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Carlos José Guimarães Cova Gestão Ambiental Volume 1 Apoio: Material Didático C873g Cova, Carlos José Guimarães Gestão ambiental. v. 1 / Carlos José Guimarães Cova. - Rio de Janeiro : Fundação CECIERJ, 2011. 212 p.; 19 x 26,5 cm. ISBN: 978-85-7648-617-6 1. Gestão ambiental. 2. Economia ambiental. 3. Contabilidade. 4. Política ambiental. 5. Legislação ambiental. 6. Impacto ambiental. I. Título. CDD: 333.7 Referências Bibliográfi cas e catalogação na fonte, de acordo com as normas da ABNT e AACR2. Copyright © 2009, Fundação Cecierj / Consórcio Cederj Nenhuma parte deste material poderá ser reproduzida, transmitida e gravada, por qualquer meio eletrônico, mecânico, por fotocópia e outros, sem a prévia autorização, por escrito, da Fundação. ELABORAÇÃO DE CONTEÚDO Carlos José Guimarães Cova COORDENAÇÃO DE DESENVOLVIMENTO INSTRUCIONAL Cristine Costa Barreto SUPERVISÃO DE DESENVOLVIMENTO INSTRUCIONAL Cristiane Brasileiro DESENVOLVIMENTO INSTRUCIONAL E REVISÃO Ana Cristina Andrade Carlos Augusto Santana Pereira AVALIAÇÃO DO MATERIAL DIDÁTICO Thaïs de Siervi EDITORA Tereza Queiroz REVISÃO TIPOGRÁFICA Equipe Cederj COORDENAÇÃO DE PRODUÇÃO Katy Araújo PROGRAMAÇÃO VISUAL Bianca Lima David Daniel Macêdo ILUSTRAÇÃO Fernando Romeiro CAPA Fernando Romeiro PRODUÇÃO GRÁFICA Verônica Paranhos Departamento de Produção SOBRE O AUTOR Carlos José Guimarães Cova Possui graduação em Ciências Econômicas pela Universidade Federal Fluminense (2002), graduação em Direito pela Universidade Federal Fluminense (1997), graduação em Ciências Contábeis pela Universidade Federal Fluminense (1996), graduação em Administração pela Universidade Federal Fluminense (1991), Mestrado em Engenharia de Produção pela Universidade Federal Fluminense (1995) e Doutorado em Engenharia de Produção pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2000). Atualmente é Professor Associado I da Universidade Federal Fluminense, Coordenador do MBA em Finanças Corporativas e Mercado de Capitais da UFF, Coordenador do Programa de Extensão Cursos Avançados de Finanças e Mercado de Capitais da UFF. Atuou como Consultor Acadêmico do Programa de Pós Graduação em Administração Pública da Fundação Escola de Serviço Público. Tem experiência na área de Administração, com ênfase em Administração Financeira, atuando principalmente nos seguintes temas: Logística e Produção, globalização, orçamento público, mercado de capitais, análise de risco e plano de negócios. 2011.1 Fundação Cecierj / Consórcio Cederj Rua Visconde de Niterói, 1364 – Mangueira – Rio de Janeiro, RJ – CEP 20943-001 Tel.: (21) 2334-1569 Fax: (21) 2568-0725 Presidente Masako Oya Masuda Vice-presidente Mirian Crapez Coordenação do Curso de Administração UFRRJ - Silvestre Prado Universidades Governo do Estado do Rio de Janeiro Secretário de Estado de Ciência e Tecnologia Governador Alexandre Cardoso Sérgio Cabral Filho UENF - UNIVERSIDADE ESTADUAL DO NORTE FLUMINENSE DARCY RIBEIRO Reitor: Almy Junior Cordeiro de Carvalho UERJ - UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO Reitor: Ricardo Vieiralves UNIRIO - UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO Reitora: Malvina Tania Tuttman UFRRJ - UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO Reitor: Ricardo Motta Miranda UFRJ - UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO Reitor: Aloísio Teixeira UFF - UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE Reitor: Roberto de Souza Salles Gestão Ambiental Volume 1 SUMÁRIO Aula 1 – Os antecedentes históricos da gestão ambiental ...................... 7 Aula 2 – As escolas de pensamento na Economia do Meio Ambiente ... 31 Aula 3 – A avaliação econômica do meio ambiente ............................. 59 Aula 4 – Os elementos da Contabilidade do Meio Ambiente ................ 89 Aula 5 – A política de meio ambiente e a legislação ambiental .......... 119 Aula 6 – Os critérios para a Gestão do Impacto Ambiental ................ 149 Aula 7 – Os aspectos fundamentais da Agenda 21............................. 181 Referências .......................................................................................... 207 Todos os dados apresentados nas atividades desta disciplina são fi ctícios, assim como os nomes de empresas que não sejam explicitamente mencionados como factuais. Sendo assim, qualquer tipo de análise feita a partir desses dados não tem vínculo com a realidade, objetivando apenas explicar os conteúdos das aulas e permitir que os alunos exercitem aquilo que aprenderam. Os antecedentes históricos da gestão ambiental 1 ob jet ivo s A U L A Meta da aula Apresentar a perspectiva histórica da gestão ambiental. Ao fi nal desta aula, você deverá ser capaz de: identifi car a trajetória evolutiva da preocu- pação com o meio ambiente; identifi car a importância dos limites para a exploração econômica do meio ambiente; caracterizar as conexões entre meio am- biente, bem-estar e desenvolvimento sustentável. 1 2 3 8 C E D E R J Gestão Ambiental | Os antecedentes históricos da gestão ambiental Você pode se perguntar: o que tem a ver a questão do meio ambiente com a gestão das empresas? Atualmente, podemos dizer que a gestão empresarial que desconsidere os aspectos relativos ao meio ambiente está fadada ao fracasso, tamanha é a sua inter-relação. Nesta aula, vamos iniciar o curso de Gestão do Meio Ambiente. Trata-se de um assunto da maior importância para os administradores de empresas, pois sua correta implementação será fundamental para a continuidade da vida na Terra. Vamos apresentar uma perspectiva histórica da preocupação do homem com o meio ambiente, destacando os principais eventos que a sociedade moderna promoveu no sentido de salvaguardar esse importante recurso. Ficará evidenciado que a exploração do meio ambiente tem limites e que a sobrevivência humana e a manutenção da atividade econômica e, consequentemente, do bem-estar social dependem de sua correta gestão. OS ANTECEDENTES HISTÓRICOS DA PREOCUPAÇÃO COM O MEIO AMBIENTE O ser humano passou a impactar com maior intensidade o meio ambiente a partir do advento da agricultura, há cerca de 10.000 anos. Com esta inovação tecnológica, o homem substituiu a enorme diversidade de espécies presentes em um determinado ECOSSISTEMA fl orestal por um limitado conjunto de espécies selecionadas em razão de seu valor como alimento ou matéria-prima. Não obstante, em razão de seus efeitos não serem muito agressivos, o manejo sistemático da agricultura não comprometeu o equilíbrio ambiental do planeta Terra durante os séculos iniciais da história das civilizações. Apenas com o advento da Revolução Industrial é que a AÇÃO ANTRÓPICA conseguiu causar impactos crescentes no meio ambiente. A partir de então, esta intervenção humana nos múltiplos ecossistemas do planeta cresceu sem parar. Conforme assinalam May et al. (2003, p. 4), em princípio é possível intervir no meio ambiente de tal forma que seja transformado radicalmente um ecossistema natural, substituindo-o por outro, que, embora artifi cial, também é equilibrado do ponto de vista ecológico, na EC O S S I S T E M A (S I S T E M A E C O L Ó G I C O) É uma unidade básica de estudo da ecologia que inclui todos os organismos de uma determinada área, interagindo com o meio físico, de forma a originar um fl uxo de matéria e energia. AÇÃO ANTRÓPICA É aquela cujos efeitos derivam da atividade humana. INTRODUÇÃO C E D E R J 9 A U LA 1medida em que mantém suas características ao longo do tempo. Porém, o problema reside no fato de que, a partir de então, a manutenção do equilíbrio nesse ambiente transformado dependerá sempre da participaçãoativa dos seres humanos, que deverão atuar com base em determinados princípios básicos de regulação ecológica, tais como a reciclagem de materiais e nutrientes e a manutenção de uma certa diversidade biológica. Um exemplo dessa transformação seria a cultura de espécies fl orestais em área sujeita à desertifi cação por meio de canais de irrigação que deveriam ser mantidos em operação para que o cultivo se sustentasse. A Revolução Industrial trouxe uma enorme quantidade de danos ao meio ambiente, que foram potencializados pelo uso sistemático de combustíveis fósseis. O emprego dessa nova fonte de energia permitiu uma ampliação sem precedentes da escala das atividades humanas. Este fato passou a pressionar cada vez mais a base dos recursos naturais do planeta. Dessa forma, estabeleceu-se um marco histórico, pois, desde o ad- vento da primeira Revolução Industrial, em fi ns do século XVIII, descor- tinou-se um processo de devastação dos bens ambientais sem precedentes na História, pois a ação humana foi potencializada pela escala industrial que a produção de bens assumiu, com um vigoroso uso de matérias-primas e de energia, com a sua consequente extração do meio ambiente. Nesse sentido, fatores como a explosão demográfi ca, a produção industrial em larga escala, as demandas de consumo cada vez maiores, a competitividade desenfreada por mercados e a ocupação desregrada dos espaços públicos passaram a atuar de forma combinada no sentido de incorporar ao planeta Terra novas formas de poluição do meio ambiente. Assim, ocorrências como o fenômeno do aquecimento global, os recorrentes desastres ecológicos, a extinção de espécies, o crescente despejo de resíduos tóxicos nas águas e na atmosfera, além da ameaça de escassez generalizada de elementos naturais indispensáveis à atividade humana passaram a despertar na sociedade o interesse pela temática ambiental. A fi gura a seguir nos apresenta um dramático efeito das mudanças climáticas que o planeta atravessa. 10 C E D E R J Gestão Ambiental | Os antecedentes históricos da gestão ambiental Figura 1.1: O aquecimento global promove o degelo da montanha Kilimanjaro – África. Fonte: http://www.fcf.usp.br/SGA/Apresentacoes Percebemos que a expansão da atividade humana não poderá ultrapassar um determinado limite ambiental global. Este limite é denominado, pela economia do meio ambiente, como sendo a carrying capacity, ou seja, a capacidade de carga do planeta. Essa capacidade de carga representa a capacidade que o planeta teria, representada pela soma das capacidades isoladas de seus múltiplos ecossistemas, de suportar a ação antrópica sem sofrer degradação irreversível. Por exemplo, a baía da Guanabara, no estado do Rio de Janeiro, na época do seu descobrimento pelos navegadores portugueses, era um local paradisíaco, no qual as baleias vinham ter as suas crias. Atualmente, boa parte da baía já está completamente degradada, fruto do esgotamento da capacidade de carga desse ecossistema. O avanço da ação humana sobre os recursos do planeta é conhecido por punção ou ecological footprint (pegada ecológica) e é o resultado do tamanho da população mundial multiplicado pelo consumo per capita dos recursos naturais, ou seja, as variáveis relevantes para essa análise são tanto o tamanho da população quanto o seu perfi l de consumo. C E D E R J 11 A U LA 1 Figura 1.2: O desmatamento da Amazônia pode levar ao colapso do seu ecossistema. Fonte: http://www.fcf.usp.br/SGA/Apresentacoes Um dado nível de punção da humanidade vai demandar, em contrapartida, o uso de áreas de terra e de água nos diversos ecossistemas, que deverão fornecer os recursos naturais, renováveis ou não, necessários ao consumo humano. Além disso, para efeito de mensuração da capacidade de carga do planeta, deve ser considerada a capacidade que estes ecossistemas possuem para assimilar os rejeitos e as descargas gerados pela ação humana no meio ambiente. Verifi ca-se que o progresso técnico é capaz de atenuar os efeitos da punção sobre o meio ambiente, mas jamais eliminá-la. É o caso do desenvolvimento de combustíveis menos poluentes ou de fi ltros de resíduos industriais. O fato é que não será possível ultrapassar a capacidade de carga do planeta sem que sejam gerados efeitos deletérios ao meio ambiente, de magnitudes catastrófi cas. Para complicar o quadro, os pesquisadores se deparam com o problema da difícil mensuração da verdadeira capacidade de carga que o planeta é capaz de suportar. Dessa forma, como não existe uma precisão no cálculo desta variável, é preciso, de antemão, adotar uma postura de precaução em face do uso dos recursos naturais. Constitui-se em ato de urgência a criação das condições políticas, econômicas, institucionais, sociais, jurídicas e culturais que tenham por propósito, de um lado, o desenvolvimento de inovações tecnológicas 12 C E D E R J Gestão Ambiental | Os antecedentes históricos da gestão ambiental poupadoras de recursos naturais (qualquer nova tecnologia que use menos recursos do que as atuais) e, de outro, o estabelecimento de novos padrões de consumo que não impliquem um crescimento contínuo e ilimitado do uso dos recursos naturais. Destarte, o desenvolvimento de inovações tecnológicas poupadoras de recursos é uma ação coerente com o modelo de produção vigente desde a aurora do capitalismo industrial, pois está alinhado com a ideia de efi ciência. Já a estabilização dos níveis de consumo per capita está em desacordo com o modelo capitalista tradicional, que tem se caracterizado por uma criação incessante de novas necessidades de consumo, tais como o advento da internet e do telefone celular. Verifi camos em Thomas (2002, XXXI) que a degradação do meio ambiente sofreu um agudo incremento em razão, entre outros fatores, do crescimento populacional, das pressões domésticas e globais sobre os recursos econômicos escassos, das políticas econômicas e da negligência com os bens públicos naturais (globais e locais). Um bem público global seria um oceano, enquanto um bem público local pode ser um bosque. Os custos decorrentes da poluição ambiental e da exploração acelerada dos recursos são enormes, e, em alguns casos, irreversíveis. É preciso que tenhamos uma perspectiva de sustentabilidade a longo prazo na condução do sistema econômico, sob pena de o mesmo chegar a um ponto de colapso. O problema das sociedades contemporâneas não é propriamente a incapacidade de obter inovações tecnológicas poupadoras de recursos naturais, mas sim conseguir uma mudança nos padrões de consumo que permita, ao menos, estabilizar os níveis de consumo per capita. Não obstante, uma mudança de atitude e de comportamento das sociedades é difícil de ser obtida porque isso contraria as condutas prevalecentes na lógica do processo de acumulação de capital vigente desde os primórdios do capitalismo, caracterizado pela criação constante de novas necessidades de consumo. Ferreira (2003, p. 12) registra que, embora a preocupação com o meio ambiente tenha surgido ainda no século XIX, foi apenas no século XX, e mais precisamente no início dos anos 1970, que esta temática passou a repercutir na sociedade. O marco de evolução do pensamento relativo à questão ambiental nessa época foi traduzido pela ideia de que o problema não poderia ser gerenciado com base em responsabilidade C E D E R J 13 A U LA 1localizada, mas sim com um enfoque de responsabilidade global. A autora também assinala que uma frase era capaz de resumir o pensamento dominante dos organismos ambientalistas em várias partes do mundo: “pensar globalmente, agir localmente”. Issosignifi ca que são as pequenas iniciativas que, somadas, produzem o grande efeito. À medida que esta conscientização foi se ampliando, a comunidade internacional passou a agir em conformidade com a perspectiva da dimensão transnacional da questão ecológica, desencadeando uma série de programas e conferências, com vistas à sensibilização dos decisores em diversas partes do mundo, bem como para o alinhamento de medidas comuns para mitigar o problema. Essa perspectiva transnacional representa a compreensão de que as ações humanas na natureza transcendem a fronteira dos países em que elas ocorrem, afetando todo o planeta. O primeiro evento digno de registro com relação ao meio ambiente foi a conferência com a temática “O Homem e a Biosfera”, da Unesco, em 1971. Logo em seguida, em 1972, ocorreu a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente, na cidade de Estocolmo, com grande repercussão internacional. Na cidade de Belgrado, em 1975, foi realizado um Seminário Internacional de Educação, com a participação de vários países do mundo, que gerou uma lista de resultados apresentados no documento que fi cou conhecido como Carta de Belgrado, cujo conteúdo contem- plava resumidamente a seguinte pauta, toda ela subordinada à harmonia com o meio ambiente: qualidade de vida ligada à felicidade humana, preservação e melhoria das potencialidades humanas e desenvolvimento do bem-estar social e individual. A Carta de Belgrado propunha que as ações de preservação ambiental deveriam passar por uma etapa preliminar que consistiria num programa de educação ambiental. Os objetivos a serem atingidos com este programa eram os seguintes: 1º – conscientizar os cidadãos de todo o mundo sobre o problema ambiental; 2º – disponibilizar acesso a conhecimentos específi cos sobre o meio ambiente; 3º – promover atitudes para a preservação do meio ambiente; 4º – desenvolver habilidades específi cas para ações ambientais; 5º – criar uma capacidade de avaliação das ações e programas implantados; e 6º – promover a participação de todos na solução dos problemas. Fonte: www.ufpa.br/npadc/gpeea/DocsEA/A%20Carta%20d e%20Belgrado.pdf ?? 14 C E D E R J Gestão Ambiental | Os antecedentes históricos da gestão ambiental A ideia contida nos programas de educação ambiental, a serem desenvolvidos nos países que aderiram à Carta de Belgrado, consistia basicamente na conscientização das crianças acerca da importância de cuidar do meio ambiente. Porém, acreditava-se que apenas a conscientização seria insufi ciente para permitir a implementação de ações efetivas por parte das crianças e mesmo depois que se tornassem adultos. Por esta razão, seria fundamental que os conhecimentos adequados sobre a ciência ambiental fossem disseminados por meio de um processo educacional. Assim, a combinação da conscientização com o conhecimento poderia promover as atitudes corretas e o desenvolvimento de habilidades específi cas para a busca de soluções para o problema ambiental. A educação ambiental passou a assumir um grande desafi o, desdobrado em quatro tópicos: (1) conscientização; (2) sensibilização; (3) responsabilidade social; (4) desenvolvimento sustentável. Solucionar este desafi o é essencial para manter o objetivo de permitir que a humanidade continue a viver. Um outro marco histórico relevante deste processo foi a constituição da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, formada pela ONU, em 1983. Registrou-se outra reunião em Estocolmo, no ano de 1988. Contudo, o maior compromisso com a questão do meio ambiente foi fi rmado, entre os países participantes, com a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento (UNCED), conhecida como Eco-92, realizada no Rio de Janeiro, oportunidade em que as nações, pela primeira vez, estabeleceram, em caráter defi nitivo, critérios para se atingir o desenvolvimento sustentável. O conceito de desenvolvimento sustentável consta no documento?? Nosso Futuro Comum, também conhecido como Relatório Bruntland, publicado em 1987 e elaborado pela Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, e foi a defi nição adotada pelo Governo brasileiro para o desenvolvimento sustentável. Trata-se do “desenvolvi-mento que satisfaz as necessidades presentes, sem com- prometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades“ (FERREIRA, 2003, p. 34). C E D E R J 15 A U LA 1 Figura 1.3: A poluição gerada pelo homem compromete a sustentabilidade do meio ambiente. Fonte: http://www.fcf.usp.br/SGA/Apresentacoes Um importante documento foi produzido na Conferência Eco-92. Trata-se da Agenda 21, que ainda é um ponto de referência na implantação de programas e política de governos e de empresas no mundo todo, na medida em que promoveu signifi cativa mudança nas relações comerciais, em suas diversas formas. Este documento foi assinado por 170 países e ainda é considerado o maior esforço conjunto de governos dos países do mundo para identifi car ações que permitam combinar o desenvolvimento com a proteção do meio ambiente. A Agenda 21 basicamente defi niu que deve existir uma reorien- tação na educação no sentido do desenvolvimento sustentável, aliada à ampliação da conscientização pública e do incentivo ao treinamento. Ela se divide em quatro seções: 1ª – trata de aspectos sociais, que versam sobre as relações entre meio ambiente e pobreza, saúde, comércio, dívida externa, consumo e população; 2ª – trata da conservação e administração de recursos, com foco no gerenciamento de recursos físicos, tais como os mares, a terra, a energia e o lixo, de tal forma a garantir o desen- volvimento sustentável; 3ª – trata do fortalecimento dos grupos sociais organizados e minoritários que colaboram com a sustentabilidade, por meio de formas variadas de apoio; 4ª – trata dos meios de implantação, por meio de programas de fi nanciamento e do papel das atividades governamentais e não governamentais. 16 C E D E R J Gestão Ambiental | Os antecedentes históricos da gestão ambiental No Brasil, os primeiros diplomas legais de proteção ao meio am- biente foram a Lei nº 6.938, de 31/8/81, conhecida como Lei de Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA), e a Lei nº 7.347, de 24/7/85, denominada Lei de Ação Civil Pública. Ambas as legislações foram bastante infl uenciadas pelos ordenamentos jurídicos de países europeus, que, desde a década dos anos 1970, passaram a promulgar normas de caráter ambiental em suas Constituições. O Brasil também acolheu essas posições mais afi rmativamente na Carta Magna de 1988, a qual reserva um capítulo no bojo do Título VIII (Da Ordem Social), para tratar do Meio Ambiente, em seu artigo 225, e qualifi cá-lo como “bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida”. A partir da Eco-92, tornou-se imperativa, para a atual sociedade tecnológica e de consumo, completamente envolvida numa economia globalizada, e em constante modifi cação, a necessidade de conciliar o progresso com a conservação da biosfera, sob pena de ESTRANGULAMENTO DO SISTEMA ECOLÓGICO, haja vista o seu aproveitamento sempre crescente por parte do sistema econômico, com riscos para a continuidade da vida no planeta. Não obstante, dentre os múltiplos desequilíbrios e problemas provocados pela malversação dos recursos naturais, destaca-se, pela grandeza e relevância, a mudança de clima, cuja maior manifestação é o aquecimento global. Essa importante questão será tratada em uma de nossas futuras aulas. Em 1979, a questão do aquecimento global obteve foros de notoriedade com a realização da Primeira Conferência Mundial sobre o Clima, eventoinaugural de uma série que propiciou o surgimento do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente e da Organização Meteorológica Mundial. Estas entidades foram posteriormente unidas no Painel Intergo- vernamental sobre Mudanças Climáticas – Intergovernmental Panel on Climate Changes (IPCC), de cujos estudos extraiu-se o arcabouço teórico-científi co para a elaboração da Convenção-Quadro das Nações Unidas Sobre a Mudança do Clima (UNFCCC), adotada na Eco-92 (Cúpula da Terra) e em vigor desde 21/3/1994, quando então se fi xou, como meta, a estabilização das concentrações de GASES DE EFEITO ESTUFA na atmosfera, num nível que impeça uma interferência antrópica perigosa no sistema climático. ESTRANGULAMENTO DO SISTEMA ECOLÓGICO Consiste na descontinuidade de seu fl uxo circular de nascimento, crescimento, morte e renovação dos seres vivos. GA S E S D E E F E I T O E S T U FA De acordo com o Anexo A do Protocolo de Quioto, são gases de efeito estufa (GEE) o dióxido de carbono (CO2), o metano (CH4), o óxido nitroso (N20), os hidrofl uorcarbonos (HFC), os perfl uorcarbonos (PFC) e o hexafl uoreto de enxofre (SF6). C E D E R J 17 A U LA 1 Com o advento da FCCC (Framework Convention on Climate Change), as suas partes componentes (em torno de 185 países mais a União Europeia) passaram a se reunir periodicamente. Como resultado destas reuniões, alguns debates iniciados na Alemanha (Grupo Ad Hoc do Mandato de Berlim), visando defi nir medidas de consenso sobre os esforços a serem envidados para combater as alterações climáticas, culminaram com a adesão dos países a um protocolo da UNFCCC, o denominado Protocolo de Quioto, em 11 de dezembro de 1997, em reunião da Terceira Conferência das Partes, ocorrida naquela cidade japonesa. No âmbito desse Protocolo, foi estabelecido que, para o período compreendido entre 2008 e 2012, haveria o compromisso de diminuição de emissões totais dos gases geradores do efeito estufa, por parte dos países listados no Anexo I do Protocolo, em um volume ao menos 5% abaixo dos níveis monitorados em 1990. Também foram ali consagrados os princípios das “responsabilidades comuns, mas diferenciadas” e do “poluidor pagador”, segundo os quais, A Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento (UNCED), conhecida como Eco-92, realizada no Rio de Janeiro, marcou o início da preocupação da comunidade internacional com a questão do meio ambiente? ____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________ _______________________________________________________________________________ _______________________________________________________________________________ _______________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ Resposta Comentada Não. Ela foi um marco importante dessa trajetória, mas o primeiro evento de caráter relevante para a questão do meio ambiente no mundo foi a conferência com a temática “O Homem e a Biosfera”, da Unesco, em 1971. Logo em seguida, em 1972, ocorreu a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente, na cidade de Estocolmo, com grande repercussão internacional. Atividade 1 1 18 C E D E R J Gestão Ambiental | Os antecedentes históricos da gestão ambiental embora seja global o problema ambiental, caberia aos países tradicionalmente industrializados e, por esta razão, historicamente responsáveis pelos danos ambientais, o ônus de evitar a sua agudização, sendo que, para esta tarefa, contariam com o auxílio dos países em desenvolvimento. Buscando viabilizar instrumentos para atingir os parâmetros propostos, o Protocolo criou o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), que passaria a possibilitar compensações entre os países do Anexo I que investissem em projetos redutores de emissões em países não-Anexo I, de tal forma a manterem seus compromissos de reduções, num balanço atmosférico global, sem prejudicar os aspectos econômicos que poderiam acarretar problemas sociais. Estes foram os principais eventos e fatos que marcaram a evolução do pensamento ambiental no mundo sobre o meio ambiente e que determinam atualmente a condução de políticas de gerenciamento ambiental. O homem poderá explorar indefi nidamente os recursos do planeta Terra, no modelo de produção da economia capitalista neoclássica em vigor? _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________ _______________________________________________________________________________ _______________________________________________________________________________ _______________________________________________________________________ Resposta Comentada Não. A expansão da atividade humana não poderá ultrapassar um determinado limite ambiental global. Este limite é denominado pela economia do meio ambiente como sendo a carrying capacity, ou seja, a capacidade de carga do planeta. O avanço da ação humana sobre os recursos do planeta é conhecido como punção ou ecological footprint (pegada ecológica) e é o resultado do tamanho da população mundial multiplicado pelo consumo per capita dos recursos naturais. Atividade 2 2 C E D E R J 19 A U LA 1AS CONEXÕES ENTRE O MEIO AMBIENTE, O BEM-ESTAR E O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL No mundo de hoje, em virtude do atual estágio de exploração de recursos, são enormes as pressões sobre os ecossistemas do planeta. No para- digma tecnológico vigente, não existem recursos sufi cientes para que toda a população da Terra consiga atingir um nível de bem-estar social equivalente ao da nossa classe média (pessoas com renda entre R$ 1.064 a R$ 4.591, segundo o Instituto de Pesquisa Aplicada – IPEA, por exemplo). Para o conceito de bem-estar social, tal circunstância impõe que uma enorme parcela da população mundial se veja privada de condições mínimas de bem-estar para que possa levar uma existência digna. Com isso, são geradas profundas desigualdades entre os atores sociais, o que leva a uma permanente tensão e grande instabilidade política e social em vários países. A superação do problema resultante do aumento da desigualdade social fez com que o desenvolvimento econômico passasse a se constituir em palavra de ordem na pauta das discussões políticas do mundo contemporâneo. Isto se deve ao fato de que, em face da efetiva implementação de um conjunto de políticas articuladas e coordenadas, o nível de pressão social que ora se estabelece poderá ser reduzido por meio de um gerenciamento mais efi ciente dos recursos. As assimetrias entre os países de todo o mundo e mesmo dentro deles são de múltiplas dimensões e possuem vários aspectos de avaliação. A etapa preliminar dessa questão reside na construção de um conjunto de indicadores que permita estabelecer prioridadesna orientação das políticas. Entrementes, existe uma carência de indicadores e de instrumentos de avaliação, pois o sentido do que venha a ser bem-estar é muito mais difuso do que o conceito da economia neoclássica tradicional poderia abarcar. O indicador mais amplamente utilizado para representar o nível de desenvolvimento de uma dada região ou país é a renda per capita, que pode não ser o mais apropriado para permitir uma investigação um pouco mais profunda acerca da questão. As defi ciências desse indicador decorrem do fato de ele ser um valor médio, não permitindo inferências sobre a forma pela qual esta renda se distribui entre os membros da sociedade. Conforme sugere Clemente (2000, p. 130), para uma análise mais abrangente do desenvolvimento, seria preciso considerar seus vários aspectos, dentre eles se destacando o econômico, o social, o cultural e o político. Nesse sentido, os aspectos econômico e social deveriam ser 20 C E D E R J Gestão Ambiental | Os antecedentes históricos da gestão ambiental tomados em conjunto, em razão da difi culdade de separá-los de forma conveniente, na medida em que constituem bons indicadores do nível de vida da população. Este nível de vida seria expresso pela medida do acesso que um dado agente econômico e social porventura possuísse de um conjunto de utilidades (renda, emprego, saúde, educação, alimentação, segurança, lazer, moradia, transporte etc.). Verifi camos em Thomas et al. (2002, p. 2) que os teóricos do desenvolvimento empregaram durante muito tempo a noção de PIB per capita como referência para o crescimento, sobretudo porque acreditavam que o progresso social está associado ao crescimento do PIB, porém também lançavam mão dessa métrica por conveniência metodológica, pois seu cálculo é relativamente simples. Não obstante, a confi ança no PIB como medida de desenvol- vimento é bastante restritiva, pois o crescimento do PIB pode ser tanto de alta quanto de baixa qualidade. A atividade humana, ao degradar o meio ambiente, pode reduzir o bem-estar ao invés de aumentá-lo. Dessa forma, para promover a integração da qualidade do crescimento em avaliações sobre o desenvolvimento, são necessários índices multidimensionais de bem-estar, ou seja, aqueles que possam aferir as múltiplas dimensões da felicidade humana. Nesse quesito, em particular, é imperativo assinalar que a própria MÉTRICA empregada na mensuração do bem-estar constitui-se num REDUCIONISMO perigoso, na medida em que propõe uma simplifi cação da realidade, que pode não ser condizente com as EVIDÊNCIAS EMPÍRICAS. Nos trabalhos de Amartya Sen (2001, p. 12), verifi camos a importância que este autor atribui à questão da métrica mental a ser empregada na mensuração do bem-estar, enquanto os formuladores de políticas públicas se preocupam em corrigir ou mitigar as desigualdades sociais. A primeira questão a ser apresentada, segundo Sen, diz respeito à caracterização dessas desigualdades. Ele indaga: “Igualdade de quê?” O argumento de Sen decorre de sua percepção de que a noção tradicional de igualdade é contrariada devido às diversidades de dois tipos distintos: primeiro, a heterogeneidade básica dos seres humanos; segundo, a multiplicidade das variáveis em cujos termos a desigualdade presente na sociedade pode ser examinada. No primeiro caso, temos a variedade de raças, religiões, culturas e costumes. No segundo, podemos inferir questões tais como acesso à água potável, saneamento básico, educação, rede hospitalar, segurança alimentar e os múltiplos aspectos dos direitos humanos. MÉTRICA Escala de valores empregada num processo de medida. RE D U C I O N I S M O Simplifi cação da realidade para fi ns de análise. EV I D Ê N C I A S E M P Í R I C A S Constatações de fatos no mundo real. C E D E R J 21 A U LA 1Assim, segundo Sen, a avaliação das demandas de igualdade deve ajustar-se à existência da diversidade humana generalizada, e o efeito de se ignorar de forma deliberada estas variações interpessoais pode ser profundamente não-igualitário. O julgamento e a mensuração de desigualdades na sociedade são dependentes da escolha da variável focal (renda, riqueza etc.) em cujos termos é feita a comparação. Todavia, mesmo as variáveis focais possuem grande pluralidade interna. A igualdade, em termos de uma particular variável focal, pode não coincidir com a igualdade na escala de outra (oportunidades iguais podem resultar em fl uxos de rendas desiguais; fl uxos de rendas iguais podem resultar em estoques de riquezas desi- guais). Esse autor conclui ainda que uma das consequências da diversidade humana é o fato de que a igualdade considerada num espaço de variável focal tende a acarretar uma desigualdade em outro espaço. Por exemplo, se estabelecermos uma renda mínima a ser subsidiada para um determinado grupo de pessoas idosas, sem que se leve em consideração aspectos específi cos relativos à saúde de cada um deles, podemos distorcer a lógica igualitária. Silva (2007, p. 172) nos oferece uma síntese interessante do pensamento de Sen. A abordagem de Sen atribui um peso maior à capa- cidade dos indivíduos, para que os mesmos possam atingir os seus objeti- vos. No seu modelo, Sen também defi ne as funções ou funcionamentos, que são os pré-requisitos para que as capacitações existam. As funções são representadas pela alimentação, saúde e até mesmo autoestima do indivíduo e sua autonomia. Os bens materiais, por sua vez, seriam apenas as condições para que estas funções se realizem. Não obstante, para Sen, o bem-estar dos agentes não seria apenas o resultado do acesso às condições básicas de vida, mas sim, e principal- mente, da liberdade de escolha que possuem quando decidem os rumos que darão às suas vidas. Nesse sentido, confi gura-se o conceito de capacitação, que seria diferente do conceito de funcionamento, pois se refere às liberdades de escolha, tanto instrumental quanto substantiva, com as quais os agentes se deparam e que os permitem alcançar um determinado nível de bem-estar empregando as funções que cada um possui. A capacitação, portanto, é a liberdade de escolha. 22 C E D E R J Gestão Ambiental | Os antecedentes históricos da gestão ambiental A liberdade instrumental é defi nida como a liberdade de escolha, pura e simples, acerca dos rumos que os indivíduos são capazes de dar para as suas próprias vidas, seja no trabalho ou na comunidade. Já a liberdade substantiva é a liberdade em si mesma, como um valor, e se confunde com a liberdade política, nas suas múltiplas manifestações. Verifi camos que, em países totalitários, os níveis de bem-estar tendem a ser muito baixos em razão da ausência desses dois tipos de liberdades. Assim, para Sen, as políticas públicas não deveriam buscar maximizar a quantidade dos bens primários acessíveis às pessoas num espaço econômico, mas sim buscar condições para que os indivíduos desenvolvam funções e tenham liberdade de escolha para exercê-las. Toda a argumentação analítica do indiano Amartya Sen foi apresentada ao meio acadêmico no último quartel do século XX. Ele foi laureado com o Prêmio Nobel de Economia em 1998 por seus estudos relacionados à pobreza. Suas contribuições têm infl uenciado análises e programas da Organização das Nações Unidas (ONU) e do Banco Mundial, tendo sido um dos criadores do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), publicado em 1999 e adotado pela ONU como um indicador mais sofi sticado e preciso do que outras referências para a análise do bem-estar das pessoas, tais como o PIB per capita, pois, em vez do poder de compra ditado pelo nível de renda, essa métrica traça um perfil da qualidade de vida das pessoas. Índice de Desenvolvimento Humano (IDH): Trata-se de um índice que se propõe a medir o desempenho geral de um país, ou de uma outra coletividade, a partir de três dimensões: a longevidade de seus habitantes; os conhecimentos e o nível de vida. O IDH foi adotado pelo PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) em 1990 e ainda está em fase de consolidação dos seus métodos de trabalho. O IDH não se propõe a substituir outras medidas de bem-estar, como se fosse um indicador perfeito e acabado para representar o estágio de desenvolvimento de um país, pois isso seria substituir um reducionismo da realidade por outro, haja vista que o desenvolvimento humano é algo mais abrangente do que aquilo que o IDH consegue mensurar. Não obstante, o IDH tem sido um útil instrumento para estimular o debate sobre o desenvolvimento, enfatizando as condições de bem- estar da população e evidenciando a necessidade do estabelecimento de uma base de dados a esse respeito. ?? C E D E R J 23 A U LA 1Não obstante, existe ainda a distinção entre os conceitos de cres- cimento e desenvolvimento econômicos. O crescimento econômico refere- se ao aumento da produção e da renda, enquanto o desenvolvimento econômico corresponde à elevação do nível de vida da população, compreendendo outras dimensões da existência, tais como saúde, educação, segurança alimentar e outros aspectos caracterizadores da dignidade humana. É verdade que um crescimento econômico pode proporcionar as condições para o desenvolvimento econômico, mas não necessariamente, pois o crescimento pode ocorrer apenas em um setor da economia, como a apropriação da renda gerada por uns poucos benefi ciários, que oprimem e submetem os demais numa relação de tirania. Nesse caso, a renda per capita poderia sugerir riqueza, mas não haveria desenvolvimento econômico. Para o atendimento da condição de desenvolvimento econômico, portanto, ou a renda da sociedade como um todo aumentaria ou haveria uma transferência líquida de renda dos setores mais ricos para os setores mais pobres, de forma a aumentar o nível de vida desses últimos, sem uma queda substancial do padrão de vida daqueles. Adicionalmente, para estabelecer as condições do desenvolvimento econômico, ainda seria preciso condicionar que a taxa de incremento da renda seja maior do que a taxa de crescimento demográfi co, pois, do contrário, a população estaria empobrecendo e não seria razoável falar em desenvolvimento. O problema do desenvolvimento amplia-se quando se inclui a questão do esgotamento de fatores ambientais que são despendidos no processo, tais como os combustíveis fósseis e as áreas de fl orestas nativas. Além disso, o efeito deletério da degradação do meio ambiente, ocasionado pela emissão de poluentes e demais rejeitos descartados pelo modelo de produção, constitui fonte de permanente tensão política entre os atores sociais, na medida em que a ação de um grupo de países e ins- tituições produz um efeito externo não compensado em grande parte da população do planeta, com desdobramentos para as futuras gerações, tais como a extinção de várias espécies de animais em virtude da destruição de seus habitats. A fi gura a seguir nos apresenta uma das consequências da poluição nos animais marinhos. 24 C E D E R J Gestão Ambiental | Os antecedentes históricos da gestão ambiental Figura 1.4: Com a poluição do mar pelo petróleo, as aves marinhas fi cam com o corpo impregnado de óleo e deixam de reter o ar entre as penas, morrendo afoga- das ao mergulhar. Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/fi le:pollution_swan.jpg O drama social do fi m do século XX pode ser caracterizado pela evidência de grandes polos atratores de recursos, no centro de um modelo de produção capitalista, em que os fatores de produção são empregados de forma cada vez mais efi ciente. Como um desses fatores de produção é o trabalho, ou seja, a mão-de-obra dos trabalhadores, o aumento da efi ciência do sistema implica menos uso desse fator por unidade de produção. Isso signifi ca um processo de permanente expulsão de trabalhadores do núcleo desse modelo de produção para as periferias, com grande concentração de renda para os que permanecem no jogo vis-à-vis com a redução da qualidade de vida para aqueles que são excluídos do processo. Esta dinâmica pode ocorrer dentro de um país, onde as disparidades de renda e os níveis de bem-estar social podem atingir proporções acintosas, ou pode se verifi car entre conjuntos de países, quando se toma por comparação o padrão de vida dos países da Comunidade Europeia e os países da África ao Sul do Saara. Entretanto, se bem conduzido, o desenvolvimento econômico pode melhorar a qualidade de vida das pessoas, aumentando a capacidade de delinearem seu próprio futuro. O desenvolvimento requer uma renda per capita maior e também uma educação mais equitativa e melhores C E D E R J 25 A U LA 1oportunidades de emprego. Requer mais igualdade de gênero (ausência de distinções entre homens e mulheres). Requer um meio ambiente mais limpo e mais sustentável, que viabilize uma oferta de saúde maior e segurança alimentar, ou seja, um nível adequado de alimentos para o atendimento das necessidades calóricas dos indivíduos. Requer também um sistema judicial e legal imparcial, bem como liberdades civis e políticas mais amplas. Os valores que importam para o desenvolvimento e que devem ser entendidos como os verdadeiros fatores de produção econômicos num sentido amplo são: capital físico, capital humano e capital natural. O capital físico é representado por instrumentos e máquinas gerados a partir do engenho humano e que são indispensáveis ao modelo de pro- dução vigente. O capital humano compreende o complexo de habilidades e conhecimentos dos indivíduos, bem como a sua rede de relacionamen- tos e o grau de articulação sinérgica com outros indivíduos. O capital natural corresponde aos fatores, renováveis e não renováveis, extraídos da natureza para atender ao modelo de produção de riqueza da huma- nidade, bem como à capacidade de absorção e de regeneração dessa mesma natureza aos efeitos da ação antrópica. O progresso tecnológico relacionado ao uso desses valores também é um elemento fundamental para a promoção do desenvolvimento. Ocorre que a busca de taxas aceleradas de crescimento econômico tem enfatizado a promoção do capital físico em detrimento do capital humano e do capital natural. Os investimentos em saúde e educação têm sido negligenciados, o que reduz o capital humano. Além disso, muitas vezes o crescimento acelerado tem sido o resultado de superexploração de fl orestas e de outros bens naturais, de forma a esgotar o capital natural e comprometer a sustentabilidade ambiental. Verifi camos que as distorções políticas, a corrupção e os maus governos, as falhas dos mercados e as externalidades (efeitos externos decorrentes da produção e do consumo, tais como emissão de efl uentes nas águas e no ar) podem colocar os países num caminho de acumulação de bens distorcido e desequilibrado. Os efeitos dessas políticas distorcidas e equivocadas com relação ao tratamento dispensado aos capitais humano e natural, em favor da priorização do capital físico, podem reduzir, ao invés de aumentar, tanto o crescimento quanto o bem-estar. Ao contrário, quando se combate a corrupção e se estimula o bom governo, as políticas econômicas conduzem à acumulação de bens 26 C E D E R J Gestão Ambiental | Os antecedentes históricos da gestão ambiental mais estável e equilibrada, pois os capitais humano e natural também contribuem paraa acumulação do capital físico, ao aumentar a taxa de retorno deste último. Assim, estariam sendo lançadas as bases de um desenvolvimento sustentável que integrasse o desenvolvimento humano, o crescimento da renda e a sustentabilidade ambiental. Por fi m, registramos o ensinamento de Panayotou (1994, p. 151), quando afi rma que o desenvolvimento sustentável precisa benefi ciar tanto a atual geração quanto as futuras gerações. Não se trata de uma questão de meras permutas temporais ou de transferências entre gerações, mas sim de análise de custo e efi ciência do crescimento, em vez de taxas e de velocidade com que ocorre o crescimento. Até porque a sustentabilidade não é possível sem o crescimento econômico, pois ela requer o alívio da pobreza, a potencialização do capital humano e a redução do uso e um suprimento responsável dos recursos naturais, com um manejo coerente do meio ambiente. Logo, a gestão ambiental deverá, de alguma forma, responder a essas demandas da sociedade contemporânea, pois se trata de um imperativo da própria sobrevivência da humanidade. Responda por que a renda per capita, que é o indicador mais amplamente utilizado para representar o nível de desenvolvimento de uma dada região ou país, pode não ser o mais apropriado para avaliar as questões mais amplas do bem- estar humano e do desenvolvimento? _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________ Resposta Comentada As deficiências desse indicador decorrem do fato de ele ser um valor médio, não permitindo inferências sobre a forma pela qual esta renda se distribui entre os membros da sociedade. Além disso, para uma análise mais abrangente do desenvolvimento, seria preciso considerar seus vários aspectos, dentre eles se destacando o econômico, o social, o cultural e o político. Atividade 3 3 C E D E R J 27 A U LA 1CONCLUSÃO É importante destacar as conexões entre o papel do gestor contemporâneo e o impacto de suas ações sobre o meio ambiente. O sis- tema econômico e social se mantém com o uso indiscriminado de recursos naturais, cuja retirada da natureza provocou transformações dramáticas nos vários ecossistemas. Tais transformações envolveram a degradação ambiental e a alteração dos ciclos da natureza, que agora se voltam contra os seres humanos sob a forma do aquecimento global e das mudanças climáticas. O homem passou a buscar alternativas para enfrentar esse desafi o, que vão implicar mudanças de hábitos e de modelos de produção já consagrados, na tentativa de conciliar as demandas por lucros e por níveis de consumo cada vez maiores, com o esgotamento da capacidade do planeta em prover os recursos necessários à produção e assimilar os rejeitos lançados no ambiente. Tais alternativas, que assumem atualmente uma dimensão de caráter transnacional, são buscadas por países e instituições que se comprometeram a atuar em favor daquilo que passou a ser designado Desenvolvimento Sustentável, que consiste na promoção do desenvol- vimento econômico sem comprometer os recursos que permitirão a sobrevivência das gerações futuras. Em face da degradação ambiental que acomete o meio ambiente na atualidade, não é difícil perceber que devem ser promovidas signifi cativas mudanças de atitude nos modelos de produção e consumo praticados até o momento. Em face dessa circunstância, você poderia dizer que o desenvolvimento econômico seria incompatível com a manutenção do meio ambiente? ___________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________ __________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ 3Atividade Final 21 28 C E D E R J Gestão Ambiental | Os antecedentes históricos da gestão ambiental ______________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ Resposta Comentada Se bem conduzido, o desenvolvimento econômico pode melhorar a qualidade de vida das pessoas. Na medida em que as políticas econômicas conduziriam à acumulação de bens mais estável e equilibrada estariam sendo lançadas as bases de um desenvolvimento sustentável, que integrasse o desenvolvimento humano, o crescimento da renda e a sustentabilidade ambiental. Não obstante, a sustentabilidade não é possível sem o crescimento econômico, pois ela requer o alívio da pobreza, a potencialização do capital humano e a redução do uso indiscriminado dos recursos naturais com um manejo coerente do meio ambiente. Iniciamos este curso com o registro da ameaça da ação humana sobre o meio ambiente terrestre. Vimos que ocorrências tais como o fenômeno do aquecimento global, os recorrentes desastres ecológicos, a extinção de espécies, o crescente despejo de resíduos tóxicos nas águas e na atmosfera, além da ameaça de escassez generalizada de elementos naturais indispensáveis à atividade humana, passaram a despertar na sociedade o interesse pela temática ambiental. Aparentemente, a expansão da atividade humana não poderá ultrapassar um determinado limite ambiental global. Este limite é denominado pela economia do meio ambiente como sendo a carrying capacity, ou seja, a capacidade de carga do planeta. O avanço da ação humana sobre os recursos do planeta é conhecido por punção ou ecological footprint (pegada ecológica) e é o resultado do tamanho da população mundial multiplicado pelo consumo per capita dos recursos naturais. Nesta aula, vimos que, embora a preocupação com o meio ambiente tenha surgido ainda no século XIX, foi apenas no século XX, e mais precisamente no início dos anos 1970, que esta temática passou a repercutir na sociedade. R E S U M O C E D E R J 29 A U LA 1 Registramos que a superação do problema resultante do aumento da desigualdade social fez com que o desenvolvimento econômico passasse a se constituir em palavra de ordem na pauta das discussões políticas do mundo contemporâneo. Verifi camos que as distorções políticas, a corrupção e os maus governos, as falhas dos mercados e as externalidades (efeitos externos decorrentes da produção e do consumo, tais como emissão de efl uentes nas águas e no ar) podem colocar os países num caminho de acumulação de bens distorcido e desequilibrado. Os efeitos dessas políticas distorcidas e equivocadas com relação ao tratamento dispensado aos capitais humano e natural em favor da priorização do capital físico podem reduzir, ao invés de aumentar, tanto o crescimento quanto o bem- estar dos agentes econômicos. Vimos que, quando se combate a corrupção e se estimula o bom governo, as políticas econômicas conduzem à acumulação de bens mais estável e equilibrada, pois os capitais humano e natural também contribuem para a acumulação do capital físico, ao aumentar a taxa de retorno deste último. Assim, estariam sendolançadas as bases de um desenvolvimento sustentável, integrando o desenvolvimento humano, o crescimento da renda e a sustentabilidade ambiental. Por fi m, reafi rmamos a ideia de que a sustentabilidade não é possível sem o crescimento econômico, pois ela requer o alívio da pobreza, a potencialização do capital humano e a redução do uso indiscriminado dos recursos naturais, com um manejo coerente do meio ambiente. As escolas de pensamento na Economia do Meio Ambiente 2 ob jet ivo s A U L A Meta da aula Apresentar as principais teorias econômicas relativas à sustentabilidade. Após o estudo do conteúdo desta aula, você deverá ser capaz de: identifi car o caráter positivo e o caráter normativo da sustentabilidade; descrever os principais elementos da Economia Ambiental; descrever os principais elementos da Economia Ecológica; defi nir o Princípio da Precaução. 1 2 3 4 32 C E D E R J Gestão Ambiental | As escolas de pensamento na Economia do Meio Ambiente Nesta aula, nós vamos estudar alguns aspectos e conceitos muito importantes para a Gestão do Meio Ambiente. O primeiro deles diz respeito às várias interpretações dadas para a expressão “Desenvolvimento Sustentável”, que, conforme veremos, se constitui numa condição fundamental para a sobrevivência do planeta. Em seguida, vamos apresentar os conceitos doutrinários da Economia do Meio Ambiente relativos às duas correntes de pensamento predominantes para explicar o fenômeno econômico sob a ótica ambiental. Por fi m, será apresentado o Princípio da Precaução, que sugere a conduta dos agentes econômicos em face das incertezas advindas dos efeitos da ação humana sobre o meio ambiente. AS MÚLTIPLAS INTERPRETAÇÕES ACERCA DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL A investigação acerca do assunto sustentabilidade deve ser iniciada a partir de considerações fi losófi cas sobre a linguagem a ser empregada por quem analisa a questão. Mankiw (2001, p. 28) nos lembra que os economistas, na qualidade de cientistas sociais, são capazes de se comunicar por meio de linguagens que refl etem suas visões de mundo, conforme os objetivos que pretendem atingir. Nesse sentido, eles fazem declarações a respeito do mundo que são de dois tipos: declarações positivas (são descritivas) e declarações normativas (são prescritivas). Uma distinção fundamental entre as declarações de caráter normativo e as de caráter positivo reside na forma como são julgadas as suas validades. Em princípio, é possível confi rmar ou refutar uma afi rmação positiva com base no exame das evidências factuais acerca dela. Contudo, o julgamento sobre uma afi rmação normativa envolve não apenas os fatos, mas também valores. Uma declaração de norma não pode ser julgada unicamente com base em dados. De acordo com Romeiro (2003, p. 5), o conceito de desenvolvi- mento sustentável possui caráter normativo, ou seja, ele prescreve como o mundo deveria ser, em oposição ao caráter positivo de uma análise, que apenas procura descrever como o mundo é. Este conceito foi empregado pela primeira vez no início da década de 1970, com a designação de ecodesenvolvimento. INTRODUÇÃO C E D E R J 33 A U LA 2Assim, decidir se uma política é boa ou má não é apenas uma questão meramente científi ca, estabelecida por meio de postulados, pois sua análise envolve também as visões dos atores sociais acerca de ética, religião e fi losofi a política. Não obstante, as afi rmações positivas e normativas podem estar inter-relacionadas, uma vez que as nossas visões sobre como o mundo funciona podem afetar as nossas visões normativas acerca de quais seriam as políticas mais desejáveis. Havia na época uma grande controvérsia acerca das conexões entre o crescimento econômico e o meio ambiente. Tal controvérsia foi bastante magnifi cada com a publicação do relatório do Clube de Roma, que apresentava a ideia limite de crescimento zero (ausência de crescimento econômico) como sendo a única forma de se evitar uma catástrofe ambiental. Dessa forma, na tentativa de resolver esse impasse, a ideia de sustentabilidade emerge desse contexto como uma proposição conciliadora, a partir da qual se admite que o progresso técnico de fato relativiza os limites ambientais, mas não os elimina, e que o crescimento econômico é uma condição necessária, mas não sufi ciente, para a eliminação da pobreza e das disparidades sociais. Não obstante, com o passar do tempo, essa proposição foi adquirindo uma aceitação mais ampla, mas, em virtude do seu caráter normativo, não deixou de evidenciar divergências no tocante à sua interpretação. A ausência de entendimento se revela não somente em razão das múltiplas defi nições sobre o termo “desenvolvimento sustentável”, mas também em virtude das diferenças de interpretação sobre uma mesma defi nição. Por exemplo, de acordo com a defi nição adotada pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (World Commission on Environmental and Development – WCD), o desenvolvimento sustentável é “o desenvolvimento que satisfaz as necessidades do presente sem comprometer as habilidades das futuras gerações de satisfazerem suas necessidades” (FERREIRA, 2003, p. 18). 34 C E D E R J Gestão Ambiental | As escolas de pensamento na Economia do Meio Ambiente Figura 2.1: A sustentabilidade pressupõe a manutenção do status do ambiente natural para que as gerações futuras também possam usufruí-lo. Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/fi cheiro:river_in_amazon_rainforest.jpg Ocorre que essa declaração esclarece pouco e talvez confunda muito. Como é possível dar um sentido aplicado, que seja operacional e prático, para esse conceito? Como ele pode ser traduzido em termos de políticas públicas? Em vista disso, o debate acadêmico no âmbito da economia do meio ambiente envolve opiniões que se dividem entre duas correntes principais de interpretação: a economia ambiental e a economia ecológica, as quais serão vistas mais adiante. Com relação ao conceito de desenvolvimento sustentável, comente as afi rmações a seguir enunciadas, dizendo se são certas ou erradas, justifi cando a sua resposta: a. O advento da degradação ambiental e a sua consequente ameaça ao bem-estar do homem no planeta Terra consagraram a ideia de desenvolvimento sustentável, que hoje se constitui num consenso universal. ( ) verdadeiro ( ) falso b. O conceito de desenvolvimento sustentável possui caráter normativo na medida em que ele prescreve como o mundo deveria ser. ( ) verdadeiro ( ) falso Atividade 1 1 C E D E R J 35 A U LA 2 _____________________________________________________________________________ ____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ Respostas Comentadas a. Falso. Embora seja cada vez mais incontestável que a ação antrópica produz efeitos deletérios no meio ambiente, não há absolutamente convergência de pensamento na maneira como isso se manifesta, de forma que a ideia de desenvolvimento sustentável possuimúltiplas abordagens e interpretações. b. Verdadeiro. O que caracteriza um posicionamento normativo é o caráter prescritivo de sua manifestação. O jornal Gazeta Mercantil, em sua sua edição de terça-feira, 9 de dezembro de 2008, publicou o seguinte artigo: Liderança para a sustentabilidade Na última quarta-feira, sob a liderança de Osires Silva, a ONG Fórum de Líderes deu partida a um importante movimento de think thank (formador de opinião), cujo objetivo é o de reunir alguns dos principais líderes empresariais brasileiros em torno do desafi o de pensar e construir propostas para o desenvolvimento do País. Mais do que isso, o seleto grupo pretende infl uenciar os tomadores de decisão das políticas públicas, apresentando caminhos e soluções em áreas como, por exemplo, o agronegócio, a educação, a inovação tecnológica e a gestão pública. Onze temas foram selecionados. A sustentabilidade – como era de se esperar – fi gura entre eles. Sob o nome de Liderança em Sustentabilidade, formou-se um grupo de trabalho, a princípio sob o comando do ex-ministro da Indústria e Comércio, Luiz Furlan, que terá, entre outras missões, que articular empresários para discutir um novo modelo competitivo, baseado no tripple bottom line, consideração de outros, além do lucro, para o demonstrativo de resultados de uma empresa. Na primeira reunião, o grupo iniciou o debate a partir da provocação feita pelos cientistas do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) sobre a urgência de rever o atual modelo de desenvolvimento comprovadamente insustentável – altamente emissor de carbono, gerador de desigualdades sociais e perdulário no Atividade 2 1 36 C E D E R J Gestão Ambiental | As escolas de pensamento na Economia do Meio Ambiente uso de recursos naturais cada vez mais escassos. Entre os participantes, fi cou claro que a mudança é a única alternativa possível para um planeta em desequilíbrio, do qual se extraem 30% a mais de recursos que ele é capaz de repor. Também houve consenso sobre o fato de que as empresas são protagonistas e podem acelerar o processo se contarem com líderes efetivamente engajados (...). Com base no que foi visto no texto, diga se é possível evidenciar que o pensamento majoritário dos decisores no Brasil corrobora a convergência sobre as relações existentes entre o progresso técnico e a degradação do meio ambiente. _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _______________________________________________________________________________ _______________________________________________________________________________ _______________________________________________________________________________ _______________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________ Resposta Comentada Vimos que havia uma controvérsia acerca das conexões entre o crescimento econômico e o meio ambiente. Nesse sentido, a ideia de sustentabilidade emergiu desse contexto como uma proposição conciliadora, a partir da qual se admitia que o progresso técnico de fato relativiza os limites ambientais, mas não os elimina, e que o crescimento econômico seria uma condição necessária, mas não suficiente, para a eliminação da pobreza e das disparidades sociais. Porém, com o passar do tempo, essa proposição foi adquirindo uma aceitação mais ampla, mas, em razão do seu caráter normativo, não deixou de evidenciar divergências no tocante à sua interpretação. No texto, verificamos que atualmente há uma conscientização mais ampla acerca do papel das empresas na questão ambiental, bem como uma ação mais afirmativa, por parte delas, na superação desse impasse (sobre a urgência de rever o atual modelo de desenvolvimento comprovadamente insustentável – altamente emissor de carbono, gerador de desigualdades sociais e perdulário no uso de recursos naturais cada vez mais escassos. Entre os participantes, ficou claro que a mudança é a única alternativa possível para um planeta em desequilíbrio, do qual se extraem 30% a mais de recursos que ele é capaz de repor. Também houve consenso sobre o fato de que as empresas são protagonistas e podem acelerar o processo se contarem com líderes efetivamente engajados). C E D E R J 37 A U LA 2A ECONOMIA AMBIENTAL Essa primeira corrente de pensamento é representada pela chamada Economia Ambiental (integra o mainstream neoclássico, ou corrente principal de pensamento da economia) e considera que os recursos naturais, tanto como fonte de insumos quanto como capacidade de assimilação de impostos nos ecossistemas, não representam um limite absoluto à expansão da economia. Inicialmente, os recursos naturais sequer apareciam nas suas representações analíticas da realidade econômica. No modelo tradicional, raciocinava-se apenas com os fatores capital (K) e trabalho (L), como se a atividade econômica fosse indepen- dente dos recursos naturais. Nos modelos posteriores, os recursos naturais passaram a ser incluídos na função de produção, com a suposição de substitutibilidade perfeita entre capital, trabalho e recursos naturais, ou seja, os eventuais limites impostos pela escassez de recursos naturais poderiam ser indefi nidamente superados pelo progresso técnico, que os substitui por capital (ou trabalho). Dessa forma, os recursos naturais restringiram apenas relativamente uma função de produção, sendo essa restrição superável a qualquer tempo pelo progresso científi co e tecnológico, que seria a variável-chave, de tal forma a não haver limites para o crescimento econômico a longo prazo. 38 C E D E R J Gestão Ambiental | As escolas de pensamento na Economia do Meio Ambiente Função de Produção é um modelo teórico que associa um dado conjunto de insumos (X1, X2,..., Xn) a uma certa quantidade de produto Y, segundo uma dada tecnologia. A fi gura seguinte expressa a função de produção. Tecnologia A função de produção relaciona uma dada combinação de insumos, em quantidades, com um certo nível de produto. Em termos macroeconômicos, é possível construir uma função de produção agregada, cujo produto é o próprio somatório de todos os bens e serviços fi nais produzidos num intervalo de tempo em determinado local, ou seja, o Produto Interno Bruto (PIB). Nesse caso, os fatores de produção são o capital físico (K) e o trabalho (L), e a função de produção pode ser expressa da seguinte forma: F(K, L) → Y. Por sua vez, uma função de produção que agregasse capital, trabalho e capital natural (RN) seria expressa assim: F(K, RN, L) → Y. ?? ProdutoY Insumos(X1, X2,..., Xn)Função Na doutrina econômica, essa concepção de restrição relativa impos- ta pelos recursos naturais fi cou conhecida como conceito de sustentabilida- de fraca. Nessa maneira de conceber o mundo, uma economia seria “não sustentável” apenas se os investimentos totais fossem menores do que a depreciação combinada dos ativos produzidos e dos não produzidos, sendo que estesúltimos seriam restritos aos recursos naturais. A ideia subjacente é a de que o investimento sempre compensaria as gerações futuras pelas perdas de ativos provocada pelo consumo e pela produção correntes (essa concepção fi cou conhecida como regra de Hartwick). Não obstante, essa ideia tem sido objeto de críticas tanto sob o aspecto das hipóteses que assume verdadeiras, ou seja, os pressupostos que a sustentam (o que se considera uma crítica externa), como também em razão de sua inconsistência metodológica (que é considerada uma crítica interna). No que diz respeito à crítica externa, a suposição é contestada na medida em que se assinala a impossibilidade de o capital produzido pela ação humana ser capaz de substituir permanentemente as utilidades geradas por algumas categorias de recursos naturais, que, em razão de suas características únicas, não podem ser substituídos pelo engenho C E D E R J 39 A U LA 2humano. Como consequência dessa contestação, fi ca a ideia de que o consumo de capital natural, em alguns casos, pode ser irreversível. Por sua vez, o núcleo da crítica interna relativa à inconsistência metodológica diz respeito à forma pela qual o capital é avaliado. Uma vez que a abordagem da sustentabilidade fraca pressupõe uma função de produção que agrega tanto o capital produzido pelo homem quanto o capital natural, é preciso que seja adotado um numerário comum na valoração desse capital. O numerário comum, ou unidade de conta, é a métrica de mensuração baseada num sistema de preços correntes. O capital produzido pode ser estimado pelos preços de mercado observados, mas os recursos naturais, para serem valorados, devem se referir aos preços existentes, em termos monetários.!! Nessa linha de argumentação, Motta (1998, p. 15) assinala que, para a determinação do valor econômico de um recurso natural, é preciso proceder à estimativa do valor monetário deste em relação aos outros bens e serviços transacionados na economia. Não obstante, esse autor lembra que alguns bens e serviços públicos não são objeto de transações nos mercados, e, em virtude disso, não têm preços defi nidos. Este é o caso da maior parte dos recursos ambientais. Figura 2.2: Um animal da fauna nativa brasileira está fora do conjunto de bens negociáveis no mercado. Ele está à disposição da contempla- ção dos amantes da natureza, devidamente protegido em seu habitat natural. Trata-se, portanto de um bem público. Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/fi cheiro:phanimals-jaburu-1.jpg 40 C E D E R J Gestão Ambiental | As escolas de pensamento na Economia do Meio Ambiente O problema decorre das dificuldades existentes para definir o numerário, uma vez que ele não incorpora vários aspectos ambientais. Por sua vez, um correto e adequado sistema de preços que refl etisse os termos de troca (e, consequentemente, explicitasse a unidade de conta) deveria considerar como cada bem seria afetado se todas as funções ambientais fossem monetizadas (expressas em moeda), mas elas só podem ser monetizadas se o sistema de preços for conhecido. Aí está a questão da crítica interna de inconsistência metodológica: é uma tautologia ou circularidade, e isso torna o emprego dos preços de mercado um procedimento muito questionável para determinar se uma economia é ou não sustentável. Para a corrente de pensamento partidária da sustentabilidade fraca, os mecanismos pelos quais se verifi ca a ampliação continuada dos limites de esgotamento ambiental em face do crescimento econômico devem ser majoritariamente os mecanismos de mercado. O problema dessa premissa é o fato de que o mercado apenas conseguiria atuar de forma parcial no estabelecimento dos sinais orien- tadores das decisões alocativas. Para os casos de um recurso natural já transacionado nos mercados, tais como os insumos materiais (madeiras, minérios etc.) e energéticos (petróleo, gás etc.), um eventual aumento de sua escassez se refl etiria na elevação do preço, induzindo à busca de inovações que permitissem poupá-lo, mediante a substituição de seu uso por outro insumo mais abundante. Porém, quando se trata de serviços ambientais que em geral não são transacionados no mercado devido à sua natureza de bem público, como é o caso da água dos mares e rios, do ar, dos ciclos bioquímicos globais de sustentação da vida, da capacidade de assimilação de rejeitos etc., o mecanismo de mercado falha, pois não existem preços de mercado que permitam estabelecer a escassez relativa entre os ativos econômicos, e, consequentemente, não é possível orientar uma alocação efi ciente de recursos. Essa falha de mercado pode ser corrigida desde que seja possível aumentar a disposição a pagar pelos serviços ambientais à medida que a escassez dos mesmos aumenta. Convém lembrar que o uso dos bens públicos relativos ao meio ambiente pode ser considerado um serviço ambiental; por exemplo, quando a produção de uma fábrica gera efl uentes líquidos e gasosos, que são despejados nos rios e no ar, o serviço que o meio ambiente executa consiste na assimilação e depuração das substâncias lançadas, cujas concentrações vão se diluindo aos poucos. C E D E R J 41 A U LA 2 Em geral, é possível observar empiricamente que, à medida que ocorre um processo de crescimento econômico numa dada sociedade, os seus membros tendem a ser menos tolerantes com a escassez desses serviços ambientais, que se manifesta com o incremento da poluição. Na verdade, o que ocorre é uma relação entre crescimento econômico e degradação ambiental parecida com um “U” invertido, de tal forma que, num primeiro momento de elevação da renda per capita, a degradação ambiental aumenta até um certo ponto e depois começa a diminuir, conforme o gráfi co a seguir: Esse fenômeno pode ser explicado pelo fato de que, nos estágios iniciais do desenvolvimento econômico, a crescente degradação do meio ambiente é admitida como sendo um efeito colateral ruim, mas necessário, pois a qualidade de vida dos agentes econômicos é muito precária. Porém, quando os atores econômicos atingem um certo nível de bem-estar, eles se tornam mais sensíveis aos efeitos deletérios da degradação do meio ambiente e, por isso, fi cam mais dispostos a pagar pela melhoria da qualidade ambiental. Esse incremento da disposição a pagar induziria à busca por mais inovações tecnológicas, institucionais e organizacionais, com vistas à superação da falha de mercado decorrente do caráter público dos serviços ambientais. Uma falha de mercado consiste numa situação na Fonte: O autor. Crescimento econômico Degradação ambiental 42 C E D E R J Gestão Ambiental | As escolas de pensamento na Economia do Meio Ambiente qual os mecanismos de mercado, em especial o sistema de preços relativos, não consegue orientar a distribuição de riqueza mediante a oferta e a demanda de produtos. Um bem público não pode ser precifi cado, logo, constitui-se numa falha de mercado. As soluções ideais para a superação desse problema seriam aquelas que viabilizassem as condições para o livre funcionamento dos mecanis- mos de mercado. Essas soluções operariam diretamente, por via da eliminação do caráter público dos bens e serviços ambientais, ao serem atribuídos direitos de propriedade sobre eles, bem como poderiam operar indiretamente, por meio da valoração econômica da degradação do meio ambiente e na imposição desses valores sob a forma de taxas cobradas pelo Estado. Em ambos os casos, existiriam problemas práticos. No caso da atribuição dos direitos de propriedade sobre o ar ou a água dos rios, mares e lagos, haveria um enorme custo de transação para viabilizar o processo
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