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ASSUNTO FUNDAMENTOS SOCIOANTROPOLOGICOS DA SAUDE 7

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FUNDAMENTOS SOCIOANTROPOLOGICOS DA SAUDE
AULA 7
Aula 7: Pobreza, exclusão social e desigualdades sociais
Nesta aula, você irá:
1- Entender o lugar do sujeito na sociedade e sua relação com a vulnerabilidade no âmbito da saúde;
2- Relacionar pobreza, exclusão social e desigualdade social;
3- Entender como a desigualdade social, a pobreza e a exclusão social são determinantes nos estados de saúde ou doença;
4- Verificar as estratégias capazes de superar as dificuldades sociais presentes na sociedade brasileira.
A desigualdade como fenômeno humano
“Terá havido no mundo alguma sociedade realmente igualitária na qual as pessoas pudessem desfrutar de maneira semelhante os bens e as oportunidades da vida social?” (COSTA, 2005, p. 247).
Faz parte da natureza cultural humana a organização do espaço onde habita. Tal organização é o que permite a permanência do grupo, entendido como grupo social. No processo de organização do espaço, funções são atribuídas aos membros dos grupos, bem como formas específicas de ação( divisão do trabalho).
 A distribuição dos bens produzidos pelo grupo também se faz de acordo com algumas regras.(idade, sexo, classe)
Desta forma, a resposta à pergunta inicial é negativa. Parece que em todas as sociedades humanas sempre existiram formas de discriminar indivíduos ou grupos de indivíduos. Portanto, a discriminação faz parte do um processo humano de classificação, o que permite a organização e a sobrevivência das sociedades.
Se a resposta à pergunta inicial é tão óbvia como nos faz parecer, por que insistimos nela e por que está atrelada às ideias de pobreza e exclusão?
 Na realidade, o problema fundamental não é a discriminação no sentido classificatório, mas as consequências destas classificações. A questão se torna, de fato, um problema quando distinção e discriminação se tornam inequivalências.
Ao fenômeno da discriminação soma-se a função valorativa expressada pelo sentido de equivalência ou inequivalência atribuído a um elemento do sistema social. Ao que parece, à medida que as sociedades se tornam mais complexas, as fronteiras da igualdade pretendida vão se tornando cada vez mais distantes.
Por que a pobreza choca e incomoda?
Se, como vimos, não há sociedade (humana e não humana) sem organização, o que implica distinção e discriminação, por que algumas posições na estrutura da sociedade nos causam desconforto?
Se distinção e discriminação implicam em acessos desiguais aos bens produzidos pelo grupo, se são fenômenos presentes desde sempre nas sociedades humanas, por que nos incomoda ou nos choca a constatação de que parcelas da população não têm acesso a estes bens?
Todos os habitantes do planeta pertencem à família humana e, como tal, devem ser assistidos de forma igualitária ou equivalente. Devem ter acesso aos bens e serviços produzidos pelas sociedades.
As desigualdades são resultantes do não acesso aos bens e da aquisição do mínimo necessário para sua reprodução e manutenção biológica, social e emocional. Nas sociedades modernas e contemporâneas, a desigualdade é sinônimo de privilégio de alguns e de pobreza ou carência absoluta de outros. É este descompasso, que nega a família humana, que choca e incomoda.
Curiosamente, a quantidade de bens produzidos no planeta seria mais do que suficiente para garantir a manutenção de toda a população. Mais do que isto, ainda restaria excedente. Apesar destas teóricas evidências econômicas, o mundo assiste a uma crescente monopolização dos bens econômicos e sociais, gerando crescente concentração de renda.
 “É em meio à sociedade da abundância que a pobreza adquire um caráter contraditório e até paradoxal” (COSTA, 2005, p. 249).
A quantidade de bens produzidos pelas sociedades contemporâneas relaciona-se diretamente com seu caráter consumista. Pobreza e muito consumo convivem – sem contradição? – em nossas sociedades.
 
“Consumismo e abundância fazem parte desse ideário do bem-estar social no interior do qual as populações carentes não param de crescer” (COSTA, 2005, p. 249).
MEDINDO AS DESIGUALDADE
As desigualdades, a pobreza e a exclusão social não se resumem apenas à falta de bens materiais. Na verdade, uma série de elementos presentes na dinâmica das sociedades concorre para a caracterização de um grupo em certa categoria. Índices são criados a fim de medir e comparar características presentes em diferentes populações e grupos sociais.
 Assim ocorre com o IDH (INDICE DE DESEMVOLVIMENTO HUMANO) . Esta medida comparativa usada para classificar os países pelo seu grau de desenvolvimento humano é composta por uma escala de 0 a 1 e serve para demonstrar e analisar a qualidade de vida e desenvolvimento sem considerar apenas índices econômicos.
A medida leva em conta a expectativa de vida a partir do nascimento, a educação e renda e padrão de vida – PIB (PPC) per capita. O índice foi criado em 1990, e é utilizado pela ONU desde 1993.
 Na listagem do Índice de Desenvolvimento Humano de 2011 divulgado pelo PNUD (PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESEMVOLVIMENTO), o Brasil figura na 84ª posição entre os 187 países, registrando a escala de 0,718. A Noruega é o país com o maior índice de IDH, registrando a marca de 0,943 pontos, seguido por Austrália, Holanda, EUA e Nova Zelândia. Em último lugar, com o pior IDH, a República Democrática do Congo, com índice de 0,286.
 O IDH permite compreender o desenvolvimento humano dos países e grupos sociais, não só em relação a si mesmos, mas em comparação com outros países.
MULTIPLAS CARÊNCIAS
Podemos falar de diversas formas de pobreza ou despossessão: a psicológica, a social, a política. Cada uma delas, somadas às clássicas carências materiais e de sobrevivência, aprofundam as desigualdades e a vulnerabilidade social.
DESPOSSESSÃO PSICOLOGICA
A despossessão psicológica aponta para um sentimento de autodesvalorização das populações pobres em relação às ricas, ou de um país pobre em relação a um país rico.
DESPOSSESSÃO SOCIAL
A despossessão social relaciona-se à impossibilidade de parte da população de ter acesso a mecanismos que propiciem êxito social, permitindo a aquisição de prestígio e o desenvolvimento de relações sociais sólidas. Ela resume a exclusão de certos grupos sociais das escolhas e decisões na vida pública e nas ações políticas.
DESPOSSESSÃO TECNOLÓGICA
Ainda podemos acrescentar outra forma de “despossessão” ou pobreza produzida pelo mundo contemporâneo: a despossessão tecnológica. “Pessoas que não possuem ‘alfabetização digital’ estão excluídas dos mais diferentes espaços e da comunicação globalizada e, o mais importante, do mercado de trabalho também. A pobreza tecnológica aflige, envergonha e exclui” (COSTA, 2005, p. 251-152).
TEORIAS E EXPLICAÇÕES PARA AS DESIGUALDADES E A POBREZA : Sistema e Biologia.
Diversas são as formas de tentar explicar as causas das desigualdades, da pobreza e, consequentemente, da exclusão social. De um lado, pode-se argumentar a favor de uma teoria que conceba estes fenômenos como parte de estruturas sociais ou econômicas e das maneiras particulares como as relações entre os sujeitos e as formas de distribuição de bens sociais se dão.
 Por outro lado, pode-se pensar que as causas da pobreza e da exclusão estariam nos próprios sujeitos à margem, mais culpados de seu estado do que vítimas. Temos uma espécie de criminalização ou “culpabilização” dos sujeitos em condição de vulnerabilidade social.
Ora, ao que parece, estes dois modelos não são suficientes para fazer compreender a complexidade do fenômeno. Mas continuamos com interrogações. Por que, apesar de tantos avanços tecnológicos e mesmo sociais, a pobreza e a desigualdade permanecem, crescem e incomodam? Incomodam?
Dentre outras respostas possíveis, temos a ineficiência dos Estados em administrar racionalmente as produções e assistir de maneira equânime grupos e cidadãos.
Pobreza e criminalidade
Seriam os pobres criminosos? Esta pergunta retoma um pensamento importante (e incorreto) que tende a associar pobreza e criminalidade. Na verdade, pobreza e exclusão social são fenômenos que não estabelecemrelação necessária com a criminalidade.
 Na verdade, à medida que é estigmatizada, a pobreza é vista por alguns como anomalia potencialmente capaz de fazer adoecer o restante da sociedade. Assim, é criminalizada, combatida com violência ou negada, escondida, mascarada.
ATENÇÃO
Criminalizar a pobreza é mais uma estratégia (ideológica) para mantê-la afastada e excluída do convívio social, livrando os responsáveis pelo gerenciamento das instituições sociais de suas reais obrigações. “A pobreza gera distanciamento social, alienação e discriminação dos pobres” (COSTA, 2005, p. 257).
Corresponsabilizar toda a sociedade pelos processos de discriminação e exclusão dos segmentos mais vulneráveis da sociedade talvez seja um passo importante para a construção de novas (e mais humanas) formas de lidar com o outro.
 Como lembra Costa (2005, p. 259), “Não podemos esquecer, entretanto, que a opção por um sistema político que favoreça uma integração maior da população em geral à sociedade ainda é a forma mais eficiente de combate à pobreza”.
 E o que os profissionais de saúde têm a ver com isto?
A DESIGUALDADE COMO FENÔMENO ESTRUTURAL NA SOCIEDADE BRASILEIRA
Na aula anterior, vimos como o fenômeno da globalização provoca importantes mudanças nos grupos e sociedades. Atuando sobre diversos setores da sociedade ( ECONÔMICO, POLITICO, CULTURAIS, ETICOS-MORAIS E ETC.) a globalização aproxima grupos, intensifica a comunicação e o compartilhamento de informações, bens e serviços.
 Entretanto, a distribuição dos bens e serviços possibilitados pelo processo de globalização não se dá de forma igualitária entre os diversos grupos que compõem a sociedade.
 Mesmo antes da intensificação da aproximação dos mercados e economias, característico da globalização, os formadores da sociedade tinham acesso desigual aos produtos e serviços, bem como às políticas públicas.
Longe de estarem resolvidas, as desigualdades sociais são retroalimentadas pela pobreza e pelas diversas formas de exclusão (social, política, trabalho, digital, lazer, saúde etc.).
 As desigualdades e os antagonismos são sustentados e resultantes do intenso e abrangente desenvolvimento do capitalismo que força a movimentação de trabalhadores, principalmente em rota migratória do campo para as cidades em busca de terra, trabalho e condições de vida, além de garantia e direitos.
 O que tudo isto provoca? Como a sociedade se comporta? Que fotografia temos do nosso país quando o tema é a igualdade e desenvolvimento social?
Para Octavio Ianni, apoiado em um trabalho de Hélio Jaguaribe, de 1988, “Seriam duas sociedades superpostas, mescladas, mas diversas: ‘A característica fundamental da sociedade brasileira é seu profundo dualismo’. A um lado ‘encontra-se uma moderna sociedade industrial, que já é a oitava economia do mundo ocidental e acusa um extraordinário dinamismo’. No outro ‘encontra-se uma sociedade primitiva, vivendo em nível de subsistência, no mundo rural, ou em condições de miserável marginalidade urbana, ostentando os padrões de pobreza e ignorância comparáveis aos das mais atrasadas sociedades afro-asiáticas’” (IANNI, 2004, p. 106).
 É como se tivéssemos, pelo menos, “dois Brasis”: um da riqueza e outro da pobreza, da discriminação e da exclusão.
Pobreza, exclusão social e saúde: conexões
Para encerramos esta aula, vale pensar em algumas relações entre os estados de saúde-doença e as condições de pobreza, discriminação e vulnerabilidade.
 Diversos estudos apontam importantes relações entre mortalidade infantil e renda das famílias, nível de educação da mãe, as condições habitacionais, local onde se vive e situação social da família da criança.
Outros estudos estabelecem relações entre cor e mortalidade infantil; por exemplo: entre os negros, a mortalidade infantil média é de 34 óbitos por 1.000 nascidos vivos, contra 23 na população branca (BUSS, 2007, p. 1579).
Estas relações se multiplicam quando se considera escolaridade, região geográfica, acesso a serviços de saneamento básico e de saúde etc.
Podemos encerrar as discussões desta aula com um breve texto que nos coloca a responsabilidade de formular ações que minimizem as desigualdades e que promovam todos os seres humanos à categoria de cidadão incluídos, de fato, na chamada família humana.
 
“É muito importante a mobilização de profissionais de saúde em geral e de sanitaristas, em particular, de todo mundo na compreensão, crítica e luta contra a globalização injusta, a pobreza e a exclusão, contra a corrida armamentista e a violência, por um meio ambiente sustentável, pela equidade na saúde, pela paz e solidariedade entre todos os povos do mundo, para que alcancemos melhores condições de saúde e qualidade de vida não num futuro distante, mas hoje, aqui e agora!” (BUSS, 2007, p. 1588). 
Gabarito: O documentário mostra como, apesar do muito que se produz na sociedade brasileira, parte significativa da população ainda vive em estado de profunda miséria, postos depois dos animais na prioridade por escolha de alimentos. Destacando a pobreza e a exclusão social, o vídeo mostra a situação de vulnerabilidade a que estão submetidos certos segmentos da população brasileira.
 À medida que a saúde é compreendida como resultante de um complexo de ações e atenções votadas aos direitos fundamentais e ao acesso aos bens produzidos pela sociedade e administrado pelo Estado, vemos que a população da Ilha das Flores está desassistida e exposta a situações produtoras de adoecimento.

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