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EVOLUÇÃO DA MATÉRIA ORGÂNICA: DA ORIGINAL AOS CARVÕES E PETRÓLEO Paulo Fernandes Universidade do Algarve – Faculdade de Ciências do Mar e Ambiente Campus de Gambelas ( pfernandes@ualg.pt ) A matéria orgânica é um constituinte ubíquo em praticamente todos os sedimentos modernos e nas rochas sedimentares. Pode ser encontrada concentrada, por exemplo, na forma de petróleo, carvão, hidratos de metano, ou disseminada nos sedimentos, formando um constituinte menor (normalmen- te menos de 1%). Toda a matéria orgânica presente nos sedimentos e rochas pode ser dividida em duas partes: querogénio e betumes. O querogénio é a “fracção da matéria orgânica sedimentar que é insolúvel nos solventes orgânicos comuns”, enquanto que os betumes correspondem à fracção solú- vel. O querogénio não é uma substância orgânica com uma composição química bem definida pois inclui matéria orgânica derivada das áreas continentais e dos ambientes marinhos, que apresentam diferentes composições químicas iniciais. A definição de querogénio também não tem em conta o estado de biodegradação da matéria orgânica nem o seu grau de maturação. O querogénio inclui toda a matéria orgânica presente nas rochas, sedimentos modernos e solos. Betumes são produtos orgânicos secundários derivados de transformações do querogénio relacionadas com mudanças de temperatura e pressão que ocorrem nas bacias sedimentares por acção dos processos de subsidência. Os betumes incluem os hidrocarbonetos líquidos, como o petróleo, e outros hidrocarbonetos sóli- dos. Nas rochas sedimentares, o querogénio pode ser isolado por métodos químicos que dissolvem a ma- téria mineral mas que não afectam ou modificam a composição química e as propriedades físicas da matéria orgânica. Pelo estudo das propriedades químicas e físicas que ocorreram nos resíduos orgâ- nicos, ou resíduos de querogénio, é possível determinar o grau de maturação e o potencial gerador de hidrocarbonetos das rochas sedimentares Carvões e petróleo, os principais combustíveis fósseis, resultam das transformações químicas e físi- cas que ocorrem no querogénio relacionadas com mudanças de temperatura e pressão durante a evolução das bacias sedimentares. Contudo, a formação destes combustíveis fósseis está dependen- te, principalmente, da composição, qualidade e quantidade da matéria orgânica inicial, ou percurso- ra, presente nos sedimentos. Estas características da matéria orgânica percursora, por seu lado, estão intimamente relacionadas com o tipo de ambientes sedimentares onde se acumula. Os carvões resultam da compactação e alteração de restos de plantas devido ao aumento da tempe- ratura e pressão à medida que ocorre subsidência em bacias sedimentares continentais ou marinho marginais (por exemplo, deltas). Os constituintes orgânicos dos carvões são os macerais. Os mace- rais são, essencialmente, componentes de origem botânica e encontram-se separados em três gru- pos: o grupo da vitrinite, o grupo da inertinite e o grupo da exinite – liptinite. A diferenciação dos diferentes grupos de macerais é feita através do microscópio de reflexão em amostras com superfí- cies polidas e tem em consideração propriedades, tais como: a cor, a forma, o relevo, a dureza e principalmente, a reflectividade. V ENCONTRO DE PROFESSORES DE GEOCIÊNCIAS DO ALGARVE VILA REAL DE SANTO ANTÓNIO – OUTUBRO DE 2004 mailto:pfernandes@ualg.pt mailto:pfernandes@ualg.pt O grupo da vitrinite inclui os constituintes botânicos formados por lenhina e celulose que evoluíram por gelificação em condições essencialmente anaeróbias durante as primeiras fases do processo de incarbonização. O grupo da inertinite também é formado por constituintes lenhino – celulósicos mas que evoluíram por fusinização em condições oxidantes (aeróbias). O grupo da exinite – liptinite inclui constituintes botânicos estruturados, tais como, esporos, pólenes, cutículas, algas e resinas, que apresentam uma composição química idêntica e possuem uma evolução semelhante durante o processo de incarbonização. Devido às mudanças regulares observadas nas propriedades de reflec- tância dos macerais do grupo da vitrinite durante o processo de incarbonização, este constitui o pa- râmetro óptico mais importante usado para determinar o rank dos carvões (lenhites, carvões sub-be- tuminosos, carvões betuminosos e antracites) e o grau de maturação orgânica das rochas nas suces- sões sedimentares. As principais transformações químicas que ocorrem nos macerais durante o processo de incarboni- zação (aumento do teor em carbono e diminuição dos componentes voláteis, principalmente, oxigé- nio e hidrogénio) são graduais e acompanhados por variações das propriedades físicas (reflectância da vitrinite, fluorescência e cor dos macerais). Embora estas transformações sejam consideradas graduais, são reconhecidos quatro pontos onde as propriedades dos macerais mudam rapidamente. Estes quatro pontos são conhecidos como saltos de incarbonização e estão também correlacionados com as principais fases de produção de hidrocarbonetos. O primeiro salto de incarbonização ocorre quando os carvões possuem 80% de carbono, 43% de matéria volátil e um poder reflector médio da vitrinite de 0,5%. Este salto coincide com o início da produção de hidrocarbonetos líquidos (início da janela do petróleo). O segundo salto de incarbonização ocorre quando os carvões possuem 87% de carbono, 29% de matéria volátil e um poder reflector médio da vitrinite de 1,5%. Este salto é ca- racterizado pelo desaparecimento das propriedades de fluorescência dos macerais do grupo da exi- nite – liptinite e pelo fim da janela do petróleo e início da produção de metano termogénico. O ter- ceiro e quarto saltos de incarbonização ocorrem a poderes reflectores médio da vitrinite de 2,5% e 3,7%, respectivamente. Caracterizam-se por perdas suplementares em matéria volátil, especialmen- te, hidrogénio sob a forma de metano e aceleração das reacções que produzem condensação dos anéis aromáticos dos macerais do grupo da vitrinite. Hunt (1996) define uma rocha mãe de hidrocarbonetos como “qualquer rocha que têm a capacidade de gerar e expelir quantidades suficientes de hidrocarbonetos para formar uma acumulação de pe- tróleo ou gás”. Na determinação do potencial gerador de hidrocarbonetos das sucessões sedimenta- res, pelo menos três factores devem ser considerados: quantidade, qualidade e grau de maturação da matéria orgânica. A quantidade de matéria orgânica presente nos sedimentos ou nas rochas sedimentares pode ser de- terminada geoquimicamente, sendo normalmente apresentada como valores de Carbono Orgânico Total (ou TOC – total organic carbon). Os valores de TOC variam consideravelmente com a litolo- gia, os valores mais elevados são encontrados em argilitos negros (black shales) e os valores menos elevados em arenitos. Os valores de TOC, normalmente, aceites como mínimos para uma rocha sil- to – argilosa ser considerada como uma rocha mãe de hidrocarbonetos varia entre 1% a 1,5% de TOC. A qualidade do querogénio presente nas rochas pode ser estudada geoquimicamente ou através de métodos petrográficos. Geoquimicamente, o querogénio pode ser diferenciado, e o seu potencial gerador de hidrocarbonetos caracterizado, por análises químicas elementares, geralmente, com base nas razões hidrogénio/carbono (H/C) e oxigénio/carbono (O/C). Atendendo às variações dos valores V ENCONTRO DE PROFESSORES DE GEOCIÊNCIAS DO ALGARVE VILA REAL DE SANTO ANTÓNIO – OUTUBRO DE 2004 destas razões durante o processo de maturação, é possível diferenciar quatro tipos diferentes de que- rogénio: tipo I, II, III e IV. Atendendo a esta classificação, o factor mais importante que controla a génese dos diferentes hidrocarbonetos, petróleo ou gás, é o conteúdo inicial em hidrogénio da maté- ria orgânica percursora. O querogénio de tipo I é rico em hidrogénio que se encontra presente na matéria rica em lípidos, sendo a sua origem, essencialmente, material de algas, quer marinhas quer lacustres. Este tipode querogénio têm um elevado potencial para gerar petróleo, contudo, é raro no registo geológico. O tipo II apresenta uma composição intermédia e deriva de material de algas (fi- toplâncton e zooplâncton) como também de material de origem continental rico em lípidos, como são os esporos e os pólenes. Este tipo de querogénio é o que se encontra presente na grande maioria das rochas mãe de petróleo. O querogénio de tipo III apresenta valores de hidrogénio baixos e é rico em compostos orgânicos aromáticos derivados de plantas superiores apresentado por isso, um maior potencial para gerar gás do que petróleo em relação aos tipos anteriores. O querogénio de tipo IV apresenta um potencial muito baixo para gerar hidrocarbonetos, quer seja petróleo ou gás. Este tipo de querogénio é formado, essencialmente, por matéria orgânica remobilizada ou altamente oxidada derivada de ambientes marinhos ou continentais. A qualidade do querogénio, portanto a sua capacidade para gerar hidrocarbonetos, pode ainda ser avaliada através de métodos petrográficos. As classificações petrográficas do querogénio são basea- das na aparência da matéria orgânica em luz transmitida e derivaram de classificações iniciais da matéria orgânica propostas pelos palinólogos. Uma das classificações mais comuns, pois está corre- lacionada com o potencial gerador de hidrocarbonetos, é a de Bujak et al. (1977). Esta classificação divide os componentes do querogénio em quatro grupos morfológicos: melanogénio, firogénio, hi- logénio e amorfogénio. O melanogénio corresponde a material orgânico opaco sendo correlaciona- do com os macerais do grupo da inertinite e com o querogénio tipo IV. Este grupo apresenta um po- tencial muito limitado, ou nenhum, para gerar hidrocarbonetos. Firogénio é toda a matéria orgânica estruturada não opaca de natureza não lenhino – celulósica e incluiu esporos, pólenes, dinoflagela- dos, etc. Este grupo morfológico correlaciona-se com os macerais do grupo da exinite – liptinite e com o querogénio de tipo II. O grupo do hilogénio consiste em material orgânico não opaco estrutu- rado de natureza lenhino – celulósica. Pode ser correlacionado com os macerais do grupo da vitrini- te e o querogénio de tipo III. O amorfogénio, normalmente referido como matéria orgânica amorfa (MOA), é toda a matéria orgânica não estruturada e não organizada, que pode estar finamente dis- seminada ou coagulada em massas. Este grupo correlaciona-se com certos macerais do grupo da exinite – liptinite e com o querogénio tipo I. O firogénio e o amorfogénio são considerados como geradores de petróleo, enquanto que o hilogénio é considerado como gerador de gás. V ENCONTRO DE PROFESSORES DE GEOCIÊNCIAS DO ALGARVE VILA REAL DE SANTO ANTÓNIO – OUTUBRO DE 2004
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