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História da Pedagogia

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( São Paulo I
E. Libero Badaró, 292 I
,i*# >
Toaos os direitos reservados
Rio de Janeiro
Eu a do Ouvidor, 166
( São Paulo I
E. Libero Badaró, 292 I
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Toaos os direitos reservados
Rio de Janeiro
Eu a do Ouvidor, 166
L. R I B O U L E T
Diplomado em Estudos superiores de Filosofia e História da educação, 
Professor no Instituto N. D. de Valbenoite, em Saint-Etienne
H I S T O R I A
D A
P E D A G O G I A
Traduzida da segunda edição por Justino Mendes
Prefácio de André Baudrillart 
Agregado da Universidade
Obra premiada pela Academia francesa
LIVRARIA FRANCISCO ALVES
EDITORA PAULO DE AZEVEDO LTDA. ,
Belo Horizonte 
E. Rio de Janeiro^ 655
N IH IL OBSTAT.
Scti Pauli, 14 aprilis 1951 
Pe. Matheus M. Garcez 
censor ad hoc.
IMPRIMA-SE 
t Paulo 
Bispo A ux ilia r 
São Paulo, 1 6 de A b ril de 1 951.
L. R I B O U L E T
Diplomado em Estudos superiores de Filosofia e História da educação, 
Professor no Instituto N. D. de Valbenoite, em Saint-Etienne
H I S T O R I A
D A
P E D A G O G I A
Traduzida da segunda edição por Justino Mendes
Prefácio de André Baudrillart 
Agregado da Universidade
,Obra premiada pela A cadem ia francesa
LIV R A R IA FRANCISCO ALVES
EDITÔBA PAU LO DE AZEVEDO LTD A.
R io de Janeiro I S ão Paulo I B elo H orizonte
Eua do Ouvidor, 166 | E. Libero Badaró, 292 | E. Bio de Janeiro, 655
Todos os direitos reservados
P R E F Á C I O
O livro que se vai ler é, antes de tuáo, uma história da 
pedagogia, nome um tanto singular de uma ciência e de 
uma arte. Ciência, pois que supõe, pelo menos, o conheci­
m ento da psicologia e até duma parte da fisiologia; arte, 
pela adaptação, flexibilidade, habilidade e até dons natu­
rais que ela exige. Os principais sistemas, e êles são le­
gião, que se têm aberto caminho quase desde as origens 
históricas são, portanto, aqui analisados e apreciados su­
cessivamente, e expostas e julgadas as suas aplicações.
Mas é também um livro de princípios, e o autor não 
hesitou em sustentar os seus com uma generosa firmeza, 
em afirmá-los com uma lealdade à qual os mesmos adver­
sários do seu pensamento prestarão certam ente homena­
gem. É que a pedagogia não é uma ciência abstrata. Ela 
age sôbre a matéria viva e sôbre o que há de mais essencial 
e de mais precioso na natureza humana, a alma, cuja for­
mação ela assegura. Credes em Deus? Na alma imortal? 
Admitis a Revelação, e que Jesus Cristo veio ao mundo 
para a salvação dos homens? É claro que, conform e as 
respostas afirmativas ou negativas que derdes a estas ques­
tões, o fim supremo da educação, todo o seu fundo, será 
modificado. No primeiro caso, pois que a vida atual não 
é senão uma preparação, uma provação da qual depende a 
sorte do homem na vida eterna, o primeiro cuidado do edu-
caãor será assentar sôbre bases sólidas as relações ão ho­
mem com o que é Divino, ãar à vida moral a preferência' 
sôbre a vida intelectual, fazer ãesta a serva e o apoio ãa 
viãa espiritual. Não se proceãerá ão mesmo moão se se 
crer que a criança faz a sua entraãa no mundo com a tara 
ão pecado original; ou se, com Rousseau, se julga que a 
natureza a faz nascer boa. Desconfiar-se-á da ingerência 
ão Estaão, que poãe ser imparcial ou até favorável à for­
mação religiosa ãa infância, mas também poãe ser inteira­
m ente o contrário, ãiverso, segunão os tempos e lugares; 
em toão caso, sujeito a tem íveis variações. Se formos ao 
fundo das coisas, verificaremos que as mais essenciais di­
vergências que apresentam os sistemas ãe eãucação proce­
dem ãesta concepção primária, e não somente ãos antago­
nismos decisivos, mas até ãos matizes que distinguem as 
famílias religiosas e as escolas filosóficas. É preciso, por­
tanto, tomar um partido.
O autor adere claramente aos princípios católicos. M e­
rece elogios, entretanto, por ter sabido conservar-se juiz 
imparcial e por não ter hesitado em ãar a sua plena apro­
vação ao que êle encontrou de sábio e de útil nos escritos 
ãos racionalistas, dos protestantes e até dos inimigos decla­
rados das verãaães ãe que êle se mostra decidido campeão.
Plenamente de acôrdo com êle, quanto aos princípios, 
eu faria talvez algumas reservas na aplicação. Há dema- 
siaãas contingências que é preciso levar em conta. Infe­
lizmente é um fato que, nas socieãaães moãernas, a uniãade 
ãe pensamento de que gozou quase unânimemente a Iãade- 
Méãia, por exem plo, foi rompida. A divisão das opiniões, 
a oposição das crenças criam uma situação extraordinària- 
m ente ãifícil. Por outra parte, as naçoes muito mais nu­
merosas, muito mais ativas que outrora, tornaram-se form i­
dáveis máquinas cuja rodagem tôda é solidária, cujos órgãos 
devem ser regulados, vigiados, mantidos, assegurados no
seu funcionamento, sob pena das mais perigosas perturba­
ções. Nestas condições, e sobretudo na nossa velha Europa, 
e particularmente entre os povos latinos, parece difícil ne­
gar que a instrução pública seja um dos primeiros deveres 
do Estado. Para os estudos superiores, a questão não pare­
ce duvidosa. Só o Estado os pode assegurar.
Entre nós, no nosso tempo, levando em conta a nossa 
economia e os nossos costumes, os progressos ãa ciência e 
a sua difusão não poderiam ser entregues ao risco ãa ini­
ciativa privaãa. Só o Estaáo poãe áistribuir êste ensino, 
kegunão as prec.isões, por tôãas as partes do território; só 
êle é bastante rico para o subvencionar. A experiência o 
ãemonstra. Os mesmos motivos, na nossa opinião e em 
graus ãiversos, valem para o ensino secundário e para o 
ensino primário. Entretanto, deveria haver, por um lado, 
largueza ãe espírito neste ensino oficial que deve respeitar 
tôda forma respeitável e séria ão pensamento e, por con­
seguinte, reconhecer os ãireitos ão pensamento religioso; 
e, por outro laão, a mais larga benevolência conceãida ao 
ensino livre em todos os seus graus. Esta largueza ãe es­
pírito não tem sofrido, creio eu, muitos ataques nas ãuas 
primeiras ordens ãe ensino. As universiãaães ão Estaáo 
têm contado e contam ainãa eminentes representantes ãa 
ãoutrina católica e sabe-se que vários, entre os mais emi­
nentes ãefensores ãa Igreja e ãa liberãaãe ão ensino, têm 
recebido a formação universitária. É que aqui o bocaão era 
ãuro ãemais para ser arrebataão pelos políticos. O inãivi- 
ãualismo é irreãutível na Universidade. Esta ãisposição 
não é sem inconvenientes, eu o reconheço. É certo que o 
ensino ganharia em coesão se o entenãimento fôsse mais 
estreito entre os professores ãuma mesma classe. Evitar- 
se-ia especialmente a sobrecarga e se obteria, pelo menos, 
uma melhor ãivisão ão trabalho fora ãa classe. As tentativas 
feitas neste sentião até hoje não têm sião infelizm ente nem
seguidas nem perseverantes, bem que fôssem conformes às 
Instruções. A culpa é da pouca boa-vontaáe dos professôres 
a êste respeito e da falta ãe firmeza dos chefes ãe estabele­
cimentos. Por que o ãevotamento tão real ãos professôres 
ãa Universiãade, o seu sentimento geralmente tão escrupu­
loso do dever profissional é incapaz ãe lhes impor êste leve 
sacrifício? Seja como fôr, o indiviãuálismo tem pelo menos 
esta vantagem ãe ter até o presente salvaguardado a inde­
pendência do pensamento.
Além ãisso, habituaãos ao manejo e à luta ãas iãéias, 
a maior parte dos professôres sabem guardar o respeito às 
oniniões alheias e têm bastante tato vara não ofender ne­
nhuma delas. Quanto ao _ensino primário, ninguém ignora 
como está . e o motivo não honra os dirigentes sectários: é 
que êles têm que lidar com uma clientela sem defesa e com 
um pessoal mal prevarado para a crítica ãas iãéias que lhes 
impõe uma formação autoritária e dogmática. Aqui, mais 
que em qualquer outra parte, é vela liberdade que temos 
oue lutar, e vão haverá nem liberdade cnmvleta nem ver­
dadeira igualdade enauanto o pai de família, que ao ensino 
oficial prefere o ensino livre, tiver que vagar ãuas vêzes; 
uma vez. como contribuinte para a escola oficial e, outra, 
para sustentar a escola livre.
Estamos absolutamente ãe acôrdo com oautor dêste 
livro: esta ãeve receber a sua parte proporcional ãos ãinhei- 
ros públicos.
As questões peãagógicas estão mais que nunca na or- 
ãem ão dia. A ãa escola única que surgiu bem recente­
mente é uma ãas mais graves. Tanto haveria que ãizer 
que vão a voãeríamos tratar aqui com o ãesenvolvim ento 
que ela comvorta. Certamente, e todos estão ãe acôrão 
sôbre êste ponto, é para ãesejar que os alunos ão futuro 
tenham a maior segurança ãe passar, se seus pais o ãeseja- 
rem, ão ensino primário para o secunãário e depois para. o
superior. Mas faltar-lhes-ão os meios no estado atual? 
Seriam mais eficazes se a concessão ãas bôlsas escapasse ao 
favoritismo. As garantias atuais são insuficientes e as nos­
sas classes contam bolseiros vindos do ensino primário, in­
capazes ou indignos, que ocupam um lugar que deveria per­
tencer a outros mais m erecedores. Os favorecidos com bôl- 
sa, é certo, podem ser riscados a juízo das assembléias de 
professores, mas compreende-se fàcilm ente que estas não 
recorrem a uma medida tão grave e tão comprometedora 
para aquêle-a quem se aplica, senão na última extremidade. 
E ainda a última palavra pertence à administração central 
na qual as influências exteriores concentram o seu esfôrço.
Por mais amplo, por mais liberal que se suponha o re­
gime da escola única, o qual está muito sujeito a se tornar 
trote e tirania, seria porventura prudente e democrático 
privar a agricultura e o operariado da flor das inteligências, 
na escola primária? Por alguns êxitos, quantas desclassi­
ficações! Quantas candidaturas ao pequeno funcionalismo, 
quantas fôrças perdidas por alguma pouca vantagem! Que 
exército de mal sucedidos e ãe descontentes se prepararia! 
Sem falar nos ciúmes e discussões de famílias, produzidos 
pela desigualdade ãe tratamento dos seus membros. En­
tão a sorte de todos os jovens franceses, qualquer que seja 
a sua origem, se deciãirá pela idade dos áoze ou treze anos. 
E será nessa iâaãe que se poãe seguramente julgar ão fu­
turo dum menino? Um desenvolvim ento tardio está longe 
de prenunciar uma irremediável incapacidade. Entram na 
Politécnica alguns que aos quatorze anos não com preen­
diam nada de matemática; e quantas vêzes temos visto alu­
nos, um pouco lentos ou retardaãos por sua saúáe, remon­
tarem o vôo na terceira ou na segunda classe, ao passo que 
meninos precoces, depois de com eços admiráveis, encontra­
vam um limite nessas mesmas classes e até um pouco antes. 
Êsse último caso será inevitàvelm ente o de muitos meninos
precoces vindos das escolas primárias. É que as qualida­
des necessárias para ter bom êxito ou para distinguir-se 
nas classes elementares não são de todo as mesmas que para 
jazer bom curso de humanidades ou estudos científicos le­
vados um pouco mais longe. Por que dar o mesmo ensino 
a meninos que tudo esperam da escola e àqueles cuja vida 
de família os impregna cada dia duma formação moral e 
intelectual bem mais íntima que a da escola? As necessi­
dades não são as mesmas. É ainda uma manifestação dêste 
espírito ãe falsa igualdaáe, tôãa ãe aparência e ãe superfí­
cie, à base de inveja, que envenena os nossos costumes e 
se infiltra nas nossas instituições. Haveria bem outras coi­
sas a dizer, mas vamos adiante.
Queixam-se ãa decaãência ãos estuãos. Mais ãuma 
causa contribui para isso, em particular dois defeitos do 
atual plano ãe estudos. Abarca demasiado e é falto de fle- 
xibilidaãe. Quanto à sobrecarga, todos estão ãe acôrão. É 
demasiaão o que se pretenãe fazer o aluno aprenãer para 
que êle aprenãa bem.
O menino consciencioso, verãaãeiramente laborioso, a 
não ser dotado ãuma memória e ãuma faciliãaãe excepcio­
nais, mata-se nesse trabalho. Nós o esmagamos para maior 
ãano ão seu equilíbrio intelectual e fisiológico. Quanto aos 
outros, êles mesmos sabem guarãar-se ão esfalfamento, mas 
então ãe que serve para êles o plano de estudos? A falta 
ãe flexibiliãaãe! Aqui não ignoro que me arrisco a per­
turbar os espíritos amigos ãum belo regulamento. E no 
entanto! O autor lembra muito a propósito a palavra tão 
justa ãum Oratoriano: “ Não se poãe ter êxito nas ciências 
para as quais não se sente nenhum atrativo” . O que um, 
menino faz com ãesgôsto claro e persistente não lhe pode 
ser proveitoso. Se ãeciãiãamente se verificam essas ãuas 
conãições, por que exigir ão aluno um esforço que não lhe 
poãe ser proveitoso e que até lhe é prejuãicial, porque o
fatiga e o impede de se consagrar a estudos que, êstes sim, 
lhe são úteis? Por que perseverar em fazer aprender o 
latim ou o grego a um aluno que, no fim de dois ou três 
anos, não compreende nada nas versões e a quem o tema 
não faz obter senão hábitos deploráveis de negligência e de 
incorreção? E a sacrossanta matemática? Está verificado 
que, nas classes inferiores, a tirania dos problemas é um 
flagelo abominável. Em dez meninos, oito se embrutecem 
nêles e, se mostram trabalhos apresentáveis, é porque tôda 
a família se pôs a ajudar; a irmã mais velha que prepara o 
seu diploma; o pai, que volta fatigado ao lar, para se ver 
logo convidado a êste atraente trabalho suplementar e não 
consegue sem pre levá-lo a bom têrm o ainda que seja po­
litécnico. Não estou inventando. Mais tarde é outra coi­
sa. Eu não quereria contristar a ninguém, mas é preciso 
dizê-lo, um defeito bastante difundido entre os professores 
de matemática é não compreenderem que não se compreen­
de. Como êles têm naturalmente o espírito de geometria e, 
por conseqüência, a demonstração geométrica lhes aparece 
com a claridade da evidência, não concebem que esta clari­
dade possa ser para outros claro-escuro- ou noite profunda. 
No fundo se explica bastante bem esta ilusão. Por mais 
fortes que sejam, contudo, êles mesmos têm seus limites 
que outros excedem . Para muitos espíritos literários, ou 
simplesmente um pouco curtos, aquêle limite está bem per­
to do ponto ãe partida. Isto êles deveriam perceber. E 
Pascal enfim não opôs o espírito de finura ao de geometria? 
Em todo caso, os programas são prematuros. Muitos jovens 
não se abrem para a matemática senão pelos 15 ou 16 anos. 
Mas há as Escolas! Muitas vêzes professores experim enta­
dos ãe matemática especial nos têm ãito: “ Enviai-nos bons 
espíritos formaâos por sóliãos estuãos literários; êles farão 
em áois anos o que teriam feito em três e talvez em quatro” . 
Que resposta mais autorizaãa! A té lá, portanto, redijam
programas mais accessiveis à maioria; êstes estudos tão 
particulares sejam diviáiãos não por classes mas por cursos 
ãe fôrça áesigual. Quanto ao menino’ inteiramente refra- 
lário à matemática (e existem !) deixem -nos em paz e per­
mitam-lhes desenvolver-se conforme as suas aptidões. É 
todo o contrário do que nós fazemos.
Êste menino é áotado unicamente para as letras, para 
as artes? depressa, dêem-lhe lições de matemática!
E inversamente, se êle se anuncia como bom geômetra 
e deplorável latinista, depressa, dêem-lhe repetições de la­
tim! E não digo que a aventura não valha alguma vez a 
pena ãe ser tentaãa, mas se não se obtém naãa, perseverare 
diabolicum. Mas é que há o bacharelado! Meu Deus, diz- 
se muito mal ão bacharelado; e, certamente, êle se presta 
à critica. Tem pelo menos uma vantagem que é a de ser 
um estimulante. Mas não ãeveria ser um obstáculo ao 
justo desenvolvim ento do aluno no sentião das suas facul­
dades. Bastaria, para isso, praticar largamente o sistema 
ãas notas compensador as. Ora, é a eliminação que vence 
e no último Congresso ão Ensino secunãário, pleiteanão 
caãa qual pro domo, ainãa peãiam que fôsse reforçaão. Bem 
vejo que se pode objetar ao que precede; mas quê! naãa é 
perfeito neste munão e. ãos resultaãos atuais, parece que 
ãe todos os inconvenientes escolhemos os piores. Aliás 
muitos ãos alunos ão ensino secunãário, sobretuão nas clas­
ses sem latim, estariam muito mais em seu lugar no primá­
rio superior. Eles aí encontrariam programas, métoãos e, 
digo-o por experiência pessoal, bem que não seja para mi­
nha honra, professôresmuito melhor aãaptados à sua ma­
neira ãe espírito e às suas necessiãaães.
Na escola primária, ãemasiaãa ambição nos programas 
e ãemasiaãa uniformidade. Os estudos primários não de­
vem ser um m edíocre resumo ãos secunãários. Se tantos 
conscritos provam nos exam es regimentais que esqueceram.
í
tudo ou nunca compreenderam nada, é porque encheram 
os seus cérebros duma multidão de noções mal digeridas, 
acima do seu alcance de meninos incultos. E será sã pe­
dagogia aplicar os mesmos programas aos meninos da gran­
de cidade e aos da roça ao que vigia as vacas no intervalo 
das classes e ao filho do artífice ou do operário urbano que 
vê e ouve cada dia uma multidão, de coisas boas ou más, 
mas cujo espírito está muitas vêzes singularmente desper­
to? Nem as necessidades são as mesmas, nem as capaci­
dades.
Uma palavra para terminar sôbre uma questão deli­
cada mas muito importante: as relações entre as famílias 
e os mestres. “ Que o pai tenha um amigo no mestre de 
seu filho” , escrevia o judicioso Quintiliano. Que verdade 
em poucas palavras, e quanto é desconhecida !... Certa­
m ente o fato existe e, para um e outro, é um grande auxí­
lio, um grande conforto, e, para o menino, um grande be­
nefício. As mais das vêzes. porém as famílias confiam o 
menino à escola ou ao colégio e depois se retiram com a 
consciência satisfeita, persuadidas de que cumpriram todo
o seu dever. Na realidade só se desembaraçaram dêle. 'No 
entanto, não há,' educação completa senão pela colaboração 
da família e dos mestres, verdade que não deveria haver 
necessidade ãe repetir É difícil ao mestre, encarregado 
duma classe numerosa, conhecer bem todos os seus alunos, 
sobretudo conhecê-los em pouco tempo.
As aparências podem enganar. Alguns se lhe esqui­
vam sempre. Poucos minutos de conversação podem escla­
recê-lo melhor do que meses duma observação sem cessar, 
distraíáa por outros cuidados. Por 'sua vez o m estre pode 
dirigir discretamente a atenção dos pais para os inconve­
nientes de certas maneiras para com seus filhos, demasiada 
exigência e rudeza; e, muitos mais comumente, uma com­
placência cega. Certos meninos têm necessidade de ser
poupados; outros, de ser estimulados sem escrúpulo. Se o 
dever dos pais é estabelecer relações com o mestre, o dever 
dês te é facilitar-lhas. Há pais que não ousam, quer por 
uma espécie de timidez para com o mestre, herdada da sua
i infância, quer por desconfiança de si mesmos, quer por uma 
discrição mal entendida. Saibam êles que entre a absten­
ção e o abuso possível, o bom educador preferirá sempre o 
segundo inconveniente.
A o invés destas úteis e cordiais relações que coisa sin­
gular a atitude de certos pais para com os mestres! Con­
fiam-lhes os filhos e desconfiam dêles. Estão sempre pron­
tos a suspeitar da sua consciência, ãa sua imparcialidade, 
do seu zêlo. Entre a palavra ão m estre e os áizeres inte- 
ressaãos ãum menino preguiçoso ou dissipado, ou que se 
conhece como mentiroso, não se hesita. É sempre o meni­
no que tem razão. E à mesa da familia? Com que malig­
no prazer pai, mãe, irmãos e irmãs não vêem o aluno arre­
medar o mestre, não o ouvem contar com chiste e abundân­
cia as peças que pregam, êles e os seus colegas! Ainda bem 
quando o pai, toáo regozijado com a narração de proezas 
que lhe recorãam os belos ãias ãa sua infância, não entra 
também com a narração ãas suas. E ainãa os pais têm mui­
tas vêzes a pruãência ãe ser bastante reservaãos sôbre êste 
ponto, mas os tios! E a mãe e a irmã mais velha sorriem 
complacentemente, bem que elas sintam que talvez aquilo 
não seja muito ortoãoxo! Sentem-se um pouco orgulhosas 
no funão, por terem um filho, um irmãozinho tão vivo, tão 
espirituoso; e, bem que êle o nota, o levaão! E ãepois, qual 
é o francês que não se ri ao ver o ãelegaão apanhar? E 
tuão isso não é naàa. Em compensação, infeliz ão professor 
aue tiver ãeixaão escapar alguma palavra muito viva e 
sobretuão se, por seu mal, ela foi pouco acertada! Uma 
carta pungente, se não é francamente descortês, bem de­
pressa o chamará à orãem. E, bem entenãião, a inãignação
se terá manifestado primeiramente na presença do menino. 
As vêzes é ainda pior. Um reitor de Academia nos dizia: 
“ Sabei, meus senhores, que não há. um só dentre vós, ouvi 
bem, não há um só, contra o qual eu não tenha recebido 
cartas anônimas” . Ingênuos educadores, ide lá fiar-vos na­
quela palavra .preliminar e jalaz: “ Entre nós, meu senhor, 
diante do menino, é sempre o professor que tem razão!” 
Reconhecimento, os m estres não o pedem.
Talvez fôsse justo que as mesmas penas, tão prontas a 
repreendê-los, se utilizassem, às vêzes, para lhes agradecer. 
Tal não é o costume. “ No dia da entrada, dizia um velho 
professor, não sei onde dar com a cabeça. Os pais me ro­
deiam, me lisongeiam, me esmagam com recomendações 
No dia ãa saída, não há atropelo para me agradecer. Posso 
sair muito sossegadamente” . Bem excepcionais são as pa­
lavras ãuma mãe ãe família que foi ter comigo um dia para 
me dizer: “ O senhor naãa perdoa a meu filho, o senhor o 
vigia e o segue ãe perto. Venho agraãecer-lhe; seria mais 
fácil ãeixar passar tuão e não se ocupar com um aluno que 
tão pouco satisfez” .
Rara avis. Pois bem tuão isso é deplorável e, no fun­
do, os pais bem o sabem; mas que fazer? a fraqueza triunfa. 
“ Os meus pequenos são engraçadinhos” . Felizm ente o pro­
fessor é suptentaão pelo seu ideal superior. Mas quanto 
seria mais viável a tarefa. quanto lhe seria mais fácil fazer- 
se respeitar e, por conseguinte, amar se os pais colaboras­
sem com êle para o maior bem de seus filhos!” Como lhes 
posso fazer bem? dizia tristem ente a Rollin um regente de 
colégio, êles não me amam!”
A afeição é metade ãe tôda pedagogia; o autor dêste 
livro excelente e que não tinha necessiãaãe ãe prefácio para 
se fazer apreciar, não me contestará, tenho certeza. Pai 
ãe família, faze um amigo do mestre ãe teu filho!
André B audrillart
I N T R O D U Ç Ã O
O estudo das doutrinas pedagógicas é um elemento in­
dispensável na formação dos educadores. Dá-lhes idéias 
gerais sôbre as questões essenciais da educação, faz-lhes 
conhecer o desenvolvimento das instituições escolares, a 
evolução dos métodos e o valor das obras que terão que 
consultar mais tarde.
A ciência da educação não é uma ciência a priori. A 
geração espontânea não existe no mundo intelectual como 
não existe no mundo físico. Todo progresso supõe uma 
tradição, porque tem um ponto de partida e êsse ponto de 
partida está necessàriamente no passado. A pedagogia atual 
constituiú-se lentamente com as idéias, as experiências dos 
sistemas, que apareceram através dos séculos e nas diferen­
tes nações civilizadas, e que são as mais apropriadas para 
atingirem o fim que se propunham educando a mocidade.
Está, portanto, intimamente ligada à historia da educa­
ção. Ambas têm o mesmo domínio; elas se completam e se 
inspecionam mutuamente. “ O estudo histórico não nos dis­
pensa de têrmos uma doutrina, diz M. Rousselot; mas, agindo 
como um estimulante e como um guia. ajuda-nos a formá-la 
e nos fornece têrmos de comparação para julgarmos a que 
estabelecemos para nós” .
A história da pedagogia, além do interêsse que apresenta 
a todo espírito cultivado, nos revela a origem, a evolução,
o aperfeiçoamento incessante dos métodos; faz conhecer a 
contribuição de cada século para os progressos do ensino, a 
influência dos acontecimentos históricos na fundação das es­
colas; julga, em nome da moral, e de uma sã psicologia, as 
idéias dos clássicos da pedagogia; enfim, ela recolhe as ver­
dades duradouras cuja reunião constitui os elementos duma 
teoria, senão definitiva da educação, pelo menos fixada nas 
suas grandes linhas.
O conhecimento das doutrinas pedagógicas tem como 
efeito manter mais elevado o ideal dos mestres, abrir-lhes 
horizontes mais vastos, preservá-los da rotina e conservá- 
los em guarda contra uma presunção e uma arrogância que 
lhes seriam funestas. Se foram precisos longos séculospara 
formular um princípio, perceber-lhe tôda a importância, 
fazer dêle judiciosas aplicações, quão temerário seria o edu­
cador-que quisesse contentar-se com as suas próprias luzes 
e a sua experiência pessoal! É fácil verificar: os progressos 
na arte de ensinar não se realizam senão pela introdução, 
na escola, dos princípios e das leis que decorrem do estudo 
atento dos grandes escritores pedagógicos. A prática, é cer­
to, precedeu a teoria; mas a teoria reage contra a rotina e 
fiscaliza os dados da experiência.
A história da pedagogia nos faz conhecer as mais belas 
páginas dos grandes educadores. Que proveito não tiramos 
dêste estudo quando nos põe em relação com gênios imor­
tais, como Platão, Santo Agostinho, Descartes, Fénelon; com 
ilustres benfeitores da mocidade, como Gerson, S. Pedro 
Fourier, São J. B. de La Salle, Pestalozzi, o Pe. Girard, o 
Ven. Champagnat, Mons. Dupanloup, D. Bosco! Haverá 
coisa mais atraente do que a narração dos seus trabalhos, 
das suas fadigas, das provações sem número que os acome­
teram sem jamais abalar a sua constância? Os seus nobres 
exemplos são de natureza a fortificar os corações e as vonta­
des que se sentiriam fracassar num labor sempre penoso e
muitas vêzes ingrato. A sua vida “ estimula para o bem” , e 
;; mais bela página que deixaram é a do seu sublime devo- 
tamento ao apostolado da infância. O conhecimento das 
quimeras e dos erros pedagógicos também não é sem pro­
veito. Estes são, como se tem dito, experiências falhas que 
contribuem para o progresso dos métodos, premunindo-nos 
contra os escolhos que convém evitar. Assim êste estudo 
aviva o espírito crítico, habituando os mestres a não aceita­
rem as teorias senão quando receberam a sanção do tempo 
e da experiência.
Nesta obra estudamos sucessivamente a antiguidade, os 
primeiros séculos do cristianismo, a Idade Média, a Renas­
cença e os tempos modernos, seguindo o desenvolvimento 
das instituições escolares e indagando, dos mestres eminen­
tes de cada época, como êles conceberam o problema da 
educação. Assim unimos constantemente a história das ins­
tituições à análise das doutrinas; agir de outro modo seria 
isolar idéias e fatos que, na realidade, nunca estiveram se­
parados.
As doutrinas e os sistemas não têm valor senão enquan­
to se preocupam com a formação integral do menino. A 
educação muda de caráter, é incompleta e superficial quan­
do não é baseada em crenças.
A religião é, na família e na escola, um elemento indis­
pensável. Poder-se-ia demonstrar isso examinando os tris­
tes resultados da escola que pretende ser neutra, escutando 
as aflitivas lamentações das vítimas da dúvida, das almas 
angustiadas pelo tormento do infinito. Só ele revela ao me­
nino a sua grandeza e os seus destinos imortais; só ela,pode 
dar-lhe a vitória sôbre os seus maus instintos; só ela pode 
consolá-lo nas provações e sofrimentos da vida.
O exame das idéias filosóficas não é menos importante: 
em cada século a educação é o éco da filosofia dominante. 
Por trás da Ratio studiorum e da Companhia de Jesus,
já se disse, por trás do Emilio de J. J. Rousseau, apa­
rece tôda uma filosofia. Existem, portanto, relações bem es­
treitas entre a filosofia e a pedagogia; duma doutrina mate­
rialista, por exemplo, é difícil deduzir princípios de educa­
ção religiosa. Eis por que é necessário conhecer as bases 
sôbre que certos educadores têm edificado os seus sistemas, 
a fim de não se deixar ofuscar pelos aspectos brilhantes que 
as suas concepções apresentam.
A influência da família é um fato que também não se 
deve negligenciar. A familia é a célula da sociedade. É 
para o menino a escola por excelência. A sua inteligência, 
o seu coração, a sua vontade nela recebem impressões que 
jamais se apagam. É no lar que êle haure princípios reli­
giosos, começa a lutar contra os seus maus instintos e a pra­
ticar as virtudes que estão na raiz de tôda organização do­
méstica e social: simpatia, afeição, gratidão, respeito, obe­
diência, espírito de sacrificio, devotamento ao bem comum. 
A educação, na família, varia conforme a convicção dos pais 
e a autoridade que lhes é dada pelo costume e pelas leis. O 
papel da mãe sobretudo é de uma importância extrema; tudo 
que tendesse a torná-lo menos eficaz prejudicaria a educa­
ção da criança. (
O meio social completa a educação familiar. As con­
versações, as leituras, os acontecimentos da vida material, 
intelectual, moral e religiosa modificam as idéias, os senti­
mentos, o caráter da criança. Até o solo e o clima contri­
buem numa medida variável para a formação da sua indivi­
dualidade.
Será necessário acrescentar que êste volume é uma obra 
de boa-fé e de imparcialidade? Já não é permitido negli­
genciar, de caso pensado, certos períodos da história da edu­
cação e certas categorias de educadores. Acreditamos sin­
ceramente, por exemplo, que os primeiros séculos do cristia­
nismo apresentam algum interêsse no ponto de vista das es­
colas, e que a idade Média não é “ uma época verdadeiramente 
pobre sob o ponto de vista pedagógico” . Todos os devota- 
mentos, quaisquer que sejam as crenças que os inspiram, 
merecem a nossa admiração; e, procuramos lealmente em 
todos os sistemas a parte de verdade que êles encerram. Não 
se surpreenderão, portanto, de nos ver glorificar os séculos 
de fé, fazer justos elogios aos benfeitores cristãos da infân­
cia e fazer justiça à Igreja Católica, “ luz das nações” e “ ins- 
Trutora dos povos” há vinte séculos. Às vêzes querem que 
se ignore o mérito que lhe compete na fundação de escolas 
e nos progressos do ensino. Entretanto, os trabalhos dos 
historiadores mais eminentes demonstram claramente que 
ela foi desde os primeiros séculos a principal; e, em certas 
épocas, a única conservadora e dispensadora dos conheci­
mentos humanos.
Dedicamos especialmente este livro aos pais e mestres. 
Oxalá êle lhes dê uma idéia mais alta da sua incumbência, 
nobre entre tôdas! É o nosso maior desejo. E se os exem ­
plos de devotamento à infância que nêle acham os levarem 
a um cumprimento mais perfeito dos seus deveres de estado, 
será isso a nossa mais agradável recompensa.
HISTÓRIA DA PEDAGOGIA
4 W . ----------- \--------------------------------------------
NA ANTIGUIDADE 
---- — ............................................= .
CAPÍTULO PRIMEIRO
A E ptíC A Ç Â O NOS POVOS NÃO C IV ILIZA D O S
Entre os povos não civilizado^, a educação se apresenta 
sob a mais simples das suas formas: não há escolas propria­
mente ditas, nem programa de estudos; uma imitação servil 
é o único método empregado.
A formação da juventude é instintiva, rotinera e limi­
tada somente às coisas que têm por objeto a satisfação das 
precisões materiais: alimentação, vestuário, abrigo. Sob a 
direção dos pais, o menino se inicia pouco a pouco nas várias 
ocupações da tribo: cuidados da casa, fabricação de utensí­
lios, tecelagem >de vários panos, pesca e caça, manejo de 
armas, guarda dos rebanhos, trabalhos agrícolas. Não obs­
tante, êste modo de proceder implica uma espécie de edu­
cação intelectual e até o cultivo de certas qualidades morais. 
É possível, portanto, depreender desta formação rudimentar 
alguns traços da educação como nós a concebemos, isto é, 
ocupando-se ao mesmo tempo do corpo, da inteligência e da 
alma, em geral.
Educação física — Os selvagens deixam grande liberda­
de a seus filhos. Êstes aproveitam-na para se entregarem a 
alegres divertimentos. Um dos. seus jogos prediletos con­
siste em arremedar as ocupações da vida dos adultos. Entre 
as tribos guerreiras fazem espadas, escudos, arcos e flechas,
simulam emboscadas e combates; entre as tribos mais pací- 
íicas, imitam os trabalhos que têm à sua vista: tecelagem, 
construção de cabanas, obras de cerâmica, trabalhos de roça, 
pesca e caça, navegação em canoas. Estas diversões os pre­
param para a vida real; contribuem à sua formação intelec­
tual, apurando as suas faculdades de observação, de imagi­
nação e de invenção.
Educação intelectual — Aeducação é sobretudo prática; 
tem por fim tornar o menino capaz de prover às suas pre- 
cisões e, mais tarde, às da sua família.
Cedo começa esta formação e varia conforme ao sexo 
da criança e à maneira de viver da tribo. Se o menino está 
destinado a viver de caça e pesca, habituam-no, a princípio, 
a encontrar raízes, larvas de formiga e vermes; mais tarde, 
exercita-se em matar lagartos ou outros pequenos animais 
de que a tribo se alimenta.
E, enquanto se torna hábil no manejo das armas, apren­
de a trepar com agilidade, a preparar e colocar aparelhos de 
pesca. Segue o rasto de animais selvagens e conhece pelos 
mais leves indícios a presença da caça que procura.
Se se destina aos trabalhos agrícolas, guarda os reba­
nhos, aguça e alisa as ferramentas; vai à roça no momento 
da maturação dos grãos, afim de espantar os pássatos. Bem 
cedo se torna hábil em tôda espécie de trabalhos manuais.
As ocupações da menina são mais ou menos as mesmas 
em tôda a parte: aprende a levantar a choupana, a ajuntar 
lenha ou mariscos, a trançar esteiras e cestas, a preparar 
argila para os vasos de barro. Ajuda nas colheitas, joeira 
o grão, pisa-o e coze-o.
Entr-p êstes povos, a escola propriamente dita não existe. 
Entretanto, algumas grandes aldeias possuem uma constru­
ção especial que os meninos procuram aos grupos. Entre os 
Bororos do Brasil, por exemplo, essa construção toma o no­
me de bahito, e os meninos ali se reúnem para aprender a 
fiar, tecer, fazer armas e cantar as suas melodias nacionais.
Esta educação não dá às faculdades uma formação sis­
temática e racional, mas apura as que lhes são mais neces­
sárias no seu gênero de vida. Os pais, obrigados a lutar 
contra perigos de tôda sorte, compreendem instintivamente 
que devem exercitar os sentidos de seus filhos e dar-lhes 
uma agudeza extrema. E, realmente, o que impressiona logo 
nos selvagens, é a acuidade maravilhosa das suas percepções 
sensoriais. O seu ouvido é de grande delicadeza; os seus 
olhos são tão exercitados que certas tribos errantes podem 
conhecer pela vista o número, a idade e até a nacionalidade 
das pessoas que passaram. O seu olfato pode rivalizar com 
o dos cães.
São dotados de memória prodigiosa. O dono dum re­
banho, vendo desfilar os seus animais, às vêzes bem nume­
rosos, verifica se o rebanho está completo, indica e descreve 
as cabeças que faltam. A sua imaginação é igualmente mui­
to viva, como atestam os seus discursos, os seus cantos de 
guerra, as suas parábolas e contos. O poder de reflexão 
atinge, às vêzes, um grau tal que excita admiração.
Educação móral e religiosa — O senso moral dos povos 
não civilizados é muito embotado, mas a sua alma conserva 
ainda impressões da lei natural. A sua consciência fala- 
lhes, e impõe a seus pensamentos e a seus atos uma certa 
sanção. Compreendem a obrigação que têm de transmitir 
a seus descendentes alguns preceitos de boas maneiras e de 
bom procedimento. As suas recomendações dirigem-se ao 
culto dos antepassados, ao respeito aos anciãos e aos pais, ao 
sentimento de honra, à fidelidade à palavra dada, à obediên­
cia às autoridades legítimas. No entanto, esta formação se 
faz sem nenhum constrangimento: os selvagens crêem que 
todo castigo corporal degrada e que a alma do menino com
quem muito se ralha ou que muito se espanca, se sente mal 
no seu corpo e procura separar-se dêle.
As tribos guerreiras sempre cultivaram com cuidado o 
valor, a paciência, o desprêzo da dor e da morte. O P. Bres- 
sani cita rasgos admiráveis verificados por êle entre os índios 
da América do Norte: meninos aturam a fom e durante oito 
ou dez dias sem se queixar; rapazinhos amarram os braços, 
colocam uma brasa sôbre os seus braços amarrados e por- 
fiam para ver quem a aguentará por mais tempo; furam ou 
fazem' furar a sua pele com uma agulha, uma sovela aguça­
da ou uma ponta aguda e desenham assim sôbre os seus 
corpos, para ficar indelével, uma águia, uma serpente, um 
dragão ou qualquer outro animal favorito.
Em numerosas povoações, a passagem da infância para 
a adolescência é distinguida por certos ritos particulares que 
têm o caráter duma formação moral.
Os jovens são separados da comunidade e enviados por 
algum tempo, sob a guarda dos anciãos mais respeitáveis da 
tribo, para uma residência especial afastada da aldeia. A 
princípio executam certas cerimônias de caráter purificató- 
rio: jejuns, privações de certos gêneros de alimentos, por 
exemplo, dos que êles consideram gulodices. Vêm depois os 
ritos da iniciação.
Compreendem invariàvelmente uma representação mími­
ca da morte e da ressurreição; de então em diante estão m or­
tos para a vida irresponsável da sua infância e devem viver 
para os deveres mais graves de que vão ser incumbidos.
Dão-lhes um nome novo e fazem-lhes aprender um dis­
curso esotérico somente conhecido pelos iniciados. Os jo ­
vens são, às vêzes, submetidos, no curso da iniciação, a pro­
vas brutais e repugnantes: extração de dentes, tatuagem, 
escarificação, circuncisão. Estas provas permitem avaliar a 
coragem dos candidatos. Estimam muito os que podem su­
portar os mais graves sofrimentos com o ânimo do Espar­
tano.
As instruções que lhes são dadas por essa ocasião, refe­
rem-se às leis do matrimônio, às tradições sagradas da tribo, 
às divisas do território, às precauções a tomar contra certos 
vícios degradantes, à fidelidade ao chefe da nação. Os ins- 
rrutores não esquecem o lado material- e prático da vida. 
Dão aos seus ouvintes instruções judiciosas sôbre a guerra," 
a caça, a pesca e as artes manuais; exortam-nos a combater 
com coragem, a proteger os fracos e a defender os oprimidos.
As noções religiosas que os povos de civilização inferior 
transmitem a seus filhos são quase sempre eivadas de cren­
ças supersticiosas, de práticas exquisitas, frequentemente 
imorais e cruéis. Distinguem-se nelas, contudo, dum mo­
do mais ou menos claro, um conjunto de preceitos, de prá­
ticas, de instituições, que razoàvelmente se podem conside­
rar como os elementos primários da religião. Mons. Le Roy 
assim resume êstes dados fundamentais:
“ Distinção entre o mundo visível e o mundo invisível; 
sentimento de dependência do homem com relação a êsse 
mundo superior; crença em um poder supremo, organizador 
e senhor do mundo e, ao mesmo tempo, pai dos homens; 
crença em espíritos independentes; uns, tutelares; outros, 
hostis; crença pa alma humana distinta do corpo e separan­
do-se dêle à hora da morte; crença no mundo do Além, o 
mundo das almas e dos espíritos; senso moral baseado na 
distinção do bem e do mal; sentimento de pudor, de justiça, 
de responsabilidade, de liberdade, de dever;' reconhecimento 
explícito ou implícito da consciência; noção de pecado, com 
sanção aplicada pela autoridade do mundo invisível ou de 
seus representantes; organização cultuai: oração, oferenda, 
sacrifício, ritos, cerimônias, símbolos; sacerdócio, primeira­
mente representado pelo chefe de família; depois, pelos an­
ciãos ou sacerdotes; distinção entre o sagrado, e o profano, 
e atingindo as pessoas, os lugares, os objetos e as palavras; 
estabelecimento e organização da família como centro social
e religioso procurando conservar a pureza do sangue, im­
pondo leis a si mesma, distinguindo-se por sinais especiais, 
fortificando-se por alianças (toténs) e transmitindo as suas 
tradições, sobretudo por ocasião das principais fases da vida: 
nascimento, adolescência, casamento e morte” . (A la re- 
cherche ãe Vorigine ães religions, p. 21-22. Paris, 1922).
B ib liografia O) — A . B r o s , La Ueligion ães peuples non civilisés ( P a r i s , 
1 9 0 7 ) . — C hristus, Manuel ã ’ lústoire ães Religions, eh. I et I I ( P a r i s , 1 9 3 2 ) . 
-— Cyelopeãia o f éãucation, art. Primitive peoples (N e w -Y o rk , 1 9 1 1 ) . — Dic- 
tionnaire apologêtique, art. Animisms, Fêtidhisme, Naturalisme. — E a s t m a n , 
Inãian boyhooã ( N e w -Y o rk , 1 9 1 2 ) . — M g r . L e R o y , La Ueligion ães primi, 
tifs ( P a r i s ,1 9 0 9 ) . — P . M o n r o e , A text-booh in the history o f éãucation, 
c l i . I (N e w -Y o rk , 1 9 0 6 ) .
CAPÍTULO II
A EDUCAÇÃO NA CHINA
Resumo histórico. “ . . . Os Chineses se atribuem origens fabulosas, 
mas a existência regular da sua nação parece remontar ao anoi três 
mil antes cTa era cristã. Os fatos autênticos de sua história só datam 
de três séculos antes de nossa era. O primeiro imperaefor célebre foi 
Chewang-te (246-210) que fêz construir a grande muralha.
Desde os tempos mais remotos até a aurora do século XX, a forma 
de govôrno foi o absolutismo. O imperador, Filho do Céu, segundo pen­
savam, participava da força do alto. Ninguém ousaria examinar ou
(1 ) D epois de cada estudo im portante, indicam os algum as obras nas 
quais se encontrarão desenvolvim entos que podem interessar. É inútil dizer 
que não pretendem os dar — o que aliás seria im possível — uma b ib liog ra fia 
com pleta do assunto. O Dicionário e o Novo Dicionário ãe Peãagogia são 
os de B u isson ; — a Cyelopeãia é que apareceu em cinco volum es, sob a d i­
reção de M onroe, na livraria M acm illan, N ew -Y ork (1 9 1 1 -1 9 1 3 ) .
contradizei as suas ordens consideradas divinas. Hoje. a China é uma 
república constitucional.
Sob a influêncià das idéias ocidentais, o povo chinês, entorpecido 
durante longos séculos numa meia civilização, parece entrar hoje na ca­
minho do progresso, mas não se desembaraça senão com dificuldade do 
seu estreito formalismo.
* Religião. —: Og chineses professam sobretucfo o confudonismo, o 
budismo © o taoismo.
O confucionismò é a doutrina de Çonftícia (551-478). Êste filósofo 
tratou soibretudo, nos seus ensinamentos, C nos seus escritos, de elevar a 
tradição., A doutrina que melhor se desprenderia das suas obras, diz 
Mons. E. Blanc, seria um vasto naturalismo panteístico ( Diccion. ãe 
p'hilosophiel art, Confuoius). Os seus livros formam o código moral e 
político da China.
Buda (622-543), filósofo indu, é o autor dfo &udismo. A sua doutrina 
compreende a eternidade da matéria, a transmigraçâo das almas e o 
nirvana ou aniquilamento. Ensina também que todos os hcimens são ir­
mãos e que se devem tratar com bondade, piedade e amor.
Renúncia, vida virtuosa, supressão de todo amor próprio, caridade 
para com o próximo, tais são, conforme Buda, as virtudes cardeais que 
n traem as bênçãos sôbre a humanidade.
O taonismo é a doutrina do Taot livro principal de Lao tseu, filósofo 
contemporâneo de Confúcio. O seu ensino se resume numa espécie de 
panteísmo, e a sua moral na doutrina do não-agir. Quer êle que o povo 
viva no bem-estar e na tranqüilidade, mas sem receber instrução, a fim 
de fugir aos (Tesejos inquietos, insatisfeitos, que são a conseqüência dela.
A educação tradicional — O antigo sistema de educação 
existia vários séculos antes da nossa era e ainda não desa­
pareceu completamente; o que nos permite descrevê-lo como 
atual. _
A primeira educação se faz na família. Confúcio diz 
no pai: “Educa teu filho desde cedo, ensina-o a mover-se, 
a ficar em pé, a falar, a comportar-se em visita, a distinguir 
ü> que deve aos velhos e aos moços. Aos sete anos ensina- 
lhe os caracteres. Enquanto é pequeno não o acostumes a 
comer bem e. andar bem vestido; que não tenha fome nem 
frio, é quanto basta”.
Considera-se a educação familiar, muito importante. A 
família é o núcleo da organização social; se os pais dão aos 
filhos bons princípios, a vantagem será para o Estado todo: 
“Se os negócios da casa são bem dirigidos, os do Estado o 
serão também, porque êstes descansam sôbre aqueles; quem 
venera seus pais venerará também o rei” .
Educação escolar — O menino vai à escola pela idade 
de sete anos. Na China as escolas são numerosas. Nas ci­
dades grandes cada bairro possui uma ou duas. Os alunos 
são obrigados a ter grande veneração pelo mestre. Há uma 
máxima que diz que se deve venerar tôda a vida como um 
pai, o professor que se adotou: “ Quando um aluno acom­
panha seu mestre na estrada, não o deve deixar para falar 
a outra pessoa; também não deve caminhar atrás dêle, mas 
deve conservar-se um pouco à direita. Quando o mestre se 
apoia sôbre o seu ombro para lhe dizer alguma coisa ao ou­
vido, deve colocar a mão sôbre a bôca para o não incom o­
dar com o seu hálito; jamais deve interrompê-lo quando êle 
lhe fala” .
A peça principal da mobília da classe é a prateleira de 
Confúcio; o aluno saúda-a ao entrar, prostra-se, oferece o 
arroz, o incenso, velas para as festas. Um assento e uma 
mesa para o mestre completam a mobília. Os alunos for­
necem tudo o que lhes é necessário: mesa, cadeira, livros e 
papel.
Curso de estudos — Podemos distinguir, na China, os es­
tudos elem entares e os estudos superiores. Os estudos ele­
mentares fazem-se dos sete aos doze anos. É seu fim .prin­
cipal conservar a unidade da nação, manter as tradições an­
cestrais e preparam o menino para os deveres da vida. Para 
conseguir êsse resultado emprega-se, como meio, a educação 
religiosa que faz conhecer 0 bem; como aplicação, as boas
maneiras, que exprimem a retidão do coração, e o cerim o­
nial que presta a cada um as honras que lhe são devidas.
A ciência religiosa é tomada dos livros sagrados que são 
em número de nove: os quatro livros clássicos e os cinco 
livros canônicos, escritos ou colecionados por Confúcio e seus 
discípulos, e cujo conjunto forma um código político e moral 
universalmente respeitado, que todos os festudantes devem 
aprender de cor.
Ligam os Chineses grande importância ao que êles cha­
mam as cinco correlações comuns a todos os homens: rela­
ções entre soberano e súditos, pais e filhos, espôso e esposa, 
irmão e irmã, companheiro e companheira. E imaginam, 
diz o P. Ricci, que nos países estrangeiros não se ocupam 
dessas relações.
O menino é formado com grande cuidado na polidez e 
boas maneiras. Um dos primeiros livros que lhe põem nas 
mãos, é um tratado sôbre a Piedade filial, escrito em forma 
de diálogo e que contém os deveres dum filho para com seus 
pais.
O curso de estudos elementares compreende, além disso, 
a leitura, a escrita e os elementos do cálculo. Acrescentam- 
lhe a música como ,um meio de introduzir a harmonia nas 
?lmas. Os elem entos ãe leitura e de escrita são aprendidos 
tendo à vista os objetos cujos signos se estudam: tem-se as­
sim a coisa, o nome e 0 sinal escrito. Para o cálculo ser­
vem-se do suan-pon, espécie de ábaco-contador. O menino 
é submetido a três espécies de trabalhos: exercícios de me­
mória, explicação de sentenças e composições elementares.
Os estudos superiores têm por fim formar letrados ou 
nspirantes às funções do Estado. O curso de estudos é so­
bretudo literário: o aluno estuda os nove livros sagrados que 
encerram tôda a filosofia ortodoxa e quase tôda a história 
antiga da China; depois, a literatura de certas épocas, es­
pecialmente as poesias da dinastia dos Tangs; as odes de
Li-Ta-Ko, cuja riqueza eqüivale, ao que parece, às de Ho- 
:. ácio ou de Anacreonte. Depois disso, dedica-se ao estudo 
dos ensaios dos mestres antigos; em seguida, à historia por­
menorizada da China; e, enfim, à filosofia nos comentadores 
de Confúcio e nas obras dos filósofos que ocupam o primeiro 
lugar entre os pensadores do império. Deve adquirir ain,da 
noções sôbre os astros, minerais, flores, animais, e conhecer 
as grandes leis da natureza. Aos dezoito ou- dezenove anos 
está maduro para os exames.
Apreciação — Este gênero de educação presta-se muito 
à critica. Liga-se demasiado à cultura da memória e negli­
genciam-se as demais faculdades. O trabalho é difícil, abor­
recido, sem atrativo; é obtido, antes, pelo temor do que pelo 
interêsse. — A cultura moral é igualmente insuficiente: nada 
ou quase nada para a formação do caráter e da consciência. 
O menino é submetido a uma passividade quase absoluta, a 
qual sufoca a personalidade. O estudo exclusivo da litera­
tura nacional desenvolve um patriotismo exagerado que leva 
a desprezar o que é estrangeiro.
Educação nova— De alguns anos para cá os métodos 
europeus de educação se têm introduzido na China, à imi­
tação das escolas fundadas pelos missionários católicos (La- 
zaristas, Associação das Missões estrangeiras, Jesuítas, Ir­
mãos Maristas, etc.) e dos missionários protestantes. Em 
1898, o imperador decretou a fundação de escolas médias e 
superiores e organizou uma universidade conforme o modêlo 
das universidades do Ocidente. Esta medida, porém, desa­
gradou e o inovador foi destronado. Entretanto, a univer­
sidade subsistiu. Em 1902 ela foi unida ao colégio dos In­
térpretes que existia em Pekin, havia quarenta anos. Rea­
briu-se como tal em 1903. Um decreto de 1904 a reorganizou 
em quatro secções: moral e filosofia, línguas estrangeiras,
direito e ciências políticas, história e belas-letras. Deixa-se 
uma grande parte aos clássicos chineses. Hoje, cada pro­
víncia tem sua universidade. O ensino ministra-se à euro­
péia em grande número de escolas secundárias e primárias. 
As nacionais de estrangeiros se submetem à fiscalização 
oficial.
Esta educação nova muito pouco se preocupa com a for­
mação moral. A própria familia deixa ao menino uma li­
berdade excessiva. Os professôres, na maior parte, estão 
convencidos da inanidade das religiões, do valor exclusivo 
das ciências empíricas, e estão impregnados das doutrinas 
materialistas de Büchner e Heckel; confessam que, para êles, 
o fim moral e religioso é secundário e que o fim humanitá­
rio e social é preferido. Os Chineses que fizeram os seus 
estudos na Europa e na América, voltam à pátria persuadi­
dos de que a religião já teve seu tempo e repetem, nas re­
vistas e livros, as velhas fórmulas do positivismo: “A ciên­
cia substitui a religião! A humanidade substitai-se defini­
tivamente a Deus!”
Os alunos, ao invés de seguirem seus cursos, fazem con­
ferências, organizam manifestações; os manuais são imbuí­
dos de idéias revolucionárias; os livros de moral não ensinam 
senão um grosseiro materialismo. (L. Coiffard, Notes sur 
Venseign. en Chine, Enseignement chrétien (juin 1922). Tal 
formação faz desclassificados, folgazões ou revoltados. Üni- 
camente o cristianismo seria capaz de reagir contra a corru­
ção dos costumes e de formar corações e vontades; mas êste 
ainda não penetrou as massas.
B ib liogra fia — BiOt, Essai sur 1’ instruction publique cn Chine (P aris, 
18 47 ). — M . C o u r a n t , Études sur 1’éãucation ct la colonisation (P aris , 
1 9 04 ). — Cyclopeãia o f eãucation, art. China. — S. S. L a u r j e , Tlislorical 
survey o f Prc-Christian eãucation (L ondres, 1907). — M a r t i n , The Chine se t 
tlieir eãucation, philosophy anã letters (N ew -Y ork , 1881). — Nouvcau Vic-
tionnaire de Péclagogic, « r t . Chine. — B . P. W ie g e t La Chine moâerne, 
3 vol. (Paris, 1922). •
CAPÍTULO III
A EDUCAÇÃO NO JAPÃO
Regumo histórico. — Compõe-se o Japão de cinco grandes ilhas, a 
saber: Hanto ou Nipon, Sikoku, Kiusa, Yezo, Formosa e algumas outras 
ilhas de menor extensão.
A fundação dó império remonta; segundo os anais japonêses, áo sé­
timo século ant«s t’.a ncissa era. O imperador exerceu diretamente 'i 
autoridade militar até o século X II, em que a entregou a um genera- 
Hssirno chamado Shagun. Na século X V II a dignidade de Shagiln tor­
nou-se hereditária e o imperador não exerceu mais que uma autoridade 
nom inal; os nobres foram reduzidos ao estado í e vassalos com o nome 
de daimios- Êste período (le feudalismo militar durou até 1868. Nessa 
época o imperador tornou a ser soberano efetivo. Desde então o Japão 
tem realizado um progresso intelectual e material “sem precedentes nos 
anais da humanicíade.”
Religião. — Três religiões dividem as crenças do povo japonês: 
oi shintoísnu)' o budismo e o cristianismo.
O sintoismo (shinte, voz ílos deuses) é a religião primitiva dos Ja­
ponêses. Consiste na veneração dos deuses, isto é, dds antepassados da 
casa imperial, e em certas orações aos deuses do vento e dfo fogo, à 
deusa da alimentação e da cozinha. Prescreve também certas purifi­
cações que têm em vista as manchas corporais mais do que ás morais.
O budismo foi introduzido no Japão no sexto século da nossa era 
e adotaiío, pouco a pouco, pela grande massa da nação. Desde então a 
civilização japonêsa seguiu um desenvolvimento ao mesmo tempo para­
lelo e subordinado ao da China. Tôdus as obrigações, morais'impostas 
pelo budismo se resumem nos Goleai e nos Gorin. Os Gokai são os prin­
cipais mandamentos: nãi matar, não furtar, não se entregar à luxúria, 
não mentir, não tomar bebida alcoólica. Os Gorin são as cinco relações 
humanas dos Chineses.
O cristianismo, perseguido por muito tempo, é tolerado hoje em vir­
tude da liberdade dos cultos. O juãmimo e o maometismo têm poucos 
adeptos no .TapãQ.
Educação antiga — Pelo ano 270 da nossa era, um le­
trado chinês, vindo da Coréia, trouxe para o Japão a escrita 
chinesa. Até ,essa época a maior parte dos japonêses igno­
rava a arte’ de escrever. O rei Mommu estabeleceu, em 701, 
uma universidade em .Tóquio, ordenou a criação de escolas 
em cada província e promulgou regulamentos relativos à 
educação.
O pessoal da universidade de Tóquio constava de um 
superintendente, um adjunto e professores. Uniam-se à uni­
versidade as escolas especiais de medicina, astrologia e mú­
sica.
Os estudos começavam entre os treze e os dezesseis anos. 
Dois íivròs, de início, eram pçstos' nas mãos dos estudantes: 
o Kokio, ou Livro do dever filial, e o Rongo, ou filosofia de 
Confúcio. Estudavam a seguir as especialidades a que se 
consagravam. Os exames do fim dos estudos eram presidi­
dos pelo ministro das cerimônias. Os candidatos eram gru­
pados em categorias, conforme as especialidade? que tinham 
estudado: clássicas chineses, ciências políticas, jurisprudên­
cia, matemática, medicina, astronomia.
Cada escola de província tinha um professor escolhido 
pelos notáveis; se ninguém era capaz de desempenhar êsse 
cargo, dirigiam-se ao ministro das cerimônias o qual desig­
nava o titular. Aprendiam primeiro a ler; depois, a com­
preender os caracteres chineses; por último, liam o Kokio 
e o Rongo. Os alunos que desejavam ler mais de dois livros 
clássicos eram transferidos para a universidade.
Durante o shagunato, a universidade de Kioto, que havia 
desaparecido, foi substituída pelo Colégio de Confúcio, em 
Yedo. Êste estabelecimento chegou a contar três mil alu-
nos. Os daimios também criaram escolas em suas provín­
cias. Os negociantes, os agricultores e os artífices que qui­
sessem fazer instruir seus filhos, deviam confiá-los a profes­
sores particulares. O número de Japonêses que recebiam 
uma educação elementar, era considerável. Às mulheres só 
se dava uma instrução limitada; algumas, no entanto, se 
distinguiram pela erudição e talentos poéticos.
Educação nova — Desde 1868, a educação é organizada 
no Japão segundo os métodos ocidentais. É dirigida por um 
ministro de instrução pública, inspetores especiais para cada 
gênero de ensino e um conselho de instrução pública.
As escolas de todos os graus são numerosas: escolas pri­
márias e primárias superiores, escolas normais, escolas se­
cundárias, universidades (Tóquio, Kioto, Sapporo); escolas 
profissionais para o comércio, a agricultura, engenharia flo ­
restal e engenharia civil; escolas especiais de música, de lín­
guas estrangeiras, de medicina, de direito, de letras, etc.
O Japão exerce uma influência intelectual considerável 
sôbre todos os povos da Ásia: Chineses, Indus, Coreanos, 
freqüentam as suas escolas e universidades.
Apreciação da educação nova — Fazem-se algumas cen­
suras à educação atual dos Japonêses. — A primeira é a de 
ter destruído, sem os substituir, os fundamentos das reli­
giões de origem chinesa. A legislação impõe neutralidade 
absoluta às escolas primárias e secundárias. O ensino mo­
ral é baseado unicamente no culto do imperador e no amor 
da pátria. Enche-se a cabeça dos meninos com a narração 
das maravilhosas proezas dos antepassados, mas esquecem 
defalar-lhes das virtudes ordinárias. O resultado prático, 
é uma juventude precoce e pretenciosa, com ares pessimistas 
e desiludidos. O problema seria achar uma moral que pu-
desse-satisfazer às almas: os sistemas propostos pecam pela 
base. Só o cristianismo podia satisfazer. Além disso, os 
Japonêses dificilmente aceitam o sobrenatural; êles mesmos 
confessam ter a alma “profundamente agnóstica”. As con­
versões aò protestantismo não têm maior importância “do 
que um mudar de roupa”.
Censur4-se*à pedagogia japonêáa ser por demais calcada 
iôbre a dos povos ocidentais; têm, daí, resultado defeitos 
consideráveis: os livros são muitas vêzes acima do alcance 
dos alunos e os professores apegam-se de preferência às pas­
sagens mais abstrusâs; os professores empregam por demais 
a forma unicamente expositiva. A fiscalização do Estado 
parece excessiva. Está tudo tão minuciosamente previsto 
que'não fica lugar para nenhuma iniciativa pessoal. Os me­
ninos sonham só em ser funcionários, e os educadores pro­
curam demasiadamente salvar as aparências.
O barão Aruske assim caracteriza a educação nova: “A 
pedagogia japonêsa é tôda de fachada, admirável no papel, 
de fato “puramente decorativa”. Os estudantes saem das 
universidades pelos vinte e cinco ou vinte e oito anos, le­
vando uma formação de pouco uso. Tôdas as suas energias 
foram dirigidas para o que ér meio: mas o fim, a vida real, 
foi completamente Tiegligenciada. Em compensação esta mo­
cidade tem a cabeça repleta de teorias revolucionárias que 
ela vai propagando pelo país, “o que não acontece sém causar 
justos receios aos espíritos bons”.
B ibliografia. — C h b istts , Manuel ãss Seligiont, ch. IV . — CyrXo- 
pedia af eãucation, art. Japan. — Étufies, n.o du 20 mai 1914. — Aperçu 
gênêral fie 1’ éfiucation au Japon (Tokio, 1905JV — Bevue hebãomadaire, 
n.o du 31 décembre 1910.
A EDUCAÇÃO DOS INDUS
Resumo histórico. — A história antiga da Índia é puuco conhecida. 
O livro de .Tó faz alusão às riquezas destas regiões e, às vêzes, tomam 
pela índia o país de Ofir, aonde Salomão, de combinação com ofe Fení- 
clos, enviava suas frotas. Êste país ;só entra definitivamente na história 
pela invasão de Alexandre (327 a. C.). Os Árabes nela fizeram in­
cursões no século VIII. Tamerlãa fundou ali, alguns séculos1 mais 
tar(Te, um vasto império, cujas ruínas algumas potências européias, 
sobretudo a Inglaterra, repartiram entre si. Não obstante as- oposi- 
ções e revoltas, os ingleses não têm cessado de estender os limites das 
suas possessões e têm permanecido os 'senhores da Índia.
Religião. — O bramqnitsmo, religião primitiva, foi um instante des­
tronado pelo budismo que procurou a destruição das escolas existentes; 
mas êste novo culto não "tardou em perder seus partidários. Não existe 
hoje senão em Ceilão e na vizinhança da China.
Os livros sagrados dos Indus sãoi os Vedas, aos quâis acrescentam 
os Puranas (livros de orações), o Mahabârata, o Samaiana (livros épi­
cos) e as 'leis de Manu, coletânea de preceitos morais, de leis, de tradi­
ções e de costumes.
Os Vedas são a mais importante dessas colefáneas. Contêm as 
idéias religiosas da raça Ariana e a narração dos principais acontecia 
mentos nesses povos desde o comêço das suas invasões até o seu estabe­
lecimento definitivo na Índia. Dêste livro se destaca uma espécie de 
panteísmo cujos traços principais são os seguintes: no princípio existiu 
uma espécie de deus adormecidV), Bralim. ■ O seu acordar foi o sinal da 
criação e da produção dos fenômenos. Do seu seio saíram Brahma, 
Vishnu e Siva, que formam a trimurti indiana.
Castas. — Nas Índias, o povo está há muito tempo dividido em 
castas: 110 grau mais elevado estavam os brâmaneg. Compreendem os sa­
cerdotes e os sábios: juriscansultos, méd'icos, professôres; em seguida, 
vinham os guerreiros, oficiais e soldados, os negociantes, os artífices, os 
agricultores; por líltimo, qs servos que não tinham direito a nenhuma 
educação. Abaixo destas castas estavam os párias, reputados infames 
e indignos de tér comunicação com os outros membros da sociedade.
Durante longna séculos os brâiíianes ('xeivevairt n maior influência. 
Foram, ao mesmo tempo, sacerdotes, pl-cfessôres, legisladores, guardas 
da literatura védica e de todos os conhecimentos- Fdram éies que de­
terminaram as ciências que cada uma das outras castas deve possuir.
Educação na família — Os Indus amam muito os filhos 
e os educam para a vida futura. Inspiram-lhes grande res­
peito pelos; pajs e mestres. A instrução familiar limita-se a 
algumas práticas de piedade e à aprendizagem dum ofício. 
Tudo se aprende por imitação e o nascimento fixa o destino 
de cada menino. Disto resulta uma rotina que abafa tôda 
individualidade, todo talento pessoal, e não deixa nenhuma 
possibilidade „de alguém se elevar pelo esforço acima da sua 
condição.
Educação elementar — Os meninos das castas superiores 
têm direito à educação, e os livros sagrados .(Shastras) orde­
nam a fundação duma escola em cada aldeia. Mas as moças 
não recebem educação; são consideradas sêres inferiores, e 
os Indus acreditam que a mulher letrada não obedece nem 
quer trabalhar.
O professor pertence à classe dos brâmanes. É objeto 
r’ e grande e proferida veneração. Os Vedas aconselham que 
levem um assento atrás dêle quando sobe umá montanha, 
nara que possa descansar, e recomendam que lhes segurem 
as sandálias enquanto êle se veste. E o livro sagrado acres­
centa: “Aquêle que censurar seu mestre, ainda quando êste 
se tivesse enganado, entrará depois dai morte no corpo dum 
burro; se o censurar falsamente transformar-se-à num cão; 
se êle se servir do que lhe pertence sem lho pedir, passará 
para o corpo de um verme; enfim, se invejar os seus méritos,, 
será transformado em vérminà”.
O mestre é considerado como quem faz um trabalho todo 
espiritual, e seria urn insulto oferecer-lhe retribuição. Mas 
os seus alunos podem dar-lhe presentes e oferecer-lhe, con-
forme seus'meios, “ um campo, ouro, pedras preciosas, uma 
vaca ou um cavalo, um guarda-sol, um par de chinelos, um 
escabêlo, cereais, roupas ou um manjar delicado” .
O curso de estudos é, por assim dizer, exclusivamente 
religioso. O menino é instruído a princípio oralmente; de­
pois, estuda os livros sagrados: catecismo budista e Vedas. 
A moral se ensina sobretudo por meio de provérbios e fá­
bulas. O catecismo budista é dividido em duas partes. A 
primeira encerra dez mandamentos com relação: a) aos 
três pecados ão corpo: assassínio, furto, impureza; b) aos 
quatro pecados ãa língua: mentira, calúnia, injúrias, conver­
sações ociosas; c) aos três pecaãos do espírito: cobiça, ma­
lícia, ceticismo. A segunda aponta cinco perigos que cum­
pre evitar: o abuso de licores que produzem embriaguez, o 
jôgo, a preguiça, a companhia dos maus, os lugares de di­
vertimentos públicos.
As outras matérias do programa são a leitura, a escrita 
o a aritmética.
Métodos — O mestre dá o ensino individual, e cada alu­
no forma uma divisão. Às vêzes, os maiores e mais adianta­
dos dirigem os trabalhos dos menores. Daí seguiu-se o sis­
tema mútuo.
Para aprender os caracteres, o menino traça-os primeiro 
sôbre a areia com os dedos ou uma vara, depois os grava 
com uma ponta de ferro em fôihas de palmeira; finalmente, 
permitem-lhe reproduzi-los a tinta em fôlhas de plátario. 
Em aritmética, o conhecimento das tabuadas precede o es­
tudo das quatro operações.
A disciplina é geralmente suave e paternal. As leis de 
Manu prescrevem não empregar a vara senão depois que 
todos os outros meios forem esgotados: “ Se um aluno se 
torna culpado duma falta, o seu professor o repreenderá 
severamente e o advertirá que na próxima transgressão o
corrigirá com a vara. E se a falta é cometida num tempo 
frio poderá lançar-lhe água fria” .
Educação superior — A educação superior é organiza­
da, na índia, há milhares de anos. Com o nome de pa- 
rishadas existiam colégios muito tempo antes de Cristo. No 
princípio, a parishada tinha trêsprofessôres; mais tarde, 
leve vinte e um e tornou-se verdadeira universidade.
Durante muito tempo, os altos estudos foram únicamen- 
(e reservados aos brâmanes. Mas, à medida que se desen- 
' olveram as cidades, nelas fundaram-se escolas de litera­
tura, de direito, de astrologia, de astronomia e de medicina.
O programa compreende o conjunto dos conhecimentos 
humanos: relig!ão gramática, matemática, astronomia, li­
teratura, filosofia, direito e medicina. Nas leis de Manu 
é que se deve procurar o ideal a atingir: ‘Aprender e com ­
preender os Vedas, praticar piedosas mortificações, adqui­
rir o divino conhec;mento da fé e da filosofia, tratar com 
veneração o pai natural e o pai espiritual” .
Os livros sagrados formam a base e a coroa da cultura 
intelectual dos Indus. Do estudo atento dos Vedas têm 
feito derivar a maior parte das suas ciências: a fonética, 
pronúncia verdadeira e natural dos sons; a gramática, arte 
ua construcão das frases: a métrica, a liturgia e os seus 
ritos, a exegese para explicar-lhe a significação, a astrono­
mia para a determinação cronológica dos sacrifícios. A es­
tas ciências primitivas se acrescentaram outras da mesma 
origem: a jurisprudência, as lendas, a lógica e a dogmática. 
Ass:m se formou o sistema ãas dez ciências às quais vieram 
a juntar-se a música e a medicina.
Os Indus têm levado bem longe os estudos gramaticais; 
o seu método tem servido de modelo aos gramáticos m o­
dernos. Em todo tem oo têm cultivado com cuidado a ma­
temática. Atribui-se-lhcs a invenção do sistema decimal.
Apreciação geral — Graças ao seu sistema de educação 
superior e ao espírito de espiritualidade que a anima, a 
índia sempre foi um país de ascetas, de letrados, de filóso­
fos e de matemáticos. Mas a educação elementar é preju­
dicada por graves defeitos: rotina excessiva dos mestre?, 
cultura demasiado exclusiva da memória, negligência sis­
temática da educação das mulheres, das crianças, dos ser­
vos e dos párias. Ocupa-se muito pouco com a formação 
do caráter e o cultivo da vontade. O regime das castas 
mantém, entre os Indus, um espírito de egoísmo, de sufi­
ciência e de orgulho que os impede de adotar as idéias e 
os métodos dos Ocidentais.
A educação' antiga tende a desaparecer. Colégios e 
universidades, fundados sobretudo pela Inglaterra, existem 
em várias cidades. A difusão do cristianismo enfraquece 
pouco a pouco o espírito de casta e prepara o reino de uma 
íraternidade conforme o espírito do EVangelho.
Bibliografia. — Chri-Stus, Hintoires de.s religions, cli. V I. — Cyelo. 
pedia o f (ducalion, art.' índia. — líüTT, O. R., History o f civilization in 
■ Aiicieiil índia, 3 rol. (Londres et Caleutta, 1900). — Laurie, Pre-christian 
(ducation. — Paroz, Histoire universelle de la pédagoyie (Paris, 1883 y. 
— W arren, .1. SchooJn in British índia ( Washington. 1873).
CAPÍTULO V 
EDUCAÇÃO DOS ASSÍRIOS E BABILÔNIOS
Resumo histórico. — A Assíria ocupava n parte superior (la bacia 
do Tigre e (To Kufrates: e, Babilônia, a parte inferior. A Caldéia, pla­
nície imiitu rica e muito fértil, era uma província de Babilônia. Qs 
povos que habitavam êsses países erain originários dos elevados planal-
11is da 'Ásia. ' Os Caldeus, primeiros possuidores do solo,, tinliam uma- 
civilização muito adiantada foram subjugados e absorvidos peliís Ba-' 
liilônios.
Religião. — Pelos textos conhecidos até << dia de hoje, a mais an- 
llga forma dê religião dos Assírios tf dos Babilônios fói o politeísmo. 
Cada cidade tinha o seu (1'eus, o qual possuía .d seu templo, recebia as 
homenagfns <io póvo e o protegia. Este deus era assistido poiv uni nú­
mero considerável de divindades secundárias. O rei da cidade não era 
mais do que oi seu representante ou o seu sacerdote. No decurso dos 
séculos o número das divindades diminuiu e uma hierarquia se formou, 
íi lesta da qual se achava reunida Uma espécie de tríade composta de 
.Inou, deus do céu de En-lil, deus da terra e de Ea, delis do mar.
Os Assírios e Babilônios tinham a alma religiosa- Os textos dos 
liidos e das orações que dirigiam fi divindade exprimem sentimentos 
muito elevados. Acompanhavam as suas súplicas com presentes, li- 
bações e sacrifícios. Tinham a noção, do liem e do mal e consideravam 
a doença e ás provações como castigos. O culto que tributavam aos 
mortos, prova que tinham idéia da vida futura. Mas nenhum texto 
conhecida atesta a sua crença na ressurreição geral ou 11a transmigra- 
ção das almas.
Educação — Os Caldeus tiveram escolas, e os magos- 
foram os seus primeiros professores! Os templos eram os 
principais centros de atividade intelectual. Os Caldeus de­
sapareceram como raça; mas legaram a seus vencedores 
uma civilização muito adiantada. O seu idioma, estudado 
como língua morta, só era empregado nas cerimônias reli­
giosas.
Nada se sabe de preciso sôbre a organização escolar 
dos Assírios e Babilônios, mas o estado da sua civilização 
leva a supor que tinham escolas numerosas. O .saber lhes 
era necessário para assegurar ao povo o bem-estar e manter 
no exterior o bom nome da nação.
A alta educação era reservada aos magos e às castas 
superiores. Um menino inteligente podia, porém, chegar 
a uma cultura elevada, que lhe dava acesso aos empregos
do Estado. A instrução era sobretudo técnica e prática: 
tratava-se de formar comerciantes e escrivães. Entretanto, 
em certa época, os estudos ditos liberais estiveram em gran­
de aprêço: houve especialistas em literatura religiosa, em 
astronomia, em história. Aprofundou-se sobretudo a ciên­
cia do comércio e adotou-se um engenhoso sistema de con­
tabilidade.
As grandes cidades possuíam bibliotecas cujos livros 
eram pranchetas ou cilindros sôbre os quais estavam gra­
vados os caracteres cuneiformes. O descobrimento de al­
guns dêsses “manuais” , destinados aos escolares, permitiu 
conhecer de modo mais preciso a civilização dêsses povos. 
O programa de estudos compreendia a religião, a gramáti­
ca, a aritmética, a história e a geografia. Os manuais de 
história são muito metódicos. A tabuada de multiplicação 
estava em uso nas escolas e conhecia-se o sistema decimal. 
Os elementos da leitura se ensinavam por sílabas que se 
combinavam para formar palavras: era um passo para o 
alfabeto.
As escavações têm trazido à luz inúmeras obras sôbre 
todos os conhecimentos humanos. Sabemos, por outro la­
do, que os magos eram versados em tôdas as ciências., São 
considerados como os fundadores da matemática e da as­
tronomia. Acharam-se os relatórios dirigidos ao rei com 
os resultados das suas observações: estudavam os astros, 
sobretudo com o fim de tirar presságios para o bem ou mal 
da humanidade. Estabeleceram a semana de sete dias, in­
ventaram os signos do zodíaco e determinaram a duração 
do ano. A sua literatura epistolar era considerável; os frag­
mentos que nos restam são preciosos para a história.
O código dos Caldeus e dos seus sucessores continha 
leis muito sábias baseadas na justiça e na probidade natu­
ral. As ordenações do rei Hammurabi (2342-2288) são cé­
lebres. A medicina foi menos florescente, porque conside-
ravam as doenças efeitos da influência dos maus espíritos. 
Para curar os doentes, empregavam principalmente encan­
tamentos. Segundo M. Lenormant e outros orientalistas, 
os Assírios tinham feito engenhosas classificações do reino 
animal e do reino vegetal. Descobertas recentes fazem su­
por que os sábios dêsse país tinham à sua disposição certos 
instrumentos de óptica e que dêles se serviam para gravar 
os caraciereF sôbre as pranchetas e os cilindros.
Universidade «?e Babilôn*a — Babilônia foi o centro de 
uma grande atividade intelectual. O próprio rei mantinha, 
em seu palácio, uma escola superior em que se estudavam 
as línguas, as ciências naturais, a astronomia e a matemá­
tica. O curso dos estudos se fazia em três anos. Os estu­
dantes eram mantidos pelo Estado. No fim do curso o rei 
os examinava com cuidado a fim de conhecer o seu juízo 
o a inteligência. Foi nesta escola que o profetaDaniel e 
os seus companheiros se instruíram em tôdas as ciências 
do seu tempo.
Cultura moral — Infelizmente a formação moral dos 
alunos foi por dfemais negligenciada nas escolas da Assíria. 
Êstes povos se entregaram a tôda espécie de desordens. 
Deus foi ofendido de tál modo que pronunciou contra Ní- 
nive e Babilônia terríveis ameaças cujos efeitos não tarda­
ram a se fazer sentir. Suas cidades foram destruídas e, 
alguns séculos mais tarde, mal se recordava o lugar que 
elas haviam ocupado.
Bibliografia. — - C ii r is t t t s , Hirtoire ãcs rrlipions, Ch. XTT. — Cyrlo. 
prãia of cducaticn, art. Assyro-BabyTonians. — L a u r ie . Prr-CMMinn etln. 
cation. — M a r p é r o , Histoire ancirnnc des pcuplm <7' 1’Oricnt (P a r is , 3 9 0 0 ). 
—- Nouvcau Dictionnairc de pcdaçtogic, art. ChaldCe, Chaldíens. — D e la - 
roETE, L a Mcsopotamie (P a r is 1 9 2 3 ).
EDUCAÇÃO DOS PERSAS
Resumo histórico. — Os Persas descendiam dos Árias que se haviam 
estabelecido, no oitavo século antes da nossa era, a leste do Tigre, entre 
o mar Cáspio e o gôlfo Pérsico. A Pérsia foi, durante vários séculos, 
um grande e poderoso império que Alexandre conquistou. Ápós a 
morte do grande conquistador, êste país foi entregue sucessivamente aos 
Selêucidas, aos Partas e aos Sassânidas. Os Árabes se apoderaram dêle 
no século VII.
Religião- — Os Persas adoraram, a princípio, os astros, os elementos 
e os fenômenos naturais. Zuroastro foi o fundador da religião dualista 
cujos princípios estão contidos no Zend-Avestn. A base desta crença é 
a dciutviníi da existência de dois princípios hostis e opostos: Ormuzd, 
espírito do bem e Ahriman, espírito do mal. As vii^tades que é preciso 
praticar para ser agradável a Ormuzd sã o : a reti<?8u, a 'caridade para 
com «s pobres, a hospitalidacíe com os estranhos. Os Persas acredi­
tavam ainda no julgamento das almas, depois da morte, nos castigos e 
recompensas da outra vida.
Educação — O sistema escolar dos Persas ieve o mérito 
de atrair a atenção dos grandes pensadores' da antiguidade, 
sobretudo dos Gregos. Esteve em vigor até a conquista 
árabe.
Começava a educação na família. O p.ai possuía um 
poder soberano; era obedecido e respeitado. Formar .os fi­
lhos na virtude, velar pela sua saúde, fazer dêles úteis ser­
vidores do Estado, tal era o seu ideal. Heródoto nos diz 
que os Persas ensinavam aos filhos três coisas: montar a 
cavalo, atirar com o arco e dizer a verdade. Cultivavam 
nêles sólidas.qualidades morais: a obediência, o amor aos 
pais, a justiça, o valor, a temperança, o sentimento de honra 
e o desejo de ser agradável a Ormuzd. Aos sete anos, a 
criança considerava-se do Estado.
Seria a educação dada a todos por igual? Inclina-se a 
crer que erã principalmente reservada à classe elevada. 
O Avesta contém alguns preceitos a êste respeito: “A edu­
cação é a vida da humanidade. . . Os homens elevam-se 
aos empregos mais ilustres pela educação que os torna ca­
pazes de í ler* e. escrever”. Uma secçãó, hoje perdida, do 
livro sagrado era dedicada unicamente à arte de educar a 
mocidade. Os filhos ^dos pobres provàvelmente não rece­
biam senãtí uma educação muito sumária. Strabão e ou­
tros escritores asseguram que os filhos dos nobres e dos 
ricos eram educados na côrte do rei, por homens graves e 
de procedimento irrepreensível.
Períodos de educação — A instrução formal principiava 
aos sete anos. No ponto de vista físico, compreendia a cor­
rida, a equitação, o tiro de flecha e de dardo. A alimenta­
ção era das mais frugais: pão, agrião e água. A formação 
intelectual compreendia a leitura do Avesta e a escrita. 
A religião era considerada” a base necessária da formação 
do cidadão”. (Avesta)
Dos quinze |toá vinte é cinco anos, efetuava-se a forma­
ção militar. O jovem recebia primeiro o cinto da virili­
dade; depois, prestava juramento de seguir a lei de Zoroas- 
tro e de servir o Estado com fidelidade. Exercitava-se tam­
bém na equitação e no manejo das armas.
Dos vinte e cinco aos cinqüenta anos, òs Persas eram 
soldados: tomavam parte nas guerras e expedições. Aos 
cinqüenta anos, os cidadãos mais instruídos e mais virtuo­
sos tornavam-se educadores. Na Persia, como na Caldéia. 
os magos foram os mestres por excelência. O Avesta lhes 
recomendava que estabelecessem entre êles e os alunos um 
laço comparável ao de um irmão com seu irmão ou dum 
pai com seu filho. Os Persas tributavam a seus mestres
uma grande veneração e, após a morte, punham-nos muitas 
vêzes no número dos santos.
A aula começava cedo porque estava prescrito aos 
jovens levantarem-se antes do canto do galo. Estrabão nos 
informa que se reiíniam desde a aurora na praça pública 
como se estivessem dispostos a tomar as armas ou a sair 
para a caça. Dividiam-se em companhias de quinze; e sob 
a direção dos seus mestres ou dos sátrapas, faziam uma 
marcha assaz longa. Os exercícios intelectuais alternavam 
com os exercícios militares. Os professores exigiam uma 
exposição das suas lições.
O curso de estudos não era uniforme. O dos soldados 
compreendia religião, leitura, escrita e, sobretudo, educa­
ção física. O dos magos era muito mais extenso. Com­
preendia religião, história, matemática, astronomia, astro­
logia, alquimia, etc.
Apreciação — Êste sistema de educação, se realmente 
existiu como o descrevem alguns escritores da antiguidade, 
merece graves censuras. Favorecia o estadismo e destruía 
os direitos da família sôbre o filho. Parte da população 
recebia educação insuficiente. A cultura física tinha uma 
importância exagerada em detrimento da formação inte­
lectual. Apesar dos seus defeitos, esta educação deu resul­
tados apreciáveis. A Pérsia teve os seus poetas ilustres: 
Ferduci, Saadi, Hafiz; e os Contos das Mil e uma Noites 
estão traduzidos em tôdas as línguas.
B i M i o g r a f i a . — C h r i s t u s , M anuel d ’liistoire ã : s religions, ch . V . — 
Cyclopcãia o f educai ion, a rt . Pcrsiun éãucation. — L a u r ie , Pre-Christian.
— M a s p é r o , I I i loire anci.nnc âes peuples dc VOricnt. — N ouvcau D i e - 
Uonnaire ãe pédagogie, a rt. P erse. — X é n o p h o n , L a Cyropédie.
EDUCAÇÃO DOS EGÍPCIOS
Resumo histórico. — O E g ito fo i p o v o a d o dVsde n m ain rem ota an­
tigu idade. N u m erosas d in astias de fa r a ó s o g ov ern a ra m n os tem pos 
m ais rem otos. O s H ik sos , h a v en d o -se a p od era d o de nina p a r te d o te rr i­
tório , su ced eram n «s r e is ; fo ra m , porém , ex p u lsos pelo an o d e 1700 
antes de C risto e a (Vina&tia n a cion a l torn ou a re in ar sôb re todo o E gito . 
E m 525, C am bises se a p rd e ro u d o p a ís e torn ou -o p rov ín cia d a P érsia . 
C on q u istan d o-o p o r seu turno, A le x a n d r e fu n d ou a c id a d e de A lex a n flr ia 
(pie se torn ou fo c o de c iên cia e c iv iliz a çã o . O E g ito p rosp erou m uito 
sob o g ov êrn o dos P to lrm ieu s ; fo i p r o v ín c ia ,r o m a n a alguns an os an tes 
da era c r is tã e con q u ista d a p e los S a rra cen os n o sécu lo V II .
Religião. — T in h a m os E g íp c io s um a d outrin a re lig io sa qu e con si­
d era va m rev e la d a . E sta v a con tid a nos liv ros hcrmáUcos, c u jo au tor, se­
gu n do a tra d içã o , n ão era sen ão o deus T ot, o M ercú rio d f«3 G regos. 
E sses liv ro s con tin h a m h in os e câ n ticos sa g ra d os e tra ta v a m de todos 
os con h ecim en tos hum anos. E m todo tem plo d o E g ito d ev ia h a v er um 
ex em p la r .
A p r in c íp io êste p ov o a d orou um só D e u s ; c a ;u, p orém , em breve 
na m ais g rosse ira id o la tr ia . P restou cu lto aos m a is vis an im a is e at»3 
aos legum es d as hortas.i "N o E g ito , d iz B ossuet, tm lo era deus ex ce to
o p ró p r io D eu s.” O s E g íp c io s a cred ita v a m na im orta lid a d e da alm a, 
nas recom p en sa s e ca stig os da ou tra viría. E sta v p m con v en c id os de que 
as

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