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1 INTRODUÇÃO À BIOFÍSICA 1.1 Conceito de Biofísica Biofísica (Física Biológica) é o estudo do caráter físico dos fenômenos biológicos (vitais), estudados em todos os níveis, começando pelas moléculas e as células, e terminando pela biosfera em seu conjunto. As investigações biológicas começam com o mapeamento físico do problema relacionado com a natureza viva. Isso significa que tal questão formula-se a partir das leis gerais da Física e da estrutura atômica e molecular da matéria. Nesta investigação a Biofísica utiliza metodologia, conhecimentos e tecnologias da Física, Química e Matemática, guiada por uma filosofia, uma disposição final, com o objetivo de descobrir, aprofundar e dominar os fenômenos biológicos. 1.2 Métodos de Estudo da Biofísica A Biofísica utiliza para investigação os mesmos métodos da Física, isto é, a observação, a experimentação, a indução e a dedução. A sequência de uma metodologia caracteriza um estudo científico. Cada um dos métodos exige do pesquisador correta atitude que se expressa através da honestidade, imparcialidade, precisa tecnologia e extremada atenção ao trabalho. 1.3 SOLUÇÕES 1.3.1 Introdução Todos os seres vivos, do ponto de vista biofísico, constituem-se de uma porção (ou porções) de solução, cujo volume é determinado por meio de membranas biológicas. Sob este ponto de vista, uma ameba ou um animal pluricelular podem ser considerados como uma solução ou um conjunto de soluções, embora altamente complexas e heterogêneas. A composição química de uma célula depende do tipo de célula, da região que se está examinando e varia continuamente com o tempo. Diz-se que a vida começou nos oceanos primitivos, portanto, em uma solução aquosa. Todos os animais, aquáticos ou não, procuram conservar-se com uma composição dentro de determinados limites, característicos da sua espécie. Qualquer variação, se não corrigida, pode levar a alterações fisiológicas que terminam resultando na morte do animal. Na espécie humana, por exemplo, a concentração extracelular de K+ deve permanecer nos limites de 4,5 a 5,5 mEq/l. Alterações para cima ou para baixo desses limites podem levar à morte por parada cardíaca. Qualquer pesquisa na área biológica faz uso de reagentes na forma de solução. A maior parte dos medicamentos empregados na área biomédica é apresentada sob a forma de solução: antibióticos, anestésicos, vitaminas, sais minerais, antitérmicos, anti-inflamatórios, analgésicos, vacinas. Na recuperação de pacientes desidratados ou para a manutenção do volume hídrico durante uma cirurgia ou no pós-operatório, faz-se uso de soluções cujo volume, composição e velocidade de administração devem ser estritamente controladas e são calculados com base no peso do paciente, no grau de desidratação e outros parâmetros clínicos. 1.3.2 Composição Qualquer solução é constituída basicamente por, no mínimo, dois componentes: o soluto e o solvente. O plasma sanguíneo, por exemplo, é uma solução constituída de grande quantidade de água, que é o solvente, na qual estão dispersos vários solutos, tais como: proteínas, sais minerais, aminoácidos, açúcares, vitaminas, hormônios e outros. Tratando-se de líquidos biológicos, teremos sempre a água como solvente e a maior parte dos solutos na forma sólida. Uma exceção importante consiste na dissolução dos gases envolvidos na respiração celular nos líquidos biológicos. 1.3.3 Concentração Caracteriza-se qualitativamente uma solução identificando-se quimicamente o seu solvente e o seu soluto, ou seus solutos, por exemplo: solução aquosa de NaCl. Quando não se especifica o solvente, subentende-se que seja a água. Rodrigues Andrade Highlight Rodrigues Andrade Highlight A caracterização quantitativa de uma solução é feita por dois parâmetros: a sua concentração ( C ) e o seu volume (V). Como existe uma relação matemática entre esses dois parâmetros e, além disso, é possível ter-se vários volumes de uma solução com a mesma concentração, a caracterização quantitativa das soluções é feita comumente apenas pela sua concentração. Por definição a concentração C de uma solução é a relação entre a quantidade de soluto (Q) e o volume da solução (V): Q Q C = ----- ==> Q = C . V ==> V = ----- V C Dessa definição, deduz-se que a quantidade de soluto (Q) presente em uma solução é sempre igual ao produto da concentração (C) pelo volume da solução (V). 1.3.4 Unidades de Concentração Da definição de concentração conclui-se que as unidades de concentração dependem das unidades de medidas ou de expressão da quantidade de soluto e do volume da solução. Por exemplo: se a quantidade de soluto for expressa em grama (g) e o volume da solução em litro (l) a concentração será em g/l. Na área biomédica as unidades de concentração mais utilizadas são as seguintes: UNIDADE DE CONCENTRAÇÃO (Físicas e Químicas) SIGNIFICADO mg/ml indica a quantidade de miligrama de soluto existente em cada um mililitro de solução Rodrigues Andrade Highlight mg % indica a quantidade de miligrama de soluto existente em cada cem mililitros de solução g/ml (g/cm 3 ) indica a quantidade de grama de soluto existente em cada um mililitro de solução g % indica a quantidade de grama de soluto existente em cada cem mililitros de solução M ou mol / l indica o número de moles de soluto existente em cada um litro de solução mM ou mmol/l indica o número de milimoles de soluto existente em cada litro de solução N ou Eq/l indica o número de equivalentes-grama de soluto (em relação a uma determinada função) existente em cada um litro de solução mEq/l indica o número de miliequivalentes-grama de soluto(em relação a uma determinada função) existente em cada um litro de solução Osm ou osmol/l indica o número de moles de partículas de soluto, ou seja, o número de osmoles existente em cada um litro de solução. mOsm ou mosmol/l indica o número de milimoles de partículas de soluto existente em cada um litro de solução Tabela 1. A conversão de uma unidade de medida em outra pode ser feita facilmente através de fatores de conversão ou de proporcionalidade. Por exemplo: a conversão de g/l para mol/l é feita utilizando-se a massa molecular como fator de conversão. Para transformar concentrações de mol/l para osmol/l, utiliza-se o fator de Van`t Hoff (i). As conversões de g para mg ou l para ml não necessitam comentários. 1.3.5 Regras de Diluição A concentração de uma solução pode ser modificada por meio de três processos. 1 - Acrescentando-se ou retirando-se solvente (±V) 2 - Acrescentando-se ou retirando-se soluto (±Q) 3- Acrescentando-se ou retirando-se soluto (±Q) e solvente (±V) na forma de solução a uma concentração diferente. Lembre-se... Use unidades coerentes nessas equações. Não queira Multiplicar C em moles/l por V em ml ou obter Cf em moles/l expressando Ci em g / l. Se a concentração final (Cf) for menor que a inicial (Ci), dizemos que a solução foi diluída; ao contrário, que foi concentrada. Em qualquer caso, porém, o Princípio da Diluição estabelece que a quantidade final de soluto (Qf) será obrigatoriamente igual à quantidade inicial (Qi) somada à quantidade acrescentada (+Qa) ou retirada (-Qa). Qf = Qi ± Qa sendo: Qf = Cf . Vf Qi = Ci . Vi e Vf = Vi ± Va Qa = Ca . Va Como em qualquer solução, a quantidade de soluto é sempre igual ao produto da concentração pelo volume, podemos substituir na equação anterior e obter uma nova equação com a qual podemos calcular a concentração da solução modificada (Cf). Cf . Vf = Ci .Vi ± Ca . Va Qf = Qi ± Qa Quando ocorrer alterações apenas no volume da solução (processo 1) a quantidade final (Qf) de soluto permanecerá igual à inicial (Qi). As equações anteriores serão simplificadas, pois o último termo (Qa) é nulo: Qf = Qi e Cf . Vf = Ci . Vi sendo Vf = Vi ± Va Na área biomédica, muitas substâncias são prescritas e administradas com base no peso corporal do paciente e divididas em mais de uma tomada por dia. As doses diárias ou fracionadas (de 12/12 h, de 8/8 h, etc.) podem ser facilmente obtidas por simples regras de proporcionalidade, sabendo-se o peso corporal do paciente. Se, por exemplo, um medicamento apresentado na forma de suspensão a 100mg/ml, deve ser administrado na dose de 40mg/kg . dia (40 mg por kg de peso por dia) dividido em quatro tomadas, como deveria ser a prescrição desse medicamento para um indivíduo de 50 kg de peso corporal ? 1 kg..........40 mg 50 kg......... x mg x (dose diária) = 2000 mg 2000 mg..........1 dia (24 h) Y mg..........1/4 dia (6 h) Y (dose fracionada) = 500 mg 100 mg..........1 ml 500 mg..........z ml z (volume da suspensão) = 5 ml 1.4 Composição e propriedades físico-químicas dos compartimentos dos organismos superiores 1.4.1 Introdução Os animais unicelulares ou de pequeníssimo porte captam diretamente do ambiente o oxigênio e as substâncias nutritivas necessárias à sua sobrevivência e lançam, também diretamente no meio ambiente, os produtos resultantes do seu metabolismo. São portanto, bastante suscetíveis a variações do meio e, se não dispõem de meios de locomoção ativa ou passiva, morrem após um certo tempo porque consomem todos os nutrientes disponíveis. Os animais multicelulares, como o homem, por exemplo, não podem, evidentemente, depender da captação DIRETA de oxigênio e nutrientes, e nem da eliminação DIRETA de catabólitos no meio ambiente. Se assim fosse, apenas as células superficiais sobreviveriam e, além disso, o animal teria que viver num meio aquoso (mergulhado em uma “salmoura”). Para solucionar esse problema, a “natureza” desenvolveu, nos animais superiores, sistemas especializados em Prescrição: Tomar 5 ml da suspensão (que contém 500 mg do medicamento) de 6 em 6 h (quatro vezes por dia). determinadas funções. Cada sistema é constituído por órgãos, que por sua vez são constituídos por tecidos e estes por células. Assim: - separando o animal do ambiente externo e desempenhando um papel de proteção, temos o sistema tegumentar. Essa proteção inclui a defesa contra agentes biológicos nocivos ou contra a perda de água, eletrólitos ou calor pelo organismo. - para a captação do oxigênio e eliminação do gás carbônico, temos o sistema respiratório. - para a digestão dos alimentos, absorção dos nutrientes e da água e eliminação dos resíduos, temos o sistema digestório. - para a distribuição do oxigênio e dos nutrientes a todas as células do organismo e para a coleta do gás carbônico e dos catabólitos por elas produzidos, temos o sistema circulatório ou cardiovascular. - para a depuração do sangue, eliminação de substâncias tóxicas não voláteis como a uréia, controle e manutenção do volume hídrico, do pH e da osmolaridade do organismo, temos o sistema urinário. - para a locomoção em busca de alimento ou para a defesa do animal, temos o sistema “ósteo-muscular”. - para a determinação das características sexuais e para a perpetuação da espécie, temos o sistema reprodutor. - por fim, para possibilitar o funcionamento harmônico dos sistemas anteriores, controlando o organismo como um todo, temos o sistema neuro-hormonal que, além disso, permite ao animal, especialmente ao homem, o relacionamento social e a execução de atividades intelectuais. Nos animais unicelulares basta a membrana citoplasmática para separar o meio intracelular do meio ambiente. Além dessa função de compartimentalização, a membrana celular também controla o intercâmbio entre os meios intra e extracelular. Os animais multicelulares, com o grande número e a variedade de células individuais que possuem, necessitam de sistemas especiais de controle de intercâmbio. Como são constituídos por diversos sistemas cujas células nem sempre estão em contato direto com o ambiente, têm que desenvolver para si um “meio ambiente interno” que possibilite o intercâmbio entre todas as células, através do sistema circulatório, e também o intercâmbio com o meio ambiente externo através do sistema tegumentar, respiratório e urinário. O controle qualitativo e quantitativo desse “meio ambiente interno” é de suma importância para a sobrevivência do animal. Do ponto de vista físico-químico um animal nada mais é do que uma solução aquosa, pois cerca de 65% de seu peso é água. O restante é constituído pelos diversos solutos existentes nos seres vivos como os pequenos compostos orgânicos e inorgânicos e as macromoléculas. 1.4.2 Propriedades físicas da água As propriedades físicas da água demonstram por que a natureza a elegeu espontaneamente o maior componente da matéria viva. A água constitui cerca de 60 a 70% do peso corporal dos animais superiores. Além do seu admirável poder solvente, que suplanta o dos demais líquidos, outras propriedades comprovam a necessidade vital da água. 1.4.2.1 Estrutura da água A molécula de água consiste em dois átomos de hidrogênio (H) ligados por ligação covalente a um átomo de oxigênio (O). Várias experiências comprovam que a molécula de água não é linear, isto é, os seus átomos não estão em linha reta, mas sim formando uma cadeia dobrada segundo um ângulo de 105 graus. A estrutura molecular da água está representada na figura seguinte: H / (-) O (+) 105 graus \ H Trata-se de uma molécula dessimétrica; os dois átomos de hidrogênio estão do mesmo lado em relação ao oxigênio. Essa configuração confere à molécula de água as propriedades de um dipolo pois, sendo o oxigênio mais eletronegativo, atrai com mais força os elétrons das ligações com os dois átomos de hidrogênio. Forma-se assim uma região negativa em torno do átomo de oxigênio e uma região positiva em torno dos átomos de hidrogênio. Por isso, a água é, entre todos os solventes, o mais ionizante e também aquele que, para os eletrólitos, tem o maior poder de dissociação. Ainda pela mesma razão, as moléculas de água são unidas por pontes de hidrogênio, como mostra a figura: H H H H \ / \ / O .....H -- O H H.......O / \ / H O : H H \ / O As linhas cheias representam ligações covalentes e as linhas interrompidas, ligações secundárias chamadas ligações por pontes de hidrogênio ou pontes de hidrogênio. No espaço, a estrutura é tetraédrica. A ligação por pontes de hidrogênio é a causa de algumas propriedades especiais da água. É uma ligação que pode ser classificada como ligação química, mas que excepcionalmente, é de fraca energia (~- 5 Kcal/mol). A ligação por pontes de hidrogênio ocorre em virtude da atração de um próton ou um íon hidrogênio por dois átomos fortemente eletronegativos pertencentes a duas moléculas ou grupamentos atômicos distintos. Seu interesse é grande porque: - é encontrada na água, no ponto em que une as moléculas (de modo que poderiaser qualificada como ligação física) em muitos constituintes do organismo. É encontrada Pontes de Hidrogênio também em macromoléculas como as proteínas e os ácidos nucléicos, nas quais muito contribui para a manutenção da estrutura espacial dessas moléculas. - tem fraca energia, o que permite o seu fácil rompimento. Quanto maior a temperatura de um sistema, menor a quantidade de pontes de hidrogênio existente. As pontes de hidrogênio implicam uma forte associação das moléculas, isto é, uma forte coesão. Isso explica a forte tensão superficial e o ponto de ebulição elevado para uma molécula tão leve como a água. No estado gasoso, a água se apresenta sob a forma de mono-hidrol (H-O-H), de peso molecular igual a 18g/mol. No estado líquido, porém, a polaridade da água permite a associação de moléculas entre sí, através de pontes de hidrogênio, com a formação de di-hidrol (H-O-H)2 ou tri-hidrol (H-O-H)3 em diferentes proporções dependendo da temperatura. O gelo, ou seja, a água no estado sólido parece que está unicamente na forma de tri-hidrol. 1.4.2.2 Calor específico (c = Q / m . t ) Calor específico de uma substância corresponde à quantidade de calor necessária para variar de 1 grau Celsius a temperatura de 1 g dessa substância. Quanto maior o calor específico de uma substância, maior sua capacidade de absorver, armazenar ou ceder grandes quantidades de calor sem sofrer grandes variações de temperatura. Em condições ordinárias de temperatura e pressão a água, entre todos os líquidos, é o que tem maior calor específico: 1 cal/g ºC. Significa que se deve retirar ou acrescentar 1 cal a cada 1 g de água para que haja uma variação de temperatura de 1 °C ou 100 cal para cada 100 g para variar a temperatura de 1 °C. Essa propriedade física da água é de grande importância para os seres vivos, pois permite que ela se comporte como um tampão ou amortecedor térmico, impedindo que ocorram grandes variações da temperatura celular em decorrência do calor liberado durante as reações biológicas. Nos animais superiores, a contínua movimentação da água através do sistema circulatório facilita a distribuição do calor por todas as partes do organismo e o intercâmbio com o meio ambiente. Para ilustrar, admitamos a existência hipotética de dois animais A e B, sendo o animal A composto de 200 g de água e o animal B de 200 g de uma substância cujo calor específico é igual a 0,2 cal/g °C. Suponhamos que esses animais estejam a uma temperatura de 37 °C e efetuem uma mesma reação biológica com a liberação de 100 cal. Supondo ainda que todo o calor liberado permaneça nos animais, quais serão suas temperaturas após as reações? Animal A Animal B m = 200 g m = 200 g c = 1 cal / g ºC c = 0,2 cal / g ºC Q = 100 cal Q = 100 cal ti = 37 ºC ti = 37 ºC t = ? t = ? tf = ti + t = ? tf = ti + t = ? ------------------------------------------------------------------------ c = Q / m . t donde t = Q / m . c ------------------------------------------------------------------------ 100 cal 100 cal t = ------------------------ t = ------------------------- 200 g . 1 cal / g ºC 200 g . 0,2 cal / g ºC t = 0,5 ºC t = 2,5 ºC tf = 37 ºC + 0,5 ºC = 37,5 ºC tf = 37 ºC + 2,5 ºC = 39,5 ºC ------------------------------------------------------------------------ O animal A, composto de água, sofreu apenas uma variação de temperatura de meio grau Celsius, enquanto o animal B sofreu uma variação de temperatura cinco vezes maior. Com mais 100 cal, a temperatura do animal A elevar-se-ia para 38 ºC, ao passo que a do animal B atingiria 42 ºC. 1.4.2.3 Calor latente de mudança de estado (L= Q/m) Denomina-se calor latente de uma substância a quantidade de calor necessária para mudar 1 g dessa substância de um estado físico para outro. Assim, podemos ter calor latente de fusão, solidificação, evaporação, condensação, sublimação, etc. Nas temperaturas usuais suportadas pelos seres vivos, as mudanças de estado que podem ocorrer com a água é a passagem de sólido para líquido (fusão), ou o inverso (solidificação) e a passagem de líquido para vapor (evaporação), ou o inverso (condensação). O calor latente de fusão/solidificação da água é de 80 cal/g e o de evaporação/condensação de 540 cal/g. Quer dizer, para se congelar um grama de água é necessário retirar da mesma 80 calorias, enquanto que para evaporar um grama de água é preciso ceder-lhe 540 calorias. Sendo relativamente grande, o calor latente de solidificação da água dificulta o seu congelamento; o que seria desastroso para os seres vivos. O elevado calor latente de evaporação da água é uma propriedade física de grande importância na regulação da temperatura corporal porque permite que o organismo libere grandes quantidades de calor, por meio da evaporação, sem perder grandes quantidades de água. A evaporação da água ao nível da pele e das vias respiratórias faz-se à custa do calor interno do organismo, isto é, a água, ao evaporar-se, retira calor do corpo. Esse é um importante mecanismo de regulação da temperatura corporal, mas seria extremamente prejudicial se o calor latente de evaporação da água fosse pequeno, pois, para eliminar uma determinada quantidade de calor, o organismo teria que perder uma grande quantidade de água, o que poderia levá-lo rapidamente a uma desidratação e à morte. Imaginemos novamente a existência de dois animais A e B, sendo A composto de 200 g de água e B de 200 g de uma substância líquida cujo calor latente de evaporação vale 108 cal/g. Suponhamos que esses animais necessitam perder, por evaporação, 1080 calorias. Quais as quantidades de líquidos que deveriam evaporar? Animal A Animal B Q = 1080 cal Q = 1080 cal L = 540 cal/g L = 108 cal/g m = ? m = ? m = Q = 1080cal = 2 g m = Q = 1080cal = 10 g L 540 cal/g L 108 cal/g O animal A perderia apenas 1 % da sua massa enquanto o animal B perderia 5 % para eliminar a mesma quantidade de calor. 1.4.2.4 Tensão superficial A tensão superficial da água é maior do que a de qualquer outro líquido, com exceção do mercúrio. Essa propriedade é de grande importância no estudo físico-químico dos fenômenos de superfície, como os que se observam nos colóides. ------------------------------------------------------------------------ Tensão superficial (20ºC ) ------------------------------------------------------------------------ Água 72,7 dina/cm Glicerina 65,2 dina/cm Benzeno 27,9 dina/cm Acetato de etila 23,3 dina/cm ------------------------------------------------------------------------ 1.4.2.5 Constante dielétrica A água possui uma constante dielétrica elevada em virtude da polarização existente nas suas moléculas. Essa propriedade lhe permite separar e manter partículas de carga oposta sob a forma dissociada ou mesmo ionizar substâncias moleculares: NaCl (s) + H2O ----------------> Na + aq + Cl - aq H2O + HCl -----------------> H2OH + + Cl- H2O + NH3 -----------------> HO - + NH3 + Por fim, a polaridade da água induz até reações, embora fracas, entre duas moléculas de água: H H H \ \ \ O + O OH+ + O- / / / / H H H H ------------------------------------------------------Constantes dielétricas ------------------------------------------------------ Ácido cianídrico 95 Água oxigenada 93 Formamida 84 Água 82 Ácido fórmico 62 Etanol 26 ------------------------------------------------------ A água se apresenta “livre” ou “ligada” a certas partículas coloidais, formando a chamada bainha de hidratação. É a água ”ligada” aos emulsóides do plasma, isto é, às proteínas, que vai influir na pressão osmótica do plasma, a qual se denomina pressão oncótica ou coloidosmótica. 1.4.3 Distribuição de água e solutos nos organismos superiores Dissemos anteriormente que os seres vivos nada mais são que soluções aquosas. Não se trata, porém, de uma solução única e homogênea, pois a existência de diversas membranas possibilita o fracionamento da solução total em compartimentos que apresentam composição e propriedades, às vezes, bastante diferentes. Essas diferenças de concentração e de propriedades entre dois ou mais compartimentos decorrem obviamente das propriedades das membranas que os separam como, por exemplo, permeabilidade e capacidade de transporte ativo. Esquematicamente podemos dividir um animal superior em dois grandes compartimentos ou “líquidos”: o líquido intracelular (LIC) e o líquido extracelular (LEC). O LIC seria o conjunto de todas as células do organismo e corresponde a cerca de 40 % de peso corporal. É lógico que se trata de uma abstração pois cada célula individual tem seu LIC particular. O LEC seria um “meio ambiente interno”, ou seja, o líquido através do qual se realiza o intercâmbio entre as diversas células e sistemas do organismo e entre o organismo e o meio ambiente externo. Corresponde a cerca de 20% do peso corporal e subdivide-se em dois compartimentos: o líquido intravascular (LIV) ou plasma e o líquido intersticial (LIT). Este último corresponde a 15 % do peso corporal e compreende o líquido existente entre as células e o compartimento intravascular. O LIT está separado do compartimento intravascular, ou seja, do sistema circulatório pela parede dos vasos sanguíneos, mais especificamente, pela membrana dos capilares que é onde verdadeiramente ocorre o intercâmbio entre esses dois compartimentos. O líquido intersticial (LIT) funciona como um “tampão” protetor para as células, amortecendo variações de concentração, de osmolaridade, de pH ou até mesmo de temperatura que ocorram bruscamente no compartimento intravascular (sangue). ------------------------------------------------------------------- Distribuição da água nos organismos superiores * ------------------------------------------------------------------- Volume líquido total (VT) 60% Líquido intracelular (LIC) 40% Líquido extracelular (LEC) 20% Líquido intersticial (LIT) 15% Líquido intravascular (LIV) 5% ----------------------------------------------------------------------- * Porcentagem média (v / p) em relação ao peso corporal ----------------------------------------------------------------------- A osmolaridade normal dos líquidos corporais, no homem, é de 0,3 Osm (0,3 osmol/l). Conhecendo-se o peso corporal de um animal pode-se determinar o volume (V) e a quantidade de soluto (Q) em cada compartimento. Assim, para um homem de 80 kg teríamos os seguintes valores: Observe-se que a osmolaridade dos três compartimentos é a mesma. Isso ocorre em virtude das membranas celular e capilar serem totalmente permeáveis à água. Havendo alteração da osmolaridade em um, até que um novo equilíbrio seja alcançado. O conteúdo líquido dos animais varia com a idade e com o sexo. Além disso, cada tecido possui compartimento, a água desloca-se por osmose do compartimento menos concentrado para o mais concentrado, uma concentração própria de água: ------------------------------------------------------------------------------- Músculos 75-80% Tecido nervoso 70-85% Tecido conjuntivo 60% Hemácias 60% Tecido ósseo 25% Tecido adiposo 20% ------------------------------------------------------------------------------- 1.4.4 Distribuição dos sais Nos líquidos corporais, quase todos os ácidos, bases e sais apresentam-se como partículas carregadas de eletricidade, os íons, em virtude da elevada constante dielétrica da água. Os compostos que formam íons em solução são chamados eletrólitos. Existem eletrólitos fortes, que se apresentam totalmente ou quase totalmente sob a forma dissociada ou ionizada, como o cloreto de sódio, o ácido clorídrico, ou o bicarbonato de sódio; e outros, os eletrólitos fracos, que se encontram parcialmente dissociados ou ionizados, como o ácido acético ou o ácido carbônico. Os íons carregados positivamente são os cátions, e os carregados negativamente são os ânions. Os íons de importância fisiológica são: Cátions: H+, Na+, K+, Ca++, Mg++, NH+ Ânions: OH-, HCO3 -, Cl-, H2 PO4 -, HPO4 = proteinatos (prot-) e SO4 = No organismo como um todo, o número de íons carregados positivamente deve ser equilibrado por igual número de cargas negativas. Desse modo, é necessário que os cátions e ânions existentes nos líquidos corporais, embora possuam molaridades diferentes, tenham a mesma equivalência eletroquímica. A equivalência elétrica, porém, não é necessariamente igual à equivalência osmótica. Um mol de Ca++ equivale osmoticamente a um mol de Cl-, mas os dois não se equivalem eletricamente. --------------------------------------------------------------------------------- COMPOSIÇÃO DOS LÍQUIDOS DOS COMPARTIMENTOS DOS ANIMAIS SUPERIORES * --------------------------------------------------------------------------------- Líquido Extracelular (LEC) L. Intracelular ( LIC ) -------------------------------------------------------- Plasma (P) L. Intersticial ------------------------------------------------------------------------------------------------- Na+ 142 Na+ 143 K+ 157 K+ 5 K+ 4 Na+ 14 Ca++ 5 Ca++ 5 Mg++ 26 Mg++ 3 Mg++ 3 Ca++ -- ------------------ --------------------- ------------------------------- 155 155 197 HCO3- 27 HCO3- 27 HCO3- 10 Cl- 103 Cl- 117 Cl- 4 HPO4 -- 2 HPO4 -- 2 HPO4 -- 117 SO4 -- 1 SO4 -- 1 S O4 -- -- Ác. Org. 6 Ác. Org. 6 Ác. Org. 6 Prot- 16 Prot- 2 Prot- 70 ------------------ ----------------------- ------------------------- 155 155 197 ---------------------------------------------------------------------------------------- * As concentrações são expressas em mEq / l Vê-se, pelo quadro acima, que há marcantes diferenças entre a composição do líquido intracelular (LIC) em relação ao extracelular (LEC), principalmente no que diz respeito ao Na+ e ao K+, sendo o Na+ o cátion predominante do LEC e o K+ do LIC. Com relação aos ânions, o Cl- do LEC é substituído pelo HPO4 = no LIC. Entre o plasma e o líquido intersticial, a principal diferença é a presença de uma maior concentração de macromoléculas (proteínas) no primeiro. Essas partículas desempenham importante papel na manutenção da tonicidade do compartimento intravascular e no intercâmbio de líquidos através dos capilares. As diferenças de concentração dos cátionsNa+ e k+ entre o lado interno e externo das células não são obtidas por simples difusão, mas por um processo metabólico complexo, que constitui o chamado “transporte ativo” associado a propriedades passivas da membrana celular como a permeabilidade seletiva. 1.4.5 Mecanismos de troca de substâncias entre os compartimentos corporais As forças que promovem o movimento de água e de pequenas moléculas através das membranas dos compartimentos são: difusão, filtração, osmose e transporte ativo. Rodrigues Andrade Highlight A DIFUSÃO consiste no espalhamento de uma substância devido simplesmente ao movimento aleatório de suas moléculas ou partículas constituintes. Pode ser difusão simples, quando ocorre num meio homogêneo, ou difusão através de uma membrana. Existindo a substância nos dois lados da membrana, a difusão faz-se nos dois sentidos. No cômputo geral, porém, o transporte efetivo faz-se da região de maior concentração para a de menor concentração. Denomina-se FILTRAÇÃO o processo de transferência de substâncias através de uma membrana por meio de um gradiente de pressão hidrostática. A natureza da membrana, ou seja, o diâmetro dos seus poros é quem determina quais as partículas que poderão ou não atravessá-las. A filtração constitui um importante mecanismo de troca de substâncias entre os compartimentos intravascular e intersticial através das paredes dos capilares. Normalmente, a membrana dos capilares é amplamente permeável à água e pequenas moléculas e impermeável às macromoléculas como as proteínas e os polissacarídeos. A OSMOSE consiste na transferência efetiva de solvente de uma solução menos concentrada para outra mais concentrada através de uma membrana quando esta é permeável apenas ao solvente. Dependendo do diâmetro dos poros, durante o fenômeno da osmose, além do solvente podem ser transportadas também pequenas moléculas ou partículas nele dissolvidas. Todos os processos vistos anteriormente são classificados como TRANSPORTE PASSIVO porque a transferência de substâncias faz-se à custa da energia dos gradientes já existentes no sistema. A membrana não necessita realizar nenhum trabalho para que o processo ocorra: existindo um gradiente (de concentração, elétrico, de pressão hidrostática ou osmótica) e sendo a membrana permeável, o transporte se efetua PASSIVAMENTE, ESPONTANEAMENTE. Considera-se TRANSPORTE ATIVO a transferência UNIDIRECIONAL de uma substância através de uma membrana INDEPENDETEMENTE ou até mesmo CONTRA um gradiente qualquer. Esse processo necessita de uma fonte externa de energia, pois, de outro modo, não poderia manter o transporte em uma única direção nem vencer um gradiente contrário que mesmo não existindo de início, apareceria logo que fosse iniciado o processo. Normalmente, as membranas biológicas obtêm na hidrólise do ATP a energia necessária para executar seus transportes ativos. As membranas podem ser estudadas quanto à permeabilidade a uma substância, ou seja, a um soluto, ou a uma solução. Quanto à permeabilidade a uma solução as membranas podem ser classificadas como PERMEÁVEIS, POUCO PERMEÁVEIS, ou IMPERMEÁVEIS, conforme o grau de facilidade com que se deixam atravessar pela referida substância. Quanto à permeabilidade a uma solução as membranas podem ser classificadas como PERMEÁVEIS, quando se deixam atravessar pelo soluto e pelo solvente; SEMI-PERMEÁVEIS, quando se deixam atravessar apenas pelo solvente e IMPERMEÁVEIS, quando não se deixam atravessar nem pelo solvente nem pelo soluto. É claro que uma mesma membrana pode ser permeável a uma solução e semi-permeável a outra. A última classe de membranas (impermeáveis) poderia ser associada a estruturas queratinóides nos seres vivos. 1.4.6 Osmose, Osmolaridade, Pressão Osmótica e Tonicidade Denomina-se OSMOSE a transferência efetiva de solvente através de uma membrana semi-permeável, como decorrência de um gradiente de concentração do solvente entre os dois compartimentos separados pela membrana. Na realidade, a osmose é um caso particular de difusão através de uma membrana. Consideremos o esquema a seguir constituído por dois compartimentos A e B, separados por uma membrana M, permeável apenas à água. Coloquemos no compartimento A 2 litros e no compartimento B, 1 litro de água pura. Figura 1 Rodrigues Andrade Highlight Sendo a membrana permeável, haverá um fluxo contínuo de água de A para B e de B para A, devido ao movimento aleatório das moléculas que resulta em choque das mesmas entre si e com as paredes do recipiente, e portanto, com a superfície da membrana. Como, porém, as moléculas no lado A estão submetidas a uma pressão hidrostática maior que no lado B, o fluxo de A para B será maior que de B para A. Teremos então uma transferência efetiva de água de A para B até que as duas pressões se igualem. Nesse ponto o sistema atingiu um estado de equilíbrio dinâmico em que os fluxos de A para B e de B para A continuam existindo, porém, com a mesma intensidade. É importante frisar que o processo de transporte efetivo da água de A para B se efetuou em decorrência de um gradiente de pressão hidrostática: não tem nada a ver com osmose. Estando o sistema em equilíbrio hidrostático, coloca-se no lado A 0,75 mol de glicose (G). Teremos então uma solução 0,3 M no lado A e solvente puro no lado B. Com relação às pressões hidrostáticas, o sistema continua em equilíbrio. Teremos agora, no entanto, um desequilíbrio de concentração. Como a membrana é impermeável à glicose, poder-se-á supor que nada mais aconteceria ao sistema, pois, apesar de estar submetida a um gradiente de concentração, a glicose não pode passar para o lado B e atingir assim um equilíbrio de Figura 2 concentração. Entretanto, a “solução” não é tão simples assim: o sistema está desequilibrado e, como tudo no universo, tende espontaneamente para um estado de equilíbrio. O desequilíbrio foi estudado com relação à glicose, mas, ele existe também com relação à água. A presença do soluto no lado A diminui a energia cinética média das moléculas do solvente nesse compartimento, isto é, a energia cinética média das moléculas de água no lado B (solvente puro) é maior que no lado A (solução), pois, nesta, parte da energia cinética das moléculas da água é transferida para as partículas do soluto. Disso resulta que a energia cinética média (a “pressão”) com que as moléculas de água se chocam no lado A da membrana é menor que no lado B. Além disso, as partículas do soluto no lado A também se movem aleatoriamente e se chocam com a superfície da membrana. Os choques do soluto, porém, são ineficazes e apenas tomam o lugar de um choque que poderia ser de uma molécula de água. Esses dois fatores em conjunto, ou seja, a diminuição da energia cinética média e a diminuição do número de choques do solvente no lado A fazem com que o fluxo de água de A para B seja menor que de B para A. Haverá então um fluxo efetivo do solvente do lado B (solvente puro) para o lado A (solução), o que constitui o fenômeno da OSMOSE (assim chamado porque o lado A “puxa” solvente do lado B). A passagem do solvente de B para A gera um gradiente de pressão hidrostática e vai diminuindo a concentração do soluto no lado A. Esses dois fatores promovem um aumento da energia cinética e do número de choques do solvente no lado A, o que resulta em aumento do fluxo de A para B. Por outro lado, a diminuição da pressão hidrostática no compartimento B leva a uma diminuição da “pressão” de choque das moléculas na membrana, o que resulta numa diminuição do fluxo de B para A. Assim, a passagem do solvente por osmose cria um gradiente de pressão hidrostática que dificulta a continuação do processo e facilita o fluxo em direção inversa. O sistema atingiráo equilíbrio quando os dois fluxos, de A para B e de B para A, novamente se igualarem. Observe-se que o sistema está em equilíbrio como um todo, apesar de não estar nem em equilíbrio hidrostático e nem em equilíbrio osmótico. Esse desequilíbrio hidrostático existe justamente para contrabalançar o desequilíbrio osmótico. O gradiente hidrostático tem um sentido inverso ao gradiente osmótico. A pressão com que o solvente é transferido para a solução é chamada PRESSÃO OSMÓTICA e pode ser medida indiretamente pela pressão que se deveria exercer sobre a solução para impedir a passagem do solvente. A pressão osmótica total e permanente de uma solução só é evidenciada quando a solução é separada do seu solvente puro por uma membrana estritamente SEMIPERMEÁVEL. Estudando o fenômeno da osmose, Pfeffer demonstrou experimentalmente que: 1 - Mantendo-se constante a temperatura, a pressão osmótica (PO) é diretamente proporcional à OSMOLARIDADE da solução, ou seja, à concentração de partículas de soluto. 2 - Mantendo-se constante a osmolaridade, a pressão osmótica (PO) é diretamente proporcional à TEMPERATURA ABSOLUTA da solução. Essas relações, em conjunto, são representadas pela equação abaixo, onde K é uma constante de proporcionalidade que independe do tipo, ou seja, da natureza química do soluto. PO = K . Osm . T Van’t Hoff, analisando a equação derivada dos estudos de Pfeffer, notou que a osmolaridade corresponde à relação entre o número de moles de partículas; ou seja, o número de osmoles (n) e o volume da solução (v). (Osm = n/V). Substituindo e fazendo um rearranjo, obteve a equação... PO . V = n . K . T que é idêntica à equação de Clapeyron, para o comportamento dos gases perfeitos : P . V = n . R . T Experimentalmente demonstrou-se que o valor de K na equação de Van’t Hoff é igual ao valor de R (constante dos gases perfeitos) na equação de Clapeyron, o que leva à suposição de que, idealmente, as partículas de um soluto comportam-se como as moléculas de um gás ocupando o mesmo volume da solução. Porém, do mesmo modo como os gases reais só obedecem à equação de Clapeyron quando estão submetidos a baixas pressões, as soluções reais só obedecem à equação de Van’t Hoff quando estão em baixas concentrações, isto é, quando estão muito diluídas. No cálculo da pressão osmótica de uma solução, é mais conveniente utilizar a equação de Pfeffer: PO = K . Osm .T onde K = 0,082 atm. l / osmol. K Tratando-se de soluções de eletrólitos, a osmolaridade é igual à molaridade multiplicada pelo fator de Van’t Hoff (i) da substância (Osm = M . i). No caso de soluções moleculares, ou seja, que não se ionizam nem se dissociam, o fator de Van’t Hoff é igual a 1 (um) e a osmolaridade torna-se numericamente igual a molaridade. Quando se estudam os fenômenos de osmose, é aconselhável expressar sempre a concentração em OSMOLARIDADE (Osm ou osmol/l). A osmolaridade é usada ainda para se classificar uma solução em relação à outra. Se as duas soluções têm a mesma osmolaridade, são classificadas como ISOSMOLARES. Se uma têm uma osmolaridade maior que a outra, a primeira é classificada como HIPEROSMOLAR em relação à segunda e a segunda é classificada como HIPOSMOLAR em relação à primeira. Nota-se que, para classificar duas ou mais soluções quanto à osmolaridade, não é necessário colocá-las em contato através de uma membrana. Basta saber o valor numérico de suas osmolaridade. Soluções isosmolares desenvolvem a mesma pressão osmótica quando são separadas do solvente por membranas SEMIPERMEÁVEIS. Quais seriam, por exemplo, as pressões osmóticas a 27ºC de uma solução de glicose a 36 g/l e de uma solução de cloreto de sódio a 5,85 g/l, quando as mesmas forem separadas dos seus solventes puros por membranas semipermeáveis? (Considere-se o NaCl 100% dissociado) DADOS: Embora as soluções tenham diferentes concentrações em g/l e mol/l, apresentam a mesma pressão osmótica. Isso ocorre porque as duas soluções têm a mesma osmolaridade. Esquematicamente, teríamos estados de equilíbrios exatamente iguais quando colocássemos as duas soluções em contato com solventes puros: NaCl Glicose M A B M A H2O NaCl A B H2O Glicose Lembre-se... A osmolaridade de uma solução é igual à molaridade multiplicada pelo fator de Van’t Hoff (i) da substância: Osm = M . i Figura 3 Podemos observar que cada solução aumenta de volume às custas de solvente que é retirado do outro compartimento. Poderíamos definir o POTENCIAL OSMÓTICO de uma solução como sendo a sua capacidade de ganhar ou “absorver” solvente, por osmose, quando está separado do mesmo por uma membrana SEMIPERMEÁVEL. O potencial osmótico é uma decorrência da pressão osmótica e, portanto, da osmolaridade da solução: quanto mais concentrada uma solução, maior sua pressão osmótica e maior seu potencial osmótico. Disso resulta também que soluções ISOSMOLARES têm a mesma pressão osmótica e o mesmo potencial osmótico. O que aconteceria se colocássemos um litro da solução de NaCl no lado A e um litro de glicose no lado B, utilizando um único dispositivo? Nenhum dos compartimentos aumentaria de volume às custas do outro, pois as soluções exercem a mesma pressão osmótica, ou seja, têm o mesmo potencial osmótico, só que, em sentidos inversos. Donde se conclui que, tratando-se de uma membrana semipermeável, não existindo gradiente de pressão osmótica, não ocorre transferência efetiva de solvente por osmose. E se colocássemos dois litros da solução de NaCl 0,1 Osm no lado A e apenas um litro da solução de glicose também 0,1 Osm no lado B ? INÍCIO EQUILÍBRIO M A B M Glicose NaCl A B NaCl Glicose Figura 4 Haverá uma transferência efetiva de solvente de A para B. Nesse caso, porém, o processo não pode ser denominado de osmose porque ocorreu em decorrência de um gradiente de pressão hidrostástica e não osmótica. As duas soluções tinham, inicialmente, a mesma pressão e, portanto, o mesmo potencial pois eram isosmolares. É interessante observar que no equilíbrio as pressões hidrostáticas (os níveis líquidos) não são iguais. Isso ocorre porque, à medida que o solvente se desloca de A para B devido ao gradiente hidrostático, a osmolaridade do NaCl vai aumentando, a da glicose vai diminuindo e começa a aparecer um gradiente osmótico de sentido inverso ao gradiente hidrostático. O equilíbrio é atingido quando o fluxo de A para B, devido ao gradiente hidrostático iguala-se ao fluxo de B para A devido ao gradiente osmótico. Temos o inverso do que ocorreu no esquema mostrado na página anterior, lá um gradiente de concentração (ou osmótico) gerou um gradiente hidrostático de sentido inverso. Se tivéssemos colocado volumes diferentes das soluções de modo que as mesmas não ficassem submetidas a um gradiente de pressão hidrostática, não haveria nenhum transporte efetivo de solvente. Poderíamos obter tal situação utilizando o esquema abaixo. INÍCIO EQUILÍBRIO M A B M Glicose NaCl A B NaCl Glicose Figura 5 Não se deve, portanto, atribuir à OSMOSE qualquer transporte efetivo de solvente. Analisemos agora o que ocorreria se colocássemos no lado B um litro de solução de glicose 0,4 Osm. A membrana continua sendo SEMIPERMEÁVEL a ambas as soluções. Quanto ao aspecto hidrostático, não há nenhum desequilíbrio. Logo, se houver algum transporte, este não pode ser atribuído a um gradiente de pressão hidrostática, ou seja, não pode ser por filtração. Antes de concluir como seria alcançado o equilíbrio, imaginemos o que aconteceria se colocássemos separadamente as soluções nos seus respectivos compartimentos em contatocom seus solventes puros. O NaCl exerceria uma pressão osmótica de 4,92 atm transportando solvente no sentido de B para A, enquanto a solução de glicose, por sua vez, exerceria uma pressão duas vezes maior (9,84 atm) transportando solvente no sentido A para B. Colocando agora as duas soluções em contato através da membrana, quem ganharia? As soluções não são mais ISOSMOLARES e, portanto, não têm mais o mesmo potencial osmótico. Assim, ganha o compartimento que possuir maior potencial osmótico, ou seja, maior capacidade de retirar solvente do outro compartimento. INÍCIO M A B Glicose 1 L NaCl 2 L EQUILÍBRIO M A B Glicose 1 L NaCl 2 L Figura 6 Podemos observar que a solução hiperosmolar ganha e a hiposmolar perde solvente. A explicação é simples: sabemos que quanto maior a quantidade de soluto em uma solução, mais baixa é a energia cinética média das moléculas do solvente e menor o número de choques eficazes na membrana. Sendo assim, a energia cinética média e o número de choques do solvente na solução hiposmolar é maior que na solução hiperosmolar, o que resulta num fluxo efetivo do solvente da solução hiposmolar para a solução hiperosmolar. Isso não quer dizer que o transporte efetivo do solvente por osmose foge às leis da difusão. Na verdade o solvente está se deslocando de uma solução mais concentrada para outra menos concentrada, se considerarmos a sua concentração e não a do soluto. É importante relembrar e salientar que, na análise que fizemos até agora, estabelecemos sempre a condição de que a membrana fosse SEMIPERMEÁVEL a ambas as soluções. As conclusões obtidas só podem ser aplicadas quando essas condições são respeitadas. Entretanto, se no esquema que utilizamos anteriormente a membrana fosse semipermeável à solução de NaCl, mas permeável à solução de glicose, o equilíbrio seria totalmente diferente. INÍCIO M A B Glicose NaCl EQUILÍBRIO M A B Glicose NaCl M A B Glicose NaCl M A B Glicose NaCl Figura 7 Nessas condições, apesar da solução de glicose ter um potencial osmótico maior que o da solução de NaCl, o mesmo não pode ser evidenciado porque a membrana não “segura” a glicose no seu compartimento. Desse modo, a glicose se distribui homogeneamente, ou seja, com a mesma concentração nos dois compartimentos e não exerce nenhum efeito osmótico permanente (Dependendo da membrana pode-se observar às vezes um efeito osmótico temporário que aparece antes que o equilíbrio final seja alcançado). No final, porém, tudo ocorre como se tivéssemos colocado a solução de NaCl no compartimento A e o solvente puro no compartimento B: Compare com o esquema anterior, inclusive quanto ao gradiente de pressão hidrostática que existe no equilíbrio. Lembre-se de que se trata de outra membrana. Os seres vivos não possuem nenhuma membrana que seja estritamente SEMIPERMEÁVEL a todos os líquidos biológicos. A membrana capilar, por exemplo, é semipermeável a soluções de macromoléculas, mas é totalmente permeável a soluções de pequenas moléculas ou íons (Na+, Cl-, sacarose, uréia, etc.). A membrana celular, em geral, é semipermeável a soluções de NaCl, CaCl2, sacarose, inulina, manitol, mas é permeável a soluções de uréia. Não se pode, portanto, prever o comportamento osmótico de uma solução nos seres vivos baseando-se apenas no conhecimento da sua osmolaridade, da sua Figura 8 pressão osmótica ou do seu potencial osmótico. Vimos que as conclusões obtidas quando estudamos a influência desses fatores só podem ser aplicadas quando a membrana é semipermeável a todas as soluções envolvidas. Passamos então a trabalhar com outra propriedade das soluções ou dos compartimentos que denominamos TONICIDADE. Podemos conceituar a TONICIDADE de uma solução (ou compartimento) como sendo a sua capacidade de retirar ou “absorver” solvente de outra solução qualquer, da qual está separada por uma membrana qualquer. Se as duas soluções têm a mesma capacidade, ou seja, a mesma tonicidade, os fluxos de solvente nos dois sentidos serão iguais e nenhuma das duas aumenta de volume às custas da outra. Dizemos que as soluções são ISOTÔNICAS. Se as soluções têm tonicidades diferentes, o fluxo de solvente será maior no sentido da solução de menor tonicidade para a solução de maior tonicidade. Esta última, portanto, tende a aumentar de volume e é classificada como HIPERTÔNICA, enquanto a solução que perdeu solvente é classificada como HIPOTÔNICA. Comparando os conceitos de POTENCIAL OSMÓTICO e de TONICIDADE podemos deduzir que o primeiro é um caso particular do segundo. Vimos que: Isso significa que o potencial osmótico de uma solução corresponde à sua tonicidade máxima e que soluções totalmente permeantes tem tonicidade nula. Da comparação entre as definições de potencial osmótico e tonicidade deduzimos também que soluções ISOSMOLARES (também chamadas isosmóticas) nem sempre são ISOTÔNICAS. Isso ocorre porque a Osmolaridade depende apenas da concentração do soluto; enquanto que a Tonicidade depende também da - o potencial osmótico é a capacidade de ganhar solvente quando a solução está separada do solvente puro por uma membrana semipermeável. - a tonicidade é a capacidade de ganhar solvente quando a solução está separada de outra solução qualquer, ou do solvente, por uma membrana qualquer. permeabilidade de membrana que separa as soluções. Pode inclusive acontecer que uma solução HIPEROSMOLAR seja HIPOTÔNICA em relação à outra. Examinemos as seguintes situações, utilizando o sistema de dois compartimentos A e B, separados por uma membrana M. I - Coloquemos no compartimento A uma solução 0,3 Osm de NaCl e no compartimento B uma solução 0,3 Osm de glicose, sendo a membrana semipermeável a ambas as soluções. Como as duas soluções têm a mesma osmolaridade (0,3 Osm), são ISOSMOLARES e têm, portanto, o mesmo potencial osmótico. Sendo a membrana semipermeável às duas soluções, suas tonicidades serão, no caso, iguais. Os dois compartimentos serão, portanto, ISOSMOLARES e ISOTÔNICOS e os solutos permanecerão cada qual no seu respectivo compartimento. II - Coloquemos NaCl 0,3 Osm em A e glicose 0,4 Osm em B. A membrana é a mesma do exemplo anterior. INÍCIO EQUILÍBRIO Glicose M A B NaCl Glicose M A B NaCl Figura 9 Quanto à osmolaridade, o compartimento B é HIPEROSMOLAR em relação ao compartimento A (0,4 é maior que 0,3 Osm). Sendo a membrana semipermeável às duas soluções, suas tonicidades serão máximas, porém, a tonicidade em B é maior do que em A. Logo o compartimento B ganha solvente e é HIPERTÔNICO em relação ao compartimento A, permanecendo cada soluto no seu respectivo compartimento. De modo análogo, o compartimento A é HIPOSMOLAR e HIPOTÔNICO em relação ao compartimento B. Com respeito às situações I e II podemos concluir que, tratando-se de membranas semipermeáveis, há sempre correspondência entre a OSMOLARIDADE e a TONICIDADE. III - Colocando-se NaCl 0,3 Osm em A e glicose 0,3 Osm em B, sendo a membrana agora, permeável a ambas as soluções. Figura 10 Quanto à osmolaridade as soluções são ISOSMOLARES. Como a membrana é permeável, suas tonicidades são nulas e, portanto, iguais. Assim, as soluções são ISOSMOLARES e ISOTÔNICAS, mas, no equilíbrio, teremos os dois solutos homogeneamente distribuídos nos dois compartimentos. Comparando com a situação I, seria tentador pensar que soluções isosmolares são sempre isotônicas, quer a membrana seja permeável ou semipermeável a ambas as soluções. Na verdade, isto é verdade. O que não é verdade é que a osmolaridade sempre corresponde à tonicidade, quer a membrana seja permeável ou semipermeável. Vejamos a situação seguinte.Glicose INÍCIO EQUILÍBRIO Glicose M A B NaCl M A B NaCl Figura 11 IV - Coloquemos NaCl 0,5 Osm em A e glicose 0,2 Osm em B. A membrana é a mesma da situação anterior. Quanto à osmolaridade, A é HIPEROSMOLAR em relação a B. Porém, como a membrana é permeável às duas soluções, suas tonicidades serão nulas e iguais. Logo, A é ISOTÔNICO em relação a B. De modo análogo, B é HIPOSMOLAR, mas é ISOTÔNICO em relação a A. INÍCIO M A B Glicose NaCl EQUILÍBRIO M A B Glicose NaCl Glicose INÍCIO EQUILÍBRIO Glicose M A B NaCl M A B NaCl Figura 12 Figura 13 Analisando as situações III e IV, concluímos que soluções separadas por membranas permeáveis, são sempre ISOTÔNICAS, não importa quais sejam suas OSMOLARIDADES. V - Coloquemos em A solução 0,3 Osm de NaCl e em B solução 0,3 Osm de uréia sendo a membrana impermeável ao NaCl mas permeável a uréia. Quanto à osmolaridade, A é ISOSMOLAR em relação a B. Porém, como a membrana é permeável à solução de uréia, esta não exerce nenhuma tonicidade. Logo, o compartimento A ganha solvente sendo, portanto, HIPERTÔNICO em relação a B. O compartimento B, por sua vez, é ISOSMOLAR, mas HIPOTÔNICO em relação ao compartimento A. Se tivéssemos utilizado NaCl 0,1 Osm em A e uréia 10,0 Osm em B, a solução de uréia continuaria sendo HIPOTÔNICA apesar de ser agora HIPEROSMOLAR (numa proporção de 100 para 1). Glicose/Uréia INÍCIO EQUILÍBRIO Glicose/Uréia M A B NaCl M A B NaCl/Uréia Lembre-se... Só se pode aumentar a tonicidade (ou o volume) de um compartimento isolado por uma determinada membrana acrescentando a esse compartimento soluto não difusível através Figura 14 VI - Coloquemos em A uma solução de NaCl 0,3 Osm e em B uma solução mista de glicose 0,3 Osm e uréia 0,1 Osm. A membrana é impermeável ao Nacl e à glicose, mas permeável à uréia (Ver esquema da página anterior). Quanto à osmolaridade, A é HIPOSMOLAR em relação a B. O potencial osmótico no compartimento B é maior que no compartimento A, mas a tonicidade de B é mantida apenas pelo potencial osmótico da glicose, já que a tonicidade da uréia é nula. Como o potencial osmótico, isto é, a tonicidade do NaCl é igual a da glicose, as soluções são ISOTÔNICAS. Quer dizer, o compartimento A é HIPOSMOLAR, mas é ISOTÔNICO em relação a B e este é HIPEROSMOLAR, mas é ISOTÔNICO em relação a A. Observe-se que, retirando a uréia do compartimento B, teríamos um equilíbrio idêntico ao que ocorreu na situação I. Da análise das situações V e VI, podemos tirar uma conclusão final que é válida para todas as situações: A TONICIDADE de um compartimento isolado por uma determinada membrana correspondente ao potencial osmótico das partículas NÃO DIFUSÍVEIS através dessa membrana. 1.4.7 Equilíbrio de GIBBS-DONNAN Como uma grande parte das proteínas dos organismos vivos está sob a forma de dispersão coloidal, em solução iônica e separada por membranas semipermeáveis, é necessário que se estude um tipo especial de distribuição de íons que é profundamente influenciada pela presença de partículas não difusíveis carregadas eletricamente. Consideremos o sistema a seguir constituído por dois compartimentos separados por uma membrana M. No compartimento A foi colocado um litro de solução 0,12 M de íons Na+ equilibrados por ânions proteinato (Prot-). Ao compartimento B, adicionamos o mesmo volume de solução 0,12 M de NaCl. A membrana é impermeável apenas aos ânions protéicos. Apesar de estar submetido a um gradiente de concentração, o íon proteinato (Prot-), por ser uma macromolécula, não pode atravessar os poros da membrana. Por isso não difunde de A para B. O íon Na+ atravessa livremente a membrana mas seu fluxo efetivo inicial é nulo: a quantidade que passa de A para B é igual à que passa de B para A porque sua concentração é a mesma nos dois lados da membrana. O íon cloreto (Cl-), porém, tem todas as condições para apresentar um fluxo efetivo diferente de zero, pois: 1 - Está submetido a um gradiente de concentração; 2 - A membrana lhe é permeável. O cloreto se difunde então de B para A devido a um gradiente de concentração. Como o íon cloreto se difunde inicialmente sem seu cátion correspondente (Na+), essa difusão realiza um trabalho elétrico que se manifesta sob a forma de energia potencial elétrica (Voltagem). Estabelece-se assim, um campo elétrico (negativo em A, positivo em B) que tende a dificultar a passagem de íons cloreto do lado B para o lado A e, ao mesmo tempo, promove um fluxo efetivo de íons sódio também de B para A. A M Início B Equilíbrio Prot- Na+ Cl- Na+ Na+ Prot- Na+ Cl- Prot- Na+ Cl- Na+ Na+ Prot- Na+ Cl- Prot- Na+ Cl- Na+ Na+ Prot- Na+ Cl- Prot- Na+ Cl- Na+ Na+ Prot- Na+ Cl- Prot- Na+ Cl- Na+ Na+ Prot- Na+ Cl- Prot- Na+ Cl- Na+ Na+ Prot- Na+ Cl- A (+) M B (-) Prot- : 12 Cl- : 12 Na+ : 12 Na+: 12 Prot- : 12 Cl- : 7 Na+ : 14 Na+: 10 Cl- : 5 Prot- Na+ Cl- Na+ Prot- Prot- Na+ Na+ Cl- Na+ Prot- Prot- Na+ Cl- Na+ Prot- Prot- Na+ Na+ Na+ Prot- Prot- Na+ Cl- Na+ Prot- Prot- Na+ Cl- Na+ Prot- Cl- Na+ Na+ Cl- Na+ Cl- Na+ Cl- Na+ Na+ Cl- Na+ Na+ Cl- Na+ Na+ Cl- Figura 15 É importante lembrar que o fluxo efetivo de Na+ se deve a um gradiente elétrico criado pela difusão do cloreto a qual decorreu de um gradiente de concentração. Ocorre com o sódio o inverso do que ocorreu com o cloreto: a difusão por gradiente elétrico gerou um gradiente de concentração. O processo continua até que os dois íons atinjam um equilíbrio eletroquímico, mesmo que os dois compartimentos não atinjam também um equilíbrio osmótico. Dizemos que o íon cloreto (Cl-), ao se difundir de B para A, realiza um trabalho útil porque a energia potencial de concentração (química) está se transformando em energia potencial elétrica. A energia potencial de concentração pode ser calculada por uma equação derivada da expansão isotérmica dos gases perfeitos, aplicada para cada íon: O equilíbrio de Donnan é alcançado quando o campo elétrico estabelecido através da membrana pela difusão do íon cloreto promove um aumento do íon sódio no lado B, de tal modo que a diferença de energia potencial de concentração para o Na+ anula totalmente a diferença de energia potencial de concentração para o Cl-. Então: Donde se conclue que: [Cl-] (B) R. T. ln [Cl-] (A) [Na+] (B) R. T. ln [Na+] (A) = 0 (zero) + Energia potencial de concentração para o íon cloreto. Energia potencial de concentração para o íon sódio. [Cl - ] (B) Ec = R. T. ln [Cl - ] (A) [Na + ] (B) Ec = R. T. ln [Na + ] (A)ou (Na+ )a . (Cl- ) a = (Na+ ) b . (Cl-) b Uma vez atingido o equilíbrio de Donnan, podemos afirmar que: a) A concentração do cátion difusível (Na+) é sempre maior no lado que contém o ânion não-difusível (Prot-). b) A concentração do íon Cl- continua maior no lado B, porém passa a existir cloreto também do lado A do sistema. c) Se formos calcular as tonicidades de cada solução, notaremos que o compartimento que contém o íon NÃO difusível é sempre hipertônico. d) Como consequência, o equilíbrio de Donnan gera um desequilíbrio osmótico, isto é, o equilíbrio de Donnan é eletro-químico e não osmótico. e) Para impedir que o compartimento que contém o íon NÃO difusível retire solvente do outro compartimento, poder-se-ia aplicar uma pressão mecânica ou hidrostática de sentido inverso. É o que acontece, por exemplo, ao nível dos capilares sanguíneos. 1.4.8 Esquema de STARLING - Importância da Pressão Oncótica Os capilares constituem os vasos sanguíneos de paredes mais delgadas e de calibre mais fino. O sangue chega até eles pelas artérias, as quais em ramificações sucessivas e sem transição real vão diminuindo seu calibre e simplificando sua estrutura até se converterem em capilares. Esses vasos, por sua vez, reúnem-se novamente sem transição real e dão origem às veias. Os capilares, portanto, podem ser divididos esquematicamente em uma porção arterial e uma porção venosa. [Cl-] (A) [Cl-] (B) [Na + ] (B) [Na+] (A) = = r Relação de Gibbs-Donnan Nos capilares, os nutrientes trazidos pelo sangue e destinados às células atravessam as suas paredes para se misturar com o líquido intersticial e daí passar para o interior das células. As substâncias eliminadas das células fariam um percurso inverso. A passagem de líquidos e substâncias através dos capilares é feita por processos de filtração, difusão e osmose. A filtração é a passagem de líquidos através dos poros dos capilares e depende, fundamentalmente, de duas pressões: a pressão hidrostática (Phid), devido à compressão mecânica que o coração exerce sobre o sangue; e a pressão oncótica (PO) devido à presença de macromoléculas, partículas não difusíveis, no plasma. A pressão hidrostática (Phid) é exercida no sentido de expulsar líquido do espaço intravascular para o espaço intersticial. A pressão oncótica (PO) tende a trazer líquido do espaço intersticial para o intravascular. Na porção arterial do capilar a Phid é maior que a PO e, então, o líquido sai dos capilares para o espaço intersticial por filtração. Na porção venosa do capilar a PO é maior que a Phid e, então, o líquido volta para o interior do capilar por osmose. Como a diferença de pressão na porção arterial do capilar é maior do que na porção venosa, a quantidade de líquido que sai dos capilares na porção arterial é maior do que a quantidade que entra na porção venosa. Pra retirar o restante do líquido do espaço intersticial se faz necessário a presença de um sistema de drenagem auxiliar do sistema venoso, o sistema linfático. O esquema de Starling serve para explicar o equilíbrio do volume líquido do leito vascular e pode ser associado ao equilíbrio de Gibbs-Donnan, visto anteriormente, considerando-se o LIV como meio que contém a partícula não-difusível e que a membrana endotelial capilar é carregada negativamente na superfície em contato com o LIV, o que explica as diferenças entre as concentrações de Na+ no LIV e no LIT. Figura 16 OBS: A concentração de macromoléculas é constante ao longo de todo o leito capilar. A diferença consiste na resultante entre TONICIDADE (PO) e PRESSÃO HIDROSTÁTICA (Phid). Figura 17. Representação do leito capilar retirada do site: http./www.google.c om 1.4.9 Teoria da Vasomotricidade Uma outra teoria utilizada para explicar o intercâmbio de líquidos entre o LIV e o LIT é a da vasomotricidade, que envolve também o jogo de influência entre a pressão hidrostrática (filtração) e a pressão osmótica (osmose), mas de maneira mais dinâmica, levando em conta o papel dos esfíncteres pré-capilares que, ao se relaxarem aumentam o fluxo de sangue na rede capilar, momento em que a Phid predomina sobre a PO e o líquido é transportado por filtração do LIV para o LIT. Em um momento seguinte, os esfíncteres pré-capilares se contraem, diminui o fluxo de sangue na rede capilar e, nesse momento, a PO suplanta a Phid e o líquido retorna ao LIV por osmose. A frequência de relaxamento e contração (vasomotricidade) dos esfíncteres pré-capilares pode ser influenciada diretamente pela atividade metabólica do tecido. Lembre-se... Q = C. V; C = Q; V = Q V V
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