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LEI DA LIBERDADE ECONÔMICA (LEI N. 13.874/2019) E OS SEUS PRINCIPAIS IMPACTOS PARA O DIREITO CIVIL

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CURSO DE BACHARELADO EM DIREITO
BEATRIZ BARROS GOULART
CAMILA DE MORAIS OLIVEIRA
CAROLINE DE PAULA ARCHETE
MAX WILLIAN ALVES BARBOSA
RICARDO GUIMARÃES FILHO
VICTÓRIA AMBRÓSIO CASTRO
RESENHA CRÍTICA SOBRE O ARTIGO A “LEI DA LIBERDADE ECONÔMICA” (LEI N. 13.874/2019) E OS SEUS PRINCIPAIS IMPACTOS PARA O DIREITO CIVIL 
Trabalho apresentado como requisito parcial para a disciplina de Direito Civil ministrada pela Prof. MS. Margarida Espósito na turma do 2º período – A no curso de Bacharel em Direito.
Muriaé
2019
INTRODUÇÃO
O objetivo desse trabalho consiste em realizar uma resenha crítica sobre o artigo escrito pelo renomado professor Flavio Tartuce, intitulado como: A Lei da Liberdade Econômica (lei n. 13.874/2019) e os seus principais impactos para o Direito Civil. Dividido em duas partes e sete seções (três na primeira parte e quatro na segunda) o artigo analisa a norma emergente e seus principais impactos para o Direito Privado apontando reflexões que podem ser revistas e repensadas, após novos estudos e debates que devem surgir. 
1. A VIGÊNCIA DA LEI. APLICAÇÃO IMEDIATA?
O primeiro aspecto que foi desenvolvido pelo autor foi sobre a vigência da lei, fruto da Medida Provisória (MP) de n. 881. O intuito era saber se ela possui ou não aplicação imediata. Dado os vetos presidenciais, a legislação com a finalidade de atender ao interesse público ficou sem data para entrar em vigor, assim foi preciso fazer uma interpretação e análise desse instrumento normativo para concluir que ele entrará em vigor em meados de novembro de 2019.
2. O “PROBLEMÁTICO” ART. 3º, INCISO VIII, DA MEDIDA PROVISÓRIA N. 881 E SUA CORREÇÃO NO CONGRESSO NACIONAL
Um dos mecanismos mais criticados da Medida Provisória de n. 881 foi o inciso VIII do art. 3º que segundo o autor traz que toda pessoa, seja ela natural ou jurídica constituiria direitos dispostos no artigo 170 da Constituição Federal, pois isso seria indispensável para o crescimento e desenvolvimento econômico do país. Observou-se que havia uma valorização excessiva da vontade individual onde deslocaria a possibilidade de uma alegação de normas nos negócios jurídicos, tidos como empresariais. Com isso, constava na medida provisória que o aderente não poderia fazer uso de normas de ordem pública, como foi notado em uma audiência pública efetuada no Congresso Nacional. Desse modo, se o objetivo dessa medida era de tutelar o pequeno empresário, já distanciava do real propósito, pois prevaleceria os interesses de grandes empresas. Assim, foram vinte e três as emendas propostas pelo Senador Pacheco, e sobre essa especificamente foi adotada uma solução intermediaria, que foi o art. 3, inciso VIII da lei 13.874/19. Contudo, sem trazer grandes modificações o autor acredita que ficou correta a aplicação desse princípio contratual.
3.	DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. A RETIRADA DO DOLO E A INCLUSÃO DO NOVO ART. 49-A NO CÓDIGO CIVIL
A respeito da desconsideração da personalidade jurídica, o autor aponta que foi inserido no nosso Código Civil o artigo 49-A que antes não consignava na MP 881 e que o que se relatava nele era uma ideia semelhante do art. 20 do Código Civil de 1916. Após muitos debates sobre a permanência dessa concepção no ordenamento jurídico, foi decidido que prevaleceria entre nós por sua própria acepção de pessoa jurídica como realidade técnica e orgânica. O choque prático dessa presciência é quase inexistente, afinal existe uma exceção a essa regra da autonomia da pessoa jurídica em face de seus constituintes e o mesmo pode ser assegurado no parágrafo único do art. 49, em que afirma o obvio. O que agora está calculado em lei traz uma falsa impressão de que a autonomia da pessoa jurídica frente aos seus membros não representava o que nele consta atualmente.
Ao art. 50 do Código Civil foi acrescentado cinco novos parágrafos em que trazem critérios objetivos para a ocorrência da desconsideração nas relações entre civis em prol de uma presumível segurança jurídica. Inicialmente, a lei passou a proporcionar a desconsideração da personalidade jurídica quanto ao sócio e administrador que indireto ou diretamente se beneficiar com o abuso. Um dos critérios previstos é o desvio de finalidade onde a norma passaria a firmar como requisito fundamental o elemento doloso ou intencional na execução da lesão ao direito de outrem ou de atos ilícitos, decisão que Flavio acha um retrocesso, afinal somente o dolo e não a simples culpa conceberia a configuração desse primeiro elemento. Já sobre a confusão patrimonial foram preservados os parâmetros que estavam calculado na MP.881.
O autor cita que o § 3º do art. 50 poderia ser adaptado ao art. 133, § 2º do Código de Processo Civil de 2015, mas afirma que apoia totalmente o § 4º do art. 50. Tartuce lamenta a mudança da finalidade original do § 5º e ratifica que já há motivos para aplicar o instituto do art. 50. Contudo, o texto da lei da desconsideração da personalidade jurídica é melhor que o original e com isso o parlamento tenha cumprido o seu papel na conversão do MP e melhoramento do texto. A luz dos fatos mencionados, acredito que o autor conseguiu chegar no seu objetivo principal e mostrar o quão importante e este assunto para nossa atualidade.
4.	ABRANGÊNCIA DA LEI QUANTO AOS CONTRATOS
Concernente à abrangência da nova lei, o autor aponta que não se pode negar que o seu principal âmbito de aplicação diz respeito aos contratos paritários ou negociados. Para ele, essa categoria jurídica surge quando do estudo da classificação dos contratos quanto à negociação do conteúdo pelas partes.
Nesse sentido o autor esclarece que os contratos de adesão são aqueles em que uma parte, o estipulante, impõe o conteúdo negocial, restando à outra parte, o aderente, duas opções: aceitar ou não o conteúdo desse negócio. Tartuce defende uma visualização ampla do conceito, de modo a englobar todas as figuras negociais em que as cláusulas são preestabelecidas ou predispostas de forma majoritária sem se filiar à antiga diferenciação entre contratos de adesão e por adesão sustentada, no passado, no sentido da necessidade de haver nos primeiros o monopólio de uma determinada atividade. 
Ao lado dos contratos de adesão, o autor apresenta os contratos paritários ou negociados, cujo conteúdo é discutido entre as partes, geralmente em posição econômica de igualdade, o que constitui exceção no meio social e não a regra. Para ele, não se pode negar, todavia, que muitos dos contratos celebrados entre grandes empresas assumem essa última categorização, estando sujeitos à nova Lei da Liberdade Econômica, em muitas de suas previsões. Cite-se, a título de uma primeira ilustração, o aqui antes analisado art. 3º, inc. VIII, da Lei n. 13.874/2019, dispositivo que apesar de ressaltar a importância da autonomia privada em tais negócios, releva a necessidade de observância das normas de ordem pública ou cogentes, como sempre se afirmou e se entendeu, tanto em doutrina como em jurisprudência.
5. INCLUSÕES NO ART. 113 DO CÓDIGO CIVIL A RESPEITO DA INTERPRETAÇÃO DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS EM GERAL 
O autor expressa que o art. 113 do Código Civil traz em seu conteúdo a função de interpretação da boa-fé objetiva, dirigida a todos os negócios jurídicos em geral sendo assim, os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar da sua celebração, valorizando-se a importância das regras de tráfego. 
Consoante Taturce, a respeito do último inciso do novo § 1º do art. 113 do Código Civil, valoriza-se a negociação prévia das partes, especialmente a troca de informações e de mensagens pré-negociais entre elas. Essas negociações devem ser confrontadas com as demais cláusulas do negócio pactuado, bem como com a racionalidade econômica das partes. A expressão destacada é mais uma cláusula geral, a ser preenchida pelo aplicador do Direito nos próximos anos, assim como ocorreu com a boa-fé objetiva e a função social do contrato nos últimos quinze anos de vigência da Lei Geral Privada. Para tanto, a título de exemplo, devemser considerados os comportamentos típicos das partes perante o mercado e em outras negociações similares, os riscos alocados nos negócios e as expectativas de retorno dos investimentos. 
Como última nota sobre o diploma, o autor expõe que foi inserido um § 2º no mesmo art. 113 do Código Civil, prevendo que “as partes poderão livremente pactuar regras de interpretação, de preenchimento de lacunas e de integração dos negócios jurídicos diversas daquelas previstas em lei”. Porém, em alguns casos, especialmente em negócios paritários, pode ser muito útil para a prática a inclusão de determinada regra de interpretação contratual que não contravenha disposição absoluta de lei. A título de exemplo, imagine-se uma regra que determine que uma cláusula específica prevaleça sobre uma geral, ou vice-versa.
6. DA NOVA REDAÇÃO DO ART. 421 DO CÓDIGO CIVIL 
Tartuce sempre sustentou que a redação do art. 421 do Código Civil trazia dois equívocos técnicos, que são: a menção à liberdade de contratar, relacionada com a celebração do contrato em si e que, em regra, é ilimitada, pois a pessoa celebra o contrato quando quiser e com quem quiser, salvo raríssimas exceções; e a função social desse instrumento que nunca foi e não é razão do contrato, sendo portanto necessário excluir a locução “em razão e”. Por bem, o texto do art. 421 do Código Civil foi corrigido, para que houvesse o real sentido de que a liberdade contratual, a autonomia privada, é que é limitada pela função social do contrato.
Outra questão apresentada é que apesar de defender o princípio da intervenção mínima agora previsto no art. 421, parágrafo único, o autor considera que o Estado, por meio do Poder Judiciário deve sim intervir tendo em vista os abusos contratuais são comuns no Brasil.
7. O NOVO ART. 421-A DO CÓDIGO CIVIL
O artigo é finalizado nessa seção em que o autor salienta a necessidade de analisar o conteúdo do art. 421-A do Código Civil, igualmente inserido pela Lei da Liberdade Econômica, originária da MP 881. Na última norma, os seus conteúdos estavam colocados nos arts. 480-A e 480-B, totalmente fora de contexto, pois o art. 480 trata de revisão de contratos unilaterais. A nova inserção permite deduzir que o diploma emergente traz ideias complementares a respeito da função social dos contratos. 
Conforme o caput do novo comando, “os contratos civis e empresariais presumem-se paritários e simétricos até a presença de elementos concretos que justifiquem o afastamento dessa presunção, ressalvados os regimes jurídicos previstos em leis especiais”. Quanto à diferença entre contratos civis e empresariais, sabe-se que o Código Civil de 2002 unificou o seu tratamento, não se justificando diferenciação quanto a ambos a respeito das normas jurídicas incidentes na atual realidade jurídica. No que concerne aos contratos empresariais − aqueles em que as partes figuram como empresários −, aplica-se, assim, a teoria geral dos contratos prevista na codificação material, entre os arts. 421 e 480. Sobre a necessidade de se elaborar uma teoria própria para os contratos empresariais, a propósito, está sendo debatida no Senado Federal a necessidade ou não de um novo Código Comercial tratar desse tema. 
Por tudo o que foi aqui analisado por Tartuce, nota-se que, em matéria de contratos, a Lei da Liberdade Econômica procurou valorizar a autonomia privada e resolver antigos problemas técnicos que existiam no Código Civil, o que é louvável. Todavia, não se pode dizer que a autonomia privada, a força obrigatória do contrato e a tal intervenção mínima passaram a ser princípios contratuais inafastáveis e absolutos. Por óbvio que devem eles ser ponderados e mitigados frente a outros regramentos, caso das sempre citadas função social do contrato e boa-fé objetiva. Com isso, busca-se o eventual equilíbrio contratual perdido e a vedação dos abusos e excessos negociais, tão comuns em nosso País.

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