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1 SUMÁRIO INTRODUÇÃO ........................................................................................................... 3 1 CONCEITO DE SEGURIDADE SOCIAL .............................................................. 4 2 A RELAÇÃO JURÍDICA DE SEGURIDADE SOCIAL ........................................... 5 3 PRINCÍPIOS REGENTES DA SEGURIDADE SOCIAL ........................................ 7 3.1 Universalidade da cobertura e do atendimento ............................................. 8 3.2 Universalidade da cobertura ......................................................................... 8 3.3 Universalidade do atendimento ..................................................................... 8 3.4 Uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais 8 3.5 Seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços ......... 9 3.6 Irredutibilidade do valor dos benefícios ......................................................... 9 3.7 Diversidade da base de financiamento ........................................................ 10 3.8 Caráter democrático e descentralizado da gestão administrativa, com a participação da comunidade ............................................................................................ 11 3.9 A regra da contrapartida.............................................................................. 11 4 FONTES DO DIREITO PREVIDENCIÁRIO ........................................................ 11 5 INTERPRETAÇÃO DO DIREITO PREVIDENCIÁRIO ........................................ 12 6 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA SEGURIDADE SOCIAL ....................................... 14 6.1 A assistência pública ................................................................................... 14 6.2 O seguro social ........................................................................................... 16 6.3 A seguridade social ..................................................................................... 19 6.4 Do risco social à necessidade social ........................................................... 22 7 A SEGURIDADE SOCIAL NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 — ............ 24 7.1 Normas gerais ............................................................................................. 24 7.2 A relação jurídica de seguridade social ....................................................... 26 8 APLICAÇÃO DO DIREITO PREVIDENCIÁRIO .................................................. 28 8.1 Aplicação no tempo ..................................................................................... 28 8.2 Aplicação no espaço ................................................................................... 30 2 9 O FINANCIAMENTO DA SEGURIDADE SOCIAL .............................................. 31 9.1 Normas gerais constitucionais. Financiamento de forma direta e indireta ... 31 9.2 Competência ............................................................................................... 32 9.3 Imunidade ................................................................................................... 33 9.4 Imunidade das aposentadorias e pensões do RGPS .................................. 33 9.5 Imunidade das entidades beneficentes de Assistência Social ..................... 33 9.6 Imunidade das receitas decorrentes de exportação .................................... 36 9.7 Anterioridade ............................................................................................... 37 9.8 Remissão e anistia ...................................................................................... 37 10 CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS PARA O CUSTEIO DA SEGURIDADE SOCIAL 38 10.1 Natureza jurídica ..................................................................................... 38 10.2 A relação jurídica de custeio .................................................................... 39 10.3 O sujeito ativo .......................................................................................... 39 10.4 O sujeito passivo ..................................................................................... 40 11 A Seguridade social na Constituição Federal de 1988 .................................... 41 11.1 Saúde ...................................................................................................... 41 11.2 Assistência Social .................................................................................... 42 11.3 Previdência Social ................................................................................... 43 12 Custeio da Seguridade Social ......................................................................... 44 13 Tipos de filiação .............................................................................................. 47 13.1 O que é? .................................................................................................. 47 13.2 Qual a diferença? .................................................................................... 47 13.3 Segurados obrigatórios ............................................................................ 47 BIBLIOGRAFIA ........................................................................................................ 50 3 INTRODUÇÃO Prezado aluno, O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em tempo hábil. Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que lhe convier para isso. A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser seguida e prazos definidos para as atividades. Bons estudos! 4 1 CONCEITO DE SEGURIDADE SOCIAL1 A seguridade social é um dos instrumentos disciplinados pela Ordem Social que, assentado no primado do trabalho, propicia bem- estar e justiça sociais. O conceito é fornecido pelo art. 194 da CF: “conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social”. O dever constitucional imposto aos Poderes Públicos e à sociedade demonstra que a solidariedade é o fundamento da seguridade social. Fonte: 1.bp.blogspot.com A seguridade social garante a proteção social compreendida na Assistência Social, na Previdência Social e no direito à saúde. A proteção social e seu respectivo custeio podem ser expandidos, nos termos do art. 194, parágrafo único, da CF, em vista das mutações sociais e econômicas, geradoras de novas contingências causadoras de necessidades. A seguridade social entra em cena quando o indivíduo não tem condições de prover seu sustento ou de sua família, em razão de desemprego, doença, invalidez ou outra causa. Se for segurado da previdência social, a proteção social será efetivada 1 Extraído do livro: Direito previdenciário / Marisa Ferreira dos Santos. 5 na forma de pagamento do benefício correspondente à contingência-necessidade que o atingiu. Terá, ainda, direito a serviços de assistência à saúde. Se não for segurado de nenhum regime previdenciário, e se preencher os requisitos legais, terá direito a benefícios e serviços de assistênciasocial e de assistência à saúde. Garantindo os mínimos necessários à sobrevivência do indivíduo, a seguridade social é instrumento de bem-estar. É, também, redutor das desigualdades sociais causadas pela falta de ingressos financeiros no orçamento do indivíduo e de sua família, e instrumento de justiça social. A seguridade social está assentada no tripé assistência social, previdência social e direito à saúde, institutos autonomamente disciplinados pela CF. O direito subjetivo às prestações de seguridade social depende do preenchimento de requisitos específicos. A proteção na área da previdência social é direito subjetivo dos segurados, isto é, daqueles que contribuem para o custeio do sistema, muito assemelhado, nessa parte, ao antigo seguro social. Todos têm direito subjetivo à saúde, independentemente de contribuição para o custeio (art. 196). O direito subjetivo às prestações de assistência social impõe o preenchimento dos requisitos legais e independe de contribuição para o custeio. A universalidade é a característica dos direitos sociais, redutores das desigualdades. Por meio da seguridade social, todos têm direito a alguma forma de proteção, independentemente de sua condição socioeconômica. Prestações de seguridade social é o gênero do qual benefícios e serviços são espécies. Os benefícios são as prestações pagas em dinheiro. 2 A RELAÇÃO JURÍDICA DE SEGURIDADE SOCIAL O Direito Previdenciário, denominação que se dá ao conjunto de normas que disciplinam a seguridade social, é ramo do Direito Público, uma vez que a maior parte de seus institutos está localizada na CF, cujo objeto é o estudo da seguridade social. Sendo a seguridade social um “conjunto integrado de ações” que visa assegurar direitos à saúde, previdência e assistência social, há três tipos de relações 6 jurídicas a considerar: relação jurídica de assistência à saúde, relação jurídica de previdência social e relação jurídica de assistência social. Os sujeitos da relação jurídica de seguridade social são: a) sujeito ativo: quem dela necessitar; b) sujeitos passivos: poderes públicos (União, Estados e Municípios) e a sociedade em geral. O objeto da relação jurídica de que se trata merece especial atenção. O seguro social tinha como objeto a proteção do risco, na sua conceituação típica do Direito Civil, isto é, evento futuro e incerto, cuja ocorrência gera dano para a vítima. No campo civilista, o risco acontecido configura o sinistro, e o dano decorrente é coberto pela indenização; o direito à cobertura pelo seguro só existe se o segurado tiver pago o prêmio. O risco é de livre definição pelas partes, assim como a extensão da indenização. A relação jurídica nasce da celebração do contrato. No seguro social, a noção de risco ainda estava presente, uma vez que o trabalhador interessado na cobertura pagava sua contribuição. A diferença é que os riscos não eram livremente escolhidos pelas partes, mas sim definidos em lei. No campo da seguridade, a questão se coloca de maneira diferente. O seguro, na sua acepção civilística, não se mostrou suficiente para configurar o objeto da proteção social dada pela seguridade porque: a) a noção de risco está sempre ligada a dano, prejuízo que deve ser recomposto pela indenização. Porém, em termos de seguridade social, a proteção nem sempre se origina de dano. Exemplifiquemos: a invalidez, causa de incapacidade para o trabalho, é evento danoso que tem cobertura previdenciária ou assistencial, conforme a hipótese. Porém, a maternidade, que conceitualmente não é dano, também tem cobertura pela seguridade social porque a segurada mãe fica impossibilitada de trabalhar e prover seu sustento e de sua família; b) o seguro impõe o pagamento do prêmio para que, configurado o sinistro, seja paga a indenização; não é o que ocorre na seguridade social, em que nem todos contribuem para o custeio, mas todos têm direito a algum tipo de proteção social; quem pode contribuir é segurado da previdência social; quem não pode contribuir tem direito à assistência social, desde que preenchidos os requisitos legais; mas todos têm direito à assistência à saúde. A relação jurídica de seguridade social é diversa da relação jurídica do seguro do Direito Civil, embora se possa afirmar que somente a relação jurídica previdenciária se aproxima de uma relação de seguro, porque a cobertura dependerá sempre de 7 contribuição do segurado. Os riscos cobertos, porém, serão sempre os enumerados pelo legislador. Insatisfatória a noção de risco, a seguridade adota a de contingência que gera a consequência-necessidade objeto da proteção. A relação jurídica de seguridade social se forma após a ocorrência do evento, ou contingência, para, então, reparar a consequência-necessidade dela decorrente. Fonte: 4.bp.blogspot.com Para a seguridade social, o que interessa é a consequência que o fato produz. A CF define as contingências básicas produtoras de necessidades, que têm cobertura por prestações de duas modalidades: benefícios e serviços. 3 PRINCÍPIOS REGENTES DA SEGURIDADE SOCIAL O parágrafo único do art. 194 da CF confere ao Poder Público competência para organizar a seguridade social, nos termos da lei, e com base nos objetivos que relaciona. A natureza das disposições dos diversos incisos do referido parágrafo único revela que são princípios e não apenas objetivos a alcançar. São princípios constitucionais porque se caracterizam pela generalidade de suas disposições e seu conteúdo diz com os valores que o sistema visa proteger. Fundamentam a ordem jurídica, orientam o trabalho de interpretação das normas e, 8 quando caracterizada a omissão da lei, são fontes do direito. Tais princípios são setoriais porque aplicáveis apenas à seguridade social. 3.1 Universalidade da cobertura e do atendimento Garante a todos os que vivem no território nacional o mínimo indispensável à sobrevivência com dignidade. Impõe ao legislador o respeito à igualdade (art. 5º), impedindo que haja excluídos da proteção social que a seguridade deve garantir. Configurada a existência de necessidade gerada por alguma das contingências legalmente previstas, dá-se a incidência da norma jurídica e efetiva-se alguma das hipóteses de proteção garantida pela seguridade social. O princípio se apresenta em duas vertentes: universalidade da cobertura e universalidade do atendimento. 3.2 Universalidade da cobertura Cobertura compõe a terminologia própria dos seguros sociais, que abrangem riscos e indenizações previamente definidos, mediante pagamento do prêmio ou cota pelos trabalhadores. A universalidade da cobertura liga-se ao objeto, às situações de necessidade previstas em lei, e a proteção social se instala em todas as suas etapas: de prevenção, de proteção propriamente dita e de recuperação. 3.3 Universalidade do atendimento A universalidade do atendimento refere-se aos sujeitos de direito à proteção social. Todos os que vivem no território nacional têm direito subjetivo a alguma das formas de proteção fornecida pela seguridade. 3.4 Uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais A CF de 1988 eliminou a histórica discriminação entre trabalhadores urbanos e rurais. 9 Pela uniformidade, trabalhadores urbanos e rurais têm direito ao mesmo plano de proteção social. Recentemente, esse princípio foi atendido com a extensão, às trabalhadoras rurais, do benefício previdenciário de salário-maternidade, tradicionalmente pago às trabalhadoras urbanas. A equivalência determina que o valor das prestações deve ser proporcionalmente igual, isto é, os benefícios devem ser os mesmos, porém o valor da renda mensal é equivalente, mas não igual, porque urbanos e rurais têm formas diferenciadas de contribuição para o custeio da seguridade. 3.5 Seletividade e distributividade na prestação dos benefíciose serviços A seletividade é princípio voltado para o legislador, e, dificilmente, propiciará análise no caso concreto. O objetivo do sistema de proteção social não é a eliminação, mas sim a redução das desigualdades sociais e regionais, por meio da garantia dos mínimos vitais à sobrevivência com dignidade. Cabe ao legislador selecionar as contingências geradoras das necessidades que a seguridade deve cobrir. É opção política que deve levar em conta a prestação que propicie maior proteção social e, por consequência, maior bem-estar. A distributividade impõe que a escolha recaia sobre as prestações que, por sua natureza, tenham maior potencial distributivo. A distributividade nada mais é do que a justiça social, redutora das desigualdades. Deve-se distribuir para os que mais necessitam de proteção, com a finalidade, sempre, de reduzir desigualdades. Seletividade e distributividade impedem que a interpretação da legislação conceda ou estenda prestações de forma diversa da prevista expressamente pela legislação. 3.6 Irredutibilidade do valor dos benefícios Concedida a prestação, que, por definição, deve suprir os mínimos necessários à sobrevivência com dignidade, conforme demonstrado por todo o período contributivo do segurado, a renda mensal do benefício não pode ser reduzida. Esse dispositivo constitucional tem como razão histórica os altos índices de inflação, que por décadas assolaram a economia nacional, aviltando salários e 10 benefícios previdenciários. O constituinte de 1988 quis corrigir essa injustiça para os inativos, prevendo, no art. 58 do ADCT, uma revisão geral para todos os benefícios em manutenção em 5 de outubro de 1988. Fonte: www.aposentadoriaeprevidencia.com A irredutibilidade foi reafirmada no art. 201, § 4º, da CF, que assegura o reajustamento dos benefícios para preservar-lhes o valor real, conforme critérios estabelecidos em lei. A jurisprudência tem entendido que a irredutibilidade é apenas nominal (TRF da 1ª Região, AC 1998.01.00.01124-63/MG, Rel. Juiz Carlos Moreira Alves, DJ, 7-5-2001, p. 52). 3.7 Diversidade da base de financiamento O art. 195 da CF prevê que a seguridade seja financiada por toda a sociedade. O custeio é feito por meio de recursos orçamentários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de contribuições pagas pelo empregador, pela empresa ou entidade a ela equiparada (art. 195, I), pelo trabalhador (art. 195, II), pelas contribuições incidentes sobre as receitas dos concursos de prognósticos (art. 195, III) e pelas contribuições pagas pelo importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele equiparar (art. 195, IV). 11 A empresa e a entidade a ela equiparada contribuem sobre diversas bases de cálculo, previstas no inciso I, a, b e c, do art. 195. Há, ainda, a possibilidade da instituição de outras fontes de custeio destinadas a garantir a expansão da seguridade social, conforme prevê o § 4º do art. 195. 3.8 Caráter democrático e descentralizado da gestão administrativa, com a participação da comunidade A gestão da seguridade social é quadripartite, com a participação de representantes dos trabalhadores, dos empregadores, dos aposentados e do Poder Público nos órgãos colegiados (art. 194, parágrafo único, VII). O caráter democrático está situado apenas na formulação de políticas públicas de seguridade e no controle das ações de execução. A descentralização significa que a seguridade social tem um corpo distinto da estrutura institucional do Estado. No campo previdenciário, essa característica sobressai com a existência do Instituto Nacional do Seguro Social — INSS, autarquia federal encarregada da execução da legislação previdenciária. 3.9 A regra da contrapartida Embora não previsto expressamente, a contrapartida é princípio regente da seguridade social. O § 5º do art. 195 dispõe que “nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total”. A seguridade opera com conceitos atuariais. A CF quer o equilíbrio financeiro e atuarial do sistema, de forma que a criação, instituição, majoração ou extensão de benefícios e serviços deve estar calcada em verbas já previstas no orçamento. 4 FONTES DO DIREITO PREVIDENCIÁRIO São fontes do Direito Previdenciário: a Constituição Federal, a Emenda Constitucional, a Lei Complementar, a Lei Ordinária, a Lei Delegada (até o momento nunca foi utilizada em matéria previdenciária), Medida Provisória, Decreto Legislativo, 12 Resolução do Senado Federal, os Atos Administrativos Normativos (Instrução Normativa, Ordem de Serviço, Circular, Orientação Normativa, Portaria etc.), a jurisprudência dos Tribunais Superiores. O princípio da hierarquia das normas impõe que cada espécie normativa não exceda os limites traçados pela CF. 5 INTERPRETAÇÃO DO DIREITO PREVIDENCIÁRIO O intérprete do Direito Previdenciário deve estar atento aos fundamentos e objetivos do Estado Democrático de Direito (arts. 1º e 3º da CF), notadamente a dignidade da pessoa humana e a redução das desigualdades sociais. O art. 6º da CF relaciona os direitos sociais: educação, saúde, trabalho, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e à infância e assistência aos desamparados. Diz, também, que são disciplinados na forma da Constituição, ou seja, conforme o disposto no Título VIII, que disciplina a Ordem Social. A Ordem Social tem como base o primado do trabalho, e seus objetivos são o bem-estar e a justiça sociais. A escolha do trabalho, feita pelo constituinte de 1988, como alicerce da Ordem Social já indica que toda a atividade legislativa e interpretativa dessas normas deve prestigiar os direitos do trabalhador. O trabalho e a dignidade da pessoa humana são fundamentos do Estado Democrático de Direito (art. 1º, III e IV, da CF). Só o trabalho propicia ao homem sustentar-se e à sua família, do que resulta que só há dignidade humana quando houver trabalho. Só o trabalho propicia bem-estar e justiça sociais. Além dos direitos sociais enumerados no art. 6º, a CF enumerou também os do art. 7º, voltados ao trabalhador com relação de emprego. Os direitos sociais não estão restritos às normas dos arts. 6º e 7º referidos. Por todo o texto constitucional há normas cuja obediência levará à efetivação do bem- estar e da justiça sociais. As disposições do art. 3º traçam os objetivos fundamentais da República, e neles inclui a erradicação da pobreza e da marginalização e a redução das desigualdades sociais e regionais. O art. XXV da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1948, que o Brasil subscreveu, dispõe: 13 “1. Todo homem tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle. 2. A maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistência especiais. Todas as crianças, nascidas dentro ou fora do matrimônio, gozarão da mesma proteção social”. A CF, no art. 3º, IV, enumera como objetivo fundamental da República “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”. O bem-estar social tem conceito legal e objetivo. A solidariedade é o elo entre o Estado e os administrados na promoção do bem-estar social. Promovê-lo não é tarefa exclusiva do Poder Público, mas também da comunidade porque depende de políticas de desenvolvimento econômico e social. A erradicação da pobreza e da marginalização e a redução das desigualdades sociais e regionais só são possíveis com a efetivação dos direitos sociais.Os fundamentos do Estado Democrático de Direito e os objetivos fundamentais da República apontam para o conceito de justiça social. A dignidade da pessoa humana, o valor social do trabalho, a solidariedade social, o desenvolvimento, a erradicação da pobreza e da marginalização, a redução das desigualdades sociais e regionais e a promoção do bem de todos são os alicerces, os princípios e diretrizes norteadores da elaboração, da interpretação e da aplicação do direito. O constituinte de 1988 seguiu Aristóteles e Perelman, adotando a justiça distributiva e a fórmula a cada qual segundo as suas necessidades (cf. Wagner Balera, Introdução à seguridade social, in Introdução ao direito previdenciário, coordenação de Meire Lúcia Gomes Monteiro, São Paulo: LTr, 1998, p. 16: a redução das desigualdades sociais “prepara o terreno onde se assenta uma sociedade mais justa”). Para a CF, a distribuição dos benefícios e obrigações sociais entre todos contribui para a redução das desigualdades. Para ser justa e propiciar a redução das desigualdades sociais e regionais, a distribuição deve conceder mais benefícios a quem tem mais necessidade, e menos benefício aos menos necessitados. Os resultados da interpretação da legislação previdenciária nunca podem acentuar desigualdades nem contrariar o princípio da dignidade da pessoa humana. 14 6 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA SEGURIDADE SOCIAL2 A evolução socioeconômica faz com que as desigualdades se acentuem entre os membros da mesma comunidade e da comunidade internacional. A pobreza não é um problema apenas individual, mas, sim, social. A concentração da maior parte da renda nas mãos de poucos leva à miséria da maioria, que se ressente da falta dos bens necessários para sobreviver com dignidade. No entanto, o homem sempre se preocupou em garantir seu sustento e o de sua família em situações de carência econômica, enfermidades, diminuição da capacidade de trabalho, redução ou perda de renda. Dessas situações o homem não consegue sair apenas com o seu esforço individual, necessitando do amparo do Estado para prevenir e remediar suas necessidades. Todos esses fatores levaram à busca de instrumentos de proteção contra as necessidades sociais, com reflexos na ordem jurídica. Dividimos a evolução histórica da proteção social em três etapas: assistência pública, seguro social e seguridade social. 6.1 A assistência pública A primeira etapa da proteção social foi a da assistência pública, fundada na caridade, no mais das vezes, conduzida pela Igreja e, mais tarde, por instituições públicas. 2 Extraído do livro: Direito previdenciário esquematizado/ Marisa Ferreira dos Santos 15 Fonte: blog.maxieduca.com.br O indivíduo em situação de necessidade — em casos de desemprego, doença e invalidez — socorria-se da caridade dos demais membros da comunidade. Nessa fase, não havia direito subjetivo do necessitado à proteção social, mas mera expectativa de direito, uma vez que o auxílio da comunidade ficava condicionado à existência de recursos destinados à caridade. A desvinculação entre o auxílio ao necessitado e a caridade começou na Inglaterra, em 1601, quando Isabel I editou o Act of Relief of the Poor — Lei dos Pobres. A lei reconheceu que cabia ao Estado amparar os comprovadamente necessitados. Surgiu, assim, a assistência pública ou assistência social. Cabia à Igreja a administração de um fundo, formado com a arrecadação de uma taxa obrigatória. “(...) o Poder Público tornava cogente o binômio igualdade- solidariedade”. A preocupação com o bem-estar de seus membros levou algumas categorias profissionais a constituírem caixas de auxílio, com caráter mutualista, que davam direito a prestações em caso de doença ou morte. Havia uma semelhança com os seguros de vida, feitos principalmente por armadores de navios. A assistência pública, no Brasil, foi prevista pela Constituição de 1824, cujo art. 179, § 31, garantia os socorros públicos. 16 As desigualdades sociais marcantes, denunciadas pela Revolução Francesa, levaram à criação de outros mecanismos de proteção social contra os abusos e injustiças decorrentes do liberalismo. 6.2 O seguro social Já não bastava a caridade para o socorro dos necessitados em razão de desemprego, doenças, orfandade, mutilações etc. Era necessário criar outros mecanismos de proteção, que não se baseassem na generosidade, e que não submetessem o indivíduo a comprovações vexatórias de suas necessidades. Na lição de Manuel Alonso Olea e José Luis Tortuero Plaza (traduzimos): “Dito de outra forma: amadurece historicamente a ideia de que se deve ter um direito à proteção, que as prestações previstas são ‘juridicamente exigíveis’, direito que deriva da contraprestação prévia em forma de quotas pagas pelo beneficiário ou por um terceiro por conta daquele.” Surgiram as empresas seguradoras, com fins lucrativos e administração baseada em critérios econômicos, com saneamento financeiro. O seguro do Direito Civil forneceu as bases para a criação de um novo instrumento garantidor de proteção em situações de necessidade. A primeira forma de seguro surgiu no século XII: o seguro marítimo, reivindicação dos comerciantes italianos. Não eram, ainda, as bases técnicas e jurídicas do seguro contratual. O desenvolvimento do instituto do seguro fez surgir novas formas: seguro de vida, seguros contra invalidez, danos, doenças, acidentes etc. O seguro decorria do contrato, e era de natureza facultativa, isto é, dependia da manifestação da vontade do interessado. Mas a proteção securitária era privilégio de uma minoria que podia pagar o prêmio, deixando fora da proteção a grande massa assalariada. Era necessário, então, criar um seguro de natureza obrigatória, que protegesse os economicamente mais frágeis, aos quais os Estado deveria prestar assistência. Augusto Venturi ensina (traduzimos): Diante das exigências das condições objetivas e da já difundida sensibilidade ante as ‘injustiças’ sociais, cada vez mais presentes na vida moderna, as soluções da beneficência, da assistência pública, do socorro mútuo, do 17 seguro voluntário, inclusive somando todas as suas contribuições ao auxílio das vítimas das vicissitudes da vida, resultavam absolutamente inadequadas. Era necessário dar um novo passo adiante e este se deu com o reconhecimento de uma dupla necessidade: de um lado, tornar obrigatórias, para todos os que pertenciam a importantes categorias de trabalhadores, formas de seguro frente aos principais riscos a que se encontram sujeitos — questão que, necessariamente, devia ser competência do Estado —; de outro lado, ajudar os trabalhadores a suportar o custo desses seguros — e, também aqui, o Estado devia adotar alguma medida, chamando a contribuir a categoria dos empregadores.” O final do século XIX marcou o surgimento de um novo tipo de seguro, cuja garantia de efetividade dependia da distribuição dos riscos por grupos numerosos de segurados. Para isso, era necessário que as entidades seguradoras assumissem a cobertura dos riscos, sem, contudo, selecioná-los. Nasceu o seguro social, na Prússia, em 1883, com a Lei do Seguro Doença, que criou o Seguro de Enfermidade, resultado da proposta de Bismarck para o programa social. A Lei do Seguro Doença é tida como o primeiro plano de Previdência Social de que se tem notícia. A partir de Bismarck e, principalmente, da Segunda Guerra Mundial, ganhou força a ideia de que o seguro social deveria ser obrigatório e não mais restrito aos trabalhadores da indústria, ao mesmo tempo em que a cobertura foi estendida a riscos como doença, acidente, invalidez, velhice, desemprego, orfandade e viuvez. Olea e Plaza, ao se referirem à “revolução bismarckiana”, ensinam (traduzimos): “Nisto consistiu, basicamente, a revolução bismarckiana — ‘da árida roca surgindo a águavivificante do seguro social’, golpeada aquela pelo báculo de Bismarck, novo Moisés —, que engendrou, no final do século XIX, o que basicamente segue sendo uma ‘operação’ de seguro — com suas notas básicas, portanto: seleção dos riscos cobertos, frente ao contingente protegido; aleatoriedade ou incerteza individual do sinistro; formação de fundo mútuo comum para custeá-lo; tratamento matemático-financeiro da relação entre um e outro, para que a presença do fundo delimite a álea da coletividade assegurada — tem, não obstante, as características especiais de que sua amplitude e obrigatoriedade derivam. Esse desenvolvimento se produz ao mesmo tempo em que a consciência social de que a exigência de viver em comunidade amplia o ideal de cobertura de que antes se tratou, incorporando novos riscos aos primeiramente selecionados; como isso ocorreu paulatinamente, também paulatinamente foi surgindo uma série de seguros sociais relativa ou totalmente independente entre si. A esse conjunto foi que se convencionou chamar na Espanha — as denominações estrangeiras são similares — previsão social.” Ao se tornar obrigatório, o seguro social passou a conferir direito subjetivo ao trabalhador. 18 O seguro social era organizado e administrado pelo Estado. O custeio era dos empregadores, dos empregados e do próprio Estado. Já não se cuidava da configuração civilista do seguro. O Estado liberal precisava de mecanismos que garantissem a redução das desigualdades sociais, e não apenas dos conflitos e prejuízos. O Estado liberal produzia cada vez mais e em maior quantidade. O seguro social atuava, então, como instrumento de redistribuição de renda, que permitia o consumo. A solidariedade ganhou contornos jurídicos, tornando-se o elemento fundamental do conceito de proteção social, que, cada vez mais, foi se afastando dos elementos conceituais do seguro civilista. A par da questão econômica caminhava, ainda, a luta pela garantia dos direitos sociais. O seguro social, na concepção bismarckiana, estendeu-se pela Europa até meados do século XX. Os sistemas de seguro social não resistiram às consequências da Primeira Guerra Mundial em razão da cobertura para o grande número de órfãos, viúvas e feridos que resultaram do combate, além da inflação galopante da época, problemas sentidos principalmente na Alemanha e na Áustria. A questão social teve, então, que ser equacionada. Em 1919, no Tratado de Versalhes, surgiu o primeiro compromisso de implantação de um regime universal de justiça social. Foi, então, fundado o Bureau International Du Travail (BIT) — Repartição Internacional do Trabalho — que realizou a 1ª Conferência Internacional do Trabalho, à qual se atribui o desenvolvimento da previdência social e sua implantação em todas as nações do mundo civilizado. Dessa conferência resultou a primeira Recomendação para o seguro-desemprego. A 3ª Conferência (1921) recomendou a extensão do seguro social aos trabalhadores da agricultura. A 10ª Conferência (1927) estendeu as demais Convenções e Recomendações sobre o seguro-doença aos trabalhadores da indústria, do comércio e da agricultura. 19 Fonte: blogdosrsiape.com Outras Conferências foram feitas, sendo que a 17ª (1933) estendeu as Recomendações anteriores aos seguros por velhice, invalidez e morte. A 18ª Conferência (1934) regulou o seguro contra o desemprego. O BIT teve papel importante na expansão da previdência social pelo mundo. O seguro social é espécie do gênero seguro, que, embora com características próprias, ainda tinha muito do seguro privado. Assim como no seguro privado, o seguro social seleciona os riscos que terão cobertura pelo fundo. A álea (incerteza da ocorrência do sinistro) e a formação de um fundo comum, administrado de forma a garantir econômica e financeiramente o pagamento das indenizações, são características do seguro social e do seguro privado. Porém, a amplitude e a natureza obrigatória do seguro social o diferenciam do seguro privado, de natureza eminentemente facultativa. 6.3 A seguridade social A Segunda Guerra Mundial causou grandes transformações no conceito de proteção social. Territórios devastados, trabalhadores mutilados, desempregados, órfãos e viúvas, tudo isso mostrou ser necessário o esforço internacional de captação de 20 recursos para a reconstrução nacional, o socorro aos feridos, desabrigados e desamparados e, ainda, para fomentar o desenvolvimento; acontecimentos totalmente diversos dos que levaram ao surgimento do seguro social. O seguro social nasceu da necessidade de amparar o trabalhador, protegê-lo contra os riscos do trabalho. Era, então, necessário um sistema de proteção social que alcançasse todas as pessoas e as amparasse em todas situações de necessidade, em qualquer momento de suas vidas. Em 1940, na Alemanha, Hitler determinou à Frente de Trabalho a elaboração de um programa que criasse pensões por velhice e invalidez para todos os alemães em atividade. O programa deveria estar fundado na solidariedade, com apoio militar, custeado pelos impostos, com natureza de serviço público, e não mais de seguro social. A queda do nacional-socialismo impediu a implantação do plano. Em junho de 1941, o governo inglês, empenhado na reconstrução do país, formou uma Comissão Interministerial para o estudo dos planos de seguro social e serviços afins, então existentes, e nomeou para presidi-la Sir William Beveridge. A Comissão foi incumbida de, após estudos, fazer uma proposta para a melhoria do setor. O resultado dos trabalhos da Comissão — o Plano Beveridge — foi apresentado ao Parlamento em 1942. O Plano analisou o seguro social e os serviços conexos da Inglaterra pós-Segunda Guerra Mundial, análise que abrangeu as necessidades protegidas, os fundos e as provisões. Beveridge concluiu que o seguro social já não atendia às necessidades sociais, porque era limitado apenas aos trabalhadores vinculados por contrato de trabalho, com certa remuneração quando em serviços não manuais. Ficavam sem cobertura os trabalhadores “por conta própria”, isto é, sem vínculo de emprego, que constituíam a parcela da massa pobre da população, justamente a que mais precisava da proteção do Estado. Entendeu Beveridge, ainda, que o seguro social não levava em conta as responsabilidades com a família para os trabalhadores não manuais, e concedia benefícios diferentes em situações em que eram os mesmos os gastos necessários das pessoas doentes e das desempregadas. Quanto às contribuições, Beveridge entendeu que as distinções também não tinham lógica dentro do sistema. 21 Beveridge percebeu que a principal conclusão de seu trabalho foi a de “que a abolição da miséria requer uma dupla redistribuição das rendas, pelo seguro social e pelas necessidades da família”. São suas palavras: “O seguro social, completamente desenvolvido, pode proporcionar a segurança dos rendimentos; é um combate à Miséria. Mas a Miséria é apenas um dos cinco gigantes, que se nos deparam na rota da reconstrução, e, sob vários aspectos, o mais fácil de combater. Os outros são a Doença, a Ignorância, a Imundície e a Preguiça.” Beveridge destacou o papel do Estado, por meio de políticas públicas que garantissem a proteção social em situações de necessidade. Influenciou muito a legislação social que se seguiu na Europa e na América, influência que atualmente ainda se faz presente nos sistemas de seguridade social. Em 1944, foi realizada a Conferência da OIT, em Filadélfia, resultando a Declaração de Filadélfia, que adotou orientação para unificação dos sistemas de seguro social, estendendo-se a proteção a todos os trabalhadores e suas famílias, abrangendo rurais e autônomos. A Declaração de Filadélfia deu um passo importante na internacionalização da seguridade social, porque ficou expresso que o êxito do sistema dependeria da cooperação internacional.A Declaração Universal dos Direitos do Homem (1948) prevê o direito à segurança, consagrando o reconhecimento da necessidade de existência de um sistema de seguridade social. Posteriormente, a 35ª Conferência Internacional do Trabalho, da OIT, em 1952, aprovou a Convenção n. 102, à qual denominou “Norma Mínima em Matéria de Seguridade Social”. Como já tivemos oportunidade de escrever: “A Convenção n. 102 é o resultado de estudos de especialistas da OIT, que, de início, tiveram a incumbência de elaborar um convênio que tivesse duas secções: uma que estabelecesse uma norma mínima, um standard de seguridade social; e outra, uma norma superior, que desse proteção a todas as necessidades. O objetivo do estabelecimento desses dois tipos de normas era viabilizar a participação de um grande número de Estados, que ficariam comprometidos em implantar os padrões mínimos de seguridade social, sem, contudo, descuidarem-se de seguir o exemplo de países mais avançados no implemento de modernas técnicas de proteção social. Entretanto, a norma superior foi separada e sua aprovação ficou sem definição de prazo, restando aprovada a norma mínima pela Convenção n. 102.” 22 Mas nem todas as Nações tinham condições econômicas de implantar a proteção mínima estabelecida pela Convenção n. 102. Entretanto, o padrão mínimo ficou garantido ao menos a uma parcela da população dos países signatários. O dinamismo social trouxe a tecnologia e a globalização, e os mínimos sociais acompanharam as modificações. Outros tratados internacionais foram celebrados, de modo que a passagem do seguro social para a seguridade social decorreu da intenção de libertar indivíduo de todas as suas necessidade para fins de desfrutar de uma existência digna. 6.4 Do risco social à necessidade social No seguro social, só tinham proteção aqueles que contribuíssem para o custeio. Era adequada, então, a noção de risco social. A relação jurídica do seguro, social ou privado, tem como objeto o risco, isto é, a possibilidade de ocorrência futura de um acontecimento que acarrete dano para o segurado. No seguro privado, o contrato estabelece os riscos cobertos, conforme escolha dos contratantes. No seguro social, entretanto, os riscos são previstos em lei, ou seja, são o objeto da relação jurídica de proteção social. “A relação jurídica preexiste ao acontecimento danoso, e nela são previstas situações causadoras de dano, que podem ocorrer no futuro, e que serão objeto de indenização pela parte seguradora. O interesse na asseguração de um bem reside na possibilidade da ocorrência da contingência danosa”. A seguridade social, entretanto, não está fincada na noção de risco, mas, sim, na de necessidade social, porque os benefícios não têm natureza de indenização; podem ser voluntários, não são necessariamente proporcionais à cotização, e destinam-se a prover os mínimos vitais. A relação jurídica de seguridade social só se forma após a ocorrência da contingência, isto é, da situação de fato, para reparar as consequências — a necessidade — dele decorrentes. 23 Fonte: www.institutoliberal.org.br Os valores dos benefícios de seguridade social destinam-se a garantir os mínimos vitais, isto é, o necessário à sobrevivência com dignidade, o que se distancia da indenização própria do seguro. Os benefícios, na seguridade social, não têm caráter indenizatório. Além do mais, na seguridade social, a contingência pode não gerar danos. Costumamos dar como exemplo, no Brasil, o salário-maternidade. O nascimento do filho gera o direito ao salário-maternidade porque, ao dar à luz, a mulher deixa de trabalhar e, por isso, não recebe remuneração; é gerada, então, a consequência- necessidade que dá direito ao benefício, para suprir a ausência de remuneração. “Há contingências desejadas, que não causam dano, mas geram necessidades”. A necessidade se qualifica como social, isto é, que tem importância para a sociedade, para que todos os seus integrantes tenham os mínimos vitais necessários à sobrevivência com dignidade. 24 7 A SEGURIDADE SOCIAL NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 — 7.1 Normas gerais O art. 6º da CF enumera os direitos sociais que, disciplinados pela Ordem Social, destinam-se à redução das desigualdades sociais e regionais. Dentre eles está a seguridade social, composta pelo direito à saúde, pela assistência social e pela previdência social. É do art. 194 da CF o conceito: “conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social”. A solidariedade é o fundamento da seguridade social. Pela definição constitucional, a seguridade social compreende o direito à saúde, à assistência social e à previdência social, cada qual com disciplina constitucional e infraconstitucional específica. Trata-se de normas de proteção social, destinadas a prover o necessário para a sobrevivência com dignidade, que se concretizam quando o indivíduo, acometido de doença, invalidez, desemprego, ou outra causa, não tem condições de prover seu sustento ou de sua família. É com a proteção dada por uns dos institutos componentes da seguridade social que se garantem os mínimos necessários à sobrevivência com dignidade, à efetivação do bem-estar, à redução das desigualdades, que conduzem à justiça social. As mutações sociais e econômicas decorrentes do avanço tecnológico conduzem a novas situações causadoras de necessidades, fazendo com que a proteção social tenha que se adequar aos novos tempos. O art. 194, parágrafo único, da CF, permite que se expanda a proteção e, consequentemente, também o seu financiamento. Deseja a Constituição que todos estejam protegidos, de alguma forma, dentro da seguridade social. E a proteção adequada se fixa em razão do custeio e da necessidade. Assim, se o necessitado for segurado da previdência social, a proteção social será dada pela concessão do benefício previdenciário correspondente à contingência- necessidade que o atingiu. Caso o necessitado não seja segurado de nenhum dos regimes previdenciários disponíveis, e preencha os requisitos legais, terá direito à assistência social. 25 Todos, ricos ou pobres, segurados da previdência ou não, têm o mesmo direito à saúde (art. 196). Portanto, todos os que vivem no território nacional, de alguma forma, estão ao abrigo do “grande guarda-chuva da seguridade social”, pois a seguridade social é direito social, cujo atributo principal é a universalidade, impondo que todos tenham direito a alguma forma de proteção, independentemente de sua condição socioeconômica. A seguridade social garante os mínimos necessários à sobrevivência. É instrumento de bem-estar e de justiça social, e redutor das desigualdades sociais, que se manifestam quando, por alguma razão, faltam ingressos financeiros no orçamento do indivíduo e de sua família. O direito subjetivo às prestações de seguridade social depende do preenchimento de requisitos específicos. Para ter direito subjetivo à proteção da previdência social, é necessário ser segurado, isto é, contribuir para o custeio do sistema porque, nessa parte, a seguridade social é semelhante ao antigo seguro social. O direito subjetivo à saúde é de todos, e independe de contribuição para o custeio. O direito subjetivo às prestações de assistência social, dado a quem dela necessitar, na forma da lei, também independe de contribuição para o custeio. Prestações de seguridade social é o gênero do qual benefícios e serviços são espécies. Os benefícios são as prestações pagas em dinheiro. Fonte: Direito Previdenciário Esquematizado, Marisa Ferreira dos Santos, p. 40. 26 7.2 A relação jurídica de seguridade social Estando a seguridade social assentada no tripé Previdência Social, Assistência Social e direito à saúde, engloba três tipos diferentesde relações jurídicas: relação jurídica de previdência social, relação jurídica de assistência social e relação jurídica de assistência à saúde. São sujeitos da relação jurídica de seguridade social: a) sujeito ativo: quem dela necessitar; b) sujeito passivo: os poderes públicos (União, Estados e Municípios) e a sociedade. Quanto ao objeto da relação jurídica de seguridade social, há alguns pontos a fixar. Muito antes da moderna concepção de seguridade social, a proteção social se fazia pela caridade, sem direito subjetivo, e, posteriormente, pelo seguro social, com proteção apenas para aqueles que o contratassem. Era, assim, proteção securitária fundada no conceito de risco, típico do Direito Civil, isto é, evento futuro e incerto, cuja ocorrência gera dano para a vítima. Configurado o sinistro (risco acontecido), o dano decorrente é coberto pela indenização; nesse caso, só existe direito à cobertura se o segurado tiver pago o prêmio. O risco e a extensão da indenização são livremente escolhidos pelas partes, e a relação jurídica nasce da celebração do contrato. O seguro social também se fundava no risco e o trabalhador interessado na cobertura pagava sua contribuição. Porém, os riscos não eram livremente escolhidos pelas partes, mas, sim, fixados em lei. Para a seguridade social, entretanto, a noção civilista de risco não se mostra adequada à definição do objeto da relação jurídica. Primeiro, porque a noção de risco está diretamente ligada a dano, prejuízo recomposto com a indenização. Ocorre que nem sempre a proteção da seguridade se destina a reparar danos. Eis um exemplo: a invalidez, que causa incapacidade para o trabalho, é, evidentemente, dano que tem cobertura previdenciária ou assistencial, conforme a hipótese. Porém, a maternidade também tem cobertura pela seguridade social, porque a segurada mãe fica impossibilitada de trabalhar e prover seu sustento e de sua família por um período; entretanto, não se pode conceituar a maternidade como dano. 27 Segundo, porque o seguro, para pagar a indenização decorrente do sinistro, exige pagamento do prêmio. Mas não é o que ocorre na seguridade social, porque nem todos contribuem para o custeio, mas todos têm direito a algum tipo de proteção social; se pode contribuir é segurado da previdência social; se não pode contribuir tem direito à assistência social, preenchidos os requisitos legais; porém, todos têm direito à assistência à saúde, independentemente de contribuição para o custeio. Como definir, então, o objeto da relação jurídica de seguridade social? Do tripé que compõe a seguridade, apenas, a relação jurídica previdenciária se aproxima da noção civilista de seguro, porque sempre dependerá do pagamento de contribuições do segurado. Porém, não há contrato, mas, sim, situações cuja cobertura sempre é definida, taxativamente, pela Constituição e pela legislação infraconstitucional. Então, o objeto da relação jurídica de seguridade social não é o risco, mas, sim, a contingência que gera a consequência-necessidade, objeto da proteção. O que importa é a consequência que o fato produz: a relação jurídica de seguridade social nasce após a ocorrência da contingência, para, então, reparar a consequência- necessidade decorrente. As contingências estão enumeradas na CF: são as prestações de seguridade social. Fixamos, desde já, que prestações é o gênero, do qual são espécies os benefícios e os serviços, que serão oportunamente definidos. Fonte: Direito Previdenciário Esquematizado, Marisa Ferreira dos Santos, p.42 28 8 APLICAÇÃO DO DIREITO PREVIDENCIÁRIO 8.1 Aplicação no tempo A lei tem por fim a disciplina das situações futuras, o “dever-ser”, e resulta da atividade legislativa que, analisando os fatos sociais, acolhe a disciplina mais adequada à pacificação social. A Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro — LINDB (Lei n. 12.376, de 30.12.2010) disciplina a vigência da lei no tempo e no espaço. E fornece algumas regras fundamentais. No art. 1º, a LINDB dispõe que a lei começa a vigorar em todo o país 45 dias depois de oficialmente publicada e, caso seja novamente publicada, para fins de correção do texto, antes de entrar em vigor, o prazo começará a correr da nova publicação (art. 1º, § 3º). A lei permanecerá em vigor até que outra lei posterior a modifique ou revogue (art. 2º). A revogação pode ser expressa ou tácita. É tácita quando a nova lei é com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria por ela antes regulada (§ 1º). E, se a lei nova perder a vigência, não haverá repristinação, isto é, a lei revogada não será restaurada, salvo disposição em contrário (§ 3º). É também na LINDB que está proibida a retroatividade da lei, cuja vigência deve respeitar o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada (art. 6º), preceito que também é garantia fundamental, na forma do art. 5º, XXXVI, da CF. Essas regras são importantes em matéria de seguridade social em razão das constantes modificações legislativas, notadamente na área da previdência social. Em matéria previdenciária, aplica-se o princípio segundo o qual tempus regit actum: aplica-se a lei vigente na data da ocorrência do fato, isto é, da contingência geradora da necessidade com cobertura pela seguridade social. E nem poderia ser diferente porque se, de um lado, novas situações de necessidade vão surgindo no meio social, por outro lado, a seguridade social está submetida a limitações orçamentárias. Exemplo: pelo princípio segundo o qual tempus regit actum, a pensão é concedida de acordo com as normas vigentes na data do óbito do segurado, porque o óbito é a contingência geradora de necessidade com cobertura previdenciária. Pode ocorrer que as normas relativas à pensão por morte sejam modificadas após o óbito, trazendo benefícios para os pensionistas. 29 Os pensionistas, então, pedem a revisão do valor do benefício ao fundamento de que a lei nova é mais vantajosa. A jurisprudência, entretanto, tem sucessivamente reafirmado que, nesse caso, se aplica a lei vigente na data do óbito, impossibilitando a aplicação das novas regras à pensão anteriormente concedida. Foi o que ocorreu com a Lei n. 9.032/95, que alterou o coeficiente da pensão por morte para 100% do salário de benefício. A legislação anterior previa percentual inferior. Muitos pensionistas acorreram ao Poder Judiciário pleiteando, então, a majoração do coeficiente. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, apreciando o Recurso Extraordinário n. 415454/SC, de relatoria do Ministro Gilmar Mendes, decidiu que, nessa situação, aplica-se a lei vigente na data do óbito do segurado. Entretanto, o julgado citado assenta que a retroatividade pode ocorrer quando a lei expressamente a ressalvar, desde que atendida a prévia indicação da fonte de custeio total. Em duas oportunidades, pelo menos, isso já ocorreu: com o art. 58 do ADCT e com a vigência da Lei n. 8.213/91, conforme veremos no tópico relativo ao cálculo do valor dos benefícios previdenciários. A aquisição dos direitos previdenciários, em regra, impõe o cumprimento de longos prazos. E é rotineiro que a legislação se modifique, alterando “as regras do jogo” antes que o direito a determinada prestação se aperfeiçoe. Há alguns exemplos recentes de alteração da legislação previdenciária que têm produzido grandes discussões: a alteração do regime jurídico das aposentadorias dos servidores públicos e das aposentadorias do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), introduzida pela Emenda Constitucional n. 20/98. Como mais adiante estudaremos, a EC 20 e a legislação infraconstitucional que a regulamentou acabaram por atingir segurados de ambos os regimes previdenciários que ainda não haviam cumprido todos os requisitos para a aposentadoria. Surgiu, então, a questão: tinham direito adquirido à aposentadoria pelas normas vigentes antes da EC20? A questão do aperfeiçoamento da aquisição de direitos não é simples em nenhum ramo do Direito. E no Direito Previdenciário se complica porque se trata de direito social, o que impõe outra pergunta: em que momento se adquire o direito a benefícios previdenciários? Na data do ingresso no sistema? Como veremos no decorrer deste trabalho, o direito aos benefícios previdenciários impõe o cumprimento de diversos requisitos, dentre eles o cumprimento de carências. Nas aposentadorias por tempo de contribuição, exemplo de mais fácil compreensão, há necessidade de comprovação de períodos de, no mínimo, 30 anos. Não se tem notícia de legislação previdenciária que no Brasil tenha vigorado por tanto tempo, de modo que é comum que a legislação se modifique antes que os requisitos tenham sido cumpridos. 30 A nosso ver, a interpretação mais consentânea com os fins da Seguridade Social é no sentido de que se adquire o direito ao benefício na conformidade das normas vigentes quando do ingresso no sistema. Isso porque a seguridade social, por definição, destina-se à proteção social que garante ao indivíduo bem-estar e justiça sociais. No terreno previdenciário, eminentemente contributivo, não parece correto que se ingresse no sistema com a expectativa de obter a aposentadoria conforme as regras então vigentes e, no meio do caminho, mudem as regras do jogo, colocando por terra todo o planejamento feito para o futuro. Onde está a segurança jurídica de quem contribui para o custeio da seguridade social por longo tempo quando, repentinamente, as regras mudam e a aposentadoria já não pode mais ser concedida? Entretanto, nosso posicionamento não encontra guarida no STF, que, há muito, vem decidindo que não há direito adquirido a regime jurídico. Nesse sentido, o julgamento do RE 575089/RS, Relator Ministro Ricardo Lewandowski. Fica claro, assim, que os benefícios previdenciários são concedidos e calculados de acordo com as normas vigentes na data em que foram cumpridos todos os requisitos para a sua concessão. 8.2 Aplicação no espaço As normas previdenciárias se aplicam a todos que vivem no território nacional, conforme o princípio da territorialidade. Há situações, entretanto, em que a lei prevê proteção previdenciária no Brasil para pessoas que estão fora do território nacional. É o que prevê o art. 11, I, c, da Lei n. 8.213/91, que classifica como segurados empregados o brasileiro ou o estrangeiro domiciliado e contratado no Brasil para trabalhar como empregado em sucursal ou agência de empresa nacional no exterior. Também é segurado obrigatório, na condição de empregado (art. 11, I, e), o brasileiro civil que trabalha para a União, no exterior, em organismos oficiais brasileiros ou internacionais dos quais o Brasil seja membro efetivo, ainda que lá domiciliado e contratado. Atenção: não será segurado obrigatório do RGPS se estiver segurado na forma da legislação vigente do país do domicílio. 31 Convém lembrar a situação dos diplomatas estrangeiros que prestam serviços no Brasil. Em regra, essas pessoas estão protegidas pela legislação previdenciária do país de origem. Porém, se estão no Brasil prestando serviços à missão diplomática ou à repartição consular de carreira estrangeira e a órgãos a ela subordinados, são segurados empregados, na forma do art. 11, I, c. Atenção: se esses estrangeiros não têm residência permanente no Brasil, não são segurados obrigatórios do RGPS. E o brasileiro que preste serviços a essas missões diplomáticas ou repartições consulares também não será segurado obrigatório se estiver amparado pela legislação previdenciária do respectivo país (art. 11, I, d). Essas normas são extremamente importantes porque o Brasil tem assinado tratados internacionais em matéria previdenciária (Portugal, Cabo Verde, Itália, Espanha, Argentina, Chile, Uruguai, Japão etc.). Havendo reciprocidade previdenciária entre os países, os segurados neles poderão obter benefícios previdenciários. A aplicação dos Acordos Internacionais está prevista no art. 32, §§ 18 e 19, do Decreto n. 3.048, de 06.05.1999 (Regulamento da Previdência Social). 9 O FINANCIAMENTO DA SEGURIDADE SOCIAL 9.1 Normas gerais constitucionais. Financiamento de forma direta e indireta O art. 195 da CF prevê que a seguridade social é financiada “por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”, e pelas contribuições sociais previstas nos incisos. I a IV. O financiamento de forma direta é feito com o pagamento de contribuições sociais previstas nos incs. I a IV do art. 195, da contribuição para o Programa de Integração Social (PIS) e para o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PASEP) (art. 239), destinadas a financiar o programa do seguro-desemprego e o abono previsto no § 3º, pago aos empregados que recebem até dois salários mínimos de remuneração mensal. O financiamento de forma indireta é feito com o aporte de recursos orçamentários da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal, que 32 devem constar dos respectivos orçamentos dos entes federativos. Esses recursos que não integram o orçamento da União. Fonte: www.gestaopublica.com.br A Lei n. 8.212, de 24.07.1991 (Plano de Custeio), dispõe no art. 11 que, no âmbito federal, o orçamento da seguridade social é composto por receitas da União, receitas das contribuições sociais e receitas de outras fontes. Caso o orçamento da seguridade se mostre insuficiente para o pagamento dos benefícios previdenciários, a União é responsável por estes, na forma da Lei Orçamentária (art. 16 da Lei n. 8.212/91). 9.2 Competência Estão enumeradas no art. 195 da CF as contribuições sociais destinadas ao financiamento da seguridade: do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada, na forma da lei, incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos do trabalho, a receita ou o faturamento e o lucro (inc. I, a, b e c); do trabalhador e dos demais segurados da Previdência Social, não incidindo sobre aposentadorias e pensões pagos pelo RGPS (inc. II); sobre a receita de concursos de prognósticos (inc. III); e do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele equiparar (inc. IV). Compete à União instituir as contribuições enumeradas pelo art. 195 (art.149 da CF), por lei ordinária. Outras fontes de custeio, diferentes das previstas nos incs. I a IV do art. 195, podem ser instituídas. Trata-se de competência residual da União, que só pode ser 33 exercida por lei complementar, proibidos a cumulatividade e o bis in idem (art. 154, I, e § 4º do art. 195). Importante frisar que, para instituir as contribuições previstas nos incs. I a IV do art. 195, não é necessária lei complementar, bastando a lei ordinária. Essa questão foi levantada por ocasião da edição da Lei n. 7.689, de 15.12.1988, que instituiu a Contribuição Social sobre o Lucro das Pessoas Jurídicas (CSSL), ainda sob a égide da redação original da CF. O STF, então, firmou a necessidade de lei complementar apenas para novas fontes de custeio. Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios também podem instituir regimes próprios de previdência e assistência social. Por isso, têm competência para instituir e cobrar de seus servidores contribuições destinadas ao financiamento. 9.3 Imunidade A CF, com frequência, faz referência à isenção e à não incidência em situações que configuram imunidade. As hipóteses de imunidade em relação às contribuições para o custeio da seguridade social são apenas as enumeradas na CF, porque o entendimento firmado pela jurisprudência é no sentido de que essas exações são tributos. Porém, não são impostos, de forma que não se lhes aplica o disposto no art. 150, VI, da CF. 9.4 Imunidade das aposentadoriase pensões do RGPS Ao prever a contribuição “do trabalhador e dos demais segurados da previdência social”, o art. 195, II, dispõe que não incide contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de previdência social de que trata o art. 201. As aposentadorias e pensões dos servidores públicos não têm imunidade. 9.5 Imunidade das entidades beneficentes de Assistência Social No § 7º do art. 195, quando se utiliza a expressão “são isentas”, na verdade se está concedendo imunidade às entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei. 34 A dificuldade reside em conceituar “entidade beneficente de assistência social”. O art. 55 da Lei n. 8.212/91, na sua redação original, estabelecia requisitos para a “isenção” das contribuições previdenciárias dessas entidades, dentre os quais o de promover a assistência social beneficente, inclusive educacional ou de saúde, a menores, idosos, excepcionais ou pessoas carentes (inc. III). A Lei n. 9.732/98 modificou o inc. III do art. 55, passando a ser requisito promover, “gratuitamente e em caráter exclusivo, a assistência social beneficente a pessoas carentes, em especial a crianças, adolescentes, idosos e portadores de deficiência”. A Lei n. 9.732/98 introduziu o § 3º do art. 55 da Lei n. 8.212/91, dispondo que: “Para os fins deste artigo, entende-se por assistência social beneficente a prestação gratuita de benefícios e serviços a quem dela necessitar”. E acrescentou também o § 5º: “Considera-se também de assistência social beneficente, para os fins deste artigo, a oferta e a efetiva prestação de serviços de pelo menos sessenta por cento ao Sistema Único de Saúde, nos termos do regulamento”. O art. 4º da Lei n. 9.732/98 dispôs: Art. 4º. As entidades sem fins lucrativos educacionais e as que atendam ao Sistema Único de Saúde, mas não pratiquem de forma exclusiva e gratuita atendimento a pessoas carentes, gozarão da isenção das contribuições de que tratam os arts. 22 e 23 da Lei n. 8.212, de 1991, na proporção do valor das vagas cedidas, integral e gratuitamente, a carentes e do valor do atendimento à saúde de caráter assistencial, desde que satisfaçam os requisitos referidos nos incisos I, II, IV e V do art. 55 da citada Lei, na forma do regulamento. A imposição de requisitos pela Lei n. 9.732/98 foi impugnada na ADI 2.028-5, ao fundamento de padecer de inconstitucionalidade formal e material. Do ponto de vista formal, o argumento foi no sentido de que, embora o art. 195, § 7º, da CF, se refira à isenção, trata-se, na verdade, de imunidade, limitação constitucional ao poder de tributar, que só poderia ser disciplinada por lei complementar, conforme disposto no art. 146, II, da CF. Quanto ao aspecto material, o fundamento foi o da violação aos arts. 195, § 7º; 199, § 1º; 196; 197, § 6º; 203 e 204, I, II e IV, todos da CF; isso porque a Lei n. 9.732/98 restringiu o alcance da imunidade concedida pela Constituição, porque, ao definir entidade beneficente de assistência social, albergou apenas as que prestem serviços de saúde exclusivamente gratuitos, ou que dirijam pelo menos 60% de sua prestação de serviços ao atendimento do SUS, requisitos que não constam do art. 14 do CTN; 35 além do mais, a restrição impõe a concessão de imunidade apenas às entidades beneficentes, e não às filantrópicas, que com elas não se confundem. O Relator, Ministro Moreira Alves, concedeu a liminar, em 14.07.1999, confirmada pelo Plenário em 11.11.1999, para suspender a eficácia do art. 1º, na parte em que alterou a redação do art. 55, III, da Lei n. 8.212/91 e acrescentou- lhe os §§ 3º, 4º e 5º, bem como dos arts. 4º, 5º e 7º da Lei n. 9.732, de 11.12.1998. Com a concessão da liminar, passou a prevalecer o disposto no art. 55 da Lei n. 8.212/91, na redação anterior à Lei n. 9.732/98, até o julgamento da ADI. O art. 55, II, referido, exigia dessas entidades a apresentação de Registro e Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (CEBAS), fornecidos pelo Conselho Nacional de Assistência Social, renovado a cada 3 anos. Essa exigência foi questionada judicialmente, havendo posicionamento firme do STF no sentido de sua legalidade. O mesmo entendimento tem sido adotado pelo STJ, que editou a Súmula 352: “A obtenção ou a renovação do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (CEBAS) não exime a entidade do cumprimento dos requisitos legais supervenientes”. Fonte: especiais.g1.globo.com O art. 55 foi revogado pela Lei n. 12.101, de 27.11.2009, que define as entidades de assistência social como pessoas jurídicas de direito privado, sem fins 36 lucrativos, reconhecidas como entidades beneficentes de assistência social com a finalidade de prestação de serviços nas áreas de assistência social, saúde ou educação, e que atendam ao disposto na Lei. Com as alterações introduzidas na Lei Orgânica da Assistência Social — LOAS (Lei n. 8.742/93), pela Lei n. 12.435/2011, essas entidades passam a integrar o Sistema Único de Assistência Social — SUAS. Com a nova redação, o art. 3º da LOAS deu-lhes nova definição: consideram-se entidades e organizações de assistência social aquelas sem fins lucrativos que, isolada ou cumulativamente, prestam atendimento e assessoramento aos beneficiários abrangidos por esta Lei, bem como as que atuam na defesa e garantia de direitos. Essas entidades auxiliam a seguridade social, sendo justificável, por isso, a concessão da imunidade. A nosso ver, somente podem ser consideradas entidades de assistência social as que atuam complementarmente ao Poder Público na área de assistência social. Por isso, o conceito de entidade de assistência social não se aplica às entidades de previdência privada que recebam contribuições dos beneficiários, que, portanto, não são alcançadas pela imunidade. Esse é o entendimento do STF, fixado na Súmula 730: “A imunidade tributária conferida a instituições de assistência social sem fins lucrativos pelo art. 150, VI, c, da Constituição, somente alcança as entidades fechadas de previdência social privada se não houver contribuição dos beneficiários”. 9.6 Imunidade das receitas decorrentes de exportação No art. 149, § 2º, a CF dispõe que não incidirão as contribuições sociais, inclusive de seguridade social, sobre as receitas decorrentes de exportação. A CF restringiu a imunidade às “receitas”, com o que outras verbas não podem ser abrangidas. O STF, em Repercussão Geral, decidiu que a isenção prevista no art. 149, § 2º, não alcança a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). O STJ tem entendimento no sentido de que “ainda que se possa conferir interpretação restritiva à regra de isenção prevista no art. 14 da Lei n. 10.637/2002, deve ser afastada a incidência de PIS e Cofins sobre as receitas decorrentes de variações cambiais positivas em face da regra de imunidade do art. 149, § 2º, I, da 37 CF/88, estimuladora da atividade de exportação, norma que deve ser interpretada extensivamente (...)”. 9.7 Anterioridade O princípio da anterioridade impõe que o tributo não seja cobrado no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que o instituiu ou aumentou (art. 150, III, b, da CF). O princípio não se aplica às contribuições sociais, que podem ser cobradas no mesmo exercício financeiro em que instituídas ou modificadas, desde que respeitado o decurso de 90 dias após a publicação da lei, conforme o art. 195, §6º, da CF. Trata-se da conhecida “anterioridade mitigada ou nonagesimal”. 9.8 Remissão e anistia A CF (art. 195, § 11) proíbe a concessão de remissão ou anistia das contribuições devidas pelo empregador, pela empresa e pela entidade a ela equiparada e pelos segurados da previdência, quando se tratar de débito superior ao previsto em lei complementar. Remissão e anistia são institutos jurídicos distintos.A remissão só pode ocorrer depois que o crédito estiver constituído pelo lançamento, configurando hipótese de extinção do crédito tributário (art. 156, IV, do CTN). A anistia ocorre em momento anterior ao do lançamento e atinge as penalidades impostas ao contribuinte por descumprir a legislação tributária. É hipótese de exclusão do crédito tributário (art. 175, II, do CTN). Remissão Anistia Depois da constituição do crédito pelo lançamento Antes da constituição do crédito pelo lançamento Extingue o crédito tributário Atinge as penalidades por descumprimento da legislação tributária Exclui o crédito tributário 38 10 CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS PARA O CUSTEIO DA SEGURIDADE SOCIAL 10.1 Natureza jurídica O art. 195 da CF enumera as contribuições sociais destinadas ao financiamento da seguridade social: do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada (I); do trabalhador e dos demais segurados da previdência social (II); sobre a receita de concursos de prognósticos; e do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele equiparar (IV). Essas contribuições sociais suscitam divergência sobre sua natureza jurídica. Predomina na doutrina e na jurisprudência o entendimento de que são tributos, mais precisamente contribuições especiais. As receitas que compõem o orçamento da seguridade social estão elencadas no art. 11 do PCSS: receitas da União (I), receitas das contribuições sociais (II) e receitas de outras fontes (III). No parágrafo único relaciona as contribuições sociais: as das empresas, incidentes sobre a remuneração paga ou creditada aos segurados aos seus serviços (a); as dos empregadores domésticos (b); as dos trabalhadores, incidentes sobre seu salário de contribuição (c); as das empresas, incidentes sobre o faturamento e o lucro (d); e as incidentes sobre a receita de concursos de prognósticos (e). Não se pode esquecer, porém, que a EC 42/2003 acrescentou o inc. IV ao art. 195 da CF, acrescendo às verbas formadoras do orçamento da seguridade a contribuição do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele equiparar. Contribuições para o custeio da seguridade social é gênero, do qual as contribuições previdenciárias são espécie. As contribuições previdenciárias destinam-se ao custeio da previdência social, e estão previstas no art. 195, I, a, II, e III, da CF. O inc. XI do art. 167 da CF proíbe a utilização do produto da arrecadação dessas contribuições no pagamento de despesas outras que não as relativas à cobertura do RGPS prevista no art. 201, conforme previsto pela Emenda Constitucional n. 20/98. A disciplina infraconstitucional das contribuições previdenciárias está na Lei n. 8.212, de 24.07.1991, denominada Plano de Custeio (PCSS). 39 10.2 A relação jurídica de custeio A Lei n. 8.212/91 (PCSS) tratou diferentemente a relação jurídica de custeio, estabelecendo sujeito ativo, base de cálculo e alíquota, que se distinguiam conforme se tratasse de contribuição destinada ao custeio da seguridade social (gênero) ou de contribuição previdenciária (espécie). 10.3 O sujeito ativo As contribuições previdenciárias eram instituídas pela União, mas arrecadadas e cobradas pelo INSS. As contribuições sociais para o financiamento da seguridade social que não fossem da espécie previdenciária tinham como sujeito ativo a União, que, por intermédio da Secretaria da Receita Federal, deveria arrecadar, fiscalizar, lançar e normatizar o recolhimento (art. 33 do PCSS). Assim ocorria com as contribuições previstas no art. 11, parágrafo único, d e e, do PCSS: as contribuições das empresas incidentes sobre o faturamento e o lucro, e as incidentes sobre a receita dos concursos de prognósticos. O sujeito ativo das contribuições previdenciárias era o INSS, autarquia federal cuja criação foi autorizada pelo art. 17 da Lei n. 8.029/90, que tinha competência para arrecadar, fiscalizar, lançar e normatizar o recolhimento das contribuições das empresas, incidentes sobre a remuneração paga ou creditada aos segurados a seu serviço; as dos empregadores domésticos; e as dos trabalhadores, incidentes sobre seu salário de contribuição (art. 33 do PCSS). A Lei n. 11.457, de 16.03.2007, tornou a União o sujeito ativo de todas essas contribuições sociais. 40 Fonte: imgs.jusbr.com A Lei n. 11.457/2007 criou a Secretaria da Receita Federal do Brasil (“Super- Receita”), órgão da Administração direta subordinado ao Ministro de Estado da Fazenda (art. 1º), que resultou da união da Secretaria da Receita Federal e da Secretaria da Receita Previdenciária. A partir de 1º.05.2007 (art. 16), cabe à Secretaria da Receita Federal do Brasil planejar, executar, acompanhar e avaliar as atividades relativas à tributação, fiscalização, arrecadação, cobrança e ao recolhimento das contribuições sociais previstas nas alíneas a, b e c do parágrafo único do art. 11 da Lei n. 8.212, de 24.07.1991, e das contribuições instituídas a título de substituição. Com a alteração introduzida pela Lei n. 11.941/2009, o art. 33 da Lei n. 8.212/91 dispõe que compete à Secretaria da Receita Federal do Brasil planejar, executar, acompanhar e avaliar as atividades relativas à tributação, à fiscalização, à arrecadação, à cobrança e ao recolhimento das contribuições sociais previstas no parágrafo único do art. 11, das contribuições incidentes a título de substituição e das devidas a outras entidades e fundos. 10.4 O sujeito passivo O sujeito passivo é o devedor, isto é, o que tem a obrigação de pagar. 41 O sujeito passivo das contribuições previstas no inc. I, a, b, e c é o empregador, a empresa ou a entidade a ela equiparada. O trabalhador é o sujeito passivo da contribuição prevista no inc. II. A contribuição sobre a receita de concursos de prognóstico (inc. III) é devida pelos órgãos do Poder Público ou pelas entidades privadas que os promoverem. E o importador de bens ou serviços do exterior, ou quem a lei a ele equiparar, é o sujeito passivo da contribuição prevista no inc. IV. 11 A SEGURIDADE SOCIAL NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 19883 A Constituição Federal de 1988 (CF/1988) instituiu o Sistema de Seguridade Social, formado pelos subsistemas Saúde, Previdência Social e Assistência Social. O caput do art. 194 da CF/1988 estabelece que “a seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social”. 11.1 Saúde Antes da Constituição Federal de 1988, o subsistema “saúde” era vinculado ao Instituto de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS), e os serviços somente eram assegurados a quem contribuísse, ou seja, não era um direito universal. Diante disso, na época, existiam dois subsistemas de caráter contributivo: saúde e previdência social. Todavia, com a promulgação da Constituição Federal de 1988, a saúde passou a ser um dever do Estado e um direito de todos, independentemente de contribuição. Trata-se de um direito social que deve ser materializado por todos os entes da federação, mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação (art. 196 da CF/1988). 3 Texto extraído do link: https://professorceliocruz.jusbrasil.com.br/artigos/220032431/a- seguridade-social-na-constituicao-federal-de-1988 42 As ações e serviços de saúde são de relevância pública, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado. (art. 197 da CF/1988). A Constituição Federal de
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