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1 2 NEGOTIATION MAP: A METODOLOGIA DE NEGOCIAÇÃO QUE VEM REVOLUCIONANDO O MERCADO Rodrigo Lang 3 4 Introdução Negociação. Já imaginou quantas técnicas e frameworks existem por trás dessa palavra? Este livro reúne dicas fundamentais e preciosas para qualquer profissional do mundo dos Negócios. Se você ainda não me conhece, meu nome é Rodrigo Lang e eu vou conduzir essa jornada de conteúdo com você. Preparei um livro que reúne minhas experiências, desafios, e, sobretudo, dicas fundamentais. Atualmente, sou membro do Conselho Executivo do BBI of Chicago. Em 2008, fundei o Instituto de Engenharia de Gestão (IEG), empresa na qual estive à frente por 10 anos, liderando a vertical de consultoria e depois sendo responsável pela criação da Escola de Negócios do IEG. Atualmente, atuo como investidor do setor de educação, tendo participação em mais de 10 empresas do segmento. Toda essa bagagem profissional está reunida aqui neste livro. No entanto, o conteúdo ainda vai além, reunindo não apenas minhas experiências e cases reais, mas também técnicas recentemente incorporadas em um benchmark mundial de metodologias de negociação realizado pelo BBI of Chicago no começo de 2019. Para melhor facilitar a leitura, resolvi adotar uma linguagem como se estivesse conversando com você e dividi nosso livro em seis capítulos. O primeiro capítulo será focado em 5 conceitos básicos. Já no segundo, introduzimos o mais importante método de negociação do BBI of Chicago, o Negotiation Map. O capítulo três foca no Modelo Q2, onde serão introduzidos os conceitos de cessão e concessão. No quarto, você vai aprender mais sobre ferramentas de execução. Durante o quinto, vamos mergulhar no mundo das propostas e no último iremos falar sobre o encerramento das negociações. Prepare-se para imergir em muito conteúdo, experiência e técnica. Nosso objetivo é que você saia do mundo leigo da negociação e entre para o time dos negociadores profissionais. Vamos nessa? 6 Primeiro capítulo: Conceitos básicos O que origina uma negociação? Antes de iniciar qualquer técnica ou introduzir algum conceito sobre negociação, é importante realizarmos esta reflexão acima. E a resposta é mais simples do que parece. Se existe, no mundo da negociação, um conceito universal é que: a negociação sempre começa a partir de um conflito. Entretanto, conflito é uma coisa que não lidamos bem. Historicamente, as mulheres e os homens possuem uma resistência muito forte ao entrar em conflitos. Isso se deve a um conceito chamado instinto evolutivo. E o que é o isso? O instinto de classe evolutiva ocorre quando seres humanos, que por agirem de um modo específico, sobreviveram ao longo dos tempos e por terem sobrevivido essa característica de comportamento ficou nosso DNA. Os seres humanos do passado que agiram dessa forma sobreviveram. E por sobreviverem, deixaram descendentes que agiam também dessa forma. Ou seja, a gente ficou uma linhagem com determinadas características. O que isso quer dizer? Entrar em um conflito há 10.000 anos atrás significava grande chance de cair em um confronto físico com outra pessoa. Discordar de alguém 7 poderia causar um confronto de grandes consequências. Se as pessoas gostassem muito de entrar em conflitos ao longo da vida, isso resultaria provavelmente em uma grande chance de morte precoce e, assim, não deixariam descendentes férteis. Tudo nos leva a inferir que a humanidade, ao longo do tempo, foi populada por pessoas que adotavam a metodologias de fugir do conflito. Seres humanos que conseguiam escapar de brigas foram pessoas que sobreviveram até chegar à idade fértil e deixaram descendentes férteis. Isso evidencia que os homens e as mulheres deixaram uma linhagem de pessoas avessas a conflitos. É bom dizer “não”? É fácil negar alguma coisa? Provavelmente você vai dizer que não gosta, porque evitamos o conflito. Mas, querendo ou não, ele faz parte da existência humana. As pessoas e, principalmente os gestores, terão que lidar com o conflito em alguma situação profissional e até pessoal e não poderão fugir dele. Negociar é a única maneira de se resolver um conflito? Negociar é uma das metodologias para lidar com o conflito, mas não necessariamente é a única, nem a melhor. Neste momento, é importante que entender e conhecer outras metodologias existentes para lidar com o conflito. 8 Quais outras formas de se resolver um conflito? A primeira forma é a imposição, que nada mais é do que quando alguém literalmente impõe uma solução. E quando é usável? Quando existe uma assimetria muito forte de poder, ou seja, quando um lado tem um poder muito forte sobre o outro. Por exemplo, imagine que existe um país fictício, a Mondávia do Norte, que resolveu ter uma bomba nuclear. Eles conseguirão obter? Com certeza não. Um país como os Estados Unidos ou a União Europeia irá negar e impor essa solução. Quando há uma assimetria de poder muito forte, talvez valha a partir para uma imposição. Desta forma, é possível adotar a solução de conflito impondo a maneira que você quer resolver. Diametralmente oposto à imposição, também existe a possibilidade de ceder (quando é possível simplesmente abrir mão, cedendo a sua posição). Mas quando isso é interessante? A primeira resposta que vem na cabeça de todo mundo é: “quando estou do outro lado da simetria de poder, quando estou do lado mais fraco.” No entanto, existe outro cenário em que é interessante ceder: quando não vale a pena adotar outra solução e será mais desgastante. Muitas vezes, são pequenos conflitos ou conflitos que não irão trazer retorno. Isso acontece muito no dia-a-dia da vida pessoal, com namorado, esposa, algum familiar ou amigo, 9 por exemplo. Muitas vezes simplesmente dizemos o famoso: “Ah, deixa. “ Então, existem até aqui duas soluções para conflitos: impor ou simplesmente ceder. Mas há também uma terceira solução, que é o convencimento, muitas vezes confundido com negociar. Em alguns capítulos a frente, será aprofundado que a negociação envolve troca, cessões e concessões. Já convencer não. Convencer baseia-se no uso de argumentos para fazer valer 100% a sua posição. Mas a imposição não seria um convencimento? A imposição, na verdade, é diferente de tentar convencer alguém simplesmente através de argumentos, porque na imposição não há necessidade de argumentos para fazer com que sua posição valha. Além das soluções citadas, devemos lembrar também da arbitragem, uma outra solução que é viável na sociedade, mas muitas vezes esquecida pelas pessoas. Hoje, no Brasil, existe a arbitragem civil, ou seja, é possível contratar um árbitro civil para opinar sobre um conflito entre pessoas ou empresas. Mas também há a arbitragem mais conhecida, que é a pública. É sempre uma opção recorrer à justiça na resolução de alguns conflitos. 10 Para falar sobre a próxima solução, temos que fala sobre cultura. Este não é um livro de negociação multicultural, mas há uma característica cultural que é importante ser disseminada. Na verdade, diversas características culturais serão abordadas ao longo do livro. Uma delas é bem marcante como solução de conflito na cultura brasileira e na cultura latina que é a espera, a famosa procrastinação. Por exemplo, se João tem um conflito, ele vai esperar para ver se o conflito se auto resolve. É uma solução que eu geralmente não gosto. Muitas vezes você espera e o conflito acaba não se resolvendo. E na hora que o João, por exemplo, precise adotar outra solução talvez seja tarde demais. Assim inicia o conceitode negociação, que é uma das soluções para resolver um conflito. Este capítulo é importante para entender que negociar não é única forma, nem a melhor, de resolver um problema. Quando encontrar um conflito, é imprescindível avaliar qual a melhor possibilidade para resolvê-lo. Isso é bem interessante, porque quando a pessoa sai do mundo leigo da negociação para o mundo mais formal e técnico, ela fica viciada em negociar tudo. Por isso, é importante avaliar as situações de onde vale a pena negociar. 11 Por que as pessoas negociam? E como negociam? Outra reflexão interessante para este capítulo de introdução é: por que as pessoas entram em uma mesa de negociação? Não existe nenhum outro motivo se não for a defesa de seus interesses. Com isso, nascem dois conceitos muito importantes: a negociação por barganha e a por princípio. E o que diferencia as duas é exatamente a forma como as pessoas defendem seus interesses. A negociação por barganha é aquela tradicional praticada por quem não é treinado ou capacitado e é feita quase que por extinto. Acontece quando as pessoas sentam em uma mesa para negociar para defender seus interesses, mas sem se importar com os interesses da outra parte. Na negociação por princípio, que é por técnica, conceito e framework, um ou mais grupos sentam em uma mesa para negociar quando eles têm a certeza de que existe uma grande probabilidade de haver uma área de intercessão, onde todas as partes podem sair melhor do que entraram. E, mais ainda, eles acreditam que esse cenário pode se perpetuar ao longo do tempo. Ou seja, a negociação por princípio é estável ao longo do tempo, ao contrário da negociação por barganha. 12 Toda pessoa bem treinada negocia por princípio? Uma das informações mais interessantes a compartilhar neste capítulo é que até pessoas altamente capacitadas acabam sem querer praticando barganha, simplesmente pelo fato de que é extremamente prazeroso, excitante e instintivo negociar dessa forma. Eu deixo sempre o exemplo da minha esposa Isabella. Ela é negociadora profissional, altamente capacitada em negociação, especializada em fusão e aquisição internacional de empresas de mais 1 bilhão de dólares. Nós temos um acordo: nunca negociamos juntos, na verdade, nós sempre negociamos separados e um assiste ao outro para dar um feedback depois. Uma vez nós estávamos viajando, no Vietnã, e a Isabella encontrou uma bolsa sendo vendida por cinco dólares. A mesma bolsa custava em média, no Rio de Janeiro, 500 reais. Logo que viu, ela disse que precisava comprar e negociar o produto e assim foi. Eu fiquei, conforme combinado, apenas assistindo. Quando eu percebi, a negociação entrou em um fenômeno chamado espiral da morte, uma característica da negociação por barganha que acontece muito ao longo das negociações em que abrimos mãos da técnica. O seu sangue vai fervendo, fervendo, fervendo e tem um 13 momento que você começa a sentir como se tivesse em um toboágua: em algumas situações você consegue resistir, levantar e ir embora, mas em outras você pula e não consegue se levantar mais. A mesma coisa é a negociação por barganha quando entra no espiral. Aquele ritmo gera tanto tesão, que a pessoa acaba não percebendo que está fazendo besteira. Eu chamei a minha esposa em um canto para conversar. Primeiro, eu perguntei: “Isa, quanto está custando essa bolsa? “Ela disse: “Custava uns cinco dólares”. Mas naquele momento da negociação, o objeto estava chegando a cinquenta centavos de dólar. Eu falei: “Calma, calma, calma. Você acha que essa bolsa custou menos do que cinquenta centavos de dólar para ser produzida? “Ela respondeu: “São crianças chinesas que fazem. “Eu logo disse: “Esse é mais um motivo para você não negociar. “Em alguns tópicos do livro mais à frente, este tópico será abordado: se você encontrar um conflito ético, o procedimento certo é sair da mesa e não negociar mais. A segunda pergunta que eu fiz foi: “Quantas bolsas você está comprando? “Ela disse: “200, vou levar para as minhas amigas”. Eu pedi a ela para parar a negociação, porque eu estava com vergonha alheia. Obviamente, ela não parou. Claramente, percebe-se que foi uma negociação por barganha e não por princípio. Por isso, é importante pensar no estado de felicidade das pessoas depois da saída das 14 negociações. A Isa saiu feliz? Ela saiu muito contente, afinal, comprou 200 bolsas por um preço surpreendente. A velhinha vietnamita saiu feliz? Saiu super feliz porque vendeu a produção dela de um mês inteiro em apenas um dia. Ela só saiu com raiva de mim por achar que eu estava empatando negociação dela. No entanto, esse cenário de felicidade não vai se perpetuar para sempre. Em alguma hora essa senhora vai conversar com marido, com a esposa, o filho, com quer que seja, e alguém vai falar: “Você vendeu essa bolsa abaixo preço de custo e teve um prejuízo na operação que fez.”. Essa vendedora irá ficar com muita raiva da negociação e o próximo turista brasileiro que aparecer irá tentar vender a bolsa por 50 dólares. E aí ele vai pechinchar, porque brasileiro não gosta de negociar, ele faz um processo que eu chamo de regatear (negociar sob apenas uma variável, geralmente o preço), e vai acabar levando essa bolsa por sete dólares achando que se deu bem. Ou seja, no limiar do tempo é visível que houve uma negociação instável, porque a senhora ficou desconfortável e depois se vingou do mercado. No momento inicial pareceu que as duas partes saíram melhores do que entraram, mas no longo prazo isso não se revelou verdadeiro. É possível procurar inúmeros exemplos corporativos em que é praticada a negociação por barganha. Há também grandes exemplos, como corrupção e propina. Uma hora 15 dará errado para todos os lados e acabará se tornando cara para todos os lados também. O objetivo aqui é negociar por princípio, mas é bem difícil, porque exige uma sobriedade e uma consciência de quem está praticando. Lembre-se sempre que negociar com barganha dá mais tesão e prazer e você vai acabar tendenciado a negociar desta maneira. Então, negociar por princípio, como será explanado aqui, com técnica, é um exercício e você precisa praticar. O famoso modelo 40, 40, 10 e 10 Toda a metodologia do BBI é baseada em dois frameworks, um da escola de americana de negociação – representada principalmente por Harvard e da escola europeia – representada principalmente pelas universidades inglesas e escocesas. A escola americana difunde um modelo que acho interessante e irei dividir com vocês: gosto de chamar ele de modelo 40, 40, 10 e 10. Os pesquisadores e estudiosos norte-americanos classificam os conflitos e como eles devem ser resolvidos segundo esse modelo. Eles dizem que 40% de toda vez que você se deparar com conflito, deve-se adotar o seguinte procedimento: primeiro você deve convencer. Se não conseguiu convencer em uma etapa inicial, aí você vai para uma mesa de negociação. Mas por que tentar convencer? Porque se você usar o processo de convencer e der certo, ótimo, você 16 ganhou tempo e não se desgastou fazendo ou preparando uma negociação. Em termos globais, pode-se usar um exemplo recente, onde Donald Trump e o carismático e polêmico líder norte coreano. Existia claramente um conflito sobre a Coreia do Norte ter uma bomba nuclear ou não. Os Estados Unidos passaram um longo tempo tentando convencer a Coreia do Norte que não, e a Coreia do Norte tentando afirmar que sim. Não existia uma assimetria de poder muito forte das partes, porque apesar da Coreia do Norte ser um país muito pequeno, tinha o apoio da Rússia e da China. O convencimento claramente não deu certo e as duas partes tiveram que sentar para negociar. Então, em 40% dosconflitos é possível usar uma metodologia de tentar convencer e depois sentar negociar se o convencimento não der certo. Nos outros 40%, quando não vale a pena tentar convencer, é ideal ir direto para uma mesa de negociação. E são três gatilhos que te levam a identificar se aquele conflito deve ir diretamente para uma mesa de negociação ou não: O primeiro cenário é quando você já recebeu um não extremamente formal ou quando você tem certeza que vai receber um não. Neste caso, não tente convencer e vá direto para uma renegociação. 17 O segundo cenário é o que todo mundo já percebeu como cliente, mas é bom perceber como visão de fornecedor também. Você está em um restaurante e faz uma reclamação formal, dizendo que o prato está ruim, por exemplo. Imagine o garçom ou o maitre tentando te convencer que aquele prato está bom. Vale a pena? O segundo cenário, então, é quando eu recebo uma reclamação formal: não vale a pena tentar convencer desta maneira. Um terceiro cenário que a escola americana coloca é quando uma variável externa àquele conflito, ou àquelas partes, se alterou. Por exemplo: eu tenho um contrato de aluguel com uma pessoa que aluga meu apartamento. Eu fechei o contrato há três anos. Lá, está dizendo que o aluguel é reajustado pelo IGPM, um índice estável e que variou de 0% a 10% ao ano nas últimas duas décadas. Agora imagine uma situação hipotética: entramos em uma crise econômica e o índice disparou para 1000% ao ano, no estilo Venezuela. Ou seja, está instaurado, claramente, um conflito. Mas que não foi causado nem por mim nem pelo locatário, mas por fatores macroeconômicos e externos a nossa responsabilidade direta. Não adianta um tentar convencer o outro de que está certo ou que o contrato vale ou não vale. Será imprescindível sentar na mesa para negociar. 18 Então, 40% dos conflitos você deve convencer e depois negociar. Os outros 40% dos conflitos originários de três fontes, quando já recebeu um não, quando uma reclamação formal ou quando uma variável externa se alterou, deve-se sentar direto na mesa para negociar. Os próximos 10% são os conflitos éticos, ou seja, quando descubro alguma coisa estranha envolvendo a outra parte, como corrupção ou trabalho escravo. Culturalmente, a gente tem a característica de continuar conversando com outra parte fingindo que não sabe de nada, mas saiba que uma vez você já está ciente daquele problema e você continua a negociação, você está se envolvendo naquele problema. Neste caso, a recomendação nossa é sair da mesa até que o problema se resolva. Os outros 10% dos conflitos são aqueles que devem ser resolvidos de outra forma, como já supracitado: com arbitragem, espera, imposição ou até mesmo cedendo. É caro ou barato negociar? Uma dúvida que pode surgir após a leitura é: é caro ou barato negociar? Muita gente responde que depende. E, na verdade, essa é a resposta ideal para tudo. O que eu gosto de fazer para dizer se é caro ou barato é levantar os custos. E quais são os custos que envolvem a negociação? O primeiro é o tempo gasto. Ao longo do livro, será explanado que a negociação não envolve apenas a etapa de sentar na mesa e colocar em prática, mas a de preparação 19 também. Eu já passei por um processo de preparação, com uma equipe de dois consultores, que já durou meses! Imagine o custo de um sócio fundador de uma empresa com dois consultores durante meses se preparando para uma negociação. E o custo não é só o direto, de salários, mas de oportunidade, porque envolve o capital que eu poderia estar gerando para minha corporação se tivesse fazendo outra atividade. Então, eu tenho o custo de preparação e o de negociação, o direto dos salários e os de oportunidades. Fora isso, é necessário também mapear toda a infraestrutura e logística necessário para preparar e executar a negociação. Estes são os custos fáceis de medir. Mas tem os custos que muitos profissionais esquecem: o risco envolvido na negociação. Negociar é arriscado. Quando você negocia, seu nome e o da sua empresa são colocados em jogo. Muitas vezes, você põe o seu patrimônio e o da sua empresa em jogo. Todo mundo sabe, sem tomar um lado político, dos escândalos que assolaram nosso país nos últimos anos. Esses escândalos foram baseados em contratos fraudulentos que foram fechados através de negociações malfeitas. Essas negociações prejudicaram muito a imagem não só dos envolvidos, mas das empresas, assim como o patrimônio deles e de todos os brasileiros. Isso evidencia o quão negociar é arriscado. Ou seja, negociar é uma operação de risco. E tudo que tem o risco tem seu custo. 20 Antes de decidir negociar, coloque na ponta do lápis primeiro qual é o custo. Depois, se os benefícios que possivelmente serão obtidos nessa negociação compensam os custos. Isso é uma conta matemática muito simples. Sempre mapeie os benefícios e os riscos envolvidos nessa negociação. Desta maneira, você terá consciência e sobriedade se deve ou não negociar. Lembre-se e guarde esta informação: negociar com princípio envolve consciência e sobriedade. O Conceito da ZOPA – O conceito básico para todo negociador Se existe um conceito básico no mundo da negociação ele se chama ZOPA - Zona Ótima de Possível Acordo, que é composta por outras duas variáveis: a preferência e o MAPAN. Iremos criar um exemplo que facilitará seu entendimento. Vamos simular que você está querendo vender um carro. Ao pesquisar, você percebeu que é possível comercializar seu automóvel por R$100.000. Então, sua preferência pela venda desse carro é R$100.000, mas você aceitaria vender este carro por até R$80.000. Este valor é o MAPAN - Melhor Alternativa Para Acordo de Negociação. Ao mesmo tempo, do outro lado, há um comprador que pesquisou e viu que pode comprar um carro por R$70.000, mas ele topa pagar até R$86.000. A preferência dele é o 21 valor mais baixo, de R$70.000, e o MAPAN é o valor de R$86.000 dele. E aí há uma área de interseção entre a vontade do comprador e a vontade do vendedor, entre 80 e 86.000 reais. Esta área é a ZOPA. Somente na Zona Ótima de Possível Acordo é possível ter acordos fechados por princípio. Negociar fora da ZOPA significa grande chance de piorar o conflito e, logo, da negociação não ser fechada. Figura1: O conceito de ZOPA Então, faz parte da negociação por princípio conhecer a ZOPA, saber que a outra parte também tem sua preferência e seu MAPAN. Além de, no início da negociação, utilizando técnicas, tentar identificar qual é a preferência e o MAPAN da outra parte... Lembre-se que a ZOPA é um dos conceitos mais fundamentais e mais importantes da negociação. 22 Segundo capítulo: Apresentação do Método BBI - Negotiation Map Neste capítulo, a nossa metodologia de negociação será apresentada. Como já falei acima, eu, Rodrigo Lang e meu sócio, João Magalhães, construímos o BBI Negotiation Map a partir das duas maiores escolas de negociação do mundo: a escola americana, representada principalmente pela Universidade de Harvard, e a escola europeia, representada pelas universidades escocesas. Por reconhecermos a nossa metodologia como um verdadeiro mapa, surgiu o nome “Negotiation Map”. As principais escolas de negociação do mundo tratam a negociação por etapas. Harvard coloca de cinco a sete etapas no processo de negociação e a maioria dos centros de pesquisa da Escócia trata de cinco etapas. Eu não gosto de usar o termo “etapas” porque dá a ideia de que uma etapa termina e a outra começa. De acordo com o que acredito, negociar não é um processo linear, é, na verdade, é um processo completamente não linear. Não são etapas, mas sim “marcos”. Na nossa metodologia, eu peço para imaginarem a negociação como se fosse um grandemapa. As ferramentas de negociação são a leitura e a identificação 23 dos pontos desse mapa. Para visualizar melhor a ideia, eu sempre uso o exemplo do mundo sem GPS. Na minha época de faculdade, minha família tinha uma casa no interior do Rio de Janeiro e eu sempre fazia churrascos lá. Quando convidava os meus amigos, não existia GPS, nem acesso à rede de dados na estrada. Então eu passava para os meus convidados quatro pontos da estrada que eram como pontos de referência: “Você vai entrar na BR, logo vai vir uma posto de gasolina com uma grande bandeira, depois de trinta minutos vai passar por uma rede de supermercados, depois pelo portal da cidade e em quatro minutos estará na minha casa.” Este exemplo, embora simplório, mostra que para negociar é preciso explicar pontos de referência. A partir de agora, serão apresentados quatro pontos de referência: o primeiro é a preparação da negociação, o segundo é a execução, o terceiro são as propostas e o quarto marco é o encerramento da negociação. Para cada um desses marcos, você vai aprender a usar tecnologias, frameworks e técnicas específicas. Pode acontecer de estar no marco de encerramento e acontecer alguma situação em que é necessário voltar para a preparação. Para entender quais atitudes devem ser tomadas e qual o momento ideal de tomá-las, é imprescindível saber usar as ferramentas de preparação. 24 E é exatamente isso que você vai ler: um mergulho profundo em ferramentas. Neste momento, a nossa brincadeira começa a ficar muito séria. Começo a transferir, a partir de agora, a mais poderosa ferramenta que eu conheço de negociação: o Negotiation Map, que é um conjunto de frameworks que vai tornar a sua arte de negociar extremamente poderosa. Vamos começar? Tudo começa pela preparação da negociação. Quais são os primeiros cuidados? O ambiente é o primeiro ponto a ser discutido durante o marco de preparação. Parece óbvio falar sobre ambiente e que é preciso primeiro escolher e identificar o lugar ideal onde a negociação vai acontecer. Mas quando se fala em negociação, o óbvio precisa ser dito. E a primeira verdade a ser tratada e desconstruída sobre o ambiente é entender que ambiente não é apenas lugar, ele é composto por duas variáveis. A primeira é onde negociar e a segunda, com quem vamos negociar. Muitas pessoas não sabem, mas isso também faz parte do ambiente. Onde negociar? Esta variável pode mudar todo o rumo da negociação. Negociar em lugares diferentes oferece vantagens e desvantagens. Basicamente, existem três cenários de 25 onde é possível negociar e conhecê-los é fundamental para tomar a decisão de onde vamos realizar nossa negociação. O primeiro cenário é negociar in house, ou seja, em casa, seja na sua empresa, no seu escritório ou no seu consultório, enfim, no seu local de trabalho. Qual é a vantagem de negociar em casa? Primeiro, o domínio total do ambiente. Você está por dentro das condições, sabe o que esperar e o que não esperar deste espaço, conhece tanto os pontos fortes quanto os pontos fracos. Mas qual a desvantagem de negociar in house? Muitas vezes, é deselegante e um pouco difícil levantar e sair da mesa quando você está dentro de casa. Provavelmente, você já passou pela situação de chamar uma visita e a pessoa se tornar indesejada em algum momento na sua sala, o que é complicado para o dono do espaço porque se torna difícil de expulsá-la. Em contrapartida, nós podemos também negociar na casa, escritório, consultório ou empresa da outra pessoa. A desvantagem é que você não domina o ambiente, mas a vantagem é que fica muito mais fácil sair da mesa se precisar. Você pode simplesmente dizer “olha, preciso me retirar, tive um problema no escritório e preciso ir embora.“ Também é executável escolher um terreno neutro onde fica fácil você se retirar se for preciso e os dois têm um grau de conhecimento e desconhecimento intermediário. 26 E sobre pessoas? A segunda variável é extremamente importante na hora de negociar: conhecer muito bem quem estará do outro lado da mesa de negociação. Eu sempre dou um exemplo de que as pessoas erram no início de carreira, quando estão fazendo processo seletivo com entrevistas. Provavelmente você já recebeu uma ligação dizendo “olha amanhã você tem um processo seletivo”. Mas qual foi a vez que você perguntou: “quem irá me entrevistar? “. E mais: quando você entrou no LinkedIn e olhou a vida da pessoa que iria fazer a entrevista com você? Dificilmente, as pessoas fazem esse tipo de pesquisa. Quando eu vou para uma reunião, não necessariamente uma negociação, mas até uma reunião mais simples, procuro saber quem são os profissionais que estarão presentes. Para isso, eu investigo profundamente a vida da pessoa que estará participando na reunião. Isso não é ser stalker, mas sim uma forma de se munir de ferramentas que vão ajudar tanto no poder de julgamento, quanto no de tomar decisões perante essas pessoas. Para facilitar e concretizar o entendimento desta variável, supõe-se que João tem uma reunião. Ele investiga a pessoa com quem irá negociar e descobre que antes de trabalhar na empresa X, ele trabalhou durante 10 anos da 27 Ambev. Já pode-se analisar que João está falando com uma pessoa meritocrática, agressiva e objetiva nos negócios. Na hora de sentar para negociar com ele, João deve procurar ter essa postura e ser mais objetivo e direto. Mas se João descobre que, ao invés de trabalhar na Ambev a outra pessoa trabalhou durante 10 anos em ONGs viajando o mundo e ajudando crianças, já pode-se imaginar que provavelmente esse é uma pessoa que potencializa mais o lado social dos negócios e valoriza muito o benefício humano dos negócios. Logo, o João deve apostar em uma postura mais humana. Hoje, a tecnologia permite de forma espetacular identificar características fundamentais das pessoas que estarão do outro lado da mesa de negociação. Existe LinkedIn, Facebook, Instagram e até o site Escavador, onde é possível descobrir várias informações sobre a pessoa, até mesmo processos na justiça. O que não falta são ferramentas para descobrir qual ambiente te espera. Estar confortável no espaço e conhecer as pessoas muda o jogo de forma completa. A partir de agora, nunca mais vá negociar às cegas. Sempre que puder, mergulhe fundo e tente entender onde e com quem você vai negociar. 28 Terceiro capítulo Modelo Q2 – a melhor forma de se preparar para uma negociação Para facilitar a etapa de preparação da negociação, irei apresentar uma referência que mudará a forma como você negocia: o Modelo Q2. Abaixo, segue o modelo que pode e deve ser usado no dia-a-dia. Eu sou tão apaixonado pelo Modelo Q2, que transformei o modelo em uma planilha de Excel onde tabulo todas as minhas preparações para as negociações importantes da minha vida. Eu tenho centenas de negociações tabuladas, formando um poderoso banco de dados, servindo como uma grande fonte de consulta. Toda vez que eu vou fazer uma negociação mais trabalhosa, eu recorro a esse modelo. 29 Figura 2: Modelo Q2 a ser preenchido 30 O Modelo Q2 é bem complexo e por isso o conteúdo será dividido em duas etapas. No primeiro momento, será abordada a parte de baixo que começa com objetivos e engloba os quatro quadrantes. A primeira etapa do modelo Q2 foca no objetivo. Qual o objetivo da sua negociação? É necessário manter o objetivo como se fosse um mantra, algo que precisa estar na cabeça de qualquer negociador desde o momento em que ele entra para negociar. Resumindo, é aquilo que você não pode esquecer. Como eu preciso sair dessa negociação? Esta reflexão auxilia a lembrar qual é o real objeto daquele processo de negociação pelo qualestou me reunindo. Parece loucura, mas muitas vezes as pessoas não identificam ou esquecem qual é o real objetivo da negociação e acabam negociando mal e, logo, fechando péssimos contratos. Pode-se ter como um exemplo um case, bastante difundido nas salas de Harvard, no qual das duas irmãs disputando uma laranja. Elas tinham apenas uma fruta e as duas precisavam da laranja. As irmãs ficaram a tarde inteira disputando a fruta e a solução adotada por elas foi a de dividir a laranja ao meio. Assim, cada irmã levou uma metade. Esta parece uma solução ótima, mas é necessário mergulhar no problema e entender qual objetivo de cada 31 irmã. Assim, descobrimos que o objetivo da irmã A era conseguir a casca da laranja para poder raspar e decorar o bolo que ela fez. Já a irmã B, gostaria de beber um suco de laranja, ou seja, ela precisava do miolo da laranja. Pensando nesse ambiente, as irmãs saíram bem na disputa? Não. As duas partes saíram com uma solução sub-ótima da negociação, porque ganharam apenas a metade da laranja. Por outro lado, a solução ótima seria dar a casca para uma irmã e o miolo para a outra. No entanto, essa solução só seria encontrada se as duas deixassem claro, desde o princípio, qual seria o real objetivo da negociação, que não era conseguir laranja em si e sim a casca e o polpa. Se as duas conseguissem mapear quais eram os objetivos antes de negociar de fato, elas teriam chegado na solução ótima. Por isso, é essencial gastar tempo identificando o qual é o real objetivo da negociação. Eu já passei por problemas reais que agora ajudam na negociação. Em toda a minha experiência, vi que as pessoas se desgastam porque não sabem um real motivo da negociação. Há um exemplo clássico que já citei em várias palestras e em vários eventos: trate-se do caso do litígio entre duas farmacêuticas. Elas estavam disputando o mesmo princípio ativo que era regulado pelo governo de um país. Aqui no livro, supõe-se que o país é o Brasil. Basicamente, 32 esse princípio ativo era fabricado com o ovo de um tucano que se alimentava de uma fruta. Esse era o princípio ativo para gerar o medicamento fabricado pela farmacêutica. Já a outra companhia queria extrair outro princípio ativo que era encontrado na semente dura. Ou seja, as duas farmacêuticas estavam disputando o fruto que existe em quantidade limitada e era ofertado por quantidade limitada pelo governo do Brasil. Para vender, o estado fazia um leilão e entregava para o farmacêutico que desse o maior lote. Cada uma oferecia um preço maior para receber a fruta, lembrando que uma precisava da fruta para extrair a semente dura e a outra precisava da fruta para o alimentar o tucano. Os negócios eram completamente complementares e elas poderiam fazer uma oferta única para o governo e comprar uma grande quantidade a preço mínimo. Uma farmacêutica iria levar a poupa para alimentar o tucano que vai produzir ovo e a outra farmacêutica iria pegar o núcleo duro e vai extrair o principal ativo. No final, as duas sairiam felizes, porque gastariam menos e produziram mais quantidade de princípio ativo que ia dar suporte à produção de dois medicamentos. Mas não. Elas passaram um ano disputando a fruta sem saber que seus interesses e objetivos eram complementares. 33 Por isso, o primeiro passo é saber muito bem qual é o objetivo da negociação da sua empresa e o do seu negócio. Tente também identificar qual é o objetivo do outro lado. Depois conhecer qual é o seu objetivo, a segunda etapa do modelo Q2 é o preenchimento dos quatro quadros: (1) quero, (2) tenho que, (3) desejos e (4) concessões. Para que entender muito bem o que são esses quatro quadrantes, é ideal usar um exemplo. Supõe-se que Maria vai fazer uma coisa que ninguém faz hoje em dia, que é contratar um pacote de viagem para seu marido, para a sua esposa, enfim, para fazer uma surpresa de presente de casamento, que é celebrado no dia 08 de julho. Ela quer levá-lo para Paris e procura uma agência de viagens para auxiliar. Maria vai planejar a sua negociação, então, primeira coisa no qual ela deve se concentrar é preencher o quadro “quero”. Lá, ela anota tudo que quer, ou seja, variáveis ótimas que ela gostaria que estivessem presentes nessa viagem. Usando o exemplo, supõe-se que a Maria quer uma viagem para Paris, do dia 10 ao dia 20 de julho, com a companhia aérea “Azul”, porque ela sempre viaja a trabalho com esta empresa. Então, se ela voar com a “Azul” nas férias, talvez 34 acumule milhas suficientes para ano que vem já viajar de graça nesta companhia. Ela também quer um hotel quatro estrelas e quer gastar no máximo €4000. Basicamente, neste quadrado cabe tudo que você quer. Fazendo um paralelo com o primeiro capítulo, este é o espaço para a minha preferência, segundo o modelo ZOPA. Agora, Maria tem que preencher o “tenho que”, um espaço para ela apontar tudo aquilo que não abre mão, as variáveis que realmente são necessárias para realize a sua viagem. Para preencher esta etapa, é ideal usar o campo “quero” como base, ver o que realmente é necessário e ir ajustando. Exemplo: Tem que ser em Paris? Sim, tem que ser em Paris. Tem que ser entre os dias 10 e 20 de julho? Não. Na verdade, o legal é que seja em julho porque é o mês de aniversário de casamento e Maria não pode deixar de celebrar, então pode ser apenas julho. Tem que ser de Azul? Não, pode ser qualquer companhia aérea. Tem que ser quatro estrelas? É legal, mas pode ser no mínimo três estrelas. Mas tem que ser no máximo 4.000 euros. Então, Maria preencheu o seu quadrante “quero” e o seu “tenho que”. O “tenho que” ficou mais curto do que o “quero”, porque realmente é o que ela preciso. 35 Agora, ela deve que preencher a lista de desejos. São pequenos que ela não necessariamente quer e tem “tem que”, mas que ficaria feliz se recebesse. São geralmente itens simples ou pequenos, de pouco valor para outra parte. Talvez um transfer do aeroporto para o hotel, um welcome drink, ou um late check-out, tudo isso pode preencher a lista de desejos. Falta apenas a lista de concessões, que são pequenos itens que durante a negociação Maria pode vir a ceder. Como por exemplo: pagar à vista ou fazer um post no Instagram sobre a companhia de viagens, se ela tiver muitos seguidores. Figura 3: Modelo Q2 Preenchido 36 É com base nesse modelo que Maria irá iniciar a sua negociação. Agora, uma pergunta para você. Quando Maria chega na companhia de viagens, qual é a primeira coisa que ela deve colocar na mesa? É imprescindível colocar o “quero”, a sua preferência. Mas culturalmente existe uma resistência quanto a isso. As pessoas acabam não colocando essa preferência e, na verdade, vão flexibilizando desde o começo. Um outro ponto importante: não tem porque você esperar para colocar a proposta. Coloque a proposta logo em cima da mesa. E coloque a proposta da preferência. Então, Maria vai falar: eu quero ir para Paris entre dia 10 e 20 de julho, eu quero que seja na companhia Azul, eu quero que seja em um hotel quatro estrelas e posso pagar no máximo €4.000. E aí, a companhia de viagem vai receber aquele pedido e analisar. Imaginem um cenário onde ocorre um problema. A agência não trabalha com “Azul”, apenas com a Latam. É neste momento que o negociador mal treinado vai dizer “ok”. A partir de agora, você não vai mais fazer isso. O modelo Q2 existe exatamente para facilitar essa negociação e para fazer você ter domínio sobre uma negociação. O que Maria vai fazer nesse momento? Ela vai justificar porque precisa da companhia “Azul” e precisa valorizar o ponto dela. Explique qual o custo que aquilo tem para você. 37 O atendente vai dizer que não tem como e entãoMaria vai responder: “Você consegue um transfer do hotel para o aeroporto para mim? Porque se você conseguir, eu tento ver com o meu marido/esposa se a gente abre mão da “Azul” e vai de “Latam”. Ao invés de abrir mão daquele ponto, ela puxou um item da lista de desejos e colocou como condição para desbloquear aquela sessão. Repare como Maria colocou: “Você tem como conseguir um transfer? Porque se você conseguir, aí eu verifico com a minha família e vejo se é possível a gente abrir mão”. Iremos discutir mais tarde a forma como essa frase foi formulada. Tudo na negociação envolve técnica. Com isso, você não perde a margem da negociação. Ao longo do livro, você verá que eu gosto de chamar isso de “entregar cordeiro”. É muito comum um negociador abrir mão facilmente da sua preferência e perder sua margem de negociação. Use a sua lista de desejos exatamente para isso. Já a lista de concessão, por sua vez, é exatamente para quando você está no outro lado, quando é necessário conceder alguma coisa. Esse é o começo do modelo Q2. Você leu e aprendeu a utilizar o seu objetivo e a entender qual eram os desejos e 38 as concessões. O “quero” é a minha preferência, o que eu gostaria de obter. O “tenho que” é o que eu não posso abrir mão. O desejo são pequenos itens que posso demandar durante uma negociação, geralmente itens simples que a outra parte não vai se incomodar em ceder. E a concessão é aquilo que eu tenho a oferecer, algo que possa interessar para botar na mesa de negociação. Para encerrar o modelo Q2, é importante entender que negociar exige uma equipe de alto desempenho, composta por três personas básicas: pelo líder, o sintetizador e o observador. E para tentar entender o papel de cada um, vamos tomar como base uma equipe de alto desempenho que eu uso como referência total: o BOPE, o Batalhão de Operações Especiais da Polícia Militar do Rio de Janeiro. Fonte: https://www.facebook.com/TropasDeEliteDoBrasil/photos/a.128915330618736/136862976490638/ 39 Esta é uma foto do BOPE, que assim como qualquer equipe de alto desempenho de assalto militar, ou seja, uma equipe de incursão militar, é um time extremamente especializado. Ao observar o BOPE, ou qualquer outra equipe equivalente no mundo, você irá notar uma mesma característica: percebe-se sempre essas cinco pessoas em fila. E isso não é por acaso. Se uma equipe como o BOPE entrar em uma comunidade, mesmo que seja com 100 pessoas, eles sempre vão entrar com 20 equipes de cinco pessoas. Se forem entrar com 120 pessoas, serão 24 equipes de cinco pessoas. E por que isso acontece? Pois é assim que funciona uma equipe especialista, onde cada um tem a sua função. O que faz cada um? A pessoa que está na frente é o líder e ela portando uma arma. Irei fazer uma pergunta completamente idiota para você e quero que reflita por um instante. Essa pessoa tem autorização para atirar? Eu te dou a resposta: não! Nos maiores grupos de assalto, nas equipes especialistas ao redor do mundo, essa pessoa não tem autorização para atirar. Inclusive, se ela atirar provavelmente irá passar por uma sindicância para tentar investigar o motivo do disparo, já que ela não tinha autorização imediata. Talvez pareça estranho que o líder não tenha autonomia para atirar, porém, antes de fazer uma incursão militar, essa equipe se reuniu com outros times para desenhar uma estratégia 40 durante a etapa de planejamento. No marco de planejamento, eles definiram a estratégia e quem vai ser o guardião dessa estratégia é o líder. Ele tem como missão observar se esse cenário está de acordo com que foi planejado e se é necessário desenhar novos caminhos para aquela estratégia. Se o líder estivesse atirando, ele teria tempo adequado e espaço de processamento no cérebro para pensar na estratégia? Não. Ele estaria perdendo tempo do pensamento dele para atirar. Então, ele não vai disparar. O líder é o guardião do julgamento e de tomada de decisão. O guardião da estratégia. Para atirar temos os próximos dois elementos: os dois que estão atrás dele são atiradores, com a função exclusiva de disparar. Já o quarto elemento não atira, apenas assume a posição de sub-líder. Ele tem como função observar o líder e caso o líder seja alvejado, ele deve assumir para o grupo não ficar sem liderança. O último elemento, por sua vez, é o que protege a retaguarda caso o grupo seja atacado de surpresa. Isto evidencia que cada um tem uma função específica, além de claramente haver a confiança entre os integrantes do grupo para executar sua função. 41 Na negociação, assim como nas tropas de elite, é preciso ter um grupo de alto desempenho. Quando falei acima das três personas, estava me referindo a construir uma equipe especialista de negociação, o que não significa que necessariamente devem haver três pessoas, mas três personagens presentes na mesa de negociação. É possível negociar com duas pessoas, mas uma deve estar acumulando duas personas. Já negociar com uma pessoa não é aconselhável até para ter uma pessoa de testemunho para aquilo que foi dito. Vale destacar também qual é o papel das três personas dentro da negociação. Vamos tratar cada uma delas. A primeira persona é o líder, o guardião da estratégia. Somente ele libera informação, faz propostas, sessões de concessões e transmite opiniões. Essas são as quatro características do líder. A segunda persona é o sintetizador, ou seja, a pessoa que vai ajudar o líder a ter espaço e tempo suficiente para pensar na estratégia. O sintetizador é aquele que formula e executa perguntas. Se o líder ficasse horas pensando em quais perguntas fazer ou formulando as questões, ele não estaria pensando na estratégia. Fazer perguntas serve para diversas situações durante uma negociação. Primeiro, para ajudar o líder com mais informações para esclarecer pontos, depois para ganhar tempo e por último, para 42 acalmar os ânimos. Cabe também ao sintetizador, realizar resumos constantes do que foi acordado até o momento, principalmente antes e depois das pausas. Ou seja, ele basicamente faz perguntas e resume. E por último há o observador, uma figura extremamente importante na cultura japonesa, por exemplo. O observador observa a outra equipe, que pode, a todo momento, emitir sinais. Ele analisa sinais de leitura corporal, sinais através de perguntas que serão feitas e através das palavras que são utilizadas. Cabe ao observador que não falar nada durante a reunião, apenas observar esses sinais e passar de alguma forma para outros membros da equipe a leitura que ele está tendo. Cabe ao observador também, em reuniões mais tensas, fazer cálculos da negociação, abrir o Excel fazer as contas, porque nem o sintetizador nem o líder irão ter esse tempo Ou seja, a partir de agora, eu quero muito que toda vez que você se deparar com uma negociação, prepare a equipe e essas três pessoas: um líder, um sintetizador e um observador. Cada um com a sua função e confiando nos demais. 43 Quais cuidados adicionais devo ter no marco de preparação? Antes de encerrar o marco de preparação e começarmos a falar do marco de execução, é preciso compartilhar dicas informações estratégicas que são importantes de pensar durante a preparação. Primeiro, pense em estratégias múltiplas. Eu sempre falo que o péssimo general perde 80% das batalhas porque vai com apenas uma estratégia. O bom general ganha 50% das batalhas porque ele vai com duas estratégias para guerra. Já o excelente general ganha 80, 90% das batalhas porque vai com múltiplas estratégias. Durante etapa de preparação, pense em múltiplas estratégias, nos cenários e se coloque como se fosse o outro lado. É extremamente importante testar cenáriose levar múltiplas estratégias. Isso tem muito a ver com a segunda dica que eu dou: utilize as pausas a seu favor. A pausa é uma excelente estratégia de negociação. Em alguns momentos, é praticamente mandatório solicitar pausa. Se surgiu algo, por exemplo, que você não preparou durante a etapa de preparação, não desenhou uma estratégia a luz dessa informação, o ideal é pedir pausa. O terceiro ponto diz respeito ao compartilhamento estratégico de informações. Culturalmente, há uma 44 resistência muito grande com a entrega de informação. Muitas vezes, a informação colocada na mesa também é poder, então separe junto com a sua equipe que informações podem ser passadas e que informação você não pode passar, porque se você não separar previamente vai acabar não passa informação nenhuma. E como já foi dito, muitas vezes é preciso passar algum tipo de informação, nem que seja o real objetivo daquela negociação para que renda frutos positivos. São três dicas importantes: pense em múltiplas estratégias, no controle estratégico das pausas e no compartilhamento estratégico de informações. 45 Quarto capítulo Execução Quando eu falo em execução, costumo dizer que este é o marco mais importante da negociação, até porque se confunde com a ideia que temos de negociação. A execução nada mais é, na verdade, do que o momento de expor argumentos e levar os contra-argumentos, formando um debate. Esta etapa pode ser feita com técnica ou sem técnicas. E é exatamente este ponto que será abordado agora. Ao falar em execução, o que deve ser evitado no primeiro momento é algo que muitas pessoas já passaram: a argumentação circular, que é quando você argumenta, argumenta, argumenta, argumenta e depois de 30, 40 minutos, ou mesmo horas ou dias você ainda está utilizando os mesmos argumentos e debatendo sobre os mesmos aspectos. Além de cansativo, isso é improdutivo, mas acontece em toda a negociação onde os profissionais não são treinados. Provavelmente, você que está lendo já passou por esta situação. Por isso, o objetivo deste livro é justamente disseminar o conceito da argumentação de monte, que pode ser melhor visualizado aqui embaixo: 46 Figura 5: Representação da negociação por escalada Para compreender a argumentação em monte ou argumentação por escalada, é essencial imaginar que existe um monte que precisa ser escalado. No início do monte, logicamente, está o início da negociação e no final está a proposta fechada com o contrato assinado. Como em qualquer escalada, ao subir o monte, podem acontecer deslizes. O segredo é não voltar ao início quando tropeçar. O bom profissional de escalada, para não voltar ao início durante a subida, finca o marco, ou seja, coloca um mosquetão na etapa onde parou. Assim, ele tem uma base para avançar para próxima etapa. 47 Então, em uma argumentação de monte ou por escalada você terá a oportunidade de argumentar. A outra parte, provavelmente, irá contra-argumentar. Nesse processo de argumentação e contra-argumentação, caso seja notada uma mínima evolução, deve-se fincar o mosquetão. Esse mosquetão ou essa bandeira impedem de que em uma próxima onda de argumentação ou contra argumentação você caia e volte para a origem. E aí surge a dúvida: que mosquetão ou que bandeira é essa? Como eu consigo fincar e perceber que estamos em um bom estágio da negociação e que não precisamos voltar o início? A resposta é: sintetizando constantemente. E é por isso que a figura do sintetizador é fundamental. Este profissional precisa ficar atento aos argumentos e aos contra-argumentos dos líderes, porque quando ele notar uma mínima evolução no processo de argumentação, deve fincar uma bandeira. O sintetizador precisa apontar que houve uma evolução e deve sintetizar ou resumir para ver se todo mundo na mesa está de acordo e se evoluiu mesmo o processo. Então, durante a etapa de execução, para não cair em uma argumentação circular, o sintetizador precisa ser muito ativo, ou seja, ele precisa o tempo todo notar se houve algum tipo de evolução e fincar uma bandeira na 48 argumentação para que ela não ocorra de modo circular. Por isso, é importante haver um bate bola, o tempo todo, do líder com o sintetizador. O sintetizador resumindo e orientando, e o líder praticando aquilo que é conhecido como argumentação ativa ou diálogo de negociação. E não praticando a persuasão. E qual é o papel do líder na prática da ação ativa ou o que muitos estudiosos gostam de chamar de diálogo da negociação? É visível que quando existem argumentadores não treinados na mesa, geralmente, a prática em 90% do tempo é de persuasão e em 10% do tempo acontece uma argumentação ativa ou diálogo de negociação. Por outro lado, um negociador amplamente treinado inverte esse cenário, praticando 90% do tempo uma negociação ativa e 10% uma persuasão simples. O objetivo deste livro é que você consiga pelo menos praticar 50% de persuasão simples e 50% de alguma atuação ativa. Isso já vai evoluir muito o seu grau de negociação. Mas o que é argumentação ativa? E o que a diferencia da persuasão? A persuasão é o que as pessoas praticam quando não são treinadas. Acontece quando você quer 49 vender sua ideia, tentando apenas convencer e influenciar. Quando existem afirmações demais, geralmente é um caso de persuasão. Já um negociador bem treinado não vende demais. Ele pratica o que é chamado de argumentação ativa, que tem três características: 1. É intensiva em perguntas para entender objetivos e restrições para obter mais informações; 2. Existe uma troca de informações de forma estratégica com curadoria daquilo que pode ser colocado na mesa e quais informações não devem ser colocados na mesa; 3. Também acontece um teste de cenários. Por exemplo: “Se eu fizer isso, a gente consegue evoluir em outro ponto? Se a gente tiver aquilo, a gente consegue por esse caminho?” Há uma diferença brutal entre uma negociação conduzida por um diálogo de negociação e uma negociação conduzida por persuasão. Pense em quantas vezes você se pegou tentando convencer o outro lado. As pessoas acabam gastando muito tempo tentando convencer alguém, mas quando saem ficam apenas no convencimento. Talvez o outro lado já tenha uma verdade e a pessoa acaba caindo na argumentação circular. Toda vez que você tentar apenas convencer, há o risco de entrar em uma argumentação circular. É necessário tentar, cada vez mais, perguntar e ouvir respostas. Tente trocar 50 informações de forma consciente e estratégica e teste cenários. Se você está fazendo isso, com certeza está mais próximo de agir como negociador profissional, praticando diálogo de negociação ou argumentação ativa. Já falamos do papel do líder e do sintetizador. E o papel do observador na execução? Já foi evidenciado o papel do líder e do sintetizador dentro do marco de execução, e agora será abordado o papel do observador, que precisa ficar atento a três tipos de sinais: micro expressões, palavras index e perguntas index. Como o foco do livro não são as micro expressões e nem linguagem corporal, focaremos nos demais pontos. Para quem quiser se aprofundar no assunto recomendo meu livro de Comunicação e Vendas de Alto Impacto. Nele dedico um capítulo inteiro às micro expressões. Vamos ao que interessa... O observador precisa ficar atento, principalmente, às palavras e perguntas que são feitas pela outra equipe. Vamos exemplificar? Supõe-se que o observador ouviu do outro grupo a seguinte frase: “Normalmente eu não concedo esse benefício para clientes com seu histórico”. Quantos sinais você vê nessa frase? 51 A partir desta expressão, um observadoratento consegue identificar muitos sinais. O primeiro e mais óbvio que ele precisa avisar para o sintetizador e o líder é o “normalmente”. Assim, o sintetizador deve perguntar: “E então em quais situações você concede?”. Outro sinal: “Normalmente eu não concedo esse benefício”. O sintetizador pode ser avisado pelo observador a perguntar: “Está bem, mas então que benefício você pode liberar?” Mais sinais ainda: “Normalmente eu não concedo esse benefício”. Então o observador pode avisar para o sintetizador perguntar: “Olha, desculpa, você não concede, mas tem alguém que pode conceder?” Vale perguntar, ainda, que perfil de cliente é esse citado por ele, visto que ele não libera para “clientes com seu histórico”. Em uma frase curta, muitos indícios foram salientados. É por isso que o observador tem que ficar o tempo inteiro sem falar nada, apenas observando, anotando e passando para o sintetizador e o líder essas informações. Somente quem conseguir ficar focado em uma reunião vai conseguir identificar tantos sinais. Todo mundo emite esses indícios através das palavras que utiliza. Isso fortalece o fato de que o observador precisa ficar o tempo todo atento às palavras que estão sendo utilizadas e não apenas às perguntas que estão sendo feitas. 52 Já que falamos de perguntas: vale lembrar que as perguntas emitem sinais de duas formas. Primeiro, toda pergunta tem um porquê. E segundo, todo encadeamento de questões leva a uma conclusão, por isso, o observador deve estar se perguntando o tempo todo por que a outra equipe fez determinada pergunta e porque essa questão foi feita em determinada ordem. No fundo, o papel do observador principal é: através dos sinais, tentar preencher – durante a negociação – o modelo Q2 do outro time. Se ele conseguir, a negociação está dominada. Por isso, o observador tem a função fundamental de captar as informações de uma forma mais ativa e observar sinais. Se acontecer de estar sozinho em uma reunião de negociação, basta levar um gravador e durante a pausa tentar ver mais uma vez a negociação, mas com um olhar de um observador, não desperdiçando sinais e, sim, sabendo identificá-los. Ao completar o Modelo Q2, há uma total clareza sobre o processo daquela negociação e quais propostas devem ser feitas. O observador é uma peça fundamental e, por isso, não é à toa que em algumas culturas como a japonesa as pessoas mais sêniors estão vestindo o paletó de observador. 53 Visto isso, quero compartilhar uma história com vocês. Um insucesso meu, que nos leva a refletir sobre o papel de uma boa argumentação É bom compartilhar histórias de sucesso e insucesso também. Mesmo como um negociador treinado e capacitado, confesso que falhamos. E eu falo que nós falhamos muito quando estamos lidando com pessoas que gostamos muito ou que temos bastante intimidade. Acabamos indo de coração aberto e falhando nas nossas negociações. Eu vou contar uma situação que passei com minha esposa em setembro de 2019. Eu viajo muito pelo Brasil e pelo mundo dando palestras e treinamentos. Uma vez, eu estava voltando de São Luís para o Rio de Janeiro em uma viagem muito cansativa, pois alteraram a rota do vôo devido a alguns problemas operacionais e fizemos escala em Brasília e São Paulo. Assim que cheguei no Rio de Janeiro, era uma sexta-feira, eu já estava muito cansado e era por volta de meia-noite. Quando entrei em casa, minha esposa estava esperando vestida para sair, ou seja, ela estava iniciando uma negociação. Eu logo perguntei: “Amor, você está querendo sair, né?” Ela respondeu que sim. Eu falei: “Então, eu não queria sair hoje. Eu estou muito, muito cansado mesmo. Amanhã de manhã tenho reunião de conselho 7h00 da manhã, não 54 posso ficar cansado numa reunião de conselho. Não posso cochilar. Você sabe, tenho que estar ativo. Vamos sair outro dia. Hoje não vai dar.” Ela falou: “Amor, lembra aquele casal que a gente conheceu na semana passada no bar? Eles mandaram uma mensagem querendo sair hoje. É a primeira vez que eles convidam a gente para sair. Vai ficar chato a gente negar logo na primeira vez.” E aí eu coloquei outro argumento na mesa. Um bom argumento, por sinal. Eu disse: “Esse é mais um motivo. Casal novo, que a gente nem conhece direito. Aí vai ser aquele papo chato e tal. Se fosse um casal amigo nosso, eu iria até me distrair e seria positivo para mim.” E ela falou: “Os Hupsel vão também. Seu problema está resolvido.” O que acabou acontecendo? Os Hupsel são grandes amigos, na verdade, somos padrinhos de casamento deles. Eu tinha um argumento muito bom que era o cansaço. Mas ao invés de me ater ao meu argumento bom e forte, eu “over” argumentei. Tentando blindar minha linha argumentativa, eu acabei botando mais um argumento na mesa, e esse foi um argumento fraco. Existe uma lei na negociação que eu quero que você leve para a vida: um argumento fraco destrói toda sua linha de argumentação por mais forte que ela seja. A “over” argumentação é muito comum. Na nossa cultura, na verdade, isso é muito normal. Colocar argumentos sobre argumentos, achando que a nossa linha 55 de argumentação vai ficar mais forte, acaba atrapalhando. Mas, na verdade, nós corremos o risco de colocar uma argumentação fraca na mesa, destruindo todos os nossos processos. Tome muito cuidado com isso e blinde os seus argumentos, porque eles precisam ser extremamente pensados. Durante a etapa de execução, evitem inventar argumentos, porque corre o risco de você colocar um argumento fraco. Leve isso para a vida. Um comentário fraco estraga tudo. Cada argumento que você colocar precisa ser blindado. Verifique isso durante a fase de preparação para que na fase de execução você não tenha surpresas. Antes de irmos para o próximo capítulo, gostaria de deixar uma dica adicional Durante o marco de execução, o sintetizador precisa estar muito ativo, fazendo o tempo todo perguntas. No entanto, ele pode ter um certo grau de dificuldade em colocar perguntas durante o calor da etapa de execução. E às vezes são perguntas bobas que precisam ser feitas somente para acalmar a negociação ou são perguntas importantes que precisam ser feitas para obter informações para eles tomarem decisões. Mas como pensar nas perguntas na hora? É muito difícil. Então, voltando um pouco na etapa de preparação, é muito importante que o 56 sintetizador em conjunto com a sua equipe prepare uma lista de perguntas, desde perguntas importantes que precisam ser feitas para obter informações estratégicas, até perguntas bobas para ganhar tempo e acalmar os ânimos. Com isso você perceberá que o trabalho do sintetizador fica muito mais fácil durante etapa de execução. 57 Quinto capítulo Proposta Neste capítulo, vamos falar sobre proposta e encerramento, dois tópicos extremamente importantes. E uma das técnicas mais essenciais do curso também será abordada. Agora, o foco está na proposta. O primeiro tópico que eu gosto de falar sobre proposta é algo que todo mundo já me ouviu falando: o óbvio precisa ser dito. E qual é o óbvio dentro de uma proposta? É aonde você vai colocar a proposta. Ela não deve ser colocada nem acima nem abaixo da sua preferência. Lembra a preferência? A Zopa? A sua proposta deve estar exatamente na sua zona de preferência. Essa é a primeira dica fundamental. Culturalmente, nós temos a tendência de colocar a proposta muitas vezes abaixo da nossa preferência a gente acaba cedendo um pouco. Não existe razão para isso. A proposta é sempre na preferência. Quem não coloca abaixo, acaba dilatando sua preferência – pedindo a mais do que quer na verdade. Lembre-se: a ZOPA e composta pela intercessãodos MAPANs. Você dilatar a sua preferência só irá criar dificuldades para você se aproximar 58 da ZOPA de forma estruturada. Proposta é sempre na preferência. E aí entra o segundo óbvio que também precisa ser dito e pensado por você. Se na etapa de preparação você já tem a sua preferência, por que muita gente demora e fica enrolando para colocar a proposta? Você deve expor sua proposta logo na mesa. Devo esperar a outra parte colocar a proposta? Não. Coloque logo sua proposta e tenha o poder da ancoragem a seu favor. Terceiro óbvio que precisa ser dito no momento da proposta: a proposta deve ser completa e específica. Tudo o que você quer deve estar contemplada na proposta. Tanto as propostas quanto as contrapropostas, na verdade, principalmente as contrapropostas, devem ser o tempo todo específicas. Quem aqui nunca fez uma contraproposta dizendo: “você não pode diminuir um pouco? “Ou “Você não pode aumentar um pouco esse prazo? “Entenda que “um pouco”, “um pouquinho”, “um pouco mais” não existe em proposta de contraproposta. Tanto a proposta quanto a contraproposta tem que ser o tempo todo clara. Ela deve ser completa e ela deve ser específica. Esses são os óbvios que eu queria transferir. O óbvio pode parecer pouco depois de ser dito, mas lembre-se disso: a 59 sua proposta deve ser colocada sempre na preferência, que já foi escolhida na etapa de preparação. Não tem porque você não colocar logo essa proposta. Coloque a proposta na mesa e ancore a sua negociação. E mais: coloque a sua proposta e a contraproposta de forma completa e de forma específica. E como fazer a proposta perfeita? Agora, vou ensinar como fazer uma proposta perfeita. Existem muitas pessoas que não sabem ou fazem mal esta etapa. E por fazerem mal a proposta, ficam muitas vezes sem resposta. Agora, eu vou ensinar o passo a passo que você precisa cumprir para fazer uma proposta de alto impacto. Sem querer parecer arrogante, esse framework tem funcionado muito bem nas empresas que aplicam nossa metodologia. Evite sempre o que todo mundo faz. Geralmente, as pessoas argumentam, argumentam, argumentam, fazem a proposta e depois voltam a argumentar. Não. O processo correto é: Argumenta, faz proposta e para. Mas não é só isso. Detalharemos a seguir. Qualquer atração colocada depois da proposta faz você tirar o poder dela e a pessoa que está ouvindo vai acabar retribuindo sua argumentação. Possivelmente, o outro negociador vai contra argumentar e esquecer da sua 60 proposta. Ou seja, não faça o argumento, proposta e argumento. Exponha argumento e já parta para a colocação de proposta. Depois pare. Agora, na colocação de proposta, eu quero ensinar um framework, desenhado por nós do BBI Of Chicago, com base no que aprendi nas melhores escolas de negociação do mundo. Esse processo é um bate bola muito entrosado entre o líder e o sintetizador na hora de colocar a proposta. Vamos lá... O líder deve fazer a sua proposta e depois exemplificá-la. Esse é o gatilho da materialização. As pessoas têm mais tendência a aceitar alguma situação quando conseguem visualizar o que foi dito. Além de colocar a proposta com números e dados, exemplifique. Materialize para a outra parte. Faça ele ver como será o futuro se ele aceitar a proposta. Após isso, neste momento, entra o sintetizador. Depois de exemplificar, a pessoa do outro lado estará no mundo da fantasia, imaginando como será depois de aceitar a negociação. O sintetizador vem para colocar os pés no chão e trazer o resumo do que foi dito. Por exemplo: “nosso líder disse que a proposta compreende isso e aquilo e até deu exemplo disso e disso.” 61 Desta maneira, o sintetizador resume tudo o que foi dito, trazendo o outro lado de volta para a realidade e abrindo caminho para o líder entrar com um call to action final. Muita gente esquece dessa parte, mas é quando o líder expõe a pergunta central e questiona: “E aí você aceita proposta? “Esse call to action é fundamental e vai exigir da outra parte uma resposta. Depois do call to action, silencie. Silêncio é poder. Lembre-se que em capítulos atrás foi dito que esse não é um livro multicultural, mas que iria falar muito de cultura. O ser humano ocidental convive mal com silêncio. Muitas pessoas chegam em casa, ligam o rádio, Youtube, tv, enfim. Pode acontecer até de não conseguir andar de carro com o rádio com defeito, porque nós convivemos mal com silêncio. Mas, lembre-se, a minha dica é: depois do call to action, silencie. Saiba conviver com silêncio, porque se você souber conviver com ele a outra parte ficará constrangida e vai forçadamente dar uma resposta. Se ela fugir e tentar não responder, faça novamente o call to action, por exemplo: “Só voltando, o que você acha da minha proposta? “ O que está escrito aqui é fundamental. Jamais pratique o 62 modelo de argumentação, proposta e argumentação. Sempre considere a argumentação, proposta e silêncio. Vamos agora falar sobre cordeiros? Essa técnica que irei ensinar aqui não foi desenvolvida por mim. Na verdade, as 4 maiores escolas de negociação do mundo contam histórias parecidas com a que contarei abaixo para exemplificar essa técnica. Isso demonstra o peso que ela tem dentro da negociação profissional. Agora, você vai conhecer a técnica mais importante de todo o livro de negociação. Enquanto escrevo, um carneiro está ao meu lado tempo todo. E para que você entenda a história desse animal, eu vou contar para uma lenda indígena canadense. Na verdade, a lenda não é indígena nem canadense. E por que eu falo que ela é indígena e canadense? Porque as pessoas prestam mais atenção quando percebem que uma lenda é de fora. E por que o Canadá? Esse é um país que todo mundo gosta, que não causa conflitos e ideal para não criar polêmicas. E a lenda é a seguinte: existia um caçador canadense que tinha quatro filhos, que logicamente eram canadenses. Durante uma nevasca muito grande no Canadá, com 3 metros de neve, a família estava sem comida. As crianças estavam literalmente com fome, sem comida nenhuma há 3 dias, coube ao caçador a decisão de sair para achar 63 comida. Ele andou durante horas e finalmente achou um carneiro. E aí ele rapidamente atirou no animal, o pegou no colo, colocou no ombro e começou a voltar com carneiro para casa. Com isso, passou-se 1 km e ele viu um lobo. Claramente, o animal logo começou uma negociação apenas com o olhar. A negociação partia do princípio de que o lobo queria um pedaço do carneiro e o caçador entendeu este recado. Ele cortou uma perna do carneiro e jogou para o lobo. O animal gostou, saiu feliz e pronto. No entanto, o caçador andou mais de 2 km e aí vieram três lobos. Ele cortou um pedaço maior, proporcional para os três, e jogou para os lobos. Eles saíram felizes, lógico, e o caçador também porque salvou sua vida. Ele andou mais 2 km e vieram seis lobos. Nisso, ele pensou que deveria cortar um pedaço bem maior, mas já quase não tinha cordeiro e mesmo assim ele entregou sua comida para os seis lobos. E aí o caçador andou mais 1 km quando apareceu uma alcateia. Ele não teve outra opção senão entregar o cordeiro inteiro para os animais, mas quando o caçador voltou para casa, não conseguiu alimentar família. 64 A pergunta que deve ser feita é: qual foi o erro do caçador? Muita gente diz que foi o fato de ele ter entregue o primeiro pedaço do carneiro. Ou também dizem que o caçador poderia ter matado o lobo porque estava com uma arma. Mas matá-lo seria uma negociação por princípio? Na verdade, claramente, seria uma negociação por barganha, até porque os dois não sairiam melhores do que entraram. O lobo seria morto e o caçador ficaria feliz em um primeiroinstante, mas depois, quando ele encontrasse os outros lobos, provavelmente os animais não desejariam apenas o cordeiro, mas sim vingança pela morte do companheiro. Mas, afinal, qual foi o erro do caçador? O primeiro problema foi não utilizar o modelo de cessão e concessão. Ele simplesmente foi cedendo, gerando ganância. E mais: muitas pessoas utilizam esse modelo na negociação, mas fazem da maneira errada. Por isso, eu vou ensinar qual é o modelo de cessão e concessão. Antes de tudo, é importante salientar que nunca se pode ceder algo sem pedir uma concessão. Mas isso não é suficiente. É preciso saber fazer isso. Deve haver muito cuidado com a forma na qual é conduzido esse processo, porque muita gente faz de maneira errada achando que está no modo correto. Há um exemplo muito bom que é o vendedor de loja: quando você vai comprar uma calça em qualquer loja e pergunta quanto custa o produto, o vendedor responde um preço qualquer, R$ 300. E aí você 65 responde dizendo que está caro e pede o clássico desconto. O vendedor logo diz que dá para fazer um desconto de 10%, mas pergunta se você pode então pagar a vista. Se você for uma pessoa bem treinada, nesse caso, vai perceber um erro e vai falar que gostou dos 10%, mas já expõe e questiona se pode pagar em duas vezes. Você já viu isso acontecendo? Uma das informações mais importantes deste livro é o modelo da concessão que será explicado agora... Voltemos ao exemplo: se eu fosse o vendedor como eu deveria agir? “Você consegue pagar à vista e em dinheiro? Porque se você conseguir pagar à vista em dinheiro, eu tento ver se dá para dar 10% de desconto para você.” Isso é o mais importante e muita gente perde margem na negociação por causa disso. A pessoa faz o que eu chamo de entregar o cordeiro, cedendo e entregando cessões sem pedir concessões em troca. Ou, muitas vezes, as pessoas falam a cessão antes de colocar a concessão como uma contrapartida. Vejo muito executivos fazendo isso, e até mesmo presidentes de diversos países: “Ah, mandei para o congresso a proposta da reforma previdenciária e a gente colocou idade de 65, mas topamos negociar. Dá para conversar sobre 62. “Não se perca. Você já entregou cordeiro, agora já era. Faça o modelo dessa concessão, mas sempre coloque a concessão como condição para desbloquear a sua cessão. Não entregue cordeiros! É por 66 isso que tenho um animal desses de pelúcia na minha mesa e aonde quer que eu esteja. Lembre-se sempre de não entregar cordeiros. Iremos falar agora um pouco mais sobre as possíveis concessões: o famoso último quadrante do modelo Q2: Quando se fala em concessões, o último quadrante do modelo Q2, temos um problema: concessões funcionam como um objeto que você coloca no bolso, vai para a rua e está disposto a perder. Você tende a subvaloriza-lo. Você precisa sempre olhar a concessão que você listou a luz da necessidade do outro. Não olhe qual o valor dessa cessão para você e sim para a outra pessoa. Isso é fundamental. Irei compartilhar com você um exemplo prático que eu passei muitos anos atrás durante um dos primeiros projetos de consultoria que eu fiz. Nosso objetivo com o projeto era maximizar a receita e diminuir custos de uma companhia aérea estrangeira. Vamos aos detalhes do projeto... Antes de tudo, é preciso saber: toda companhia aérea com vôo internacional trabalha com overbooking. Ela acaba vendendo mais bilhetes do que ela pode comportar porque não vale a pena um avião com assento vazio. Sempre 67 acontece de alguém cancelar na hora ou esquecer da viagem, então sempre trabalham com overbooking. Só que isso gera problemas e a orientação da companhia quando acontecem problemas é simples: você entrou na fila e aconteceu um overbooking. O atendente fala: “você está indo para Nova Iorque, né? Então, a gente teve um probleminha de overbooking na classe econômica. Você aceita ir para classe executiva?” Sinceramente, qual o maluco vai dizer que não topa? Todo mundo aceita. Mas quando você joga alguém para a classe executiva, existem custos para a companhia aérea, geralmente em torno de 50 a 80 dólares para cobrir a refeição diferenciada, o welcome kit etc. Nós no nosso projeto, decidimos mudar esse procedimento. No processo novo de overbooking, a atendente não irá falar para o cliente sobre o problema. Ela irá iniciar o que chamamos de “protocolo de aproximação”. “Oi fulano tudo bem? Você está indo para Nova Iorque, certo? Estamos vendo aqui. Seu nome é João, né? Ah, o mesmo nome do meu filho. “O primeiro passo é gerar uma identificação com a pessoa que está recebendo essa mensagem. Seja pelo nome, pelo aniversário ou alguma informação que foi captada, o importante é gerar uma identificação com outro. E aí a atendente faz uma proposta para essa pessoa. “Nossa! Me identifiquei com você e gostaria de te fazer uma proposta. Eu tenho direito a isso, 68 mas quase não faço com ninguém. Mas eu posso deixar você fazer um upgrade para classe executiva. Você vai ter uma tacinha de champanhe, embarque prioritário, sala vip, refeição diferenciada etc. “Tudo isso é a valorização da sua concessão. E aí você lança a proposta. “Essa promoção que eu tenho aqui em mãos permite você ir para a classe executiva e pagar apenas 70 dólares”. Eu acompanhei esse processo durante cinco anos e 93% das pessoas toparam ir para classe executiva. O resultado foi fantástico! Para a companhia aérea, é muito fácil ceder uma vaga na classe executiva porque aquele voo vai decolar de qualquer jeito, mas não basta apenas isso. É importante saber valorizar as nossas concessões. Nós só valorizamos quando olhamos no olhar dos outros. Para a companhia aérea, o custo de colocar alguém lá é baixo, mas perde margem. Para o cliente, aquela mudança é um benefício estrondoso. Ele paga 500 dólares por uma passagem até Nova Iorque em uma classe econômica, mas pagaria 2.000 dólares na classe executiva. Para o cliente, essa mudança teria um valor agregado de 1.500 dólares! Saiba valorizar o que você está entregando! Agora que já falamos sobre valorizar suas concessões, quero conversar com você sobre um ponto que todo mundo irá passar uma vez na vida: uma proposta absurda. Pergunto a você: como reagir a uma proposta absurda? 69 Algumas verdades na vida: você irá envelhecer, todos um dia irão morrer e em algum momento da sua vida, você irá receber uma proposta absurda. E como reagir a isso se você não é treinado? O instinto básico das pessoas é ficar argumentando e contra argumentando em cima dessa proposta absurda. Não faça isso. Com este livro, você vai entender a minha sugestão ao receber uma proposta absurda. Na verdade, para explicar sobre essa sugestão, vou compartilhar mais um caso de consultoria, dessa vez para uma empresa de concessão de barcas. A instituição ganhou a concessão de uma operação de barcas nos Estados Unidos. A prefeitura da cidade enviou então a minuta para avaliarmos e esta veio com uma cláusula absurda. A proposta da empresa tinha os valores de concessões que nós receberíamos, mas havia também uma cláusula de multa. Tinha um KPI, um indicador de desempenho, que dizia o seguinte: a barca deve trafegar numa velocidade de X nós em média e para cada dia que trafegasse abaixo da velocidade de X nós, teria que ser pago uma multa de um milhão de dólares por nó. Esse é um exemplo de proposta absurda. A tendência, se você for mal treinado em uma negociação, é dizer que isso é absurdo e contra-argumentar. Mas na verdade, nossa resposta foi muito calma e clara. Nós aplicamos o modelo de concessão e cessão e dissemos o seguinte: “se vocês aceitarem que a cada dia que nós trafegarmos em uma 70 velocidade acima de X nós, a gente receba um bônus de 1 milhão por
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