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EFICÁCIA DA LEI PENAL EM RELAÇÃO ÀS PESSOAS A lei penal se aplica a todos, nacionais ou estrangeiros, por igual, não existindo privilégios pessoais (artigo 5°, caput, e inciso I, da CF/88). Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição; Há, no entanto, pessoas que, em virtude de suas funções ou em razão de regras internacionais, gozam de imunidades. Trata-se de PRERROGATIVA FUNCIONAL (não é privilégio), uma proteção ao cargo ou função desempenhada. Em que pesem as discussões a respeito do tema, a imunidade penal não é vista como privilégio, mas um mecanismo jurídico para assegurar as garantias e os direitos fundamentais estipulados na Constituição Federal, bem como respeitar o exercício da soberania dos demais estados, em obediência a tratado ou convenção internacional. Vamos estudar as imunidades diplomáticas e parlamentares (absoluta e relativa), lembrando que a análise mais detalhada sobre as demais espécies de imunidades é feita pelo Direito Constitucional. IMUNIDADES DIPLOMÁTICAS A imunidade diplomática é uma prerrogativa de direito público internacional de que desfrutam: a) os chefes de governo ou de Estado estrangeiro e sua família e membros da sua comitiva; b) embaixador e sua família; c) os funcionários do corpo diplomático e sua família; d) funcionários das organizações internacionais (ex: Organizações das Nações Unidas – ONU, Organização dos Estados Americanos – OEA, etc), quando em serviço. Em se tratando de direito penal, sabe-se que as embaixadas já foram consideradas território do país representado, porém, após a Convenção de Viena, a regra foi alterada, sendo que as embaixadas não são mais consideradas território do país representado, sendo que seus respectivos territórios são do próprio país onde se localizam (ou seja, no caso, Brasil). A Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, assinada em 1961 e incorporada ao direito brasileiro por meio do Decreto n° 56.435/65, regula a imunidade diplomática. No seu artigo 31, 1, de forma expressa, assegura ao agente diplomático o gozo de imunidade de jurisdição penal do Estado acreditado. Ou seja, os representantes diplomáticos não se sujeitam à jurisdição criminal do país onde estão acreditados porque suas condutas permanecem sob a eficácia da lei penal do Estado a que pertencem. Em síntese, o agente diplomático está sujeito à lei do país que ele representa. Caso venham a cometer crime no Brasil, haverá o fenômeno da INTRATERRITORIALIDADE, aplicando-se a lei penal estrangeira a fato cometido no território brasileiro. Por consequência, se no país de origem o fato não é crime, o agente não será responsabilizado. O agente diplomático, por disposição expressa, não poderá ser objeto de nenhuma forma de detenção ou prisão (artigo 29, Decreto n° 56.435/65). Esta inviolabilidade de que é portador estende-se à sua residência particular, seus documentos, correspondências e bens (artigo 30, do mesmo decreto). A discutida imunidade estende-se aos funcionários do corpo diplomático, acontecendo o mesmo com os componentes da família do representante. Dessa forma, os lugares em que exercem os serviços da embaixada são invioláveis. Não no sentido da extraterritorialidade (não em razão da embaixada ser considerada território estrangeiro), mas em função da imunidade dos representantes. Assim, cometida uma infração nesses locais (embaixada) por pessoa que não goza da imunidade, o fato fica sujeito à jurisdição territorial. Não se deve confundir o agente diplomático com o agente consular. O Cônsul exerce apenas funções administrativas e não desfruta da mesma imunidade que o agente diplomático. A imunidade do cônsul é restrita aos atos de seu ofício, por isso chamada de imunidade funcional relativa. Tratando-se de crime comum, são punidos de acordo com a lei brasileira; já no caso de delito relacionado diretamente com a função consular (por exemplo, fraude na concessão de passaportes), incide a imunidade e o cônsul fica sujeito à lei do país de origem. A imunidade dos agentes diplomáticos é IRRENUNCIÁVEL (não pode abrir mão), pois é conferida em razão do cargo e não da pessoa. Contudo, pode haver a renúncia, desde que EXPRESSA, por parte do Estado de origem do agente diplomático (denominado Estado Acreditante), nos termos do artigo 32, 1 e 2, do Decreto n° 56.435/65. IMUNIDADES PARLAMENTARES As imunidades parlamentares encontram previsão na Constituição Federal e tem como finalidade conferir aos parlamentares ampla liberdade de palavra no exercício de suas funções. Desse modo, impede-se que os referidos parlamentares venham a responder por eventuais abusos no uso da manifestação do pensamento. As imunidades parlamentares classificam-se em absolutas e relativas. IMUNIDADE PARLAMENTAR ABSOLUTA (freedom of speech) Também chamada de imunidade substancial, material, real, inviolabilidade ou indenidade, a imunidade parlamentar absoluta está previsto no artigo 53, caput, da CF/88, nos seguintes termos: CF, Art. 53. “Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos”. Quais os limites da imunidade parlamentar material? Deve haver vínculo (conexão) entre as palavras e/ou opiniões do parlamentar e o exercício da sua função. Entende a doutrina (seguida pela jurisprudência) que, estando o parlamentar nas dependências do parlamento, presume-se (de modo absoluto) o nexo. Esse elo, porém, não será presumido nos casos em que o parlamentar se encontrar fora das dependências da casa legislativa respectiva, demandando prova de que as manifestações são ligadas ao exercício do mandato. Na hipótese de utilização de meios eletrônicos (Whatsapp, Facebook, Twitter, Instagram, e-mails, etc) para divulgar mensagens ofensivas à honra de alguém, deve haver vinculação com o exercício parlamentar para que seja afastada a responsabilidade, ainda que a mensagem tenha sido gerada dentro do gabinete. A imunidade absoluta não se estende ao corréu que pratique o crime em concurso de agentes com parlamentar que não tenha a prerrogativa do cargo, porquanto, circunstância pessoal incomunicável (artigo 30 do CP - “Não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal, salvo quando elementares do crime”). Esse é o entendimento manifestado pelo STF, nos termos da súmula 245: “A imunidade parlamentar não se estende ao corréu sem essa prerrogativa”. Sendo inerente ao mandato, a imunidade parlamentar absoluta é irrenunciável, não se podendo instaurar inquérito policial ou ação penal, mesmo que o parlamentar autorize. Trata-se de instituto que visa preservar o regime representativo, possibilitando a atuação livre e independente do Parlamento, e não a pessoa do Parlamentar. IMUNIDADE PARLAMENTAR RELATIVA A imunidade parlamentar relativa, também conhecida como imunidade formal, processual ou adjetiva, encontra previsão no artigo 53, §1° ao §8°, da CF/88: Artigo 53 (...) § 1º Os Deputados e Senadores, desde a expedição do diploma, serão submetidos a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 35, de 2001) § 2º Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 35, de 2001) § 3º Recebida a denúncia contra o Senador ou Deputado, por crime ocorrido após a diplomação, o Supremo TribunalFederal dará ciência à Casa respectiva, que, por iniciativa de partido político nela representado e pelo voto da maioria de seus membros, poderá, até a decisão final, sustar o andamento da ação. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 35, de 2001) § 4º O pedido de sustação será apreciado pela Casa respectiva no prazo improrrogável de quarenta e cinco dias do seu recebimento pela Mesa Diretora. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 35, de 2001) § 5º A sustação do processo suspende a prescrição, enquanto durar o mandato. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 35, de 2001) § 6º Os Deputados e Senadores não serão obrigados a testemunhar sobre informações recebidas ou prestadas em razão do exercício do mandato, nem sobre as pessoas que lhes confiaram ou deles receberam informações. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 35, de 2001) § 7º A incorporação às Forças Armadas de Deputados e Senadores, embora militares e ainda que em tempo de guerra, dependerá de prévia licença da Casa respectiva. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 35, de 2001) § 8º As imunidades de Deputados ou Senadores subsistirão durante o estado de sítio, só podendo ser suspensas mediante o voto de dois terços dos membros da Casa respectiva, nos casos de atos praticados fora do recinto do Congresso Nacional, que sejam incompatíveis com a execução da medida. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 35, de 2001) http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc35.htm#art1 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc35.htm#art1 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc35.htm#art1 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc35.htm#art1 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc35.htm#art1 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc35.htm#art1 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc35.htm#art1 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc35.htm#art1 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc35.htm#art1 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc35.htm#art1 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc35.htm#art1 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc35.htm#art1 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc35.htm#art1 IMUNIDADE PARLAMENTAR RELATIVA - 1) Prerrogativa relativa ao foro Artigo 53 (...)§ 1º Os Deputados e Senadores, desde a expedição do diploma, serão submetidos a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal. O foro especial se estende da diplomação (e não da posse) até o fim do mandato. => A prerrogativa de foro se limita aos crimes cometidos no exercício do cargo e em razão dele; => A jurisdição do STF se perpetua caso tenha havido o encerramento da instrução processual (intimação das partes para as manifestações finais – artigo 11 da Lei n° 8.038/90) antes da extinção do mandato. Isso serve para que sejam preservadas a efetividade e a racionalidade da prestação jurisdicional e evita manobras processuais, como já ocorreu, de um parlamentar que estava prestes a ser julgado renunciou o mandato para que o processo fosse encaminhado para a primeira instância e com isso o processo demorasse muito mais. IMUNIDADE PARLAMENTAR RELATIVA – 2) Relativa à prisão CF, Artigo 53 (...) § 2º Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 35, de 2001) Consiste na impossibilidade do parlamentar ser preso, salvo em flagrante delito e por crime inafiançável (racismo, tráfico de drogas, crimes hediondos), ou quando definitivamente condenado. Em resumo, o parlamentar não poderá ser preso, mesmo que em flagrante delito, por crime afiançável. A imunidade atinge somente os crimes cometidos após a diplomação (ato que o investe no cargo parlamentar). Cabe prisão civil contra o Congressista devedor de alimentos? A questão gera grande controvérsia na doutrina. Uadi Bulos ensina ser cabível a prisão civil do congressista quando devedor de alimentos. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc35.htm#art1 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc35.htm#art1 Gilmar Mendes leciona que a imunidade abarca qualquer ato de privação da liberdade, o que impede também as prisões civis. Rogério Sanches Cunha diverge dos dois dizendo que se deve diferenciar os alimentos provisórios dos definitivos. Nos casos de alimentos provisórios, não seria possível a prisão, assim como não é possível a prisão provisória (antes de condenação transitada em julgado). No que tange aos alimentos definitivos, admitem a coação da prisão civil. Nada justifica a preponderância da liberdade do exercício da função quando comparada com a comprovada necessidade do alimentando. IMUNIDADE PARLAMENTAR RELATIVA – 3) RELATIVA AO PROCESSO Caso o parlamentar venha a ser preso em flagrante por crime inafiançável, deverá a Casa respectiva ser informada em 24 horas para deliberar sobre a manutenção desta ou pelo relaxamento do flagrante. Independentemente da decisão tomada pela Casa, poderá o Procurador Geral da Republica oferecer denúncia contra o parlamentar, não havendo mais necessidade de autorização da casa legislativa, como era antes da EC nº 32/01. Oferecida a denúncia contra o parlamentar, preso ou não, o Supremo Tribunal Federal receberá a denúncia e oficiará a casa respectiva para, por voto da maioria absoluta (metade mais um dos membros que compõem a casa legislativa) e no prazo improrrogável de 45 dias, após requerimento de partido político do parlamentar denunciado, ou outro com representação na casa, sustar a presente ação até o término do mandato. Durante o mandato, a prescrição penal também permanecerá suspensa. IMUNIDADE PARLAMENTAR RELATIVA – 4) RELATIVA À CONDIÇÃO DE TESTEMUNHA A Constituição Federal continua a reconhecer também a imunidade para servir de testemunha. Dispõe o Parágrafo 6º do artigo 53, que os deputados e senadores não serão obrigados a testemunhar sobre informações recebidas ou prestadas em razão do exercício do mandato, nem sobre as pessoas que lhes confiaram ou deles receberam informações. Embora a testemunha tenha o dever de comparecer quando intimada pelo juízo para prestar depoimento, o artigo 221 do Código de Processo Penal estabelece que os deputados e senadores terão a prerrogativa de ajustar dia, horário e local com essa finalidade. A prerrogativa processual penal é exclusiva para parlamentar enquanto ostentar a condição de testemunha, NÃO se aplicando ao parlamentar investigado ou acusado. Quanto ao mais, porém, os congressistas deverão prestar depoimentos. IMUNIDADES PARLAMENTARES E ESTADO DE SÍTIO As imunidades absolutas e relativas dos deputados e senadores subsistirão durante o estado de sítio, só podendo ser suspensas mediante o voto de dois terços dos membros da Câmara respectiva, nos casos de atos praticados fora do recinto do Congresso, e que sejam incompatíveis com a execução da medida. Nas demais hipóteses, ou seja, qualquer crime praticado no recinto do Congresso ou que não sejam incompatíveis com o estado de sítio praticados fora dele, são asseguradas imunidades parlamentares (artigo 53, par. 8º). IMUNIDADES DO PARLAMENTAR LICENCIADO Caso o parlamentar se licencie do cargo para o qual foi eleito com o objetivo de exercer outro, NÃO manterá sua imunidade, que não é pessoal, mas da função, cessando igualmente a prerrogativa de foro, a não ser que o cargo assumido também confira a prerrogativa, como no caso de ministros deEstado. IMUNIDADES DOS DEPUTADOS ESTADUAIS Não obstante as regras das imunidades sejam previstas para todos os deputados federais e senadores, a própria CF estendeu o rol aos deputados estaduais, com fulcro no princípio da simetria (artigo 27, Parágrafo 1º, CF). CF, Art. 27 (...) § 1º Será de quatro anos o mandato dos Deputados Estaduais, aplicando-se-lhes as regras desta Constituição sobre sistema eleitoral, inviolabilidade, imunidades, remuneração, perda de mandato, licença, impedimentos e incorporação às Forças Armadas. PARLAMENTARES FEDERAIS PARLAMENTARES ESTADUAIS Imunidade absoluta nas opiniões, palavras e votos. Imunidade absoluta nas opiniões, palavras e votos. Imunidade relativa: a) Foro (STF); b) Prisão; Imunidade relativa: a) Foro (TJ/TRF/TRE); b) Prisão; c) Processo; d) Condição de testemunha. c) Processo; d) Condição de testemunha. IMUNIDADES DOS VEREADORES Os vereadores, por força do artigo 29, VIII, do CF/88, desfrutam somente de imunidade absoluta, desde que suas opiniões, palavras e votos sejam proferidos no exercício do mandato (nexo material) E na circunscrição do Município (critério funcional). CF, Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos: (...) VIII - inviolabilidade dos Vereadores por suas opiniões, palavras e votos no exercício do mandato e na circunscrição do Município. IMUNIDADES DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA Art. 86. Admitida a acusação contra o Presidente da República, por dois terços da Câmara dos Deputados, será ele submetido a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal, nas infrações penais comuns, ou perante o Senado Federal, nos crimes de responsabilidade. § 1º O Presidente ficará suspenso de suas funções: I - nas infrações penais comuns, se recebida a denúncia ou queixa- crime pelo Supremo Tribunal Federal; II - nos crimes de responsabilidade, após a instauração do processo pelo Senado Federal. § 2º Se, decorrido o prazo de cento e oitenta dias, o julgamento não estiver concluído, cessará o afastamento do Presidente, sem prejuízo do regular prosseguimento do processo. § 3º Enquanto não sobrevier sentença condenatória, nas infrações comuns, o Presidente da República não estará sujeito à prisão. § 4º O Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções. O Presidente da Republica goza de imunidades formais em relação à prisão e à ação penal durante o exercício do mandato presidencial. Isto significa que, com relação à prisão, somente poderá ser preso sobrevindo sentença penal condenatória. O §3º, do artigo 86, veda a aplicação de qualquer modalidade de prisão provisória ao Presidente da República, mesmo em flagrante delito por crime inafiançável. No tocante à ação penal, o presidente somente poderá ser processado após autorização – juízo de admissibilidade – da Câmara dos Deputados por 2/3 dos votos de seus membros (2/3 de 513 deputados). Tratando-se de crime comum, o Procurador Geral da República – chefe do Ministério Publico da União – oferecerá denúncia ao Supremo Tribunal Federal que oficiará a Câmara para autorizar a ação penal. Autorizada a ação e recebida a denúncia, o Presidente ficará afastado de suas funções pelo prazo máximo de 180 dias. No entanto, em se tratando de crime de responsabilidade, previstos na Lei 1.079/50, a denúncia será oferecida por qualquer cidadão à Câmara dos Deputados que autorizará o processo perante o Senado Federal. Admitida a ação pela Câmara, o Senado é obrigado a processar o Presidente. É o denominado processo de impeachment. Por fim, a Constituição Federal ainda prevê o princípio da irresponsabilidade penal do Presidente da República enquanto estiver exercendo mandato presidencial (portanto, a imunidade é temporária) às: a) infrações penais cometidas do início do exercício do mandato; b) infrações penais cometidas durante o exercício do mandato, mas que não guardam correlação com suas funções. DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS 1) EFICÁCIA DA SENTENÇA ESTRANGEIRA Na conformidade da lei brasileira (artigo 935 do Código Civil e artigos 63 e 64 do Código de Processo penal), uma vez existente sentença condenatória na esfera criminal, pode ser o autor do crime responsabilizado civilmente, sem possibilidade de discussão do mérito. Atualmente, com a reforma processual penal de 2008, o valor mínimo indenizatório pode, inclusive, ser fixado pelo juízo criminal, por ocasião da sentença, nos termos do artigo 387 do CPP. Código Civil, Art. 935. “A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal”. Código de Processo Penal, Art. 63. “Transitada em julgado a sentença condenatória, poderão promover-lhe a execução, no juízo cível, para o efeito da reparação do dano, o ofendido, seu representante legal ou seus herdeiros. Parágrafo único. Transitada em julgado a sentença condenatória, a execução poderá ser efetuada pelo valor fixado nos termos do inciso IV do caput do art. 387 deste Código sem prejuízo da liquidação para a apuração do dano efetivamente sofrido”. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008). Código de Processo Penal, Art. 64. “Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, a ação para ressarcimento do dano poderá ser proposta no juízo cível, contra o autor do crime e, se for caso, contra o responsável civil. (Vide Lei nº 5.970, de 1973) Parágrafo único. Intentada a ação penal, o juiz da ação civil poderá suspender o curso desta, até o julgamento definitivo daquela”. Código de Processo Penal, Art. 387. “O juiz, ao proferir sentença condenatória: (...) IV - fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido”; (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008) Pode ocorrer, contudo, que a sentença criminal seja proveniente de órgão jurisdicional estrangeiro e, neste caso, deverá ser homologada no Brasil, exigindo-se, para tanto, que esteja provado o seu trânsito em julgado (súmula 420 do STF – “Não se homologa sentença proferida no estrangeiro sem prova do trânsito em julgado”). A homologação de sentença estrangeira, para produzir efeitos no Brasil, compete ao SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA – STJ, conforme prevê o artigo 105, I, “i”, da CF/88: CF, Art. 105. “Compete ao Superior Tribunal de Justiça: I - processar e julgar, originariamente: (...) i) a homologação de sentenças estrangeiras e a concessão de exequatur às cartas rogatórias”; A decisão da homologação da sentença estrangeira não atinge o seu mérito (o seu conteúdo), vez que o STJ somente realiza um exame formal acerca do preenchimento dos requisitos elencados nos incisos do artigo 788 do Código de Processo Penal. CPP, Art. 788. “A sentença penal estrangeira será homologada, quando a aplicação da lei brasileira produzir na espécie as mesmas consequências e concorrem os seguintes requisitos: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/1930-1949/Ret/RetDel3689-41.doc#art387iv http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/1930-1949/Ret/RetDel3689-41.doc#art387iv http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2008/Lei/L11719.htm#art1 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2008/Lei/L11719.htm#art1 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/1970-1979/L5970.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2008/Lei/L11719.htm#art1 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2008/Lei/L11719.htm#art1 I - estar revestida das formalidades externas necessárias, segundoa legislação do país de origem; II - haver sido proferida por juiz competente, mediante citação regular, segundo a mesma legislação; III - ter passado em julgado; IV - estar devidamente autenticada por cônsul brasileiro; V - estar acompanhada de tradução, feita por tradutor público”. Reza o artigo 9° do Código Penal: Art. 9º - A sentença estrangeira, quando a aplicação da lei brasileira produz na espécie as mesmas consequências, pode ser homologada no Brasil para: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) I - obrigar o condenado à reparação do dano, a restituições e a outros efeitos civis; (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) II - sujeitá-lo a medida de segurança.(Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) Parágrafo único - A homologação depende: (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) a) para os efeitos previstos no inciso I, de pedido da parte interessada; (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) b) para os outros efeitos, da existência de tratado de extradição com o país de cuja autoridade judiciária emanou a sentença, ou, na falta de tratado, de requisição do Ministro da Justiça. (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) Observação: Uma sentença penal estrangeira gera reincidência (art. 63 do CP). Para gerar este efeito, não é necessária a sua homologação; exige-se, contudo, prova idônea (documento oficial traduzido por tradutor juramentado). 2 – CONTAGEM DO PRAZO Em matéria penal, devem ser diferenciados os prazos processuais e os prazos penais. Os PRAZOS PROCESSUAIS seguirão a regra do art. 798, §1°, do CPP, não se computando o dia do começo, mas incluindo-se o do vencimento. O prazo que terminar em domingo ou feriado considerar- se-á prorrogado até o imediato dia útil (artigo 798, §3°, do CPP) e a intimação na sexta-feira conduz o início do prazo processual na segunda-feira seguinte – ou primeiro dia útil que se seguir (súmula 310 do STF). CPP, “Art. 798. Todos os prazos correrão em cartório e serão contínuos e peremptórios, não se interrompendo por férias, domingo ou dia feriado. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/1980-1988/L7209.htm#art9 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/1980-1988/L7209.htm#art9 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/1980-1988/L7209.htm#art9 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/1980-1988/L7209.htm#art9 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/1980-1988/L7209.htm#art9 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/1980-1988/L7209.htm#art9 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/1980-1988/L7209.htm#art9 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/1980-1988/L7209.htm#art9 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/1980-1988/L7209.htm#art9 § 1o Não se computará no prazo o dia do começo, incluindo-se, porém, o do vencimento. (...) § 3o O prazo que terminar em domingo ou dia feriado considerar-se-á prorrogado até o dia útil imediato”. “Súmula 310, STF - Quando a intimação tiver lugar na sexta-feira, ou a publicação com efeito de intimação for feita nesse dia, o prazo judicial terá início na segunda-feira imediata, salvo se não houver expediente, caso em que começará no primeiro dia útil que se seguir”. Os PRAZOS PENAIS são computados na forma do artigo 10 do Código Penal. Há a inclusão do dia inicial e exclusão do dia final. São improrrogáveis. Mas podem ser suspensos ou interrompidos, como por exemplo, nos casos de prescrição (artigo 116 e 117 do Código Penal). A contagem do artigo 10 do CP aplica-se a todos os prazos da lei material, tais como o de duração das penas, do sursis, do livramento condicional, da prescrição, da decadência, etc. Além disso, a contagem deve levar em conta o calendário comum (mês de 30 dias e ano de 365 dias). “CP, Art. 10 - O dia do começo inclui-se no cômputo do prazo. Contam- se os dias, os meses e os anos pelo calendário comum”. Contagem de mês e ano: são contados como períodos que compreendem um número determinado de dias, pouco importando quantos sejam os dias de cada mês. Exemplo: 6 meses a partir de abril; terminará o prazo em setembro, não importando se o mês tem 30 ou 31 dias. Os anos são contados da mesma forma, sendo irrelevantes se bissextos ou com 365 dias. Exemplo: Cinco anos a partir de janeiro de 1994 será cumprido em janeiro de 1999. Questão: o agente começa a cumprir pena às 19h27min do dia 5 de agosto de 2003. Foi condenado a 6 anos, 9 meses e 23 dias para cumprir. Calcular a data do término. Resposta: Dividir em três colunas dia, mês e ano. Em seguida, adicionar o quantum a ser cumprido. 5 DE AGOSTO DE 2003 DIA MÊS ANO 5 8 2003 1ª etapa: somam-se os anos => 2003 + 6 anos = 2009 DIA MÊS ANO 5 8 2003 + 6 ANOS = 2009 FINAL DA 1ª etapa DIA MÊS ANO 5 8 2009 2ª etapa: depois de somar o número de anos, somam-se os meses. DIA MÊS ANO 5 8 (AGOSTO DE 2009) + 9 MESES= MAIO DE 2010 2009 FINAL DA 2ª etapa DIA MÊS ANO 5 5 2010 3ª etapa: somar os dias DIA MÊS ANO 5 + 23 = 28 5 2010 FINAL DA 3ª etapa DIA MÊS ANO 28 5 2010 Dessa forma, a pena de 6 anos, 9 meses e 23 dias, cujo cumprimento começou em 5 de agosto de 2003, pela soma deve terminar em 28 de maio de 2010. NÃO ESQUEÇA, PORÉM, QUE DEPOIS DA OPERAÇÃO DEVE-SE DIMINUIR SEMPRE UM DIA, JÁ QUE, PELA REGRA, O DIA DO COMEÇO DEVE SER COMPUTADO. A pena, assim, estará cumprida em 27/05/2010. 3 - FRAÇÕES NÃO COMPUTÁVEIS DA PENA CP, “Art. 11 - Desprezam-se, nas penas privativas de liberdade e nas restritivas de direitos, as frações de dia, e, na pena de multa, as frações de cruzeiro”. Nas penas privativas de liberdade, desprezam-se as horas (fração de dia); nas penas de multa, desprezam-se os centavos. CONFLITO APARENTE DE NORMAS Às vezes, duas ou mais normas parecem regular o mesmo fato. A primeira tarefa é verificar se há hipótese de conflito intertemporal de normas, pois se existir este conflito em virtude da sucessão de normas no tempo, não há se falar em conflito aparente de normas. Conflito aparente de normas Sucessão de Lei penal no tempo Lei vigente x Lei vigente Lei revogada x Lei vigente Afastada a hipótese do conflito intertemporal, poderemos estar diante de um “conflito aparente de normas”. Diz-se aparente, porque não é verdadeiro. CONCEITO: é o conflito que se estabelece entre duas ou mais normas aparentemente aplicáveis ao mesmo fato. Há conflito porque mais de uma norma pretende regular o fato, mas é aparente, porque, com efeito, apenas uma delas acaba sendo aplicada à hipótese. ELEMENTOS: Para que se configure o conflito aparente de normas é necessária a presença de certos elementos: 1) Unidade do fato (há somente uma infração penal); 2) Pluralidade de normas (duas ou mais normas pretendendo regulá-lo); 3) Aparente aplicação de todas as normas à espécie (a incidência de todas é apenas aparente); 4) Efetiva aplicação de apenas uma delas (somente uma é aplicável, razão pela qual o conflito é aparente). Verificados os pressupostos, impõe-se a solução do conflito (aparente) para: a) assegurar a harmonia e coerência do sistema penal e, ao mesmo tempo; b) evitar a possibilidade do BIS IN IDEM, que poderia ocorrer caso duas normas (aparentemente aplicáveis) incidissem sobre o mesmo fato. SOLUÇÃO DO CONFLITO APARENTE DE NORMAS O conflito que se estabelece entre as normas é apenas aparente, porque, na realidade, somente uma delas acaba regulamentando o fato, ficando afastadas as demais. A solução dá-se pela aplicação de alguns princípios, os quais, ao mesmo tempo em que afastam as normas não incidentes, apontam aquela que realmente regulamenta o caso concreto. Esses princípios são chamados de “princípios que solucionam o conflito aparente de normas”. São TRÊS os princípios: a) ESPECIALIDADE; b) SUBSIDIARIEDADE; c) CONSUNÇÃO. 1) PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE – “LEX SPECIALIS DEROGAT LEGI GENERALI” O princípio da especialidade está previsto no artigo 12 do Código Penal. CP, “Artigo 12 - As regras gerais deste Código aplicam-se aos fatos incriminados por lei especial, se esta não dispuser de modo diverso”. Consiste na derrogação da NORMA GERAL pela NORMA ESPECIAL. A norma é especial quando acrescenta na norma geral um ou vários requisitos especializantes, que trazem um minus ou um plus de severidade. É como se tivéssemos duas caixas iguais, em que uma se diferenciasse da outra em razão de um laço, uma fita ou qualquer outro detalhe que a torne especial. Entre uma e outra, o fato se enquadra naquela que tem algo a mais. Ex.: O infanticídio (art.123), acrescenta ao Homicídio (art.121) vários requisitos especializantes: a vítima não pode ser qualquer “alguém”, mas o próprio filho da autora + o momento do crime deve ser durante o parto ou logo após + a autora deve estar sob influência do estado puerperal. Ex: O tráfico internacional de drogas (artigo 33 da Lei n° 11.343/06) se distingue do contrabando (artigo 334-A do Código Penal) porque se refere, especificamente, a um determinado tipo de mercadoria proibida, qual seja, a substância entorpecente. Em suma, tem-se um único fato, o qual na dúvida entre a norma genérica e uma com elementos especiais, opta-se pela ESPECIAL. CONSEQUÊNCIA: A LEI ESPECIAL PREVALECE SOBRE A GERAL, A QUAL DEIXA DE INCIDIR NAQUELA HIPÓTESE. Para se saber qual norma é geral e qual é especial, não é preciso analisar o fato concreto praticado, sendo suficiente que se comparem abstratamente as descrições contidas nos tipos penais. Da mera leitura das definições típicas já se sabe qual norma é especial. A norma especial não é necessariamente mais grave ou mais ampla que a geral, ela é apenas... ESPECIAL. EXEMPLO: A norma do art. 123 do Código Penal (Infanticídio) prevalece sobre a do art. 121 (Homicídio), porque possui, além dos elementos genéricos deste último, os seguintes especializantes: “próprio filho”, “durante o parto ou logo após” e “sob a influência do estado puerperal”. O infanticídio não é mais completo nem mais grave, ao contrário, é bem mais brando do que o homicídio. É, no entanto, especial em relação àquele. Na conduta de importar cocaína, aparentemente duas normas se aplicam: a do art. 334-A do Código Penal (contrabando – importar mercadoria proibida) e a do art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006 (importar drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização legal ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar). O tipo incriminador previsto na Lei de Drogas, embora bem mais grave, é especial em relação ao contrabando. Assim, a importação de qualquer mercadoria proibida configura o delito de contrabando, mas, se tal mercadoria for substância considerada como DROGA, esse elemento é especializante e afastará a incidência do art. 334-A do CP, incidindo o crime de tráfico de drogas (artigo 33 da Lei n° 11.343/06). O tipo fundamental é excluído pelo qualificado ou privilegiado, também por força do princípio da especialidade, já que os tipos derivados possuem todos os elementos do básico, mais os especializantes. Assim, o furto privilegiado e o qualificado prevalecem sobre o simples. 2º) PRINCÍPIO DA SUBSIDIARIEDADE – “LEX PRIMARIA DEROGAT LEGI SUBSIDIARIAE”: Subsidiária é aquela que descreve um grau menor de violação de um mesmo bem jurídico, isto é, um fato menos amplo e menos grave, o qual, embora definido como infração penal autônoma, encontra-se também compreendido em outro tipo como fase normal de execução do crime mais grave. Dessa forma, se for cometido o fato mais amplo, duas normas aparentemente incidirão: aquela que define esse fato e a outra que descreve apenas uma parte ou fase dele. A norma que descreve o “todo”, isto é, o fato mais abrangente, é conhecida como primária e, por força do princípio da subsidiariedade, absorverá a menos ampla, que é a norma subsidiária, justamente porque esta última cabe dentro dela. A norma primária não é especial, é mais ampla. Ex: O crime de ameaça (art. 147 do CP) cabe dentro do de constrangimento ilegal mediante ameaça (art. 146 do CP), o qual, por sua vez, cabe dentro da extorsão (CP, 158). O Crime de seqüestro (art. 148, CP) cabe dentro do de extorsão mediante seqüestro (CP, art. 159). O disparo de arma de fogo (Lei n. 10.826/03, art. 15) cabe no de homicídio cometido mediante disparo de arma de fogo (art. 121 do CP). Nos casos, há um único fato, o qual por ser maior do que a norma subsidiária, só se pode encaixar na primária. CONSEQUÊNCIA: a norma primária prevalece sobre a subsidiária, que passa a funcionar como um soldado de reserva (expressão de Nelson Hungria). Tenta-se aplicar a norma primária, e somente quando isso não se ajustar ao fato concreto, recorre-se subsidiariamente à norma menos ampla. É necessário verificar qual crime foi praticado e qual foi a intenção do agente, para só então saber qual norma incidirá. Não há elementos especializantes, mas descrição típica de fato mais abrangente e mais grave. Uma norma é mais ampla que outra, mas não necessariamente especial. É como se tivéssemos duas caixas de tamanhos diferentes, uma (a subsidiária) cabendo dentro da outra (primária). Ex: o agente efetua disparos de arma de fogo sem, no entanto, atingir a vítima. Aparentemente três normas são aplicáveis: o art. 132 do CP (periclitação da vida ou saúde de outrem); o art. 15 da Lei n. 10.826/2003 (disparo de arma de fogo); e o art. 121 c/c o art. 14, II, do CP (tentativa de homicídio). O tipo definidor da tentativa de homicídio descreve um fato mais amplo e grave, dentro do qual cabem os dois primeiros. Assim, se ficar comprovada a intenção de matar, aplica-se a norma primária, qual seja, a da tentativa de homicídio. A subsidiariedade pode ser: a) expressa ou explícita b) tácita ou implícita EXPRESSA OU EXPLÍCITA: A própria norma reconhece expressamente seu caráter subsidiário, admitindo incidir somente se não ficar caracterizado fato de maior gravidade. Exemplos: o tipo penal previsto no art. 132 do CP estabelece sua incidência “se o fato não constitui crime mais grave”; o art. 21 da Lei de Contravenções Penais prevê as vias de fato, reconhece: “... se o fato não constitui crime”. TÁCITA OU IMPLÍCITA: a norma não diz nada, mas, diante do caso concreto, verifica-se sua subsidiariedade. Exemplo: mediante emprego de violência, a vítima é constrangida a entregar a sua carteira ao autor. Incidem aparentemente o tipo definidor do roubo (norma primária) e o do constrangimento ilegal (norma subsidiária). Da mera comparação entre os tipos, sem que a lei nada diga, resulta, porém, a prevalência do art. 157 sobre o art. 146. ESPECIALIDADE X SUBSIDIARIEDADE Na especialidade, é como se tivéssemos duas caixas, cuja diferença seria algum detalhe existente em uma e não constante na outra, tal como um laço vermelho ou um papel de embrulho; na subsidiariedade há duas caixas idênticas, só que uma, menor, cabe na outra. 3) PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO – “LEX CONSUMENS DEROGAT LEGI CONSUMPTAE”: Quando uma conduta definida por uma norma incriminadora é meio necessário ou normal fase de preparação ou execução de outro crime, bem como quando constitui conduta anterior ou posterior do agente, cometida com a mesma finalidade prática atinente àquele crime. Ex.: A lesões corporais são consumidas pelo homicídio, se aquelas constituírem fase de realização deste. O crime consumado consome ou absorve o crime tentado. O dano absorve o perigo. O furto consome a violação de domicílio, etc. Na subsidiariedade, em função do fato concreto praticado, comparam-se as normas para se saber qual é a aplicável. Na consunção, sem recorrer às normas, comparam-se os fatos, verificando-seque o mais grave absorve os demais. A comparação é estabelecida entre os fatos, não entre as normas, de forma que o mais completo (o todo) prevalece sobre a parte. Não há um fato único buscando se enquadrar numa ou noutra norma, mas uma seqüência de situações diferentes no tempo e no espaço, uma sucessão de fatos, na qual o fato mais grave absorve o menor. O PEIXÃO ENGOLE O PEIXE, QUE ENGOLE O PEIXINHO, QUE ENGOLE O ALEVINO. Dessa forma, como todos vão parar na barriga do Peixão, só ele e a sua norma restarão. Não é a norma que absorve a outra, mas o fato que consome os demais, restando com que reste apenas uma norma. Por exemplo, um sujeito dirige perigosamente (direção perigosa) até provocar, dentro do mesmo contexto fático, um acidente fatal (homicídio culposo no trânsito). Neste caso, o Peixe (direção perigosa) é absorvido pelo Peixão (homicídio culposo na direção do veículo automotor). Hipóteses em que se verifica a consunção 1º) Crime progressivo; 2º)Crime complexo; 3º) Progressão criminosa (progressão criminosa em sentido estrito, fato anterior (“ante factum”) não punível e Fato posterior (“post factum”) não punível. Crime progressivo Existe um elemento subjetivo e uma pluralidade de fatos, ou seja, o crime é composto de vários atos, mas existe sempre a mesma vontade desde o início (ex.: um sujeito tem o dolo (intenção) de matar a vítima; para isso utiliza-se de um instrumento qualquer que vai causando lesões, desde as leves até as gravíssimas, até chegar à consumação do crime. Neste caso, o homicídio absorve as lesões, mesmo porque o dolo era de matar a vítima). Como se nota, há uma única ação, isto é, um único crime (um homicídio), comandado por uma única vontade (a de matar), mas constituído por vários atos, progressivamente mais graves. Aplica-se o princípio da consunção e o agente responde somente pelo crime mais grave (homicídio). São quatro os elementos do crime progressivo: a) unidade de elemento subjetivo (desde o início, há uma única vontade); b) unidade de fato (há um só crime, comandado por uma única vontade); c) pluralidade de atos (se houvesse um único ato, não haveria falar em absorção); d) progressividade na lesão ao bem jurídico (os atos violam de forma cada vez mais intensa o bem jurídico, ficando os anteriores absorvidos pelo mais grave). CONSEQUÊNCIA: o agente só responde pelo resultado mais grave, ficando absorvidas as lesões anteriores ao bem jurídico. Crime complexo Resulta da fusão de dois ou mais crimes que passam a funcionar como elementares ou circunstâncias no tipo complexo. Ex.: Extorsão mediante sequestro => Dentro do mesmo artigo (artigo 159 do CP) prevê a extorsão (artigo 158 do CP) + sequestro (artigo 148 do CP). Assim, se alguém privar outra pessoa de liberdade para exigir um resgate para libertar a vítima (extorsão + sequestro), responde pelo crime do artigo 159 do Código Penal - EXTORSÃO MEDIANTE SEQUESTRO, e não pelos crimes do artigo 158 (extorsão) e do artigo 148 (sequestro). Ex: Latrocínio=> Dentro do mesmo artigo (artigo 157, §3°, parte final, do CP) prevê o roubo (artigo 157 do CP) e o homicídio (artigo 121 do CP). Assim, se alguém, durante um roubo e em razão desse roubo empregar violência e matar a vítima (roubo + homicídio), responde pelo crime do artigo 157, §3°, parte final, do CP – LATROCÍNIO, e não pelos crimes do artigo 157 (roubo) e do artigo 121 (homicídio). CONSEQUÊNCIA: o fato complexo absorve os fatos autônomos que o integram, prevalecendo o tipo resultante da reunião daqueles. Progressão criminosa: compreende três subespécies: 1) Progressão criminosa em sentido estrito; 2) Fato anterior (“ante factum”) não punível; 3) Fato posterior (“post factum”) impunível. 1) Progressão criminosa em sentido estrito: O agente deseja inicialmente produzir um resultado e, após atingi-lo, decide prosseguir e reiniciar sua agressão produzindo uma lesão mais grave. Existe uma pluralidade de fatos e elementos subjetivos e uma progressividade na lesão, ou seja, cada fato será progressivamente mais grave que o outro. Ex.: um sujeito tem o dolo (intenção) de causar uma lesão leve na vítima; após consumado o crime, o agente decide causar lesões graves na vítima; logo em seguida, o agente decide matar a vítima consumando o crime. Neste caso, o homicídio absorve as lesões. CONSEQUÊNCIA: embora haja condutas distintas (cada sequência de atos comandada pela vontade corresponde a uma conduta, logo, para cada vontade, uma conduta), o agente só responde pelo fato final, mais grave. Os fatos anteriores ficam absorvidos. Elementos da progressão criminosa em sentido estrito: a) Pluralidade de desígnios (o agente inicialmente deseja praticar um crime e, após cometê-lo, resolve praticar outro de maior gravidade, o que demonstra existirem duas ou mais vontades); a) Pluralidade de fatos (ao contrário do crime progressivo, em que há um único fato delituoso composto de diversos atos, na progressão criminosa existe mais de um crime, correspondente a mais de uma vontade); b) Progressividade na lesão ao bem jurídico (o primeiro crime, isto é, a primeira sequência voluntária de atos, provoca uma lesão menos grave do que o último e, por essa razão, acaba por ele absorvido). 2) Antefactum não punível Sempre que um fato anterior menos grave for praticado como meio necessário para a realização de outro mais grave, ficará por este absorvido. É um fato anterior imprescindível para a execução do fato principal. Note que o fato anterior que integra a fase de preparação ou de execução somente será absorvido se for de menor gravidade (somente o peixinho é engolido pelo peixão, e não o contrário). Ex: quando uma pessoa entra no imóvel de outra para furtar objetos do local, o crime de violação de domicílio (fato anterior que configura o meio para a prática do furto - crime fim) fica absorvido, respondendo o autor apenas por furto. 3)Postfactum não punível Configura fato posterior irrelevante. O fato posterior é tomado como mero exaurimento.Exemplo: o sujeito que furta um automóvel e depois o danifica não praticará dois crimes (furto+dano), mas somente o crime de furto, sendo a destruição do objeto furtado fato posterior impunível. OBSERVAÇÃO: Há uma regra que auxilia na aplicação do princípio da consunção, segundo a qual, quando os crimes são cometidos no mesmo contexto fático, opera-se a absorção do menos grave pelo de maior gravidade. Sendo diferentes os momentos, responderá o agente por todos os crimes em concurso. Exemplo: se o sujeito é agredido em um boteco e, jurando vingança, dirige-se ao seu domicílio ali nas proximidades, arma-se e retorna ao local, logo em seguida, para matar seu algoz, não responderá pelos crimes de porte ilegal de arma de fogo, disparo de arma de fogo em concurso com homicídio doloso, já que tudo se passou na mesma cena, em um mero desdobramento de ações até o resultado final. Neste caso, o porte e o disparo integram o homicídio no seu iter criminis, de maneira que puni-los autonomamente implicaria em bis in idem, pois já foram punidos como um todo. Ao contrário, se um larápio perambula a noite toda com um revólver pelas ruas, até que, ao nascer do sol, encontra uma desafortunada vítima, a qual vem a assaltar, haverá concurso de crimes entre o porte ilegal e o roubo, dado a diversidade dos momentos consumativos e dos contextos em que os delitos foram cometidos.
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