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Informativo comentado: Informativo 661-STJ
Márcio André Lopes Cavalcante
ÍNDICE
DIREITO CIVIL
DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA
· Membros do conselho fiscal de uma cooperativa não podem ser atingidos pela desconsideração da personalidade jurídica se não praticaram nenhum ato de administração.
DIREITOS AUTORAIS
· É desnecessária a autorização do titular da obra parodiada que não for verdadeira reprodução da obra originária nem lhe implicar descrédito, ainda que a paródia tenha finalidade eleitoral.
· Ainda que a intérprete tenha autorizado a gravação e produção de um fonograma, a reprodução e comercialização do material obtido, em CD, precisa de sua nova anuência, não se podendo dizer que estava abrangida pela primeira autorização.
COOPERATIVAS
· Se um cooperado pede para sair ou é expulso da cooperativa ele não terá direito de receber uma quota-parte do FATES, que é um fundo indivisível
DIREITO DO CONSUMIDOR
COMPRA E VENDA DE IMÓVEL
· O promitente-comprador, em razão de atraso, pediu o desfazimento do contrato, a devolução dos valores e a condenação da construtora a pagar lucros cessantes; o termo final dos lucros cessantes é a data do trânsito em julgado da ação que pediu a resolução.
DIREITO EMPRESARIAL
RECUPERAÇÃO JUDICIAL
· É imprescindível a verificação da natureza onerosa ou gratuita do aval prestado, antes do pedido de recuperação judicial por sociedade empresária, para que se determine se a garantia se sujeita ou não ao processo de soerguimento.
· Os encargos derivados de adiantamento de contratos de câmbio se submetem aos efeitos da recuperação judicial da devedora.
ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
PEDIDO DE GUARDA
· Mãe biológica pode se opor à ação de guarda de sua filha mesmo que já tenha perdido o poder familiar em ação proposta pelo MP com esse objetivo.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
CITAÇÃO
· Empresa estrangeira que não tenha agência ou filial no Brasil pode ser citada por meio de seu entreposto no país.
AGRAVO DE INSTRUMENTO
· O art. 1.015, VI, do CPC/2015 abrange a decisão interlocutória que versa sobre a exibição do documento em incidente processual, em ação incidental ou, ainda, em mero requerimento formulado no bojo do próprio processo.
Informativo 661-STJ (19/12/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 10
INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS
· Não cabe recurso contra o acórdão que admite ou inadmite o IRDR.
INSOLVÊNCIA CIVIL
· A declaração de insolvência civil dos executados não pode ser feita no bojo da própria ação executiva.
DIREITO PROCESSUAL PENAL
EXECUÇÃO PENAL
· É ilegal a sanção administrativa que impede definitivamente o direito do preso de receber visitas.
DIREITO PREVIDENCIÁRIO
REAFIRMAÇÃO DA DER
· É possível a ratificação da data de entrada do pedido de aposentadoria no curso da ação judicial.
PREVIDÊNCIA PRIVADA
· A decretação de intervenção federal em entidade de previdência complementar implica a suspensão do cumprimento de sentença.
DIREITO CIVIL
DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA
Membros do conselho fiscal de uma cooperativa não podem ser atingidos pela desconsideração da personalidade jurídica se não praticaram nenhum ato de administração
	
	Importante!!!
A desconsideração da personalidade jurídica, ainda que com fundamento na Teoria Menor, não pode atingir o patrimônio pessoal de membros do Conselho Fiscal sem que haja a mínima presença de indícios de que estes contribuíram, ao menos culposamente e com desvio de função, para a prática de atos de administração.
Caso concreto: consumidor comprou um imóvel de um cooperativa habitacional, mas este nunca foi entregue; o consumidor ajuizou ação de cobrança contra a cooperativa, tendo o pedido sido julgado procedente para devolver os valores pagos; durante o cumprimento de sentença, o juiz, com base na teoria menor, fez a desconsideração da personalidade jurídica para atingir o patrimônio pessoal dos membros do Conselho Fiscal da cooperativa; o STJ afirmou que eles não poderiam ter sido atingidos.
A despeito de não se exigir prova de abuso ou fraude para fins de aplicação da Teoria Menor da desconsideração da personalidade jurídica, tampouco de confusão patrimonial, o § 5º do art. 28 do CDC não dá margem para admitir a responsabilização pessoal de quem jamais atuou como gestor da empresa.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.766.093-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Rel. Acd. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 12/11/2019 (Info 661).
	
	
NOÇÕES GERAIS SOBRE A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA
Princípio da autonomia patrimonial
As pessoas jurídicas são sujeitos de direitos. Isso significa que possuem personalidade jurídica distinta de seus instituidores. Assim, por exemplo, não é porque o sócio morreu que, obrigatoriamente, a pessoa jurídica será extinta.
De igual modo, o patrimônio da pessoa jurídica é diferente do patrimônio de seus sócios.
Informativo comentado
	Ex.1: se uma sociedade empresária possui um veículo, esse automóvel não pertence aos sócios, mas sim à própria pessoa jurídica.
Ex.2: se uma sociedade empresária possui uma dívida, este débito deverá ser pago com os bens da própria sociedade, não podendo para isso, em regra, ser utilizado o patrimônio pessoal dos sócios.
Vigora, portanto, o princípio da autonomia patrimonial entre os bens do sócio e da pessoa jurídica.
Desconsideração da personalidade jurídica
O ordenamento jurídico prevê algumas situações em que essa autonomia patrimonial pode ser afastada. Tais hipóteses são chamadas de “desconsideração da personalidade jurídica” (disregard of legal entity ou teoria do superamento da personalidade jurídica).
Quando se aplica a desconsideração da personalidade jurídica, os bens particulares dos administradores ou sócios são utilizados para pagar dívidas da pessoa jurídica.
Por que foi idealizada essa teoria da desconsideração da personalidade jurídica?
A autonomia patrimonial das pessoas jurídicas sempre foi um instrumento muito importante para o desenvolvimento da economia e da atividade empresarial. Isso porque serviu para estimular os indivíduos a praticarem atividades econômicas, uma vez que, constituindo pessoas jurídicas, as pessoas físicas sabiam que apenas o patrimônio da sociedade empresária responderia pelas dívidas em caso de insucesso. Com isso, as pessoas físicas ficavam mais seguras, já que, mesmo que o empreendimento não prosperasse, elas não perderiam também o seu patrimônio pessoal não investido na sociedade.
Ocorre que alguns indivíduos começaram a abusar da autonomia patrimonial da pessoa jurídica, utilizando-a como um meio de praticar fraudes. A pessoa jurídica, após adquirir diversas dívidas, transferia todo lucro e patrimônio para o nome dos sócios e, com isso, não tinha como pagar os compromissos assumidos, não sobrando bens da sociedade que pudessem ser executados pelos credores.
Percebendo esse abuso, a jurisprudência passou a permitir a desconsideração da personalidade jurídica nessas hipóteses. Posteriormente, foram editadas leis prevendo expressamente a possibilidade da desconsideração.
Histórico da desconsideração da personalidade jurídica no Brasil
· CC-1916: não previa a possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica.
· Na década de 60, Rubens Requião foi um dos primeiros doutrinadores brasileiros a defender a aplicação
da teoria no Brasil, mesmo sem previsão legal.
· Lei nº 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor): foi a primeira lei a prever a possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica no Brasil (art. 28).
· Lei nº 8.884/94 (antiga Lei Antitruste): também previu a desconsideração.
· Lei nº 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais): também disciplinou a desconsideração.
· Código Civil de 2002: trouxe previsão expressa no art. 50.
· Lei nº 12.529/2011: desconsideração em caso de infrações da ordem econômica (art. 34).
· Lei nº 13.105/2015 (novo CPC): previu um procedimento para a desconsideração da personalidade jurídica.
· Lei nº 13.874/2019 (Lei da Liberdade Econômica), fruto da conversão da MP 881/2019: produziu profundas mudanças no regime da desconsideraçãoda personalidade jurídica previsto no Código Civil.
DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NO CÓDIGO CIVIL
Art. 50 do CC
A desconsideração da personalidade jurídica, no âmbito das relações civis gerais, está disciplinada no art. 50 do CC.
Podemos dizer que esse art. 50 traz a regra geral sobre a desconsideração jurídica no ordenamento jurídico brasileiro, havendo algumas previsões específicas em diplomas próprios (como é o caso do CDC).
Código Civil
Redação original
Depois da Lei nº 13.874/2019
Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.
Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou
indiretamente pelo abuso.
	A Lei nº 13.874/2019 prevê uma nova redação para o art. 50 do CDC. Vamos comparar as mudanças para, em seguida, tecer alguns breves comentários:
Espécies de abuso da personalidade jurídica
Somente poderá ocorrer a desconsideração da personalidade jurídica nas relações jurídicas regidas pelo Código Civil se ficar caracterizado que houve abuso da personalidade jurídica.
O abuso da personalidade jurídica pode ocorrer em duas situações:
1) Desvio de finalidade;
2) Confusão patrimonial.
A mudança promovida pela Lei nº 13.874/2019 no caput do art. 50 foi a seguinte: só se pode atingir o patrimônio particular do administrador ou do sócio se ficar demonstrado que eles se beneficiaram, direta ou indiretamente, do abuso da personalidade jurídica.
Assim, é acrescido um novo requisito para que se atinja o patrimônio do administrador ou sócio: deve ser provado que essa pessoa foi beneficiada com o abuso da personalidade jurídica.
Teorias maior e menor da desconsideração
Como vimos acima, a desconsideração da personalidade jurídica não é prevista apenas no Código Civil. Existem outros importantes diplomas que tratam sobre o tema, como é o caso do CDC e da Lei Ambiental. Ocorre que nem todas as leis trazem os mesmos requisitos para a desconsideração. A partir daí surgiram dois grupos de legislações separadas a partir dos requisitos impostos para a desconsideração. Confira:
	
	Teoria MAIOR
	Teoria MENOR
	
	
	O Direito Civil brasileiro adotou, como regra geral, a chamada teoria maior da desconsideração. Isso porque o art. 50 exige que se prove o desvio de finalidade (teoria maior subjetiva) ou a confusão patrimonial (teoria maior objetiva).
	No Direito do Consumidor e no Direito Ambiental, adotou-se a teoria menor da desconsideração. Isso porque, para que haja a desconsideração da personalidade jurídica nas relações jurídicas envolvendo consumo ou responsabilidade civil ambiental não se exige desvio de finalidade nem
confusão patrimonial.
	
	
	Deve-se provar:
1) Abuso da personalidade (desvio de finalidade ou confusão patrimonial);
2) Que os administradores ou sócios da pessoa jurídica foram beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso (novo requisito trazido
pela Lei nº 13.874/2019).
	De acordo com a Teoria Menor, a incidência da desconsideração se justifica:
a) pela comprovação da insolvência da pessoa jurídica para o pagamento de suas obrigações, somada à má administração da empresa (art. 28, caput, do CDC); ou
	
	
	
	b) pelo mero fato de a personalidade jurídica representar um obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores, nos termos do § 5º do art. 28 do CDC.
STJ. 3ª Turma. REsp 1735004/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 26/06/2018.
	
	
	Adotada pelo art. 50 do CC.
	Prevista no art. 4º da Lei nº 9.605/98 (Lei
Ambiental) e no art. 28, § 5º do CDC.
	
	
Dica para você não confundir: teoria maior porque exige um maior número de requisitos.
Além da alteração no caput do art. 50, a Lei nº 13.874/2019 acrescentou cinco novos parágrafos a esse mesmo artigo. Confira:
Novo § 1º do art. 50: definição do que é “desvio de finalidade”
A Lei nº 13.874/2019 acrescentou o § 1º ao art. 50 com a seguinte redação:
	§ 1º Para os fins do disposto neste artigo, desvio de finalidade é a utilização da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores e para a prática de atos ilícitos de qualquer natureza.
	
Assim, o desvio de finalidade é o ato intencional, do administrador ou do sócio, de fraudar terceiros ou praticar atos ilícitos utilizando a autonomia da pessoa jurídica como um escudo.
O conceito dado pelo novo § 1º está consentâneo com aquilo que já ensinava a doutrina e era acolhido pela doutrina. A despeito disso, a inclusão é salutar por trazer mais segurança jurídica.
Obs: não constitui desvio de finalidade a mera expansão ou a alteração da finalidade original da atividade econômica específica da pessoa jurídica (art. 50, § 5º do CC).
Novo § 2º do art. 50: definição do que é “confusão patrimonial”
	§ 2º Entende-se por confusão patrimonial a ausência de separação de fato entre os patrimônios, caracterizada por:
I - cumprimento repetitivo pela sociedade de obrigações do sócio ou do administrador ou vice-versa;
II - transferência de ativos ou de passivos sem efetivas contraprestações, exceto os de valor proporcionalmente insignificante; e
III - outros atos de descumprimento da autonomia patrimonial.
	
A confusão patrimonial ocorre quando, na prática, não há separação entre o que seja patrimônio da pessoa jurídica e dos sócios. Ex: todas as despesas pessoais dos sócios são pagas com o cartão de crédito da empresa, os veículos utilizados são da empresa, os funcionários fazem serviços pessoais para os sócios etc.
Novo § 3º do art. 50: previsão expressa da “desconsideração inversa”
	§ 3º O disposto no caput e nos §§ 1º e 2º deste artigo também se aplica à extensão das obrigações de sócios ou de administradores à pessoa jurídica.
	
O novo § 3º do art. 50 prevê a chamada “desconsideração inversa” da personalidade jurídica.
O que é desconsideração INVERSA da personalidade jurídica?
Na desconsideração inversa (ou invertida) da personalidade jurídica, o juiz, mediante requerimento, autoriza que os bens da pessoa jurídica sejam utilizados para pagar as dívidas dos sócios ou dos
administradores.
	Segundo a Min. Nancy Andrighi, “a desconsideração inversa da personalidade jurídica caracteriza-se pelo afastamento da autonomia patrimonial da sociedade, para, contrariamente do que ocorre na desconsideração da personalidade jurídica propriamente dita, atingir o ente coletivo e seu patrimônio social, de modo a responsabilizar a pessoa jurídica por obrigações do sócio.” (REsp 1.236.916-RS).
Assim, é possível “a desconsideração inversa da personalidade jurídica sempre que o cônjuge ou companheiro empresário valer-se de pessoa jurídica por ele controlada, ou de interposta pessoa física, a fim de subtrair do outro cônjuge ou companheiro direitos oriundos da sociedade afetiva" (REsp 1.236.916-RS). Os exemplos mais citados pelos livros sobre desconsideração inversa estão no campo do Direito de Família. É o caso de um marido (ou companheiro) que transfere todos os seus bens para a sociedade empresária a fim de não ter que dividir seu patrimônio no divórcio ou dissolução da união estável.
A desconsideração inversa é admitida no direito brasileiro?
Antes desse § 3º, não havia previsão expressa em nosso ordenamento jurídico. Apesar disso, a doutrina e
a jurisprudência admitiam a desconsideração inversa. Nesse sentido:
	Enunciado 283-CJF: É cabível a desconsideração da personalidade jurídica denominada “inversa” para alcançar bens de sócio que se valeu da pessoajurídica para ocultar ou desviar bens pessoais, com prejuízo a terceiros.
	
	(...) A desconsideração inversa da personalidade jurídica caracteriza-se pelo afastamento da autonomia patrimonial da sociedade, para, contrariamente do que ocorre na desconsideração da personalidade propriamente dita, atingir o ente coletivo e seu patrimônio social, de modo a responsabilizar a pessoa jurídica por obrigações do sócio controlador.
IV — Considerando-se que a finalidade da disregard doctrine é combater a utilização indevida do ente societário por seus sócios, o que pode ocorrer também nos casos em que o sócio controlador esvazia o seu patrimônio pessoal e o integraliza na pessoa jurídica, conclui-se, de uma interpretação teleológica do art. 50 do CC/02, ser possível a desconsideração inversa da personalidade jurídica, de modo a atingir bens da sociedade em razão de dívidas contraídas pelo sócio controlador, conquanto preenchidos os requisitos previstos na norma. (...)
STJ. 3ª Turma. REsp 948117/MS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 22/06/2010.
	
Novo § 4º do art. 50: desconsideração envolvendo grupo econômico também exige os mesmos requisitos
	§ 4º A mera existência de grupo econômico sem a presença dos requisitos de que trata o caput deste artigo não autoriza a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica.
	
No âmbito das relações trabalhistas, as empresas que integram o mesmo grupo econômico possuem responsabilidade solidária, conforme previsto no art. 2º, § 2º, da CLT:
	
	Art. 2º (...)
§ 2º Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, ou ainda quando, mesmo guardando cada uma sua autonomia, integrem grupo econômico, serão responsáveis solidariamente pelas obrigações decorrentes da relação de emprego.
	
Alguns autores trabalhistas afirmam que esse art. 2º, § 2º da CLT traz uma hipótese de desconsideração da personalidade jurídica com base na teoria menor; outros, no entanto, sustentam que se trata pura e simplesmente de responsabilidade solidária.
O certo é que, nas relações jurídicas civis em geral (regidas pelo Código Civil), uma pessoa jurídica só responde pelas dívidas da outra pessoa jurídica do mesmo grupo econômico se estiverem presentes os
	requisitos que autorizam a desconsideração da personalidade jurídica com base na teoria maior. Em outras palavras, será necessário provar:
1) Abuso da personalidade (desvio de finalidade ou confusão patrimonial);
2) Que os administradores ou sócios da pessoa jurídica foram beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso.
Mesmo antes do novo § 4º, esse já era o entendimento da jurisprudência:
	Reconhecido o grupo econômico e verificada confusão patrimonial, é possível desconsiderar a personalidade jurídica de uma empresa para responder por dívidas de outra.
STJ. 3ª Turma. AgRg no AREsp 441.465/PR, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 18/06/2015.
	
Novo § 5º do art. 50: expansão ou alteração da finalidade original da atividade não constitui desvio de finalidade
	§ 5º Não constitui desvio de finalidade a mera expansão ou a alteração da finalidade original da atividade econômica específica da pessoa jurídica.
	
CASO CONCRETO JULGADO PELO STJ
Imagine a seguinte situação hipotética:
Existem determinados empreendimentos habitacionais que são planejados, construídos e comercializados por sociedades cooperativas. Um exemplo famoso é o da Paulicoop, cooperativa criada com o objetivo de construir e vender imóveis (em geral, apartamentos).
João celebrou contrato com a Paulicoop para adquirir um apartamento. O prazo máximo para entrega de sua unidade era o mês de julho de 2003.
Contudo, sua unidade nunca foi entregue, o que o levou a ajuizar ação de resolução cumulada com a devolução das quantias pagas.
Primeira dúvida: essa relação jurídica é regida pelo Código de Defesa do Consumidor? João pode ser considerado consumidor? A cooperativa habitacional pode ser classificada como fornecedora?
SIM. A cooperativa que promove um empreendimento habitacional assume posição jurídica equiparada a uma incorporadora imobiliária, estando sujeita, portanto, às disposições do Código de Defesa do Consumidor.
Quando lança um plano habitacional, a cooperativa age como prestadora de serviços, e os seus cooperados (adquirentes) se equiparam a consumidores.
Os cooperados adquirem o imóvel como destinatários finais e são considerados vulneráveis, razão pela qual se enquadram no conceito de consumidores.
Existe um enunciado que espelha esse entendimento:
	Súmula 602-STJ: O Código de Defesa do Consumidor é aplicável aos empreendimentos habitacionais promovidos pelas sociedades cooperativas.
	
Voltando ao caso concreto:
O pedido foi julgado procedente condenando a Paulicoop a pagar R$ 500 mil a João. Houve o trânsito em julgado.
Iniciou-se a fase de cumprimento de sentença e, após não serem localizados bens penhoráveis da cooperativa, o juiz decretou a desconsideração de sua personalidade jurídica.
O magistrado determinou, então, a inclusão de Luis, Paulo e Rodrigo no polo passivo da execução em virtude de eles terem sido membros do conselho fiscal da cooperativa.
Os três recorreram contra a decisão afirmando que não poderiam ter sido incluídos no polo passivo da execução por não deterem qualquer poder de ingerência na administração da cooperativa.
	Segunda dúvida: para se analisar se a decisão do juiz foi correta ou não, devemos examinar os requisitos da teoria maior ou da teoria menor de desconsideração da personalidade jurídica?
Os requisitos da teoria menor. Isso porque, conforme já explicado, estamos diante de uma relação de consumo. Logo, devemos analisar o art. 28, § 5º do CDC:
	
	Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.
(...)
§ 5º Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores.
	
A teoria menor tem aplicação restrita a situações excepcionais em que se mostra necessário proteger bens jurídicos de patente relevo social e inequívoco interesse público – como o Direito Ambiental e o Direito do Consumidor.
A teoria menor tratada no § 5º do art. 28 do CDC tem substrato na circunstância de que o risco empresarial normal às atividades econômicas não pode ser suportado pelo consumidor que contratou com a pessoa jurídica, mas sim por seus sócios administradores, ainda que demonstrem conduta administrativa proba, isto é, mesmo que não exista qualquer prova capaz de identificar conduta culposa ou dolosa por parte dos sócios administradores da pessoa jurídica.
Assim, “é possível, em linha de princípio, em se tratando de vínculo de índole consumerista, a utilização da chamada Teoria Menor da desconsideração da personalidade jurídica, a qual se contenta com [...] o fato de a personalidade jurídica representar um 'obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos
consumidores' (art. 28 e seu § 5º, do Código de Defesa do Consumidor)” (Resp 1111153/RJ, Quarta Turma,
DJe 04/02/2013).
Terceira dúvida: agiu corretamente o magistrado ao incluir os membros do conselho fiscal no polo passivo da execução?
NÃO.
O § 5º do art. 28 do CDC representa uma hipótese autônoma e independente de desconsideração, que não precisa cumprir os requisitos do caput do mesmo art. 28. Trata-se assim de uma hipótese que tem o objetivo de garantir uma ampla proteção aos consumidores já que basta que a personalidade jurídica esteja servindo como um “obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores.”
A despeito disso, mesmo em tal hipótese, a desconsideração somente pode atingir pessoasincumbidas da gestão da empresa.
Assim, a despeito de não se exigir prova de abuso ou fraude para fins de aplicação da Teoria Menor, tampouco de confusão patrimonial, o § 5º do art. 28 do CDC não dá margem para admitir a responsabilização pessoal de quem jamais atuou como gestor da empresa.
O art. 47 da Lei nº 5.764/1971, que instituiu o regime jurídico das sociedades cooperativas, preceitua que “(...) a sociedade será administrada por uma Diretoria ou Conselho de Administração, composto exclusivamente de associados eleitos pela Assembleia Geral"
Nesse mesmo diploma legal, foi dedicado um único artigo para definir as atribuições e a forma de composição do Conselho Fiscal, o que foi feito de maneira absolutamente genérica:
	
	Art. 56. A administração da sociedade será fiscalizada, assídua e minuciosamente, por um Conselho Fiscal, constituído de 3 (três) membros efetivos e 3 (três) suplentes, todos associados eleitos anualmente pela Assembleia Geral, sendo permitida apenas a reeleição de 1/3 (um terço) dos seus componentes.
	
	Os membros do Conselho Fiscal não administram, conforme explica Nilson Reis Júnior:
“A atuação do conselho fiscal e dos seus membros está sujeita a limites precisos. De um lado, é mero fiscal e não pode substituir os administradores da companhia no tocante à melhor forma de conduzir os negócios sociais. Não lhe compete apreciar a economicidade das decisões da diretoria ou conselho de administração nem interferir na conveniência dos negócios realizados. Sua tarefa limita-se aos aspectos da legalidade e regularidade dos atos de gestão. De outro lado, o conselho fiscal tem atuação interna, ou seja, os destinatários de seus atos são os órgãos sociais.” (Aspectos societários das cooperativas, Belo Horizonte: Mandamentos, 2006, p. 105)
A Lei das Sociedades Cooperativas equipara os componentes do Conselho Fiscal aos administradores das sociedades anônimas mas apenas para efeito de responsabilidade criminal (art. 53), não se aplicando o referido dispositivo, portanto, às relações de natureza civil.
Assim, desconsideração da personalidade jurídica, seja ela realizada com base na Teoria Maior ou na Teoria Menor, não pode ser decretada para admitir a responsabilização civil e pessoal de quem, além de não agir com culpa no desempenho de suas funções, não possui poder de gestão na cooperativa devedora nem dela seja controlador ou cooperado majoritário, até por se tratar de Sociedade Cooperativa que possui regramento distinto das Sociedades Limitadas e Anônimas.
Resumindo:
	A desconsideração da personalidade jurídica, ainda que com fundamento na Teoria Menor, não pode atingir o patrimônio pessoal de membros do Conselho Fiscal sem que haja a mínima presença de indícios de que estes contribuíram, ao menos culposamente e com desvio de função, para a prática de atos de administração.
A despeito de não se exigir prova de abuso ou fraude para fins de aplicação da Teoria Menor da desconsideração da personalidade jurídica, tampouco de confusão patrimonial, o § 5º do art. 28 do CDC não dá margem para admitir a responsabilização pessoal de quem jamais atuou como gestor da empresa.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.766.093-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Rel. Acd. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 12/11/2019 (Info 661).
	
DIREITOS AUTORAIS
É desnecessária a autorização do titular da obra parodiada que não for verdadeira reprodução da obra originária nem lhe implicar descrédito, ainda que a paródia tenha finalidade eleitoral
	A paródia é uma das limitações do direito de autor, com previsão no art. 47 da Lei 9.610/98, que prevê serem livres as paráfrases e paródias que não forem verdadeiras reproduções da obra originária nem lhe implicarem descrédito. Respeitadas essas condições, é desnecessária a autorização do titular da obra parodiada.
A finalidade da paródia, se comercial, eleitoral, educativa, puramente artística ou qualquer outra, é indiferente para a caracterização de sua licitude e liberdade assegurada pela Lei nº 9.610/98.
Caso concreto: durante sua campanha de reeleição para Deputado Federal em 2014, o humorista Tiririca fez uma paródia da música “O Portão”, de autoria de Roberto Carlos e Erasmo Carlos, na qual pedia votos. O STJ entendeu que não era devida indenização para o titular dos direitos autorais porque, em regra, não é necessária prévia autorização para a realização de paródias.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.810.440-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 12/11/2019 (Info 661).
	
	A situação concreta, com adaptações, foi a seguinte:
Em sua campanha de reeleição para Deputado Federal em 2014, o humorista Tiririca fez uma paródia da
música “O Portão”, de autoria de Roberto Carlos e Erasmo Carlos.
A belíssima canção, em sua versão original, tem um refrão muito conhecido que diz o seguinte:
“Eu voltei Agora pra ficar Porque aqui,
aqui é meu lugar”
Na campanha eleitoral divulgada na TV, Tiririca perguntava para ele mesmo vestido de Roberto Carlos: “até você votou em mim, bicho”? Em seguida, imitando Roberto Carlos, o humorista cantava, em forma de paródia, o refrão da música “O Portão”:
“Eu votei
De novo eu vou votar Tiririca
Brasília é o seu lugar.”
Ação de indenização por danos materiais
A Emi Songs do Brasil Edições Musicais Ltda., empresa que é titular dos direitos patrimoniais da canção “O Portão”, ajuizou ação de reparação por danos materiais contra Tiririca e o Diretório do Partido Político.
A empresa argumentou que houve clara violação aos direitos patrimoniais e morais do autor na medida em que os réus utilizam criação intelectual alheia, adaptando e alterando para melhor atender suas aspirações políticas, furtando-se do pagamento de direitos autorais, o que afronta o art. 28 da Lei nº 9.610/98:
	
	Art. 28. Cabe ao autor o direito exclusivo de utilizar, fruir e dispor da obra literária, artística ou científica.
	
Primeira pergunta: o candidato (Tiririca) é parte legítima para figurar na ação de reparação de danos decorrentes de uma propaganda eleitoral ou a responsabilidade por isso é do partido?
Em tese, processualmente falando, o candidato pode figurar no polo passivo da ação de indenização em razão solidariedade prevista no art. 241 do Código Eleitoral:
	
	Art. 241. Toda propaganda eleitoral será realizada sob a responsabilidade dos partidos e por eles paga, imputando-lhes solidariedade nos excessos praticados pelos seus candidatos e adeptos.
Parágrafo único. A solidariedade prevista neste artigo é restrita aos candidatos e aos respectivos partidos, não alcançando outros partidos, mesmo quando integrantes de uma mesma coligação.
	
Era necessária prévia autorização dos titulares dos direitos relacionados com essa obra para que ela tivesse sido utilizada como paródia?
NÃO.
Paródia
A paródia é forma de expressão do pensamento. É a imitação cômica de composição literária, filme, música, obra qualquer, dotada de comicidade, que se utiliza do deboche e da ironia para entreter. Consiste em uma interpretação nova, adaptação de obra já existente a um novo contexto, com versão diferente, debochada, satírica (Min. Luis Felipe Salomão).
Na paródia a pessoa faz um uso transformativo da obra original, resultando, portanto, em uma obra nova, ainda que reverenciando a obra parodiada.
A intenção é a de despertar o riso, porém sem causar prejuízo à obra original.
	Paródia como limitação dos direitos de autor
A paródia é uma das limitações do direito de autor, conforme prevê o art. 47 da Lei nº 9.610/98:
	
	Art. 47. São livres as paráfrases e paródias que não forem verdadeiras reproduções da obra originária nem lhe implicarem descrédito.
	
Se respeitados os limites da paródia, não é necessária prévia autorização do autor nem enseja pagamento de indenização
Conforme explica Rodrigo Moraes:
“(...) a paródia consiste num limite ao exercício da prerrogativa extrapatrimonial de respeito à obra. O parodista não precisa, pois, pedir prévia e expressa autorização do autor da obra parodiada.
A liberdade do parodista, contudo, não é absoluta. Assim como não o é a do caricaturistaem relação ao direito à imagem.
Em primeiro lugar, a paródia não pode ser uma verdadeira reprodução da obra anterior. Nela tem de existir certo grau de criatividade, sob pena de ser considerada plágio. Em segundo lugar, ela não pode ridicularizar, maliciosamente, o autor da obra originária, depreciando a sua honra. Nem pode atingir direitos da personalidade de terceiros. A liberdade de expressão encontra limite na dignidade da pessoa humana, que não pode ser vilipendiada.
Enfim, tanto o parodista quanto o caricaturista podem sofrer uma ação de indenização por danos morais, caso ultrapassem o limite da razoabilidade. A apreciação da ofensa, portanto, será casuística”. (Os Direitos Morais do Autor: repersonalizando o direito autoral. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 192)
Conforme já decidiu o STJ:
	(...) 2. A paródia é lícita e consiste em livre manifestação do pensamento, desde que não constitua verdadeira reprodução da obra originária, ou seja, que haja uma efetiva atividade criativa por parte do parodiador, e que não tenha conotação depreciativa ou ofensiva, implicando descrédito à criação primeva ou ao seu autor. O art. 47 da Lei nº 9.610/1998 não exige que a criação possua finalidade não lucrativa ou não comercial.
3. Na hipótese, o acórdão recorrido consignou que a campanha publicitária, promovida em formato impresso e digital, fez mera alusão a um dos versos que compõem a letra da canção "Garota de Ipanema", alterando-o de forma satírica e não depreciativa, sem reproduzir a melodia de coautoria de Tom Jobim e Vinicius de Moraes.
4. A publicidade é técnica de comunicação orientada à difusão pública de produtos, empresas, serviços, pessoas e ideias, que também envolve a atividade criativa. (...)
STJ. 3ª Turma. REsp 1.597.678/RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, DJe 24/8/2018.
	
Desse modo, é desnecessária a autorização do titular da obra parodiada que não for verdadeira reprodução da obra originária nem lhe implicar descrédito.
Mesmo que essa paródia tenha uma finalidade eleitoral?
Mesmo assim.
A propaganda eleitoral tem o objetivo de angariar votos, apresentando o nome de um determinado candidato a cargo eletivo, no contexto de uma eleição concreta. Logo, sua finalidade específica é o convencimento do eleitor para a escolha de uma certa candidatura.
Desse modo, não há razões que justifiquem um tratamento diferenciado da propaganda “comum” para a
propagando eleitoral no que tange à desnecessidade de prévia autorização do titular dos direitos no caso de paródia.
	A finalidade da paródia, se comercial, eleitoral, educativa, puramente artística ou qualquer outra, é indiferente para a caracterização de sua licitude e liberdade assegurada pela Lei nº 9.610/98.
Em suma:
	É desnecessária a autorização do titular da obra parodiada que não for verdadeira reprodução da obra originária nem lhe implicar descrédito, ainda que a paródia tenha incontroversa finalidade eleitoral.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.810.440-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 12/11/2019 (Info 661).
	
DIREITOS AUTORAIS
Ainda que a intérprete tenha autorizado a gravação e produção de um fonograma, a reprodução e comercialização do material obtido, em CD, precisa de sua nova anuência, não se podendo dizer que estava abrangida pela primeira autorização
	A fixação de uma interpretação em fonograma não é suficiente para absorver o direito prévio do intérprete, tampouco deriva em anuência para sua reprodução sucessiva ou em cessão definitiva de todos os direitos titularizados pelo intérprete e demais titulares de direitos de autor ou conexos.
Os direitos do artista intérprete estão elencados nos incisos do art. 90 da Lei nº 9.610/98, e a disposição de cada um deles não presume a cessão dos demais, devendo-se interpretar restritivamente os contratos de cessão de direitos autorais.
Caso concreto: Juliana, cantora, foi contratada pela “VAM Ltda” (empresa produtora de mídias) para gravar a canção “La vem Emília”. Ao ser contratada, Juliana foi informada de que a música seria utilizada como tema da personagem Emília, no programa de TV “Sítio do Pica Pau Amarelo”. Posteriormente, esse fonograma foi incluído em um CD intitulado Sítio do Pica-Pau Amarelo produzido pela “VAM Ltda”. Ocorre que Juliana não foi comunicada de que a música seria inserida no CD, além de a produtora não ter inserido o nome da intérprete nos créditos.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.400.463-RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 12/11/2019 (Info 661).
	
Imagine a seguinte situação adaptada:
Juliana, cantora, foi contratada pela “VAM Ltda” (empresa produtora de mídias) para gravar a canção “La vem Emília”.
Ao ser contratada, Juliana foi informada de que a música seria utilizada como tema da personagem Emília,
no programa de TV “Sítio do Pica Pau Amarelo”.
Posteriormente, esse fonograma (faixa de música) foi incluído em um CD intitulado Sítio do Pica-Pau
Amarelo produzido pela “VAM Ltda”.
Ocorre que Juliana não foi comunicada de que a música seria inserida no CD, além de a produtora não ter inserido o nome da intérprete nos créditos.
O debate jurídico foi, portanto, o seguinte: a produtora poderia ter utilizado a música gravada pela intérprete no CD sem a sua prévia autorização? O fato de a intérprete já ter gravado a música autoriza que a produtora utilize em outras atividades?
NÃO.
Direitos do intérprete e direitos da produtora fonográfica
No presente caso estamos diante do conflito entre:
· os direitos do intérprete e
· os direitos da produtora fonográfica.
	
Ambos são classificados como “direitos conexos aos direitos do autor” (art. 89 da Lei nº 9.610/98).
São chamados de direitos conexos porque se “anexam” à obra autoral.
Conforme explica Ana Frazão (A gestão pessoal dos direitos autorais e os novos negócios no mercado musical. In Revista Brasileira de Direito Civil – RBDCivil. Belo Horizonte, vol. 14, p. 226, out/dez 2017):
“(...) os direitos conexos constituem direitos autônomos com relação aos direitos de autor propriamente ditos, na medida em que são titularizados por sujeitos distintos e emergem de atos de criação que não se confundem, seja no momento, seja no conteúdo, com o ato que dá origem primeira à obra. Tratam-se, na verdade, de intervenções artísticas ou técnicas que, ao longo do tempo, agregam novas qualidades à obra em questão, fazendo aderir novos interesses a eventuais reproduções daquela peça. Basta notar que os direitos conexos previstos em lei constituem rol exemplificativo, uma vez que novos direitos conexos podem surgir a partir da introdução de novas intervenções sobre a obra e igualmente merecer proteção legal, como é o caso, no campo artístico, do remixing e, no campo técnico, do webcasting ou simulcasting.”
Direitos da produtora
Produtor é a “pessoa física ou jurídica que toma a iniciativa e tem a responsabilidade econômica da primeira fixação do fonograma ou da obra audiovisual, qualquer que seja a natureza do suporte utilizado” (art. 5º, XI, da Lei nº 9.610/98).
O direito da produtora recai sobre o fonograma, isto é, sobre a gravação. Os direitos da produtora estão previstos no art. 93:
	
	Art. 93. O produtor de fonogramas tem o direito exclusivo de, a título oneroso ou gratuito, autorizar-lhes ou proibir-lhes:
I - a reprodução direta ou indireta, total ou parcial;
II - a distribuição por meio da venda ou locação de exemplares da reprodução;
III - a comunicação ao público por meio da execução pública, inclusive pela radiodifusão; IV - (VETADO)
V - quaisquer outras modalidades de utilização, existentes ou que venham a ser inventada.
	
Direitos da intérprete
Os direitos da intérprete estão previstos no art. 90 da Lei:
	
	Art. 90. Tem o artista intérprete ou executante o direito exclusivo de, a título oneroso ou gratuito, autorizar ou proibir:
I - a fixação de suas interpretações ou execuções;
II - a reprodução, a execução pública e a locação das suas interpretações ou execuções fixadas; III - a radiodifusão das suas interpretações ou execuções, fixadas ou não;
IV - a colocação à disposição do público desuas interpretações ou execuções, de maneira que qualquer pessoa a elas possa ter acesso, no tempo e no lugar que individualmente escolherem;
V - qualquer outra modalidade de utilização de suas interpretações ou execuções.
§ 1º Quando na interpretação ou na execução participarem vários artistas, seus direitos serão exercidos pelo diretor do conjunto.
§ 2º A proteção aos artistas intérpretes ou executantes estende-se à reprodução da voz e imagem, quando associadas às suas atuações.
	
O fonograma, por conter a interpretação da cantora, também se sujeita à esfera do direito exclusivo da intérprete, que pode autorizar ou proibir a reprodução, na esteira do art. 90.
Fica evidente, assim, que os direitos da artista e da produtora não podem ser confundidos. Logo, não é possível presumir que o exercício dos segundos contém ou suprime os primeiros.
	Em suma:
	A fixação de uma interpretação em fonograma não é suficiente para absorver o direito prévio do intérprete, tampouco deriva em anuência para sua reprodução sucessiva ou em cessão definitiva de todos os direitos titularizados pelo intérprete e demais titulares de direitos de autor ou conexos.
Os direitos do artista intérprete estão elencados nos incisos do art. 90 da Lei nº 9.610/98, e a disposição de cada um deles não presume a cessão dos demais, devendo-se interpretar restritivamente os contratos de cessão de direitos autorais.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.400.463-RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 12/11/2019 (Info 661).
	Desse modo, ainda que a intérprete tenha autorizado a gravação e produção do fonograma, a reprodução e comercialização do material obtido em CD não teve a sua anuência, não se podendo dizer que estava abrangida pela primeira autorização porque essa inclusão no CD foi um ato subsequente e caracterizador de nova utilização.
COOPERATIVAS
Se um cooperado pede para sair ou é expulso da cooperativa ele não terá direito de receber uma quota-parte do FATES, que é um fundo indivisível
	Não se partilha a verba do Fundo de Reserva e Assistência Técnica Educacional e Social - FATES
- com o associado excluído ou que se retira do quadro social da cooperativa.
O percentual obrigatoriamente pago ao FATES, no percentual mínimo de 5% das sobras líquidas apuradas ao final do exercício social não é disponível e seu destino independe da vontade dos cooperados.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.562.184-RS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 12/11/2019 (Info 661).
	Imagine a seguinte situação adaptada:
Copershoes é uma cooperativa de calçados.
João era um dos cooperados desde 1998, mas em 2018 foi excluído da cooperativa.
Ele pediu, então, para receber a sua cota parte do FATES (Fundo de Assistência Técnica Educacional e Social) em relação ao tempo que ficou na cooperativa.
O que é o FATES?
A Lei prevê que as cooperativas são obrigadas a formar um fundo para a assistência dos associados, familiares e dos empregados. Isso é o FATES: Fundo de Assistência Técnica, Educacional e Social. Veja a redação do art. 28, II, da Lei nº 5.764/71:
	
	Art. 28. As cooperativas são obrigadas a constituir:
(...)
II - Fundo de Assistência Técnica, Educacional e Social, destinado a prestação de assistência aos associados, seus familiares e, quando previsto nos estatutos, aos empregados da cooperativa, constituído de 5% (cinco por cento), pelo menos, das sobras líquidas apuradas no exercício.
	
O pedido de João foi acolhido? O FATES pode ser partilhado com cooperado excluído ou que se retira do quadro social da cooperativa?
NÃO.
O art. 4º, VIII, da Lei nº 5.764/71 afirma que o FATES é indivisível:
	
	Art. 4º As cooperativas são sociedades de pessoas, com forma e natureza jurídica próprias, de natureza civil, não sujeitas a falência, constituídas para prestar serviços aos associados, distinguindo-se das demais sociedades pelas seguintes características:
	
	(...)
VIII - indivisibilidade dos fundos de Reserva e de Assistência Técnica Educacional e Social;
	
O Código Civil, em seu art. 1.094, VIII, menciona apenas o fundo de reserva (um outro fundo obrigatório das cooperativas) como sendo indivisível. Confira:
	
	Art. 1.094. São características da sociedade cooperativa:
(...)
VIII - indivisibilidade do fundo de reserva entre os sócios, ainda que em caso de dissolução da sociedade.
	
Apesar desse “silêncio” do Código Civil sobre o FATES, a doutrina e o STJ afirmam que a intenção do art. 1.094, VIII, do CC não foi a de revogar tacitamente o art. 4º, VIII, da Lei nº 5.764/71 nem retirar a indivisibilidade do FATES.
Aplica-se aqui o princípio da especialidade e, portanto, ainda subsiste a indivisibilidade do FATES.
Além disso, a regra constante do art. 4º, VIII, da Lei nº 5.764/71, não colide com o Código Civil, que ressalva a possibilidade de aplicação de disposições concernentes à Lei das Cooperativas em circunstâncias que não divergem do mencionado diploma.
Assim, não é plausível que, na apuração de haveres por retirada de cooperado, este perceba cota-parte que compõe o FATES, já que a natureza do fundo não se transmuda ou se transforma pela retirada ou exclusão de associado, que é um direito potestativo e irrestrito, porém, submetido às regras do sistema cooperativista.
Em suma:
	Não se partilha a verba do Fundo de Reserva e Assistência Técnica Educacional e Social - FATES - com o associado excluído ou que se retira do quadro social da cooperativa.
O percentual obrigatoriamente pago ao FATES, no percentual mínimo de 5% das sobras líquidas apuradas ao final do exercício social não é disponível e seu destino independe da vontade dos cooperados.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.562.184-RS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 12/11/2019 (Info 661).
	
DIREITO DO CONSUMIDOR
COMPRA E VENDA DE IMÓVEL
O promitente-comprador, em razão de atraso, pediu o desfazimento do contrato, a devolução dos valores e a condenação da construtora a pagar lucros cessantes; o termo final dos lucros cessantes é a data do trânsito em julgado da ação que pediu a resolução
Importante!!!
	No caso de resolução de contrato por atraso na entrega de imóvel além do prazo de tolerância, por culpa da incorporadora, o termo ad quem dos lucros cessantes é a data do trânsito em julgado.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.807.483-DF, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 08/10/2019 (Info 661).
Observação 1:
Se o contrato contiver uma cláusula prevendo multa em caso de atraso na entrega do imóvel (cláusula penal moratória), a construtora pagará apenas a multa, não podendo ser cumulada com lucros cessantes. Nesse sentido:
	A cláusula penal moratória tem a finalidade de indenizar pelo adimplemento tardio da obrigação e, em regra, estabelecida em valor equivalente ao locativo, afasta-se sua cumulação com lucros cessantes.
STJ. 2ª Seção. REsp 1.498.484-DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 22/05/2019 (recurso repetitivo) (Info 651).
Observação 2:
Em 28/12/2018, entrou em vigor a Lei nº 13.786/2018, que dispõe sobre a resolução do contrato por inadimplemento do adquirente de unidade imobiliária.
A Lei nº 13.786/2018 acrescentou o art. 43-A na Lei nº 4.591/64 para tratar sobre o inadimplemento (parcial ou absoluto) em contratos de compra e venda, promessa de venda, cessão ou promessa de cessão de unidades autônomas integrantes de incorporação imobiliária ou de loteamento.
O entendimento acima exposto REsp 1.807.483-DF só se aplica para os contratos celebrados antes da vigência da Lei nº 13.786/2018.
As regras da Lei nº 13.786/2018 não podem ser aplicadas aos contratos anteriores à sua vigência.
	
Imagine a seguinte situação hipotética:
João celebrou contrato de promessa de compra e venda de um apartamento com a construtora MRT Engenharia.
A cláusula quinta do pacto previa que a construtora entregaria o apartamento no dia 31/03/2012, podendo prorrogar a entrega para 30/09/2012, ou seja, por mais 180 dias (prazo de tolerância).
Chegou o ano de 2014 e, mesmo assim, a construtora não entregou o imóvel.
Diante disso, João ajuizou ação de resolução contratual cumulada com restituiçãode quantia paga e indenização por lucros cessantes em virtude de atraso na entrega de imóvel.
Em outras palavras, o promitente-comprador, em razão do enorme atraso, pediu o desfazimento do contrato, a devolução de todo valores pagos e a condenação da construtora a pagar lucros cessantes.
Os pedidos do promitente-comprador foram acolhidos?
SIM.
Qual é o termo a quo (termo inicial) dos lucros cessantes?
O dia limite para a entrega do apartamento (já considerando o prazo de tolerância). Em nosso exemplo, o dia 30/09/2012.
E o termo final? Qual é o termo ad quem dos lucros cessantes?
	O termo ad quem dos lucros cessantes é a data do trânsito em julgado.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.807.483-DF, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 08/10/2019 (Info 661).
	Vale ressaltar que somente se considera o atraso quando a construtora não entrega o apartamento no prazo previsto no contrato, sendo válida a previsão que estipula a chamada cláusula de tolerância:
	No contrato de promessa de compra e venda de imóvel em construção (“imóvel na planta”), além do período previsto para o término do empreendimento, há, comumente, uma cláusula prevendo a possibilidade de prorrogação excepcional do prazo de entrega da unidade ou de conclusão da obra por um prazo que varia entre 90 e 180 dias. Isso é chamado de “cláusula de tolerância”.
Não é abusiva a cláusula de tolerância nos contratos de promessa de compra e venda de imóvel em construção, desde que o prazo máximo de prorrogação seja de até 180 dias.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.582.318-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 12/9/2017 (Info 612).
	Observação 1:
Se o contrato contiver uma cláusula prevendo multa em caso de atraso na entrega do imóvel (cláusula penal moratória), a construtora pagará apenas a multa, não podendo ser cumulada com lucros cessantes. Nesse sentido:
	A cláusula penal moratória tem a finalidade de indenizar pelo adimplemento tardio da obrigação e, em regra, estabelecida em valor equivalente ao locativo, afasta-se sua cumulação com lucros cessantes.
STJ. 2ª Seção. REsp 1.498.484-DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 22/05/2019 (recurso repetitivo) (Info 651).
Observação 2:
Em 28/12/2018, entrou em vigor a Lei nº 13.786/2018, que dispõe sobre a resolução do contrato por inadimplemento do adquirente de unidade imobiliária.
A Lei nº 13.786/2018 acrescentou o art. 43-A na Lei nº 4.591/64 para tratar sobre o inadimplemento (parcial ou absoluto) em contratos de compra e venda, promessa de venda, cessão ou promessa de cessão de unidades autônomas integrantes de incorporação imobiliária ou de loteamento.
O entendimento acima exposto REsp 1.807.483-DF só se aplica para os contratos celebrados antes da vigência da Lei nº 13.786/2018.
As regras da Lei nº 13.786/2018 não podem ser aplicadas aos contratos anteriores à sua vigência.
DIREITO EMPRESARIAL
RECUPERAÇÃO JUDICIAL
É imprescindível a verificação da natureza onerosa ou gratuita do aval prestado, antes do pedido de recuperação judicial por sociedade empresária, para que se determine se a garantia se sujeita ou não ao processo de soerguimento
	A empresa “J” tomou dinheiro emprestado junto a um banco e a empresa “E” foi avalista. Antes do vencimento, a empresa “E” entrou em recuperação judicial.
Esse crédito do banco deverá ser habilitado na recuperação judicial e poderá ser cobrado da
empresa “E” (avalista)?
Depende. O art. 5º, I, da Lei nº 11.101/2005 preconiza:
Art. 5º Não são exigíveis do devedor, na recuperação judicial ou na falência: I – as obrigações a título gratuito;
Esse art. 5º, I, tem como objetivo impedir que o devedor, já com dificuldades para adimplir dívidas decorrentes de obrigações de natureza onerosa, seja também compelido a satisfazer aquelas pelas quais não recebera qualquer contrapartida, circunstância que implicaria quebra de isonomia e prejuízo a quem se tornou credor e cumpriu, a contento, a contraprestação respectiva.
Assim, será necessário verificar se esse aval prestado pela empresa teve natureza onerosa ou gratuita, para que se determine se a garantia se sujeita ou não ao processo de recuperação judicial.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.829.790-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 19/11/2019 (Info 661).
	
Recuperação judicial
A recuperação judicial consiste em um processo judicial, no qual será construído e executado um plano com o objetivo de recuperar a empresa que está em vias de efetivamente ir à falência. Logo, em vez de a empresa ir à falência (o que é nocivo para a economia, para os donos da empresa, para os funcionários etc.), tenta-se dar um novo fôlego para a sociedade empresária, renegociando as dívidas com os credores. Na antiga Lei de Falências, esse processo era chamado de “concordata” (DL 7.661/45).
	A Lei nº 11.101/2005 acabou com a “concordata” e criou um novo instituto, com finalidade semelhante, chamado de recuperação judicial.
Assim, a recuperação judicial surgiu para substituir a antiga “concordata” e tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise do devedor, a fim de permitir que a atividade empresária se mantenha e, com isso, sejam preservados os empregos dos trabalhadores e os interesses dos credores.
Créditos que estão sujeitos à recuperação judicial
Na recuperação judicial, a empresa devedora, que está “sufocada” por dívidas, irá pagar os seus credores
de uma forma mais “suave”, a fim de que consiga quitar todos os débitos e se manter funcionando.
Assim, os credores da empresa em recuperação judicial são inscritos no “quadro geral de credores”, e cada
um receberá seu crédito de acordo com o que for definido no plano de recuperação.
Um dos temas importantes sobre esse assunto é saber quais créditos estão sujeitos à recuperação judicial, ou seja, quais credores irão ter que receber seus créditos conforme o plano de recuperação.
Regra
Em regra, estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido de recuperação judicial, ainda que não vencidos (art. 49, caput, da Lei nº 11.101/2005):
	
	Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos.
	
Ex: a empresa tem que pagar uma dívida com um fornecedor daqui a 9 meses; se o pedido de recuperação foi feito hoje, esse crédito já será incluído nas regras da recuperação judicial, mesmo que ainda não tenha chegado a data do vencimento.
Consequência dessa regra:
Como vimos acima, tendo sido decretada a recuperação judicial, os credores irão receber conforme o plano. Como consequência disso, em regra, as ações e execuções que tramitam contra a empresa em recuperação são suspensas para poder não atrapalhar a execução do plano. Veja:
	
	Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário.
(...)
§ 4º Na recuperação judicial, a suspensão de que trata o caput deste artigo em hipótese nenhuma excederá o prazo improrrogável de 180 (cento e oitenta) dias contado do deferimento do processamento da recuperação, restabelecendo-se, após o decurso do prazo, o direito dos credores de iniciar ou continuar suas ações e execuções, independentemente de pronunciamento judicial.
	
Esse prazo em que haverá a pausa momentânea das ações e execuções é chamado de stay period e tem por objetivo permitir que o devedor em crise consiga negociar, de forma conjunta com todos os credores (plano de recuperação) e, ao mesmo tempo, preservar o patrimônio do empreendimento, que ficará livre, por um determinado período de respiro, de eventuais constrições (ex: penhora) de bens necessários à continuidade da atividade empresarial. Com isso, minimiza-se o risco de haver uma falência.
Exceções à regra:
A regra acima exposta (caput do art. 49) possui exceções que estão elencadas nos §§ 3º e 4º.
Dessa feita, nesses parágrafos estão previstos determinados créditos que não se sujeitam aos efeitos da recuperação judicial.
	Imagineagora a seguinte situação hipotética:
A empresa Teikon Indústria S/A contraiu um empréstimo junto ao Banco do Brasil e, como garantia do pagamento, emitiu uma cédula de crédito bancário.
A Cédula de Crédito Bancário (CCB) é um título de crédito extremamente comum na atividade empresarial, estando disciplinada nos arts. 26 a 45 da Lei nº 10.931/2004.
Quando uma pessoa física ou jurídica adquire um empréstimo bancário, a instituição financeira exige que este mutuário emita, em favor do banco, uma cédula de crédito bancário, que é um papel no qual o emitente se compromete a pagar para o beneficiário determinada quantia ali prevista.
Este papel (CCB) fica em poder do credor. Caso o emitente não cumpra a sua promessa e não pague a dívida no prazo, o credor poderá executar a CCB, que é um título de crédito e, portanto, título executivo extrajudicial. Conforme definição de Fran Martins:
“A cédula de crédito bancário – instrumento da obrigação garantida pela recuperanda – consiste, como é cediço, em título de crédito emitido em favor de instituição financeira ou entidade a esta equiparada, representando promessa de pagamento em dinheiro decorrente de operação de crédito de qualquer modalidade.” (MARTINS, Fran. Títulos de crédito. 17ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 546).
ESESA foi avalista da obrigação
A empresa ESESA S/A foi avalista desta obrigação assumida pela Teikon, ou seja, se esta não pagar, o BB poderá cobrar a dívida da ESESA.
Recuperação judicial da ESESA
Antes que chegasse o dia do pagamento do empréstimo, foi decretada a recuperação judicial da ESESA. Ao se apurar as obrigações da empresa recuperanda, constatou-se que ela havia assumido essa condição de avalista.
Diante disso, o crédito do Banco do Brasil relativo à Cédula de Crédito Bancário foi incluído no quadro geral de credores apresentado pelo administrador judicial.
O Banco do Brasil não concordou com isso porque iria “travar” o recebimento da quantia e pediu ao Juiz que esse seu crédito fosse excluído do quadro geral de credores sustentando que ele não deve se sujeitar aos efeitos do processo de recuperação judicial, pois a recuperanda (ESESA) figura tão somente como avalista da obrigação, circunstância que afastaria a incidência do art. 49 da Lei nº 11.101/2005.
O administrador judicial defendeu a submissão dos valores ao processo recuperacional, afirmando que a manutenção da credora no rol de créditos tem por base apenas evitar discussões no futuro relativas a não participação efetiva do Banco do Brasil nas discussões sobre o plano apresentado e que espera seja aprovado, eis que se eventualmente o devedor principal deixasse de efetuar o pagamento das dívidas, o aval da empresa ESESA deverá ser pago nos moldes do plano aprovado.
A questão chegou até o STJ. Vejamos o que foi decidido pelo Tribunal.
Aval não está listado como exceção nos §§ 3º e 4º do art. 49
O aval representa garantia prestada em favor de devedor de título de crédito, caracterizada pelo fato de o avalista responder pelo cumprimento da obrigação da mesma maneira que o devedor principal.
A obrigação derivada do aval é autônoma e independente em relação à obrigação por ele garantida. É dizer, o avalista responde solidariamente pela dívida perante o credor, não lhe sendo cabível invocar exceções de ordem pessoal, tampouco benefício de ordem.
Conforme vimos acima, o art. 49 da Lei nº 11.101/2005 estipula que todos os créditos existentes na data do pedido de recuperação judicial ficam sujeitos a seus efeitos (ainda que não vencidos), excetuados aqueles listados nos §§ 3º e 4º do mesmo artigo. Esses parágrafos não mencionam o aval. Assim, formalmente, o aval não se inclui como uma exceção aos efeitos da recuperação judicial.
Desse modo, como o caput do art. 49 afirma que devem ser incluídos na recuperação judicial as dívidas da empresa recuperanda, mesmo que ainda não estejam vencidas e como o aval não está previsto nos §§
	3º e 4º, a conclusão inicial seria a de que este crédito do Banco do Brasil deveria sim ser incluído no quadro geral de credores.
Um dos argumentos invocados pelo administrador judicial foi o de que o aval conferido teria sido um ato gratuito e, portanto, seria uma obrigação que não poderia ser cobrada em razão da decretação da recuperação judicial. Esse argumento, em tese, é correto?
SIM. O art. 5º, I, da Lei nº 11.101/2005 preconiza:
	
	Art. 5º Não são exigíveis do devedor, na recuperação judicial ou na falência: I – as obrigações a título gratuito;
(...)
	
Esse art. 5º, I, tem como objetivo impedir que o devedor, já com dificuldades para adimplir dívidas decorrentes de obrigações de natureza onerosa, seja também compelido a satisfazer aquelas pelas quais não recebera qualquer contrapartida, circunstância que implicaria quebra de isonomia e prejuízo a quem se tornou credor e cumpriu, a contento, a contraprestação respectiva.
“Não seria justo comprometer parte dos recursos disponíveis na massa ou no patrimônio do devedor em recuperação no atendimento a obrigação gratuita, quando não há suficientes para pagamento de todos os credores.” (COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários à Lei de Falências e Recuperação de Empresas. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2018, p. 73)
Desse modo, como o argumento é correto, para a resolução do caso concreto é fundamental analisar se o aval concedido foi ou não um ato gratuito, conforme decidiu o STJ:
	É imprescindível a verificação da natureza onerosa ou gratuita do aval prestado, antes do pedido de recuperação judicial por sociedade empresária, para que se determine se a garantia se sujeita ou não ao processo de soerguimento.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.829.790-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 19/11/2019 (Info 661).
	
Para dizer se o aval concedido foi gratuito ou oneroso é necessário examinar se houve algum ganho indireto para o avalista
Não se pode considerar o aval como um ato gratuito ou onerosof sem antes analisar as circunstâncias que ensejaram sua concessão.
É bastante comum que as relações negociais travadas no âmbito empresarial envolvam a prestação de garantias em contrapartida a algum outro ato praticado (ou a ser praticado) pelo avalizado ou por terceiros Interessados. Explicando melhor nas palavras de Luis Felipe Spinelli:
“ainda que não exista contraprestação direta pelo aval, existem situações em que a garantia foi prestada com o objetivo de auferir algum ganho, mesmo que intangível, como ocorre na hipótese de aval prestado em benefício de sociedades do mesmo grupo econômico ou para viabilizar operações junto a parceiros comerciais, hipóteses nas quais não se pode considerar tal obrigação como a título gratuito” (O aval na recuperação judicial e na falência. In Direito das garantias. Gisela
S. da Cruz Guedes et. al. (coordenação). São Paulo: Saraiva, 2017, p. 156).
Nessas hipóteses, portanto – em que a declaração cambiária em questão assume contornos de natureza onerosa –, a norma do art. 5º, I, da LFRE não tem aplicabilidade. Logo, o crédito correspondente ao aval deverá se sujeitar aos efeitos da recuperação judicial.
Voltando ao caso concreto:
No caso concreto, que foi adaptado na explicação acima para fins didáticos, o STJ afirmou que as partes não haviam debatido sobre a natureza do aval prestado: se gratuito ou oneroso.
	Diante disso, o Tribunal determinou o retorno dos autos ao juízo de primeiro grau a fim de que verifique se o aval foi prestado a título gratuito ou oneroso e, na sequência, prossiga no julgamento da impugnação de crédito, de acordo com o entendimento fixado pelo STJ.
RECUPERAÇÃO JUDICIAL
Os encargos derivados de adiantamento de contratos de câmbio se submetem aos efeitos da recuperação judicial da devedora
	Adiantamento sobre contrato de câmbio (ACC) é um serviço por meio do qual o banco faz a antecipação de recursos para o exportador, em moeda nacional (Reais), enquanto ele não recebe o dinheiro da exportação.
Os encargos derivados de adiantamento de contratos de câmbio se submetem aos efeitos da recuperação judicial da devedora.
O exportador que celebrouum ACC terá que, depois de um tempo que for combinado, devolver ao banco os recursos que a ele foram adiantados. Ocorre que, além da quantia principal adiantada, o exportador também terá que pagar outros valores acessórios, como juros, multa, taxas etc.
· Os valores relacionados com adiantamento a contrato de câmbio não se sujeitam aos efeitos da falência, por força do § 4º do art. 49 da Lei nº 11.101/2005. São considerados créditos extraconcursais.
· Por outro lado, os ENCARGOS derivados de adiantamento de contratos de câmbio: submetem-se aos efeitos da recuperação judicial da empresa devedora. Isso significa que o banco, para receber os encargos, terá que sujeitar esse crédito às regras de pagamento da recuperação judicial.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.810.447-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 05/11/2019 (Info 661).
	
Recuperação judicial
A recuperação judicial consiste em um processo judicial, no qual será construído e executado um plano com o objetivo de recuperar a empresa que está em vias de efetivamente ir à falência. Logo, em vez de a empresa ir à falência (o que é nocivo para a economia, para os donos da empresa, para os funcionários etc.), tenta-se dar um novo fôlego para a sociedade empresária, renegociando as dívidas com os credores. Na antiga Lei de Falências, esse processo era chamado de “concordata” (DL 7.661/45).
A Lei nº 11.101/2005 acabou com a “concordata” e criou um novo instituto, com finalidade semelhante, chamado de recuperação judicial.
Assim, a recuperação judicial surgiu para substituir a antiga “concordata” e tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise do devedor, a fim de permitir que a atividade empresária se mantenha e, com isso, sejam preservados os empregos dos trabalhadores e os interesses dos credores.
Créditos que estão sujeitos à recuperação judicial
Na recuperação judicial, a empresa devedora, que está “sufocada” por dívidas, irá pagar os seus credores de uma forma mais “suave”, a fim de que consiga quitar todos os débitos e se manter funcionando.
Assim, os credores da empresa em recuperação judicial são inscritos no “quadro geral de credores”, e cada
um receberá seu crédito de acordo com o que for definido no plano de recuperação.
Um dos temas importantes sobre esse assunto é saber quais créditos estão sujeitos à recuperação judicial, ou seja, quais credores irão ter que receber seus créditos conforme o plano de recuperação.
	Regra
Em regra, estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido de recuperação judicial, ainda que não vencidos (art. 49, caput, da Lei nº 11.101/2005).
Ex: a empresa tem que pagar uma dívida com um fornecedor daqui a 9 meses; se o pedido de recuperação foi feito hoje, esse crédito já será incluído nas regras da recuperação judicial, mesmo que ainda não tenha chegado a data do vencimento.
Consequência dessa regra:
Como vimos acima, tendo sido decretada a recuperação judicial, os credores irão receber conforme o plano. Como consequência disso, em regra, as ações e execuções que tramitam contra a empresa em recuperação são suspensas para poder não atrapalhar a execução do plano. Veja:
	
	Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário.
(...)
§ 4º Na recuperação judicial, a suspensão de que trata o caput deste artigo em hipótese nenhuma excederá o prazo improrrogável de 180 (cento e oitenta) dias contado do deferimento do processamento da recuperação, restabelecendo-se, após o decurso do prazo, o direito dos credores de iniciar ou continuar suas ações e execuções, independentemente de pronunciamento judicial.
	
Esse prazo em que haverá a pausa momentânea das ações e execuções é chamado de stay period e tem por objetivo permitir que o devedor em crise consiga negociar, de forma conjunta com todos os credores (plano de recuperação) e, ao mesmo tempo, preservar o patrimônio do empreendimento, que ficará livre, por um determinado período de respiro, de eventuais constrições (ex: penhora) de bens necessários à continuidade da atividade empresarial. Com isso, minimiza-se o risco de haver uma falência.
Exceções à regra:
A regra acima exposta (caput do art. 49) possui exceções que estão elencadas nos §§ 3º e 4º.
Dessa feita, nesses parágrafos estão previstos determinados créditos que NÃO se sujeitam aos efeitos da recuperação judicial.
Veja o § 4º, que interessa para explicar o julgado:
	
	Art. 49 (...)
§ 4º Não se sujeitará aos efeitos da recuperação judicial a importância a que se refere o inciso II do art. 86 desta Lei.
	
O inciso II do art. 86, por sua vez, preconiza:
	
	Art. 86. Proceder-se-á à restituição em dinheiro:
(...)
II – da importância entregue ao devedor, em moeda corrente nacional, decorrente de adiantamento a contrato de câmbio para exportação, na forma do art. 75, §§ 3º e 4º , da Lei nº 4.728, de 14 de julho de 1965, desde que o prazo total da operação, inclusive eventuais prorrogações, não exceda o previsto nas normas específicas da autoridade competente;
	
Desse modo, os valores relacionados com adiantamento a contrato de câmbio (art. 86, II) não se sujeitam aos efeitos da falência, por força do § 4º do art. 49 da Lei nº 11.101/2005. São considerados créditos extraconcursais.
	O que é adiantamento a contrato de câmbio (ACC)?
O exportador, quando vende uma mercadoria para um outro país estrangeiro, algumas vezes demora muito tempo para receber o valor devido. Isso porque o comprador que está localizado no estrangeiro só aceita pagar (tudo ou pelo menos a maior parte) depois que a mercadoria chega ao destino.
Assim, entre faturar o pedido e receber a quantia, o exportador demora um tempo para receber efetivamente o pagamento.
Pensando nisso, os bancos oferecem um serviço ao exportador, que é o adiantamento sobre contrato de câmbio (ACC). A instituição financeira antecipa parcial ou totalmente para o exportador o valor dos produtos vendidos ao exterior e que ainda irão demorar um pouco para serem entregues.
O adiantamento é feito em moeda nacional, referente ao valor da venda feita em moeda estrangeira. Nesse caso, a conversão é feita pela taxa de câmbio corrente do dia da contratação do ACC. Por isso, o adiantamento tem uma outra vantagem que é a de permitir que o exportador receba o seu pagamento em uma taxa de câmbio fixa, protegendo-se de possíveis variações cambiais até a entrega do produto.
Resumindo: ACC (adiantamento sobre contrato de câmbio) é um serviço por meio do qual o banco faz a antecipação de recursos para o exportador, em moeda nacional (Reais), enquanto ele não recebe o dinheiro da exportação.
O que são os “encargos derivados do adiantamento de contratos de câmbio”?
O exportador que celebrou um ACC terá que, depois de um tempo que for combinado, devolver ao banco os recursos que a ele foram adiantados. Ocorre que, além da quantia principal adiantada, o exportador também terá que pagar outros valores acessórios, como juros, multa, taxas etc.
ACC está fora dos efeitos da falência
Conforme vimos acima, os valores relacionados com adiantamento a contrato de câmbio (art. 86, II) não se sujeitam aos efeitos da falência, por força do § 4º do art. 49 da Lei nº 11.101/2005. São considerados créditos extraconcursais.
Assim, quando o exportador for devolver os valores ao banco, a instituição financeira não precisará entrar
na “fila” de credores. A ACC está fora do concurso de credores. É um crédito extraconcursal. Nesse sentido:
	(...) o crédito resultante de adiantamento de contrato de câmbio não se submete aos efeitos da recuperação judicial, nos termos do art. 49, § 4º, da Lei n. 11.101/2005.
STJ. 3ª Turma. AgRg no REsp 1444410/PR, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 27/10/2015.
	
A dúvida que surgiu foi a seguinte: os ENCARGOS derivados do adiantamento de contratos de câmbio estão também incluídos no § 4º do art. 49 e, portanto, estão fora dos efeitosda recuperação judicial? NÃO.
· adiantamento de contratos de câmbio: não se submete aos efeitos da recuperação judicial. São créditos
extraconcursais previstos no § 4º do art. 49.
· ENCARGOS derivados de adiantamento de contratos de câmbio: submetem-se aos efeitos da recuperação judicial da empresa devedora. Não estão abrangidos pela previsão do § 4º do art. 49.
	Os encargos derivados de adiantamento de contratos de câmbio se submetem aos efeitos da recuperação judicial da devedora.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.810.447-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 05/11/2019 (Info 661).
	
O art. 49, § 4º, da Lei nº 11.101/2005 autoriza a exclusão apenas do montante principal adiantado pela instituição financeira à recuperanda (devidamente atualizado), mas não abrange os encargos correlatos. A própria interpretação literal dos dispositivos revela que estão fora dos efeitos da recuperação judicial apenas “a importância entregue ao devedor, em moeda corrente nacional”.
 	ECA	
PEDIDO DE GUARDA
Mãe biológica pode se opor à ação de guarda de sua filha mesmo
que já tenha perdido o poder familiar em ação proposta pelo MP com esse objetivo
	A mãe biológica detém legitimidade para recorrer da sentença que julgou procedente o pedido de guarda formulado por casal que exercia a guarda provisória da criança, mesmo se já destituída do poder familiar em outra ação proposta pelo Ministério Público e já transitada em julgado.
O fato de a mãe biológica ter sido destituída, em outra ação, do poder familiar em relação a seu filho, não significa, necessariamente, que ela tenha perdido a legitimidade recursal na ação de guarda.
Para a mãe biológica, devido aos laços naturais, persiste o interesse fático e jurídico sobre a criação e destinação da criança, mesmo após destituída do poder familiar.
Assim, enquanto não cessado o vínculo de parentesco com o filho, através da adoção, que extingue definitivamente o poder familiar dos pais biológicos, é possível a ação de restituição do poder familiar, a ser proposta pelo legítimo interessado, no caso, os pais destituídos do poder familiar.
STJ. 4ª Turma. REsp 1.845.146-ES, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 19/11/2019 (Info 661).
	
Imagine a seguinte situação hipotética:
Larissa é filha biológica de Francisca.
Ocorre que Larissa, quando tinha 2 anos de idade, foi abandonada por sua genitora e passou a morar na casa de Paulo e Regina, que cuidam da criança como se ela fosse sua filha.
Ação de guarda e citação da mãe biológica
Depois de 5 anos convivendo com a criança, Paulo e Regina ajuizaram ação de guarda em relação à Larissa (agora com 7 anos), a fim de regularizar a posse de fato da referida menor.
Francisca, mãe biológica da criança, foi citada. Na contestação argumentou que não mais cuidou da criança porque se encontra cumprindo pena. Alegou que deseja que Larissa seja criada por seus avós maternos (pais de Francisca) e, portanto, opõe-se ao pedido dos autores.
Ação de destituição do poder familiar
Depois da contestação apresentada, o Ministério Público ajuizou ação de destituição do poder familiar contra Francisca.
O juiz responsável pela ação de guarda ajuizada por Paulo e Regina, ao ser informado desta ação do Parquet, decidiu que o processo de guarda deveria ficar suspenso até o julgamento da ação de destituição do poder familiar.
O pedido formulado pelo MP na ação de destituição foi julgado procedente e o juiz destituiu Francisca do poder familiar exercido sobre a menor, tendo a sentença transitado em julgado.
Retomada da ação de guarda
Como a ação de destituição do poder familiar transitou em julgado, o juiz da ação de guarda retomou o curso do processo.
Após mais algumas diligências, o magistrado proferiu sentença julgando procedente o pedido, deferindo a guarda definitiva da menor Larissa aos autores Paulo e Regina.
Francisca, mãe biológica, interpôs apelação reiterando que deseja que a filha seja criada pelos avós
 maternos.	
	O recurso não foi conhecido por ausência de legitimidade recursal.
O Tribunal de Justiça afirmou o seguinte: como a mãe biológica, durante o curso deste processo de guarda, foi destituída do poder familiar, ela passou a não mais ter legitimidade para recorrer das decisões que conferiram a guarda da menor à família substituta em detrimento da família extensa (avôs maternos).
Francisca (mãe biológica da criança) tem legitimidade para recorrer contra essa sentença?
SIM.
	A mãe biológica detém legitimidade para recorrer da sentença que julgou procedente o pedido de guarda formulado por casal que exercia a guarda provisória da criança, mesmo se já destituída do poder familiar em outra ação proposta pelo Ministério Público e já transitada em julgado.
STJ. 4ª Turma. REsp 1.845.146-ES, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 19/11/2019 (Info 661).
	
O fato de a mãe biológica ter sido destituída, em outra ação, do poder familiar em relação a seu filho, não significa, necessariamente, que ela tenha perdido a legitimidade recursal na ação de guarda.
Para a mãe biológica, devido aos laços naturais, persiste o interesse fático e jurídico sobre a criação e destinação da criança, mesmo após destituída do poder familiar.
Assim, enquanto não cessado o vínculo de parentesco com o filho através da adoção, que extingue definitivamente o poder familiar dos pais biológicos, é possível a ação de restituição do poder familiar, a ser proposta pelo legítimo interessado, no caso, os pais destituídos do poder familiar.
Dessa forma, a ação de destituição do poder familiar ajuizada contra a genitora não eliminou o seu laço de parentesco natural com a criança.
A despeito de a sentença ter feito cessar, juridicamente, suas prerrogativas parentais, faticamente subsiste seu laço sanguíneo, que confere a ela legitimidade e interesse próprio para, em prol da proteção e melhor interesse da menor, discutir o destino da criança, seus cuidados e criação.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
CITAÇÃO
Empresa estrangeira que não tenha agência ou filial no Brasil pode ser citada por meio de seu entreposto no país
	É regular a citação da pessoa jurídica estrangeira por meio de seu entreposto no Brasil, ainda que não seja formalmente aquela mesma pessoa jurídica ou agência ou filial.
STJ. Corte Especial. HDE 410-EX, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 20/11/2019 (Info 661).
	
Imagine a seguinte situação adaptada:
A empresa “XX” ingressou com ação judicial, no Brasil, contra a empresa estrangeira Crossports Mercantile INC, que possui sede nas Ilhas Virgens Britânicas.
A única diretora da CROSSPORTS é outra pessoa jurídica, também estrangeira, a Amicorp Management Limited, também situada nas Ilhas Virgens Britânicas.
A Amicorp Management Limited não possui sede no Brasil, mas existe aqui uma empresa que representa seus interesses, qual seja, a Amicorp do Brasil Ltda.
Diante disso, o juízo determinou a citação da CROSSPORT por meio da Amicorp do Brasil Ltda.
Essa citação foi válida?
SIM. Amicorp do Brasil Ltda. deve ser compreendida como um entreposto no Brasil da Amicorp
Management Limited, que é, por sua vez, a diretora da ré Crossports.
	Vamos entender com calma.
Quem representa a pessoa jurídica em juízo?
· quem o ato constitutivo designar;
· se não houver essa designação, a pessoa jurídica será representada por seu diretor.
É o que preconiza o art. 75, VIII, do CPC/2015:
	
	Art. 75. Serão representados em juízo, ativa e passivamente:
(...)
VIII - a pessoa jurídica, por quem os respectivos atos constitutivos designarem ou, não havendo essa designação, por seus diretores;
	
No caso específico da pessoa jurídica estrangeira, o legislador procurou facilitar essa representação e previu que ela pode ser representada pelo gerente, representante ou administrador de sua filial, agência ou sucursal aberta ou instalada no Brasil:
	
	Art. 75. Serão representados em juízo, ativa e passivamente:
(...)
X - a pessoa jurídica estrangeira, pelo gerente, representante ou administrador de sua filial, agência ou sucursal aberta ou instalada no Brasil;
	
Vale ressaltar, que “o gerente de filial

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