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As Religiões Negras do Brasil - Reginaldo Prandi

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FICHAMENTO
As Religiões Negras do Brasil - Reginaldo Prandi
“Na Bahia originou-se também o muito popular candomblé de caboclo e o menos conhecido candomblé de egum. Mais recentemente, no Rio de Janeiro e depois em São Paulo, constituiu-se a umbanda, que logo se disseminou por todo o país, abrindo, de certo modo, caminho para uma nova etapa de difusão do antigo candomblé. O Nordeste foi berço também de outras modalidades religiosas mais próximas das religiões indígenas, mas que cedo ou tarde acabaram por incorporar muito das religiões afro-brasileiras ou as influenciar. Trata-se do catimbó, religião de espíritos aos quais se dá o nome de mestres e caboclos, que se incorporam no transe para aconselhar, receitar e curar. Esse tronco afro-ameríndio tem particularidades em diferentes lugares, sendo chamado de jurema, toré, pajelança, babaçuê, encantaria e cura.” (P. 66).
“Tudo indica que a organização das religiões negras no Brasil deu-se tardiamente. Uma vez que as últimas levas de africanos trazidos para o Novo Mundo nas últimas décadas do século XIX, período final da escravidão, foram fixadas sobretudo nas cidades e em ocupações urbanas, os africanos desse período puderam viver no Brasil em maior contato uns com os outros, física e socialmente, com maior mobilidade e, de certo modo, liberdade de movimentos, num processo de interação que não conheceram antes. Esse fato propiciou condições sociais favoráveis para a sobrevivência de algumas religiões africanas, com a formação de grupos de culto organizados.” (P. 66).
“Sua língua ritual deriva do iorubá, mas o significado das palavras em grande parte se perdeu através do tempo, sendo hoje muito difícil traduzir os versos das cantigas sagradas e impossível manter conversação na língua do candomblé.” (P. 66).
“Nessa "nação", tem fundamental importância o culto dos caboclos, que são espíritos de índios, considerados pelos antigos africanos como sendo os verdadeiros ancestrais brasileiros, portanto os que são dignos de culto no novo território em que foram confinados pela escravidão. O candomblé de caboclo é uma modalidade do angola centrado no culto exclusivo dos antepassados indígenas. Foi provavelmente o candomblé angola e o de caboclo que deram origem à umbanda.” (P. 66).
“Em nosso século nasceu a umbanda, que tem sido reiteradamente identificada como sendo a religião brasileira por excelência, pois, formada no Brasil, ela resulta do encontro de tradições africanas, espíritas e católicas (2). Ao contrário das religiões negras tradicionais que se constituíram como religiões de grupos negros, a umbanda surge como religião universal, isto é, dirigida a todos. A umbanda sempre procurou legitimar-se pelo apagamento de feições herdadas do candomblé, sua matriz negra, especialmente os traços referidos a modelos de comportamento e mentalidade que denotam a origem tribal e depois escrava, mantendo contudo essas marcas na constituição do panteão. Comparado ao do candomblé, seu processo de iniciação é muito mais simples e menos oneroso e seus rituais evitam e dispensam sacrifício de sangue.” (P. 67).
“A umbanda absorveu do kardecismo algo de seu apego às virtudes da caridade e do altruísmo, assim fazendo-se mais ocidental que as demais religiões do espectro afro-brasileiro; mas nunca completou o processo de ocidentalização, ficando a meio caminho entre ser religião ética, preocupada com a orientação moral da conduta, e religião mágica, voltada para a estrita manipulação sobrenatural do mundo.
Desde o início as religiões afro-brasileiras se formaram em sincretismo com o catolicismo, e em grau menor com religiões indígenas. O culto católico aos santos, numa dimensão popular politeísta, ajustou-se como uma luva ao culto dos panteões africanos.” (P. 67).
“E o candomblé também mudou. Até 20 ou 30 anos atrás, o candomblé era religião de negros e mulatos, confinado sobretudo na Bahia e Pernambuco, e de reduzidos grupos de descendentes de escravos localizados aqui e ali em distintas regiões do país. No rastro da umbanda, a partir dos anos 60 deste século, o candomblé passou a se oferecer como religião também para segmentos da população de origem não-africana.
A presença do negro na formação social do Brasil foi decisiva para dotar a cultura brasileira dum patrimônio mágico-religioso, desdobrado em inúmeras instituições e dimensões materiais e simbólicas, sagradas e profanas, de enorme importância para a identidade do país e sua civilização. No que diz respeito à religião especificamente, os cultos trazidos pelos africanos deram origem a uma variedade de manifestações que aqui encontraram conformação específica, através de uma multiplicidade sincrética resultante do contato das religiões dos negros com o catolicismo do branco, mediado ou propiciado pelas relações sociais assimétricas existentes entre eles, e também com as religiões indígenas e bem mais tarde, mas não menos significativamente, com o espiritismo kardecista.” (P. 67).
“Desde sua formação em solo brasileiro, as religiões de origem negra têm sido tributárias do catolicismo. Embora o negro, escravo ou liberto, tenha sido capaz de manter no Brasil dos séculos XVIII e XIX, e até hoje, muito de suas tradições religiosas, é fato que sua religião enfrentou-se desde logo com uma séria contradição: a própria estrutura social e familiar às quais a religião dava sentido aqui nunca se reproduziram. As religiões dos bantos, iorubás e fons são religiões de culto aos ancestrais, que se fundam nas famílias e suas linhagens.” (P. 67).
“Se a religião negra, ainda que em sua reconstrução fragmentada, era capaz de dotar o negro de uma identidade negra, africana, de origem, que recuperava ritualmente a família, a tribo e a cidade, perdidas para sempre na diáspora, era através do catolicismo, contudo, que ele podia se encontrar e se mover no mundo real do dia-a-dia, na sociedade dos brancos dominadores, responsável pela garantia da sua existência, não importa em que condições de privação e dor. Qualquer tentativa de superação da condição escrava, como realidade ou como herança histórica, implicava primeiro a necessária inclusão no mundo branco. E logo passava a significar o imperativo de ser, sentir-se e parecer brasileiro. Nunca puderam ser brasileiros sem ser católicos. Podiam preservar suas crenças no estrito limite dos grupos familiares, muitas vezes reproduzindo simbolicamente a família e os laços familiares através da congregação religiosa, daí a origem dos terreiros e das famílias-de-santo.” (P. 68).
“As religiões afro-brasileiras, em suas origens, sempre foram devedoras e dependentes do catolicismo, ideológica e ritualmente. Só muito recentemente - quando a sociedade brasileira não precisa mais do catolicismo como a grande e única fonte de transcendência que possa legitimá-la e fornecer os controles valorativos da vida social -, as religiões de origem negra começaram a se desligar do catolicismo.” (P. 68).
UMBANDA, UMA RELIGIÃO UNIVERSAL
“A fundação, nos anos 20, daquele primeiro centro de umbanda no Rio de Janeiro, como dissidência pública e institucionalizada do kardecismo, num processo de valorização de elementos nacionais, como o caboclo e o preto-velho, que são espíritos de índios e escravos, deve ter representado uma forma de acomodação seletiva, um movimento de rearranjo entre duas alternativas confluentes na perspectiva dos fundadores da umbanda: uma mais rica em conteúdos doutrinários, a outra mais centrada em práticas rituais. O kardecismo como religião de salvação, religião da palavra, o candomblé como religião ritualística, de manipulação do destino.” (P. 69).
“[...] a simplificação da iniciação, com a eliminação quase total do sacrifício de sangue, iniciação que ganha, ao estilo kardecista, características de aprendizado mediúnico público, o desenvolvimento do médium. Mantém-se o rito cantado e dançado dos candomblés, bem como um panteão simplificado de orixás, já porém há muitos anos sincretizados com santos católicos, reproduzindo-se, portanto, um calendário litúrgico que segue o da Igreja Católica,publicizando-se as festas ao compasso desse calendário.” (P. 69).
“Na umbanda que se consolidará a partir de então, a presença da entidade no transe ritual volta-se mais para a cura, limpeza, aconselhamento dos fiéis e clientes, afastando-se de outro ideal kardecista: o de comunicação com os mortos com o fim de estender ao mundo dos espíritos atrasados e sofredores a doutrinação evangélica caridosa, e receber dos espíritos de luz orientação para o desenvolvimento de virtudes na terra, curas do corpo e da alma, evolução espiritual dos vivos e dos mortos.” (P. 69).
“Do Rio de Janeiro, a umbanda instala-se e se expande em São Paulo rapidamente, depois pelo país inteiro. Três décadas depois será analisada e festejada como a religião brasileira. A adoção da umbanda por São Paulo dá-se publicamente.” (P. 70).
“A umbanda, ritualmente muito próxima do candomblé dos ritos angola e caboclo, em que já estão esquecidos os inquices bantos, substituídos pelos orixás nagôs, procura incorporar na doutrina em formação as verdades teologais do cristianismo ​ fé, esperança e caridade ​, as grandes virtudes católicas adotadas pelo kardecismo, e procura emprestar desta religião seus modelos de organização burocrática e federativa. Não logra inteiramente nem uma coisa nem outra.” (P. 70).
“A umbanda é a religião dos caboclos, boiadeiros, pretos velhos, ciganas, exus, pombagiras, marinheiros, crianças. Perdidos e abandonados na vida, marginais no além, mas todos eles com uma mesma tarefa religiosa e mágica que lhes foi dada pela religião de uma sociedade fundada na máxima heterogeneidade social: trabalhar pela felicidade do homem sofredor.” (P. 70).
“A umbanda, de certo modo, rompe com a concepção kardecista do mundo: aqui não é mais uma terra de sofrimentos onde devemos ajustar contas por atos de nossas vidas anteriores. Trazendo do candomblé a idéia, ainda que desbotada, pouco definida, de que a experiência neste mundo implica a obrigação de gozá-lo, a idéia de que a realização do homem se expressa através da felicidade terrena que ele deve conquistar, a umbanda retrabalha a noção culpada da evolução cármica kardecista, assim como, através da propiciação ritual, descobre a possibilidade de alteração da ordem. É necessário que cada um procure a sua realização plena, mesmo porque o mundo com o qual nos deparamos é um mundo que valoriza o individualismo, a criatividade, a expansão da capacidade de imaginação, a importância de subir na vida. Este pormenor é essencial.” (P. 71).
“A umbanda se divide numa linha da direita, voltada para a prática do bem e que trata com entidades "desenvolvidas", e numa linha da "esquerda", a parte que pode trabalhar para o "mal", também chamada quimbanda, e cujas divindades, "atrasadas" ou demoníacas, sincretizam-se com aquelas do inferno católico ou delas são tributárias.” (P. 73).
“Na prática, não há quimbanda sem umbanda nem quimbandeiro que não seja umbandista, pois são duas faces de uma mesma concepção religiosa.
Assim, estão do lado "direito" os orixás, sincretizados com os santos católicos, e que ocupam no panteão o posto de chefes de linhas e de falanges, que são reverenciados, mas que pouco ou nada participam do "trabalho" da umbanda, isto é, da intervenção mágica no mundo dos homens para a solução de todos os seus problemas, que é o objetivo primeiro da umbanda enquanto religião ritual. Ainda do lado do "bem" estão o caboclo (que representa a origem brasileira autêntica, o antepassado indígena) e o preto-velho (símbolo da raiz africana e marca do passado escravista e de uma vida de sofrimentos e purgação de pecados). Na "esquerda" estão os exus masculinos e as pombagiras, sincretizados com demônios católicos, sempre dispostos a trabalhar "para o mal", visando sempre o bem de seus adeptos, amigos e clientes. Embora religião surgida neste século, durante e em função do processo intenso de urbanização e industrialização, o panteão da umbanda é constituído sobretudo de entidades extraídas de um passado histórico que remonta pelo menos ao século XIX. Ela nunca incorporou, sistematicamente, os espíritos de homens e mulheres ilustres contemporâneos que marcam o universo das entidades do espiritismo kardecista.” (P. 73).
CANDOMBLÉ, AGORA TAMBÉM UMA RELIGIÃO PARA TODOS
“Durante os anos 1960, contudo, algo surpreendente começou a acontecer. Com a larga migração proveniente do Nordeste em busca das grandes cidades industrializadas no Sudeste, o candomblé começou a penetrar o bem estabelecido território da umbanda, e velhos umbandistas começaram a se iniciar no candomblé, muitos deles abandonando os ritos da umbanda para se estabelecer como pais e mães-de-santo das modalidades mais tradicionais de culto aos orixás. Neste movimento, a umbanda é remetida de novo ao candomblé, sua velha e "verdadeira" raiz original, considerada pelos novos seguidores como sendo mais misteriosa, mais forte, mais poderosa que sua moderna e embranquecida descendente.” (P. 74).
“O candomblé encontrou condições sociais, econômicas e culturais muito favoráveis para o seu renascimento num novo território, em que a presença de instituições de origem negra até então pouco contava. Nos novos terreiros de orixás que foram se criando então, entretanto, podiam ser encontrados pobres de todas as origens étnicas e raciais. Eles se interessaram pelo candomblé. E os terreiros cresceram às centenas.” (P. 74).
Explicar
“Esse consumo, que não é do pobre, mas é do jovem, do estudado, do branco metropolita, leva primeiro essa classe média aos terreiros da Bahia: há um novo universo no mercado religioso interno, à altura das formas mais originais e herméticas do Oriente. Mas a metrópole não vai pagar por muito tempo o preço de ir tão longe. Quer que a Bahia seja refeita aqui, em São Paulo, por que não? E quando o candomblé chegar, sua clientela já estará de prontidão. Uma clientela de classe média, aliás, indispensável para garantir a infra-estrutura dessa religião, clientela que se ampliará e se diversificará muito, evidentemente.” (P. 76).
“Como agência de serviços religiosos oferecerá ao não-devoto um tipo de serviço em que o sagrado, o estritamente religioso, é pouco exigente para quem busca uma religião não para ser ou por ser religioso, mas simplesmente para a solução de um problema não resolvido por outros meios. Aos olhos do cliente, a densa sacralidade do candomblé pode passar despercebida. Isso permitirá ao homem de mentalidade laicizada das classes médias ​ de onde sai o grosso da clientela do candomblé na metrópole ​ um menor ou nulo envolvimento religioso quando se trata de uma solução ad hoc: posto que pensada como magia executada pelo sacerdote e menos como intervenção de uma divindade espiritual que ele tem que enfrentar face to face na umbanda. Este deslocamento da magia em relação ao plano da religião, no sentido de que a magia pode ser exercida e pensada como prática autônoma, às vezes até se vale de procedimentos aparentemente científicos, isto é, totalmente dessacralizados e racionais. Só que agora é a religião que dá legitimidade para essa mágica "autônoma" e, por isso, nem é considerada magia, nem julgada perniciosa para a sociedade.” (P. 76).
“A primeira cerimônia privada a que a noviça (abiã) é submetida consiste num sacrifício votivo à sua própria cabeça (ebori), para que a cabeça possa se fortalecer e estar preparada para algum dia receber o orixá no transe de possessão. Para se iniciar como cavalo dos deuses, a abiã precisa juntar dinheiro suficiente para cobrir os gastos com as oferendas (animais e ampla variedade de alimentos e objetos), roupas cerimoniais, utensílios e adornos rituais e demais despesas suas, da família-de-santo, e eventualmente de sua própria família durante o período de reclusão iniciática em que não estará, evidentemente, disponível para o trabalho no mundo profano.” (P. 78).
“Segundo o candomblé, cada indivíduo pertence a uma divindade específica, que é o senhor de sua cabeça e mente e de quem herda características físicas e de personalidade. É prerrogativa religiosado pai ou mãe-de-santo descobrir a origem mítica através do jogo de búzios. Esse conhecimento é absolutamente imperativo no processo de iniciação de novos devotos e mesmo para se fazerem previsões do futuro para clientes, assim como para resolver seus problemas. Embora na África haja registro de culto a cerca de 400 orixás, apenas duas dezenas deles sobreviveram no Brasil. A cada um destes cabe o papel de reger e controlar forças da natureza e aspectos do mundo, da sociedade e da pessoa humana. Cada um tem suas próprias características, elementos naturais, cores simbólicas, vestuário, músicas, alimentos, bebidas, além de se caracterizar por ênfase em certos traços de personalidade, desejos, defeitos, etc. Nenhum orixá é nem inteiramente bom, nem inteiramente mal. Noções ocidentais de bem e mal estão ausentes da religião dos orixás no Brasil. E os devotos acreditam que os homens e mulheres herdam muitos dos atributos de personalidade de seus orixás, de modo que em muitas situações a conduta de alguém pode ser espelhada em passagens míticas que relatam as aventuras dos orixás. Isso evidentemente legitima, aos olhos da comunidade de culto, tanto as realizações como as faltas de cada um.
De fato, o seguidor do candomblé pode simplesmente tomar os atributos do seu orixá como se fossem os seus próprios e tentar se parecer com ele, ou reconhecer através dos atributos da divindade bases que justificam sua conduta. Os padrões apresentados pelos mitos dos orixás podem assim ser usados como modelo a ser seguido, ou como validação social para um modo de conduta já presente. Um iniciado pode, ao familiarizar-se com seus estereótipos míticos, identificar-se com eles e reforçar certos comportamentos, ou simplesmente chamar a atenção dos demais para este ou aquele traço que sela sua identidade mítica. Mudar ou não o comportamento não é importante; o que conta é sentir-se próximo do modelo divino.” (P. 79).
“A segunda divindade tem papel importante na definição do comportamento, permitindo operar-se com combinações muito ricas. Como cada orixá particular da pessoa deriva de uma qualidade do orixá geral, que pode ser o orixá em idade jovem ou já idoso, ou o orixá em tempo de paz ou de guerra, como rei ou como súdito, etc., etc., as variações que servem como modelos são quase inesgotáveis.” (P. 79).
“O cliente de classe média que vai aos candomblés para jogar búzios e fazer ebós é o bricoleur que também tem procurado muitas outras fontes não-racionais de sentido para a vida e de cura para males de toda natureza. Certamente o candomblé deste cliente é bem diferente do candomblé do iniciado, mas nenhum deles contradiz o sentido do outro.” (P. 80).
“Aceitando o mundo como ele é, o candomblé aceita a humanidade, situando-a no centro do universo, apresentando-se como religião especialmente dotada para a sociedade narcisista e egoísta em que vivemos.” (P. 80).
“O candomblé se preocupa sobretudo com aspectos muito concretos da vida: doença, dor, desemprego, deslealdade, falta de dinheiro, comida e abrigo - mas sempre tratando dos problemas caso a caso, indivíduo a indivíduo, pois não se trabalha aqui com a noção de interesses coletivos, mas sempre com a de destino individual.” (P. 82).
“Assim, os deuses africanos apropriados pelas metrópoles da América do Sul não são mais deuses da tribo, impostos aos que nela nascem. Eles são deuses numa civilização em que os indivíduos são livres para escolhê-los ou não, continuar fielmente nos seus cultos ou simplesmente abandoná-los.” (P. 82).

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