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UMA INICIATIVA NO"CON São Cristóvão. 2010 Copyrigth by Editora Universidade Federal de Sergípe Cidade Universitária "Prof. José Aloísio de Campos" Av. Mal. Cândido Rondon, s/na - CEP.: 49.100-00 São Cristóvão/SE Este livro, ou parte dele, não pode ser reproduzido por qualquer meio sem autortzação escrita da Editora. Centro de Educação Superior a Distância Coordenação Gráfica Glselda Santos Barros Edítoração eletrônica AdUma Menezes Capa Sandra PInto Frelre Ilustração da capa: Bodleian Llbrary, Uníversíty of Ox:ford (disponível em www.unicamp.br/lel/memorla/) Ficha Catalográfica elaborada pela Biblioteca Central da Universidade Federal de Sergípe Oliveira. Luiz Eduardo 048g Gramatização e escolarização: contribuições para uma história do ensino das linguas no Bra- sil (1757-1827)/ Luíz Eduardo Oliveira. São Cris- tóvão: Editora UFS; Aracaju: Fundação Oviêdo Teíxeíra, 2010. 170p. ISBN:978-85-7822-099-0 l.Línguas - Ensino - História. 2. Gramática. 3. História da educação - Brasil. I. Título. CDU 811:37.016 (81) (091) ALGUNS AGRADECIMENTOS A única profissão que exerci na vida foi a de professor de Inglês. Iniciei minha carreira dando aulas em cursos livres de línguas e em escolas da rede particular de ensino. mesmo antes de concluir a graduação em Letras Português-Inglês da Universi- dade Federal de Sergípe, em 1990. quando passei a compor o qua- dro de professores da rede estadual de ensino. locado na Escola de 1.0 Grau Jornalista Paulo Costa. em Aracaju. Meu interesse pelo estudo do processo de ínstítucíonalíza- ção do ensino de Inglês no Brasil foi despertado a partir de mi- nhas atividades como professor de Literatura Inglesa da Univer- sidade Federal de Sergípe, desde 1994. sistematizando-se em mi- nha pesquisa de Mestrado, cuja Dissertação foidefendida em 1999. no Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Campinas. com o titulo A historiografia brasileira da literatura inglesa; uma história do ensino de inglês no Brasil (1809-1951). A opção de trabalhar com as "Línguas Vivas". isto é. com as línguas estrangeiras modernas. em minha Tese de Doutorado - cujo titu- lo é A instituição do ensino das Linguas Vivas no Brasil: o caso da Língua Inglesa (1809-1890) -. defendida em 2006 no Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação: História. Política. Socieda- de. da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. deveu-se ao fato de que a legislação. os planos e programas de ensino. bem como as outras fontes utilizadas referentes ao ensino de Inglês. são os mesmos para as demais linguas estrangeiras. e em alguns casos para as linguas antigas e a nacional. Dessa forma. sem acarretar maiores esforços. algo inevitável com a ampliação do campo de investigação. mantive o objetivo de analisar o caso par- luiz Eduardo Oliveira ticular da Língua Inglesa. servindo-me, além das fontes que tra- tavam genericamente do ensino das línguas. dos compêndios de Inglês de cada época. Assim que retomei às atividades docentes na Universidade Federal de Sergípe, decidi criar o Grupo de Pesquisa História do Ensino das Línguas no Brasil. com o intuito de congregar pesqui- sadores e estudantes das áreas de História da Educação e dos Estudos Linguísticos e Literários interessados no tema. Fundado em 2006. o grupo atualmente conta com pesquisadores e estu- dantes de diferentes instituições. departamentos e programas de pós-graduação. os quais orientam e/ou desenvolvem pesquisas de Iniciação Científica. Pós-Graduação lato sensu, Mestrado e Doutorado. e com dois projetos de pesquisa: "AEscola. o Estado e a Nação: para uma história do ensino das línguas no Brasil" (1757- 1857). financiado pelo CNPq. e "A legislação pombalina sobre o ensino de línguas: suas implicações na educação brasileira (1757- 1827)". fmanciado pela FAPITEC. Este livro. que é fruto dos estudos e pesquisas realizados no decorrer desses anos sobre a história do ensino das línguas e suas respectivas literaturas no Brasil. é também o resultado de minha formação de professor e pesquisador. motivo pelo qual agra- deço aos seus primeiros ínspíradores, mentores e leitores: José Costa Almeída, por ter me incentivado a prestar o concurso para a matéria de ensino Literatura de Língua Inglesa da Universida- de Federal de Sergípe, em 1994; Marta Lúcia Dal Farra. por ter sido a primeira Ieítora-oríentadora do meu projeto de mestrado; Carlos Daghlían, presidente de honra da ABRAPUI (Associação Brasileira dos Professores Universitários de Inglês). por ter me incentivado a participar do XXVIIISENAPULLI(Seminário Nacio- nal dos Professores Universitários de Literaturas de Língua Ingle- sa). realizado em Ouro Preto. em 1996. no início da minha carrei- ra docente na Universidade Federal de Sergípe: Martsa Lajolo, por ter se interessado pelo meu projeto de Mestrado e aceitado me orientar. me emprestando um pouco de sua enorme experiência como escritora e pesquisadora; Jorge Carvalho do Nascimento. 6 GRAMATIZAÇÃO E ESCOlARIZAÇÃO por me fazer aprofundar no campo da História da Educação; Kazumi Munakata. por me apresentar à história das disciplinas escolares: Mírían Warde, pelas primeiras orientações durante o outorado; Marta Lúcia S. Hílsdorf, pelas preciosas observações no Exame de Qualificação de Doutorado; e finalmente Odair Sass, meu orientador de Doutorado. pela compreensão. paciência. lei- tura cuidadosa dos meus textos e. sobretudo. amizade. Devo também um agradecimento aos pesquisadores e estu- dantes que se engajaram no Grupo de Pesquisa História do Ensi- no das Línguas no Brasil. desde sua fundação: Antonio Ponciano Bezerra; Claudete Daflon dos Santos; Jorge Carvalho do Nasci- mento; Lêda Corrêa; Marta Leõnia Garcia Costa Carvalho; Marta Roseneide Santana dos Santos; Vanderlei José Zacchi; Vilma Mota Quintela e Wilton James Bemardo dos Santos. Quanto aos estu- dantes. destaco as participações de Álvaro César Pereira de Sou- za. Amanda Carvalho Silva; Cristiane Tavares Fonseca de Moraes Nunes; Dyego Anderson Silva Pereira; Elaine Maria Santos; Fabiane Vasconcelos Andrade: Fábio Wesley Santos Paixão; Femanda Gurgel Raposo; Giselle Macedo Barbosa; Grazielle San- tos Silva; João Escobar José Cardoso; Jonaza Glória dos Santos; Juliana Moura Ferreíra: Kartna Andrade Santos; Marcle Vanessa Menezes Santana: Maríângela Dias Santos; Mirela Magnani Pacheco; Rogério Tenorío de Azevedo; Sara Rogéría Santos Barbo- sa; Simone Sílveíra Amorím: Thadeu Vinicius Souza Teles e Wagner Gonzaga Lemos. 7 SUMÁRIO ALGUNS AGRADECIMENTOS APRESENTAÇÃO 11 A história do ensino das línguas no Brasil 14 Organização do livro 24 Referências 25 INTRODUÇÃO .••.•••.••.••.•.•••.•....•••••.••.....•••..•.•.••.•.•..•.••••••.•.••••...•.•.•.•..•.•.•..••.••.•••••••.•.•.•.•........ 13 A GRAMÁTICA LATINA E O ENSINO DAS LíNGUAS ••••••....•.•.............•..•.•..•.....••....... 27 Gramatização e Escolarização 28 A Gramática Latina e as Línguas Nacionais 31 A constituição das línguas como disciplinas escolares 39 Referências 42 OS PROFESSORES R~GIOS DE GRAMÁTICA LATINAE RETÓRICA: NOTAS PARA O ESTUDO DAS ORIGENS DA PROFISSÃO DOCENTE NO BRASIL 45 A forma escolar e a profissão docente 46 As Reformas Pombalinas e os Professores Régios de Gramática Latina e Retórica 51 O caso brasileiro 63 Algumas considerações 69 Referências 72 DA LíNGUA DO PRíNCIPE À LíNGUA NACIONAL: UMA HISTÓRIA DO ENSINO DE PORTUGU~S NO BRASIL ......................•.....•..............•.••.....•...•......•........... 75 APRESENTAÇÃO A lei do Diret6rio 76 A Gramática da Lrngua Nacional e as escolas de Primeiras Letras 85 Algumas considerações 91 Referências 96 Maria Lucia S. Hilsdorf* AS GRAMÁTICAS INGLESAS E A INSTRUÇÃO PÚBLICA: UMA HISTÓRIA DO ENSINO DE INGL~S NO BRASIL .........•.••......•.......•..•..•.••...•••... 99 Dentre os campos de conhecimento cultivados pela universi- dade brasileira, na atualidade, o da História da Educação é, sem dúvida, um dos mais fecundos. Brasil afora, grupos de pesquisa e centros de pós-graduação têm vivificado com seiva nova esse ramo da escrita historiográfica e notabilizado, aqui e no exterior, a quan- tidade e o valor dos trabalhos que põem em circulação. O texto que o Professor Luiz Eduardo Oliveira oferece aos seus leitores, nesta oportunidade, representa uma importante contribuição da geração mais nova dos pesquisadores em Histó- ria da Educação aos atuais debates no campo. Em primeiro lugar, pela originalidade do seu objeto de estudo: o processo de ínstítu- cionalização do ensino das línguas, em particular o da Língua Inglesa, e a correlata configuração delas como disciplinas escola- res, o que o coloca no interior de uma das mais promissoras mo- dalidades de abordagem hoje desenvolvidas acerca da história da escola e da educação. Em segundo lugar, pelo ineditismo do perí- odo em que o situa, obrigando, assim, pela aprofundada pesquisa A "transmigração" da corte portuguesa 100 O Real Colégio dos Nobres e a Gramática de Teles de Menezes 103 A Academia Real Militar do Rio de Janeiro e o Professor de Inglês Eduardo Thomaz Colville li8 A Cadeira Pública de Língua Inglesa da corte 125 Os Professores Públicos de Língua Inglesa 137 O ensino da Lrngua Inglesa nos colégios e seminários 147 Algumas considerações 159 Referências 163 ILUSTRAÇÕES Grammatica da lingua portuguesa (1540), de João de Barros 38 Verdadeiro metodo de estudar (1746), de Luiz Antonio Verney 74 Arte da grammatica da lingua portugueza (1770), de Antonio José dos Reis lobato 95 Gramatica ingleza ordenada em portuguez (1762), de Carlos Bernardo da Silva Téles de Menezes 124 The English spelling-book (1851), de William Mavor 136 Arte ingleza (1827), de Guilherme Tflbury 142 Nova grammatica ingleza e portugueza (1812), de Manoel de Freitas Brazileiro 145 Compendio da grammatica ingleza e portugueza (1820), de Monoel José de Freitas 158 • Maria Lucia S. Hllsdorf é Professora Doutora do Departamento de Filosofia da Educação e Ciências da Educação da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (FEUSP). área de História da Educação; sócía- fundadora da Sociedade Brasileira de História da Educação (SBHE); do Centro de Memória da Educação da FEUSP e autora de O aparecimento da escola modema: uma história ilustrada (2006). pela Autêntica. História da educação brasileira: leituras (2007. 3." edição). pela Píoneíra-Thomson, e Pensando a educação em tempos modemos (2005. 2.· edição). pela Editora da Universidade de São Paulo (EDUSP). de fontes documentais e a erudita arquitetura analítica que o embasam, à revisão dos nossos conhecimentos sobre a escola, a cultura e a sociedade dos séculos XVIIIe XIX. Creio que este tra- balho é especialmente feliz por uma terceira razão, qual seja, a do seu recorte, por ter o seu autor, ao longo do desenvolVimento des- sa investigação tão bem fundamentada, encontrado um ãngulo de Visão seu, dentre as posições de reconhecidos teóricos das dis- ciplinas escolares como Chervel e Hamilton, dentre outros. Re- sulta que, ao término desse percurso que enfrenta as questões concernentes à gênese, finalidades e resultados do ensino das línguas no Brasil, entre 1757 e 1827, o professor Luíz Eduardo Oliveira se afirma como autor com voz própria, ao propor uma periodização dessa história atrelada, não como se diz costumeiramente, aos diferentes métodos, mas sim, às finalida- des desse ensino, as quaís, por sua vez, ele reconhece serem tan- to pedagógicas quanto políticas e culturais. E é aqui que ele nos reserva mais uma (boa) Surpresa, ao avançar a comprovação de que o ensino das línguas tem a ver com a formação da escola brasileira e do estado nacional, mas também com a formação de algumas profissões imperiais. Graças à determinação e à paciência desse perquiridor res- ponsável e rigoroso perante os escolhos teóricos, metodológicos e sobretudo operacionais que enfrentou para ultimar seu estudo _ reconhecidos por todos nós que lidamos no Brasil com esse dífícíl e fascinante mundo da História da Educação e da Escola _, temos agora, à dísposrção, um texto que se faz necessário desde já aos interessados na compreensão da escola, da cultura e da socieda- de brasileira de todos os tempos. INTRODUÇÃO Luiz Eduardo Oliveira Este livro vincula-se a dois projetos de pesquisa: "AEscola, o Estado e a Nação: para uma história do ensino das línguas no Brasil" (1757-1857). financiado pelo CNPq, e "Alegislação pomba- lina sobre o ensino de línguas: suas implicações na educação bra- sileira (1757-1827)", financiado pela FAPITEC, sendo também fruto de estudos e pesquisas realizadas pelo Grupo de Pesquisa Histó- ria do Ensino das Línguas no Brasil- GPHELB (http://www.ufs.br / grupos /gphelb/). criado em 2006, no Departamento de Letras da Universidade Federal de Sergípe, o qual congrega estudantes e pesquisadores das áreas de História da Educação e dos Estudos Línguístícos e Literários. O GPHELB tem como objetivo geral investigar o processo de institucionalização do ensino das línguas e de suas respectivas literaturas no Brasil, bem como de sua configuração como disci- plina escolar e acadêmica, no intuito de delinear suas represen- tações e fmalidades pedagógicas, políticas e culturais no sistema educacional do país. Suas atiVidades de estudo e pesquisa con- centram-se sobre três fontes fundamentais: 1) legislação brasilei- ra sobre ensino de línguas; 2) compêndios [Catecísmos, Cartilhas, Gramáticas, Manuais de Retórica e Poética, Seletas, Livros de Leitura e Histórias Literárias); 3) narrativas (auto) biográficas, memorialisticas ou flccíonaís sobre professores de línguas. As li- nhas de pesquisa do grupo são as seguintes: 1) "Aconstituição das línguas como disciplinas escolares e acadêmicas", que pretende investigar o processo de con- figuração das línguas e suas respectivas literaturas como 12 Luiz Eduardo Oliveira GRAMATIZAÇÃO E ESCOLARIZAÇÃO disciplina escolar e/ou acadêmica, buscando delinear suas finalidades pedagógicas, políticas e culturais. A história do ensino das línguas no Brasil pode ser pensa- da como uma instância de validação não somente de um conjun- to de conteúdos e métodos (re)elaborados ou facilitados para sua aprendizagem escolar no decorrer do tempo, mas também de cons- tituição dos próprios conceitos de língua e literatura, tal como se configuram nas políticas linguísticas e educacionais implemen- tadas em vários períodos históricos. Nessa perspectiva, a sua íns- titucionalização relaciona-se com o seu processo de configuração como disciplina escolar no sistema educacional do país, o que torna possível a investigação do modo como se delineiam suas finalidades políticas, pedagógicas e culturais. Contudo, o uso da legislação educacional como fonte de uma pesquisa histórica sobre o ensino de línguas só deve servir de objeto para o estudo do que o seu discurso faz propagar, interpre- tar ou suprimir sobre a matéria, e não como fonte privilegiada de "práticas escolares", o que seria ingênuo. Mesmo assim, convém não dicotomizar as práticas escolares e a legislação educacional. Primeiro, porque uma lei a respeito de qualquer tema, indepen- dentede sua aplicação, se constitui em virtude de circunstâncias reais, de práticas cotidianas. Segundo, porque algumas peças legíslatívas, como os Alvarás, as Provisões e Decisões com força de lei sobre Instrução Pública, nos séculos XVIIIe XIX, ao indica- rem algum método ou compêndio de determinada matéria, ou re- gularem a remuneração de um ou mais professores, não são pre- visões legais, mas verdadeiras sentenças - no sentido jurídico do termo - proferidas sobre requerimento das partes interessadas, constituindo, portanto, representações bastante significativas de situações concretas, de "práticas" enfim (OLIVEIRA,2006). No intuito de superar essa dicotomia, Hamilton (1989) propõe uma solução díalógíca na qual escola e sociedade são examinadas em suas relações recíprocas, uma vez que professores e alunos são ao mesmo tempo alvo de objetivos educacionais definidos pelo Esta- do e meio ativo pelo qual tais objetivos podem ser alcançados, pro- duzindo um efeito reativo sobre o currículo. A seu ver, apesar de os teóricos da escolarízação (theorists of schooling) reconhecerem que a intervenção estatal raramente alcança seus objetivos, seus diag- nósticos mantêm-se no domínio das políticas educacionais. Assim, a reforma curricular continua sendo uma solução permanente: 2} "História Literária e Ensino da Literatura: para uma his- tória dos cânones escolares no Brasil", que intenta veri- ficar os processos mediante os quaís, em períodos ou épocas diferentes, algumas obras ou autores se manti- veram na condição de clássicos e outros não, nos manu- ais didáticos de leitura ou de história literária. Para que o leitor tome conhecimento da natureza da pes- quisa à qual este livro se vincula, bem como de seus objetivos e fundamentos teÓrico-metodológicos, seguem algumas notas acer- ca da caracterização do problema e do estado da arte da produção acadêmica em torno dessa temática. 15 A história do ensino das Ifnguas no Brasill I Este foi o texto que serviu de Justificativa para o projeto de pesquisa "A Escola. o Estado e a Nação: para uma história do ensino das lInguas no Brasil (1757-1827)". aprovado pelo Edita! n. 003/2008/CNPq (Processo n. 400822/ 2008-3), tendo sido apresentado na Mesa-Redonda "O Ensino e a Pesquisa em História da Educação", como parte do Seminário em comemoração aos 15 (quinze) anos do NPGED (Núcleo de Pós-Graduação em Educação) da Universidade Federal de Serglpe: O Núcleo de Pós-Graduação em Educação e a Pesquisa Educacional, realizado na cidade de São Cristóvão, de 27 a 30 de abril de 2009. Encontra-se no prelo um livro reunindo os textos de todas as mesas-redondas do referido Sernínárto,organizado pelo Prof. Dr. Míguel André Berg~r, Coordenador Geral do evento. Este capítulo (intitulado Notes towards a theory oJ schooling) procura evitar esse dualismo. Ele parte da premissa oposta 14 Luiz Eduardo Oliveira - de que a escola e a sociedade podem ser examinadas em termos de relações recíprocas que as mantém unidas atra- vés do tempo e do espaço. De tal perspectiva, as práticas cotidianas da escola podem ser vistas como práticas soci- almente construídas e historicamente localizadas. Suas formas derivam, por exemplo, tanto das expectativas de padres e políticos quanto das circunstâncias materiais da arquitetura escolar e da disponibilidade de compêndios (HAMILTON,1989, p. 151).2 A htstoríografla educacional brasileira, ainda marcada tanto pela coletânea de leis organizada por Primitivo Moacyr (1936; 1939; 1942) quanto pela interpretação, ou "matriz" azevedtana", tam- bém baseada nas leis sobre educação, ainda não fez uma devida interpretação da legislação educacional do país, restringindo-se à mera citação do "caput" de decretos e alvarás, sem qualquer análise do texto da lei, em sua exposição de motivos e seus vários artigos e parágrafos. A obra de Moacyr, que serviu - e serve ainda hoje - de base para muitos trabalhos, e que sem dúvída é uma fonte das mais importantes para a história da educação brasilei- ra, toma-se problemática quando intercala o discurso do legisla- dor com o do autor, desmembrando artigos e parágrafos e assim orientando o leitor para uma determinada interpretação, ou lei- 2 Neste caso específico, traduzi schooling. cujo equivalente mais próximo. em Português. seria "escolartzação", genericamente por escola. Eis o texto original: "Thís chapter seeks to avoid such a dualism. It starts from the opposite prerníse - that schooling and society must be examined in terms of the reciprocal relationships that hold them together across time and space. Frorn such a perspective. the day to day practices of schoolíng are deemed to be both socially-constructed and historically-located. Theír shape derives as much, for tnstance, from the changing expectatíons of priests and politicians as it does from the pre-gíven circumstances of school archítecture and texbook avaílabílíty". 3 Sobre a critica da "matriz azevedíana'' na htstortografta educacional brasileira. consultar Warde (1984); Carvalho (1998) e Warde e Carvalho (2000). 16 GRAMATIZAÇÃO E ESCOLARIZAÇÃO tura da lei. Nesse sentido, em uma pesquisa que busca investigar o processo de institucionalização do ensino das línguas, a legisla- ção educacional - bem como todas as peças a ela relacionadas, como os anais parlamentares, os relatórios de ministros, de auto- ridades, congregações, conselhos, câmaras ou comissões especi- ais - ainda é uma fonte de suma importância. Seu estatuto em relação a outros objetos que integram o ensino de línguas, tais como compêndios - no caso do ensino de línguas, eles são de vários gêneros: catecismos, cartilhas, gramá- ticas, manuais de retórica e poética, seletas, livros de leitura e histórias literárias -, narrativas memorialísticas ou ficcionais de professores, programas de ensino, periódicos, produção acadêmi- ca, entre outros, é mais relevante, pois representa a ação do Es- tado na propagação, representação ou mesmo omissão do ensino de línguas, bem como no processo de construção de uma identi- dade e uma cultura nacional: A formação de uma cultura nacional contribuiu para criar padrões de alfabetização universais, generalizou uma úni- ca língua vemacular como o meio dominante de comunica- ção em toda a nação, criou uma cultura homogênea e man- teve instituições culturais nacionais, como, por exemplo, um sistema educacional nacional (HALL,2005, p. 49-50). Para Chervel, o problema das finalidades da escola é um dos mais complexos e sutis da história do ensino, uma vez que seu estudo só depende em parte da história das disciplínas, rela- cionando-se também com a estrutura familiar, religiosa, cultural e política de cada época específica. A seu ver, o historiador das disciplinas precisa distinguir o que chama de "finalidades reais" das "finalidades de objetivo", mesmo quando os textos oficiais mis- turam umas e outras: Deve sobretudo [o historiador) tomar consciência de que uma estipulação oficial, num decreto ou numa circular, 17 Luiz Eduardo Oliveira visa mais freqüentemente. mesmo se ela é expressada em termos positivos. corrigir um estado de coisas. modificar ou suprimir certas práticas. do que sancionar oficialmente uma realidade. "Apenas o francês será usado na escola". estipula o regulamento modelo das escolas de 1851: fínalí- dade de objetivo. Trinta anos mais tarde ensinava-se ainda em patois ou na língua regional (CHERVEL. 1990. p. 190). A definição das "finalidades reais", segundo o autor, deve ser buscada nos objetivos da escola, e não dos poderes públicos, pois o estudo das fmalidades não pode abstrair os "ensinos re- ais", a "realidade pedagógica". Assim, o historiador precisa evitar a redução das disciplinas escolares às suas respectivas metodo- logías, ou idéias pedagógicas, procurando investigar seus objeti- vos, em um primeiro estágio, nos textos oficiais programáticos e nos planos de estudos, para só então rastrear suas fmalidades nas salas de aula. Citando o caso da Lei Guizot de 1833 e do estatuto das esco- las do ano seguinte, que introduziu no programada Instrução Primária os "elementos da língua francesa", Chervel reconhece que a lei desempenhou um papel importante na propagação do ensino do Francês, mas afirma que até 1850 a maioria das esco- las francesas da zona rural negligenciou esta parte do programa, em decorrência do que pergunta: "de que lado colocaremos as finalidades? Do lado da lei ou do lado das práticas concretas"? (CHERVEL,1990, p. 189). Em uma pesquisa histórica como esta, a investigação das "práticas concretas" do ensino de línguas toma-se extremamente dífícíl, senão impossível. tanto pela dístâncía temporal quanto pela carência de fontes não oficiais, sendo muito mais fácil a sua rea- lização em estudos nos quais o pesquisador possa acompanhar todas as atividades de um determinado grupo de alunos em um espaço de tempo previamente estabelecido. Ao historiador, resta somente a indagação dos documentos de épocas passadas, pois, como afirma o próprio Chervel (1990, p. 191): 18 GRAMATIZAÇÃO E ESCOLARIZAÇÃO Cada época produziu sobre sua escola, sobre suas redes educacionais. sobre os problemas pedagógicos, uma litera- tura freqüentemente abundante: relatórios de inspeção, projetos de reforma. artigos ou manuais de didática. prefá- cio de manuais. polêmicas diversas, relatórios de presiden- tes de bancas. debates parlamentares. etc. É essa literatu- ra que. ao menos tanto quanto os programas oficiais, es- clarecia os mestres sobre sua função e que dá hoje a chave do problema. No entanto, se as "finalidades reais" de qualquer disciplina devem ser buscadas nos objetivos da escola, e não dos poderes públicos, como afirma o autor acima citado, seus "ensinos reais" não podem se desvincular das políticas educacionais que lhes dão suporte, uma vez que suas finalidades pedagógicas são tam- bém culturais e, sobretudo, políticas. Nesse sentido, a legislação sobre o ensino das línguas é aqui uma fonte de suma importãncia não somente pela especificidade pedagógica de seu objeto, mas também por inscrever-se como um discurso político e cultural que a toma, muito mais do que um reflexo do contexto de sua época, parte do seu próprio texto. Quanto à delimitação do período a ser estudado na pesqui- sa, de 1757 a 1827, serviram como pilares duas leis importantes que regulamentaram o ensino das línguas no Brasil: o Díretórío dos Índios ou Lei do Díretórío, de 3 de maio de 1757, confirmada pelo Alvará de 27 de agosto de 1758, que instituiu o ensino de Língua Portuguesa no pais, e a Lei Geral de 15 de outubro de 1827, que mandou criar Escolas de Primeiras Letras em todas as cidades, vilas e lugares mais populosos do Império. Esta lei, que foi a única de ãmbito nacional a tratar especialmente das Primei- ras Letras no Brasil, durante todo o Império e parte da República, estabeleceu, em seu artigo sexto, a Gramática da Língua Nacio- nal entre as matérias a serem ensinadas pelos professores e re- gulamentou as condições necessárias, o modo de admissão, re- muneração e um plano de carreira da profissão docente, os quais 19 \ Luiz Eduardo Oliveira GRAMATIZAÇÃO E ESCOLARIZAÇÃO 20 jeta sua sombra até mesmo no universo disponível de escolha de períodos, razão por que há tão poucos trabalhos - pelo menos os produzidos nos Programas de Pós-Graduação entre 1972 e 1988- relativos às épocas que não são privilegiadas em A cultura brasi- leira (1942). como a pombalina. Segundo Laerte Ramos de Carva- lho (1952, p. 106). em sua obra pioneira, no país, sobre As refor- mas pombalinas da instrução pública, "é muito difícil precisar até que ponto e em que escala se fez sentir a reforma de 1759 no Brasil". Banha de Andrade, em A reforma pombalina dos estudos secundãrios no Brasil (1978). tenta minorar tal dificuldade, fazen- do um mapeamento das correspondências entre o Diretor Geral dos Estudos D. Tomás de Almeida e seus comissários distribuídos pelas várias capitanias da colônia. De qualquer modo, conforme a interpretação que tem pre- valecido na historiografia da educação brasileira, as inovaçôes advindas das Reformas Pombalinas não afetaram a situação da Instrução Pública no país. Para Azevedo (1971). as reformas de Pombal só teriam desarranjado a sólida estrutura da educação jesuítica, baseada que era em um sistema mais ou menos unifi- cado, com seriação dos estudos, para dar lugar ao ensino disper- so e fragmentário das Aulas Avulsas ministradas por professores leigos e mal preparados. Em sua opinião, a base da pedagogia dos jesuítas, após a sua expulsão de Portugal e seus domínios, teria permanecido a mesma, uma vez que os padres missionários, além de terem cui- dado da manutenção dos colégios destinados à formação de seus sacerdotes, criaram seminários para um clero secular, constituí- do por "tios-padres" e "capelães de engenho". Estes, dando conti- nuidade à ação pedagógica dos inacianos, mantiveram sua "metodologia" e programa de estudos, que deixavam de fora, se- gundo o autor, além das ciências naturais, as "línguas e literatu- ras modernas": serviriam de modelo para o provimento de outras cadeiras, tais como as de Latim, cujos estudos foram reformados com o Alvará Régio de 28 de junho de 1759 - que também tratou do ensíno das Línguas Grega e Hebraica e de Retórica -, e línguas estrangeiras modernas, ínstituídas no país pela Decisão n. 29, de 14 de julho de 1809, que criou uma cadeira pública de Francês e outra de Inglês na cidade do Rio de Janeiro (OLIVEIRA,2006). Com tal delimitação períodológtca, que é também uma to- mada de posição conceitual, a história do ensino das línguas no Brasil só tem ínteresse quando alcança o estatuto de política educacional de um Estado-Nação, ou de um Estado que se quer nação, tendo para tanto que passar não somente por um movi- mento geral de reformulação jurídica, mas também pelo proces- so de construção de uma identidade nacional - ou de invenção de sua tradição -, o que, mais do que uma entidade política, configura-se como um sistema de representação cultural (HALL, 2005), caso das Reformas Pombalinas em Portugal e no Brasil. Esta é a razão por que ficou de fora, para seus escopos, o periodo jesuítico. Nesse sentido, esta pesquisa contrapõe-se ao discurso hís- toriográfico produzido pela "matriz azevediana", que, destacando os aspectos civilizadores do jesuitismo, desqualifica o papel ino- vador das Reformas Pombalínas, bem como do período joaníno (CARVALHO,1998). Chagas (1967, p. 104). por exemplo, afirma que, mesmo depois da expulsão dos jesuítas, em 1759, "o traço fundamental da ínstrução secundária, [...], manteve as linhas básicas do século XVI", como se aquele tipo de instrução fosse possível no Renascimento. Segundo o mesmo autor, a transferên- cia da corte para o Rio de Janeiro, apesar de importar na institui- ção do ensíno profissional, militar, superior e artístico, nada fez a respeito da "escola secundária prôpriamente dita". Somente em 1837, argumenta, o Ensino Secundário, no Brasil, teria alcança- do a "segunda etapa". Como notou BontempiJr. (1995), a força da obra de Femando de Azevedo, no campo do pensamento educacional brasileiro, pro- No fundo, e através das formas mais variadas da paisa- gem escolar, recorta-se ainda nitidamente, com seus tra- 21 ----.... Luiz Eduardo Oliveira ços característicos, a tradição pedagógica e cultural dei- xada pelos jesuítas e continuada pelos padres-mestres, e resultante de uma educação exclusivamente literária, baseada nos estudos de gramática, retórica e latim e em cujos planos não figuravam nem as ciências naturais nem as línguas e literaturas modernas (AZEVEDO,1971, p. 556). Geraldo Bastos Silva, por sua vez, reconhece que, apesar de ser legítimo falar em fragmentação do ensino, tal fragmenta- ção, "do ponto de vista do cuniculo", é um progresso, uma vez que a "paisagem escolar" do país se modifica com a chegada de "novas matérias"; [... 1, entre as aulas criadas, posteriormente, para suprir a falta dos colégiosjesuítas, há algumas que exprimema ten- dência à modificaçãoda tradição pedagógica,pelo apareci- mento de novas matérias, em resposta anovas exigências de ordem prática ou de natureza cultural. Assim, desde os fins do século XVIII,ao lado das matérias do ensino literá- . rio e religioso- o latim, a retórica, o grego, o hebraico, a filosofia,a teologia- a paisagem escolar do Brasil inclui as matemáticas e outras disciplinas, comoo desenho, o fran- cês, o inglês (SILVA,1969,p. 189). A afirmação de Silva. embora não apresente ou faça refe- rência a qualquer documento que possa comprovar ou sugerir a prática do ensino das Línguas Vivas no Brasil de "fins do século XVIII". é pertinente quando se leva em conta que. com a reforma dos Estudos Maiores. em 1772. o Francês e o Inglês passaram a ser matérias recomendadas pelos Estatutos da Uni- versidade de Coimbra para o ingresso nos cursos médico e ma- temático. Isso significa dizer que os filhos de famílias abasta- das brasileiras ou residentes no Brasil poderiam ter frequen- tado aulas daquelas línguas dadas por religiosos ou particula- 22 GRAMATIZAÇÃO E ESCOLARIZAÇÃO res. antes de cruzar o atlãntico para ingressar na academia coímbrã." Diante da carência de fontes referentes às iniciativas guia- das pelas novas orientações vindas de Portugal. principalmente no que dizem respeito ao ensino de línguas. foiadotado como marco inicial de seu processo de institucionalização a Lei do Diretório de 1757. que instituiu o ensino de Língua Portuguesa no país. Tal adoção. como já foi dito. implica uma tomada de posição quanto ao papel das Reformas Pombalinas. isto é, da transferência do controle da instrução da Companhia de Jesus para o Estado por- tuguês, na história da educação brasileira. uma vez que busca provar que as reformas de Pombal foram capazes de "dar um novo rumo à educação. tanto na metrópole quanto na colônía, em ter- mos de renovação metodológíca, de conteúdos e de organização". como afirma Hilsdorf (2003. p. 15). invertendo assim a leitura de Fernando de Azevedo. que descreve a época pós-pombalina em termos de decadência e transição. Seu marco final. 1827. justifica-se pela hipótese de que a vinda do Príncipe Regente D. João e sua corte para o Rio de Janei- ro. em 1808. significou, em matéria de Instrução Pública - e. por- tanto. de organização e racionalização do próprio Estado brasilei- ro -. a aplicação e desenvolvimento. na colõnia que se transfor- mou em sede do governo português. das diretrizes estabelecidas pelas Reformas Pombalinas. Desse modo. podemos conceber um período de continuidade. do ponto de vista da história do ensino das línguas no Brasil. que comporta os governos de D. José I. D. 4 Cardoso (2002, p. 206) também ratifica tal hipótese, embora não apresente documentos: "além das Aulas de Primeiras Letras. Gramática Latina. Retórica, Língua Grega e Hebraica. introduzidas em 1759 e que permaneceram até 1834. foram sendo incluídas no currículo escolar das Aulas Régias. que após 1822. chamaram-se Aulas Públicas. outras cadeiras. a partir da segunda fase da reforma dos estudos. em 1772. como Filosofia Moral e Racional, Economia Política. Desenho e Figura. Língua Inglesa. Língua Francesa e Aulas de Comércio". 23 <, Luiz Eduardo Oliveira GRAMATIZAÇÃO E ESCOLARIZAÇÃO Maria I e D. João VI, bem como do seu filho e sucessor D. Pedro I, uma vez que a permanência, mesmo depois da Independência, de uma geração de intelectuais que passaram por todo esse proces- so, tais como Martim Francisco (1775-1844) e o Visconde de Cairu (1756-1835), em instãncias decisórias de ãmbito educacional, dentre outros fatores, contribuiu para a manutenção, propaga- ção e até mesmo apropriação de valores advindos da universida- de reformada de Coímbra, talvez a grande obra cultural do Mar- quês de Pombal (1699-1782). projeto" Americanismo e Educação: a fabricação do homem novo", o qual deu sustentação ao convênio estabelecido entre a institui- ção paulista e o NPGED (Núcleo de Pós-Graduação em Educação), da Universidade Federal de Sergípe, com financiamento da CA- PES, através do Programa de Cooperação Acadêmica (PROCADl, e teve como objetivo investigar e descrever o processo de institucio- nalização do ensino das Línguas Vivas no Brasil, observando o caso específico da Língua Inglesa, de 1809 a 1890, no intuito de estabelecer uma periodização relacionada às principais fmalida- des assumidas pelo ensino daquelas línguas no sistema de Ins- trução Pública do país.Organização do livro Este livro foi organizado em quatro capítulos. No primeiro, A Gramática Latina e o ensino das línguas, buscou-se verificar o modo como o processo de gramatização, que tem como base a Gramáti- ca Latina, articula-se com a escolarização das línguas nacionais e estrangeiras. No segundo, Os Professores Régios de Gramática Latina e Retórica: notas para o estudo das origens da profissão do- cente no Brasil, há uma análise da legislação pombalina, mariana e joanína referente aos professores de Latim, Grego, Hebraico e Retórica. No terceiro, Da Língua do Príncipe à Língua Nacional: uma história do ensino de Português no Brasil., tentou-se um esbo- ço crítico-descritivo de tal processo, sugerindo algumas hipóteses de trabalho que poderão ser depois desenvolvidas. No quarto, fí- nalmente, As Gramáticas Inglesas e a Instrução Pública: uma histó- ria do ensino de Inglês no Brasil, o leitor terá uma mostra de parte da pesquisa desenvolvida em minha Dissertação de Mestrado, defendida no Instituto de Estudos da Linguagem da Unicamp, em 1999, e intitulada A historiograjia brasileira da literatura inglesa: uma história do ensino de inglês no Brasil (1809-1951), e em mi- nha Tese de Doutorado, intitulada A instituição do ensino das Lín- guas Vivas noBrasil: o caso da Língua Inglesa (1809-1890), defen- dida em fevereiro de 2006 no Programa de Estudos Pós-Gradua- dos em Educação: História, Política, Sociedade, da Pontifícia Uni- versidade Católica de São Paulo. A tese foi um dos resultados do Referências ANDRADE,Antonio Alberto Banha de. 1978. A reforma pombalina dos estudos secundários no Brasil. São Paulo: Saraiva / EDUSP. AZEVEDO, Fernando de. 1971. 5. ed. A cultura brasileira. São Paulo: Melhoramentos / EDUSP. BONTEMPl JUNIOR, Bruno. 1995. História da educação brasileira: o terreno do consenso. Dissertação de Mestrado, pós-Graduação em Educação: História. política. Sociedade, Pontificia Universidade Católica de São Paulo. CARVALHO, Laerte Ramos de. 1952. As reformas pombalinas da instrução pública. São Paulo: FFCL da USp, Boletim n. 160. CARVALHO.Marta Maria Chagas de. 1998. "A configuração da historiografia educacional brasileira". In: FREITAS. Marcos César de (org.), Historiograjia brasileira em perspectiva. São Paulo: Contexto / Universidade São Francisco. CHAGAS,R. Valnir C. 1967. Didática especial de línguas modernas. 2. ed. São Paulo: Nacional. CHERVEL. André. 1990. "História das disciplinas escolares: reflexões sobre um campo de pesquisa". Tradução: Guaclra Lopes Louro. Teoria & Educação. Porto Alegre, n°. 2, pp. 177-229. HALL. Stuart. 2005. A identidade cultural na pós-modernidade. Tradução: Tomaz Tadeu da Silva. Guaraclra Lopes Louro. 10. ed. Rio de Janeiro: DP&A. 24 25 • Portarta de 30 de junho de 1931, assinada por Francisco Campos, Ministro de Estado da Educação e Saúde Pública. / HAMILTON, Davíd. 1989. Towards a theory of schooling. London: Falmer Press. A GRAMÁTICA LATINA E O ENSINO DAS LÍNGUAS HILSDORF, Maria Lucia Spedo. 2003. História da educação brastleira: leituras. São Paulo: Pioneira / Thomson Learning. 1939. A instrução e as proVÚlC/as (1834-1889). São Paulo: Nacional, 3 v. MOACYR,Primitivo. 1936. A Instrução e o Império. São Paulo: Nacional, v. 1. 1942. A Instrução pública no estado de São Paulo. São Paulo: Companhia Editora. Nacional, v. I. o objetivo principal do estudo do latim é ojUológico, isto é, o conhectmento da vida econômica, social e política dos roma- nos, e, através destes, o conhecimento do mundo antigo. Si- multaneamente, porém, com a realização de talftnalidade, desempenha o ensino do latim papel saliente na educação do pensamento, pois que oferece ensejo a que oestudante adqui- ra, com os exercícios que terá defazer, os necessários hábitos de pensar célere, profunda e cuidadosamente. Acresce ainda que o l.atim serve ao melhor conhecünento das línguas románi- cas, enriquecendo-lhes o vocabulário e tornando-o mais preci- soeexato.' OLIVEIRA,Luíz Eduardo Meneses de. 2006. A instituição do ensino das Línguas Vivas no BrasU: o caso da Língua Inglesa (1809-1890). Tese de Doutorado, Programa de Estudos pós-Graduados em Educação: História, Política, Sociedade, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Disponível em: <http:/ / www.sapientla.pucsp.br/tde_busca/ arquivo. php?codArquivo=2255> SILVA, Geraldo Bastos. 1969. A educação secundária (perspectiva histórica e teórica). São Paulo: Nacional. WARDE, Mirian J. 1984. "Anotações para uma historiografia da educação brasileira". Em aberto. Brasília: INEP, n." 23, pp. 1-6. WARDE, Mirían J. e CARVALHO,Marta M.C. de. 2000. "Política e cultura na produção da história da educação no Brasil". Contemporaneidade e Educação. Rio de Janeiro, n.? 7, pp. 9-33. <, Luiz Eduardo Oliveira GRAMATIZAÇÁO E ESCOLARIZAÇÁO A formalização do ensino das línguas no mundo ocidental, ao relacionar-se com o desenvolvimento dos saberes metalinguísticos codificados, coincide com o aparecimento das primeiras gramáticas escritas em Latim e dedicadas, em sua maior parte, ao ensino da Língua Latina. Tais gramáticas constituem um elemento de fundamental importãncia no processo de escolarização daqueles saberes, o qual ocorre no mesmo momen- to em que os Estados começam a burocratizar-se, seja em suas relações políticas e comerciais com paises ou povos vizinhos, seja em suas aventuras expansionistas. Nessa perspectiva, pode-se inferir que o ensino das línguas - entenda-se das línguas estrangeiras, mortas ou vivas, para cujo aprendizado exige-se um saber metalinguístico, ao contrário das línguas maternas, componentes de um saber elementar (HÉBRARD, 1990) - familiar ou corporativo formaliza -se por volta do século XVI, época em que Auroux (1992) localiza o fenõmeno a que dá o nome de "gramatízaçâo'' 1, possibilitado em grande parte pela utilização dos caracteres móveis da imprensa. Com efeito, é naquele século que se verifica o aparecimento de grande número de gramáticas, e de quase todas as línguas do mundo, cujas des- crições eram baseadas na gramática da Língua Latina, fato veri- ficado ínclusive no Brasil, como testemunha a Arte da grammatica I o conceito de "grarnatização". tal como o define Auroux (1992. p. 65) _ "o processo que conduz a descrever e a instrumentar uma língua na base de duas tecnologias. que são ainda hoje os pilares de nosso saber metalinguístico: a gramática e o dicionário" -. difere-se das primeiras tentativas fllológícas de tradução e Interpretação de textos. assim como da grammatücé grega. que nasce na virada dos séculos V e IV antes de nossa era. Sua formulação tem origem no século II a.C .. com a Escola de Alexandría, e associa-se ao conhecimento empírico dos poetas e prosadores. mas o sentido moderno. como corpo de regras que explicam como construir palavras mediante paradígmas, para aprender a falar - e depois ler e escrever -. é um advento mais recente e coincide com o Renascimento. 28 GRAMATIZAÇÃO E ESCOLARIZAÇÃO da lingoa mais usada na costa do Brasa, de 1595, composta pelo padre jesuíta José de Anchieta (1533-1597). De modo semelhante, é por volta do século XVIque Vincent, Lahire e Thin (2001) situam "a invenção da forma escolar", carac- terizada por uma inédita relação social entre "mestre" e "aluno"; pelo surgímento de um "tempo" e um "espaço" escolar específicos; pela organização e codificação dos conteúdos ensinados; pelas gramáticas e manuais de "Civilidades" e pela produção das "dis- ciplinas escolares". Julia (2001) situa também no século XVI a emergência de uma das primeiras figuras do processo de profissi- onalízação dos professores, com o desmembramento da antiga cristandade em "confissões plurais" nos países protestantes. Nos católicos, tal processo ocorreria com os desdobramentos do Con- cilio de Trento (1545-63). Ser cristão, segundo o autor, não se restringia mais a pertencer a uma comunidade, mas exigia tam- bém a capacidade de proclamar pessoalmente as verdades da fé e a instrução sobre os princípios de sua religião. Assim, pode-se dizer que, a partir do século XVI, o papel educativo teria passado por um deslocamento das comunidades e das famílias para as instituições de ensino, as quais serviam tan- to aos interesses das duas Reformas quanto aos da burguesia em ascensão. O sistema de autoridade dos mestres sobre os discípu- los, diferente da "comunidade" entre os mesmos; a organização das classes conforme as idades dos alunos; os procedimentos de controle do tempo e de suas atividades; e fmalmente a implanta- ção dos planos de estudos e do seu sistema de progressão, ou seriação, com o advento do exame, seriam os dispositivos funda- mentais para a constituição da "forma escolar", ou da escolarização. A gramatização, por sua vez, ao fornecer elementos para a padronização dos vernáculos europeus, criou uma rede de conhe- cimentos Iínguístícos que se foi estruturando cada vez mais com o acréscimo de cada região "descoberta", ou conquistada, repre- sentada pelos cartógrafos. Auroux (1992, p. 35-36) considera tal processo a primeira revolução científica do mundo moderno, tão 29 Luiz Eduardo Oliveira -, importante na história da humanidade quanto a da físíca-mate- mática galileico-cartesiana. sua contemporânea, uma vez que as ciências da natureza. apesar de alcançarem primeiro sua grande síntese teórica. com Isaac Newton (1642-1727). tiveram consequ- êncías práticas mais tardias. com a industrialização. Assim. mesmo com um modelo de cíentífícídade dominante. que abarcava inclu- sive as "ciências humanas". as ciências modernas da natureza não teriam sido possíveis sem a revolução técnico-linguística da gramatização. A aprendizagem de uma língua estrangeira. nesse sentido. pode ser considerada como a causa inicial do processo de grarnatí- zação, sendo a Língua Latina. cujo estatuto de "língua franca" no meio intelectual e político já havia se estabelecido desde a Idade Média. a língua gramatical por excelência. No ensino. a Gramática da Língua Latina vai desempenhar um papel preponderante. uma vez que seu aprendizado representa a via de acesso principal à educação do homem letrado. seja nas congregações religiosas. an- tes e depois das duas Reformas. seja nas universidades. A gramática utilizada pelos jesuítas. que exerceram um monopólio quase absoluto na instrução dos meninos de Portugal e seus domíníos-, era a Arte da gramática latina do padre Manoel Álvares (1526-1583). a qual suscitou uma série de publicações a ela relacionadas: resumos. comentários e edições reformadas. como a recomendada pelo Ratio Studiotum (1599). de António Vellez.Papel semelhante desempenhou na Inglaterra a Short introduction of qrammar, atribuída a William Lilly (1468-1522) e reformulada por 2 A obra dos jesuítas em Portugal e seus domínios deve ser examinada levando- se em conta o caráter mísstonárío pelo qual passava a Igreja Católica no século XVI, que adotou uma postura social e ativa, diferentemente das ordens monásticas medievais, receptivas, acolhedoras e passivas em relação aos novos adeptos. Ameaçado pelo avanço do reformísrno, bem como pela revolução luterana, o Papa Paulo IIJ (1534-63) convocou bispos, teólogos e cardeaís para o Concílio de Trento (l545-1563), iniciando assim o que se convencionou chamar de movimento da Contra-Reforma (HILSDORF, 2003, p. 4). 30 GRAMATIZAÇÃO E ESCOLARIZAÇÃO John Colet (C. 1467-1519) -ambos pertencentes à St. Paul's School -. que obteve em 1540 a autorização real de Henrique VIII (1509- 1547) para estabelecer um método uniforme do ensino de gramá- tica nas escolas (HOWATI. 1988. p. 32). A Gramática latina e as lfnguas Nacionais Se a Gramática da Língua Latina faz da gramática. com o passar do tempo. uma técnica de aprendizagem da língua mater- na e. depois,uma técnica geral para a aprendizagem de todas as línguas, transmítíndo-lhes a sua "latínídade'", a gramatização dos vernáculos é acompanhada por um processo de reforma, e até de recusa da Língua Latina. Na Inglaterra, os primeiros passos nes- sa direção foram dados ainda na segunda metade do século XVI, com a publicação póstuma, em 1570, de The Schoolmaster, de Roger Ascham (1515-1568), obra designada pelo autor para educar os filhos de famílias nobres inglesas, adaptando-os às exigências da corte da rainha EUzabeth (1558-1603). Ascham, pela técnica da traduçào interlinear (double translation). dá igual ímportãncía ao Latim e ao Inglês, fazendo com que o aluno adquira um conheci- mento de sua própria língua com seis procedimentos básicos: "ímítatío", "translatío", "paraphrasís", "epítome", "metaphrasís" e "declamatío" (HOWATI. 1988, p. 33-34). Mais radical, no entanto. é a proposta de Joseph Webb (c. 1560-1633). já no século XVII, tanto em An appeal to truth (1622) quanto em Pueriles confabulatiunculae (1627). obras nas quais defende a idéia de que, para se adquirir habilidades comunicati- vas. é necessário apenas o "hábito". ou "costume". alcançado pe- 3 o conceito de latlnidade, aqui, não se confunde com o sentido que lhe dá Vemey (1949, p. 169-192), na sua Carta Terceira, isto é, como "expressão lIterãria da cultura latina", mas com a ídéía de "alfabetização" (AVROUX, 1992, p. 65): um processo segundo o qual um locutor alfabetizado na Língua latina adapta aos seus caracteres e à sua escrita os sons que percebe de outros Idiomas. 31 Luiz Eduardo Oliveira los exercícios de leitura, escrita e fala. As regras gramaticais, para o autor, seriam adquírídas em um estágio secundário, de modo "natural" e sem muito esforço por parte do mestre, uma vez que seus pressupostos já estariam apreendidos pelo aluno com o uso reiterado. Fato curioso na biografia de Webb é a sua Petition to the high courtofParliament, de 1623, na qual pede ao parlamento in- glês uma patente para seu método de dispor graficamente, em seus compêndios, os diálogos latinos com a respectiva tradução no idioma dos alunos (HOWAIT, 1988, p. 35-37). No caso português, o movimento é mais tardio, e data do sé- culo XVIII,coincidindo com as atividades da Academia Portuguesa, fundada na biblioteca de sua própria casa por Francisco Xavier de Menezes, 040 Conde de Ericeira e tradutor da Arte Poética,de Boileau, entre 1717e 1720 (RIBEIRO, 1871,p. 163-164). Apoiado nas ínfor- mações da Bibliotheca Lusitana (1741-1758), de Barbosa Machado (1682-1772) e das Prosas Portuguesas (1728), de D. Rafael Bluteau, António Salgado Júnior (1952, p. XXXi-XXXiii),no prefácio do quarto volume da edição por ele organizada do Verdadeiro método de estu- dar (1746), de Luíz Antônio Verney (1713-1792), divide em três os estudos realizados pela academia lusitana: literários, históricos e filosóficos e científicos. Independentemente do que possa haver de história ou de memória em torno dessa academia, o certo é que a ela estavam relacionadas, direta ou indiretamente, as principais personagens que iriam liderar o processo de reforma da pedagogia portuguesa no século XVIII. A primeira delas é a de um padre teatino francês ligado à vida cultural lusitana, o já citado Rafael Bluteau (1638-1734), autor do Vocabulário português e latino, primeira obra importante da lexico- grafia portuguesa e fonte principal de onde procederam todos os de- mais dicionários portugueses modernos, publicada em dez volumes entre 1712 e 1728. A segunda é a de Martinho de Mendonça de Pina e Proença (1693-1743), em cujo plano de estudos de sua obra mais conhecida, os Apontamentos para a educação de wn menino nobre, de 1734, não constava a Gramática Latina: "que importantes e agradaveis noticias de Geografia, Hístoría. Chronologia, Geome- 32 GRAMATIZAÇÃO E ESCOLARIZAÇÃO ma, e Algebra, se podião adquirir aos muitos alunos, que se Gastão em aprender Latim!" (apud CARVALHO,1959, p. 79). Em 1746 apareceu a primeira edição do Verdadeiro método de estudar para ser útil à República, e a igreja: proporcionado ao estilo, e necessidade de Portugal, exposto em várias cartas, escritas pelo R. P. Barbadinho da Congregação de Itália ao R. P. Doutor na Universidade de Coimbra, a mais arrojada empreitada pedagógica do período. Escrita em forma epistolar e sob pseudõnimo, à ma- neira do que fizera Locke em seus Thoughts conceming education, de 1693, Verney dividiu sua obra em cinco volumes, planejando uma reforma completa dos estudos portugueses, no que se de- bruçava sobre todos os ramos do saber de sua época, desde os estudos fílológícos - ou linguísticos e literários - até os fílosóflcos, médicos, jurídicos, teológicos e canõnicos. Nas primeiras três Cartas, dedicadas, respectivamente, à Língua Portuguesa, à Gramática Latina e à Latinidade -, é elabo- rada uma reformulação ortográfica do Português, com regras e resultados muito peculiares, baseados na prosódia, ao mesmo tempo em que é planejada uma sistematização do ensino da gramática da Língua Portuguesa, para isso propondo o autor uma mudança no método de ensino da Gramática Latina, com os pres- supostos então correntes de uma "gramática geral"." 4 De acordo com Auroux (1992, p. 88), a gramática geral "encontra seu apogeu no século XVIIIem tomo dos enciclopedistas franceses", propondo-se a "ser a ciência do que é comum a todas as línguas", ou a "ciência das leis da linguagem às quais devem se submeter todas as línguas". Para ele, "a maior parte das gramáticas gerais se apóia principalmente sobre a língua do seu redator e sobre as línguas clássicas, latim e grego". Francisco J. C. Falcon (1993, p. 118), por seu turno, ao tratar dos "grandes temas" da Ilustração. afirma que o "universo do discurso" ocupa um primeiro plano, "através de uma nova gramática, espécie de tradução do modelo newtoníano no nível específico da lingüística", e apóia-se no Foucault de Le mots et les choses para citar a Gramática geral (1767) de N. Bauzée como exemplo clássico. Um precursor português teria sido Amaro de Roboredo, como 'sugere o titulo do seu Methodo grammatical para tcx1as as línguas, de 1619. 33 Luiz Eduardo Oliveira Suas observações a respeito da sintaxe, depois expostas na introdução de sua Grammatica latina, publicada somente em 1790, podem ser assim resumidas: 1) todas as línguas têm a mesma ordem natural de sintaxe; 2) a diversidade das línguas na sintaxe é acidental, e consiste em ocultar algumas palavras por elipse, ou em transpô-Ias por hipérbato, ou em aumentá-Ias por pleonasmo, e, algumas vezes, em suprir com uma só voz várias idéias, ou inventar novas partículas para reger diversos casos; 3) todas as línguas se podem reduzir ãs mesmas regras gerais e essenciais e, especialmente, às mesmas da latina (VERNEY, 1949, p. 158-164).5 Outro pedagogísta lusitano do período é Antônio Nunes Ri- beiro Sanches (1699-1783), que antes de escrever um Método para aprender a estudar a medicina (1763), havia produzido, há três anos, suas Cartas sobre a educação da mocidade, nas quais pla- nejou quatro tipos de escolas para a educação da juventude por- tuguesa: 1) as escolas reais estabelecidas nas cabeças de comarca, para meninos que não eram nobres; 2) as escolas reais estabele- cidas em Lisboa, Coimbra e Évora, preparatôrias para o ensino universitário dedicado à mesma categoria de rapazes; 3) as esco- las para os meninos nobres em geral, concebida em termos de um colégio militar; 4) e uma escola para os meninos nobres intelectu- almente bem dotados. O Latim, de acordo com Sanches, seria ensinado nas escolas dos tipos 1, 2 e 4, mas não nas do tipo 3, pois "pode se duvidar com razão se todos os educandos devem aprender sem distinção a Língua Latina, e as Sciencias mais ele- vadas. He certo que devia haver excepção nesta materia; e con- formar o ensino ao gênio, inclinação e engenho dos educandos" (apudCARVALHO, 1959, p. 82). 5 As inovações sintáticas propostas por Verney, como observa António Salgado -Júníor (1949, p. 159). em nota de rodapé, e o próprio Verney(p. 144-151), ao tratar das "modernas orientações" da Gramática Latina, Já haviam sido expostas pela maioria dos gramáticos modernos, tais como Escalígero (1484- 1558), Sctoppío (1576-1649) e Vóssío (1577-1649). mas parece ser a Minerva (1587) de Francisco Sanches (1523-1601) seu modelo principal. 34 GRAMATIZAÇÃO E ESCOLARIZAÇÃO Ainda em meados do século XVIII, algumas idéias desse movimento português e "estrangeirado" de reformulação do ensi- no da Gramática Latina tomaram forma de lei. Com o Alvará Ré- gio de 28 de junho de 1759, que extinguiu todas as "Classes" e "Escolas" dos jesuítas em todos os reinos e domínios de Portugal, proibindo-os definitivamente de exercer qualquer atividade do- cente", reformou também os estudos de gramática da Língua La- tina. Grega. Hebraica e Retôrica. O Estado português. a partir de então, assumiu o controle da instrução. O texto do Alvará, porém, faz sugerir que os jesuítas foram os grandes causadores do estado calamitoso em que se encontra- va o estudo das Letras Humanas, "base de todas as Scíencías". nos Reinos de Portugal e seus domínios. Inventando uma tradi- ção de glorioso auge das letras antes de serem elas confiadas aos discípulos de Inácio de Loyola, o legislador - "EI Rei", sob as vistas do Conde de Oeiras - ordenava que se restituísse "o methodo an- tigo. reduzido aos termos simples, claros e de maior facilidade que se pratica atualmente nas nações mais polidas da Europa" (POR- 1UGAL. 1830). Tal método dizia respeito à simplificação da Gramática Lati- na. que deveria ter as regras e exceções reduzidas e ser ensinada em Português, refletindo uma polêmica que repercutia em Portugal desde o início da década de cínquenta, principalmente depois da publicação. em 1752, do Novo método da gramática latina reduzido a compêndio para uso das escolas da Congregação do Oraiôno. com- posto pelo Padre Antônio Pereira. A obra foi adotada pelo Alvará como livro a ser usado em substituição à Arte da gramática latina de Manoel Alvares. tomada proibida (art. 8.°), do mesmo modo que as obras de seus comentadores ou reformadores. A "Instrução para os Professores de Gramática Latina". no seu parágrafo dezesseis, incentivava o uso da Língua Portugue- 6 o jesuítas foram oficialmente expulsos dos reinos e domínios de Portugal com o Alvará de 3 de setembro de 1759. 35 Luiz Eduardo Oliveira sa: o Latim não poderia ser falado nas "Classes", para evitar os "barbarismos", devendo os professores pratícá-lo depois, quando os estudantes tivessem um conhecimento suficiente da língua, fazendo-os preparar em casa algum "Diálogo ou História" para ser repetido na classe. Os modelos aconselhados para tal exercício eram Terêncio e Plauto, "como vão" na Coleção dos diálogos de Luís Vives, na Coleção das palavras familiares portuguesas e lati- nas feita por António Pereira, da Congregação do Oratório, e nos Exercícios da língua latina eportuguesa acerca de diversas coisas, ordenados pela mesma congregação (PORfUGAL, 1830). Nos meses e anos subsequentes ao Alvará de 1759, foram expedidas outras medidas regulamentando as Aulas Régias de Humanidades, o que levou a htstortografía a determinar que, num primeiro momento, as Reformas Pombalinas da Instrução Pública não atingiram o ensino elementar, tornando-se este um objeto de legislação somente com a reforma dos Estudos Menores efetuada pelo Alvará de 6 de novembro de 1772, que criou as escolas públi- cas de ler, escrever e contar no Reino e as Aulas de Filosofia. No entanto, não se pode deixar de ressaltar o papel da Lei do Díretórío (de 3 de maio de 1757, confmnada pelo Alvará de 27 de agosto de 1758), primeira tentativa do Estado português de instituir escolas para os índios, em substituição ao controle pe- dagógico da Companhia de Jesus, no Grão-Pará. O Díretórío esta- belecia, como "base fundamental da Civilidade", a proibição do uso do idioma da terra e impunha a Língua Portuguesa como idi- oma oficial, criando escolas, para meninos e meninas, de Doutri- na Cristã, Ler e Contar - nas escolas de meninas, o Contar era substituído pelo "fiar, fazer renda, costura", e mais os "mínísteríos proprios daquelle sexo" (PORTUGAL,1830). Com o Alvará de 30 de setembro de 1770, EI-Rei ordenou que "os Mestres da Língua Latina", quando recebessem em suas classes os discípulos, os instruíssem "durante seis meses" na Gramática portugueza composta por António José dos Reis Lobato, oficializando assim o ensino de Português em seus reinos e domí- nios. As razões da lei eram alegadas logo no início, "sendo a 36 GRAMATlZAÇÃO E ESCOLARIZAÇÃO correcção das línguas nacionais um dos objectos mais attendiveis dos povos civilisados, por dependerem della a clareza, a energia, e a magestade, com que se devem estabelecer as Leis, persuadir a verdade da religião, e fazer uteis, e agradaveis os Escritos" (POR- TUGAL,1858). Ao referir-se às escolas de ler e escrever, o legislador obser- vava que, "até agora", se praticava a lição de processos litigiosos, e sentenças, "que somente servem para consumir o tempo, e de costumar a mocidade ao orgulho, e enleios do foro", mandando, em seu lugar, se ensinar por meio de impressos, "ou manuscriptos de diversa natureza". Indicava para compêndio o "Catecismo pe- queno do Bispo de Montpellier Carlos Joaquim Colbert, mandado traduzir pelo Arcebispo de Evora [D.João Cosme da Cunha, futu- ro Cardeal da Cunha) para instrução dos seus díocesanos" (POR- TUGAL,1858).7 7 A primeira edição lisbonense da obra acima referida, de acordo com Andrade (1978, p. 15-16), saiu em 1765, pela Oficina de Míguel Manescal da Costa, com o título Instru.cçoens Gerais emfonna de catecismo, chegando, com mais ou menos dezoito edições, até 1884, e persistindo como compêndio principal de formação religiosa usado nas escolas de ler e escrever, até a introdução dos conceitos de civilidade, urbanidade e decência. que se deu pela adaptação, em 1855, do Novo Methodo para apprender a ler, segundo o methodo de Pestalozzi. Conforme o autor, apoiado na História da Igreja em Portugal, de Fortunato de Alrneída, o Catecismo foi mandado traduzir peJo próprio Conde de Oelras, que' o havia difundido no Reino e no Brasil ainda em 1765. 37 \ GRAMATIZAÇÃO E ESCOLARIZAÇÃO Luiz Eduardo Oliveira fi ~ ~ •: : Si A constituição das Ifnguas como disciplinas escolares Apesar de todo movimento de reforma e recusa do ensino da Gramática Latina, o Latim se manteve no plano dos estudos se- cundários, ou preparatórios, no Brasil, até a década de 1950, sendo sua carga horária maior ou compativel com a das Línguas Vivas, depois de sua introdução no plano oficial daqueles estudos (VECCHIA& LORENZ, 1998)8, além de ser uma matéria obrigató- ria para se ter acesso a qualquer um dos estudos superiores, em Portugal ou no Brasil. Ajustificativa de sua permanência no cur- rículo, além de se basear em seu caráter erudito, ou de "cultura geral", relacionava-se com o seu papel de "ginástica mental", isto é, como um meio de desenvolver o intelecto dos alunos mediante a memorização e análise de regras e paradigmas, através de exercí- cios de versão e tradução. Assim, a aprendizagem da Língua Lati- na, além de ajudar a pensar melhor, tornava mais preciso o co- nhecimento da língua materna. Quando expediu os programas do curso fundamental do Ensino Secundário, pela Portaria de 30 de junho de 1931, nos termos do artigo 10 do Decreto n. 19.890, de 18 de abril do mesmo ano, assim se expressava Francisco Campos, Ministro de Estado da Educação e Saúde Pública, em nome do Governo Provisório, quanto às "instruções pedagógicas" do ensino do Latim: 'GRAM:I M'JTICJ da lingua 'Por- tllguefa· OLYSSJPPONE. Apuef Lodouicum'Rotori- gm ,TyJ'OgYal'bum. .M. D. ,XL. o objetivo principal do estudo do latim é o fllológíco, isto é, o conhecimento da vida econômica, social e politica dos 8 O plano oficial desse tipo de ensino. no Brasil. foi instituído em 2 de dezembro de 1837. quando o regente interino Bemardo Pereira de Vasconcelos decretou a conversão do Seminário de São Joaquim em Imperial Colégiode Pedro Il, primeira instituição de estudos secundários. criada na corte e mantida pelo Estado para servir de modelo às demais. A partir de então. seu programa e carga horária passaram a ser Instituídos por lei. sendo reestruturados e redlstribuídos pelos sucessivos decretos que reformaram o estabelecimento (OLIVEIRA. 1999). '="'-"'---';""-');.1,~. -~~ ••"'., ..;o. .,...11 Grammatica da língua portuguesa (1540) 38 39 Luiz Eduardo Oliveira romanos, e, através destes, o conhecimento do mundo an- tigo. Simultaneamente, porém, com a realização de tal fi- nalidade, desempenha o ensino do latim papel saliente na educação do pensamento, pois que oferece ensejo a que o estudante adquira, com os exercícios que terá de fazer, os necessários hábitos de pensar célere, profunda e cuidado- samente. Acresce ainda que o latim serve ao melhor conhe- cimento das línguas romãnicas, enriquecendo-lhes o voca- bulário e tornando-o mais preciso e exato (apud BICUDO, 1942, p. 142). É interessante observar que o ensino das línguas estran- geiras modernas na Inglaterra sofreu muitos preconceitos por ser tido como um tipo de instrução mais adequado ao público femini- no, sendo as meninas bem melhores nesta matéria do que os meninos, como mostra um relatório de Cambridge de 1868. Mes- mo tendo as Línguas Vivas entrado nos estabelecimentos de Ins- trução Secundária a partir da década de cinquenta do século XIX, com o estabelecimento do sistema de exames públicos controla- dos pelas Universidades de Oxford e Cambridge, o estatuto aca- dêmico das línguas mortas, ou clássicas, que tinham como su- porte as Grammar Schools - as quaís davam acesso privilegiado aos cursos superiores e não ensinavam as Línguas Vivas -, se manteve intacto, uma vez que os Locals - como se chamavam os Exames Públicos - eram desprestígíados por aceitarem candida- tos de países do "terceiro mundo", como a Jamaica, e do sexo fe- minino (HOWAIT, 1988, p. 133-134). Nos Estados Unidos, apesar dos ideais de Benjamin Franklin (1706-1790), em um panfleto de 1751 intitulado Id.eaof the English School; no qual havia elaborado um programa de instrução lín- guístíca e literária vernacular, antecipando assim a idéia da dis- ciplina, o Inglês sempre se manteve em níveis mais baixos e dota- do de menos recursos do que o Latim ou o Grego durante todo o século XIX, mesmo levando-se em conta que uma "cátedra" de "língua e oratória inglesa" havia sido criada na Universidade da 40 GRAMATIZAÇÃO E ESCOLARIZAÇÃO Filadélfia em 1755, e outra equivalente tinha se estabelecido em Harvard em 1806 (GOODSON, 1995, p. 178). No caso francês, depois do declínio que começou a ter desde o século XVI, acompanhando a já referida tendência da gramatí- zação dos vernáculos europeus, o Latim voltou a ter uma forte ascensão no século XIX, na época de Jules Ferry (1808-1880). seja como um tipo de formação que conferia um grau de nobreza ao indivíduo, representando assim um passaporte social relevan- te (CHERVELe COMPERE, 1999, p. 152). seja como uma espécie de "ginástica mental" (CHERVEL, 1990, p. 179). tomando-se qua- se um sínônímo de Ensino Secundário, uma vez que os estabele- cimentos dedicados a esse tipo de instrução vão se caracterizar pela inclusão, no seu plano de estudos, da Língua Latina (CHERVEL, 1992, p. 102-105). Se, para que possa ser considerada como disciplina esco- lar, uma matéria de ensino deve conter quatro componentes prin- cipais - a saber: um conteúdo explícito do conhecimento, exposto pelos professores e compêndios; uma bateria de exercícios, que juntamente com os conteúdos explícitos formam o "núcleo" da dis- ciplina; "métodos pedagógicos" e exames, os quais, com suas res- trições específicas, introduzem alterações na prática disciplinar (CHERVEL, 1990) -, a constituição das línguas, estrangeiras ou nacionais, como disciplinas escolares, no século XIX, obedece a um processo idêntico ao do Latim, pois o seu núcleo, composto pelos seus dois primeiros componentes, em sua parte teórica ou expositiva, encontrava-se já formulado pela Gramática Latina, cujos termos e classificações são também usados no ensino das Línguas Vivas. Os exercícios, da mesma forma, centrados inicial- mente na leitura, pronúncia, tradução, versão e composição, ti- nhamjá como suporte uma longa tradição, pois a Decisão de 1809, que criou as primeiras cadeiras de Línguas Vivas da América por- tuguesa (apud. OLIVEIRA,2006). mandava que os professores se- guissem, quanto ao "tempo", "horas das lições" e "attestações" do aproveitamento dos discípulos, o mesmo que se achava estabele- cido, "e praticado", pelos professores de Gramática Latina. 41 Luiz Eduardo Oliveira Referências ANDRADE.Antonio Alberto Banha de. 1978. A reforma pombalina dos estudos secundários no Brasil. São Paulo: Saraiva / EDUSP. AUROUX. Sylvaín. 1992. A revolução tecnológica da gramatização. 1radução: Eni Puccinelli Orlandi. Campinas: Editora da Unícamp. BICUDO. Joaquim de Campos. 1942. O ensino secundário no Brasil e sua legislação atual (de1931 a 1942 Inclusive). São Paulo: AlFES (Associação de Inspetores Federais de Ensino Secundário). CARVALHO.Rómulo de. 1959. 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Por essa razão, so- mente devem usar os Professores do método abreviado feito para uso das Escolas da Conqreqaçõo do Oratória, ou daArte de Gramática Latina reformada por Antonio Felix Mendes, que tem as referidas circunstâncias.·· • Versão anterior deste capítulo foi publicada em 2003, com o título de "Considerações sobre as figuras dos professores régios de línguas clássicas e modernas: notas para o estudo das origens da profissão docente no Brasil (1759-1809)", na Revista do Mestrado em Educação da Universidade Federal de Sergípe, n. 5, pp. 103-124 . •• "Instruções para os Professores de Gramática Latina. Grega, Hebraica e de Retórica", publicadas em 7 de julho de 1759. Luiz Eduardo Oliveira A forma escolar e a profissão docente o conceito de forma escolar, segundo seus principais de- fensores - Guy Víncent, Bernard Lahire e Daníel Thin -, em um artigo de 1994, foi elaborado no fmal dos anos de 1970, a partir dos trabalhos realizados pelo "Grupo de Pesquisa sobre a Sociali- zação", ligado à área de Sociologia da Educação, da Universidade Lumíêre Lyon 2, na França, que, numa "perspectiva de sociologia histórica", "írredutível a uma hístortograíía das instituições esco- lares", desenvolveram o uso que dele fizeram Reger Chartier, Domíruque Julia e Marie-Madeleine Compére em L'Éducation en France duXVI auXVIII siêcle, obra de 1976 (VINCENT, LAHlRE e THIN, 2001, p. 8). Tal é a versão que também nos conta António Nóvoa, pro- fessor da Universidade de Lisboa, quanto à origem do conceito, em sua proposta "Para o estudo sócio-histórico da gênese e de- senvolvimento da profissão docente", segundo capítulo de Le temps de professeurs: analyse sócio-historique de Ia profession enseígnante au Portugal (XVIII-XXsíêcle), de 1987: Os autores de L'Éducation en France duXVl auXVlIl siêcle, após haverem constatado que, contrariamente àquílo que se tomou evidente para as sociedades contemporâneas, a educação não é necessariamente escolartzação, afirmam que "os três séculos da época moderna são marcados em todo o Ocidente pelas conquistas da forma escolar em detrimento de alguns modos antigos de aprendizagem" (NÓVOA, 1991, p.242). Para o autor português, a gênese e o desenvolvimento da for- ma escolar devem ser relacionados a quatro fatores: a instauração de uma "ética protestante do trabalho", no sentido weberiano da expressão; a efetivação de normas regulando o uso do corpo (asseio, higiene, etc.), processo nomeado por Norbert Elias como "a civiliza- ção dos costumes"; o surgímento de uma nova concepção de infãn- 46 GRAMATIZAÇÃO E ESCOLARIZAÇÃO cia, tal como o entende Philipe Artes: e a inauguração da "socieda- de disciplinar", no conceito foucaultiano do termo. Na consolidação de tais fatores, muito teriam contribuído os colégios administrados pelas congregações religiosas, responsáveis pela conformação de uma nova instituição educacional (NÓVOA, 1991, p. 243-244). Assim, a partir do século XVI, o papel educativo teria passa- do por um deslocamento das comunidades e das famílias para a instituição escolar, que por sua vez servia tanto aos interesses das duas Reformas quanto aos da burguesia em ascensão'. Vincent, Lahire e Thin (2001), por sua vez, ao colocarem em pri- meiro plano o confronto entre "formas escriturais-escolares e for- mas sociais orais", também situam a "invenção" da forma escolar nos séculos XVIe XVII, relacionando-a às formas sociais-escriturais de transmissão do conhecimento e de exercício do poder. Segun- do os autores, a análise "sócíox-genétíca" do processo de pedago- gízação das relações sociais de aprendizagem - forma inédita de relação social entre mestre e aluno -; do surgímento de um tempo e de um espaço escolar específicos e da organização e codificação dos conteúdos ensinados, através de gramáticas e manuais de civilidades e da produção das disciplinas escolares, é condição necessária para o estabelecimento de relações entre a forma es- colar e outras formas sociais, assim como para o aprofundamento da questão das "culturas escritas". Relacionando a ausência de uma "forma propriamente es- colar" à inexistência de uma cultura escrita, em um artigo de 1995, Julia (2001, p. 28) trata do lento processo de profissionalização das figuras do mestre de escola elementar e do mestre do campo: I De acordo com Nóvoa (1991, p. 242). "a ação da burguesia. classe revolucionária por excelência. vai ser orientada por um conceito novo que será totalmente incompreensível para um homem da Idade Média; o de plasticidade. Este conceito forma um todo com a idéia de que o mundo é moldável. de que o homem é trW1Sjormável: portanto. de que se pode fazer uma sociedade diferente". 47 Luiz Eduardo Oliveira Em países católicos, pelo menos a aprendizagem das verda- des da salvação pôde ser feita por via puramente oral, atra- vés de um catecismo aprendido de cor, freqüentemente mes- mo em dialeto, posto que a Igreja, diferentemente dos Esta- dos, privilegia a língua vemácula local em detrimento da língua imposta pelo poder central: que necessidade então de um professor, se não se faz sentir a necessidade da escrita? Nóvoa, no referido artigo, afírma que é no século XVIII,quan- do o Estado toma o lugar da Igreja nas atribuições educativas, que se inicia o processo de institucionalização da profíssâo do- cente. Não que se tratasse de uma ruptura com o modelo educa- cional que vinha se desenvolvendo nos dois séculos anteriores, através de um novo projeto pedagógico, mas de uma espécie de renovação dos currículos e programas, e principalmente de um controle estatal concernente a todo o conjunto do sistema de en- sino, inclusive à seleção e recrutamento do pessoal docente: o processo de estatização da escola não começa senão por volta do fim do século XVIII; ele é indissociável: do movi- mento secular de emergência do Estado-Nação que se de- senvolve nos séculos XVIIIe XIX;de uma transformação pro- funda das concepções relativas à moral, que tendem a se libertar de uma definição estritamente religiosa; e da arran- cada da revolução industrial e da emancipação do capital industrial dos entraves coorporativos (NÓVOA,1991, p. 247).2 2 Não podemos esquecer do papel inovador. na França. das escolas urbanas desenvolvidas pelos lnnãos das Escolas Cristãs no final do século XVII. ou das petites écoLes e dos Colégios do Antigo Regime (VINCENT.LAHlRE e THIN. 2001. p. 12). Para Julia (2001. p. 28), "Jean Baptlste de La Salle pode bem ser considerado um inovador incômodo. que rompe com a tradição das congregações religiosas quando decide fundar um instituto de leigos - os lnnãos das Escolas Cristãs não são padres - que se excluem, por vocação. da cultura das elites para se consagrarem às escolas de caridade destinadas aos mais pobres: eles não ensinarão o latim, mas somente os rudimentos do ler, do escrever e do contar, e eles o farão em francês". 48 GRAMATIZAÇÃO E ESCOLARIZAÇÃO Segundo o autor, é curioso o aparente paradoxo que se dá com o fím do Antigo Regime, pois à liberação das forças produti- vas e das relações de produção dos entraves coorporativos corresponde um controle mais
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