Buscar

LIVRO Educação na Cidade

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 356 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 356 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 356 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

Educação na Cidade:
Conceitos, Reflexões e Diálogos
Organizadores:
Dilza Côco
Nelson Martinelli Filho
Priscila de Souza Chisté
Sandra Soares Della Fonte
ACADÊMICO
Educação na cidade:
conceitos, reflexões e diálogos
Organizadores:
Dilza Côco
Nelson Martinelli Filho
Priscila de Souza Chisté
Sandra Soares Della Fonte
Educação na cidade:
conceitos, reflexões e diálogos
Vitória, 2018
© 2018 Programa de Pós-Graduação em Ensino de Humanidades – PPGEH
Todos os direitos reservados. 
É permitida a reprodução parcial desta obra, desde que citada a fonte. 
O conteúdo dos textos é de inteira responsabilidade dos autores
Biblioteca Nilo Peçanha do Instituto Federal do Espírito Santo
Educação na cidade : conceitos, reflexões e diálogos / organizadores Dilza Côco… 
[et al.]. - Vitória: Edifes, 2018.
 356p. : il. ; 22 cm. 
 ISBN: 978-85-8263-292-5 (Broch.)
 978-85-8263-293-2 (E-book)
 1. Educação - Filosofia. 2. Educação e Estado. 3. Educação – Vitória (ES). I. 
Martinelli Filho, Nelson. II. Côco, Dilza . III. Chisté, Priscila. IV. Della Fonte, Sandra 
Gomes. V. Título.
 CDD: 370.1
E24
Reitor: Jadir Jose Pela
Pró-Reitor de Administração e Orçamento: 
Lezi José Ferreira
Pró-Reitor de Desenvolvimento Institucional: 
Luciano de Oliveira Toledo
Pró-Reitora de Ensino: Adriana Pionttkovsky 
Barcellos
Pró-Reitor de Extensão: Renato Tannure 
Rotta de Almeida
Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação: 
André Romero da Silva
Programa de Pós-Graduação em Ensino de 
Humanidades – PPGEH
Av. Vitória, nº 1729 – Jucutuquara, 
29040-780 – Vitória – ES 
(27) 3331-2277
Coordenador: Antônio Donizetti Sgarbi
Campus Vitória
Diretor Geral: Hudson Luiz Cogo
Editora do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do 
Espírito Santo
R. Barão de Mauá, nº 30 – Jucutuquara
29040-689 – Vitória – ES
www.edifes.ifes.edu.br
editora@ifes.edu.br
Diretor de Ensino: Márcio Almeida Có
Diretora de Pesquisa e Pós-graduação: Marcia 
Regina Pereira Lima
Diretor de Extensão: Christian Mariani Lucas dos 
Santos
Diretor de Administração: Roseni da Costa Silva 
Pratti
Comitê Científico
Prof. Dr. Antônio Carlos Gomes
Prof. Dr. Leonardo Bis dos Santos
Profª. Drª. Sandra Aparecida Fraga da Silva
Revisão textual: André Luiz Neves Jacintho,
Nelson Martinelli Filho
Diagramação: Gabriela Maciel de Almeida
Imagem da capa: SAMÚ, Raphael. Sem título, 
1986. Serigrafia sobre papel. Acervo pessoal do 
artista.
Sumário
Prefácio....................................................................................................11
Apresentação...........................................................................................17
Considerações iniciais: proposta de constituição do grupo de estudos e 
pesquisas sobre a educação na cidade e humanidades (GEPECH)..........25
Dilza Côco 
Priscila de Souza Chisté
Sandra Soares Della Fonte
Capítulo I - Educação na cidade: conceitos e reflexões...........................33
Reflexões sobre cidade educativa, cidade educadora, 
município que educa e educação na cidade................................................35
Simone Oliveira Thompson de Vasconcelos
Priscila de Souza Chisté
Cidade e educação: breve ensaio sobre a questão
polissêmica e conceitual................................................................................61
Swami Cordeiro Bérgamo
Sandra Soares Della Fonte
A educação na cidade como atividade teleológica: 
paradigmas científicos de análise e suas intencionalidades....................78
Adriano de Souza Viana
Antonio Donizetti Sgarbi
Contribuições de Henri Lefebvre para a leitura da cidade.......................92
Priscila de Souza Chisté
Capítulo II - Educação na cidade de Vitória - Espírito Santo................123
A modernização da cidade de Vitória: 
reflexões sobre a história capixaba......................................................................125
Patrícia Guimarães Pinto
Priscila de Souza Chisté
Vitória (ES) nos cartões-postais:
a cidade em exposição e suas potencialidades educativas.....................156
Dilza Côco
Priscila de Souza Chisté
O Parque Moscoso como espaço educativo da cidade de Vitória - ES..198
Larissa Franco de Mello Aquino Pinheiro
Priscila de Souza Chisté
O direito à cidade e as questões ecológicas:
o problema capixaba do pó preto...............................................................223
Israel David de Oliveira Frois
Sandra Soares Della Fonte
A criança e a educação na cidade:
pensamentos inquietantes na educação infantil de Vitória..................240
Dina Lúcia Fraga 
Dilza Côco
Capítulo III - Educação na cidade e suas interfaces com a literatura...261
O outro e a cidade na literatura brasileira:
um diálogo entre Rubem Fonseca e as relações
de alteridade no espaço urbano..................................................................263
Letícia Queiroz de Carvalho
Lirismo e cidade – uma voz entre muitas vozes.......................................286
André Luiz Neves Jacintho
Letícia Queiroz de Carvalho
Miradas sobre las ciudades..........................................................................312
Gabino Cárdenas Olivares
María Estela Martínez Castro
Prefácio
O escritor Ítalo Calvino nos ensina que “jamais se deve con-
fundir uma cidade com o discurso que a descreve. Contudo, existe uma 
ligação entre eles” (1999, p. 59). Munidos dessa advertência é que 
vislumbramos a possibilidade de iniciar a leitura de Educação 
na cidade: conceitos, reflexões e diálogos. Uma coletânea de 
escritos que tratam da cidade a partir de um de seus aspectos 
mais interessantes: a sua relação com a educação. 
Tentar apreender a cidade por meio de pesquisas diversas asse-
melha-se um pouco à conhecida fábula dos cegos e do elefante: cada 
homem que se aproximava do animal tateava uma de suas partes e 
imaginava que ali se encontrava o todo de sua forma. Da mesma ma-
neira, cada um de nós, pesquisadores que nos aproximamos do ur-
bano na tentativa de apreendê-lo, o compreendemos por meio das 
nossas possibilidades, com nossa percepção filtrada pelos teóricos 
nos quais nos apoiamos, pela ideia de cidade através da qual nos mo-
vemos em nossas investigações, e pela abrangência que permitimos 
ao nosso olhar. As cidades, dessa maneira, tornam-se, para cada um 
de nós, um constructo engendrado pelos nossos interesses de pesqui-
sa, bem como pelas amplitudes e limitações de nosso conhecimento.
12
Podemos entender a alcunha “cidade” em uma concepção 
morfológica, um espaço físico composto de prédios e avenidas, 
pontes e túneis. Nessa perspectiva, vemos muitas vezes a cida-
de tomada como um problema espacial, quebra-cabeças ao qual 
o urbanismo tenta fornecer respostas. Podemos, ainda, ter nos-
so interesse voltado para as redes associativas que compõem a 
vida urbana, as suas dinâmicas e conflitos. Em outras palavras, 
aquilo que, de forma invisível, molda a configuração que esco-
lhemos para viver. A essa compreensão é a sociologia urbana que 
procura atender e providenciar contorno e abrangência. Temos 
aqueles que preferem entender a cidade como arena de dispu-
tas de poder, locus privilegiado no qual se corporificam os jogos 
de mercado e capital. O urbano, para estes, se torna sinônimo 
de negócio e as suas possibilidades são aquelas que podem ser 
quantificadas, transformando-se em oportunidades de lucro. É 
admissível, ainda, tentarmos vislumbrar a urbanidade por meio 
de suas representações, sejam as da literatura, da arte, da publici-
dade, do cinema. Para estes, as representações funcionam como 
uma forma de estender o olhar e a percepção até limites que não 
seriam atingidos apenas com a observaçãodireta da dinâmica ci-
tadina. E há, ainda, os que se alimentam da vida urbana, vendo a 
cidade como musa, inspiração ou palco para as suas ideias. São 
os adeptos daquilo que é defendido por Baudelaire quando afir-
ma que “jouir de la foule est un art” (“apreciar a multidão é uma 
arte”). Esses criam. Sua arte, seus discursos ou suas pesquisas são 
alimentados pela energia proveniente dessa reunião de pessoas 
diferentes ocupando o mesmo espaço, da tensão que tal convívio 
produz, dos embates e das interações que brotam do chão das 
metrópoles. Cidade, nessa concepção, é um poderoso catalisador 
de forças e energias.
Assim, se são múltiplas as formas através das quais pode-
mos olhar para qualquer objeto de pesquisa, quando esse objeto 
Educação na cidade: conceitos, reflexões e diálogos 13
é tão diverso quanto uma cidade, essas possibilidades chegam 
ao infinito. Talvez seja essa riqueza de pontos de vista que a 
torne tão interessante como depositária de nossos interesses 
e esforços. Cidades são ilimitadas, cidades são desafiadoras. 
Na confluência de algumas perspectivas de olhares para a di-
nâmica citadina é que podemos situar os textos que compõem 
esse livro. Os pesquisadores aqui reunidos olham, cada um a 
seu modo, para o mesmo objeto e nos mostram o que veem. Tal 
como Calvino, que faz com que o seu personagem Marco Pólo 
descreva ao imperador Kublai Kahn múltiplas cidades através 
daquela que mora em seu coração – e que, ao final de Cidades 
Invisíveis ficamos sabendo tratar-se de Veneza –, os textos que 
compõem esta coletânea nos apresentam pontos de vista que 
se alternam, complementam, contrapõem, para que, ao findar 
a leitura, possamos nós, leitores, formar o nosso panorama pes-
soal sobre o tema. 
Oriundos das discussões e investigações do Grupo de Es-
tudos e Pesquisas sobre Educação na Cidade e Humanidades 
(GEPECH), ligado ao Programa de Pós-Graduação em Ensino de 
Humanidades (PPGEH) do Ifes, os textos que aqui se reúnem são 
divididos em três capítulos: Educação na cidade: conceitos e 
reflexões; Educação na cidade de Vitória - Espírito Santo 
e Educação na cidade e suas interfaces com a literatura. 
Sob esses temas, vários artigos se desenvolvem. Em cada um 
deles temos a oportunidade de acompanhar um dos fenôme-
nos mais interessantes para um pesquisador: o desabrochar do 
pensamento sobre um tema. Assim, através de Simone Olivei-
ra Thompson de Vasconcelos, Priscila de Souza Chisté, Swami 
Cordeiro Bérgamo, Sandra Soares Della Fonte, Adriano de Souza 
Viana e Antonio Donizetti Sgarbi temos a chance de seguir as 
considerações sobre o papel da cidade na educação e os concei-
tos que devem ser priorizados nesse percurso. No capítulo se-
14
guinte, Patrícia Guimarães Pinto, Priscila de Souza Chisté, Dilza 
Côco, Larissa Franco de Mello Aquino Pinheiro, Israel David de 
Oliveira Frois, Sandra Soares Della Fonte e Dina Lúcia Fraga tra-
tam especificamente da cidade de Vitória, abordando diversos 
aspectos que podem ser considerados na educação citadina na 
referida cidade. Finalmente, no terceiro capítulo, Letícia Queiroz 
de Carvalho, André Luiz Neves Jacintho, Gabino Cárdenas Oliva-
res e María Estela Martínez Castro nos trazem a literatura como 
espelho através do qual podemos ver o urbano e suas dinâmicas.
Saímos deste livro – como acontece com as melhores leitu-
ras – com mais questões do que respostas. As perspectivas apre-
sentadas nos instigam, provocam, esclarecem, estimulam. Tal 
como a cidade que lhes deu origem, são plurais e desafiadoras. 
Ao findar, junto com as inquietações originárias da leitura, nos 
vêm também o desejo de que as pesquisas prossigam, que as 
questões que aqui desfilam deem lugar a outras, que os autores 
avancem cada vez mais em suas investigações, e que possamos 
ler outras produções do GEPECH em breve. 
Eliana Kuster
Apresentação
Por mais que a cidade preexista ao capitalismo, o processo 
de industrialização conferiu a ela e à realidade urbana em geral 
uma nova configuração. Segundo Lefebvre (2011)1, a industria-
lização fez um assalto à cidade e a transformou no palco dos 
principais conflitos sociais.
As relações sociais capitalistas ganharam vida na terri-
torialidade e no ritmo de vida da cidade. Circuitos de riqueza, 
com seus sistemas de segurança, convivem com os aglomera-
dos de miséria, com seus poderes paralelos ao estatal. A distri-
buição e a qualidade de moradias, comércio, instituições de en-
sino, transporte coletivo, saneamento básico e infraestrutura, 
espaços e equipamentos de lazer e estabelecimentos de saúde 
revelam uma cidade segregada e fraturada. 
Não por acaso Harvey (2012, 2009a, 2009b)2 evidencia como as 
formas espaciais e temporais contemporâneas de nossas cidades 
se transformaram em fragmentos, com comunidades fechadas, 
privatização de espaços públicos, formação de vários microes-
tados. Para esse autor, a “acumulação por despossessão” (HAR-
VEY, 2012, p. 83) tem desobstruído bairros pobres, capturado 
18
terras para incrementar a atividade imobiliária. Em muitos ca-
sos, o mercado imobiliário urbano associado ao capital finan-
ceiro e ao apoio do Estado tem desempenhado função relevante 
na absorção e geração de capitais excedentes em escala cres-
cente, “[...] mas ao preço do explosivo processo de destruição 
criativa que tem desapropriado as massas de qualquer direito à 
cidade” (HARVEY, 2012, p. 85).
Como “lugar de consumo e consumo de lugar” (LEFEBVRE, 
2011, p. 20), a cidade não apenas articula a desigualdade social 
à segregação espaço-social urbana, mas também aloja o confli-
to constitutivo de toda mercadoria: “[...] a cidade e a realidade 
urbana dependem do valor de uso. O valor de troca e a genera-
lização da mercadoria pela industrialização tendem a destruir, 
ao subordiná-las a si [...]” (LEFEBVRE, 2011, p. 14).
Para Lefebvre (2011), a complexidade de tal situação coloca 
desafios para a reflexão teórica, para a ação prática e a ima-
ginação. Por isso, filosofia, arte e ciência se veem obrigadas a 
reconsiderar esse fenômeno.
Abraçamos essa tarefa a partir de uma preocupação educa-
tiva. Os cidadãos constroem as cidades e, por sua vez, as cidades 
formam seus cidadãos. Nesse sentido, a configuração da cidade 
nos seus espaços e tempos carreiam uma orientação pedagógi-
ca. Em outros termos, a cidade condensa a história dos grupos e 
dos conflitos que, sob certas condições históricas, a realizaram. 
Entrar em contato com essa história faz da experiência urbana 
uma relação entre gerações de transmissão e incorporação in-
tencional de modos de vida próprios, valores, ritmos e rotinas, 
maneiras de agir, práticas imaginativas e artísticas, formas de 
1LEFEBVRE, Henri. O direito à cidade. 5. ed. São Paulo: Centauro, 2011. 
2HARVEY, David. Alternativas ao neoliberalismo e o direito à cidade. Novos Cadernos 
NAEA, Belém, v. 12, n. 2, p. 269-274, dez. 2009a.
HARVEY, David. A liberdade da cidade. Espaço e Tempo, São Paulo, n. 26, p. 9-17, 2009b.
HARVEY, David. O direito à cidade. Lutas Sociais, São Paulo, n. 229, p. 73-89, jul./dez.2012.
Educação na cidade: conceitos, reflexões e diálogos 19
sociabilidade e de mobilidade, confrontos e contradições. Como 
atesta Arroyo (1997, p. 25)3, “A dinâmica urbana como um todo 
é educativa [...]”.
Se o arranjo da cidade e da urbanidade como um todo é, por 
si, um agente educativo e investe na formação subjetiva de seus 
habitantes, torna-se premente aprender a ler a grafia social ins-
crita nessa ordenação citadina. Em outras palavras, desvendar 
suas ruas e seus nomes, suas sedes administrativas, os recortes 
de seus bairros, a concentração de sua população, suas praças e 
parques, os monumentos públicos, suas formas arquitetônicas, 
a localização de suas indústriase fábricas, o seu ritmo do tra-
balho, a sua condição ambiental-ecológica, seus lugares de en-
contros, suas rotas de mobilidade, a sua distribuição da riqueza 
material e simbólica e seus confrontos de classe.
Para exercitar essa tarefa, não se pode abrir mão de um 
vagueio errático pela cidade. Por certo, não se trata do vagar 
da multidão, empurrada pelos semáforos prestes a fechar, pelo 
tempo acelerado da atividade produtiva, pelo olhar negligen-
te e epidérmico que satisfaz às demandas emergenciais de se 
chegar ao trabalho ou em casa. A experiência que se conclama 
é errante e desacelerada; paciente, ela experimenta e conhe-
ce; inquieta, vê, cheira, toca, ouve o que a cidade nos diz. Está 
longe de ser passiva: retruca seus dizeres, regozija-se com seus 
acertos, dialoga com a cidade, a indaga em seu existir. No fundo, 
o diálogo com a cidade é um auto diálogo, um colóquio com a 
cidade que construímos e que nos construiu, portanto, com a 
cidade que existe também em nós.
Segundo Lefebvre (2011), o direito à cidade é um apelo e 
uma exigência. Por mais que reformas sejam relevantes, só um 
processo revolucionário pode nos assegurá-lo. Por isso, reco-
3ARROYO, Miguel G. O aprendizado do direito à cidade. Educação em Revista, Belo Hori-
zonte, n. 26, p. 23-38, dez. 1997.
20
nhecemos que evidenciar os projetos educativos que na cidade 
se materializam e se chocam pode ser uma ação insuficiente 
para a conquista e o exercício efetivo desse direito, mas, nem 
por isso, menos importante. Bem cumprida, essa ação pode ins-
pirar a projeção de formas rebeldes de intervenção. De alguma 
maneira, os capítulos deste livro se alimentam desse horizon-
te e pretendem, a partir de preocupações variadas, reeducar o 
nosso olhar a cidade, de vivê-la e construí-la. 
Para tanto, insistimos, com Lefebvre (2011), que os pro-
dutores da cidade têm direito de dela se apropriar. Afinal, “O 
direito à cidade, como ele está constituído agora, está extre-
mamente confinado, restrito na maioria dos casos à pequena 
elite política e econômica, que está em posição de moldar as 
cidades cada vez mais ao seu gosto” (HARVEY, 2012, p. 87). As-
sim, contra a cidade mercadoria, coloca-se a necessidade de 
uma construção coletiva do direito à cidade, como caracteri-
zado por Lefebvre (2011): um direito humano de natureza so-
cial vinculado à liberdade, à individualização na socialização, 
ao habitat e ao habitar. Trata-se, segundo ele, de um direito à 
vida urbana, movida não pela industrialização, mas por neces-
sidades sociais com fundamentos antropológicos, rumo a uma 
nova práxis e a um novo ser humano, “o homem da sociedade 
urbana” (LEFEBVRE, 2011, p. 108).
Se o humano é o sentido primeiro e último da sociedade 
urbana, 
[...] então a questão sobre qual tipo de cidade queremos não 
pode estar divorciada da questão sobre qual tipo de pessoas 
desejamos ser, quais tipos de relações sociais buscamos, qual 
relação nutrimos com a natureza, qual modo de vida deseja-
mos. [...] O direito à cidade está, por isso, além de um direito 
ao acesso àquilo que já existe: é um direito de mudar a cidade 
mais de acordo com o nosso desejo íntimo. A liberdade para 
nos fazermos e nos refazermos, assim como nossas cidades, 
Educação na cidade: conceitos, reflexões e diálogos 21
é um dos mais preciosos, ainda que dos mais negligenciados, 
dos nossos direitos humanos (HARVEY, 2009a, p. 09).
Por isso, o direito à cidade se situa no confronto geral con-
tra o capital. Lefebvre caracteriza que o fundamento antropo-
lógico que advém do processo revolucionário de superação do 
capital clama por um ser humano rico. Contudo, nesse contex-
to, a riqueza não diz respeito à propriedade privada: “O homem 
da sociedade urbana já é um homem rico em necessidades: o 
homem de necessidades ricas que aguardam a objetivação, a 
realização” (LEFEBVRE, 2011, p. 124-125).
A base marxiana é claramente perceptível. O ser huma-
no rico é criado pela e criador da ruptura da sociabilidade 
burguesa. Em contraposição à unilateralidade restrita do de-
senvolvimento sob o capitalismo, ele experimenta a eman-
cipação completa das qualidades e dos sentidos humanos; 
emancipação de todos os seres humanos, emancipação do ser 
humano por inteiro. 
Nos Manuscritos econômico-filosóficos, Marx (2004)4 contrasta 
o ser humano fraturado pela divisão social do trabalho com o 
ser humano total. Sob o pressuposto do socialismo, Marx (2004, 
p. 139) fala da “riqueza (Reichheit) das carências humanas” e, 
portanto, de um novo modo de produção e de um novo objeto da 
produção. Assim, ele entrevê o enriquecimento da essência hu-
mana sob outra lógica que não o acumular, o ter. Nesse con-
texto, riqueza e pobreza alcançam uma significação que tem o 
ser humano como seu fim. Por isso, Marx afirma: “O homem 
rico é simultaneamente o homem carente de uma totalidade da 
manifestação humana da vida. [...] que deixa sentir ao homem 
a maior riqueza, o outro homem como necessidade (Bedürfnis)” 
(MARX, 2004, p. 112-113). Ainda de acordo com Marx (2004, p. 
 4MARX, Karl. Manuscritos econômico-filosóficos. São Paulo: Boitempo, 2004.
22
161), o ser humano rico é educado para usufruir a arte, apreciar 
a beleza, agir de modo estimulante e encorajador sobre os ou-
tros, trocar amor por amor.
Criada e criadora desse novo ser humano, a sociedade ur-
bana em um horizonte socialista também assume uma dimen-
são omnilateral. A citação é longa, mas vale a pena acompanhar 
a descrição de Lefebvre ao se referir às necessidades sociais que 
servirão de motor para as transformações urbanas:
[...] opostas e complementares, compreendem a necessidade 
de segurança e a de abertura, a necessidade de certeza e a ne-
cessidade de aventura, a da organização do trabalho e a do 
jogo, as necessidades de previsibilidade e a do imprevisto, de 
unidade e de diferença, de isolamento e de encontro, de trocas 
e de investimentos, de independência (e mesmo de solidão) e 
de comunicação, de imediaticidade e de perspectiva a longo 
prazo. O ser humano tem também a necessidade de acumu-
lar energias e a necessidade de gastá-las, e mesmo de desper-
diça-las no jogo. Tem necessidade de ver, de ouvir, de tocar, 
de degustar, e a necessidade de reunir essas percepções num 
“mundo”. A essas necessidades antropológicas socialmente 
elaboradas (isto é, ora separadas, ora reunidas, aqui comprimi-
das e ali hipertrofiadas) acrescentam-se necessidades especí-
ficas [...]. Trata-se da necessidade de uma atividade criadora (e 
não apenas de produtos e bens materiais consumíveis), neces-
sidades de informação, de simbolismo, de imaginário, de ativi-
dades lúdicas. [...] que superam mais ou menos a divisão par-
celar dos trabalhos. Enfim, a necessidade da cidade e da vida 
urbana só se exprime livremente nas perspectivas que tentam 
aqui se isolar e abrir horizontes (LEFEBVRE, 2011, p. 105).
Deixemo-nos contagiar por esse horizonte político e teórico!
Sandra Soares Della Fonte
Educação na cidade: conceitos, reflexões e diálogos 23
24
Considerações iniciais: proposta de
constituição do grupo de estudos e pesqui-
sas sobre educação na cidade e humanida-
des (Gepech)
Os estudos sobre a cidade apresentam-se como temáti-
ca importante no campo da educação, pois contribuem para a 
compreensão dos aspectos históricos, políticos, sociais, cultu-
rais, filosóficos e econômicos referentes ao desenvolvimento 
urbano. A partir de consulta realizada em janeiro de 2016 ao 
Diretório de Grupos de Pesquisas cadastrados e certificados 
pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tec-
nológico (CNPq), constatamos que poucos são os grupos que 
abarcam discussões sobre Cidade e Educação. Dos 312 registros 
encontrados a partir do descritor “cidade”, apenas seis grupos 
de pesquisaestão concentrados na área da Educação.
A possibilidade de contribuir com esse nicho de pesquisa 
favoreceu a constituição de um grupo de estudos que integrasse 
alunos e professores do Programa de Pós-Graduação em Ensi-
no de Humanidades do Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes) 
para a discussão da cidade como espaço potencial para ações 
26
educativas. Desse modo, o Grupo de Estudos sobre Educação 
na Cidade e Humanidades (Gepech) iniciou suas atividades em 
março de 2016, compondo uma das linhas do Grupo de Pesquisa 
“Artes Visuais, Literatura, Ciências e Matemática: diálogos pos-
síveis” cadastrado no CNPq.
Ao idealizarmos o Gepech, elencamos como os seus obje-
tivos: 1) discutir relações entre a cidade e a educação a partir 
de áreas do conhecimento ligadas às humanidades; 2) planejar, 
executar e avaliar formações de professores da educação básica 
que contribuam com reflexões sobre os espaços da cidade; bem 
como 3) sistematizar materiais educativos que discutam e apre-
sentem propostas relacionadas com a cidade. 
As reuniões do grupo iniciaram juntamente com o recém 
implementado Mestrado Profissional em Ensino de Humanida-
des e ocorreram semanalmente com duas horas de duração cada 
encontro. Para a organização das atividades do Gepech, optamos 
por um referencial de abordagem crítica e dialógica, conforme 
proposições de Bakhtin (2003)5. Essa perspectiva valoriza a in-
teração discursiva, em suas diferentes formas e manifestações, 
na promoção do conhecimento e na constituição dos sujeitos.
A partir desse alinhamento teórico, as reuniões semanais 
do grupo se configuraram como eventos que promoveram en-
contros repletos de enunciados sobre/com a cidade. Encontros 
eEsses que encontros potencializaram diálogos entre os par-
ticipantes e desstes com textos de referência sobre a cidade, 
com outros pesquisadores que elegem o tema cidade como foco 
principal de estudos, assim como com exposições culturais que 
apresentam a cidade por meio de roteiros discursivos diversos. 
Nessa dinâmica, várias vozes foram contempladas na configu-
ração de novos textos e, por consequência, promoveram a ela-
5BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
Educação na cidade: conceitos, reflexões e diálogos 27
boração de outras compreensões pelos participantes, a respeito 
do conceito cidade e, mais especificamente, sobre a cidade de 
Vitória, no Espírito Santo. 
O grupo estabeleceu diálogo com textos teóricos de autores 
como Lefebvre (1991, 1999)6; Canevacci (2004)7; Harvey (2014)8; 
Silva (1979)9, Klug (2009)10 e outros. Essa sequência de autores 
não foi definida a priori, mas sintetiza uma construção coletiva, 
pois foi acessada e integrada ao cronograma de estudos a partir 
de diálogos entre os participantes e com as primeiras referên-
cias que abordavam a noção de educação e cidade. Assim, na 
medida em que desenvolviam os primeiros estudos, professores 
e alunos tomavam ciência de outras fontes consideradas rele-
vantes para a exploração da temática privilegiada pelo grupo. 
Tal dinâmica de interação com os textos e a consequen-
te produção e reelaboração do cronograma indicam relações 
com a noção de inacabamento da palavra, pois, conforme 
Bakhtin (2005, p. 195)11, as palavras do outro comportam um 
limiar e, ao serem “[...] introduzidas em nossa fala, são reves-
tidas inevitavelmente de algo novo, da nossa compreensão e 
da nossa avaliação”. Desse modo, a leitura dos textos numa 
perspectiva dialógica pressupõe que um texto abre possibili-
dades para outros textos, alimentando o fluxo da comunica-
ção verbal (BAKHTIN, 2004)12 sobre a cidade. Assim, as leituras 
das obras iniciais apontavam para novas fontes e, por meio 
de atitudes ativas e responsivas (BAKHTIN, 2004), os partici-
pantes contribuíram com a construção do roteiro de estudos e 
exploração do conteúdo. 
Essa dinâmica participativa e colaborativa presente na 
construção do cronograma das ações do Gepech foi ampliada 
nos momentos de estudos e discussões coletivas. Ampliadas 
porque os integrantes do grupo assumiam atitudes de prota-
gonismo quando realizavam as leituras das obras e sistema-
28
tizavam roteiros de discussões para exploração de conceitos 
considerados importantes para a produção das propostas de 
pesquisas e elaboração de materiais educativos, desenvolvidos 
pelo Gepech, numa perspectiva crítica. Assim, esses encontros 
favoreceram a compreensão de conceitos-chave, como o de ci-
dade educativa, amplamente divulgado pelos documentos for-
mulados pela Unesco, porém com muitas questões que guar-
dam potencial de problematizações, conforme discutido por 
Silva (1979) e Chisté e Sgarbi (2015)13. Essas problematizações 
puderam ser pensadas de modo mais aprofundado com estudos 
de outros autores como Lefebvre (1991, 1999), de base marxia-
na, que apresenta fundamentos importantes para compreender 
os problemas da cidade e seu processo de urbanização. Nessa 
linha de proposições e também a partir do materialismo his-
tórico-dialético, Harvey (2014) foi outro autor que contribuiu 
para que os participantes do Gepech entendessem questões so-
bre o direito à cidade como direito humano. A partir de estu-
dos oriundos da geografia urbana e de cunho marxiano, Harvey 
(2014) evidencia que esse direito é prejudicado devido a rela-
ções capitalistas orientarem a vida na cidade em uma perspec-
6LEFEBVRE, Henri. A Revolução Urbana. Belo Horizonte: Editora UFMG, 1999. 
LEFEBVRE, Henri. O direito à cidade. São Paulo: Moraes, 1991.
7CANEVACCI, Massimo. A cidade polifônica: ensaio sobre a antropologia da 
comunicação urbana. São Paulo: Studio Nobel, 2004.
8HARVEY, David. Cidades Rebeldes. São Paulo: Martins Fontes, 2014.
9SILVA, Jefferson Idelfonso da. Cidade Educativa: um modelo de renovação 
da educação. São Paulo: Cortêz & Moraes, 1979.
10KLUG, Letícia Beccalli. Vitória: sítio físico e paisagem. Vitória: Edufes, 2009.
11BAKHTIN, M. Problemas da poética de Dostoiévski. Rio de Janeiro: Forense 
Universitária, 2005.
12BAKHTIN, M. Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais 
do método sociológico na ciência da linguagem. São Paulo: Editora Hucitec, 2004.
13CHISTÉ, Priscila de Souza; SGARBI, Antonio Donizetti. Cidade educativa: re-
flexões sobre educação, cidadania, escola e formação humana. Revista Deba-
tes em Educação Científica e Tecnológica, Vitória, v. 6, n. 1, out. 2015.
Educação na cidade: conceitos, reflexões e diálogos 29
tiva de predomínio do direito individual à propriedade em de-
trimento ao direito coletivo. Essa noção de direito à cidade pode 
ser pensada a partir de uma chave de leitura apresentada na 
obra Cidade polifônica, de Canevacci (2004). Este autor indica que 
fazer a leitura da cidade implica atentar para aspectos de natu-
reza polifônica, ler os diferentes elementos que a integram, es-
tabelecendo interconexões. Mostra, a partir de pressupostos de 
Bakhtin, que é importante conhecer as formas arquitetônicas 
da cidade, suas relações com a organização de poder, bem como 
a comunicação com os demais elementos do entorno.
As proposições conceituais desenvolvidas por esses auto-
res nos levaram a refinar nosso olhar sobre a cidade de Vitória, 
capital do Espírito Santo, foco de nossas pesquisas. Nessa dire-
ção, Klug (2009) nos apresenta análises do processo de desen-
volvimento e ocupação da cidade de Vitória, fato que estimu-
lou nos participantes do Gepech um novo olhar sobre o espaço 
urbano, com atenção aos patrimônios naturais e históricos que 
ainda resistem ao processo de especulação imobiliária ocorrido 
no centro histórico da capital.
 Além da dinâmica de estudos sobre a cidade a partir de 
fontes bibliográficas, o Gepech também promoveu interlocu-
ção com pesquisadores por meio de palestras e entrevistas. Em 
relação àspalestras, tivemos oportunidade de contar com as 
presenças dos doutores Érika Sabino de Macêdo, Eliana Kuster 
e Gilton Luis Ferreira. Com a professora Macêdo, notamos a im-
portância de ler a cidade e suas problematizações a partir do 
grafitti. Para a pesquisadora, trata-se de manifestação artísti-
ca e crítica que apresenta reflexões e problematizações sobre 
temas diversos presentes na vida urbana, dentre eles a polui-
ção do ar da cidade de Vitória/ES. As considerações de Macê-
do contribuem para construir outras formas de ver, interagir e 
compreender marcas e discursos inscritos na cidade que podem 
30
evidenciar conflitos e contradições. 
Seguindo essa tendência, a professora Kuster apresenta o 
potencial de leitura da cidade a partir de elementos da arquite-
tura. Explora conhecimentos da arquitetura da cidade, em suas 
formas antigas e modernas, estabelecendo diálogos diversos com 
obras de arte, com fatos da história, com a literatura e com estra-
tégias de ocupação dos espaços físicos dentre outros elementos. 
Com o terceiro palestrante, professor Ferreira, tivemos 
a oportunidade de conhecer maiores detalhes do processo de 
modernização do estado do Espírito Santo a partir de aspec-
tos históricos, políticos, econômicos e sociais. Nessa direção, 
Ferreira explica que as ações inerentes à modernização do Es-
pírito Santo se revestiu de um processo de atualização, trans-
formando o que era velho, ou simplesmente descartando-o. 
As ponderações dos palestrantes mostraram conexões com 
questões comentadas por pesquisadoras da Universidade de 
São Paulo (USP) e pelo coordenador do Instituto Paulo Freire, 
entrevistados pelas coordenadoras do Gepech. Essas entrevistas 
foram realizadas em 2016, registradas por meio de videograva-
ção e exibidas durante os encontros de estudos com o objetivo 
de adensar compreensões sobre aspectos inerentes aos estudos 
da cidade. As conversas com as professoras Fraya Frehse, da Fa-
culdade de Sociologia (USP), e Joana Mello e Ana Castro, da Fa-
culdade de Arquitetura e Urbanismo (USP), ressaltaram o valor 
de aspectos históricos e sociais para entender as mudanças que 
ocorreram na cidade de São Paulo e suas implicações para a vida 
coletiva. Articulado a esse investimento de estudos e pesquisas, 
as professoras apostam na formação de professores numa abor-
dagem de interação com a cidade por meio de roteiros espe-
cíficos. Essas entrevistas ofereceram contribuições ao Gepech 
especialmente por indicar a potência de processos formativos 
de docentes para contemplar a educação na cidade como estra-
Educação na cidade: conceitos, reflexões e diálogos 31
tégia de acesso aos conhecimentos elaborados. 
A entrevista com Paulo Roberto Padilha (Instituto Paulo 
Freire) foi fundamental para compreender a inserção de Paulo 
Freire nas discussões relacionadas com a educação na cidade. O 
pesquisador nos apresenta na ocasião a proposta da Rede Muni-
cípio que Educa como modo de renovar proposições implemen-
tadas pela Unesco conhecidas como Cidade Educativa.
Além das entrevistas, o Gepech ainda realizou visitas a 
exposições que exploravam temas com e sobre a cidade. Com 
a cidade porque as exposições foram organizadas em espaços 
históricos, como o Espaço Cultural Palácio Anchieta e o Museu 
Vale. Adentrar nesses espaços possibilitou experiências dos 
membros do Gepech aproximando-os de conhecimentos histó-
ricos, políticos, econômicos, sociais, materializados na estrutu-
ra física das construções visitadas. 
 A sistematização e as repercussões das várias ações 
(estudos bibliográficos, palestras, entrevistas e visitas a expo-
sições) que integraram a metodologia de estudos do Gepech, 
nos permitem visualizar um caminho percorrido que contri-
buiu para aprendizagens e para reelaborações de conceitos. En-
tendemos esse percurso como primeiras ações de estudos que 
precisam ser intensificadas e aprofundadas, especialmente com 
atividades de pesquisas. Como modo de contribuir e compar-
tilhar os conhecimentos sistematizados por esse processo de 
estudos, o grupo ofertou em maio de 2017 curso de formação 
de professores para a divulgação de materiais educativos que 
contemplam vários aspectos da cidade de Vitória em meio aos 
acontecimentos econômicos, políticos, ecológicos e sociais que 
colaboraram com a sua transformação.
Finalizamos este texto ressaltando a importância das ações 
realizadas como direcionadoras de novos estudos coletivos, 
bem como a produção de pesquisas a partir dos temas de inves-
32
tigação desenvolvidos pelos participantes do grupo em diálogo 
com o campo educacional. Deixamos nosso agradecimento a to-
dos que colaboram com os estudos empreendidos e esperamos 
que este livro, fruto do primeiro ano de estudos, possa contri-
buir para o debate sobre a educação na cidade, ampliando con-
ceitos, reflexões e diálogos.
Dilza Côco 
Nelson Martinelli Filho
Priscila de Souza Chisté
Sandra Soares Della Fonte
Educação na cidade: conceitos, refl exões e diálogos 33
Capítulo I
Educação na cidade: 
conceitos e refl exões
34
Reflexões sobre cidade educativa, 
cidade educadora, município que
educa e educação na cidade
Simone Oliveira Thompson de Vasconcelos
Priscila de Souza Chisté
A aldeia de Hollywood foi planejada de acordo com a noção
Que as pessoas desse lugar fazem do Paraíso. Nesse lugar
Elas chegaram à conclusão de que Deus,
Necessitando de um Paraíso e de um Inferno, não precisou
Planejar dois estabelecimentos, mas
Apenas um: o Paraíso. Que esse,
Para os pobres e infortunados, funciona
Como inferno.
(Bertold Brecht, 1942)
A cidade14 é objeto de várias abordagens de estudo. Segun-
do Maricato (2015), ela pode ser lida de modos especiais: como 
um discurso, pelo viés da estética, como manifestação de prá-
ticas culturais e artísticas, como legado histórico, como palco 
14O dicionário de filosofia de Japiassú e Marcondes (2008) apresenta o verbete 
“cidade”, oriundo do latim civitas e do grego polis, como coletividade políti-
ca organizada, possuindo um mínimo de autonomia e mantida por leis.
36
para conflitos sociais, como espaço de reprodução do capital, 
entre outros possíveis focos interpretativos. Diante desses vá-
rios campos de pesquisa, neste capítulo buscaremos apresentar 
discussão que relaciona a cidade ao campo da educação15, em 
especial por discutirmos termos e conceitos que se referem à 
“cidade educativa”, “cidade educadora”, “município que edu-
ca” e “educação na cidade” a fim de compor debate que visa 
desvelar os motivos que movimentaram a criação de tais ter-
mos e vislumbrar possíveis alternativas conceituais que am-
pliem as discussões sobre cidade e potencializem suas relações 
com a educação.
Como modo de alcançar o objetivo traçado, analisaremos 
o termo “cidade educativa” proposto pelo relatório Aprender 
a Ser, elaborado por uma Comissão da Unesco/ONU, liderada 
por Edgar Faure em 1972 e publicado em 1973, com o objeti-
vo de estudar o caminho de soluções globais para as grandes 
questões colocadas pelo desenvolvimento da educação em um 
mundo de transformações. Em contraponto a esse documento 
apresentaremos reflexões de Jefferson Ildefonso Silva, no livro 
Cidade educativa: um modelo de renovação da educação. 
A seguir, examinaremos o termo “cidade educadora” pro-
posto pela Associação Internacional de Cidades Educadoras 
(AICE). Discorreremos sobre algumas publicações da Associa-
ção Internacional de Cidades Educadoras (AICE), dentre elas, 
a Carta das Cidades Educadoras, o livro Cidade Educadora: prin-
cípios e experiências, organizado por Moacir Gadotti e outros 
autores, bem como a pesquisa Cidade educadora e juventudes: as 
políticas públicas e a participação dos jovens de Gravataí – RS, de 
Ingrid Wink.15Entendemos “educação”, de modo amplo, como mediação capaz de contri-
buir com a formação integral dos seres humanos por meio da apropriação 
dos conhecimentos sistematizados pela humanidade.
Educação na cidade: conceitos, reflexões e diálogos 37
Investigamos a expressão “município que educa” proposta 
em 2009, no Fórum Mundial de Educação (FME), pela Rede Mu-
nicípio que Educa, lançada na ocasião do evento e, finalizamos 
o capítulo elucidando o que compreendemos como “educação 
na cidade”.
Diante do exposto buscaremos, nas próximas seções, apre-
sentar tais termos com vistas a elencar suas origens e contra-
dições.
Cidade Educativa e as implicações do 
Relatório “Aprender a Ser”
Como visto anteriormente, o termo “cidade educativa” 
surgiu no Brasil após ser apresentado pelo relatório Aprender a 
Ser, publicado em 1973. Esse relatório foi elaborado por uma Co-
missão Internacional da Unesco/ONU liderada por Edgar Faure, 
ex-ministro da Educação da França, com representantes dos Es-
tados Unidos da América - EUA, União Soviética - URSS, Chile, 
Síria e Congo. Para Faure et al. (1973), o relatório surge como 
modelo para “ajudar” os países pobres a enfrentarem o proble-
ma educacional a partir de um intercâmbio livre e sistemático. 
Reforçando a condição inferior de alguns países, justifica a ne-
cessidade dessa cooperação internacional para a implantação 
da “cidade educativa”. O relatório é dividido em três partes: 
Resultados, Futuro e Havia uma Cidade Educativa. Na primeira 
parte, o relatório faz uma retrospectiva histórica, reforçando a 
condição dos países “menos desenvolvidos” de copiar as inicia-
tivas educacionais de outros países. Essa primeira parte aponta 
as heranças do passado, alguns pontos de progressos e fracassos 
alcançados ao longo da história e a educação como produto e 
fator da sociedade (solução de todos os problemas). Na segunda 
38
parte, reforça o tempo de questionamentos (1972), os eixos do 
futuro e as transcendências, dentre elas o humanismo cientí-
fico, conceito difundido que retrata a importância do conhe-
cimento científico para o homem moderno, agora centro das 
ações. A terceira parte apresenta a cidade educativa como lugar 
e função das estratégias educativas, pois a ideia apresentada no 
relatório é a de superação de uma concepção escolar sistemáti-
ca. Essa parte retrata ainda a cidade como caminho para a so-
lidariedade na medida em que ela reforce as relações humanas 
existentes, por meio de uma compenetração íntima da educa-
ção nas concepções sociais, políticas e econômicas, bem como 
nas redes culturais. 
Para Faure et al. (1973), quando a economia cresce, o nível 
educacional das pessoas tende a melhorar impulsionado pela 
qualificação solicitada pelo mercado. Os autores consideram im-
portante uma abordagem educacional humanística e científica 
e apontam que, com a era científica-tecnológica, a mobilidade 
dos conhecimentos e a renovação das inovações devem consa-
grar um menor esforço ao conhecimento adquirido e reforçar a 
aprendizagem pelo método de aquisição do conhecimento cha-
mado de “aprender a aprender”16. Ao explicarem o termo “ci-
dade educativa” informam que a estrutura educacional está em 
colapso e consideram que outras instituições educacionais para 
além da escola também podem contribuir com a superação da 
crise instaurada. Elencam o indivíduo como sujeito da sua edu-
cação e colocam fé utópica na sociedade, propondo uma relação 
íntima entre educação e o tecido social, político e econômico. 
Diante dessas informações, precisamos realizar uma breve 
retrospectiva histórica para compreender o momento de escri-
16Nos afastamos dessa ideia pois consideramos que as pedagogias do apren-
der a aprender negam a importância da transmissão do conhecimento e 
despotencializam o papel do professor enquanto mediador (DUARTE, 2001).
Educação na cidade: conceitos, reflexões e diálogos 39
ta deste relatório. Após a segunda guerra mundial os países eu-
ropeus entraram em recessão e algumas alianças foram forma-
das polarizando a Europa em capitalista e socialista. Houve uma 
ascensão da economia dos Estados Unidos da América (EUA) e a 
consagração de duas potências mundiais, os EUA e a União So-
viética, dando início à Guerra Fria. O investimento na indústria 
armamentista fez surgir uma era científica e tecnológica. O mo-
mento de consolidação da hegemonia capitalista acontece no 
período anterior à publicação do relatório, mesmo com a crise 
econômica dos EUA provocada pela Guerra do Vietnã. Os EUA 
precisavam se reerguer e para isso apropriaram-se do discur-
so do desenvolvimento científico e tecnológico para “vender” 
seus conhecimentos, tecnologias e ideologias. Dessa forma, o 
discurso passa a ser voltado para atender ao capital. 
Segundo Lefebvre (1999), o modo de produção influencia o 
tipo de cidade e de relações sociais que surgem. Para ele existe 
um eixo espaço-tempo em que a cidade se transforma ao longo 
do tempo até chegar numa zona crítica, na qual todas as ques-
tões relacionadas à natureza que foram deixadas de lado em 
prol do progresso e da urbanização serão cobradas. Assim, todo 
cuidado passa a ser pouco quando a educação é pensada para 
atender determinado tipo de sociedade. A economia hegemôni-
ca do mercado atual educa quem, como, para quem e para quê?
Silva (1979) contrapõe-se às ideias apresentadas no rela-
tório Aprender a Ser, proposto pela Unesco/ONU, debatendo 
sobre educação e sobre as concepções de homem no mundo. 
O livro está dividido em três capítulos: o primeiro, O Relatório 
Apprendre à être; o segundo, A Cidade Educativa; e, o terceiro, O 
Humanismo Científico. No primeiro capítulo Silva (1979) refor-
ça o caráter ideológico do relatório e fala dos principais temas 
abordados, problematizando-os. No segundo capítulo, explica a 
concepção da cidade educativa como um sistema educacional 
40
com uma estruturação tecnoburocrata e inspirada na educação 
permanente, aquela que considera a educação como um pro-
cesso contínuo que se estende por toda a vida do indivíduo. No 
terceiro capítulo aponta que o humanismo científico descrito 
no relatório serviu para sintetizar os aspectos antropológicos 
orientadores da proposta de “cidade educativa”. No entanto, 
alerta para as posições antagônicas existentes entre o huma-
nismo e a necessidade do progresso científico e tecnológico 
descrito. Segundo Silva (1979), o relatório evidencia que na 
atualidade aparecem novos sintomas de uma outra revolução 
para além da industrial.
É a revolução científica e técnica que, ao contrário da revolução 
industrial, não se baseia na máquina como multiplicadora ou 
substituta da força humana física, e nem no homem visto como 
mão-de-obra produtora. A nova máquina interfere no campo 
de força humana mental podendo multiplicá-la e até mesmo 
substituí-la. O trabalho humano é atingido em seu significado: 
o homem é envolvido no processo de produção, não mais como 
mão-de-obra, mas como portador da ciência e do conhecimen-
to social acumulado; é impelido para a margem da produção 
imediata; sua presença é muito mais de criador, de cientista, 
que de operário no sentido industrial (SILVA, 1979, p. 92).
Para Silva (1979), no relatório, o projeto referencial do mundo e 
do homem é o modelo tecnocrático, mesmo que “disfarçado”. O au-
tor ainda considera que falta a esse documento apresentar um cami-
nho com alternativas fora do mito tecnocrático. Em sua crítica, Silva 
(1979) relaciona o conceito de cidade educativa ao humanismo, des-
construindo a proposição científica e tecnológica que é reforçada no 
próprio relatório e que impregna o mundo de hoje. Essa ambiguida-
de humanismo versus progresso científico e tecnológico demonstra 
a inconsistência do relatório, que tenta agradarao positivismo com 
o reforço científico tecnológico e ao mesmo tempo ao humanismo, 
que prega o oposto do positivismo. Segundo Silva (1979, p. 117):
Educação na cidade: conceitos, reflexões e diálogos 41
Com relação à proposta concreta da Cidade educativa, 
continua o mesmo panorama de ambiguidade. Vê a ne-
cessidade de ultrapassar a dimensão sistêmica da socie-
dade, mas não consegue libertar-se de suas estruturas e 
instituições. [...] Não fica claro também como a Cidade edu-
cativa, ao valorizar as instituições sociais como agentes 
educativos e ao promover os meios tecnológicos de comu-
nicação, poderá evitar o perigo de se transformar simples-
mente no instrumento universal da “cultura de massa”.
Com isso, Silva (1979) nos faz refletir sobre a seguinte ques-
tão: ou o relatório está simplificando o humanismo, ou acredi-
ta que a desconstrução da mentalidade industrial dará espaço 
a uma educação científica e tecnológica utópica. A ênfase na 
importância do desenvolvimento das capacidades do homem 
com viés utilitário e tecnológico enfatiza o espírito que orienta 
o relatório: o capitalismo liberal necessita de forças produti-
vas adaptadas às novas exigências da sociedade e, consequen-
temente, efetivar-se como único sistema econômico possível.
De modo contrário a essas posições, Silva (1979) orienta que 
a “cidade educativa” deve ser a busca universal de um humanis-
mo novo, que abra caminhos para o homem, com sua vocação his-
tórica cheia de percalços, sempre ameaçada, mas não destruída. 
Silva conclui suas análises sobre o relatório argumentando que, 
longe dos pressupostos apresentados pela proposta de Faure e 
seus colaboradores, a cidade educativa deveria ser fundamen-
talmente a comunidade humana que se educa, que vai marcan-
do seus caminhos entre perigos, “[...] lutando para se aproxi-
mar da ‘utopia’ de um homem sujeito e criador no centro de 
seu mundo feito hoje de ciência e técnica” (SILVA, 1979, p. 119).
Em acordo com as críticas de Silva ao relatório Aprender a 
ser, Gadotti (1992) assevera:
A ideia de uma Cidade Educativa, defendida pela Comissão In-
ternacional para o Desenvolvimento da Educação da UNESCO, 
é esta miragem da Educação Permanente que, atualmente, 
42
alimenta os sonhos dos países em via de desenvolvimento. 
No Brasil, por exemplo, a ideia de uma comunidade na qual 
a educação estaria “ao alcance de todos”, “durante a vida in-
teira”, “ministrada sob todas as formas possíveis” foi acolhi-
da imediatamente pelos responsáveis pela educação. Assim, 
um país como o Brasil, que está longe de haver atendido o 
mínimo necessário para a educação fundamental, longe de 
haver esgotado seus recursos educativos, tenta “implantar” 
um modelo de educação cujos resultados devem ser postos 
em dúvida, dado que foram elaborados para as necessidades 
dos países altamente desenvolvidos (GADOTTI, 1992, p. 62).
A partir dos excertos de Silva (1979) e Gadotti (1992) pode-
mos inferir que o relatório é ambíguo e contraditório porque não 
vai à origem do problema da sociedade hodierna: a sociedade ca-
pitalista precisa ser transformada em uma sociedade justa, sem 
desigualdade social e sem exploração do homem pelo homem. 
Um dos modos de se preparar a travessia para efetivação dessa 
utopia seria, como apontam estes autores, por meio da educa-
ção cidadã na cidade educativa. Concordamos com Freire (2007, 
p. 24) quando aponta que “[...] o ser humano jamais para de edu-
car-se”. Contudo, cabe reforçar o alerta desse autor quando diz 
que a política da cidade, assim como o Estado, são violentos. Eles
[...] interdita[m] ou limita[m] ou minimiza[m] o direito das 
gentes, restringindo-lhes a cidadania ao negar educação para 
todos. Daí também, o equívoco em que tombam grupos popula-
res, sobretudo no Terceiro Mundo quando, no uso de seu direito 
mas, indo além dele, criando suas escolas, possibilitam às vezes 
que o Estado deixe de cumprir seu dever de oferecer educação 
de qualidade e em quantidade ao povo (FREIRE, 2007, p. 24).
Na concepção de Freire (2007) a escola é uma institui-
ção fundamental e junto com a cidade deve suprir a ne-
cessidade humana de se poder educar permanentemente.
A Cidade se faz educativa pela necessidade de educar, de 
Educação na cidade: conceitos, reflexões e diálogos 43
aprender, de ensinar, de conhecer, de criar, de sonhar, de 
imaginar de que todos nós, mulheres e homens, impreg-
namos seus campos, suas montanhas, seus vales, seus rios, 
impregnamos suas ruas, suas praças, suas fontes, suas ca-
sas, seus edifícios, deixando em tudo o selo de certo tem-
po, o estilo, o gosto de certa época (FREIRE, 2007, p. 25).
Longe dos preceitos do relatório Aprender a ser e a partir 
de ideais contra-hegemônicos assumimos que toda escola deve 
ser pública, democrática, transformadora, promover a humani-
zação e estar sempre em busca da transformação social. Cremos 
em uma formação integral e emancipatória, na qual os indiví-
duos politizados tomem as cidades nas mãos e instruam-se uns 
aos outros, tanto na escola como nos espaços citadinos.
Cidade Educadora e suas relações
com os preceitos da AICE
O conceito de “cidade educadora” efetivou-se depois da 
realização do I Congresso Internacional de Cidades Educadoras 
(1990). Congresso, eEste Congresso, incentivado pela Unesco na 
Convenção das Nações Unidas de 1989, que reuniu em uma carta 
de intenções princípios essenciais ao desenvolvimento educa-
cional das cidades. A Carta das Cidades Educadoras baseia-se em 
documentos internacionais como a Declaração Universal dos 
Direitos do Homem (1948), o Pacto Internacional dos Direitos 
Econômicos, Sociais e Culturais (1966), a Declaração Mundial da 
Educação para Todos (1990), a Convenção nascida do Congresso 
Mundial para a Infância (1990) e a Declaração Universal sobre 
Diversidade Cultural (2001). A carta informa que a cidade possui 
elementos para formação integral e, ao mesmo tempo, funcio-
na como um agente de educação permanente. Preconiza, ainda, 
a colaboração entre a educação formal, informal e não-formal 
44
para uma efetiva troca de experiências. Este documento define 
vinte princípios a serem seguidos pelas cidades-membro, divi-
didos em três partes, a saber: o direito a uma cidade educadora, 
o compromisso da cidade e serviço integral das pessoas. 
Tais princípios propõem direito à igualdade; políticas pú-
blicas baseadas na justiça social, qualidade de vida e civismo 
democrático; políticas educativas amplas, compreendendo as 
diferentes modalidades de educação; canais abertos e perma-
nentes de comunicação com os cidadãos; ordenamento do es-
paço físico urbano com acessibilidade, promovendo encontro, 
cultura, esportes, lazer; definição de estratégias de formação, 
de modo que todos ajam com respeito mútuo; resolver desigual-
dades; apoiar associações; dentre outros. 
A Carta das Cidades Educadoras define “cidade educadora” 
como:
[...] cidade que se relaciona com o seu meio envolvente, outros 
centros urbanos do seu território e cidades de outros países. 
O seu objectivo permanente será o de aprender, trocar, parti-
lhar e, por consequência, enriquecer a vida dos seus habitantes 
(AICE, 1990, p. 04).
Pensando na concepção de sua criação concluímos que da 
mesma forma como são debatidas as medidas econômicas mun-
diais por meio de cartas de recomendações/intenções, que mui-
tas vezes não retratam a realidade, nem a história, nem a cultura 
de seus países membros, beneficiando apenas uma minoria que 
detém o poder econômico nas mãos, assim enxergamos o que se 
quer fazer acreditar com essa carta de intenções. , A a concluir 
pelos encontros anuais de troca de experiências, que fatalmente 
são discussões puramente políticas, que dificilmente aproximam 
as discussões da maioria dos habitantesdas cidades e que não dis-
cutem a verdadeira causa da desigualdade e da pobreza mundial. 
Ficam somente presos a paliativos que não irão, em momento 
Educação na cidade: conceitos, reflexões e diálogos 45
algum, contribuir com a transformação da sociedade capitalista.
Tal conceito – cidade educadora, embora considerado novo, 
reúne um conjunto de propostas contraditórias apresentadas 
anteriormente pela Unesco (no relatório Aprender a Ser – 1972), 
principalmente quando fala de formação integral, educação per-
manente, diferentes modalidades de educação (informal, formal 
e não-formal), com o agravante de que vivemos numa “pseudo” 
urbanização generalizada, que hoje se reflete na busca de uma 
educação científico-tecnológica de qualidade. Dentro do modelo 
capitalista instalado, com a globalização em foco, maiores são 
as contradições, diferenças e dificuldades observadas nas cida-
des, fato que gera uma tentativa de cooperação internacional 
para trocas de experiências, sem que se perca o foco no modelo 
econômico que impera. Tanto no caso anterior do conceito de 
“cidade educativa” proposto pela Unesco, quanto na Carta das 
Cidades Educadoras, de 1990, algumas ideias propostas seduzem. 
No entanto, observamos que os discursos para a democra-
cia e para o desenvolvimento integral do indivíduo ficam apenas 
no plano político, longe dos cidadãos e dos diálogos essenciais. 
A exemplo disso, temos a cidade de Vitória, no estado do Espí-
rito Santo, que integra a Associação Internacional de Cidades 
Educadoras (AICE), criada em 1994, constituída de uma estru-
tura de permanente colaboração entre os governos compro-
metidos com a Carta das Cidades Educadoras. Hoje a AICE conta 
com 478 cidades membros de 36 países de todos os continentes. 
A Prefeitura Municipal de Vitória ao integrar-se a esta asso-
ciação deve promover ações que visam cumprir os vinte prin-
cípios propostos pela Carta das Cidades Educadoras, dentre eles 
a igualdade, o direito à cidade, a integração social, entre outros. 
De acordo com Lefebvre (2001), os seres humanos possuem ne-
cessidades sociais de origem antropológica, dentre elas a segu-
rança e outras carências específicas que não foram e nem são 
46
levadas em conta na urbanização ou na construção das cidades. 
Além disso, nos diz que é preciso superar ideologias para alcan-
çarmos um humanismo novo, que aproxime o povo de sua histó-
ria a fim de refazer e reconstruir as cidades a partir de projetos 
urbanísticos bem desenvolvidos e de programas políticos con-
tra-hegemônicos. Para isso, se faz necessária a transformação 
intelectual, que pense na filosofia e na ciência (ou ciências) da 
cidade. É preciso o envolvimento do povo e da força que ema-
na dele, demanda conhecimento da cidade, e também do meio 
rural, para que se possam criar parâmetros comparativos e de 
valores a serem implementados e alcançados coletivamente. 
Diante de tal atitude, quantas pessoas que vivem na cidade 
de Vitória conhecem ou exercem seus direitos, conhecem es-
ses compromissos assumidos, conhecem e utilizam os espaços 
da cidade? Quantos cidadãos da cidade possuem conhecimento 
para cobrar metas ou cumprimento de princípios e objetivos? 
Ainda debatendo o termo “cidade educadora”, cabe apre-
sentar uma experiência de aproximação realizada pelo Instituto 
Paulo Freire17 em parceria com a Associação Internacional das 
Cidades Educadoras (AICE), no ano de 2004. Oriunda dessa rela-
ção foi sistematizada uma publicação, em português, intitulada 
Cidade Educadora: princípios e experiências, que compila traba-
lhos extraídos dos Cuadernos Ciudades Educadoras América Latina 
com a finalidade, também, de apresentar o projeto Escola Cida-
dã, proposto pela cidade de Porto Alegre – RS. 
Tal projeto estabelece uma utopia pedagógica em que a es-
cola é dever do Estado, sob controle social, constituída por todos, 
com um currículo intermulticultural, que contemple os movi-
mentos de educação popular, sendo este propulsor do processo 
de transformação política, econômica e cultural da sociedade. O 
projeto Escola Cidadã, surgiu no Brasil no início dos anos de 1990 
e, de acordo com Gadotti et al. (2004):
Educação na cidade: conceitos, reflexões e diálogos 47
Designa-se comumente por “Escola Cidadã” uma certa con-
cepção e uma certa prática da educação “para e pela cida-
dania”, que, sob diferentes denominações, são realizadas, 
em diversas regiões do país, principalmente em municípios 
onde o poder local foi assumido por partidos do chamado 
campo democrático-popular (GADOTTI et al., 2004, p. 122).
Nesse livro, Gadotti e seus colaboradores aproximam-se 
de algumas experiências ocorridas na América Latina a fim de 
estimular o projeto “Escola Cidadã”. Relatam no último capí-
tulo diversas experiências observadas em alguns municípios 
brasileiros com viés sócio-democrático. Não se deixam, entre-
tanto, alheios às críticas, esclarecendo na apresentação deste 
desse capítulo a fonte dos textos que têm o intuito de fundar 
uma rede de solidariedade, aceitando, inclusive, contribuições. 
Analisando a aproximação entre grupos de ideias tão diferentes 
nos surpreendemos. De um lado um novo nome dado, Cidade 
Educadora, a uma antiga ideologia da Unesco, e, de outro, o que 
sempre pregou Paulo Freire: a autonomia, o diálogo, a cidada-
nia, a dignidade, o envolvimento político. Entendemos tal apro-
ximação como uma tentativa de Gadotti e seus colaboradores de 
extrair o melhor de cada ideologia a fim de atender um objetivo 
comum, a emancipação crítica do citadino. E, mesmo sobre essa 
égide libertária, é exatamente o oposto o que vemos no nosso 
dia a dia consumido pela economia hegemônica capitalista. No 
entanto, cabe salientar, como dito anteriormente, que as ideias 
propostas pela Carta das Cidades Educadoras seduzem e, até, en-
contram pessoas capazes de criar um movimento novo com o 
cumprimento de seus princípios, mas ele é contraditório porque 
não supõe a transformação social, apresenta apenas paliativos.
Outro estudo que realizamos acerca do conceito de cidade 
educadora deu-se a partir de Wink (2011). Para essa autora, tal 
48
conceito está em constante transformação, pois algumas biblio-
grafias tendem a relacionar o conceito de cidades educadoras a 
um modelo de bem bem-estar europeu (este oferecendo o mí-
nimo, como uma proposta liberal clássica) com a o qual ela não 
concorda. Segundo a pesquisadora, é preciso pensar as cidades 
educadoras como aquelas que fortalecem as diversas identida-
des. Explica o ingresso de uma cidade à Associação Internacional 
das Cidades Educadoras (AICE), bem como a necessidade de com-
prometimento à Carta das Cidades Educadoras e sua relação com 
a Unesco. De acordo com Wink (2011, p. 72):
A Cidade Educadora vê na educação a principal forma de 
transformação da sociedade, sendo referência a educação 
que vai além dos muros da escola. Trata-se da educação 
que não se finda, que não tem idade, não tem necessaria-
mente espaço afixado e trabalha com o viés de que a troca 
e a aprendizagem é processo contínuo na construção políti-
ca da autonomia do sujeito.
Além disso, a pesquisadora reforça o conceito de perten-
cimento e informa que a cidade educadora propõe repensar-
mos as relações sociais, ambientais e os planejamentos urbanos 
diversos, informando que esta pode contribuir para minimizar 
os efeitos avassaladores do capitalismo. A pesquisadora reali-
za algumas críticas ao projeto de cidades educadoras, pois ar-
gumenta que a AICE sugere uma interação educativa entre os 
diferentes setores econômicos e sociais, mas isso raramente 
acontece, pois os setores propõem ações isoladas, visando seu 
bem -estar. Wink (2011), após suas análises, realiza crítica à ló-
gica capitalista por trás das intenções demodelos europeus de 
cidade, propostos pela AICE.
Freire (1995, p. 16) ressalta que a escola não é o único es-
paço de veiculação do conhecimento, outros espaços podem 
propiciar práticas pedagógicas que possibilitam interação de 
Educação na cidade: conceitos, reflexões e diálogos 49
experiências. Para o autor a associação entre diferentes espa-
ços educativos imprime o conceito de coletividade, que enten-
demos ser premissa para a construção de uma visão crítica de 
mundo. Essa visão ou leitura de mundo que todo o ser humano 
necessita cultivar pode ser ampliada nas cidades por meio do 
diálogo, do respeito, da igualdade. 
Nos diz Freire (1995, p. 63):
A palavra, a frase, o discurso articulado não se dão no ar. São 
históricos e sociais. É possível, em culturas de memória pre-
ponderante ou exclusivamente oral, discutir, em projetos de 
educação popular, a criticidade maior ou menor contida na 
leitura do mundo que o grupo popular esteja fazendo num 
dado momento, sem a leitura da palavra.
Ora, se as relações sociais e históricas nos imprimem uma 
visão e leitura de mundo que nos tornam capazes de discutir e 
propor ações, não é difícil conceber a ideia de que a cidade edu-
ca. Mas, nesse contexto, é preciso saber como e para que a ci-
dade educa. Quando pensamos na sociedade capitalista em que 
vivemos, pensamos também na educação mercantilista, bancá-
ria, excludente que vemos, logo, também, na cidade que afasta, 
desprotege, deseduca. De acordo com Harvey (2014):
A cidade tradicional foi morta pelo desenvolvimento capi-
talista descontrolado, vitimada pela sua interminável ne-
cessidade de dispor da acumulação desenfreada de capital 
capaz de financiar a expansão interminável e desordenada 
do crescimento urbano, sejam quais forem suas consequên-
cias sociais, ambientais ou políticas (HARVEY, 2014, p. 20).
Seguindo a lógica de Harvey (2014), nossas cidades cederam 
ao capital e somente um movimento revolucionário consciente 
e de interesse coletivo poderá transformar a sociedade e, con-
50
sequentemente, a cidade e seus processos de urbanização. Hoje 
vivemos numa cidade hostil onde a própria disposição dos es-
paços privilegia o isolamento. Refletindo sobre a cidade, Lefeb-
vre (2001, p. 73) diz que: “A vida urbana compreende mediações 
originais entre a cidade, o campo, a natureza”. Estas mediações 
somente podem ser compreendidas por meio de “simbolismos e 
representações (ideológicas e imaginárias)” que, hoje, são des-
contruídos pelo movimento complexo de urbanização.
No sentido de clarificar as diferenças entre a cidade edu-
cativa, na perspectiva de Freire, e a cidade educadora, Chisté e 
Sgarbi (2015, p. 13) dizem:
Já que consideramos todo ato educacional como um ato polí-
tico, e que pontuamos que ele não é neutro, já que tomamos 
uma posição nesta nossa reflexão sobre cidade, educação e 
escola, faz-se necessário voltar a uma questão levantada na 
introdução deste texto. Ou seja, a de que os esforços por “cida-
de educadora” visavam a ampliação e o reforço da sociedade 
capitalista pela via de se delegar a sociedade civil a responsa-
bilidade de implementar e executar políticas sociais.
Corroborando suas ideias às nossas, ao assumirmos o con-
ceito de “cidade educadora” como correto, estamos nos ade-
quando à globalização do mercado e atribuindo nossa incapaci-
dade política, social, cultural e econômica diante daqueles que 
impõem a economia de mercado, vendendo uma cultura e um 
modelo de sociedade como se fossem únicos e os melhores do 
planeta. Longe dessas discussões, precisamos reforçar o que foi 
apontado para argumentar que a tarefa educativa da cidade im-
plica posição política: devemos compreender a fundo a política 
dos gastos públicos, a política cultural e educacional, a política 
de saúde, a dos transportes, a do lazer (FREIRE, 1995). Nas pala-
vras do pensador brasileiro:
Educação na cidade: conceitos, reflexões e diálogos 51
No fundo, a tarefa educativa das Cidades se realiza tam-
bém através do tratamento de sua memória e sua memória 
não apenas guarda, mas reproduz, estende, comunica-
-se às gerações que chegam. Seus museus, seus centros 
de cultura, de arte são a alma viva do ímpeto criador, dos 
sinais de aventura do espirito. Falam de épocas diferen-
tes, de apogeu, de decadência, de crises, da força condi-
cionante das condições materiais (FREIRE, 1995, p. 26).
Nesse sentido, compreendemos que educar na cidade pres-
supõe o desvelamento de seus espaços, muitas vezes configura-
dos para reproduzir a sociedade desigual em que vivemos. Essas 
contradições precisam ser reveladas por meio de uma educação 
que empodere os sujeitos e os impulsionem a coletivamente 
criar meios de transformar as condições de exploração em que 
estão hodiernamente submetidos.
Município que Educa: contribuições
do setor privado para o campo da
educação pública 
O conceito “município que educa” surgiu com o Programa 
Município que Educa, lançado em 30 de janeiro de 2009 e coor-
denado por Paulo Roberto Padilha, no contexto do Fórum Mun-
dial da Educação e do Fórum Social Mundial, em uma iniciativa 
do Instituto Paulo Freire de lançar uma reflexão sobre a cidade 
com abordagem democrática e participativa. Segundo Padilha 
(2010, p. 12), tal programa possui como objetivo geral:
[...] contribuir para o desenvolvimento das municipalida-
des, com base na identificação, fortalecimento e mobilização do 
potencial educativo dos seus espaços e tempos, das ações dos 
sujeitos que ali vivem ou atuam e das iniciativas articuladas en-
tre Estado e sociedade civil.
52
 
 Padilha (2010) afirma que o conceito “município que 
educa” surgiu da experiência de anos, desde os primeiros de-
bates sobre educação popular em meados dos anos de 1960, de 
iniciativas nacionais e internacionais, visando potencializar as 
intencionalidades educativas e fortalecer processos de gestão 
municipal participativa. Para isso utiliza o planejamento dialó-
gico com vários segmentos sociais, iniciado com a base da so-
ciedade. Além disso, prevê cinco estratégias básicas, sendo elas: 
potencializar as relações humanas e sociais; influenciar ações 
locais com projetos educativos; potencializar espaços educati-
vos e criativos; realizar cadastros e agendamentos para encon-
tros entre os representantes do município e o Instituto Paulo 
Freire. Sobre essas estratégias Gadotti (2010) pontua:
Qualquer programa que tenta interconectar os espaços e equi-
pamentos do município é fundamental, pois desconhecemos a 
nossa própria municipalidade e subestimamos as suas poten-
cialidades. Precisamos empoderar educacionalmente todos os 
seus equipamentos culturais. A educação é cultura. O municí-
pio é o espaço da cultura e da educação. Existem muitas ener-
gias sociais transformadoras que ainda estão adormecidas por 
falta de um olhar educativo sobre eles (GADOTTI, 2010, p. 21).
Podemos compreender que o programa Município que Edu-
ca propõe, a partir de atos educativos nos espaços-tempos da ci-
dade, uma educação integral e cidadã. No entanto, o que vemos ao 
longo dos anos são muitas propostas com diferentes nomes e, às 
vezes, mesmos ideais, que não são colocados em prática porque, 
infelizmente, povo crítico e inteligente incomoda. Se o Estado 
quisesse poderia empreender esforços para resolver o proble-
ma educacional do país, mas a educação não é a sua prioridade.
O programa Município que Educa instaurou parcerias. O 
primeiro parceiro potencial da rede município que educa foi 
Educação na cidade: conceitos, reflexões e diálogos 53
a União Nacional de Dirigentes Municipais de Educação (Undi-
me), instituição criada em agosto de 1985, quando um grupo de 
dirigentes se reuniram em prol da educação municipal. Em 1986 
o movimento já estava amadurecido e contava com cercade mil 
dirigentes municipais de educação. A associação com Instituto 
Paulo Freire aconteceu em 2009. A partir das parcerias, inclu-
sive com diversas empresas privadas, a rede “município que 
educa” alavancou, realizou palestras, formações de professores, 
iniciativas individuais e coletivas, estudos e publicações. 
A rede Município que Educa esteve em ascensão até meados 
de 2013, quando aconteceu uma mudança na presidência da União 
Nacional de Dirigentes Municipais de Educação (Undime) e as pa-
lestras com o objetivo de multiplicar a rede foram interrompidas. 
Cabe salientar que o Programa Município que Educa espera 
e propõe parcerias com os diversos segmentos da sociedade, le-
vando-nos a inferir que, especificamente, por isso se afasta dos 
preceitos preconizados por Paulo Freire para uma cidade edu-
cativa, pois, quando reflete sobre a escola esse pensador refor-
ça a importância do Estado em cumprir seu dever de oferecer 
educação de qualidade e em quantidade para o povo. Quando 
Freire fala da cidade educativa e de sua necessidade de educar, 
aprender, conhecer, sonhar, criar, imaginar e ensinar, reforça 
em seu discurso a importância de educar politicamente a fim de 
quebrarmos as amarras colocadas pela classe dominante e pela 
economia hegemônica capitalista. Definitivamente, parcerias 
privadas na educação não traduzem seus ideais. Transpor para a 
iniciativa privada, em especial organizações não governamentais 
(ONGs) e instituições ligadas a bancos, as obrigações do Estado 
é inconcebível para Freire e para outros teóricos progressistas.
Apesar de visualizarmos aspectos hegemônicos na propos-
ta da rede Município que educa, vislumbramos pontos positivos 
que ainda se referem ao legado freiriano, como o trabalho com 
54
temas geradores, o foco nos sujeitos como atores do processo 
de apropriação do conhecimento e a inserção dos educandos no 
contexto da cidade, estimulando a atuação crítica e cidadã. No en-
tanto, consideramos que a proposta desta rede se aproxima, em 
muitos aspectos, das ideias debatidas quando tratamos o concei-
to “cidade educadora”, pois visa o estabelecimento de parcerias 
com empresas privadas e, talvez, de modo não intencional, con-
tribuem ao fim e ao cabo com a reprodução do sistema capitalista. 
Educação na Cidade como proposta 
contra-hegemônica de diálogo entre
a cidade e a escola
Para finalizar este texto, gostaríamos de retomar algumas 
questões que se direcionam a elencar pressupostos acerca da 
discussão empreendida. Diante da polissemia dos termos apre-
sentados, cidade educativa, cidade educadora e município que 
educa, optamos pela utilização do termo “Educação na Cidade”, 
pressupondo que Educação em seu sentido amplo depreende 
processos de apropriação de conhecimentos diversos e pode ser 
efetivada em variados locais. Assim, consideramos que é possí-
vel educar em diferentes espaços, sejam eles a escola, a rua, o 
museu, os monumentos históricos, os prédios, as pinturas dos 
muros, os parques ecológicos, as praças, as instituições bancá-
rias, os postos de saúde, os hospitais, os centros comunitários, o 
comércio em geral, a igreja, etc. Basta para isso termos a inten-
ção e condições objetivas para fazê-lo. A expressão Educação na 
Cidade é aquela que se aproxima mais efetivamente da propos-
ta do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Educação na Cidade 
(Gepech); afinal, diante de uma cidade que educa, na maioria 
das vezes, para a adaptação à lógica do mercado, precisamos 
Educação na cidade: conceitos, reflexões e diálogos 55
construir uma intervenção pedagógica que nos ajude a ler essa 
cidade e apontar caminhos de sua transformação. Entendemos 
que o que torna, em tese, os espaços efetivamente educativos é 
o olhar que se tem sobre eles. Não existe olhar neutro do mun-
do que nos cerca. Todo processo pedagógico está repleto de as-
pectos ideológicos, políticos e culturais que se fazem presentes 
no ato educativo e marcam a forma de agir e compreender o 
mundo, ou seja, a tarefa educativa que pode ser implementada 
na cidade é atravessada pelos posicionamentos políticos, pela 
maneira que é exercido o poder na cidade, ou seja, a serviço de 
quem e de que estamos agindo. Cabe ficar atento às seguintes 
questões acerca da Educação na cidade: 
• Qual potencial transformador tem a cidade? 
• Que locais podem problematizar o que está posto?
• Que estratégias podem ser pensadas nesses espaços que 
contribuam com a problematização da realidade? 
• Como pode a cidade contribuir com o processo de huma-
nização dos sujeitos? 
• Que lugares da cidade podem contribuir com o processo 
de humanização?
• Como planejar a visita a esses espaços?
• O que fazer antes da visita?
• O que fazer durante a visita?
• Como dar continuidade às reflexões iniciadas na visita no 
espaço escolar?
Sabemos da necessidade de assegurar que nossas ações pos-
sam contribuir com a emancipação e com a humanização dos 
educandos, na perspectiva de construir uma sociedade menos 
desigual. Portanto, cabe pensar em uma nova organização dos 
espaços e dos tempos da escola e da cidade, na perspectiva da 
56
instauração de práticas educadoras orientadas para o processo 
de humanização que se distancie dos preceitos capitalistas de 
mercantilização dos espaço citadinos. Consideramos necessário 
sistematizar propostas contra-hegemônicas que visem revelar 
as contradições presentes na cidade, para que os educandos am-
pliem suas consciências críticas e seus conhecimentos de mundo. 
Desse modo, compreendemos que educar na cidade pres-
supõe o desvelamento de seus espaços, muitas vezes configu-
rados para reproduzir a sociedade desigual, marca registrada 
da sociedade capitalista. Essas ambiguidades precisam ser re-
veladas por meio de uma educação que empodere os sujeitos e 
os estimulem a, coletivamente, criar meios de transformar as 
condições de exploração em que estão submetidos.
Assumimos que toda a escola deve ser pública, democrá-
tica, capaz de promover a humanização e a transformação so-
cial e de mediar conhecimentos integrais e emancipatórios, 
tanto em seu espaço institucional quanto nos demais espaços 
da cidade. Insistimos que a escola é um espaço privilegiado de 
transmissão do conhecimento sistematizado, por isso é tão des-
potencializada pela elite dirigente que busca de modo inces-
sante enfraquecê-la tendo em vista o seu potencial coletivo de 
conscientização. É o local que, sob um viés contra-hegemônico, 
pode estimular a politização dos indivíduos impelindo-os à crí-
tica e à tomada do poder. Ensejamos que, a partir de propos-
tas oriundas e em consonância com a escola, todos os espaços 
da cidade colaborem com o desmantelamento das estratégias 
que enfraquecem o coletivo e reforçam a ideologia dominante.
Vigotski (2010), no último capítulo do livro Psicologia Peda-
gógica, publicado na Rússia em 1926, diz que o maior erro da es-
cola foi ter se fechado e se isolado da vida. Nas palavras do autor:
A educação é tão inadmissível fora da vida quanto a combus-
Educação na cidade: conceitos, reflexões e diálogos 57
tão sem oxigênio, ou a respiração no vácuo. […] Na cidade do 
futuro provavelmente não haverá um único prédio em que 
apareça o letreiro “Escola”, porque escola, que no pleno senti-
do da palavra significa “lazer”, e destinou pessoas especiais e 
um edifício especial para ocupações com “lazer”, estará toda 
incorporada ao trabalho e à vida e se encontrará na fábrica, na 
praça pública, no museu, no hospital e no cemitério. Em cada 
sala de aula haverá janelas. Um professor de verdade irá olhar 
de sua escrivaninha para o vasto mundo, para as inquietações 
humanas, as alegrias e obrigações da vida, […] e na escola do fu-
turo essas janelas estarão abertas da forma mais escancarada,

Continue navegando