
respectivos empregadores. Todos devem atuar de modo a
amenizar os efeitos, não só financeiro, mas acima de tudo, social
da população.
Os empregados e empregadores não podem pagar essa conta
sozinhos, especialmente os micro, pequenos e médios
empresários.
Outro ponto questionável da MP é também quanto ao fato de
convalidar as medidas trabalhistas adotadas por empregadores
em momento anterior a edição da MP (período dos trinta dias
anteriores à data de entrada em vigor), ainda que não
contrariassem o disposto na MP, abre-se um espaço para futuras
discussões, pois o poder diretivo do empregador e a subordinação
jurídica do empregado, com certeza, desequilibram a relação
capital x trabalho.
O conteúdo da MP determina o respeito à Constituição Federal,
ou seja, no mínimo, devem ser resguardados e respeitados os
direitos sociais, isto porque, a dignidade do ser humano está
acima de tudo.
Em suma, não deveria o Poder Executivo interferir de forma
tão invasiva na relação entre patrões e empregados, tendo em
vista que se trata de ato-condição, em que os empregados apenas
aderem às condições impostas pelo empregador, em que pese a
boa intenção.
Para surpresa nossa, antes de acabarmos de redigir esse
artigo, o presidente Jair Bonsonaro avisou nas redes sociais que
revogou o artigo 18 da MP 927/20, que permitia a suspensão do
contrato de trabalho por até 4 meses sem salário.
O artigo 18 previa que, “Durante o estado de calamidade pública
a que se refere o art. 1º, o contrato de trabalho poderá ser
suspenso, pelo prazo de até quatro meses, para participação do
empregado em curso ou programa de qualificação profissional
não presencial oferecido pelo empregador, diretamente ou por
meio de entidades responsáveis pela qualificação, com duração
equivalente à suspensão contratual...”3.
Auguramos sorte e felicidade à iniciativa presidencial. QUE
DEUS NOS AJUDE!
1 Fonte: congressoemfoco.
2 Fonte: revista VEJA.
3 Fonte: Agência Brasil, às 14h, do dia 23.03.2020.
BREVES COMENTÁRIOS ACERCA DA MP 927
Denise Alvarenga
Sócia responsável pela área trabalhista do escritório Motta Fernandes
Advogados.
Helena Gomez
Advogada associada do escritório Motta Fernandes Advogados.
Foi publicada no dia 22/3, a MP 927/20, com objetivo de
regulamentar as medidas trabalhistas para enfrentamento do
estado de calamidade, decretada em virtude da emergência de
saúde pública internacional decorrente da expansão
epidemiológica do Novo Coronavírus.
A MP 927/20 teve sua vigência iniciada no ato da sua
publicação e sobreveio diante dos novos dilemas relacionados
aos contratos de trabalho no atual momento atravessado pelo
Brasil, bem como diante da premente necessidade de regular
ações que já vinham sendo tomadas pelos empregadores em
todo o país.
Nos diversos canais de comunicação já se tinha ciência das
condutas adotadas pelas empresas, sendo muitas destas
condutas irregulares até então, mas que agora, diante da edição
da MP 927/20 passam a ser dotadas de alguma segurança
jurídica, tanto para empregados, quanto para empregadores.
O momento é de extrema excepcionalidade, por isso admitida
a flexibilização das condições do trabalho. É importante ter em
mente que existem dois prazos no cerne da discussão.
O primeiro deles é o período de duração do estado de
calamidade que, nos termos do Decreto Legislativo 6/20,
produzirá efeitos até 31 de dezembro de 2020, o que evidencia o
caráter temporário das medidas constantes na MP 927/20.
O segundo é o prazo de vigência da própria MP 927/20.
Necessário recordar que a sua subsistência está condicionada à
sua conversão em lei pelo Poder Legislativo, que deverá deliberar
sobre o texto no prazo de 60 dias prorrogáveis por igual período
(uma única vez). Se aprovada pelo Congresso Nacional, a medida
retorna à presidência para sanção e passa vigorar como lei
federal. Se rejeitada, vetada pela presidência ou não aprovada no
prazo de 120 dias, deixará de produzir efeitos.
Nota: enquanto este artigo era redigido, obtivemos
informações provenientes das redes sociais do Presidente Jair
Bolsonaro, informando possíveis alterações nos dispositivos
da MP 927/20. Assim, chamamos a atenção do leitor para
possíveis mudanças no texto legal após a publicação do
presente artigo.
Em apertada análise do conteúdo da MP 927/20, verifica-se de
pronto grande esforço do Governo Federal na adoção de medidas
visando a preservação dos contratos de trabalho. À toda
evidência, o objetivo parece ser evitar demissões em massa, o
que fatalmente contribuiria para uma crise maior na economia
nacional, na sociedade brasileira e culminaria no abarrotamento
dos Tribunais Trabalhistas, afinal (arriscamos a afirmar diante
do contexto apresentado) a grande massa dos trabalhadores
seria dispensada sem o pagamento dos haveres rescisórios.
As alternativas propostas pelo Governo (capítulos II, III, IV, V,
VI e VIII da MP 927/20) para dar destino à força de trabalho dos
empregados, devem ser analisadas de acordo com o tipo de
operação de cada empresa, observada a necessidade de mão-de-
obra ativa enquanto perdurar o período da crise. Um
microempreendedor que não tenha ferramentas para viabilizar o
regime de teletrabalho ou para direcionar seus empregados para
qualificação, por exemplo, poderá se valer de outras
possibilidades conferidas pela MP para dar providência a esses

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