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Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp A esquistossomose é uma parasitose causada por vermes trematódeos do gênero Schistosoma. Existem 3 espécies reconhecidas desse verme: S. haematobium, S. japonicum e S. mansoni. No Brasil, a principal é a mansoni. Existem aproximadamente 200 milhões de pessoas infectadas no mundo e, no Brasil, 8-12 milhões. Os casos se concentram no PE, BA e MG. Em SP temos focos isolados. O hospedeiro intermediário do S. mansoni no Brasil é o caramujo Biomphalaria glabrata. As manifestações clínicas da esquistossomose dependem da espécie do parasito, da carga parasitária e de determinantes do hospedeiro. No Brasil, a infecção por S. mansoni causa principalmente as formas hepatointestinal (discreta) e hepatoesplênica (grave). Outras manifestações menos comuns (pulmonares, renais, do sistema nervoso etc.) resultam da migração anômala de vermes e/ou de ovos e de complicações resultantes da forma hepatoesplênica. CICLO DO PARASITA Os ovos são depositados em lagoas e água lenta. Deles eclodem miracídeos que colonizam os caramujos B. glabrata e se transformam em cercárias. As cercárias são larvas nadantes que infectam os humanos através da penetração na pele (geralmente das pernas). Ao penetrarem na pele, perdem a cauda e transformam-se em esquistossômulos. Estes, nas primeiras 24 h, produzem e secretam enzimas proteolíticas que destroem a matriz conjuntiva da pele, facilitando sua penetração em vasos sanguíneos da circulação periférica. Após seis a 12 dias de infecção, os esquistossômulos transformam-se em vermes imaturos, passam pelos pulmões e migram para o fígado, no qual são encontrados a partir do 16º dia. Depois de 28 Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp dias da infecção, os vermes adultos migram para as veias mesentéricas inferiores, onde se acasalam e, em torno do 35º dia de vida, iniciam a oviposição (fase postural). Os vermes maduros vivem permanentemente acasalados, com a fêmea dentro do canal ginecóforo do macho. Os vermes sobrevivem, em média, três a cinco anos, e as fêmeas produzem 100 a 300 ovos por dia. Os ovos depositados nos vasos do plexo mesentérico podem seguir três caminhos: (1) atravessam a mucosa intestinal e são liberados na luz do órgão, sendo carreados pelas fezes e eliminados no ambiente, reiniciando o ciclo; (2) provocam reação inflamatória granulomatosa na parede intestinal; (3) são levados ao fígado, onde ficam retidos nos finos ramos intra-hepáticos da veia porta, formam granulomas e induzem fibrose portal, dando início às alterações que caracterizam a doença e determinam sua gravidade. Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp GRANULOMA ESQUISTOSSOMÓTICO Ovos de S. mansoni retidos secretam enzimas proteolíticas que destroem tecidos. Seus produtos induzem resposta imunitária mediada por linfócitos T representada por reação inflamatória crônica granulomatosa. Inicialmente, a resposta do hospedeiro mediada por linfócitos T CD4+ é do tipo Th1, com produção de citocinas pró-inflamatórias, como IFN-γ, IL-1, TNF-α e IL-6. Tais citocinas parecem ser responsáveis por manifestações clínicas da fase aguda e talvez por lesões destrutivas hepatocitárias. Em seguida, antígenos do ovo de S. mansoni induzem mudança no padrão de resposta, que passa a ser predominantemente do tipo Th2; IL-10 tem papel importante na modulação da resposta Th1 para Th2. Esse perfil de resposta resulta em diminuição das alterações teciduais, embora IL-13 esteja associada a estímulo fibrogênico, com papel na progressão das lesões e da doença. Resposta imunitária equilibrada entre os tipos Th2 e Th1 resulta em granulomas menores e com menos fibrose. A indução do granuloma se dá quando há postura do ovo maduro do Schistossoma mansoni. Os ovos tem antígenos solúveis, como proteínas, glicoproteínas e lipídeos, que causam uma reação granulomatosa espécie específica. Esse granuloma é formado por macrófagos, linfócitos, macrófagos epitelioides e células gigantes. Além de fibroblastos na periferia e grande número de eosinófilos. Poucos neutrófilos e plasmócitos. - Estágios Evolutivos do Granuloma Fase necrótico-exsudativa: ovo está na parte central envolvido por zona de necrose. Há zona de exsudação celular por fora. Fase exsudativa: predominam células de exsudação (principalmente eosinófilos). Zona de necrose central é pequena ou ausente. Fase produtiva: ovo morto, deformado ou somente a casca. Há presença de células gigantes e redução das células de exsudação e tem fibrose na periferia. Fase de cura por fibrose: fibras colágenas concêntricas no 4 mês a 6 mês de infecção mais ou menos. Consequências da reação granulomatosa: é uma reação de proteção dos tecidos do hospedeiro das secreções do miracídio. Em imunocompetentes, essa resposta é eficiente e consegue ter morte do ovo. Contudo, causa bloqueio do fluxo sanguíneo no parênquima hepático, causando estase sanguínea e fibrose tecidual. Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp Os ovos ficam impactados nos sinusoides, então o sangue que vem da veia porta não passa. Assim, há fibrose portal com proliferação vascular do tipo angiomatoide, ou seja, tentativa do parênquima em permitir a oxigenação normal ele tenta proliferar vasos. Há ramos dilatados da porta, porque o sangue fica extasiado ali. HEPATOPATIA DA ESQUISTOSSOMOSE Em suma, temos 3 aspectos da hepatopatia da esquistossomose, a depender da fase de infecção: 1. Hepatite pré-postural: antes de ter o acasalamento do macho com a fêmea. Só há a passagem do esquistossomulo que está na corrente sanguínea para chegar no pulmão, isso causa uma reação inflamatória linfocitária mínima. 2. Hepatite granulomatosa: quando há o acasalamento e aprisionamento dos ovos nos sinusoides hepáticos. Há formação de granulomas em finas radículas portais e peri-portais. 3. Fibrose axial de Symmers: (em haste de cachimbo de barro). A patogenia ainda é discutida, mas há intensa fibrose devido aos granulomas. Essa fibrose não leva a formação de cirrose!!! Está restrita aos ramos venosos portais que ficam mais calibrosos. Com o estimulo sanguíneo ao redor dos vasos neoformados, não temos formação de septos. Está associada a uma intensa proliferação angiomatoide. FIBROSE COM HIPERTENSÃO PORTAL NÃO CIRRÓTICA. A forma hepatoesplênica da esquistossomose, encontrada tipicamente em indivíduos que vivem em áreas endêmicas da infecção, é a que tem a maior relevância e resulta de lesões hepáticas induzidas pelos ovos do S. mansoni. Essa forma da doença associa-se a alta carga parasitária e reinfecções, embora fatores individuais pareçam ter papel relevante, uma vez que ela ocorre somente em uma minoria de indivíduos infectados de áreas endêmicas (4 a 10% dos infectados). A forma hepatoesplênica acomete sobretudo jovens, em torno de 15 anos de idade, sendo rara depois dessa idade. A alteração hepática característica da forma hepatoesplênica da esquistossomose é a fibrose portal e periportal com formação de septos conjuntivos que interconectam espaços portais adjacentes. Deve-se enfatizar, porém, que não se trata de cirrose, pois a estrutura lobular/acinar do parênquima hepático mantém-se preservada e não há nódulos parenquimatosos difusos como na cirrose. Macroscopicamente, a superfície hepática é irregular, apresenta espessamento fibroso da cápsula de Glisson e mostra aumento de tamanho. A consistência do órgão é firme ou endurecida, e a superfície de corte revela alargamento estrelar ou irregular dos espaços portais por tecido fibroso que acompanha os ramos intra-hepáticos da veia porta. Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp Microscopicamente, o fígado mostra alargamento fibroso dos espaços portais e dos septos entre eles. Os granulomas são constituídos por células gigantes multinucleadas,macrófagos epitelioides e quantidade variável de linfócitos, eosinófilos e ocasionais plasmócitos. Os granulomas podem ser encontrados com diferentes composições celulares em função do tempo de evolução e da resposta imunitária do hospedeiro. Alguns aparecem como cicatrizes arredondadas e fibrosas, hialinas, enquanto outros têm predomínio de células gigantes multinucleadas em torno de casca do ovo ou de ovos calcificados. Há, também, proliferação angiomatoide de pequenos vasos com parede delgada. Pelo menos parte desses vasos são linfáticos dilatados, como demonstram anticorpos específicos de células endoteliais linfáticas. Outro achado frequente é a proliferação da rede arterial hepática nos espaços portais. O parênquima hepático, em geral, conserva sua estrutura lobular/acinar, mas podem ser vistas atrofia, congestão sinusoidal e fibrose perissinusoidal. Pode haver formação de septos fibrosos finos e longos a partir de espaços portais em direção ao parênquima, às vezes interconectando espaços portais adjacentes. Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp O tratamento para esquistossomose reduziu significativamente a ocorrência da forma hepatoesplênica, de modo que o seu diagnóstico deve ser feito somente quando existem elementos convincentes e que sejam afastadas outras doenças que têm lesões parecidas. Inicialmente, os ovos ocluem os pequenos ramos da veia porta e desencadeiam a formação de granulomas. Obstrução de pequenos vasos aumenta a pressão no sistema venoso intra-hepático, resultando na abertura de pequenos vasos colaterais em torno de ramos mais calibrosos da veia porta; progressivamente e dependendo da carga parasitária, esses vasos também vão sendo ocluídos e destruídos por ovos e granulomas, resultando na fibrose que forma o manguito característico ao longo dos vasos maiores (pipe-stem fibrosis). À medida que aumenta a pressão no sistema porta, levando a expansão da rede arterial hepática, a irrigação hepática torna-se progressivamente mais dependente da circulação arterial (arterialização do fígado). Tais alterações circulatórias e hemodinâmicas tornam o órgão sujeito a um sistema de maior pressão. É possível que a pressão aumentada nos sinusoides contribua para a fibrose perissinusoidal e hipotrofia hepatocitária, com perda de áreas do parênquima. Obstrução de ramos da veia porta altera as relações hemodinâmicas hepáticas e leva a aumento da pressão no sistema porta, causando esplenomegalia congestiva. Nesses pacientes, encontram- se hiperplasia e hipertrofia de células do sistema fagocítico-mononuclear nos cordões esplênicos e deposição de matriz conjuntiva, com espessamento dessas estruturas. Também tem formação de áreas de hemorragia recente e antiga que são chamados de nódulos de Gamna-Gandy. Há também depósitos de hemossiderina e sais de cálcio. As nodulações já são vistas na macroscopia. A polpa branca pode estar hipotrófica ou hiperplásica, com folículos linfoides reacionais. A formação de fístulas arteriovenosas nos seios venosos do baço aumenta a pressão intravascular, que se transmite à veia porta e contribui para aumentar ainda mais a pressão no sistema porta. Aumento da pressão portal estende-se ao sistema venoso gastroesofágico, com formação de varizes gástricas e esofágicas. - Manifestações Clínicas Clinicamente, os pacientes apresentam hepatoesplenomegalia, varizes do esôfago e circulação colateral, que traduzem quadro de hipertensão portal. Em geral, os pacientes não apresentam insuficiência hepática, em consonância com uma arquitetura geral hepática preservada e Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp hipertensão portal essencialmente pré-sinusoidal. Insuficiência hepática pode ocorrer em pacientes que têm outras condições agravantes, como sangramento digestivo alto por ruptura de varizes esofageanas. → GRANULOMAS ESQUISTOSSOMÓTICOS NO FÍGADO Os granulomas são constituídos por células epitelióides e gigantes, como os vistos na tuberculose. É comum que tenham um halo linfocitário e fibroblastos na periferia, em arranjo concêntrico, formando uma cápsula. É frequente nos granulomas o encontro de cascas de ovo fagocitadas por gigantócitos. Mais raramente, são observados ovos intactos ou restos de vermes. Os vermes e ovos provocam reação de hipersensibilidade do tipo I (anafilática), o que atrai eosinófilos. Os eosinófilos são as células inflamatórias mais relacionadas à defesa contra metazoários. É bem conhecido que pacientes portadores de helmintíases intestinais tendem a apresentar eosinofilia sanguínea. Nesta lâmina há eosinófilos isolados em vários granulomas. Ocasionalmente podem ser numerosos, como no exemplo ilustrado, relacionados a um verme necrótico. Também são observados nódulos fibróticos, resultado final da evolução dos granulomas. Com o tempo, quando há digestão do corpo que causou o granuloma, as células epitelióides e gigantes desaparecem, sendo substituídas por fibroblastos que produzem colágeno. A obstrução de múltiplos ramos portais intra-hepáticos é a causa da hipertensão portal na esquistossomose. Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp → FIBROSE HEPÁTICA ESQUISTOSSOMÓTICA Os espaços em volta dos ramos maiores da veia porta estão grandemente espessados por tecido fibroso e há intensa proliferação vascular angiomatóide, resultante da hipertensão portal crônica. Entre os vasos há moderado infiltrado inflamatório crônico e observam-se gigantócitos contendo ovos de Schistosoma mansoni (na maior parte, fragmentos de cascas). Por vezes, os ovos são observados também livres no tecido fibroso e podem estar calcificados (cor azul quase negra). A fibrose periportal é responsável pelo aspecto macroscópico 'em haste de cachimbo de barro branco' (clay pipestem cirrhosis ou fibrose hepática de Symmers). Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp Na fibrose esquistossomótica, ao contrário da cirrose hepática, a fibrose concentra-se em volta dos ramos intrahepáticos mais calibrosos da veia porta e o parênquima mantém a estrutura lobular mais ou menos intacta. Não há septos fibrosos formando pseudolóbulos. Nos casos com infestação maciça, as células de Kupffer se destacam já em médio aumento pela pigmentação negra do citoplasma. O chamado pigmento esquistossomótico é derivado da hemoglobina das hemácias ingeridas pelos vermes. A digestão da hemoglobina libera hematina ou meta- heme livre, que é o heme separado da globina. O Fe2+ oxida-se a Fe3+. O Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp pigmento negro é fagocitado pelas células de Kupffer, mas isso não tem repercussão clínica. (O pigmento malárico tem a mesma natureza e aspecto). → ESPLENOMEGALIA ESCLEROCONGESTIVA NA ESQUISTOSSOMOSE São hemorragias visíveis já macroscopicamente na superfície de corte do baço como áreas acastanhadas. São consequência da hipertensão portal de longa duração, que causa congestão passiva e hiperplasia da polpa vermelha. Microscopicamente, observa-se na área hemorrágica, além das hemácias, depósitos de hemossiderina (pigmento marrom granuloso) e cristais alongados de cor esverdeada, que são constituídos por impregnação de sais de ferro e de cálcio em fibras colágenas e elásticas. Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp A hiperplasia da polpa vermelha resulta da lentificação da circulação pelo baço, levando a proliferação dos macrófagos e maior fagocitose de hemácias. Com o tempo estabelece-se também fibrose da polpa vermelha, com endurecimento do baço, daí o termo esplenomegalia esclero- congestiva. Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp
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