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Tese Lucas de Souza Lehfeld

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LUCAS DE SOUZA LEHFELD 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
CONTROLES DAS AGÊNCIAS REGULADORAS 
 
A participação-cidadã como limite à sua autonomia 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
DOUTORADO EM DIREITO DO ESTADO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO 
SÃO PAULO – 2006 
 1
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO 
 
PROGRAMA DE ESTUDOS PÓS-GRADUADOS EM DIREITO 
NÍVEL DOUTORADO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
CONTROLES DAS AGÊNCIAS REGULADORAS 
 
A participação-cidadã como limite à sua autonomia 
 
 
 
 
 
 
 
 
LUCAS DE SOUZA LEHFELD 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SÃO PAULO 
2006 
 2
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO 
 
PROGRAMA DE ESTUDOS PÓS-GRADUADOS EM DIREITO 
NÍVEL DOUTORADO 
 
 
 
 
 
 
 
CONTROLES DAS AGÊNCIAS REGULADORAS 
 
A participação-cidadã como limite à sua autonomia 
 
 
 
 
 
 
 
LUCAS DE SOUZA LEHFELD 
 
 
 
 
Tese apresentada à banca examinadora 
da Pontifícia Universidade Católica de 
São Paulo, como exigência parcial para 
obtenção do título de DOUTOR em 
Direito do Estado (Constitucional), sob 
a orientação da Profa. Dra. Maria 
Garcia. 
 
 
 
SÃO PAULO 
2006 
 3
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Banca Examinadora 
 
 
____________________________
____________________________
____________________________
____________________________
____________________________ 
 
 
 
 4
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Dedicatória 
 
A DEUS, por me acompanhar mais uma vez 
nessa importante etapa, sem deixar de me 
apoiar nos momentos mais difíceis. 
 
Aos meus pais, pelo amor incondicional. 
 
À Profa. Dra. Neide Aparecida de Souza 
Lehfeld, investigadora incansável, responsável 
por toda minha formação acadêmica. Espero 
retribuir a toda essa dedicação em breve. 
 
À Profa. Dra. Maria Garcia, querida professora 
que me acolheu com respeito e carinho. 
Maestrina do conhecimento, cujas aulas jamais 
serão esquecidas em virtude da beleza e 
harmonia de sua condução. 
 
À Pontifícia Universidade Católica de São 
Paulo e à CAPES, pelo apoio e prontidão aos 
meus requerimentos. 
 
À Vivian Thomé e Castro, mulher que me 
trouxe maturidade para enfrentar as 
intempéries da vida. Não dedico apenas o meu 
apoio à sua formação acadêmica e profissional, 
mas todo o meu amor (futura esposa!). 
 
A todos aqueles amigos, especialmente ao 
Padu e Zé Carlos, que me auxiliaram nesse 
processo de investigação, ajuda sem a qual não 
conseguiria concluir a busca do conhecimento. 
 
 5
RESUMO 
 
 
 
 A instituição das agências reguladoras no Brasil revela o recente perfil regulador 
do Estado e suas dificuldades quanto à execução de obras e serviços públicos, sob à 
égide de uma gestão pública voltada para a eficiência. Após o Programa Nacional de 
Desestatização, na década de 90, formalizou-se uma mudança na mentalidade 
administrativa referente à sua intervenção no domínio econômico, com a transferência 
de bens e serviços do setor público para o setor privado. Essa alteração de papéis, de um 
Estado fomentador para fiscalizador e regulador, compreendeu a flexibilização do 
monopólio estatal, com as chamadas privatizações dos principais serviços públicos. A 
descentralização administrativa consistiu numa remodelação do sistema administrativo, 
que deixa de ser concentrada e passa a ser um modelo difuso, pela formação de pólos 
administrativos. O Poder Público concentra-se na elaboração de políticas regulatórias e, 
por meio de concessões, permissões e autorizações, transfere a execução dessas 
políticas à iniciativa privada. A presença das agências reguladoras, nesse processo de 
descentralização administrativa, acompanha uma concepção moderna da Teoria da 
Separação dos Poderes, em que há, por um lado, a centralização governamental nos 
Poderes Políticos (Executivo e Legislativo), aos quais cabem as atribuições de 
estabelecer políticas e finalidades da Administração Pública por meio de standards 
normativos e, por outro, a efetiva consecução desses objetivos pela transferência das 
atividades decisórias e regulatórias às agências. No entanto, a ampla autonomia das 
agências para o exercício de suas competências, por si só, não garante a eficácia da 
regulação estatal. Na realidade, essa estabilização do processo regulatório, atualmente, 
apresenta dificuldades, pois enfrenta constante interferência do núcleo governamental 
devido especialmente ao tradicional controle hierárquico exercido na esfera do Poder 
Executivo. Por outro lado, a legitimação do modelo regulatório pressupõe outros tipos 
de controle juspolíticos e sociais. São notórias, ante ao processo de privatização, a 
prática de infrações a direitos individuais e coletivos dos usuários por parte das 
empresas privadas prestadoras de serviços públicos, como também as deficiências da 
regulação exercida pelas agências. Assim, a participação cidadã, no controle social 
desses órgãos estatais, consiste em elemento essencial para a eficácia dos instrumentos 
regulatórios adotado no País. Atribui-se importância fundamental à condição de cidadão 
do indivíduo, o qual deixa de ser mero dado estatístico das democracias formais, para se 
tornar protagonista de todo processo político, dividindo responsabilidades com a 
Administração Pública quanto ao trato da coisa pública. É nessa perspectiva que o 
presente trabalho, baseado em ampla pesquisa bibliográfica, busca estudar as agências 
reguladoras e seus controles político-institucionais e democráticos, formatados sob a 
orientação de princípios inerentes à Administração Pública no desempenho de seu perfil 
regulador contemporâneo. 
 
 
PALAVRAS E EXPRESSÕES-CHAVE: Privatização. Regulação. Agência reguladora. 
Autonomia. Controles. Serviço Público. Democracia participativa. 
 
 
 6
ABSTRACT 
 
 
 
 The institution of regulatory agencies in Brazil reveals the recent State 
regulating role and its difficulties regarding the execution of public services and 
investments, under the objective of a public administration towards efficiency. After the 
National Privatization Program, in the nineties, a change has been formalized in the 
public administration mentality about the interference in the economic dominium, with 
the transference of assets and services from the public to the private sector. This change 
in the State role, from a fomenting to a controlling and regulating agent, has included 
also the over ture of the state monopoly, with the so-called privatization of the main 
public services. The management decentralization consisted in remodeling the 
administrative system, from a concentrated to a much diffused model, by the formation 
of administrative groups. The Public Sector concentrates itself in elaborating regulatory 
policies and, by the means of concessions, permissions and authorizations, transfers to 
the private sector the execution of such policies. The presence of regulatory agencies, 
within this process of administrative decentralization, follows a modern concept of the 
Theory of Separated Powers (Executive and Legislative), those who must establish 
Public Administration policies and ends by normative standards and, the effective 
execution of these objectives, by transferring the decision and regulation function to the 
regulatory agencies. However, the wide autonomy of the regulatory agencies solely 
does not assure the state regulation efficacy. Actually, this stabilization of the regulation 
process, nowadays, shows difficulties as it deals with a constant interference of the 
governmental nucleon given specially to the traditional control made by the Executive 
Power. On the other side, the original recognition of the regulation model should 
consider other kinds of social, legal and political controls. It is known, considering to 
privatization process, several violation of individual and collective rights by private 
firms, which are responsible for the public services, as well as the deficiencies of 
regulatory agencies. Thus, the citizen participation in the social control of regulatory 
agencies should consist in an essentialelement to the efficacy of the regulation 
instruments adopted in the country. It is given a fundamental importance to a citizen 
condition as an individual, who should not be a trivial statistic data in a formal 
democracy, but to become a protagonist of the whole political process, sharing 
responsibilities with the Public Administration regarding the management of the public 
domain. In this perspective, this present work, based in a wide literature review, intends 
to study the regulatory agencies and their political, institutional and democratic controls, 
organized by the Public Administration principles, in the performance of its present 
regulation role. 
 
 
KEY-WORDS: Privatization. Regulation. Regulatory agency. Independency. Controls. 
Public service. Participative democracy. 
 
 
 
 
 
 7
RESUMEN 
 
 
 
 La institución de las agencias reguladoras en el Brasil revela el reciente perfil 
regulador del gobierno y sus dificultades cuanto a la ejecución de obras y servicios 
públicos, con el comando de una gestión pública que tiene como prioridad la eficiencia. 
Después del Programa Nacional de Desestatización, en la década de 90, se formalizó un 
cambio en la mentalidad administrativa referente a su intervención en el dominio 
económico, con la transferencia de bienes y servicios del sector público para el sector 
privado. Ese cambio de papeles, de un gobierno fomentador para fiscalizador y 
regulador, comprendió la flexibilidad de los monopolios gubernamentales, con las 
llamadas privatizaciones de los principales servicios públicos. La descentralización 
administrativa consistió en una modificación del sistema administrativo, que deja de ser 
concentrada y pasa a ser un modelo difuso, por la formación de polos administrativos. 
El poder público se concentra en la elaboración de políticas regulatórias y por medio de 
concesión, permiso y autorización, transfiere la ejecución de esas políticas a la iniciativa 
privada. La presencia de las agencias reguladoras, en ese proceso de descentralización 
administrativa, acompaña una concepción moderna de la Teoría de la Separación de los 
Poderes, en que haya, por un lado, la centralización gubernamental, en los Poderes 
Políticos (Ejecutivo y Legislativo), a los cuales caben las atribuciones de establecer 
políticas y finalidades de la Administración Pública por medio de standards normativos 
y, por otro, la efectiva consecución de esos objetivos por la transferencia de las 
actividades de decisión y reguladoras a las agencias. Sin embargo la amplia autonomía 
de las agencias para el ejercicio de sus competencias, por si solo, no garantiza la 
eficacia de la regulación gubernamental. En realidad esa estabilidad del proceso 
regulador, actualmente presenta dificultades, pues, enfrenta constante interferencia del 
núcleo gubernamental debido especialmente al tradicional control jerárquico ejercido en 
la esfera del Poder Ejecutivo. Por otro lado, la legitimidad del modelo regulador 
presupone otros tipos de control juspolíticos y sociales. Son notorias, ante el proceso de 
privatización, la práctica de infracciones a los derechos individuales y colectivos de los 
usuarios por parte de las empresas privadas prestadoras de servicios públicos, como 
también las deficiencias de la regulación ejercida por las agencias. Así, la participación 
ciudadana, en el control social de ese órgano gubernamental, consiste en elemento 
esencial para la eficacia de los instrumentos reguladores adoptados en el País. Se 
atribuya fundamentalmente a la condición de ciudadano del individuo, el cual deja de 
ser mero dato estatístico de las democracias formales, para tornarse protagonista de todo 
el proceso político, dividiendo, responsabilidad con la Administración Publica cuanto al 
trato de la cosa pública. Es en esa perspectiva que el presente trabajo, basado en amplia 
encuesta bibliográfica, busca estudiar las agencias reguladoras y sus controles político-
institucionales y democráticos, formados bajo la orientación de principios inherentes a 
la Administración Pública en el desarrollo de su perfil regulador contemporáneo. 
 
 
PALABRAS-LLAVE: Privatización. Regulación. Agencia reguladora. Autonomía. 
Controles. Servicios públicos. Democracia Participativa. 
 
 
 8
SUMÁRIO 
 
 
 
INTRODUÇÃO 12 
 
 
 
CAPÍTULO I 
O ESTADO: EVOLUÇÃO DO ESTADO. O ESTADO REGULADOR 20 
Da Antiguidade ao Estado Regulador Contemporâneo: 
 aspectos juspolíticos e econômicos 
 
1.1 Origem e formação do Estado 20 
1.1.1 Estado e sociedade 22 
1.1.2 Cidades-Estado 26 
 
1.2 O Império e sua transição para os feudos 30 
1.2.1 Feudalismo e o pretenso Estado Medieval 36 
1.2.2 Queda do Feudalismo e processo de criação dos Estados Modernos 37 
 
1.3 A formação dos Estados Modernos 41 
1.3.1 Marco histórico do surgimento dos Estados Modernos e 
sua evolução político-econômica 43 
1.3.2 O Estado Estamental (Ständenstaat) 44 
1.3.3 Estado Absoluto 45 
1.3.4 Estado Constitucional 49 
 
1.4 A ordem econômica e o Estado constitucional 63 
1.4.1 O Estado e sua dimensão liberal burguesa no século XIX 63 
1.4.2 A crise do Estado liberal e a ideologia marxista 66 
 
1.5 O Estado Regulador Contemporâneo Neoliberal 70 
1.5.1 O modelo estatal intermediário: o Welfare State 70 
1.5.2 O perfil regulador do Estado Contemporâneo Neoliberal 72 
 
 
CAPÍTULO II 
REGULAÇÃO 78 
Teorias e princípios informadores da regulação e sua importância para 
 a concepção do Estado Regulador Contemporâneo 
 
2.1 Considerações preliminares: análise do termo “regulação” 78 
 
2.2 Teorias da regulação 82 
2.2.1 Escola do Interesse Público 82 
2.2.2 Escola Econômica da Regulação 86 
2.2.2.1 Deficiência na concorrência 87 
 9
2.2.2.2 Bens coletivos 89 
2.2.2.3 Externalidades 91 
2.2.2.4 Deficiências no acesso à informação 92 
2.2.2.5 Desemprego, inflação e desequilíbrio de mercado 93 
2.2.2.6 Críticas à Escola Econômica de Regulação 94 
2.2.3 Regulação e proteção institucional da difusão do conhecimento 96 
 
2.3 Princípios informadores da Regulação 100 
2.3.1 Princípios e regras: considerações preliminares 100 
2.3.2 Princípio do acesso necessário 105 
2.3.2.1 Relacionamento entre concorrentes 105 
2.3.2.2 Universalização: amplo acesso dos consumidores 110 
2.3.3 Princípio da função social da propriedade dos meios de 
acesso ao mercado 114 
2.3.3.1 Co-propriedade dos bens de acesso 117 
2.3.3.2 Compartilhamento dos bens de acesso 118 
2.3.4 Direito antitruste e a “regra da razão” 123 
2.3.5 Condutas em espécie 128 
2.3.5.1 Negociação compulsória 129 
2.3.5.2 Comportamento predatório 130 
2.3.5.3 Colusão (teoria dos jogos) 131 
 
2.4. Regulação econômica e o Estado Contemporâneo: os órgãos reguladores 133 
 
 
 
CAPÍTULO III 
AGÊNCIAS REGULADORAS 138 
O Estado Regulador Contemporâneo e as agências reguladoras como representantes 
 desse novo perfil perante a atividade econômica: a experiência norte-americana 
 
3.1 O perfil do Estado regulador contemporâneo: considerações preliminares 138 
 
3.2 Representantes do Estado Regulador Contemporâneo: 
as agências reguladoras 148 
3.2.1 Delimitação do tema 148 
3.2.2 Origem das agências reguladoras: contribuição norte-americana 
à configuração do Estado Regulador Contemporâneo 149 
3.2.3 O instituto agency e sua relação com as agências 150 
3.2.4 As fases de implementação das agencies nos EUA 155 
 
3.3 Qualificação e classificação das agências norte-americanas 160 
3.3.1 Classificação das agencies quanto ao âmbito de atuação 161 
3.3.2 Classificação quanto à natureza das atividades 163 
3.3.3 Classificação quanto à autonomia 165 
3.3.4 Classificação quanto ao nível federativo 168 
 
3.4 Autonomia das agências norte-americanas e seuscontroles 170 
 
3.5 Competência legiferante das agências 182 
 10
3.5.1 A questão da separação dos poderes 182 
3.5.1.1 A teoria da separação dos poderes e sua 
evolução interpretativa 183 
3.5.2 Delegação legislativa 185 
3.5.2.1 Atividade normativa das agencias reguladoras 
 norte-americanas 189 
3.5.2.1.1 Classes de regulamentos 189 
3.5.2.1.2 Procedimentos normativos 193 
3.5.2.1.3 Principiologia inerente à atividade normativa 196 
 
3.6 Delegação de competências jurisdicionais 202 
 
3.7 Síntese da função reguladora nos EUA e sua repercussão na 
introdução das agências reguladoras no Brasil 207 
 
 
CAPÍTULO IV 
PERFIL REGULADOR DO ESTADO BRASILEIRO E AS 
AGÊNCIAS REGULADORAS 210 
Reforma administrativa, privatizações e as agências reguladoras no 
Direito brasileiro. 
 
4.1 Administração Pública: conceito e evolução 210 
 
4.2 A Administração em países em desenvolvimento: indicativos comuns e 
o caso brasileiro 214 
 
4.3 Reforma administrativa do Estado Brasileiro 225 
4.3.1 Reforma gerencial da Administração Pública brasileira de 1995 225 
4.3.2 Reforma constitucional: a Emenda n° 19, de 04.06.1998 230 
 
4.4 Modelos institucionais da Reforma Administrativa 236 
4.4.1 Autarquias 238 
4.4.2 Agências 239 
4.4.3 Organizações Sociais 243 
 
4.5 A intervenção do Estado brasileiro na economia 246 
4.5.1 A crise do Estado brasileiro 246 
4.5.2 Privatização e a Constituição Federal de 1988 252 
4.5.3 Modalidades de intervenção estatal no domínio econômico 259 
4.5.4 Serviço público como modalidade de atividade econômica 263 
 
4.6 As agências reguladoras no Direito brasileiro 266 
4.6.1 Natureza Jurídica 267 
4.6.2 Autonomia 270 
4.6.2.1 Autonomia orçamentário-financeira 272 
4.6.2.2 Autonomia administrativo-funcional e a estabilidade 
dos dirigentes, conselheiros ou diretores 274 
4.6.3 Competência regulatória das agências reguladoras no Direito brasileiro 282 
4.6.3.1 Poder normativo (quase-legislativo) 284 
 11
4.6.3.2 Poder jurisdicional (quase-judicial) 290 
 
4.6.4 Agências reguladoras brasileiras em espécie 293 
 
 
CAPÍTULO V 
CONTROLES DAS AGÊNCIAS REGULADORAS NO BRASIL 297 
Enfoque na participação cidadã como instrumento de controle da 
 autonomia das agências reguladoras no País. 
 
5.1 Considerações preliminares: concepção de controles juspolíticos 
da autonomia das agências reguladoras 297 
 
5.2. Democracia participativa: enfoque no exercício da cidadania como 
instrumento de controle das agências reguladoras 304 
 
5.3 Modalidades de participação cidadã e as agências reguladoras 313 
5.3.1 Direito de informação e de petição 315 
5.3.2 Audiências e consultas públicas 319 
5.3.3 Ombudsman 323 
5.3.4 Plebiscito, referendo e iniciativa de lei 328 
5.3.5 Veto popular e recall: contribuições 334 
5.3.6 Ação popular 337 
5.3.7 Outras garantias constitucionais: Mandado de Segurança e 
Habeas Data 350 
5.3.8 Devido processo legal 355 
 
5.4 Controles decorrentes da organização político-institucional do Estado 361 
5.4.1 Controle pelo Poder Executivo 361 
5.4.1.1 Contrato de gestão 363 
 
5.5 Controle pelo Poder Legislativo 367 
5.5.1 Tribunal de Contas 372 
5.5.2 Comissões Parlamentares de Inquérito 375 
 
5.6 Controle pelo Ministério Público 378 
5.6.1 Ação civil pública 379 
 
5.7 Controle pelo Poder Judiciário 381 
5.7.1 Controle jurisdicional em sede de políticas públicas 
instituídas pelas agências 382 
5.7.2 Controle jurisdicional dos atos normativos 383 
5.7.3 Controle jurisdicional sobre a intervenção regulatória 
no domínio econômico privado 387 
 
 
CONCLUSÕES 391 
 
 
BIBLIOGRAFIA 396 
 12
INTRODUÇÃO 
 
 
 
 A instituição das agências reguladoras no Brasil reflete o recente perfil regulador 
do Estado e suas dificuldades quanto à execução de obras e serviços públicos, sob a 
orientação de uma gestão pública caracterizada pela eficiência e voltada para resultados. 
Após o Programa Nacional de Desestatização, cujo marco normativo deu-se com a 
edição da Lei n° 8.031/90 (revogada pela Lei n° 9.491/97), formalizou-se uma mudança 
na mentalidade administrativa referente à sua intervenção no domínio econômico, com a 
“transferência de bens e serviços do setor público para o setor privado. Seu 
denominador comum é o de realizar de forma privada o que antes se fazia 
publicamente.”1 
Essa alteração de papéis, de um Estado fomentador para fiscalizador e regulador 
dos setores da economia, compreendeu a flexibilização do monopólio estatal, com as 
chamadas privatizações dos principais serviços públicos, como energia elétrica, 
telecomunicações e derivados do petróleo. A descentralização administrativa provocou 
uma remodelação do sistema administrativo, que deixa de ser uma unidade 
(concentrada) e passa a ser um modelo difuso, pela formação de pólos administrativos. 
Assim, o Poder Público concentra-se na elaboração de políticas regulatórias e, por meio 
de concessões, permissões e autorizações, transfere a execução dessas políticas à 
iniciativa privada. 
Ressalta-se que a desestatização no País ocorreu de forma ampla, incluindo-se 
nesse processo desde a inserção de práticas e incentivos competitivos do mercado no 
setor público da economia, pela simples transferência de ativos para a iniciativa privada, 
até mesmo a passagem ao setor privado de atividades inteiras. 
Com a transferência da execução dos serviços públicos por meio de instrumentos 
do direito administrativo, a presença do Estado na fixação de políticas regulatórias, bem 
como no respaldo do interesse público na prestação eficiente dessas atividades impõe, 
hodiernamente, grande desafio à Administração Pública, especialmente quanto à 
instituição das agências reguladoras como modelo de intervenção estatal no domínio 
econômico. 
 
1 PIRIE, Madsen. Privatización. Inglaterra: Wildwood House, 1998, p. 305. 
 13
 “O Direito brasileiro incorporou, principalmente do Direito norte-americano, a 
idéia de descentralização administrativa na prestação dos serviços públicos e 
conseqüentemente gerenciamento e fiscalização pelas Agências Reguladoras.”2 
É evidente que essa descentralização se materializa por lei, a qual compete 
determinar os parâmetros de atuação dessas agências reguladoras, como autonomia e 
funções normativas e decisórias, diretamente relacionadas à promoção do 
desenvolvimento econômico e social do setor regulado; à defesa e manutenção dos 
interesses dos usuários; à eficiência e modernização dos serviços prestados pelas 
empresas concessionárias, permissionárias ou autorizadas. 
 A presença das agências no processo de descentralização administrativa, na 
realidade, acompanha uma concepção moderna da Teoria da Separação dos Poderes, 
preconizada por MONTESQUIEU, qual seja, há, por um lado, a centralização 
governamental nos Poderes Políticos (Executivo e Legislativo), aos quais cabem as 
atribuições de estabelecer políticas, metas e finalidades da Administração Pública por 
meio de conceitos genéricos (standards normativos) e, por outro, a efetiva consecução 
desses objetivos, por meio da transferência das atividades decisórias e regulatórias, às 
agências. 
 Não obstante a origem desses órgãos autônomos ser inglesa, o direito 
administrativo norte-americano é que se caracterizou como o “direito das agências”, em 
virtude da instituição nos setores da economia daquele País de diversas agências para 
fiscalização e regulação dos serviços prestados pela iniciativa privada. Com a 
Administrative Procedure Act de 1946 (APA), houve padronização nos procedimentos 
realizados por esses órgãos, a fim de proporcionar a eficiência da prestação dos serviços 
e a defesa do interesse público,as quais, em razão da grande quantidade de agências e 
de várias modalidades (reguladoras, não-reguladoras, executivas, independentes), 
mostravam-se comprometidas pelos constantes desencontros dos procedimentos 
decisórios.3 
 No Brasil, esses órgãos reguladores foram instituídos por lei, com natureza 
jurídica de autarquias de regime especial, vinculadas ao Ministério competente para 
tratar da respectiva atividade. A expressão “regime especial”, por determinação legal, 
compreende a perspectiva de atribuir a esses órgãos maior autonomia no exercício de 
 
2 MORAES, Alexandre de. Agências reguladoras. São Paulo: Atlas, 2003, p. 20. 
3 JUSTEN FILHO, Marçal. O direito das agências reguladoras independentes. São Paulo: Dialética, 
2002, p. 61-63. 
 14
suas competências normativa (quase-legislativa) e decisória (quase-judicial), bem como 
garantir a estabilidade de seus quadros em virtude dos mandatos fixos estabelecidos 
para seus diretores.4 
 Essa ampla autonomia compreende dimensões funcionais e estruturais das 
agências, como: decisória, normativa, administrativa e financeira. A primeira trata da 
resistência às pressões de grupos de interesse no setor submetido à fiscalização e 
regulação da agência. O órgão regulador, portanto, possui competência para solucionar 
conflitos entre os agentes econômicos regulados, com o objetivo de garantir a 
manutenção dos marcos regulatórios pré-estabelecidos pelo modelo regulatório adotado 
pelo Estado. 
 A competência normativa também é resultado da autonomia ampliada dessas 
autarquias, em razão de sua qualificação especial, as quais competem estabelecer 
normas de comportamento para o mercado sob regulação econômica, nos termos da 
política instituída pela legislação pertinente. Essa função quase-legislativa fundamenta-
se na necessidade de uma gestão pública dinâmica dos setores recém-privatizados, com 
a aproximação da Administração Pública ao perfil das empresas privadas e às 
particularidades da área econômica. 
 Por outro lado, essa aproximação, atualmente, vem provocando o que se conhece 
pela expressão “captura do regulador pelo regulado”. Esse fenômeno tem por base a 
capture theory (“teoria da captura”), que destaca a figura do regulado como agente 
capaz de influenciar nas decisões do regulador, não obstante o fundamento de sua 
atuação se consubstanciar no interesse público. Essa situação revela certa fragilidade do 
modelo quanto ao cumprimento dos instrumentos coercitivos por parte dos regulados, o 
que prejudica a finalidade da Administração Pública de buscar qualidade e modicidade 
na prestação dos serviços públicos.5 
 A autonomia administrativa, em virtude da personalidade jurídica própria, 
possibilita à agência reguladora contratar e administrar em seu próprio nome, contrair 
obrigações e adquirir direitos, mas em consonância com o ordenamento jurídico 
vigente. Embora seja característica comum a todas as entidades da Administração 
Pública indireta, nos termos do art. 26 do Decreto-Lei n° 200/67, “os doutrinadores têm 
 
4 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na Administração Pública: concessão, permissão, 
franquia, terceirização, parceria público-privada e outras formas. 5 ed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 197-
209. 
5 Cf. POSNER, R. Theories of economic regulation. The Bell Journal of Economics and Management 
Science, n. 5, 1974. 
 15
apontado certas características e prerrogativas que aparentemente reforçam sua 
autonomia administrativa e mesmo a ampliam em relação às autarquias comuns.”6 
 A autonomia financeira, por sua vez, versa sobre a disponibilidade de recursos 
humanos e infra-estrutura material da agência, além da previsão de dotações previstas 
no orçamento da União, créditos especiais, transferências e repasses que lhe forem 
atribuídos. A lei que cria o órgão regulador também pode estabelecer outras fontes de 
receitas, como recursos provenientes de taxas de fiscalização cobradas sobre as 
concessionárias e permissionárias, bem como de convênios, contratos, doações, venda 
ou locação de bens móveis e imóveis etc. 
 No que diz respeito à nomeação dos dirigentes, a legislação específica das 
agências reguladoras estabelece mandatos fixos, o que impossibilita a demissão ad 
nutum pelo Chefe do Poder Executivo7. Fica a cargo deste, a nomeação dos dirigentes, 
após a aprovação do Senado. Procedimento este, que no ano de 2000, padronizou-se em 
razão da edição da Lei nº 9.986, de 18 de julho, a qual, em seu art. 5°, exige que o 
Presidente ou Diretor-geral ou Diretor-Presidente e demais membros da diretoria 
deverão ser brasileiros, de vasto conhecimento sobre a área de atuação e reputação 
ilibada, escolhidos pelo Presidente da República e por ele nomeados, após a aprovação 
do Senado Federal. 
 A fixação do mandato e a impossibilidade de demissão ad nutum proporcionam 
às agências reguladoras certa independência das ingerências políticas e interesses 
partidários, especialmente quando da mudança de governo. Contudo, o fato de o 
Presidente da República e o Senado possuírem a atribuição de escolha e aprovação, 
respectivamente, atenua essa autonomia. 
 A referida lei inova, em seu art. 8º, no momento em que impõe aos ex-dirigentes 
a chamada “quarentena”, o que lhes veda, após a exoneração ou o término de mandato, 
o exercício de atividade ou prestação de qualquer serviço no setor regulado pela 
respectiva agência, por um período de quatro meses. 
 Nesses termos, verifica-se que a instituição das agências reguladoras, como 
entidades responsáveis pela implantação do modelo regulatório pós-privatização do 
mercado de prestação de serviços, demanda atenção especial do Estado no 
fortalecimento da credibilidade de sua atuação diante dos anseios sociais. A captação de 
 
6 ARAUJO, Edmir Netto de. A aparente autonomia das agências reguladoras. In MORAES, Alexandre de 
(Org.). Agências reguladoras. São Paulo: Atlas, 2002, p. 49-50. 
7 PACHECO, Regina. El control de las agencias reguladoras en Brasil: ¿Ulises e las sirenas o Narciso? 
Responsabilización y evaluación de la gestión pública. Caracas: CLAD, 2005, p. 236. 
 16
investimentos estrangeiros, estabilidade do mercado frente às crises econômicas, 
manutenção da competição entre global players, eficiência e qualidade dos serviços 
prestados e garantia do respeito ao cidadão como usuário são elementos que prescindem 
de transparência no trato da coisa pública por esses órgãos reguladores.8 
 Percebe-se que a ampla autonomia das agências para o exercício de suas 
competências, por si só, não garante a eficácia da regulação estatal. Na realidade, essa 
estabilização do processo regulatório, atualmente, apresenta dificuldades, pois enfrenta 
constante interferência do núcleo governamental devido ao tradicional controle 
hierárquico exercido na esfera do Poder Executivo que, por vezes, em razão de 
interesses político-partidários, tolhe indevidamente a atuação reguladora desses órgãos 
administrativos. 
 A legitimação do modelo regulatório, ademais, pressupõe outros tipos de 
controle juspolíticos e sociais. São notórias, ante ao processo de privatização realizado 
no país, a prática de infrações a direitos individuais e coletivos dos usuários por parte 
das empresas privadas prestadoras de serviços públicos, como também as deficiências 
da regulação exercida pelas agências, como: excesso de poder de mando dos seus 
diretores, ausência de transparência no processo decisório e na responsabilidade pelos 
atos praticados perante as instituições políticas constituídas (Legislativo e Judiciário) e a 
própria sociedade. 
 Tal fato traz à baila a importância de uma nova relação entre a sociedade e o 
Estado, com a ampliação da participação cidadã no processo de tomada de decisões da 
Administração Pública com relação ao desempenho de suasfunções estatais. 
Reconhece-se que são insuficientes, pois são simples disposições constitucionais e 
legais de limites à autonomia das agências, na tutela de princípios inerentes à prestação 
do serviço público, como continuidade, eficiência e modicidade tarifária, e de direitos 
fundamentais do usuário. Tornam-se imprescindíveis novos instrumentos democráticos 
de controle e fiscalização das agências reguladoras no cumprimento de seus objetivos e 
finalidades. 
 Assim, o controle social, que é complementar aos demais controles jurídicos e 
político-institucionais, consiste em modalidade de democracia renovadora do papel da 
sociedade como verdadeiro elemento político. Denominada de participativa, essa forma 
de relação Estado-sociedade atribui importância fundamental à condição de cidadão do 
 
8 BARROSO, Luís Roberto. Agências reguladoras. Constituição, transformações do Estado e legitimidade 
democrática. Revista de direito administrativo, São Paulo, Renovar, n. 229, p. 285-311, jul/set. 2002. 
 17
indivíduo, o qual deixa de ser mero dado estatístico das democracias formais, como 
simples eleitor, abandonado, para tornar-se centro e ator de todo processo político, 
como verdadeiro protagonista, dividindo responsabilidades com a Administração 
Pública quanto ao trato da coisa pública.9 
 É nessa perspectiva que o presente trabalho busca analisar as implicações do 
modelo regulatório adotado pelo País a partir da Reforma Administrativa de 1995, com 
o Programa de Desestatização e instituição das agências reguladoras que, embora 
qualificadas como autarquias de regime especial, foram concebidas nos moldes da 
experiência norte-americana referente à regulação do domínio econômico10. Para tanto, 
o enfoque da pesquisa ressalta a participação cidadã como instrumento fundamental 
para a legitimação desses órgãos da Administração Pública indireta, que atualmente 
passam por uma crise de identidade, tanto no que se refere ao seu status na estrutura 
organizacional do Estado, como na eficácia de suas normas e decisões aplicas aos 
agentes (empresas prestadoras, usuários e outras entidades governamentais) e setores 
regulados. 
 Com tudo, no intuito de conceber esses controles e a importância do cidadão na 
institucionalização dessa intervenção estatal no atual cenário econômico neoliberal 
brasileiro, é necessário o estudo da evolução do Estado Contemporâneo e seu novo 
papel de ente regulador. Nesse sentido, a estruturação do presente trabalho comporta 
cinco capítulos, com o objetivo de revelar as características do modelo regulatório atual, 
implantado no País, contextualizado nesse processo de transformação da atuação estatal 
no domínio econômico ao longo do tempo. 
 Assim, o Capítulo I – “Evolução do Estado. O Estado Regulador. Da 
Antiguidade ao Estado Regulador Contemporâneo: aspectos juspolíticos e 
econômicos” – resgata a evolução do Estado, partindo-se da Antiguidade para se chegar 
ao seu perfil contemporâneo, com o levantamento de suas principais transformações 
nesse processo histórico e formas de relacionamento com a sociedade e ordem 
 
9 MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Globalização, regionalização, reforma do Estado e da 
Constituição. Revista de direito administrativo, Rio de Janeiro, Renovar, n. 211, p. 2, jan/mar. 1998. 
10 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 25 ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 
369-370; JUSTEN FILHO, Marçal, op. cit., p. 286-411; DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito 
administrativo. São Paulo: Atlas, 2006, p. 453-463; GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. As agências 
reguladoras. Revista de direito constitucional e internacional, São Paulo, RT, ano 12, n. 46, p. 74-106, 
jan/mar. 2004; LEHFELD, Lucas de Souza. As novas tendências na regulamentação do sistema de 
telecomunicações pela Agência Nacional de Telecomunicações – ANATEL. São Paulo: Renovar, 2003, p. 
89-94; BARROSO, Luís Roberto. Apontamentos sobre as agências reguladoras. In: MORARES, 
Alexandre de (Org.). Agências reguladoras. São Paulo: Atlas, 2002, p. 119-126. 
 18
econômica. Momento que também revela a importância da Constituição como diploma 
de organização política e jurídica do Estado, principalmente no que se refere ao respeito 
dos direitos e garantias fundamentais como verdadeiros limites ao poder estatal.11 
 No Capítulo II, intitulado “Regulação: teorias e princípios informadores da 
regulação e sua importância para a concepção do Estado Regulador Contemporâneo”, 
preocupa-se em conhecer as modalidades de intervenção estatal no domínio econômico. 
O embasamento desse estudo fundamenta-se em escolas tradicionais e contemporâneas 
sobre a teoria da regulação econômica e dos órgãos estatais envolvidos nesse processo 
de reparação das deficiências do mercado sob orientação de uma política econômica 
balizada pela concorrência e livre iniciativa instituídas no País, principalmente a partir 
da Reforma do Estado ocorrida na década de 90.12 
 No terceiro capítulo, “Agências Reguladoras. O Estado Regulador 
Contemporâneo e as agências reguladoras como representantes desse novo perfil 
perante a atividade econômica: a experiência norte-americana”, parte-se para a análise 
do modelo regulatório contemporâneo, baseado na instituição das agências reguladoras 
como verdadeiros representantes do Estado no seu exercício de fiscalização e controle 
da prestação de serviços públicos, transferida para a iniciativa privada. Para tanto, 
imprescindível foi o estudo da origem dessas entidades reguladoras, criadas na 
Inglaterra no século XIX, mas com grande desenvolvimento no direito administrativo 
norte-americano – modelo importado pelo Estado brasileiro para o desempenho de seu 
papel regulador atual. 
 Esse processo de agencificação13 da Administração Pública do País é o tema do 
Capítulo IV, denominado “Perfil regulador do Estado Brasileiro. As agências 
reguladoras no País: reforma administrativa, privatizações e agências reguladoras no 
Direito brasileiro”. O esforço científico, nesse momento, foca o Programa Nacional de 
Desestatização (PND) e a natureza jurídica, competências e atribuições das agências 
reguladoras, modalidade institucional priorizada na Reforma do Estado e promovida, 
 
11 CREVELD, Martin van. Ascensão e declínio do Estado. São Paulo: Martins Fontes, 2004. 
12 Cf. SALOMÃO FILHO, Calixto. Regulação da atividade econômica: princípios e fundamentos 
jurídicos. São Paulo: Malheiros, 2001; BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito econômico. São Paulo: 
Bastos Ed., 2003, p. 189-256. 
13 Termo utilizado por CHITI, Mario P. Principio di sussidiarietà publica amministrazione e diritto 
amministrativo. Sussidiarietà e pubbliche amministrazione. Bolonha: Maggiore, 1997, p. 110. 
 19
em 1995, pelo ex-ministro Luiz Carlos BRESSER PEREIRA, no comando, à época, do 
Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado (MARE).14 
 O último capítulo – “Controles das agências reguladoras no Brasil: enfoque na 
participação cidadã como instrumento de controle da autonomia das agências 
reguladoras no País” – propõe um complexo de instrumentos de controle da autonomia 
dessas entidades em um processo crescente de legitimação do modelo regulatório no 
País. A perspectiva é revelar formas de participação direta do cidadão na esfera pública, 
especialmente no processo administrativo e na tomada de decisões das agências, a fim 
de aproximá-las aos anseios e preocupações sociais15. A democratização na composição 
de conflitos e resolução de questões na relação público-privada é preeminente e 
imprescindível para o sucesso das agências reguladoras na preservação da natureza dos 
serviços públicos.16 
Observa-se que se trata de um tema complexo. Embora com a preocupação de se 
buscar amplo levantamento bibliográfico, o presente estudo não tem a pretensãode 
esgotar o tema. Na realidade, propõe uma análise crítica aprofundada dos mecanismos 
juspolíticos e sociais, que efetivamente estabeleçam limites às agências reguladoras 
como forma de legitimá-las perante os agentes envolvidos na regulação. Visa, portanto, 
não apenas aprimorar o conhecimento sobre instrumentos jurídicos pré-existentes, mas 
também propor, por meio da hermenêutica do ordenamento jurídico pátrio17 e do direito 
comparado, outras formas de controle, sem prejuízo à estabilidade do modelo de 
regulação proposto pelo País. Busca-se uma harmonização entre a descentralização 
administrativa, necessária numa economia globalizada, e a concentração governamental, 
vigilante no respeito aos direitos e garantias individuais e coletivos. 
 
 
14 BRESSER PEREIRA, Luiz Carlos. A reforma gerencial de 1995. Burocracia e reforma do Estado, São 
Paulo, Fundação K. Adenauer, n. 3, p. 29 et seq., 2001. Cardenos Adenauer; GARCIA, Maria. Reforma 
do Estado e a Administração Pública: a EC 19/98. O problema da reforma constitucional. Revista de 
direito constitucional e internacional, São Paulo, RT, ano 10, n. 38, p. 124, jan/mar. 2002. 
15 AMARAL, Roberto. Democracia representativa está morta; viva a democracia participativa. In: 
GRAU, Eros Roberto; GUERRA FILHO, Willis Santiago (Orgs.). Direito constitucional: estudos em 
homenagem a Paulo Bonavides. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 19-56. 
16 GRAU, Eros Roberto. Constituição e serviço público. In: GRAU, Eros Roberto; GUERRA FILHO, 
Willis Santiago (Orgs.). Direito constitucional..., p. 249-267. 
17 Por exemplo, uma análise crítico-reflexiva de determinados diplomas normativos, como a Constituição 
Federal, Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/92), Lei da Ação Civil Pública (Lei nº 
7.345/85), Lei sobre a Ordem Econômica (Lei nº 8.884/94), Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 
8.078/90) e outros pertinentes ao tema. Ademais, também serão estudadas as competências e atribuições 
de órgãos institucionais, como o Ministério Público (art. 129 da CF/88), Conselho Administrativo de 
Defesa Econômica (CADE), Tribunal de Contas da União (TCU), Organismos Internacionais cujas 
decisões influenciam na estruturação normativa dos serviços públicos (como exemplo a OMC). 
 20
CAPÍTULO I 
 
O ESTADO: EVOLUÇÃO DO ESTADO. O ESTADO REGULADOR 
 
Da Antiguidade ao Estado Regulador Contemporâneo: 
aspectos juspolíticos e econômicos. 
 
 
 
1.1 Origem e formação do Estado 
 
 
Encontrar uma forma de associação que defenda e proteja a pessoa e 
os bens de cada associado com toda a força comum, e pela qual cada 
um, unindo-se a todos, só obedece, contudo, a si mesmo, 
permanecendo assim tão livre quanto antes. Esse, o problema 
fundamental cuja solução o contrato social oferece [...] 
Imediatamente, esse ato de associação produz, em lugar da pessoa 
particular de cada contratante, um corpo moral e coletivo, composto 
de tantos membros quantos são os votos da assembléia, e que, por 
esse mesmo ato, ganha sua unidade, seu eu comum, sua vida e sua 
vontade. Essa pessoa pública, que se forma desse modo, pela união 
de todas as outras, tomava antigamente o nome de cidade e, hoje, o 
de república ou de corpo político, o qual é chamado por seus 
membros de Estado quando passivo, soberano quando ativo, e 
potência quando comparado a seus semelhantes.18 
 
O desígnio dos homens, causa final ou fim último – que amam 
naturalmente a liberdade e o domínio sobre os outros -, introduzindo 
restrições a si mesmos conforme os vemos viver nos Estados, é o 
cuidado com sua própria conservação e com uma vida mais satisfeita. 
Enfim, o desejo de sair daquela mísera condição de guerra que é a 
conseqüência necessária – conforme demonstrado – das paixões 
naturais dos homens, quando não há um poder visível capaz de 
mantê-los em respeito, forçando-os, por meio do castigo, ao 
cumprimento de seus pactos e ao respeito àquelas leis naturais [...]19 
 
 Num primeiro momento, para melhor compreender a evolução do Estado e suas 
dimensões política, econômica e social, cabe apresentar um esboço sobre sua origem e 
formação. Para tal propósito, faz-se imprescindível retratar a lição de DALLARI, que 
distingue duas correntes doutrinárias sobre a origem e formação da sociedade e do 
Estado. Uma delas, conhecida como teoria naturalista, remonta à antiguidade, por volta 
do séc. IV a. C., na obra “A Política” de ARISTÓTELES, o qual afirma ser o homem 
 
18 ROUSSEAU, J. J. O contrato social. Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1978, p. 32-33. 
19 HOBBES, Thomas. Leviatã. São Paulo: Martin Claret, 2004, p. 127. 
 21
um animal naturalmente político, ou seja, é da própria essência humana viver em 
sociedade. Trata-se de um impulso associativo natural, independentemente do elemento 
volitivo20. Outros adeptos também sedimentam a idéia de sociedade natural, como 
CÍCERO, ainda na Antiguidade, em sua obra “Da República”, Santo TOMÁS DE 
AQUINO, na Idade Média, na “Summa Theologica”, e mais recentemente, Oreste 
RANELETTI, em “Instituzioni di Diritto Pubblico”.21 
 Por outro lado, sob a perspectiva ainda do autor, há os contratualistas, que 
sustentam que a sociedade é produto único do acordo de vontades, qual seja, de um 
contrato hipotético celebrado entre os homens, orientado pela racionalidade. É evidente 
que há muitas diversidades entre os adeptos dessa corrente, mas todos negam, de forma 
uníssona, que a sociedade se origine do impulso associativo natural. Destaca-se aqui, 
em primeiro momento, PLATÃO, que em sua obra “A República” refere-se a uma 
organização social, dotada de razão, sem qualquer menção à existência de uma 
necessidade natural. Em outro momento, já no século XVI, Thomas MOORE e 
Tommaso CAMPANELLA22, que embora descrevessem uma sociedade utópica, sem a 
preocupação de relatar as mazelas e os problemas sociais, ratificaram a idéia da total 
submissão da vida social à razão e à vontade.23 
 Todavia, o contratualismo encontrou a sua sistematização doutrinária nos 
ensinamentos de HOBBES, em sua imortal obra “Leviatã”, que demonstrou a 
transposição do estado natural do homem, caracterizado pela máxima “guerra de todos 
contra todos”24, fundada na igualdade natural dos homens, para um estado social, 
sustentado pelo contrato hipotético que limita o homem e o obriga à observância de seus 
compromissos perante à sociedade, por temor ao castigo aplicado pelo Estado, 
construído artificialmente para a sua própria proteção e defesa. 
 Também de grande expressão é a visão de ROUSSEAU quanto à formação do 
Estado, como corpo moral e coletivo, garantidor do contrato social realizado entre os 
homens na transposição do estado natural para o social. 
 
 
20 Ressalta-se que os adeptos à teoria naturalista, mesmo partindo da premissa de que o homem se associa 
por ser da sua própria essência, reconhecem que há a vontade de se reunirem em grupo, em virtude de 
seus benefícios frente às necessidades de sobrevivência. Entretanto, para a teoria, o que pressupõe a 
formação da sociedade é o impulso associativo natural do homem. 
21 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado. 22 ed. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 
10. 
22 Respectivamente, nas obras “Utopia” e “A cidade do sol”. 
23 DALLARI, Dalmo de A., op. cit., p. 12. 
24 Cf. HOBBES, Thomas. Leviatã. São Paulo: Martin Claret, 2004, parte I, cap. XIII. 
 22
Quem retomou a linha de apreciação de Hobbes, explicando a 
existência e a organização da sociedade a partir de um contrato 
inicial, foi Rousseau, especialmente em seu livro mais divulgado, ‘O 
Contrato Social’, aparecido em 1762, no qual, entretanto, adotou 
posição semelhante à de Montesquieu25 no tocante à predominância 
da bondade humana no estado de natureza. O contratualismo de 
Rousseau, que exerceu influência direta e imediata sobre a Revolução 
Francesae, depois disso, sobre todos os movimentos tendentes à 
afirmação e à defesa dos direitos naturais da pessoa humana, foi, na 
verdade, o que teve maior repercussão prática. Com efeito, ainda hoje 
é claramente perceptível a presença das idéias de Rousseau na 
afirmação do povo como soberano, no reconhecimento da igualdade 
como um dos objetivos fundamentais da sociedade, bem como na 
consciência de que existem interesses coletivos distintos dos 
interesses de cada membro da coletividade.26 
 
Não obstante as teorias sobre a origem e formação do Estado, como superação 
do estado natural e egoísta do homem, na visão hobbesiana, ou como o pacto social 
fundado na ordem social e na preservação dos direitos humanos, fundamentais para 
ROUSSEAU, indubitável é a sua necessidade, como entidade soberana, para o 
agrupamento humano, independentemente das dimensões que remontam os seus 
fundamentos ou destinos. 
 
1.1.1 Estado e sociedade 
 
De início, é importante esclarecer a relação entre esses dois conceitos: Estado e 
Sociedade. Para tal propósito, HESSE traça importantes considerações: 
 
La concepción tradicional parte, a este respecto, de la distinción 
entre “Estado” y “Sociedad” situando al Estado como una unidad 
dada y a la Sociedad como una pluralidad dada el uno frente a la 
otra y sin relación alguna. Este dualismo sigue hundiendo sus raíces 
en el pensamiento liberal predemocrático de la época anterior a 
1918, siendo expresión de la relación entre un poder estatal, 
representado por el gobierno monárquico y el aparato funcionarial, 
y una “sociedad” excluida en buena parte de la determinación y 
conformación políticas, cuya vida básicamente venia autorregulada, 
 
25 Sobre o estado de natureza, declara: “O homem, no estado de natureza, teria, sobretudo, a faculdade de 
conhecer, mais do que conhecimentos já adquiridos. É óbvio, igualmente, que as suas primeiras idéias não 
seriam idéias especulativas; ele se ocuparia da conservação de seu ser, em lugar de investigar a sua 
origem. Um homem, assim, sentiria, a princípio, a sua fraqueza; sua timidez seria extrema; e si houvesse 
necessidade de uma confirmação pela experiência, teríamos o exemplo dos silvícolas: tudo os amedronta 
e afugenta. Nesse estado cada um se sente inferior; dificilmente cada um se sente igual. Não procurarão 
atacar-se e a paz entre eles seria a sua primeira lei natural.” (MONTESQUIEU. O espírito das leis. 
Coleção clássicos do direito. Belo Horizonte: Líder, 2004, p. 14). 
26 DALLARI, Dalmo de A., op. cit., p. 16. 
 23
en tanto el “Estado” sólo tenía que garantizar los presupuestos de 
un proceso sometido a sus propias leyes, interviniendo sólo en caso 
de perturbaciones. 
 
Ahora bien, los presupuestos de tal dualismo han desaparecido en el 
Estado democrático y social contemporáneo. La vida “social” ha 
dejado de ser posible sin una organización responsable, 
organizadora y planificadora. A la inversa, el “Estado” democrático 
no se constituye sino a través de la cooperación social. También la 
vida social se halla en relación más o menos estrecha con la vida 
estatal en el proceso de formación de la unidad política. La 
importancia actual del Estado para la vida económica y social, así 
como la influencia “social” sobre la actividad estatal e, incluso, la 
participación “social” en aquél excluyen una contraposición carente 
de relación alguna.27 
 
 
 Jorge MIRANDA, para elucidar essa relação, parte do seguinte questionamento: 
“O Estado é político, mas todo o político é estadual?”. Há, para o autor, três 
posicionamentos que trabalham o assunto. Para alguns, a resposta é positiva, visto que 
Estado, como fenômeno humano permanente e universal, e sociedade política se 
identificam. Para outros o Estado é apenas uma espécie, a mais importante, de sociedade 
política. Uma terceira vertente estabelece que “o problema não se põe, ou por não se 
lidar com o conceito de Estado ou por se reduzir o Estado ao nome convencionalmente 
dado a qualquer sociedade política”. 28 
 Para o referido autor, a segunda tese mostra-se mais adequada, pois em razão da 
grande variedade de sociedades políticas (também denominadas sociedades de fins 
gerais), é necessário realizar distinções e classificações. Isso porque não se justifica 
confundir “as formas primitivas de sociedades políticas com as formas desenvolvidas e 
 
27 “A concepção tradicional parte, a este respeito, da distinção entre ‘Estado’ e ‘Sociedade’ situando o 
Estado como uma unidade dada e a Sociedade como uma pluralidade dada, e um frente à outra e sem 
relação alguma. Este dualismo tem fundamento em suas raízes no pensamento liberal pré-democrático da 
época anterior a 1918, sendo expressão da relação entre um poder estatal, representado pelo governo 
monárquico e o aparato funcionalista, e uma ‘sociedade’ excluída em boa parte da determinação e 
conformação políticas, cuja vida basicamente vinha auto-regulada, entretanto o ‘Estado’ só teria que 
garantir os pressupostos de um processo submetido a suas próprias leis, intervindo somente em caso de 
perturbações. 
 Agora bem, os pressupostos de tal dualismo têm desaparecidos no Estado democrático e social 
contemporâneo. A vida ‘social’ tem deixado de ser possível sem uma organização responsável, 
organizadora e planificadora. Por outro lado, o ‘Estado’ democrático não se constitui senão através da 
cooperação social. Também a vida social se acha em relação mais ou menos estreita com a vida estatal no 
processo de formação da unidade política. A importância atual do Estado para a vida econômica e social, 
assim como a influência ‘social’ sobre a atividade estatal e, inclusive, a participação ‘social’ naquele 
exclui uma contraposição carente de relação alguma.” (HESSE, Konrad. Escritos de derecho 
constitucional. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1983, p. 13, tradução nossa). 
28 MIRANDA, Jorge. Teoria do Estado e da Constituição. Rio de Janeiro: Forenses, 2003, p. 19. 
 24
complexas que tardiamente surgem. E o Estado tem tanto de peculiar que tudo 
aconselha a separar o seu tratamento do estudo de outras figuras, embora afins”.29 
 O próprio DALLARI classifica as sociedades, quanto à sua finalidade, em 
sociedades de fins particulares e aquelas que apresentam fins gerais ou sociedades 
políticas. “Entre as sociedades políticas, a que atinge um círculo mais restrito de pessoas 
é a família, que é um fenômeno universal. Além dela existem ou existiram muitas 
espécies de sociedades políticas, localizadas no tempo e no espaço, como as tribos e os 
clãs”30. O Estado é apenas uma das espécies, evidentemente, a mais importante em 
razão de sua complexidade, amplitude e capacidade de influir e condicionar o 
comportamento dos indivíduos constituintes dessa sociedade. 
 O Estado, na posição de uma sociedade complexa de natureza política (fins 
gerais), não se prende a um objetivo determinado, mas desde a sua criação coloca-se, 
numa primeira perspectiva, como instrumento utilizado por seus constituintes para lhes 
promover a consecução de seus fins e aspirações, por meio da organização e 
coordenação das ações humanas em função da busca de um fim social – o bem comum. 
É verdade que encontrar um denominador comum entre interesses individuais e 
da sociedade (comum) não se mostra tarefa fácil. Portanto, importante compreender o 
que seria esse ideal, pois seu conceito não se encontra uniforme na literatura jurídica. 
Busca-se, com isso, auxílio na doutrina social-cristã, que apresenta caracterização 
acertada dessa instituição de valor reconhecido universalmente pela humanidade. Em 
Pacem in Terris – Encíclica, II, 58 – do Papa João XXIII, bem comum compreende 
“todas as condições de vida social que consintam e favoreçam o desenvolvimento 
integral da personalidade humana”.31 
 Perante essa perspectiva de que o Estado representa um tipo de sociedadepolítica que não pode ser confundida com outras sociedades primitivas, é importante 
salientar que o próprio nome “Estado” reflete o desenvolvimento dessa espécie, cujo 
nascimento se encontra em momento particular na história, com pilares de sustentação 
bem delineados, como povo (elemento subjetivo), território (dimensão espacial) e 
soberania (elemento juspolítico). Sob esse prisma, quanto ao vocábulo, determina DE 
PLÁCIDO E SILVA: 
 
 
29 MIRANDA, Jorge, op. cit., p. 19. 
30 DALLARI, Dalmo de A., op. cit., p. 49. 
31 Ibid., p. 24. 
 25
Derivado do latim status (estado, posição, ordem, condição), é 
vocábulo que possui sentidos próprios no Direito Público e no Direito 
Privado [...] No sentido do Direito Público, Estado, segundo conceito 
dado pelos juristas, é o agrupamento de indivíduos, estabelecidos ou 
fixados em um território determinado e submetidos à autoridade de 
um poder público soberano, que lhe dá autoridade orgânica. É a 
expressão jurídica mais perfeita da sociedade, mostrando-se também 
a organização política de uma nação, ou de um povo [...] No conceito 
que lhe empresta o Direito Privado possui a significação genérica de 
modo de ser ou de estar de uma coisa ou pessoa. Refere-se, assim, às 
próprias condições ou qualidades que lhe são atribuídas, em relação a 
fatos que os mostram como devem ser. 32 
 
 O Estado, para DEL VECCHIO, compreende a figura de um “verdadeiro e 
próprio sujeito (persona no sentido técnico dos juristas), que tem uma vontade própria 
sumamente autônoma e inconfundível com a das pessoas singulares [...] e tal vontade 
concretiza-se justamente nas regras do direito”. Trata-se do “sujeito da vontade que 
estabelece (impõe) uma organização jurídica.”33 
 CREVELD entende que o Estado é uma entidade abstrata, não idêntica aos 
governantes nem aos governados, nem mesmo ao conjunto de todos os cidadãos agindo 
em comum. Ele inclui todos e se declara acima de todos. 
 
É o mesmo que dizer que o Estado, sendo distinto tanto de seus 
membros quanto de seus regentes, é uma corporação [...], sobretudo 
no sentido de que possui uma persona jurídica própria, o que 
significa que tem seus direitos e deveres e pode realizar diversas 
atividades como se fosse uma pessoa de carne e osso. As diferenças 
entre o Estado e as outras corporações são, em primeiro lugar, o fato 
de que ele as autoriza todas, mas só é autorizado (reconhecido) por 
outros de sua espécie; em segundo lugar, o fato de que certas funções 
(conhecidas coletivamente como atributos de soberania) estão 
reservadas somente a ele; e em terceiro lugar, de que exerce essas 
funções sobre determinado território, dentro do qual sua jurisdição é 
tanto exclusiva quanto abrangente.34 
 
 ZIPPELIUS, por sua vez, considera o Estado como uma comunidade 
juridicamente constituída. Trata-se da “totalidade de indivíduos cujas condutas são 
coordenadas de maneira específica [...] como estrutura de acção juridicamente 
organizada. Desta concepção de Estado aproxima-se um dos significados originários do 
 
32 SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1984, p. 205, v. II. 
33 DEL VECCHIO, Giorgio. O Estado e suas fontes do direito. Tradução Henrique de Carvalho. Belo 
Horizonte: Ed. Líder, 2005, p. 19. 
34 CREVELD, Martin Van. Ascensão e declínio do Estado. Tradução Jussara Simões. São Paulo: Martins 
Fontes, 2004, p. 1. 
 26
vocábulo ‘status’ que designa um estado, uma determinada ‘constituição’ de 
convivência”.35 
 Para Celso Ribeiro BASTOS, não é fácil encontrar uma definição de Estado que 
“agrade a todos”. Mesmo assim, ele enfrenta muito bem o desafio ao conceituá-lo como 
a “organização política sob a qual vive o homem moderno [...] resultante de um povo 
vivendo sobre um território delimitado e governado por leis que se fundem num poder 
não sobrepujado por nenhum outro externamente e supremo internamente”.36 
 Nessa diversidade de conceitos, DALLARI, em análise de seus elementos 
constituintes, elaborou um dos conceitos de Estado mais completos na doutrina. 
Segundo o autor, o Estado é a “ordem jurídica soberana que tem por fim o bem comum 
de um povo situado em determinado território”.37 
 Sem detrimento à importância de analisar as sociedades primitivas, pré-
históricas, verdadeiras tribos, dentro do processo de formação do Estado, o presente 
estudo fixa um ponto de partida, as cidades-estado gregas e romanas, por constituírem, 
em primeira instância, estrutura básica para formação dos Estados modernos. 
 
1.1.2 Cidades-Estado 
 
 Embora não haja estudos conclusivos sobre como as cidades-estado evoluíram 
das comunidades que as precederam, presume-se que, nessas sociedades em que o 
governo se limitava apenas ao âmbito familiar, houve um processo de unificação dessas 
famílias. As cidades, com isso, passaram a constituir um empreendimento coletivo, 
governado por poucos, dotados de certa autoridade sobre as demais. 
 No período helenístico, na Antiguidade, o Estado tinha caráter municipal ou 
cantonal. Ou seja, a polis grega constituía o Estado, circunscrito aos limites da referida 
cidade38, razão pela qual a denominação cidades-Estado. Como traços essenciais, a polis 
apresentava prevalência do fator pessoal, em que o Estado se baseia na comunidade dos 
 
35 ZIPPELIUS, Reinhold. Teoria geral do Estado. Lisboa: Gulbenkian, 1997, p. 61. 
36 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de teoria do Estado e ciência política. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 1995, 
p. 10. 
37 DALLARI, Dalmo de A., op. cit., p. 118. 
38 O termo polis significa cidade e do qual provém o termo política, a arte ou ciência de governar a 
cidade. MUNFORD descreve a pólis como um assentamento permanente de casas construídas com 
material durável (pedra ou tijolo). Contém um tempo, um mercado – como a ágora grega e o fórum 
romano -, um ou mais prédios do governo, bem como habitantes em número considerável, os quais não 
mais fazem da agricultura como ocupação principal. (Cf. MUNFORD, L. A cidade na história. 4 ed. São 
Paulo: Martins Fontes, 1998, cap. I e II). 
 27
cidadãos (embora não sejam os únicos habitantes, com a presença dos metecos e os 
escravos). O aspecto territorial, por outro lado, tinha pouca importância, de pequena 
extensão, delineado às cidades-Estado. 
 Semelhante às cidades gregas, o Estado romano constituía-se pelo agrupamento 
das famílias ou das gentes – civitas, comunidade de habitantes ou res publica, coisa 
comum a todos. Em Roma, freqüente se tornou a expressão status republicae, para 
indicar o estado da coisa pública dos negócios do governo.39 
 Percebe-se que as cidades-Estado clássicas (gregas e romanas) apresentam uma 
separação entre o público e o privado, entre o governo e a propriedade - distinção até 
então desconhecida pelas sociedades primitivas (sem detrimento de outras 
oportunidades na história, como nos impérios e no sistema feudal, em que essas duas 
instituições novamente se confundem). Não existia governo político no sentido moderno 
do termo, pois àquelas pessoas que exerciam autoridade sobre as outras (cabeças de clã, 
capatazes ou chefes com poderes totais), não o faziam na qualidade de autoridades 
públicas, mas sim como pessoas que, em função de fatores como sexo, idade, religião, 
eram consideradas superiores e, dessa forma, mereciam administrar a comunidade. 
“Forte ou fraco, o governante regia – isto é, liderava, comandava, promulgava decretos, 
julgava, tributava e, se necessário punia – os que eram ‘seus’, independentemente de 
serem membros de sua linhagem ou subchefes, correligionários, serviçais, dependentes, 
inquilinos ou escravos”.40 
 Nas cidades-Estado, conseqüentemente, os cidadãos indicavam outros para 
governá-los, sendo que tais pessoas eleitas agiam não em nome próprio, mas sim em 
nome da comunidade. Por isso, eram consideradosmagistrados, que exerciam 
atividades administrativas e judiciais (por magistrados especiais, os chamados tribunos), 
já que nas cidades-Estado não ocorria a separação dos poderes como conhecida 
hodiernamente: legislativo, executivo e judiciário. 
 
 
39 Quanto às cidades-Estado romanas, MENEZES ensina: “O Estado romano começou pela cidade, a 
civitas, formada por famílias e tribos que constituíam as gentes. Ampliou-se a cidade no seu aspecto 
estatal, conservando a família, no entanto, a sua importância primitiva, desde quando o governo residia 
numa assembléia de paters-familias, ao ponto mesmo de manter-se sempre aos senadores romanos o 
tratamento usual de paters [...] A expansão de Roma, em sua tendência universalista, modificou o 
panorama primitivo, passando o poder estatal, ampliado da civitas, a ligar-se a outro órgão, o imperium, 
também denominado majestas e que, na época republicana, repousava no povo, que o exercia nos 
comícios: de cúrias, de centúrias e de tribus, conforme a feição do Estado: patrício, censitário e 
popular.” (MENEZES, Anderson de. Teoria geral do Estado. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 112-
113). 
40 CREVELD, Martin Van, op. cit., p. 32-33. 
 28
Com efeito, tanto a polis grega [...] como a república romana durante 
muito tempo conservaram traços de um sistema anterior. Em ambas, 
os cidadãos não constituíam um corpo único, mas estavam divididos 
em demos, fratrias, cúrias, centúrias e tribos que, em Roma, pelo 
menos, votavam em bloco. Contudo, não se organizavam ao redor de 
laços de família [...] Muito menos se baseavam em qualquer outra 
forma de “propriedade” de uma pessoa por outra. Pelo contrário, 
tanto na Grécia quanto em Roma, o “governo” (arkhé, imperium) era 
definido como forma de autoridade exercida por algumas pessoas 
sobre as outras, que, ao contrário dos membros da família e dos 
escravos, eram iguais a elas (hómoioi) perante a lei e não lhes 
“pertenciam” em nenhuma das condições mencionadas. Havia, 
portanto, um limite bem nítido entre as esferas privada (ídios, res 
privata) e pública (demósios, res publica). Dentro do lar (oikos, 
domus), as relações sociais baseavam-se na propriedade exercida pelo 
pater-familia sobre seus dependentes, parentes ou não [...] Fora do 
lar, havia a autoridade política, ou governo.41 
 
 A Assembléia Popular, órgão principal das cidades-Estado clássicas, presididas 
por magistrados, era local de reunião de todos os cidadãos, quais sejam, homens adultos 
que não eram escravos ou estrangeiros, que decidiam sobre assuntos variados, como a 
aprovação de leis (nómoi na Grécia, e leges em Roma), eleição de magistrados e 
resolução de assuntos militares. Em Atenas, por exemplo, ao referido órgão também era 
atribuído o direito de condenar os cidadãos considerados inimigos da ordem pública ao 
ostracismo.42 
 Os magistrados aparecem como segunda instituição de maior importância nas 
cidades-Estado. Responsáveis pela administração dos assuntos cotidianos da cidade, 
como comandar atividades militares, controlar as finanças, construir obras “publicas”, 
exercer fiscalização dos mercados, bem como exercer a justiça e manter a ordem 
interna, ocupavam o respectivo status social por meio de eleição (funções mais 
importantes) ou por sorteio.43 
 
41 Ibid., p. 33. 
42 LOEWENSTEIN, ao ressaltar a participação dos cidadãos no regime político das cidades-Estado 
gregas, esclarece: “La democracia directa de las Ciudades-Estados griegas en el siglo v es el único 
ejemplo conocido de un sistema político con plena identidad entre gobernantes y gobernados, en el cual 
el poder político está igualmente distribuido entre todos los ciudadanos activos, tomando parte en él 
todos por igual […] Todas las instituciones políticas de los griegos reflejan su profunda aversión a todo 
tipo de poder concentrado y arbitrario, y su devoción casi fanática por los principios del Estado de 
derecho de un orden (eunomía) regulado democrática y constitucionalmente, así como por la igualdad y 
la justicia igualitaria (isonomia). Las diferentes funciones estatales fueron ampliamente distribuidas 
entre diversos detentadores de cargos, órganos o magistrados; el poder de los últimos fue restringido por 
ingeniosas instituciones de control.” (LOEWENSTEIN, Karl. Teoría de la Constitución. Barcelona: 
Ediciones Ariel, 1965, p. 150). 
43 Para se candidatar à magistratura, o cidadão postulante devia preencher determinados requisitos, como 
idade mínima ou alistamento para o serviço militar e participação em número determinado de campanhas 
militares, fato responsável pela origem militar de vários governos das cidades-estado. Quanto ao 
 29
 Precisamente em Roma, devido ao seu vigoroso governo, havia os chamados 
tribunos, que eram magistrados especiais eleitos para proporcionar aos cidadãos 
mecanismos de participação direta no governo, bem como evitar eventuais excessos no 
exercício do poder pelos governantes. 
 A Câmara44 também é outra instituição que aparece nas cidades-Estado. 
Compunha o governo, cujos membros eram indicados por sorteios, com mandatos de 
um ano. Em Roma, manteve-se, em parte, o caráter aristocrático, já que os senadores 
eram indicados ex officio dentre àqueles ex-magistrados que já tinham cumprido seu 
mandato. Desde que não desqualificados pelos censores, os magistrados responsáveis 
pela investigação das propriedades e conduta dos cidadãos, no caso os senadores, 
mantinham o cargo pelo resto da vida.45 
 Com relação ao sistema jurídico, era descentralizado, com tribunais 
independentes, formados por cidadãos sem qualquer formação específica, os quais se 
reuniam diariamente para decidir caso a caso, nos diversos locais em que se 
encontravam. Não existiam tribunais de apelação e as decisões, uma vez tomadas, eram 
consideradas definitivas.46 
 Na área econômico-financeira, as cidades-Estado, para realizar suas despesas, 
recorriam-se à tributação do mercado, bem como aos frutos do poder judiciário, como 
multas e bens confiscados. Os templos religiosos também eram instituições importantes 
no sistema econômico das cidades, já que em razão de sua relativa segurança, neles 
 
mandato, sua duração não ultrapassava, na maioria dos casos, de um ano. Só em Esparta, os chamados 
reis tinham mandato vitalício, embora fossem submetidos a um forte controle dos éforos, responsáveis 
pela limitação do exercício do poder com a finalidade de evitar arbitrariedades. (MITCHELL, H. Sparta. 
Cambridge: Cambridge University Press, 1964, p. 101 et seq.). 
44 Como principais funções da Câmara, têm-se a apresentação de projetos de lei à Assembléia para 
aprovação, supervisão das atividades exercidas pelos magistrados, “ouvidoria” (recebimento de 
reclamações), fiscalização de contas e gastos públicos, substituição da Assembléia no recebimento dos 
enviados de governos estrangeiros, bem como estava autorizada a suspender direitos civis em caso de 
estado de emergência ou desordem. 
45 CREVELD, Martin Van, op. cit., p. 39. Quanto à importância do Senado, continua o referido autor: 
“Não obstante, nem em Roma durante seu apogeu, no século II a. C., a autoridade (auctoritas) do senado 
jamais foi formalizada. Ao contrário do moderno parlamento, o senado não aprovava leis; o máximo que 
podia fazer era deliberar e encaminhar consulta (estritamente falando, conselhos) aos magistrados. 
Contudo, não podia dar-lhes ordens nem responsabilizá-los, muito menos passar por cima da assembléia 
dos cidadãos, que sempre conservava a soberania – caso seja esse fosse o termo apropriado – nas próprias 
mãos.” (Ibid., loc. cit.). 
46 Nessa estrutura, formava-se uma espécie de tribunal do júri, com cidadãos previamente escolhidos 
geralmente pela Assembléia. Com poder decisório nasmãos desses cidadãos, percebe-se que as cidades-
estado, especialmente Atenas, foram as primeiras a estabelecer uma certa divisão dos poderes – executivo 
e judiciário. Ou seja, retirava-se das mãos de uma só pessoa (governante) a função judiciária, a qual era 
atribuída ao referido órgão colegiado. (MENEZES, Anderson de, op. cit., p. 114). 
 30
eram geralmente depositados bens pelos cidadãos. Tornaram-se verdadeiros bancos, 
custodiavam esses bens e também emprestavam dinheiro a juros.47 
 No que se refere à seara militar, não havia também um exército permanente. 
Novamente, CREVELD ressalta: 
 
Tanto na Grécia quanto em Roma, sempre que terminava uma guerra 
os soldados – inclusive os comandantes e os oficiais – simplesmente 
se dispersavam e voltavam para a casa. Sempre que eclodia uma nova 
guerra, os magistrados responsáveis se dirigiam ao local designado – 
como em Roma, o Campus Martius ou Campo de Marte -, 
consultavam a lista de cidadãos e realizavam a convocação. 
Admitiam primeiro os voluntários e, só depois disso, voltavam-se 
para os outros cidadãos que ainda não tinham servido o número de 
campanhas estipulado por lei [...] Os cidadãos-soldados, que 
naturalmente não usavam uniformes, deviam apresentar-se com suas 
próprias armas [...] Já que a guerra era considerada assunto do povo, 
não recebiam pagamento pelos serviços; no máximo, distribuíam-se 
quantias para a subsistência.48 
 
1.2 O Império e sua transição para os feudos 
 
 Diferentemente das cidades-Estado, pequenas por essência, os impérios, ao 
contrário, mesmo os mais antigos, eram conhecidos pela sua grande extensão e 
centralização de poder. Como exemplo, pode-se citar os antigos impérios egípcio e 
chinês49, como também o inca, que se estendia por mais de 5 mil quilômetros, 
 
47 Aquelas cidades que tinham em seus territórios riquezas naturais, como minas, arrendavam a operação 
das mesmas a indivíduos, destinando a receita a algum fim público, ou simplesmente repartindo-a 
igualmente entre os seus cidadãos. Outras cidades, em virtude de um desenvolvimento mais avançado, 
contavam com outros instrumentos de aquisição de renda, como taxas portuárias e de alfândega e 
pagamentos feitos por estrangeiros para residir ou fazer comércio na cidade. Em tempo de guerra, 
emergencialmente poderia haver a imposição aos cidadãos de imposto especial sobre as propriedades ou 
na forma de capitação. 
 Contudo, a fonte principal de renda das cidades-estado, tanto gregas como romanas, eram as 
contribuições feitas pelos cidadãos ricos, as chamadas liturgias. Essa renda era destinada para fins 
diversos, mas especificamente de interesse público, como recursos para a construção de obras públicas ou 
de outras atividades, como esportes, entretenimento, lazer. 
 As liturgias não constituíam em doações, mas sim em um dever cívico. Por isso, eram atribuídas 
pelos magistrados responsáveis aos cidadãos que detinham em seu poder bens, em conformidade com 
lista própria de registro dessas contribuições no passado. Para não pagar a referida contribuição, o cidadão 
deveria indicar outra pessoa que possuísse mais bens, mas que tivesse doado menos. Poucos deixavam de 
contribuir, pois o pagamento era bem visto pela sociedade (respeito às necessidades da comunidade), 
trazendo popularidade, influência em assuntos cotidianos, status, bem como eventual benefício perante o 
tribunal (solidariedade dos jurados) àqueles que participavam desse processo. (Cf. CREVELD, Martin 
Van, op. cit., p. 44-48). 
48 Ibid., p. 43. 
49 MIRANDA traz à baila os traços mais marcantes do chamado Estado do Médio Oriente: a) teocracia, 
ou seja, o poder político reconduzido ao poder religioso; b) forma monárquica (combinada com a 
teocracia, já que o monarca á adorado como um deus); c) ordem desigualitária, hierárquica e hierática da 
 31
preenchidos com um número, igualmente expressivo, de habitantes, cerca de 8 
milhões.50 
 A expansão romana, por sua vez, deu-se a partir de uma cidade-Estado. Na 
última década do século II a.C., o império romano já tinha uma população de milhares, 
embora mantivesse ainda seu sistema republicano de governo, o qual tornou-se 
impraticável no momento em que foram emancipados a cidadão os aliados italianos 
quando da guerra social de 90-89 a.C.51-52 
 Com a crescente participação nas diversas assembléias, em razão de sua 
expansão, bem como o aumento daqueles considerados cidadãos, com poder de voto na 
estrutura social romana, tornou-se um campo fértil para a manipulação pelos 
demagogos, que ao presidirem em tais reuniões, apelavam para o pão e circo, com o 
propósito de se obter apoio a posições favoráveis a um ou outro interesse particular. 
Não demorou a haver conflitos entre os próprios demagogos, até que um deles 
mobilizou a força armada e tomou o poder. Surge a partir desse momento a figura do 
imperador. 
 O comando do imperador, caracterizado pela sua dimensão militar (organização 
das forças armadas obedientes a essa figura), também se reveste de um apelo à 
divindade. Na realidade, a maioria dos imperadores afirmava dever o cargo a alguma 
ligação com um ente superior. Roma, por oportuno, pela sua grandeza secular, 
apresentou em seu quadro de imperadores, César como pontifex maximus e, 
posteriormente, Augusto, que permitia a construção de templos em sua homenagem, 
tanto em Roma, como nas províncias romanas. Um processo que alcançou seu apogeu 
em 218 d. C., foi o momento em que Varius Avitius Bassianus, ao assumir o império 
romano, identificou-se com o deus sírio chamado Elgabalo. “Dessa época até o império 
 
sociedade; d) reduzidas garantias jurídicas dos indivíduos; e) larga extensão territorial e aspiração a 
constituir um império universal. Lugar à parte, Israel se baliza na crença monoteísta, na recusa da 
natureza divina dos reis e no princípio da submissão da vontade destes à lei ditada por Deus. 
(MIRANDA, Jorge, op. cit., p. 25). 
50 Ibid., p. 52. 
51 BRUNT, P. Italian manpower. Oxford: Clarendon, 1971, p. 44-90. 
52 Com o crescimento de Roma e sua conseqüente expansão ao mundo então conhecido, modifica-se o 
conceito de Estado que se amplia para o de imperium, convertendo-se a res populi em res imperantis. No 
período medieval, encontram-se diversas expressões para designar as unidades políticas. Ao lado de 
imperium, aparece o termo regnum, delas procedendo a império e reino. Também se volta a falar em 
cidade e, agora, no termo terra, para indicar, respectivamente, cidades livres e domínios territoriais. 
(MENEZES, Anderson de, op. cit., p. 42). 
 32
tornar-se cristão, no reinado de Constantino, cada imperador era um deus ex officio e 
exigia adoração como tal, tanto nas províncias quanto na própria Roma”.53-54 
 Percebe-se, portanto, que há confusão entre governo e religião, a qual é utilizada 
como meio de submissão ao poder do imperador. Apresenta-se nesse cenário um 
governo absolutista, em que as funções legislativa, executiva e judiciária encontravam-
se nas mãos do imperador, qualquer que fosse a sua relação com os deuses. Não se 
vislumbra qualquer tipo de limitação constitucional ou separação de poder, mas sim o 
princeps legibus solutus est, ou seja, o imperador está acima da lei.55 
 Sem deixar de considerar essa relação íntima com a religião, os impérios se 
centram também nas forças armadas e na burocracia. Com a pretensão de serem 
governantes universais, os imperadores tinham ao seu lado, com fidelidade, o exército, 
que era enorme e constituído por profissionais que exerciam o serviço militar durante 
longos períodos, comandados por oficiais e pagos com dinheiro do tesouro imperial. 
 As dificuldades financeiras, em razão do baixo desenvolvimento econômico e 
social, consistiam em impedimento à formação de grandes contingentes militares,

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