Prévia do material em texto
EDIÇÃO 6 ANO 6 N 2 ABRIL/JUNHO/2018 ISSN 2358 - 6133 2 Coordenadora do Projeto: Ma. Andréa Kochhann Editorial Artigos científicos Artigos de opinião Relato de experiência Entrevistas Informação Resenhas Cruzadinhas Matando o tédio Índice EDITORAS Andréa Kochhann Maria Eneida da Silva Este trabalho é reflexo da interdisciplinaridade e da indissociabilidade pesqui- sa, ensino e extensão e compõe as atividades do GEFOPI – Grupo de Estudos em Formação de Professores e Interdisciplinaridade. É fruto de uma oficina re- alizada com a turma de Pós Graduação Stricto Sensu em Educação, na discipli- na “Pedagogia Socialista”, ministrada pelo Prof. Dr. Erlando da Silva Rêses, na Universidade de Brasília-UnB. IMAGEM DA CAPA https://br.freepik.com/vetores-gratis/punho- cerrado-no-feixe-radial_687831.htm Catalogação na Fonte Comissão Técnica do Sistema Integrado de Bibliotecas Regionais (SIBRE) Universidade Estadual de Goiás EDIÇÃO 6 ANO 6 N 2 ABRIL/JUNHO/2018 ISSN 2358 - 6133 Revista pedagógica: Pedagogia Socialista / Ma. Andréa Kochhann (Coord.) - ed. 6 ano 6 n. 2 (2018). – Anápolis: UEG, 2018. 28 p. il. ISSN: 2358- 6133 1. Aprendizagem. 2. Ensino Superior. 3. Pedagogia Socialista . I. GEFOPI – Grupo de Estudos em Formação de Professores e Interdisciplinaridade- UEG. II. Título. CDU 37.013 3 O convite a esta leitura é um convite à aventura Uma aventura que navegou no escrito à mão Que se deliciou com Gutemberg Mas se deslumbrou com o texto eletrônico Hoje, de Personal Computers a Smartphones Reconfiguram-se as maneiras de ler e de conhecer Ler o que nos impõem Conhecer o que nos permitem Comprar o que não podemos Epicuro tem razão! Por isso, o convite hoje é para a aventura! Da coragem da leitura e da coragem do escrito Combate ao ensino teatral consumidor Da apropriação do trabalho no capital: a alienação Mas no trabalho ontológico: a emancipação Instrução e produção material na escola educação Pela Pedagogia da omnilateralidade Em totalidade das forças e totalidade do eu Assim, manifestam-se os textos em gêneros diversos que são trazidos a esta revista, cuja edição discute a Pedagogia Socialista sob os ideais de Marx e Engels, bem co- mo outros teóricos que se inspiraram no eixo do pensamento destes célebres teóricos e assumiram a crítica à escola capitalista. A 26ª edição da Revista Pedagógica conta com a coordenação e edição de membros do Grupo de Estudos em Formação de Pro- fessores e Interdisciplinaridade – GEFOPI – e a valiosa colaboração dos alunos da disciplina Pedagogia Socialista da Faculdade de Educação da Universidade de Bra- sília – UnB. Em trabalho coletivo, foram produzidos: artigos científicos; artigos de opinião; resenhas de filme e livros; entrevistas; charges e demais gêneros que pudes- sem, de forma descontraída e sem perder o academicismo, compor um espaço valio- so de discussão da Pedagogia Socialista. Uma universidade pública é o lócus que po- de permitir ao trabalhador uma formação científica elevada para o conduzir à com- preensão do processo e das contradições sociais e políticas. Dessa forma, a Revista Pedagógica do GEFOPI, ao estilo magazine, é instrumento de produção e também de socialização das ideias contra hegemônicas que nos permitem pensar a educação sob o prisma da construção do ser social e não mais do ser para a sociedade. Divirtam-se e instruam-se por meio das próximas páginas. As editoras 4 COMO GRAMSCI PENSOU O PRINCÍPIO EDUCATIVO? Gramsci foi membro-fundador e secretário-geral do Partido Italiano (PCI), e deputado pelo distrito do Vêneto, sendo preso pelo regime fascista de Benito Musso- lini. É reconhecido pela sua teoria da hegemonia cultural que descreve como o Esta- do usa, nas sociedades ocidentais, as instituições culturais para conservar o poder. Para o autor “todo grupo social, nascendo no terreno originário de uma função es- sencial no mundo da produção econômica cria para si, ao mesmo tempo, organica- mente uma ou mais camadas de intelectuais que lhe dão homogeneidade e consciên- cia da própria função, não apenas no campo econômico, mas também no social e po- lítico” (1995, p. 9). Os grupos sociais que nascem a partir do modo como se estrutura o mundo da produção material criam, de modo orgânico, seus intelectuais, que lhes dão homegeneidade ideológica e política. Os intelectuais seriam então, os organizadores da hegemonia capazes de formar opinião. Todos os homens são intelectuais, embora nem todos possuam esta função na sociedade. Assim, todos desenvolvem atividades intelectuais independente do traba- lho que realizam, pois não se pode separar o homo faber do homo sapiens. A hege- monia para o autor seria a capacidade das classes dominantes de manutenção do po- der pelo consenso, que é espontâneo e dado pelas grandes massas da população ao grupo dominante. Quando isto não funciona, o aparato de coerção estatal assegura legalmente a disciplina dos grupos pela força. Outro conceito desenvolvido por Gramsci é a cultura como manifestação da espiritualidade humana – ciência, arte, religião, filosofia , política e educação. INTRODUÇÃO O presente artigo foi elaborado a partir de estudos bibliográficos da disciplina Pedagogia Socialista, ministrada na Pós- Graduação Stricto Sensu da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília, tratando do princípio educativo e da escola unitária em Gramsci que também são defendidos por Pistrak. ANDRÉA KOCHHANN NATHÁLIA BARROS RAMOS Pedagoga; graduanda em História e mestranda em Educação pela Universi- dade de Brasília - UnB Pedagoga, mestre em Educação e doutoranda em Educação pe- la Universidade de Brasília UnB. Monitora da disciplina Pedagogia Socialista. GRAMSCI E PISTRAK: contribuições para uma pedagogia socialista 5 Esta constitui um produto no desenvol- vimento histórico de um grupo social, bem como possibilita a consciência política ca- paz de se opor efetivamente à da sociedade burguesa dominante. É por meio dela que se constitui a fonte da vontade coletiva e do comportamento coletivo. Ao criticar a escola dual, Gramsci propõe a escola unitária que seria “uma es- cola única de cultura geral, humanista, for- mativa, que equilibre de modo justo o de- senvolvimento da capacidade de trabalhar manualmente, teoricamente, industrial- mente, o desenvolvimento das capacidades de trabalho intelectual” (1995, p. 33). Ela deveria propor a tarefa de inserir os jovens na atividade social, depois de tê-los levado a certo grau de maturidade e capacidade, à criação intelectual e prática e a uma certa autonomia na orientação e na iniciativa. Por fim, importante salientar que para ele a escola, na tendência democrática, não pode significar apenas que um operário manual se torne qualificado. QUAL A CONTRIBUIÇÃO DE PISTRAK PARA A EDUCAÇÃO? Pistrak desenvolveu uma proposta pedagógica revolucionária, na perspectiva de uma pedagogia socialista. Para uma educação voltada para as massas e que se opunha à educação tradicional capitalista, é necessário pensar em alguns elementos centrais, que são: relação teoria e prática revolucionária; transformação pela teoria marxista; e atuação do professor na pedagogia comunista como agente revolucionário. Assim como em Marx, o trabalho era central para Pistrak que constituiu a Escola Única do Trabalho, nas comunas, possuindo características de autogestão e auto- organização, tendo o trabalho como princípio educativo. Pelo trabalho é possível atuar sobre a realidade concreta e modificá-la, pois este é um instrumento de luta que pode servir à classe trabalhadora. Esse modelo de escola se baseava no complexo de estu- dos, pelo método dialético. O trabalho pedagógico seria pensado e organizado por complexos temáticos que,segundo Pistrak, permitiria melhor compreensão da realida- de. O conteúdo é visto de forma multidisciplinar e interdisciplinar . É preciso que cada cidadão se torne “governante” e que a sociedade o ponha em condições gerais de poder fazê-lo. Gramsci, amadurecendo a concepção de escola do trabalho, sintetizou que deveria haver uma união também da visão huma- nística. A escola unitária, segundo Gramsci (1995, p. 3) tinha por objetivo a forma- ção de sujeitos intelectuais, ativos “de um modo orgânico, [...] homogeneidade e consciência da própria função, não ape- nas no campo econômico, mas também no social e político [...]”. Desta forma, o sujeito começaria a ter consciência de que suas decisões tem importantes para meio social em que vive e que não deve- ria se deixar levar pelos interesses da classe dominante, ou seja, emancipação humana., tornando todo processo educa- tivo. O princípio educativo pode se ex- pressar em toda sociedade enquanto tra- balho educativo e, mais específico na es- cola, enquanto trabalho pedagógico. 6 CONSIDERAÇÕES Defendemos uma educação que vise à formação docente e ao trabalho concreto para a crítica, a autonomia, a omnilateralidade e a luta pela emancipação humana. Para isso, acreditamos que uma pedagogia contra-hegemônica ou pedagogia socialis- ta pode favorecer essa construção na luta diária e coletiva. Para formar-se no princí- pio educativo é preciso uma prática revolucionária, com sujeitos revolucionários e que possuam auto-organização. Eis o vir a ser. REFERÊNCIAS FRIGOTTO, Gaudêncio. Educação e a crise do capitalismo real. 6. ed. São Paulo: cortez, 2010. GRAMSCI, Antonio. Concepção dialética da história. Tradução de Carlos Nelson Coutinho. 10. ed. Rio de Janeiro: Ed. Civilização Brasileira, 1995. PISTRAK, Moisey Mikhaylovich. Fundamentos da Escola do Trabalho. 3. ed. São Paulo: Expressão Popular, 2011. Para Pistrak (2011, p. 23-24) “a es- cola sempre foi uma arma nas mãos das classes dirigentes. [...]. A escola é a ar- ma ideológica da revolução”. Nas socie- dades capitalistas, toda forma de traba- lho em suas relações sociais estabeleci- das podem vir a ser para a alienação e a reprodução ou para a emancipação e a autonomia. Para o autor, a base da esco- la do trabalho deve seguir os princípios de relação com a realidade e de auto- organização dos alunos, em que o traba- lho nas escolas esteja vinculado a ativi- dades sociais, reais e concretas, social- mente uteis, para não perder seu valor essencial e ser meramente atividade téc- nica e anêmica. Para tanto, a auto- organização dos alunos é importante, visto que não podem ser atividades rea- lizadas por coerção. A auto-organização dos alunos é fundamental em uma pedagogia social. A escola unitária, na perspectiva de Fri- gotto (2010, p. 190) considera que “ao definir-se o conhecimento a ser trabalha- do (conteúdos, processos, métodos, téc- nicas etc.), para ser orgânico, deve ter como ponto de partida a realidade dada dos sujeitos sociais concretos.”, bem co- mo é preciso evitar o teorismo (teoria), assim como o ativismo (prática) e primar pela práxis. Isso significa valorizar a prá- tica social com a práxis. Destarte, é im- portante considerarmos que o trabalho pedagógico pode ser alicerçado pela prá- xis e vir a ser uma prática revolucionária. A unidade teoria e prática é necessária no contexto da prática revolucionária por meio do trabalho pedagógico enquanto princípio educativo. 7 MARX, ENGELS E A EDUCAÇÃO 1. Introdução As constatações de Marx e Engels subverteram a compreensão liberal de educação que sublima uma possível “autonomia” do complexo em questão quando comparado à totalidade social em que se insere. Para ambos, os objetivos e os princípios hegemônicos de um determinado processo educativo vinculam- se às necessidades da sociedade em que este se desenvolve. No âmbito do modelo societal burguês, por exemplo, a dinâmica educativa destinada à classe trabalhadora atrela-se à preparação de “força de trabalho” descartável, acrítica e subserviente à forma de acumulação do sistema. Nas páginas seguintes, levando em consideração as formulações dos revolucionários supracitados, apresentaremos alguns elementos pedagógicos imprescindíveis à constituição de um complexo educacional partícipe de uma totalidade social sem classes, ancorada em produtores autônomos associados e em que os seres humanos se coloquem a serviço de uma igualdade material que, por sua vez, ampliará a possibilidade de diferenciação das personalidades sociais a partir das atividades desenvolvidas no tempo de não trabalho. 2. Desenvolvimento O ser humano se destaca do complexo “puramente” orgânico na medida em que transforma intencionalmente o meio que o circunda com o objetivo de produzir e reproduzir materialmente a sua existência. Tal ação, protoforma de todas as demais práxis sociais, submete a espécie animal “homo sapiens sapiens” a um “vir-a-ser” socialmente determinado, em que a consciência - tanto do singular da espécie quanto do gênero como um todo - assume papel determinante no devir. Isto pois, ao alterar o meio de forma planejada, suprindo as necessidades do estômago e do imaginário, ou seja, ao trabalhar, os seres sociais modificam a natureza e a si próprios, inserindo o “novo” de forma recorrente na realidade, desenvolvendo inéditos conhecimentos e inauditas habilidades, posteriormente generalizáveis por toda a espécie e as demais ações sociais. 8 A partir dessa descoberta, Marx e Engels propuseram como elementos estruturais do momento educacional de uma sociedade emancipada e liberta dos grilhões do capital, os seguintes eixos: (i) a unidade entre a educação e o trabalho; (ii) a politecnia; (iii) a vinculação entre a educação e a política; (iv) e a relação entre o “tempo de trabalho” e o “tempo livre”, ou seja, de não trabalho. Se no capitalismo, educa-se a criança e o jovem para o desempenho posterior do “trabalho alienado”, em que o produtor não possui autonomia tanto no momento de criação quanto no processo de objetivação, além de não deter o objeto resultado de sua ação, no comunismo, trabalha-se, de forma “desalienada”, para educar. Assim sendo, o intercâmbio orgânico entre o ser humano e a natureza com o objetivo de produzir os meios de produção e os meios de subsistência – elemento central na constituição das mais distintas sociabilidades, do comunismo originário ao capitalismo dos dias correntes –, torna -se o fundamento do processo de formação. Ademais, como Suchodolski tão bem nos demonstrou em seu texto a “Teoria Marxista da Educação” (1976), a descoberta marxiana de que “é o ser social – sociedade – quem determina a consciência (singular)”, exige um processo de “desalienação”, com efetiva participação da escola, que não pode prescindir de um movimento que revolucione a materialidade capitalista. Destarte, a emancipação terá que transcender o “simples pensar de forma consciente e autorrefletida”, mediado pela “Escola Única do Trabalho”, desaguando em uma sociedade sem a propriedade privada dos meios de produção e em que o trabalho seja autônomo, consciente, livre, associado e universal e, não mais, assalariado e alienado. Na escola citada anteriormente, a “politecnia” – educação tecnológica – ganhará centralidade! Essa, todavia, não deverá ser confundida com um adestramento acrítico em distintas tarefas produtivas, mas, sim, como uma proposta de subversão da dicotomia burguesa entre a teoria e a prática, entre o trabalho manual e o trabalho intelectual, entre o campo e a cidade, nestes termos, a educação tenderá à omnilateralidade, ou seja, à formação humana que leve em consideração os distintos momentos de interação da espécie como meio, afastando-se do atual caráter unilateral, especializado e descontextualizado, tipicamente burguês. Educar, politizando, politizar, educando. Pela discussão e pela prática de relações sociais autênticas, como a autogestão, que se aproximem de uma sociedade em que a liberdade não seja apenas o direito de ser proprietário, educa- se. Assim, consolida-se um processo de “formação humana” a serviço de uma coletividade em que a produção social seja de todos, rompendo, portanto, com a hegemonia ideológica do individualismo e da defesa da propriedade privada dos meios de produção. 9 Por fim, no movimento de constituição da sociedade “em que o desenvolvimento de cada um seja indispensável ao desenvolvimento de todos”, as atividades realizadas no tempo de “não trabalho”, “livre”, estarão disponíveis à totalidade dos seres humanos e não apenas à classe proprietária dos meios de produção e à pequena burguesia (profissionais autônomos e trabalhadores assalariados responsáveis pela gestão do capital da classe de proprietários), como no capitalismo. De mais a mais, o momento livre, no comunismo, de forma distinta do contexto atual, em que o lazer resume-se ao consumo, será preenchido por atividades educativas e culturais que propiciem a adequação dos indivíduos ao potencial genérico, tanto afetivo e intelectual, quanto corporal, propiciando uma educação plena. 3. Considerações Finais A partir de tais contribuições educacionais, sempre inseridas em uma análise mais abrangente sobre a sociedade burguesa e a sua sucessora, a comunista, Marx e Engels, a partir do materialismo histórico-dialético, lançaram luz sobre o caminho a ser trilhado pela escola colocada a serviço de um projeto de humanidade em que as personalidades sociais definirão de forma consciente, livre e voluntária, as funções que desempenharão no processo de produção material da vida do coletivo e em que os desenvolvimentos das capacidades intelectivas, corporais, afetivas e artísticas humanas tornar-se-ão fins em si mesmos! REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS MARX, K. & ENGELS, F. Textos Sobre Educação e Ensino. 2. ed. São Paulo: Moraes, 1992. ROSSI, Vagner Gonçalves. Pedagogia do trabalho: raízes da educação socialista. Volume 1. SP: Editora Moraes, 1981. SAVIANI, D. Trabalho e Educação: fundamentos onto- lógicos e históricos. Revista Brasileira de Educação. V. 12, nº 34, jan/abr. 2007; SUCHODOLSKi, B; WOJNAR, I; MAFRA, J. F. Teoria Marxista da Educação. In: SUCHODOLSKI - Coleção Educadores. Recife: Fundação Joaquim Nabuco, Editora Massangana, 2010. SUCHODOLSKI, Bogdan. Teoria Marxista de Educa- ção. São Paulo: Editorial Estampa, 1976 Thiago Oliveira Queiroz Nunes Doutorando do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação Física da Universidade de Brasília – UnB; Pesquisador do AVANTE/LEFET/FEF/UnB e do GENPEX/FE/UnB. 10 Pedagogia Socialista na Universidade: reflexões a partir de uma disciplina na pós-graduação Escolhemos cursar a disciplina Pe- dagogia Socialista com o intuito de co- nhecer melhor a proposta desta, bem co- mo estudar com maior profundidade os autores socialistas - desde os mais conhe- cidos, como Marx e Engels, aos menos conhecidos, como Mariatégui. A disciplina Pedagogia Socialista foi oferecida pela primeira vez pelo Pro- grama de Pós-graduação da Faculdade de Educação, na Universidade de Brasília - PPGE, ministrada pelo Prof. Dr. Erlando da Silva Rêses. As discussões da discipli- na foram focalizadas pelas problemáticas disponibilizadas pelo professor no plano de curso. As problemáticas direcionaram os debates coletivos, por meio das seguin- tes questões: Como se define o socialismo? Qual a concepção de mundo e soci- edade existentes no mundo? Qual relação entre socialismo e tra- balho? Qual contribuição dos autores cita- dos anteriormente para se pensar a educação? Como seria a pedagogia socialista? Para responder às problemáticas, foi necessário estudar alguns dos principais teóricos da área. Nesse contexto, desta- cam-se Hernecker (1976), Marx e Engels (1963,1983), Rossi (1981), Saviani (2007) Makarenko in Luedemann (2002), Pis- trak (2000), Krupskaya in Freitas et al. (2017), Lunatcharski (1988), Shulgin (2013), Gramsci (1995). De maneira geral, os estudos ratifi- cam uma nova concepção de sociedade e de educação, alicerçada para o desmante- lamento do capitalismo. Salienta-se a ne- cessidade do trabalho como princípio educativo, sendo este o trabalho orienta- do para a luta do proletariado. Nesse con- texto, a educação seria voltada para os princípios pedagógicos coletivos, colabo- rativos, emancipadores e transformado- res. Assim, a pedagogia socialista seria tratada como rompimento das práticas excludentes permeadas pelo capital. Dando prosseguimento, Marx (2012, p. 14) cita que educação popular a cargo do Estado é inconcebível, tendo em vista que para ele: Uma coisa é determinar, por meio de uma lei geral, os recursos para as escolas públicas, as condições de capacitação do pessoal docente, as matérias de ensino, etc., e velar pelo cumprimen- to destas prescrições legais mediante inspetores do Estado, como se faz nos Estados Unidos, e outra coisa completamente diferente é designar o Estado como educador do povo! Longe disto, o que deve ser feito é subtrair a escola a toda in- fluência por parte do governo e da Igreja. Sobre- tudo no Império Prussiano-Alemão (e não vale fugir com o baixo subterfúgio de que se fala de um "Estado futuro"; já vimos o que é este), onde, pelo contrário, é o Estado quem necessita de re- ceber do povo uma educação muito severa. 11 Para o referido autor, a educação deve ser de forma absoluta pública e gra- tuita. O público, nesse caso, não é sinôni- mo de estatal. A escola seria administra- da pela sociedade em geral, assim, seria exercida a democracia de fato (MARX, 2012). Nesse contexto, não há uma esti- pulação de teoria da educação para Marx. Para ele, a educação tem uma função so- cial e deveria combater a alienação e a desumanização proporcionada pelo siste- ma capitalista (MARX, 2012). Assim, cursar Pedagogia Socialista nos demandou uma grande quantidade de leituras, bem como a realização de estu- dos dirigidos, todos voltados para a te- mática. Essas atividades proporcionaram à turma vários momentos de reflexão acerca de questões relevantes como edu- cação, socialismo e superação do capita- lismo, entre outros. Ressalta-se que a disciplina nos ajudou a compreender criticamente como a sociedade está estruturada no sistema capitalista, pois cada vez mais este traz mazelas ao povo, pois o objetivo central é de gerar lucro por meio da exploração dos trabalhadores e manter a ordem soci- al hegemônica vigente. Desta forma, para que essa exploração hedionda dos seres humanos cesse, é necessário que haja a transformação do mundo, bem como da educação (MARX; ENGELS, 1963; MÉSZÁROS, 2008). Essa transformação se dá por meio da educação e do trabalho, pois, conso- ante Saviani (2007), o homem, utilizando a sua racionalidade, trabalha e edu- ca/aprende ao mesmo tempo. REFERÊNCIAS MARX, Karl & ENGELS, F. Obras es- colhidas - Teses sobre Feuerbach. Volu- me 3. Rio de Janeiro: Editorial Vitória, 1963. MARX, Karl. Crítica do Programa de Gotha. Trad. de Rubens Enderle. São Paulo: Boitempo, 2012. MÉSZÁROS, ISTVÁN. A Educação para além do capital. São Paulo: Boi- tempo, 2008. SAVIANI, Dermeval. Trabalho e Edu- cação: fundamentos ontológicos e histó- ricos. Revista Brasileira de Educação. V. 12, no 34, jan/abr. 2007. QUEM SOMOS Marina de Oliveira Sampaio (direita) é pe- dagoga pela UnB. Está cursando mestrado acadêmico em Educação, pela linha de pes- quisa Educação, Tecnologias e Comunicação - ETEC, na UnB. Priscila Campos Pereira (esquerda)é licen- ciada em pedagogia pela UnB. Atualmente, cursa mestrado acadêmico em Educação, pela linha de pesquisa Educação, Tecnologias e Comunicação - ETEC, UnB. No socialismo, o trabalho ocorre coletivamente com a finalidade de que todos se ajudem, portanto, que o traba- lho seja útil a todos na sociedade socia- lista. Trata-se, deste modo, da supera- ção do modelo capitalista. 12 É possível uma pedagogia socialista no Brasil? A escola pública no Brasil é objeto inesgotável de estudos e debates pelos es- tudiosos em Educação, e de modo geral, todos opinam e tentam compreender sua função em um país de extremas desigual- dades. Lanço a questão que intitula este texto para tentar determinar o lugar da pe- dagogia progressista entre nós, professo- res das escolas públicas brasileira, e sem a pretensão de esgotar o debate, lançarei al- guns argumentos para tentarmos iniciar uma discussão necessária entre nós educa- dores. Inicialmente acredito que a nossa escola pública ainda padece de questões estruturantes, como sobre o seu financia- mento e a valorização dos seus profissio- nais, entretanto, podemos discutir o que temos feito para avançar na discussão qualitativa dos aspectos que dizem respei- to aos que fazem a escola, principalmente que concepção de currículo estamos colo- cando em prática e qual o posicionamento político que tomamos frente a necessidade de elevação dos indicadores de aprendiza- gem e prosseguimento dos estudos de nos- sa comunidade acadêmica. Existem propostas interessantes em prática em algumas redes de educa- ção básica, que inclusive se apresentam como progressistas para o contexto das escolas brasileiras: o currículo em movi- mento da rede de educação básica do Dis- trito Federal e o Currículo Integrado da Rede Federal de Educação Profissional (os Institutos Federais). Chamo a atenção pa- ra ambas as propostas por um aspecto em particular e que remonta uma premissa marxiana em Educação: o Trabalho como Princípio Educativo. A articulação da categoria Trabalho com Educação está na base de qualquer proposta progressista de educação, e sua efetivação necessita de tempo e espaço adequados para sua discussão, e espaços de formação, discussão e construção cole- tiva entre os profissionais da educação, al- go ainda incomum entre nós e em nossas escolas. Faço esta constatação a partir dos meus dez anos de docência na educação básica, sempre em escolas públicas. E con- vido aos leitores a remontarem em suas memórias passagens marcantes que se contraponham a minha afirmação. Ser co- letivo não é algo fácil. A teoria não dá conta da realidade, pois para além da percepção necessária de transformação e do caminho, algo mais nos falta para pensar o espaço escolar co- mo espaço comunitário e amplo, envol- vendo estudantes, pais, professores, técni- cos em educação e gestores em torno de uma proposta efetiva de transformação da realidade da escola pública brasileira. 13 Retorno a questão que intitula este texto: É possível uma pedagogia socialista no Brasil? Se pensarmos a sua concepção e implementação nas redes de educação básica no Brasil, a resposta seria afirmati- va, porém entre nós que fazemos a escola pública provavelmente não temos a exata noção do quanto tais propostas seriam mo- bilizadoras da escola e de suas comunida- des. Será que peguei o leitor de surpresa ao afirmar que as propostas do Distrito Fe- deral e dos Institutos Federais são iniciati- vas de pedagogias socialistas? Espero que não, pois a necessária compreensão de am- bas as propostas nos coloca na condição de não só crer em sua efetividade, mas também engajar-se nesta empreitada. Em nossa caminhada de leituras e discussões durante o curso de Pedagogia Socialista do Professor Dr. Erlando Rêses, me pareceu latente o papel revolucionário do professor para que tais iniciativas sejam efetivas. Para o referido autor, a educação deve ser de forma absoluta pública e gra- tuita. O público, nesse caso, não é sinôni- mo de estatal. A escola seria administrada pela so- ciedade em geral, assim, seria exercida a democracia de fato (MARX, 2012). Nesse contexto, não há uma estipulação de teoria da educação para Marx. Para ele, a educa- ção tem uma função social e deveria com- bater a alienação e a desumanização pro- porcionada pelo sistema capitalista (MARX, 2012). Assim, cursar Pedagogia Socialista nos demandou uma grande quantidade de leituras, bem como a reali- zação de estudos dirigidos, todos volta- dos para a temática. Sobre o autor REINOUDS LIMA SILVA Professor da Ensino Básico, Técnico e Tecno- lógico da Rede Federal de Educação Profissio- nal desde 2007; servidor do Instituto Federal do Maranhão; mestre em Educação pelo PPGE/FE e cursa doutorado pelo PPGE/FE. Essas atividades proporcionaram à turma vários momentos de reflexão acerca de questões relevantes como edu- cação, socialismo e superação do capita- lismo, entre outros. Essa transformação se dá por meio da educação e do traba- lho, pois, consoante Saviani (2007), o homem, utilizando a sua racionalidade, trabalha e educa/aprende ao mesmo tempo. O revolucionário pretendido se caracteriza por sua inquietação frente a realidade. Por essa inquietação e na capaci- dade de se perceber como agente efetivo de superação das desigualdades, faz-se premente não só ter a consciência do que nos circunda, mas promover os mei- os efetivos para o avanço das propostas já existentes. Pensar uma escola criati- va, que alie as ações de ensino e pesqui- sa, que se proponha popular como sua identidade, e não como mera caracterís- tica, incluindo não só as pessoas, mas as realidades a serem compreendidas, reve- ladas e esgotadas, como ação e reflexão necessárias para sua efetivação. Enfim, após as necessárias reflexões saberei dar resposta a questão inicial: sim, é possí- vel! E para você? 14 O Professor Dr. Erlando da Silva Rêses é referência na luta e defesa da Educação Pública e Gratuita. Ele é docente da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília e, em 2018, criou e implementou no currí- culo da Pós-graduação na FE da UnB a disciplina Pedagogia Socialista na linha Políticas Públicas e Gestão da Educação (POGE). Coordena programas populares de extensão que visam a democratização de aces- so da classe trabalhadora à universidade pública, dentre os quais desta- camos o Pós-Populares e o FORMANCIPA. Coordena o Grupo de Estu- dos e Pesquisa em Materialismo Histórico-Dialético e Educação (Consciência). É membro da Diretoria Executiva do ANDES-SN (Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior). 1) – Qual é a importância em uma disciplina como Pedagogia Socialista para o ensino superior? Primeiro é trazer ao contexto acadêmi- co autores desse campo da Pedagogia Socialista por se tratar de um conjunto ainda pouco conhecido. Temos aqui na Faculdade de Educação disciplinas que inserem esporadicamente autores desse campo dentro do plano de curso, mas que são trabalhados de forma rápida e aligeirada sem uma discussão mais pro- funda para conhecer a verdadeira con- tribuição desses autores para a Educa- ção. Resolvi dar exclusividade a esse campo, tendo em vista se tratar de um espaço teórico-acadêmico de discussão que está no cerne do modo de produção socialista, num debate e em contraposi- ção ao modo de produção capitalista. A partir disso, criamos formulações na área da educação para trabalhar aspec- tos como a emancipação, reconheci- mento da posição social do indivíduo na sociedade e o papel que se tem em torno dela, enquanto classe social, para gerar possíveis transformações na socie- dade. 2) – No atual cenário politico educaci- onal brasileiro, que reflexões a disci- plina Pedagogia Socialista podem pro- piciarno meio acadêmico? Tudo que estamos presenciando na atual sociedade, em vários aspectos, social, educacional, político, econômico e am- biental, está no cerne da classe domi- nante, aliando essas esferas de modo a gerar retrocessos e retiradas de direitos. Com muita tranquilidade, afirmo, isso é próprio, é típico do modo de produção capitalista. A disciplina, portanto, serve para entendermos que este modelo de sociedade atual faz isso. Se pegarmos textos como “Salário, preço e lucro”, de Karl Marx, percebemos na discussão sobre o salário que o modo de produção capitalista considera que ele não deva ser aumentado para o trabalhador para ampliar o lucro do capitalista e manter a subsunção do trabalho sobre o Capital. 15 Da mesma forma, o detentor dos meios de produção pode entender que não de- va existir sindicatos para atuarem em torno da conquista ou da manutenção de direitos. Portanto, é preciso refletir sobre essas questões, reconhecendo a importância da organização da classe trabalhadora em uma sociedade com divisão social do trabalho, afinal lutar sozinho pode não frutificar, prosperar em avanços no campo político, social e econômico. A primeira atitude que a disciplina toma, inclusive a partir das bases marxistas, é inserir em sua dis- cussão o contexto da práxis, por conse- guinte da organização da classe traba- lhadora. 3) Seria possível criarmos conexões no curso de pós-graduação entre a disciplina Pedagogia Socialista e as demais ofertas curriculares? A cone- xão que podemos encontrar dessa disci- plina com as demais do curso de pós- graduação já tocamos levemente ainda na primeira questão, quando lembra- mos que temos outras disciplinas que trabalham com textos de autores que essa disciplina acabou colocando co- mo, por exemplo, Marx e Engels, auto- res centrais da disciplina Pedagogia So- cialista. Demos uma ênfase maior a es- ses autores durante o curso, no que eles trazem e discutem sobre educação e en- sino. Portanto, tem vínculo com outras disciplinas, como Pensamento Pedagó- gico Contemporâneo, e com autores desse contexto, como Makarenko e Pis- trak. Contudo, há uma invisibilidade das contribuições da Pedagogia Socialista e de vários autores, ainda pouco conheci- dos, como Krupskaya, Lunatcharski, Ma- riatégui, Suchodolski e Shulgin. 4) Que autores considerados em Peda- gogia Socialista poderiam nos inspirar para o enfrentamento necessário às práticas neoliberais que atacam a edu- cação pública? Inicio a entrevista afir- mando que estamos sofrendo duros ata- ques à educação pública. Podemos perce- ber e destacar que, praticamente, todos os autores trabalhados por nós na disciplina, como os citados acima, servem de inspi- ração para o socialismo e para a defesa da educação pública. O próprio Marx e En- gels, em “Comuna de Paris”, objeto de estudo desse curso, fazem menções acer- ca da defesa da educação pública e gra- tuita, que foram mencionadas nas Teses de Feuerbach por eles. Os autores ressal- taram que a educação deve primar por es- sa base para o conhecimento alcançar o máximo de pessoas possíveis, no intuito de promover mudanças e superar o capi- talismo. Aproveito para convidar a quem tiver interesse em conhecer nosso plano do curso, a conversar conosco e, caso seja estudante da pós-graduação da UnB, a cursar a disciplina. WESLEI GARCIA DE PAULO Pós-graduando na FE da UnB 16 Profa. Dra. Andrea Versuti Faculdade de Educação Departamento de Métodos e Técnicas - MTC Programa de Pós- Graduação em Educação (PPGE) Coordenadora da Linha de Pesquisa: Educação, Tecnolo- gia e Comunicação (ETEC) 1) – Qual é a importân- cia em uma disciplina co- mo Pedagogia Socialista para o ensino superior? Considero fundamental que os cursos superiores de Pedagogia possibilitem aos alunos o acesso e a discussão de diferentes perspectivas epistemológi- cas e abordagens sobre Educação, justamente pela complexidade da área en- quanto objeto de estudo. 2) – No atual cenário po- litico educacional brasi- leiro, que reflexões a dis- ciplina Pedagogia Socia- lista podem propiciar no meio acadêmico? Creio que seja justamente fornecer elementos críti- cos e reflexivos para am- pliação do repertório cul- tural dos sujeitos sobre a realidade do país, marcada por um movimento de re- trocesso em vários as- pectos, principalmente no campo da Educação. Neste momento, é preci- so sobretudo qualificar o debate em torno das po- líticas educacionais atu- ais, deixando claro a qual projeto de socieda- de estas atendem e enfa- tizando seus impactos, inclusive para as gera- ções futuras. 3) – Seria possível cri- armos conexões no cur- so de pós-graduação entre a disciplina Peda- gogia Socialista e as de- mais ofertas curricula- res? Penso que as questões que envolvam os rumos do sistema capitalista globalizado na sociedade contemporânea, bem co- mo suas articulações no campo político, social, econômico, simbólico e cultural devam ser temas discutidos tendo em vis- ta seus aspectos ideoló- gicos norteadores. Tal conexão importa à todos aqueles que estão impli- cados direta ou indireta- mente com a formação docente, também na pós- graduação. Estes víncu- los podem sim ser feitos à medida em que se faz necessária a compreen- são do contexto no qual estão inseridos os mais diversos estudos realiza- dos sobre o campo edu- cacional. Weslei Garcia de Paulo Pós-graduando na FE da UnB 17 LUIZ ARAÚJO Ex-presidente do PSOL e professor da FE da Uni- versidade de Brasília. 1) – Qual é a importân- cia em uma disciplina como Pedagogia Socia- lista para o ensino supe- rior? Temos uma disputa de projeto de sociedade e a liberdade de cátedra nos garante fazermos esse embate para todos os cur- sos de pós-graduação e graduação sobre que tipo de mundo devemos ter. É raro colocarmos em uma disciplina essa concepção de mundo, porém a Peda- gogia Socialista fornece elementos teóricos para que possamos compreen- der que é possível termos uma nova ótica e uma no- va concepção da necessi- dade de se lutar e se im- plementar o socialismo. Há várias experiências bem sucedidas de implan- tação dessa disciplina. 2) – No atual cenário politico educacional brasileiro, que reflexões a disciplina Peda- gogia Socialista podem pro- piciar no meio acadêmico? Vivemos um momento de um golpe parlamentar, que é um retrocesso, e ao mesmo tempo um crescimento das concep- ções conservadoras no meio educacional e estamos discu- tindo de forma parcelada essa problemática. O Projeto Esco- la sem Partido nos ataca e te- mos que enfrentar isso, sofre- mos uma mudança curricular, uma uniformização dos currí- culos e temos que enfrentar isso. E uma disciplina como Pedagogia Socialista nos dá uma proposta global para esse enfrentamento e também ana- lisar as causas desse conserva- dorismo tão latente. Além de propor uma alternativa a esse projeto atrasado e conserva- dor, essa disciplina dá o con- junto das críticas que estão muito fragmentadas em rela- ção aos ataques que sofremos no campo teórico com muita qualidade e visando transfor- mações. Ela além de possibilitar elementos teóricos, tam- bém fomenta condições práticas de se discutir a pe- dagogia que não sejam as formas tecnicistas de re- produção da exploração e preconceitos que legiti- mam a forma da explora- ção do homem pelo ho- mem que acontece em nos- sa sociedade. Ela pauta aos alunos que a pedagogia não seja algo neutra, mas todas elas possuem um po- sicionamento. Essa disci- plina é fundamental por- que esclarece e fornece elementos para perceber que existem nas outras pe- dagogias um viés ideológi- co hegemônico de explora- ção nos cursos de gradua-ção e pós-graduação. 18 3) – Seria possível criarmos conexões no curso de pós-graduação entre a disciplina Pedagogia Socialista e as demais ofertas curriculares? Não conexões diretas, mas existe uma disputa de projeto de mundos presentes teoricamente na Pós-graduação. Peda- gogia Socialista dá elementos para que possamos sair para essa disputa com uma visão mais articulada. Muitas teses tentam abstrair a existência de visão de mundo dos projetos societários, como se isso já não fosse necessário, e poder- mos reafirmar um projeto do socialis- mo e mostrar que esse pensamento se traduziu em teorias e práticas pedagógi- cas nos auxiliam a enfrentar certa vala comum de que não há mais narrativas universais e que quaisquer técnicas e temas específicos sejam suficientes pa- ra se analisar o mundo. Também deve contribuir para que, em relação ao soci- alismo, não se faça apenas uma profis- são de fé, afirmando utilizar o Materia- lismo Histórico Dialético e acabar não usando nenhuma das categorias nos va- riados trabalhos apresentados na Pós- graduação. Por isso essa disciplina é importante para dar mais rigidez em muitos trabalhos que se denominam marxistas e que na verdade apenas re- petem os clássicos e não se apropriam do instrumental para se fazer o traba- lho. 4) – Que autores considerados em Pe- dagogia Socialista poderiam nos inspi- rar para o enfrentamento necessário às práticas neoliberais que atacam a edu- cação pública? Para esse quadro específico de ataques a escola pública e as universidades públi- cas, gostaria de destacar Florestan Fernan- des. Uma pessoa pouco lida na Educação, mas lido na sociologia, ainda assim pouco na sociologia pós-moderna. Florestan pensou de forma marxista a educação na realidade brasileira a partir de suas carac- terísticas, utilizando claramente o método dialético para analisar a realidade e não transpôs experiências sem dialogar com ela. Produziu muito a partir dessa visão de sociedade para a educação. Travou em três momentos distintos uma batalha para defender a escola pública: na década de 1940 ainda jovem; na década de 1960 na era Vargas e formulação da LDB e na dé- cada de 1980, como Parlamentar na Cons- tituinte, onde lutou para que o setor priva- do não se apropriasse dos recursos públi- cos. O considero um símbolo de um pen- sador coerente, muito sólido que produziu bastante com a realidade brasileira. Sendo totalmente socialista e tendo tudo a ver com a guerra que travamos hoje pela ma- nutenção da escola pública. Ler Florestan Fernandes faz muito bem para todos que desejam implantar o socialismo no Brasil. Weslei Garcia de Paulo Pós-graduando na FE da UnB 19 O MST protagoniza uma das mais valiosas experiências brasileiras de educação de massas, a partir de uma pedagogia aprimorada ao longo do tempo, levando a trabalhadores e trabalhadoras rurais, uma educação do campo emancipadora e critica em relação a realidade rural no Brasil. A educação do campo no Brasil é uma conquista social, fruto de um processo de luta e persistência dos movimentos sociais rurais, que há mais de 20 anos negociam com o po- der público, uma educação emancipa- dora e crítica no meio rural. Este processo visa a construção de uma pedagogia que tenha como objetivo, os interesses destes sujeitos e suas organizações. Foi na I Confe- rencia Nacional por uma Educação Básica no Campo, em 1998, que o ter- mo “Educação do Campo” passou a ser forjado. Foi o MST que encampou o de- safio de discutir de forma mais ampla a educação no meio rural brasileiro. Neste mesmo ano, é instituído o Pro- grama Nacional de Educação na Re- forma Agraria (PRONERA), como uma primeira conquista. Pela primeira vez na história, os trabalhadores passam a influir em uma politica pública de educação, não mais para o meio rural, mas im- pondo este protagonismo e tornan- do-se sujeitos efetivos, conquistando uma Educação do Campo para os sujeitos do campo, os camponeses, quilombolas e trabalhadores rurais. Desde então, um outro conjun- to de experiências em educação do campo, conduzida por organizações e movimentos sociais, como o Movi- mento dos Atingidos por Barragens, o Movimento de Educação de Base, entre outros, vem sendo articulados e aprimorados na sua pedagogia, for- talecendo uma base teórica e concei- tual, que suportam todos os objeti- vos deste movimento por uma edu- cação do campo. JOÃO MARCELO INTINI Engenheiro Agrônomo Mestre em Agricultura Familiar Doutorando pela FE/UnB 20 Paulo Freire, com sua Pedagogia do Oprimido, influi imediatamente neste contexto, sendo a pri- meira base teórico conceitual que articula os ru- mos desta Educação do Campo. Em busca da emancipação, conscientização e libertação destes sujeitos sociais, o MST, nas escolas rurais presen- tes em dezenas de assentamento de reforma agrá- ria, em todas as regiões do país, aplica o método Paulo Freire, e milhares de pessoas são alfabeti- zadas e tornam-se sujeitos de sua própria história. Mas a dinâmica social em cur- so é forte e pujante, e não bastava alfabetizar as pessoas. Era preciso ir além. O Movimento dos Trabalhado- res Sem Terra, junto a outros movi- mentos sociais populares do campo, engendra processos educacionais e pedagógicos que visam uma outra formação do ser humano, na cons- trução de outro projeto de nação, al- ternativo ao atual processo de cons- tituição da sociedade brasileira, situ- ando seu marco teórico e prático na luta contra hegemônica. E no meio rural, a hegemonia do capital, expresso pela concentra- ção fundiária, pela agricultura inten- siva e baseada nos agrotóxicos e ou- tros insumos artificiais e marcada pela violência contra os trabalhado- res rurais, precisa ser enfrentada. O MST, então, passa a buscar a união entre teoria e pedagogia com a pratica da luta social, tendo o trabalho socialmente útil na centra- lidade deste projeto político. Então a base teórico conceitu- al gradualmente vai sendo alterada, e outros autores, como Pistrak e Makarenko passam a amparar con- ceitualmente este processo. A materialidade do trabalho e da educação, passam a ser determi- nantes, como categorias fundantes deste processo. Uma pedagogia socialista, to- mar o assentamento rural, o lugar de vida, aonde se processam todas as relações da realidade, que per- meiam a escola e cada etapa da for- mação básica dos alunos. 21 EMENDA CONSTITUCIONAL 95: a Universidade de Brasília e a Educação Superior Pública Brasileira Em 17 de abril de 2016, com 367 votos favoráveis e 137 votos contrários, a Câmara dos Deputados afastou Dilma Roussef, eleita presidenta da República em outubro de 2014, por 54 milhões e 500 mil brasileiros. Desse momento em diante, acentuou-se vertiginosamente a reestruturação do Estado nacional de tal forma que se transformasse em um arcabouço jurídico-institucional “mínimo” para a garantia dos direitos sociais e “máximo” para a recomposição das taxas médias de lucro do capital nacional e internacional. A destruição da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, a entrega dos ativos nacionais a valores irrisórios, como a venda dos campos de exploração de petróleo do pré-sal, a nova política de preços da Petrobrás, a tentativa de desconstrução da Previdência Social – amparada por argumentos falaciosos de um suposto déficit, que não levavam em consideração, por exemplo, a vinculação da Previdência à Seguridade Social e à sua respectiva fonte de financiamento, conforme o estabelecido pela Constituição Federal de 1988, além de não discutirem a necessidade da revogação da Emenda Constitucional que institui a “Desvinculação de Receitas da União”, malfadada “DRU”, que subtrai recursos vultosos da Previdência -, são algumas das medidas do governoatual que se alinham aos interesses das forças sociais vinculadas ao mercado. Ressaltemos, a título de curiosidade, que esse “novo” modelo de Estado, não aprovado pelas urnas, se impôs sob a “cortina de fumaça” de um discurso que propunha um possível combate ao “descontrole” das contas públicas e à corrupção do governo anterior. Argumentos estes, após dois anos de um executivo federal composto por Michel Temer, Geddel Vieira, Aécio Neves, Moreira Franco, José Serra, Mendonça Filho – todos políticos vinculados ao PMDB, ao PSDB, ao DEM e a outros agrupamentos de matizes semelhantes –, hegemonizado pelos interesses supracitados, difíceis de serem sustentados à luz de análises minimamente críticas, que se afastem da aparência da realidade com o objetivo de constatar os reais motivos da dinâmica social em análise.. Retornando à discussão referente ao modelo de Estado proposto nos dias atuais, talvez, para além das medidas descritas anteriormente, a “cereja do bolo” seja a Emenda Constitucional - EC nº 95, que tramitou na Câmara dos Deputados como Proposta de Emenda Constitucional – PEC nº 241/16 e no Senado Federal como PEC nº 55/2016, sendo aprovada em dois turnos por 3/5 dos integrantes de ambas as casas. Essa emenda instituiu o novo regime fiscal da União que, por mecanismos diversos, acaba por se impor, também, aos demais entes federados, ou seja, municípios, Estados e Distrito Federal. 22 Pela letra do novo marco normativo, congelam-se por vinte anos as despesas primárias do executivo federal, recompondo- as, no máximo, ao teto da taxa de inflação do ano anterior à definição do novo orçamento, ao passo que liberam-se os gastos com despesas financeiras, que drenam mais de 40% do orçamento nacional para os bolsos dos bancos e dos fundos de investimento nacionais e internacionais. Caso mantida pelo tempo definido inicialmente, duas décadas, reestruturar-se-ão por completo o tamanho e a função do Estado brasileiro, aproximando-o, ainda mais, dos interesses vinculados à recomposição das taxas médias de lucro do capital nacional e internacional, sobre o “cadáver” dos direitos sociais constitucionais, entre os quais, a educação pública, universal e gratuita! Inviabiliza-se, por exemplo, a meta 12 do Plano Nacional da Educação que propõe o acesso de 33% da população entre 18 e 24 anos à educação superior, em 2024. É nesse contexto que se encontra a Universidade de Brasília - UnB. Tendo como fontes de financiamento, prioritariamente, (i) o tesouro nacional, além de (ii) recursos próprios decorrentes da prestação de serviços como o executado pelo Centro de Seleção e e Promoção de Eventos – CESPE, (iii) e de convênios, a comunidade acadêmica não pode fruir do aporte que lhe é de direito, tendo que verter parte do financiamento para as despesas financeiras e para a “rolagem” da dívida da União, pois o orçamento corrente, levando em consideração a EC 95, restringe as dotações das Universidade Federais. Assim, em 2018, por exemplo, a UnB terá acesso a 137 milhões de reais para o custeio, ao passo que possui 214 milhões a pagar, ademais, dos 168 milhões oriundos de fontes próprias, o Tesouro Nacional autorizou a execução de, somente, R$ 110 milhões. Como resultado, a previsão de déficit da Universidade para o ano corrente é de 92 milhões de reais. E quem paga o preço da política do governo ilegítimo de fazer sangrar as universidades federais para que sejam repassadas, a médio prazo, à iniciativa privada? Os trabalhadores e os educandos menos favorecidos economicamente: terceirizados, estagiários, usuários do Restaurante Universitário – RU, entre outros. Finalizando, perguntamos aos discentes de graduação e de pós-graduação da UnB e das demais Universidades Federais: - “ficaremos sentados, preocupados com prazos burocráticos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES e com o cumprimento dos respectivos calendários acadêmicos, fingindo que tal situação não nos atinge, nem às gerações futuras, ou assumiremos a nossa responsabilidade e nos uniremos à luta dos trabalhadores e graduandos, que já deflagraram movimentos de resistência em diversos locais?”. Sejamos dignos dos postos que ocupamos e nos levantemos contra as injustiças impostas pelo governo ilegítimo de plantão contra a classe trabalhadora brasileira!! A história nos cobrará! EDUCAÇÃO NÃO É MERCADORIA! Mais informações sobre a situação da UnB: http://www.dpo.unb.br/images/ phocadownload/180323%20Apresentacao% 20Final.pdf Thiago Oliveira Queiroz Nunes Doutorando do Programa de Pós- Graduação em Educação Física na Universidade de Brasília – UnB; Pesquisador do AVANTE/LEFET/ FEF/UnB e do GENPEX/FE/UnB. http://www.dpo.unb.br/images/phocadownload/180323%20Apresentacao%20Final.pdf http://www.dpo.unb.br/images/phocadownload/180323%20Apresentacao%20Final.pdf http://www.dpo.unb.br/images/phocadownload/180323%20Apresentacao%20Final.pdf 23 A EDUCAÇÃO PROIBIDA – 2012 O documentário “A Educação Proibi- da” (título original La Educación Prohibida) foi lançado em 2012, dirigido por Juan Vauti- sas e produzido por German Doin, problemati- za o modelo de educação tradicional, isto é, aquele à serviço da produção e reprodução do sistema econômico e social hegemônico.. Edu- cação Proibida apresenta a realidade e crítica ao ensino para o ajustamento, treinamento e alienação, ainda em vigor nos países da Améri- ca Latina, com base no resgate do cenário só- cio histórico e político que o originou; nas mais de 90 entrevistas realizadas, em 08 paí- ses, com educadores/as, estudiosos/as, profissi- onais, alunos/as e pais; e nas 45 experiências educativas não convencionais. Também discu- te as teorias pedagógicas que fundamentam a Educação Proibida. A perspectiva histórica da educação tra- dicional é contextualizada a partir do modelo de ensino da Prússia, no século XVIII, que ob- jetivava promover o controle e ajustamento dos/ as estudantes para atender os interesses da classe dominante. Esse modelo, posteriormen- te, popularizou-se nos países da Europa e da América Latina. A forma didática que o Docu- mentário questiona a educação prussiana e as novas roupagens, na atualidade, na forma da escola como depósito dos/as alunos/as, o con- teudismo, a hierarquização no processo de aprendizado, o sistema de prêmios e castigos, os horários, a falta de respeito a individualidade e realidade social dos/as estudantes, a insatisfa- ção dos professores com o trabalho, instiga o/a telespectador/a indignar-se e entender a necessi- dade de um modelo de educação capaz de pro- mover a emancipação humana. A Educação Proibida, ao apresentar as experiências educativas não convencionais, de- monstra a viabilidade da educação contra hege- mônica e, assim, do ensino livre, associado teo- ria e prático, interdisciplinar com vista a autono- mia, criatividade e a conscientização dos/as es- tudantes quanto ao seu papel no processo de aprendizagem e na sociedade. Por isso, o filme recebeu o nome “Educação Proibida”, pois não atende os interesses da classe dominante, mas se constitui em meio para construção de uma soci- edade justa e igualitária. O Documentário é um manifesto político- pedagógico que alcança e requer a educação proibida no sentido de superação da histórica educação tradicional. O filme encontra-se dis- ponível no canal youtube, pois foi financiado coletivamente e possui licenças livres que per- mitem e incentivam sua cópia e reprodução. Portanto, não deixe de assistir!. Pedrina Viana Gomes A aprendizagem é muito mais que analisar ou relacionar conceitos. Aprender implica um profundo processo onde se criam relações entre pessoas e seu entorno (43:00). Acesso: https://youtu.be/OTerSwwxR9Y Professora do Centro Universi- tário deBrasília – IESB. Assis- tente Social do INSS . Graduada em Serviço Social – UNB. Pós- Graduação em Gestão de Políti- cas Públicas. https://youtu.be/OTerSwwxR9Y 24 OS SETE ENSAIOS DE INTERPRETAÇÃO DA REALIDADE PERUANA - 1928 O livro faz uso do materialismo histórico como instrumento para compreen- der a formação e desigualdade socioeconômica do Peru e criticar o modelo tradici- onal e elitista da educação. A obra continua atual, pois dialoga com o cenário edu- cacional contemporâneo da América Latina, e por desvelar, em bases marxistas, que a educação não é um problema administrativo, jurídico, étnico, moral ou religi- oso, mas histórico, econômica, político e social. Sendo assim, capaz de contribuir para transformação e superação do modelo econômico opressor. O convite a uma leitura de Sete ensaios propõe-se, entre outras coisas, socia- lizar a proposta de José Carlos Mariátegui quanto à organização da classe trabalha- dora, dos estudantes, intelectuais, professores e da população do campo com vista transformação e superação das desigualdades educacionais e, consequentemente, de classe, ainda, arraigadas na América Latina. Acesso: https://goo.gl/images/BW7Kmk PEDRINA VIANA GOMES Professora do Centro Universitário de Brasília – IESB Assistente Social do INSS Graduada em Serviço Social – UNB Pós-Graduação em Gestão de Políticas Públicas O atual contexto latino-americano de cri- se política, econômica e social requer a leitura ou releitura de um dos livros mais notórios em interpretar e desvelar a formação social da América Latina. A obra, “Os Sete ensaios de in- terpretação da realidade peruana”, de José Car- los Mariátegui, publicado pela primeira vez no Brasil, em 1975, foi uma das primeiras a conso- lidar o pensamento marxista na América Latina. 25 NATHÁLIA BARROS RAMOS Graduanda em História, Pe- dagoga e Mestranda em Edu- cação Pela Universidade de Brasília - UnB Encontre onze palavras que representam a PEDAGOGIA SOCIALISTA Revolução, luta, marxismo, transformação, liberdade, pedagogia, socialista, traba- lho, educação, teoria e emancipação. 26 http://educacaoepraxis.blogspot.com/2012/03/tiras-da-mafalda.html https://exercicios.brasilescola.uol.com.br/exercicios-redacao/exercicios-sobre- interpretacao-texto-nas-tirinhas-mafalda.htm NATHÁLIA BARROS RAMOS Pedagoga, Graduanda em História e Mestranda em Edu- cação pela Universidade de Brasília - UnB 27 https://twitter.com/PiadasNerds 28