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Disciplina: Economia do Bem Estar Social Professora: Lena Lavinas Aluna: Sarah Nicolau dos Santos MICROCURA? UMA CRÍTICA AO MICROCRÉDITO ENQUANTO INSTRUMENTO DE REDUÇÃO DA POBREZA Rio de Janeiro Julho/2016 INTRODUÇÃO Atualmente o Microcrédito se apresenta como uma solução para inclusão das camadas pobres ao sistema bancário, impulsionando seus empreendimentos e promovendo a estas pessoas acesso ao consumo e à qualidade de vida. Com o sucesso de algumas iniciativas e a conseqüente difusão do microcrédito, ele começou a ser encarado também como uma forte ferramenta de combate à pobreza. Este trabalho irá conceituar o microcrédito e desmontar esta ilusão, mostrando a insuficiência das microfinanças enquanto agente promotor de proteção social e combate à pobreza. A partir da difusão de idéias liberais e da influência setor financeiro no Brasil e no mundo, este tipo de estudo é importante para delimitar o papel dos bancos na sociedade moderna. Para isso, foi preciso refletir sobre a pobreza e o papel do Estado na sua eliminação e de que forma o microcrédito se encaixa, destrinchando também seu funcionamento e sua história. Onde há Estado de Bem Estar Social não há espaço para este tipo de atividade bancária. O texto a seguir foi precedido de revisão bibliográfica de artigos acadêmicos e também de pesquisa feita em sites de financeiras, bancos de varejo e do BNDES. Também foram estudados e serão abordados o histórico, características, difusão e as críticas existentes ao microcrédito, o caso do Banco Grameen e a involução do Estado de Bem Estar Social. DESENVOLVIMENTO 1. MICROCRÉDITO 1.1 APRESENTAÇÃO O Microcrédito é uma linha de crédito que busca atender camadas de baixa renda excluídas do setor financeiro. Sucintamente, microcrédito pode ser definido como crédito para pobres, dado sem garantias reais e de forma sustentável para geração de autoemprego. (FERRAZ; GOMES; SANTANA; 2012) O Microcrédito é um fenômeno recente, mas já se configura como uma das ofertas mais populares na esfera das Microfinanças, que incluem também micropoupanças, microseguros, crédito imobiliário, entre outros. Este segmento oferece serviços financeiros para clientes para os quais os bancos comerciais não possuem apetite, devido ao risco pela assimetria de informações. Segundo Mick (2003), essas instituições financeiras inovaram ao oferecer soluções extremamente variadas para problemas cruciais no combate ao apartheid financeiro: assegurar que grande número de pobres pudesse ter acesso a empréstimos; prover mecanismos para identificar maus tomadores na ausência de registros escritos ou business plans; dar incentivos ao pagamento para tomadores que não podem dar garantias ou, se isso falhar, forçá-los a pagar em dia. Se apresenta portanto uma ferramenta de capitalização do pobre, para que este possa incrementar a sua renda, impulsionar suas atividades produtivas informais e transpor sua condição de carência de necessidades básicas. 1.2 HISTÓRICO E CARACTERÍSTICAS Entre os anos 1950 e 1980, em diversos países, houve uma tentativa de disseminação de combate à pobreza através de crédito subsidiado, principalmente em áreas rurais. No entanto, este movimento fracassou devido à ineficiência, corrupção e taxas de juros altamente subsidiadas que acabaram gerando altíssimas taxas de inadimplência, custos crescentes dos subsídios, entre outros fatores que tornaram insustentável o crédito para desfavorecidos. A experiência acabou tendo inclusive efeito reverso, pois ocasionou racionamento de crédito. Mais tarde, e meados dos anos 90, com o surgimento do Grameen Bank,foram feitos avanços metodológicos notáveis, resultando em uma experiência de sucesso. Este banco surgiu a partir dos ideais de Muhammad Yunus um economista e professor universitário em Blangadesh. Yunus (2002) afirma que o crédito é um direito humano, assim como os demais direitos constitucionais, e que propicia a igualdade ao possibilitar que pessoas menos favorecidas de recursos também participem da economia. Porém, o crédito para os pobres não deve ser entendido como assistencialismo, a concessão deve ser formalizada e o objetivo não é o consumo e sim o fomento do autoemprego. A idéia inicial do Banco Grameen era fazer pequenos empréstimos aos “mais pobres dos pobres”, quantias que não ultrapassavam trezentos dólares. Uma das principais práticas difundidas pelo Banco Grameen é a concessão de crédito em conjunto, para pequenos grupos de pessoas que também dividem a responsabilidade relativa ao pagamento. O uso deste mecanismo, chamado aval solidário, contribui para os baixos níveis de inadimplência. Isto porque mitiga o problema da seleção adversa para as instituições bancárias e, além disso, aumenta o poder de pressão, com possíveis sanções sociais, para que os empréstimos sejam pagos. Outra característica particular do Microcrédito, comum em Blangadesh e difundida mundo à fora, é que muito comumente são as IMFs (Instituição de Microfinanças) que vão até o cliente. Os agentes de crédito procuram os clientes e investem no entrosamento e relacionamento com os mesmos, para estreitar laços e procurar indícios de capacidade de pagamento. De e acordo com Santos e Carrion (2009 apud YUNUS, 2003), nos anos 2000, um décimo da população de Bangladesh, ou seja cerca de 12 milhões de pessoas, são assistidas pelo crédito concedido pelo Banco Grameen, sendo que 94% dos tomadores de empréstimo são mulheres que obtêm em média 150 dólares junto ao banco cada uma, havendo um índice de recuperação bancária superior a 98%. E as taxas de reembolso costumam ser bastante altas também em outras instituições de microcrédito. Seria então o Microcrédito a panacéia contra a pobreza no mundo capitalista? Há duas questões que não podem ser deixadas de fora desta análise: Primeiro, é fato que este impacto, a priori, positivo se dá através do endividamento de uma população sem instrução. Em segundo lugar, é sensato esperar caridade e/ou proteção social de instituições financeiras que visam o lucro? As taxas de juros cobradas variam de acordo com cada IMF e sua localidade, ideologicamente para adequarem-se ao seu público deveriam ser mais baixas que as taxas cobradas em empréstimos convencionais. Porém, Segundo Costanzi (2002), para compensar a associação de baixo valor dos empréstimos com os elevados custos de operação do microcrédito as taxas de juros do microcrédito precisam ser altas. No entanto, ainda assim o microcrédito seria uma boa oportunidade para o perfil do cliente em questão, que antes não tinha fornecimento de crédito formal e recorria à agiotagem e seus juros abusivos. 1.3 APOGEU E DISSEMINAÇÃO Nos anos 2000, a euforia em torno do microcrédito foi de grandes proporções. O ano de 2005 foi nomeado pela ONU “Ano Internacional do Microcrédito”. No ano seguinte, 2006, o Prêmio Nobel da Paz foi atribuído à Muhammad Yunus, o fundador do Grameen Bank.Ainda em 2006, a Campanha da Cúpula do Microcrédito ultrapassou a meta fixada em 1997 de chegar a cem milhões de famílias mais pobres do mundo com créditos para o autoemprego e outros serviços comerciais. O panorama dos anos anteriores explica parte do sucesso do Microcrédito nos anos que precederam seu auge, em que a redução da pobreza tornou-se foco de organismos multilaterais. A pobreza havia se tornado um problema crescente e preocupante para o capitalismo, prejudicando a expansão dos mercados capitalistas nos países em desenvolvimento e a estabilidade social nos países desenvolvidos (LAVINAS, 2013). Soares (2014) pontua um ponto político essencial: é importante compreender que o microcrédito encaixa-se com perfeição à ideologia neoliberal, pois reduziria o número de pobres sem aumentar os gastos públicos, sem redistribuirrenda e utilizando mecanismos de mercado. A expansão do microcrédito logrou também de uma mitificação criada em torno da experiência pioneira do Grameen Bank que influenciou, como modelo, a formação de instituições microfinanceiras em muitos países. O modelo de concessão de pequenos empréstimos bengalês era descrito, sem meias palavras, como uma revolução (ROBINSON, 2001), como a mais poderosa arma individual contra a pobreza no mundo. No entanto, durante o processo de difusão da prática internacionalmente, a concepção original do microcrédito sofreu derivações. O termo “microfinanças” passou a designar diferentes serviços citados anteriormente, e houve uma mudança de público-alvo, os muito pobres foram substituídos por micro e pequenos empreendedores. O “produto” microcrédito diversificou-se e atualmente, além dos modelos de microcrédito baseados no Banco Grameen (aval solidário), existe o microcrédito ao consumidor, fornecido pelas financeiras em lojas; microcrédito para o fomento de atividades específicas (agricultura, pesca, teares manuais etc.), microcrédito fornecido por bancos comerciais, microcrédito fornecido através da parceria entre bancos e ONGs, Microcrédito fornecido sem garantias por não-ONGs como associações de apoio ao microempreendedor, etc. 1.4 CRÍTICA As microfinanças desempenham contribuições genuínas, que não podem ser nem ignoradas. De fato o acesso ao crédito e outros serviços financeiros foi estendida à populações carentes e, naturalmente, possibilita o consumo de bens seja para consumo, seja para o autoemprego. Porém, o microcrédito não alcança dimensões de pobreza como déficits em saúde, saneamento, educação, empoderamento e capital social. De modo que, o este serviço não faz jus à promessa de tirar as pessoas da pobreza. É evidente que com a quantidade de clientes de microempréstimos espalhados pelo mundo, podemos encontrar uma variedade de resultados. No entanto, em entrevista à Revista Época, o pesquisador David Roodman, há 11 anos dedicado ao tema do combate à pobreza, conta que em sua análise cuidadosa das melhores pesquisas, encontrou poucas evidências de que o microcrédito consiga esses efeitos na média. Ressalta ainda que recentemente, pesquisadores têm acompanhado grupos que receberam e que não receberam empréstimos e descobriram que, depois de 15 a 18 meses, não havia diferenças entre os dois grupos quanto aos indicadores de pobreza, como gastos da família ou número de crianças frequentando a escola. “[...] Antropólogos têm encontrado histórias de mulheres no sul da Ásia que se sentiram mais valorizadas pela oportunidade de fazer transações financeiras em reuniões semanais de coleta dos pagamentos. Mas também encontraram histórias de mulheres inadimplentes que perderam telhados, panelas e frigideiras, roubados pelas outras famílias fiadoras para pagar os empréstimos. Quando um empréstimo cria novas possibilidades para uma pessoa e quando é uma armadilha que a deixa ainda mais pobre? Se entrar em enrascadas por causa do microcrédito é algo corriqueiro, então deve ser uma preocupação de todos.” (Roodman, 2012) Para este autor, microseguros e micropoupanças são mais eficientes no combate à pobreza,principalmente por seu baixo risco. A ampliação destes serviços financeiros é inclusive uma tendência de IMFs maduras como o Grameen Bank e BancoSol Soares (2014 apud Banerjee et al. 2009) analisa, através de um experimento aleatório, um programa clássico de microcrédito em Hyderabad, Índia, tendo como objeto pequenos empréstimos para grupos de mulheres. Foram analisadas 104 “favelas” de Hyderabad: cerca de 65 famílias em cada uma dessas áreas fizeram parte deste estudo. Os resultados encontrados, apesar de significativos, não foram muito positivos: não foi identificado nenhum impacto sobre as condições de educação, saúde e empoderamento feminino nos 15-18 meses posteriores ao experimento. O microcrédito afeta positivamente o consumo de duráveis e a criação de novos empreendimentos neste mesmo período. As microfinanças poderiam auxiliar no aquecimento de um sistema financeiro nacional. Há a oportunidade de melhorar o acesso de microempreendedores pobres a serviços financeiros que sejam eficientes e sustentáveis. O crédito estimula e dá aporte ao empreendedorismo, porém possui suas limitações devido a não garantia de sucesso e a ausência de acompanhamento do ciclo de vida do negócio. É nesse ponto que se torna imprescindível a dimensão da sustentabilidade de pagamento, pois é possível que o resultado seja contraproducente: falência, inadimplência ou desemprego. Gonzaléz-Vega(2001) reconhece a capacidade do financiamento como motor do empreendedorismo e autoemprego de pobres, bem como suas limitações. No trecho à seguir, o autor ainda faz um claro contraponto à concepção de Yunus (2002) do crédito como direito: “Sem dúvida não se trata de um direito humano [o crédito]. O endividamento não é um direito, é uma responsabilidade. O comprometimento para o pagamento de um empréstimo é uma carga, é a aquisição de um passivo. Muitas pequenas empresas estão dispostas a comprometer-se a pagar seus empréstimos. Caso o acesso a estes empréstimos seja limitado, embora dispostos e com capacidade de pagamento, esta utilização se perde. Por outro lado, quando a oportunidade produtiva não existe, a empresa usualmente não tem capacidade de pagamento e, portanto, não há demanda legítima de crédito e não se deve conceder o empréstimo. Endividamento, nestas condições, é um crime, pois aumenta a carga das responsabilidades financeiras mas não cria uma oportunidade que não existe, ou outorga a capacidade de pagamento que não se tem. Em resumo, o crédito nestas circunstâncias é contraproducente e danoso, porque emprestar sem a devida capacidade de pagamento e sem a intenção da cobrança destrói um programa de crédito e não tem nenhum propósito benéfico. (GONZÁLEZ-VEGA, 2001, p. 29). O autor também ressalva que as microfinanças não são uma panacéia, não são uma boa ferramenta para inúmeros outros propósitos tão nobres e igualmente importantes como o controle de epidemias, a redução do analfabetismo ou a conservação do meio ambiente. Percebe-se portanto que o Microcrédito é um instrumento de acessibilidade, que inovou, tem espaço e valor. Para oferecê-lo, as IMFs e/ou bancos devem ser cautelosos para assegurar rentabilização e sustentabilidade. Já no que diz respeito a erradicação da pobreza, o Microcrédito não é somente ineficiente, como também está deslocado, pois proteção social não faz parte do seu escopo. 2. O ESTADO DE BEM ESTAR SOCIAL 2.1 BREVE CONCEITUAÇÃO E HISTÓRICO O Welfare State ou Estado de Bem Estar Social surge para viabilizar a expansão do capitalismo, corrigindo as falhas de mercado produzidas pelo próprio sistema. Existe a necessidade de integrar a classe trabalhadora ao capitalismo e de garantir condições mínimas de vida para estas pessoas, pela importância de sua força de trabalho. Os primórdios do Estado de Bem Estar Social irromperam na Europa, no final do século XIX, como resultado de transformações experimentadas pela própria sociedade à época, tal como a industrialização e a urbanização, que por sua vez, eram características do capitalismo industrial. Desde esta época, entende-se, assim, que um Estado de Bem- Estar é essencial por questões não apenas de justiça e equidade social, mas também de eficiência econômica, preservação das liberdades essenciais e também da coesão social (BARR, 1993). Assim, é dever deste Estado, promover uma espécie de igualdade de oportunidade aos seus cidadãos. Para isso precisa reduzir a pobreza, garantir condições de vida dignas, promover a integração social e também viabilizar a entrada e permanência das pessoas no mercado de trabalho. A partirdesses preceitos, os países desenvolvem um Sistema de Proteção Social de acordo com suas características culturais, as necessidades de sua sociedade, a estrutura e a conjuntura política, outrossim de acordo com o seu grau de desenvolvimento. Após a Segunda Guerra Mundial a proteção social e a busca pelo pleno emprego eram pontos cruciais nas estratégias de desenvolvimento. No entanto, décadas mais tarde, com o avanço de um framework neo-liberal, as políticas de bem estar não chegaram a se extinguir, mas diminuíram bastante. O Modelo recente trata quase que exclusivamente da pobreza e da pobreza absoluta, criando mecanismos apenas para proteger, e ainda assim de maneira incompleta, esses grupos mais vulneráveis. 2.2 SISTEMA DE PROTEÇÃO SOCIAL RECENTE: A POBREZA EM FOCO As ações de focalizadas no combate direto à pobreza não possuem um longo planejamento e, geralmente, têm caráter transitório e sua continuidade fica à mercê dos governos eleitos. Dessa forma, as políticas definidas parecem sempre difusas e não estruturadas dentro do aparelho do Estado. Esse conjunto de ações, por sua vez, se ramifica em duas grandes tendências: a transferência de renda com condicionantes e o incentivo à atividade empresarial empreendedora como instrumento de inclusão social. Esses dois gêneros de ações de combatem à pobreza de forma imediata e incompleta, além disso ao mesmo tempo se complementam e possuem relação com as outras políticas sociais mas de forma muito residual. Assim, em meados dos anos 90, a proteção social, na periferia, tornou-se sinônimo de combate à pobreza, e não um direito social e universal. Em concomitância, ocorreu o período de expansão do Microcrédito. 2.2 ESTADO DE BEM ESTAR SOCIAL x MICROCRÉDITO O papel estratégico que o conjunto de ações de combate à pobreza possui hoje para manutenção do atual padrão de acumulação via financeirização caracteriza-se pela regulação dos custos da força de trabalho no mercado mundial, por meio da regulação do comportamento econômico, político e civil dos pobres, garantindo baixo risco de sublevação social e uma forma ideologicamente palatável de inserção precária dessas massas na ordem econômico-financeira contemporânea (MAURIEL, 2009, p. 45). Esta atual gestão estratégica da pobreza distorce os conceitos originais de Estado de Bem Estar e supõe o fortalecimento da capacidade dos pobres para lutarem contra a pobreza como sujeitos ativos desse processo, aposta no crescimento individual e na melhoria das condições de acesso à produção, ao microcrédito e, conseqüentemente, à mobilidade social. Com isso, abre-se espaço para o Microcrédito florescer enquanto “política social”. Para os autores da corrente neoliberal, o Estado de Bem Estar Social era um entrave ao crescimento econômico e ao investimento, além de criar desincentivos para o trabalho e gerar uma dependência, por parte dos mais pobres, de benefícios do governo, pontua Soares (2014 apud FRIEDMAN, M.; FRIEDMAN, R.; 1990). O custo das políticas sociais era tido como alto e não garantiam o crescimento econômico. Percebemos portanto que o Microcrédito só avança no sentido de “cura para pobreza” devido ao enfraquecimento do Estado de Bem Estar Social, da distorção da proteção social e da redução da mesma apenas para a questão do fim da pobreza pelo fim da pobreza, sem a reflexão e abordagem complexas que merece. CONCLUSÃO: Nas três última décadas, o Estado tem aberto mão cada vez mais de seu papel de protagonista que lhe foi concedido historicamente. Sua responsabilidade enquanto promotor de bem-estar social está enfraquecido e o governo tem realizado um papel secundário no que diz respeito a ações práticas nesse sentido. Esta característica fica muito evidente quando se pensa aos interesses de que grupo estão submetidas as diretrizes da política social. O microcrédito foi apresentado como a panacéia contra a pobreza porque se encaixa na agenda neoliberal de que o Estado deve deixar de ter participação ativa no desenvolvimento e na proteção social, e que o setor privado pode resolver estas questões. Uma associação totalmente falha, pois a própria existência da proteção social é fruto da ineficiência do mercado; logo, o mercado não pode ficar responsável por nortear a proteção social. O Microcrédito até obtém êxito enquanto facilitador de consumo, supre necessidades básicas do pobre momentaneamente, servindo para consumo de subsistência ou mesmo para o autoemprego, porém ainda assim não moveria as questões de capital social e empoderamento.Este serviço pode ser sustentável financeiramente para as IMFs e bancos, mas não é sustentável social e temporalmente para que a pobreza seja vencida pelos clientes. Bons resultados para a população carente serão obtidos quando o Estado fizer seu trabalho, construindo infraestrutura, investindo em educação e a saúde, garantindo uma renda básica de cidadania. Isso é proteção social, crédito é endividamento. Por fim, em termos práticos, gostaria de mais tempo e espaço para este trabalho ser complementado com uma maior quantidade de dados, que enriqueceriam a análise: renda média dos tomadores de microcrédito, ocupação, com o que eles de fato gastam o montante recebido, etc. Gostaria de ter mais provas empíricas das minhas conclusões. Esta será a missão para futuras pesquisas que eu possa desenvolver neste campo. BIBLIOGRAFIA BARR, Nicholas. The Economics of Welfare State, Oxford, 1993. BUCHMANN, Gabriel; HARRIS, Helen; NERI, Marcelo. Microcrédito: teoria e prática. In: NERI, M. (org.). Microcrédito, o mistério nordestino e o Grameen brasileiro: perfil e performance dos clientes do Crediamigo. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2008. CHIONE, Daniela Corna. David Roodman: “O microcrédito cria pobres endividados”. ÉPOCA, 2012. Disponível em: <http://revistaepoca.globo.com/ideias/noticia/2012/02/david-roodman-o-microcredito- cria-pobres-endividados.html>. Acesso em 17 de Julho de 2016. 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