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Curso de Introdução à Obra de Pachukanis – Com Alysson Leandro Mascaro 
 
PACHUKANIS, MARXISMO E DIREITO 
 
Aula 1: Marxismo 
https://www.youtube.com/watch?v=vv_Mr4xJNEw&list=PLHiE8QPap5vT-
4gGfjaxSzkZNcyxxQJpJ&index=1 
 
Pachukanis é um pensador central para o direito, mas em especial é também um 
pensador central do marxismo. Embora alguns cheguem a Pachukanis interessados na 
sua contribuição para o direito, está também no pensamento pachukaniano uma grande 
contribuição ao próprio marxismo, às próprias reflexões políticas, ao próprio horizonte 
do que é o capitalismo, do que é a transição ao socialismo, e enfim do que vem a ser 
uma sociedade pós capitalista, socialista e comunista. Pachukanis no começo do século 
XX nos legou uma contribuição fundamental: a partir do método de Marx, esse método 
que está desenvolvido, estabilizado, levado ao máximo na sua obra O Capital, a partir 
daí Pachukanis nos deu uma leitura fina de como transplantar categorias, de como 
transplantar métodos de Marx para o campo da política do Estado do Direito. Então, 
Pachukanis dá uma contribuição que é a melhor para o campo jurídico, mas também é 
a melhor para o campo da política e do Estado. Ele vai nos ensinar que a forma jurídica 
é de alguma maneira similar/ equivalente/ espelho/ tem um grau de derivação daquela 
que é a forma mercadoria. Marx já havia nos dito no Capital, que o segredo do 
capitalismo, aquilo que é o seu átomo, aquilo que constitui o seu núcleo mínimo é a 
mercadoria. Claro, Marx vai ensinar que esta mercadoria só é mercadoria nas 
sociedades que são capitalistas e que portanto a principal mercadoria é o trabalho do 
trabalhador, é o trabalho então que no capitalismo toma a forma assalariada. É aqui a 
grande contribuição de Pachukanis. Para que o trabalho seja mercadoria e esse trabalho 
tome forma assalariada, o trabalhador que venderá sua força de trabalho tem que ter 
uma forma social correspondente à mercadoria que será o seu trabalho e que será 
vendida no mercado. E para que ele possa vender a sua força de trabalho, este 
trabalhador toma forma de subjetividade jurídica e sujeito trabalhador não é 
simplesmente assujeitado por alguém, ele é assujeitado pelo direito, esse sujeito de 
direito é um sujeito pelo direito, e portanto, Pachukanis nos mostra que há uma íntima, 
conexa e necessária relação entre as condições da produção capitalista, essa produção 
que é permeada e tem por horizonte essa troca infinita de mercadorias e para que tudo 
isso aconteça é necessário que exista um sujeito de direito. Pachukanis está nos 
ensinando algo de central, algo de fundamental: como ler o marxismo, como entender 
inclusive metodologicamente estas categorias abstratas, como a mercadoria, e como 
então, a partir delas, nós podemos transplantar tais conceitos para o campo concreto e 
entender que formas como subjetividade jurídica, a própria forma do Estado, todas elas 
remanescem de uma base concreta, todas elas estão lastreadas numa materialidade 
que é a sociedade produtora de mercadorias e esta sociedade é a sociedade na qual o 
trabalho é explorado de modo assalariado. Por muito tempo a leitura marxista sobre a 
sociedade capitalista investiu em termos fundamentais, de grande relevo e de grande 
importância com o entendimento do trabalho como a leitura sobra a classe trabalhadora 
e a partir daí sobre a luta de classes. Se o trabalho é explorado, se o trabalho no 
capitalismo se põe de modo assalariado, esse trabalhador explorado tem que se 
levantar e sendo a maioria da sociedade, esse trabalhador por conta de embates 
políticos, por conta de estratégias revolucionárias, em algum momento este trabalhador 
em grupo, em classe, em movimento, em partido, chegará à destruição das condições 
da produção capitalista e então inaugurará um outro horizonte da sociabilidade, que 
será o socialismo. Essa leitura tradicional do marxismo é a leitura do entendimento da 
luta de classes. A luta de classes existe, existe um movimento da classe trabalhadora, a 
luta de classes tem importância fundamental historicamente e em todos os tempos do 
capitalismo para demonstrar aonde vai o horizonte da própria sociabilidade capitalista. 
Mas Pachukanis ensina algo para além: lendo Marx, lendo o capital, nós percebemos 
que o átomo do capitalismo não é a luta de classes, o átomo é a mercadoria. Portanto a 
mercadoria nas condições de produção capitalista, aí está o problema, o segredo, a 
chave para o entendimento do próprio capitalismo e a sua superação. Com isto, 
Pachukanis dá um passo para além daquele que era há um tempo o grande teórico do 
direito, Stutchka. Stutchka, que foi um pensador que fez fama na URSS que estava 
surgindo pós Revolução Soviética, ensinava que o direito advinha da luta de classes. Esta 
posição de Stutchka é marxisma e ao mesmo tempo, embora não chegue no 
fundamental, tem algo a contribuir para a nossa reflexão. Na sua obra direito e luta de 
classes, Stutchka insiste com o fato de que o direito é moldado a partir das condições 
da luta de classes. Para quem escuta e vive o momento presente do Brasil e do mundo 
sabe reconhecer que quando a classe trabalhadora está enfraquecida, quando está não 
consciente, quando não tem um horizonte de compreensão, de como é a sua situação, 
de quais são os seus horizontes de luta, a classe trabalhadora é esmagada e portanto, 
por razão de uma luta de classes posta aqui a partir da exploração e da opressão das 
classes capitalistas, a classe trabalhadora perde inclusive direitos. Nós verificamos no 
atual momento o combate aos direitos sociais, ao direito do trabalho. Stutchka nos 
revela algo fundamental: existe de fato uma certa modulação do direito que advém da 
luta de classes e, com luta de classes podemos trazer também para este mesmo 
movimento, a luta de grupos sociais. Enquanto o movimento feminista não foi forte, o 
direito não atendeu às demandas da mulher. Enquanto o movimento negro não foi 
forte, o direito era racista. E somente depois conseguiu ter alguns institutos de combate 
parcial a essa estrutura geral do próprio racismo. Nós verificamos que o direito atende 
à uma lógica, expressa o nível das contradições, das lutas, das posições das classes, dos 
grupos também, das minorias, dos movimentos sociais. Estou dizendo, com isso, que 
Stutchka nos dá uma contribuição importante. Quando a classe trabalhadora está com 
força, conscientizada, unida, engajada num processo de combate e transformação social 
o direito tende a dar conta de favorecer esses mesmos movimentos da classe 
trabalhadora. E vice-versa, a classe trabalhadora enfraquecida revela então nesse 
momento o perecimento das próprias garantias jurídicas. Mas isto não é o fundamental 
do direito. Stutchka nos dá uma contribuição importante mas ainda não chegou ao 
fundamental. A pergunta que se faz é por que na sociedade capitalista classes, grupos, 
movimentos sociais, minorias, quando pleiteiam o seu interesse o fazem mediante 
institutos jurídicos. A classe trabalhadora é a maioria da população em qualquer país do 
mundo. No entanto, por que essa classe trabalhadora não toma o poder fisicamente 
diretamente nas mãos? Isso nos revela que essa estrutura pela qual a sociabilidade 
capitalista existe é sempre uma estrutura que faz com que as pessoas estejam 
permeadas por institutos jurídicos e por institutos políticos estatais. Então o povo não 
toma o poder diretamente porque o povo crê que o poder está localizado, e de fato é 
um plexo central da vida capitalista, o povo crê que o poder esteja localizado no Estado, 
mas não entende que o Estado também tem uma estruturação a partir das próprias 
relações do capitalismo. Então as pessoas dissociam capitalismo e estado e costumam 
quase sempre xingar o Estado e nunca põem em xeque, nunca põem em risco, a vida 
econômica e a exploração econômicado capitalismo. Nós dizemos “o governante é 
corrupto, tal líder político nos traiu, há muito problema no Estado”... nós sabemos xingar 
o Estado e quase nunca as pessoas sabem xingar o capitalismo. Nós temos, no entanto, 
uma coerção do Estado do direito na vida das pessoas. A forma jurídica e essa forma 
política estatal se impõem necessariamente no capitalismo, de tal modo que então 
quando a massa da classe trabalhadora busca lutar por melhores condições de vida ela 
não busca lutar para transformar o capitalismo e tomar esse poder econômico nas mãos, 
ela busca mais direitos, ela busca aqui no caso do Brasil, a CLT, a consolidação das leis 
do trabalho, portanto, busca ter o direito a hora extra, a 13º salário, a fazer greve, sem 
que esta greve não seja alijada da sua conta de possibilidades, isto porque o direito 
garante esta mesma possibilidade de greve. Estou dizendo com isto, que nós temos uma 
tradição de ler o direito a partir da luta de classes, como foi em Stutchka, mas é 
insuficiente pensar isto, porque o direito tem uma forma necessária que se impõe a 
partir das condições do capitalismo. E toda vez que a classe trabalhadora luta por mais 
direitos, então essa classe trabalhadora está lutando pelas mesmas estruturações do 
capitalismo. Com mais ou menos direitos é óbvio que com isto a classe trabalhadora viva 
melhor ou viva pior. E isso é a diferença que faz com que a alguém possa educar os seus 
filhos em escola pública, estando doente ir ao hospital e receber um remédio... Há uma 
diferença, é claro, que a luta de classes postula e consegue dar dentro do direito. Mas 
no fundamental o direito é um instrumento no qual o capital é do capitalista e ao 
trabalhador só resta vender a sua força de trabalho. Por causa disso Pachukanis é 
fundamental. Ele nos ensina para além de Stutchka, que o direito é modulado pela luta 
de classes, é verdade, ele atende mais ao interesse do capital ou mais ao interesse do 
trabalhador quando a luta de classes está pendente mais para um lado do que para o 
outro, mas no fundamental o direito é forma do capital e portanto não há mais direitos 
como chegada ao socialismo. Se nós pensarmos numa sociedade para além da 
exploração capitalista, nós devemos pensar nesse momento, numa sociedade que 
passou para além também da própria forma jurídica. Se a forma jurídica é espelho 
também da própria forma mercadoria numa sociedade aonde as pessoas se põem como 
exploradas mediante um trabalho assalariado, então sair da exploração do trabalho 
assalariado é sair necessariamente da forma jurídica. O que Pachukanis tem de 
fundamental para o marxismo? Nós, que temos como tendência observar diretamente 
a luta de classes, grupos, minorias, movimentos sociais, mas nos esquecemos das 
formas que estruturam essa mesma sociabilidade, com Pachukanis somos obrigados a 
pensar então que para além dessa luta imediata por mais direitos e contra retrocessos 
de direitos nós temos que pensar na superação total dessa sociabilidade dos direitos. 
Porque tudo o que está no mundo é de todos, deve ser de toda a classe trabalhadora, 
de todos os grupos e minorias e este compartilhar não é por direito, porque por direito 
somos obrigados a respeitar o capital do capitalista. Este compartilhar é por uma outra 
forma de sociabilização e de vida econômica que permite então que toda a classe 
trabalhadora seja diretamente responsável pela sua vida e pela distribuição das riquezas 
da sociedade. 
 
Aula 2: Pachukanis e o direito 
https://www.youtube.com/watch?v=_d0CO0opyTE&list=PLHiE8QPap5vT-
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Pachukanis é um pensador fundamental. E não só para quem é do direito. Mas também 
para todo aquele que estuda o marxismo e se preocupa com as condições da sociedade 
capitalista e com as possibilidades de transformação desta mesma sociedade. Para o 
campo do direito, Pachukanis é um pensador brilhante. Nós temos uma tradição do 
mundo jurídico em reconhecer importância teórica a autores como Hans Kelsen. Kelsen 
identificou na norma jurídica o fundamento do direito. Isto fez fama, isto fez sucesso e 
hoje por todo o mundo praticamente a maioria dos juristas e dos pensadores do direito 
imagina que o direito é um conjunto de normas jurídicas porque esta é a definição, 
dentre outros, de Hans Kelsen no seu livro Teoria Pura do Direito. No entanto, alguns 
pensadores do direito foram mais além e desvendaram certas contribuições, certas 
questões, certos entendimentos do direito que a maioria não tem. Eu dou o exemplo 
constantemente naquilo que eu chamo de não jurispositivismo de um pensador como 
Karl Schmidt, que nos desvendou que para além da norma jurídica, existe o poder. A 
norma diz que todos são iguais, e o poder desempata mostrando que esses iguais no 
final das contas são aqueles que a decisão jurídica e que a decisão do poder revelam ser 
os iguais ou diferentes. Michel Foucault também nesse ponto do não jurispositivismo é 
um pensador que nos revela que para além da norma jurídica existe a microfísica do 
poder. Mas há ainda um ponto muito mais alto do que este dos pensadores não 
jurispositivistas. Aí nesse ponto que eu chamo em minhas obras de visão crítica do 
direito, mas em especial essa é a visão do marxismo, neste ponto temos a grande 
descoberta, esta que é a mais importante de todo o contributo para a ciência do direito, 
nós temos a descoberta de Pachukanis de que a forma do direito equivale à forma da 
mercadoria. Esta relação intrínseca, necessária, específica, entre direito e mercadoria, 
que não é uma relação tão simples como se pode pensar num primeiro momento, ela é 
complexa, é entremeada, tem uma estrutura muito profunda que lhe dá base. 
Pachukanis quando descobre tudo isso nos ensina algo de fundamental: o direito não é 
reduzido à norma jurídica e o direito também não é apenas um fenômeno do poder, o 
direito é um fenômeno enraizado nas relações sociais capitalistas. É na produção, é na 
exploração dos homens pelos homens, é no modo pelo qual um ser humano explora um 
trabalho alheio, é exatamente aí que está o segredo do direito. Portanto não há um 
campo do direito que esteja eminentemente posto num nível da norma e que nós 
pudéssemos dizer “vou transformar essa norma em outra norma que seja boa”. 
Pachukanis nos mostrou que a questão é muito mais alta. O direito não está reduzido a 
norma. O direito está posto a partir das estruturas da sociabilidade capitalista. Então a 
resolução das nossas questões, dos nossos problemas, das nossas dores e dos nossos 
sofrimentos sobre coisas como injustiça, sobre parcialidade, sobre ter ou não ter, passar 
fome, não ter casa, não ter dignidade, não ter condição mínima para o trabalho, tudo 
isso não se resolve com normas melhores, tudo isso não se resolve com reformas no 
arcabouço institucional. Pachukanis nos ensina verdadeiramente que o horizonte da 
transformação das ditas injustiças humanas, dos sofrimentos, das indignidades e da 
exploração, a transformação de tudo isto está na base material econômica concreta 
produtiva de onde então o direito é uma de suas formas derivadas. Ou seja, o problema 
do mundo está na exploração, no capital, na mercadoria e Pachukanis é quem nos 
mostrou este mais alto horizonte e portanto também nos deu o mais alto encargo para 
transformarmos a sociedade. 
 
 
Aula 3: Fundamentos do pensamento pachukaniano 
https://www.youtube.com/watch?v=ZkuWrmma8jc&list=PLHiE8QPap5vT-
4gGfjaxSzkZNcyxxQJpJ&index=3 
 
Pachukanis descobre que o fundamento da sociabilidade capitalista está na mercadoria, 
no trabalho que se tornou mercadoria. Esse trabalho é assalariado. Essa sociabilidade 
então é orientada pelo capital para o acúmulo de capitais e o capitalista extrai do 
trabalhador assalariado o mais valor. Quando Pachukanis observa este que é o núcleo 
da armação da sociabilidade do capital e que Marx desenvolve no Capital, Pachukanis 
começa a pensar quais sãoos elementos jurídicos que estão envolvidos nesse plexo 
central da própria vida capitalista. Para que haja o capitalista e o trabalhador assalariado 
e para que este último possa se vender ao primeiro, é preciso que haja um mecanismo 
diferente daquele que foi o da escravidão ou daquele que foi o do feudalismo. Nessas 
sociedades, nesses modos de produção anteriores àqueles da sociedade capitalista nós 
temos um trabalho compulsório, feito a partir de uma certa junção, a partir de uma certa 
imposição, que advém no caso da escravidão da força. Portanto alguém trabalha para 
alguém porque este senhor possui a força suficiente para jungir o trabalhador 
escravizado às condições desse mesmo trabalho. O mesmo no feudalismo, com outra 
razão e outra perspectiva, mas o feudalismo também faz aqui uma espécie de vinculação 
compulsória e o trabalhador servil, o vassalo, se põe numa relação aqui de uma 
submissão direta às vontades, aos caprichos e às condições daquele que é o senhor 
feudal. No capitalismo não se dá nenhuma forma de exploração como aquela do 
escravagismo ou aquela do feudalismo. O que nós temos do capitalismo é uma forma 
pela qual o trabalhador então se colocando sob as condições do capitalista assim o faz 
mediante vínculos jurídicos, mediante vínculos contratuais. Por esta razão, não é a força 
que impõe o capital perante a classe trabalhadora, muito pelo contrário, os vínculos 
neste átomo que é a relação entre capitalista e trabalhador são vínculos jurídicos. Os 
trabalhadores assalariados vendem a sua força de trabalho ao capital. Não são levados 
à força para o trabalho. Isto faz com que nós tenhamos uma natureza jurídica necessária 
do capitalismo. O direito não é um acessório do capitalismo, é um dos seus elementos 
centrais, porque só com o direito é possível a venda do trabalho do trabalhador para o 
próprio capitalista. Que que se revela nesse momento que Pachukanis então com sua 
compreensão genial descobre este elemento central do capitalismo a partir de Marx no 
livro O Capital? Nós temos entre o trabalhador assalariado e entre o capitalista, uma 
relação que faz com que estes dois sujeitos sejam presumidos na hora deste vínculo 
contratual como equivalentes. O trabalhador e o capitalista passam a ser neste 
momento iguais. E por que são iguais? Esta igualdade advém de algo mais profundo. A 
verdade da equivalência está na mercadoria. Tudo se troca por tudo e tudo de todos se 
troca por tudo de todos. Essa equivalência só é possível no capitalismo quando então se 
troca produto fabril por dinheiro, se troca produto agrícola por dinheiro, se troca serviço 
por dinheiro e neste movimento geral se dá então esta equivalência de tudo com tudo 
e isto revela uma sociabilidade da mercadoria. O capital não está aqui lastreado no seu 
valor de uso, mas ele está lastreado no valor de troca. Portanto, esta equivalência geral 
é o que permite fazer com que em toda a sociabilidade do capital nós possamos 
estabelecer cálculo, quantidade, algo que se veja de indistinto, geral e comum a todas 
as coisas e também a todas as pessoas. Neste resultado, na sociedade da equivalência, 
nós temos então um instrumento que faz com que os sujeitos que portam as 
mercadorias e que vendem mercadorias e forças de trabalho sejam também de alguma 
maneira tornados equivalentes uns aos outros. Esta é a igualdade jurídica. Capitalista e 
trabalhador assalariado tornam-se então iguais perante o direito. E essa igualdade 
jurídica permite o estabelecimento de um contrato. Nós rompemos com o capitalismo 
as diferenças das sociedades antigas. A sociedade feudal e o resquício do feudalismo, 
que é o Absolutismo que adentrou a Idade Moderna, que no caso da França só foi acabar 
a partir da Revolução Francesa (virada do século XVIII para o XIX). Estas sociedades 
anteriores são sociedades estamentais. Então as pessoas por lá pertencem a estamentos 
e possuem um status quo diferente, o nobre e o clero têm privilégios que o povo não 
tem. A classe burguesa, justamente porque pertencia ao estamento do povo e não 
possuía privilégios e não tinha então os poderes estamentais do privilégio, a classe 
burguesa movimenta a história europeia e a história das sociedades capitalistas da Idade 
Moderna para fazer com que a noção estamental acabe e para dar então a igualdade 
jurídica a todas as pessoas. Este é um reflexo necessário do movimento da equivalência. 
Da exploração de uma pessoa por outra mediante um instrumento que faz com que o 
vínculo seja contratual e que faz com que o trabalho seja mercadoria. Temos em 
Pachukanis a descoberta central de que para que haja esta equivalência de tudo com 
tudo é preciso que haja pessoas que sejam consideradas iguais e estas pessoas iguais 
também tem que ser livres para a disposição de sua vontade. Na escravidão o escravo 
não fazia livremente o que queria. Mas no capitalismo, aí surge este artifício, esta 
instrumentalidade, que é real e ao mesmo tempo é irônica nos termos em que se 
apresenta, surge a liberdade. As pessoas são livres para trabalharem para quem bem 
quiserem e os capitalistas são livres para contratarem quem bem quiserem também, 
diferente do feudalismo, cuja vassalagem fazia um vínculo muito direto, muito 
específico, muito próprio de uma imediatitude, diferente também da escravidão, com a 
força jungindo pessoas a outras, no capitalismo, o artifício que une uma pessoa a outra 
é um artifício jurídico, é a liberdade, é aquilo que nos termos do direito nós chamamos 
por autonomia da vontade. Então o trabalhador por livre manifestação de sua vontade 
deseja e declara vender a sua força de trabalho ao capitalista e em troca o capitalista diz 
que pagará X de dinheiro para aquele que é o trabalhador. Essa estrutura que temos no 
capitalismo, esta vinculação que temos na sociabilidade capitalista, presume que a 
liberdade seja dada a partir de uma vontade livre. É livre então há liberdade, há 
autonomia para jungir vínculos que o capitalismo tem e os modos pré-capitalistas de 
produção não tinham. Isso nos revela então o paraíso daquilo que é o direito no 
capitalismo. O direito só pode se estabelecer com sujeitos que sejam iguais entre si e 
livres. Pachukanis percebe a partir daí então que para que o capital possa explorar o 
trabalho é necessário que nós construamos, é necessário que surja uma categoria 
central do capitalismo que é a categoria do sujeito de direito. Aquele que está 
submetido, na escravidão e no feudalismo estava submetido por razões de força, 
tradição, posse direta dos meios de produção nas mãos de outro, era só um sujeito, 
sujeito pela força, sujeito pela impossibilidade de outros meios. No capitalismo além de 
tudo isto nós temos um outro aspecto e este é o central: alguém está sujeito por outra 
pessoa mediante instrumentos jurídicos. É o que nós chamamos no direito de sujeito de 
direito, mas que eu insisto muito inclusive em meus livros, que nós deveríamos até 
pensar em chamar de sujeito pelo direito, é o direito que faz a possibilidade de 
submissão de um pelo outro. Este sujeito que até então era um sujeito jungido pela 
força passa a ser um sujeito que será jungido na sua exploração do trabalho por vínculos 
contratuais, então a sua subjetividade passa a ter uma forma social de vínculo com 
outras subjetividades mediante uma instrumentação e mediante uma certa relação que 
é jurídica. Eis o sujeito de direito e eis a forma de subjetividade jurídica: todos e todas 
no capitalismo tomam forma de subjetividade jurídica, de tal modo que hoje no mundo 
todos os seres humanos vendem ou compram seu trabalho, ou vendem ou compram o 
trabalho alheio, todas as pessoas o que têm têm por direito, e se tomam do outro que 
não seja por instrumento jurídico cometem crimes, vão presas, essas pessoas então 
estão vinculadas a um mundo no qual a sua subjetividade só pode agir mediante balizas, 
modulações, construções jurídicas. Então alguém tem 500casas e outro não tem 
nenhuma porque essas 500 por direito são dele e do outro por direito não tem nada 
registrado no seu nome. O direito faz com que os sujeitos então balizem sua vida e dêm 
a dimensão do que fazem, se exploram o trabalho alheio ou se são explorados, todos 
esses movimentos dos sujeitos são dados pelo próprio direito. Conclusão descoberta 
genial de Pachukanis: o que estrutura o direito na sociabilidade capitalista é esta própria 
vida que vem a partir da produção, que vem a partir dos mecanismos pelos quais o 
trabalho se junge ao capital diante vínculo contratual e por causa disso então o direito 
é instrumento fundamental, o direito é uma forma necessária. E até aqui, nós vamos 
entender, não está passando norma jurídica, não está passando instituição judiciária. 
Nós estamos chegando no nervo, no centro do que vem a ser a sociabilidade capitalista. 
O direito é estrutura fundamental e necessária do capital exatamente porque naquele 
nível da produção, no nível da relação e interação entre pessoas aí é necessário que as 
pessoas tomem forma social de subjetividade jurídica. Não é a norma que fez alguém 
ser sujeito de direito. O que fez a união de uma pessoa com a outra no capitalismo é 
exatamente o vínculo concreto, material, este vínculo econômico que faz com que 
alguém só se venda a alguém mediante o instituto jurídico, mediante o artifício da 
igualdade jurídica, da liberdade, da autonomia, da vontade. Então o direito no 
capitalismo é estrutural exatamente porque neste momento nesta circunstância não foi 
uma norma que fez o sujeito de direito, foi a vida concreta que erigiu, que fez levantar 
pessoas que são submetidas a outras mediante vínculos, mediante mecanismos que são 
jurídicos. 
 
 
 
 
Aula 4: Capitalismo e direito 
https://www.youtube.com/watch?v=t_ImAihWAuI&list=PLHiE8QPap5vT-
4gGfjaxSzkZNcyxxQJpJ&index=4 
 
Pachukanis desenvolve uma teoria sobre o direito que pressupõe uma leitura marxista 
sobre a sociedade. Pachukanis não está dizendo que quando há circulação mercantil, 
então há direito. É muito mais profundo e sofisticado aquele horizonte pelo qual 
Pachukanis identifica o direito com o capitalismo. Só há direito quando a mercadoria se 
torna plena. E isto quer dizer nas palavras de Marx em O Capital que somente quando o 
trabalho se torna mercadoria é que temos a mercadoria plenificada. Em sociedades pré-
capitalistas nós temos a peculiaridade de que a mercadoria existe, mas ela é incidental, 
ela é parcial, ela não fecha todos os circuitos nem se impõe como necessária a todas as 
relações sociais. Um senhor de escravo podia trocar mercadoria com outro senhor de 
escravo, mas o fundamental daquilo que estrutura a produção antiga é a escravidão que 
cada senhor de escravo impõe àqueles que são os seus escravizados. Esta é a forma 
antiga a qual na mercadoria é incidental. No capitalismo a mercadoria é plena e não é 
simplesmente pelo aumento quantitativo, é porque no capitalismo não basta 
simplesmente comprar tudo, como mercadoria, nem vender tudo sob a mesma forma. 
É que fundamentalmente o trabalho do trabalhador se torna mercadoria. Então 
Pachukanis está fazendo aqui um lastro de pensamento, não é na circulação simples, 
não é na própria mercantilização em termos insignes. O que Pachukanis está fazendo 
em sua obra é lastrear a mercadoria no mundo da produção. Entre nós aqui no Brasil, 
despontando inclusive no mundo, quem aponta para está que é a leitura correta e é a 
leitura profunda de Pachukanis é o professor Márcio Bilharinho Naves (Livro: Marxismo 
e Direito. Um Estudo sobre Pachukanis). O professor Marcio Naves revela em suas obras 
que quando lemos o Pachukanis a circulação não cabe ao próprio Pachukanis a pecha 
de circulacionista, Pachukanis está aqui pensando na mercadoria nos termos da 
produção. Então a obra do professor Marcio resgata uma leitura Pachukaniana que por 
muito tempo ou foi esquecida ou foi lida de modo errôneo e, portanto, a partir daí 
advém uma reflexão fundamental a nós. Nesta reflexão nós temos uma compreensão 
sofisticada dos mecanismos do capital e, portanto, Pachukanis faz aqui não 
simplesmente uma extração jurídica de problemas e de implicações jurídicas, 
Pachukanis nos dá uma dimensão de leitura da obra de Marx em O Capital, que é uma 
leitura sofisticada. Muitos fizeram isto no campo da economia, no campo da filosofia, 
no campo das ciências sociais, uma leitura fina de que a mercadoria só há quando há a 
produção, mas foi Pachukanis quem fez isso para o campo do direito e temos no Brasil 
o professor Marcio Naves reafirmando e dando as balizas e os contornos de como se dá 
essa relação entre forma jurídica e a própria produção capitalista. 
 
Aula 5: Pachukanis e a política 
https://www.youtube.com/watch?v=4B_Tl4n5zxM&list=PLHiE8QPap5vT-
4gGfjaxSzkZNcyxxQJpJ&index=5 
 
Pachukanis é um pensador central para o campo da política. Seu pensamento jurídico 
tem largas implicações para o modelo a partir do qual as lutas socialistas se impõem na 
história dos séculos presentes que são os séculos do capitalismo. Para Pachukanis o 
direito é a forma necessária do capital. A subjetividade jurídica, portanto, é um 
elemento que se põe como estrutura da própria exploração do trabalho assalariado. O 
mundo mercantil produtivo capitalista é necessariamente o mundo de forma jurídica, 
de forma de subjetividade jurídica. O que se conclui daí então? Pachukanis faz uma 
descoberta que a maior parte dos pensadores e lutadores de esquerda não conseguiu 
ver e que mesmo no marxismo muitos não apontaram para este ponto central. 
Pachukanis descobre que as lutas de transformação social não são jurídicas nem 
tampouco estatais. Isto nos revela que não é aumento de direitos que nos faz sair do 
capitalismo e chegar ao socialismo. O aumento de direitos é uma modalidade possível 
dentro do capitalismo. O bem estar social, o desenvolvimentismo, a eventual 
distribuição de terras e a reforma agrária, tudo isto se põe como elemento do 
capitalismo, como um certo manejo do capitalismo. Em meus livros, como Introdução 
ao Estudo do Direito, eu revelo que isto é uma mudança de quantidade do direito e não 
de qualidade. A qualidade jurídica, que é esta qualidade de fazer com que tudo seja 
possuído, apropriado juridicamente e que todas as pessoas sejam igualadas para a 
exploração e se tornem sujeitos de direito, essa é a qualidade de direito que fica de pé, 
em qualquer mudança do capitalismo sempre há a qualidade jurídica. O que muda de 
um capitalismo neoliberal para um capitalismo de bem estar social e vice-versa são as 
quantidades de direito, maior proteção jurídica do trabalhador, proteção das minorias, 
fim das proteções a minorias e trabalhadores. Essa é a história interna do direito no 
capitalismo. Pachukanis nos revela algo notável: para sair do capitalismo não se sai daí 
com as formas que estruturam o próprio capitalismo. Então o socialismo nem é a 
redistribuição das mercadorias nem é uma nova forma de organização da vida entre 
patrões e empregados, nem é um pouco de melhoria ou muito de melhoria para o 
trabalho assalariado. O socialismo é o fim do trabalho assalariado, é o fim da exploração 
do trabalhador pelo capitalista, é o fim do capital, e o fim da mercadoria. Isto que dói 
muito nas pessoas. E este horizonte que é tão difícil de ver, porque no dia a dia, nas lutas 
cotidianas nós estamos muito jungidos àquilo que é o imediato: não acabar com a CLT, 
não deixar haver um golpe parlamentar, lutar contra a parcialidade ou imparcialidade 
de alguém que está no poder judiciário. Quem está nesse nível de luta não se lembra 
muitas vezes de que a transformação da sociabilidade capitalista é o fim das formas do 
capitalismo. E Pachukanis então ao demonstrar que o fim do capitalismo, a superação 
do capitalismo é o perecimento da mercadoria, é o perecimento da lógica do capital e 
da exploração do trabalho dealguém por outro alguém, que é o capitalista, quando nós 
nos vislumbramos nesse horizonte, então a superação do capitalismo e a chegada numa 
sociedade pós capitalista socialista será também o fim do direito. O fim da forma 
jurídica. Não é com o direito que se chega ao socialismo. E isto já Engels e Kautsky já 
tinham anunciado num livro chamado O Socialismo Jurídico. Já por lá anunciavam que 
aquele que aposta na chegada ao socialismo mediante direitos está fazendo um 
reformismo capitalista. Tanto para o campo do direito quanto para o campo da política 
Pachukanis insiste no fato de que é impossível manejarmos quantidades ou formas de 
engendramento do Estado do Direito como se isso fosse a antessala do socialismo. O 
Estado é uma forma do capitalismo. Eu tenho insitido muito no livro Estado e Forma 
Política de que só se pode pensar o Estado como forma necessária, como forma 
específica de um terceiro na relação entre o capital e o trabalho. Para que haja essa 
exploração é preciso que um mundo de organização política se dê a partir de uma forma 
estatal. Portanto não é o burguês que domina diretamente a sociedade num nível 
político, se dominasse politicamente além de economicamente essa sociedade seria 
escravista ou seria feudal. No capitalismo há um terceiro. Além da exploração das 
massas trabalhadoras e despossuídas pelos capitalistas, há uma organização política 
terceira que é estatal. Isso desenvolvo em Estado e Forma Política a partir desse 
horizonte marxista que é o Capital e é também o pachukaniano. Pachukanis nos insiste 
com o fato de que a transformação para o socialismo não se faz simplesmente tomando 
o Estado nas mãos. Não é aqui Pachukanis o leitor de um Estado neutro, indiferente, ou 
a disposição dos grupos. Isto quem faz são aqueles que imaginam que o Estado se 
reveste das características de quem o domina. Muita gente imagina “com a luta de 
classes dos trabalhadores e dos despossuídos nós chegaremos a um momento em que 
esse estado será dominado pelos trabalhadores e então o Estado será socialista, será 
dos trabalhadores e isso levará ao socialismo”. A grande proposição do Pachukanis é 
que não. A forma do Estado, como advém desta estrutura da mercadoria, como faz com 
que esta subjetividade política seja subjetividade de pessoas iguais que se respeitam em 
espaços públicos, isto quer dizer, cidadania. A cidadania é forma do capital. De tal modo 
que quando alguém é cidadão e exerce o seu direito perante o Estado ele vota. Então a 
cada 4 anos nós escolhemos quem nos governa de modo representativo e esta seria a 
forma por excelência dessa vinculação capitalista. Isto nos mostra que o povo não tem 
o poder nas mãos. Isto nos mostra que a noção de que todo o poder emana do povo e 
que vivemos numa sociedade democrática tudo isso está exatamente algo que nos põe 
a votar, a ter representantes, mas este é o movimento pelo qual politicamente o capital 
se garante por meio destes institutos e aparatos e aparelhos que levam a sociedade a 
transferir para um poder político terceiro aquilo que podia fazer essa mesma sociedade 
como uma gestão direta, como uma autogestão, como um controle direto das suas 
condições políticas, econômicas e sociais. Que Pachukanis tem nos ensinado então? Nos 
ensina que não há alternativa de socialismo jurídico. Que toda tentativa de mudar as 
quantidades de direito são tentativas que mantêm a sociedade capitalista nos seus 
próprios quadrantes, e claro, não vamos desconhecer a diferença que há entre um 
capitalismo fascista, nazista e um capitalismo de bem estar social, ou entre um 
capitalismo de total desregulação econômica ou um capitalismo então que possa dar 
uma indução ao desenvolvimento. Mas todo esse quadro, por mais diferentes que sejam 
as possibilidades de vida, todo este quadro é capitalista e todo este quadro é de 
exploração. Para superarmos o capitalismo é preciso vencer esta etapa jurídica. É 
preciso acabar com a forma jurídica porque a forma jurídica é que faz com que alguém 
tenha uma casa e alguém não tenha porque o direito garante a casa do um e não garante 
a casa do outro. Portanto, para fazer um mundo de iguais plenos, para fazer um mundo 
no qual esta solidariedade socialista possa reinar é preciso acabar com esta ideia de que 
a riqueza do mundo seja por direito de uns e não dos outros. A riqueza tem que ser de 
todos e esta gestão socialista do mundo, esta construção de que todos venham a se 
governar tem que passar para além deste momento de uma subjetividade jurídica de 
homens que se relacionam com homens simplesmente jungidos por mecanismos 
mediante institutos que são jurídicos. Quais são as novidades belas de Pachukanis? O 
socialismo é para além do direito e o socialismo é para além do Estado. Portanto, neste 
momento, Pachukanis aponta algo de notável, tão notável que Pachukanis pagou com a 
vida esta leitura de mundo, porque no tempo de Stalin a URSS se imaginava um estado 
socialista, com um direito socialista proclamado numa constituição soviética dita 
socialista e portanto a leitura stalinista do mundo ensinava que nós chegaríamos ao 
socialismo mediante ganhos em quantidades de direitos. Pachukanis exatamente por 
ensinar que não é por este caminho, que não é por este horizonte que se faz a luta de 
transformação, Pachukanis pagou com a vida este seu pensamento tão iluminado, tão 
importante e tão aberto nas questões que revelam as estratégias políticas do tempo do 
capitalismo. Até hoje muitos no mundo imaginam que ganhando direitos, que ganhando 
eleições nós faremos sociedades melhores. Por todo o mundo o ganhar eleições revela 
o impasse e revela os limites dessas apostas reformistas. O Brasil historicamente revela 
nos tempos presentes isso, a constituição de 1988 que pareceu menos pior do que as 
anteriores nem ela se aguenta se não são as condições de luta, se não são as condições 
concretas, políticas, em especial as econômicas que venham a dar diretriz ou direções a 
tudo isto. Isto nos revela que não são institutos jurídicos que em ganho quantitativo 
chegam a cavalgar olimpicamente para o socialismo. As formas da sociabilidade 
capitalista não levam ao socialismo, senão seria o equivalente a cair em um poço e 
tentar puxar o cabelo para ver se sai do poço {AS AVENTURAS DE KARL MARX E O BARÃO 
DE MÜNCHHAUSEN – MICHEL LOWŸ}, ou seja, o que constitui o capitalismo não é forma 
social suficiente nem minimamente necessária para fazermos a saída do capitalismo e a 
chegada no socialismo. Pachukanis nos ensina então que direito enquanto forma de 
subjetividade jurídica o direito é específico do capitalismo, ele não serve como guia nem 
como antessala, nem como condutor ao socialismo. E a forma política estatal também 
é específica do capitalismo, ela não nos possibilita aqui um caminho de chegada a uma 
sociabilidade pós capitalista. Essa especificidade, que é tanto em face do passado, o 
passado não teve forma de subjetividade jurídica, nem de forma política estatal, é 
também contra o futuro, o futuro aqui nos revela que o socialismo não pode ser 
construído mediante manipulações ou mediante distribuições jurídicas nem tampouco 
políticas. Pachukanis revela que o socialismo não será jurídico nem será político-estatal. 
Não é uma nova distribuição de direitos nem uma nova distribuição de riquezas dentro 
do campo do capitalismo. Não é reforma agrária, não é uma nova organização do solo 
urbano, não é uma nova participação dos trabalhadores na fábrica ainda mantendo a 
condição de exploração do capitalista perante o trabalhador. O socialismo será o fim de 
todas estas formas que jungem os homens a outros homens e portanto será a 
construção do novo. Por que Pachukanis é altamente especial? Porque nos obriga a 
pensar não nos termos da nossa sociabilidade, mas nos obriga a pensar na fronteira de 
uma sociabilidade que até hoje nós nunca ainda vivemos. 
 
Aula 6: Leituras de Pachukanis 
https://www.youtube.com/watch?v=V8B9bH-IK-E&list=PLHiE8QPap5vT-4gGfjaxSzkZNcyxxQJpJ&index=6 
 
Ler Pachukanis é fundamental para pensarmos um outro modelo de entendimento das 
lutas jurídicas no capitalismo. Pachukanis nos revela que o nervo, que o centro, que o 
núcleo do direito no capitalismo não é a norma jurídica. A norma jurídica e certas 
normatividades, ainda que não jurídicas existiram em muitos tempos, muitas 
sociedades, muitos modos de produção. Já no Mundo Antigo nós temos 10 
mandamentos, 12 tábuas, código de Manu, código de Amurad, todos legislações. Ser do 
direito não equivale ser da norma jurídica. Nos termos do capitalismo ser jurídico 
equivale a portar subjetividade jurídica. Então a descoberta central de Pachukanis não 
está no nível das instituições normativas, está no nível daquilo que é a própria 
materialidade das vinculações econômicas e sociais. Isto nos dá a dimensão de que não 
se transforma o mundo mediante mudança normativa, nem se transforma o mundo 
mediante mudanças no nível do Estado, tripartindo poderes ou reunindo poderes... não 
é isto o fundamental. Nos revela então essa visão pachukaniana um certo horizonte 
maior que nos faz entender que o campo de um jurista normativo ainda é o campo 
daquele que está lidando com aquilo que não é central. Se nós não pensarmos na luta 
dos trabalhadores e, mais que isto, no fim da sociedade da mercadoria, da exploração 
do trabalho assalariado, nós sequer tangenciamos o central daquilo que é o problema 
jurídico. Digo isto porque de fato há instituições normativas, de fato há instituições do 
Estado, o Estado é forma necessária da nossa vida capitalista, mas a relação entre Estado 
e Direito não é uma relação entre iguais que se sobrepõem totalmente porque um é o 
outro. Embora haja uma sobreposição (que não é total, é quase total) essa sobreposição 
se dá em duas formas distintas derivadas ambas de uma forma basilar. Nós temos a 
forma mercadoria, que estrutura a sociabilidade do capital. Para que haja a forma 
mercadoria é preciso que haja uma forma jurídica, forma de subjetividade jurídica, e é 
preciso que haja também uma forma político-estatal. No meu livro Estado e Forma 
Política, eu tenho insistido muito com essa dimensão de duas formas insignes derivadas 
ambas de uma forma matriz, que é a forma mercadoria. A relação entre Estado e Direito 
no capitalismo é uma relação de duas formas derivadas, é uma relação que existe entre 
ambos, o Estado tenta dar baliza para a vida jurídica concreta material e o direito por 
sua vez é baliza do próprio Estado, mas isto que há entre direito e estado eu chamo de 
co-formação/ conformação ou também uso a expressão derivação secundária, 
derivação de segundo grau, com o sentido de menos importante. O fundamental é que 
a forma política Estatal e a forma jurídica derivam primariamente e primeiramente da 
forma mercantil. Relacionam-se entre si e esta relação secundária faz aqui um plexo 
entre direito e estado. Este plexo, volto a dizer, tem uma matriz. Este plexo é 
materialmente jungido, dado, erigido, a partir das condições da produção capitalista. 
Isto nos dá a dimensão de que o direito não vem do Estado, nem o Estado vem do 
direito. Não é possível a aproximação kelseniana que até muita gente de esquerda e 
muitos marxistas fizeram ao dizer que o direito é o estado e o estado é o direito. O 
direito deriva da mercadoria, deriva da produção capitalista, bem como o Estado como 
forma política específica deriva também da própria produção capitalista e isto faz com 
que em algum momento haja uma espécie de imbricação, de conformação entre estas 
formas sociais já derivadas da forma mercadoria. As implicações políticas e jurídicas 
desta leitura de uma derivação primária e depois então de uma derivação secundária 
são implicações muito decisivas para nós porque nos revela que o direito e o estado não 
são simplesmente duas faces da mesma moeda e tampouco são elementos neutros 
técnicos pelos quais a técnica política estatal faria o direito ou então a técnica normativa 
faria o Estado, têm razões específicas de ser e a especificidade geral de tudo isto é a 
especificidade da própria mercadoria e da própria produção capitalista. 
 
Aula 7: Recepção histórica da obra 
https://www.youtube.com/watch?v=yiwHfqxWfeA&list=PLHiE8QPap5vT-
4gGfjaxSzkZNcyxxQJpJ&index=7 
 
Pachukanis representa uma mudança e uma posição nova do marxismo quanto ao 
direito. Historicamente, embora muitos marxistas tivessem formações jurídicas, a 
começar pelo próprio Marx, não era o direito um assunto central da ocupação filosófica, 
política, prática revolucionária dos marxistas. Tanto assim que Engels e Kautsky ao final 
do século XIX, tiveram que escrever um livro precioso, O Socialismo Jurídico, para dar 
conta de corrigir determinadas leituras do campo da esquerda que insistiam no fato de 
que reformismos, ganhos jurídicos, algumas conquistas no campo dos direitos sociais, 
tudo isso levaria o capitalismo ao socialismo, esta era a visão por exemplo de Anton 
Menger na própria Áustria do século XIX. Tudo isto foi corrigido pelo próprio Engels e 
por Kautsky, mas o fato era que o direito era um assunto alijado das preocupações 
centrais do marxismo. Então no tempo da Revolução Soviética nós tivemos aqui uma 
necessidade premente de saber o que fazer com o próprio direito e também e isto mais 
também no campo estrutural com o Estado. Lênin já em Estado e Revolução, se ocupa 
do perecimento do Estado como um momento necessário dessa passagem do 
capitalismo para o socialismo. Stutchka foi o pensador que deu início à reflexão jurídica 
de alto nível do marxismo quando propõe então uma leitura material do direito, não 
mais uma leitura psicológica, não mais uma leitura do jurista enquanto elemento que 
faz o direito, mas o direito enquanto estrutura social, e identifica a verdade do direito 
na luta de classes. Pachukanis é quem chega ao auge da reflexão. Na sua obra Teoria 
Geral do Direito e Marxismo, de 1924, Pachukanis expõe então que o direito, para além 
daquilo que é a determinação do seu conteúdo na luta de classes é forma necessária do 
capitalismo. Esta descoberta Pachukaniana é o alto de toda a tradição do pensamento 
jurídico marxista. E não só marxista. Nos termos de uma leitura da teoria geral do direito, 
Pachukanis é o momento de não retorno, é o momento de auge, é o momento 
necessário de toda reflexão que se ponha como jurídica no nosso tempo. No entanto, 
com o passar dos anos e com uma tomada de orientação da própria URSS nos termos 
daquilo que foi a experiência do stalinismo, nós vemos um descompasso entre a leitura 
pachukaniana e aquele que era o momento histórico, as circunstâncias, as opções e as 
leituras teóricas e políticas do próprio stalinismo. Vyshinsky, que foi o pensador jurídico 
do stalinismo, era alguém que imaginava que o direito, visto pela perspectiva marxista, 
bastaria que utilizasse categorias como as de Kelsen, normas jurídicas, ordenamento 
jurídico e aplicasse conteúdo socialista a essa forma que seria uma forma normativa. 
Por conta disso Pachukanis caiu em desgraça, foi morto no momento do stalinismo e 
nós tivemos um tempo no qual no pós segunda guerra a URSS capitaneou boa parte dos 
movimentos socialistas e de luta revolucionária do mundo e portanto Pachukanis estava 
em desgraça nessa mesma leitura de mundo, que era uma leitura ainda muito simplória 
no que tange ao direito. Imaginava que era preciso conquistar o Estado e que de alguma 
maneira o Estado seria neutro, seus instrumentos jurídicos também se revestiriam de 
neutralidade ou pelo menos de condição técnica de caráter ou qualidade técnica e os 
trabalhadores então fariam normas jurídicas socialistas. Esta baixa leitura teórica sobre 
o direito nas esquerdas só veio a ser rompida quando na década de 1960 se percebe na 
Europa um movimento de revalorização do próprio Pachukanis. Isso se deu com 
pensadores como Umberto Cerroni. Cerroni é um dos elementos centraisque 
permitiram uma retomada da valorização de Pachukanis no próprio Ocidente. E depois 
de Cerroni, uma série de pensadores na Europa, nos Estados Unidos, na América Latina, 
por todo o mundo se deu uma revalorização do próprio Pachukanis, como Antonio 
Negri, que fez o mesmo na década de 70 na Itália. E assim vem sucessivamente uma 
valorização de Pachukanis. Nós devemos enormemente esta revalorização à pesquisa e 
às descobertas do professor Marcio Bilarinho Naves. Em especial em seu livro Marxismo 
e Direito, um estudo sobre Pachukanis, demonstra categoricamente que Pachukanis 
revela, denuncia e expõe ao máximo as condições da especificidade do direito no 
capitalismo, onde o direito é necessário, estrutural ao capitalismo. E o professor Marcio 
Naves também desenvolve uma reflexão que faz com que Pachukanis não seja aqui 
acusado de economicismo, de circulacionismo, porque expõe a verdade desse 
pensamento pachukaniano exatamente no mundo da produção e não simplesmente da 
circulação simples. Essa contribuição do professor Marcio é também responsável por 
abrir um campo de leitura pachukaniano no Brasil. Hoje boa parte ou a maior parte 
daquilo que se faz enquanto leitura pachukaniana do direito, enquanto leitura marxista 
do direito, se deve por se beber da fonte das pesquisas, reflexões e das ideias do 
professor Marcio Naves. O Brasil, que passou muito tempo sem conhecer Pachukanis, 
ou conhecendo apenas de uma notícia muito simplória, muito rápida, muito imediata, 
teve a partir do professor Naves nessas décadas atuais, especialmente essas do início 
do século XXI, teve um florescimento de uma cultura pachukaniana para o direito, 
cultura que se reveste de uma especial importância, de um especial trajeto e de um 
horizonte de muito valor porque nós precisamos conhecer a critica estrutural do direito 
na sociedade capitalista, bem como a crítica do estado na sociedade capitalista, sem o 
que nós erraremos em reformismos, nós erraremos em revoluções que se creem 
revolucionárias no sentido profundo, mas estão simplesmente torcando a guarda do 
Estado e a guarda do direito. E penso que no século XXI, com a necessidade que temos 
de sair da sociabilidade capitalista num mundo em frangalhos, num mundo no qual as 
contradições são agudas, são sistemáticas, estruturais e não é possível consertar nem 
remendar essa nossa sociabilidade, Pachukanis é o autor central para poder nos dar guia 
para um novo tempo e uma nova sociedade.

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