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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI VICE-REITORIA DE GRADUAÇÃO CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS CURSO DE DIREITO O DANO MORAL NAS RELAÇÕES DE TRABALHO E A REFORMA TRABALHISTA JUSCELINO DAUER . Itajaí, junho de 2018. UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI VICE-REITORIA DE GRADUAÇÃO CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS CURSO DE DIREITO O DANO MORAL NAS RELAÇÕES DE EMPREGO E A REFORMA TRABALHISTA JUSCELINO DAUER Trabalho de Conclusão de Curso de Direito submetido à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do título de bacharel em Direito. Orientador: Professor MSc. Wanderley Godoy Junior Itajaí, junho de 2018. AGRADECIMENTO Agradeço primeiramente a Deus por estar sempre ao meu lado. Agradeço também a minha família por todo o apoio nos momentos bons e principalmente nos difíceis. Ao Prof. MSc. Wanderley Godoy Junior, como orientador, pela sua dedicação e apoio necessário nessa trajetória. Por fim, meus agradecimentos a Universidade do Vale do Itajaí e a todo o seu corpo docente pelo infinito conhecimento. DEDICATÓRIA Dedico este trabalho às minhas filhas Débora, Danny e em especial a Dayse, que não está mais presente entre nós, por sempre me incentivarem e apoiarem para a conclusão deste curso. TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo. Itajaí, junho de 2018. Juscelino Dauer Graduando PÁGINA DE APROVAÇÃO A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando Juscelino Dauer, sob o título O dano moral nas relações de emprego e a reforma trabalhista, foi submetida em 22 de maio de 2018 à banca examinadora composta pelos seguintes professores: Professor Mestre Wanderley Godoy Junior, orientador e Professora Doutora Solange Lucia Heck Kool, avaliadora, sendo a monografia aprovada. Itajaí, junho de 2018. Prof. MSc. Wanderley Godoy Junior Orientador e Presidente da Banca Prof. MSc. José Artur Martins Coordenação da Monografia ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS AASP Associação dos Advogados de São Paulo ADI Ação Direta de Inconstitucionalidade ADPF Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental ANAMATRA Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho Art. Artigo Arts. Artigos CC Código Civil CCB Código Civil Brasileiro CF Constituição Federal CLT Consolidação das Leis do Trabalho CJF Conselho da Justiça Federal DEJT Diário Eletrônico da Justiça do Trabalho EC Emenda Constitucional Inc. Inciso JDC Jornada de Direito Civil MP Mediada Provisória RE Recurso Extraordinário RGPS Regime Geral da Previdência Social STF Superior Tribunal Federal STJ Superior Tribunal de Justiça Sum. Súmula TST Tribunal Superior do Trabalho SUMÁRIO RESUMO ............................................................................................ X INTRODUÇÃO ................................................................................. 11 CAPÍTULO 1 .................................................................................... 14 A RESPONSABILIDADE CIVIL ....................................................... 14 1.1 CONCEITO ..................................................................................................... 14 1.1.1 Responsabilidade subjetiva ..................................................................... 18 1.1.2 Responsabilidade objetiva............................................................................. 22 1.1.3 Responsabilidade contratual ........................................................................ 24 1.1.4 Responsabilidade extracontratual ............................................................... 26 1.2 ATO ILÍCITO ................................................................................................... 27 1.2.1 O ato ilícito como fonte da obrigação de indenizar ............................... 29 1.3 A REPARAÇÃO DO DANO ............................................................................ 30 CAPÍTULO 2 .................................................................................... 34 O DANO MORAL ............................................................................. 34 2.1 CONCEITO ..................................................................................................... 34 2.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA ............................................................................... 36 2.2.1 O Código de Hamurabi ............................................................................. 37 2.2.2 O Código de Manu .................................................................................... 38 2.2.3 Grécia ......................................................................................................... 39 2.2.4 Roma .......................................................................................................... 40 2.3 O DANO MORAL NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO ............... 42 2.4 PATRIMÔNIO MORAL ................................................................................... 45 2.5 CARACTERIZAÇÃO DO DANO MORAL ...................................................... 46 2.6 O DANO MORAL NO DIREITO DO TRABALHO .......................................... 48 2.7 A COMPETENCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO ........................................ 51 CAPÍTULO 3 .................................................................................... 54 O DANO MORAL TRABALHISTA E A SUA REPARAÇÃO ............ 54 3.1 EXTENSÃO DO DANO................................................................................... 54 3.2 FINALIDADE DA INDENIZAÇÃO .................................................................. 57 3.3 A REFORMA TRABALHISTA - LEI 13.467/2017 .......................................... 61 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................. 72 REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS .......................................... 75 RESUMO A dignidade da pessoa humana, mais do que um princípio norteador do sistema jurídico, representa uma característica inerente às pessoas e um valor intrínseco na vida de qualquer ser humano. O Dano Moral se caracteriza quando ocorre prejuízo a um bem integrante da personalidade do homem, ou seja, ao patrimônio pessoal, psicológico, à personalidade, à dignidade da pessoa humana. A Constituição Federal de 1988 prevê a admissibilidade da reparação dos Danos Morais, e o Código Civil de 2002 determina que a dor sofrida pela violação aos direitos da personalidade e dignidade do ser humano, deve ser reparada em toda sua extensão. Por outro lado, a indenização do Dano Moral trabalhista surge como uma função além de reparadora do dano, também preventiva, com a finalidade de que o prejuízo não volte a ocorrer. Uma vez caracterizado o Dano Moral trabalhista, cabe à Justiça do Trabalho a competência para julgar este ilícito. A fixação do quantum indenizatório não eliminará a ocorrência da violação dos direitos da personalidade, mas protegerá os direitos fundamentais determinados na Constituição brasileira. A reforma trabalhista prevista na Lei 13.467/2017, estabelece algumas mudanças significativas em relação ao DanoExtrapatrimonial, destacando o artigo 223-G que fixa as indenizações a quem sofrer algum dano moral decorrente da relação de trabalho, podendo torna-las injustas ou até mesmo excessivas. Palavras-chave: Dano Moral, Relação trabalhista, Indenização, Reforma Trabalhista. INTRODUÇÃO A presente Monografia tem como objeto o estudo do dano moral nas relações de emprego frente à reforma trabalhista prevista na Lei 13.467/2017 que estabelece no artigo 223-G os parâmetros a serem observados pelo julgador ao fixar o valor da indenização a ser paga a quem sofrer dano moral decorrente da relação de trabalho, analisando os efeitos desta alteração nas indenizações que poderá torná-las injustas ou excessivas. A alteração proposta por meio desta reforma trabalhista, no que se refere às indenizações por dano moral na esfera laboral tem sido alvo de discussão entre juristas e operadores do direito, motivo pelo qual poderá ser declarada inconstitucional, restabelecendo a lei atual. O seu objetivo é Analisar a caracterização e o reconhecimento do dano moral nas relações trabalhistas, bem como os critérios de fixação dos valores das condenações. Para a presente monografia foram levantados os seguintes problemas: 1º problema: É possível a existência do dano moral na relação de trabalho? 2º problema: De que forma é feito o arbitramento do valor da indenização quando caracterizado o Dano Moral na Justiça do Trabalho? Com base nos problemas levantados, se apresentam as seguintes hipóteses: 1ª Hipótese: Embora não existisse na CLT, antes da reforma, dispositivo específico versando sobre o dano moral nas relações de trabalho, mas sendo o dano moral previsto no Código Civil Brasileiro e também na Constituição Federal de 1988, já existia a possibilidade da sua aplicação no âmbito da Justiça do Trabalho. 12 2ª Hipótese: O quantum a ser pago a titulo de indenização, fica a critério do magistrado que levará em consideração fatores como a extensão, a gravidade do dano e a capacidade financeira das partes. Visando buscar a confirmação ou não das hipóteses, o trabalho foi dividido em 03 capítulos. O capitulo 1 trata da responsabilidade civil, seu conceito, avaliação, obrigação de indenizar, formas de reparação, além de uma análise do ato ilícito e da obrigação da reparação do dano. No capítulo 2 serão apresentados o conceito de dano moral e a evolução histórica do dano moral, a forma como o dano moral é tratado no ordenamento jurídico brasileiro, tratará também, do dano moral no trabalho, apresentando a definição de patrimônio moral, as formas de caracterização do dano moral na esfera trabalhista e como se dá a competência da justiça do trabalho para analisar e julgar estas demandas. O Capítulo 3 tratará do dano moral trabalhista e a sua reparação, como se dá a sua reparação, analisando a extensão dos danos e a finalidade do pagamento das indenizações, além de analisar os efeitos da aplicação da Lei 13.467/2017 e a discussão acerca do tema e das recentes mudanças. O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre o dano moral nas relações de emprego e a reforma trabalhista. Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase de Investigação1 foi utilizado o Método Indutivo2, na Fase de Tratamento de 1 ―[...] momento no qual o Pesquisador busca e recolhe os dados, sob a moldura do Referente estabelecido [...].‖ PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. 13 ed. Florianópolis: Conceito Editorial, 2015. p. 87. 2 ―[...] pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral [...]‖. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 91. 13 Dados o Método Cartesiano3, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente Monografia é composto na base lógica indutiva. Não será utilizado rol de categorias, tendo em vista que os conceitos operacionais foram abordados no decorrer da pesquisa. Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas do Referente4, do Conceito Operacional5 e da Pesquisa Bibliográfica6. 3 Sobre as quatro regras do Método Cartesiano (evidência, dividir, ordenar e avaliar) veja LEITE, Eduardo de oliveira. A monografia jurídica. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 22-26. 4 ―[...] explicitação prévia do(s) motivo(s), do(s) objetivo(s) e do produto desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para a atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa.‖ PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 58. 5 ―[...] uma definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das ideias que expomos [...]‖. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 39. 6 ―Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais‖. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 215. Capítulo 1 A RESPONSABILIDADE CIVIL 1.1 CONCEITO Antes de entrar no tema principal deste trabalho, é necessário destacar o conceito de Responsabilidade Civil. Diversas são as dificuldades que a doutrina tem enfrentado para conceituar a Responsabilidade Civil. Alguns doutrinadores se baseiam na culpa, enquanto outros atribuem a obrigação imposta pelas normas que obrigam as pessoas a responderem pelas consequências prejudiciais dos seus atos. Segundo a lição de Carlos Alberto Bittar: O lesionamento a elementos integrantes da esfera jurídica alheia acarreta ao agente a necessidade de reparação dos danos provocados. É a responsabilidade civil, ou obrigação de indenizar, que compele o causador a arcar com as consequências advindas da ação violadora, ressarcindo os prejuízos de ordem moral ou patrimonial, decorrente de fato ilícito próprio, ou de outrem a ele relacionado.7 Em seu sentido etimológico e também no sentido jurídico, a Responsabilidade Civil está atrelada a ideia de contraprestação, encargo e obrigação. Entretanto é importante distinguir a obrigação da responsabilidade. A obrigação é sempre um dever jurídico originário; responsabilidade é um dever jurídico sucessivo consequente à violação do primeiro.8 Conforme ensina Silvio de Salvo Venosa: Em princípio, toda atividade que acarreta um prejuízo gera responsabilidade ou dever de indenizar. [...] O termo responsabilidade é utilizado em qualquer situação na qual alguma pessoa deva arcar com as consequências de um ato, fato, ou 7 BITTAR, Carlos Alberto. Curso de direito civil. 1 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1994. p.561. 8 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 9. ed. rev. e ampl. São Paulo: Atlas, 2010. p. 2. 15 negócio danoso. Sob essa noção, toda atividade humana, portanto, pode acarretar o dever de indenizar.9 De acordo com Silvio Rodrigues, a Responsabilidade Civil consiste na obrigação que pode incumbir uma pessoa a reparar o prejuízo causado a outra, por fato próprio, ou por fato de pessoas ou coisas que dela dependem. 10 Nas palavras de Rui Stoco: A noção da responsabilidade pode ser haurida da própria origem da palavra, que vem do latim respondere, responder a alguma coisa, ou seja, a necessidade que existe de responsabilizar alguém pelos seus atos danosos. Essa imposição estabelecida pelo meio social regrado, através dos integrantes da sociedade humana, de impor a todos o dever de responder por seus atos, traduz a própria noção de justiça existente no grupo social estratificado. Revela-se, pois, como algo inarredável da naturezahumana.11 Segundo Maria Helena Diniz, a Responsabilidade Civil pode ser assim conceituada: A responsabilidade civil é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesma praticado, por pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal.12 Na interpretação de Cleyson de Moraes Mello, o conceito de Responsabilidade Civil pode ser assim definido: Responsabilidade civil é uma relação jurídica obrigacional que se constitui através de fatos oriundos ou da própria conduta do agente ou tendo por causa, ainda, coisas ou pessoas sobre as quais o agente tenha guarda ou controle e, que venham a causar a outras pessoas, danos materiais ou morais injustificados 9 VENOSA. Sílvio de Salvo. Direito Civil: responsabilidade civil. 6. Ed. São Paulo: Atlas, 2006. p.1 10 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. 14 ed. São Paulo: Saraiva, 1995. v.4, p.6. 11 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência. 7 ed. São Paulo Editora Revista dos Tribunais, 2007. p.114. 12 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. v7: responsabilidade civil. 19 ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p 40. 16 legalmente, visto serem atos que venham a infringir relações contratuais ou previstas em textos legais.13 A Responsabilidade Civil decorre da existência de uma relação jurídica obrigacional, em que exista de um lado, no polo ativo, o credor com o direito subjetivo de exigir a reparação ou indenização de danos ou prejuízos, materiais ou morais, sofridos injustificadamente e de outro lado, no polo passivo, o autor do dano, com a obrigação de reparar ou indenizar o dano causado.14 Na lição de Carlos Roberto Gonçalves sobre a Responsabilidade Civil: Pode-se afirmar, portanto, que responsabilidade exprime ideia de restauração de equilíbrio, de contraprestação, de reparação de dano. Sendo múltiplas as atividades humanas, inúmeras são também as espécies de responsabilidade, que abrangem todos os ramos do direito e extravasam os limites da vida jurídica, para se ligar a todos os domínios da vida social. Coloca-se, assim, o responsável na situação de quem, por ter violado determinada norma, vê-se exposto às consequências não desejadas decorrentes de sua conduta danosa, podendo ser compelido a restaurar o status quo ante.15 No ensinamento de Jonas Ricardo Correia, o conceito de Responsabilidade Civil pode ser entendido como: [...] a obrigação de alguém indenizar o direito alheio vulnerado ou o prejuízo sofrido por outrem, em virtude da prática de ato ilícito, seja de natureza contratual ou extracontratual, tenha ou não concorrido com culpa lato sensu (que abrange o dolo) e a culpa stricto sensu.16 13 MELLO, Cleyson de Moraes. Responsabilidade civil e sua interpretação pelos tribunais. 2. ed. Campo Grande: Contemplar, 2012. p. 22. 14 MELLO, Cleyson de Moraes. Responsabilidade civil e sua interpretação pelos tribunais, p.21. 15 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. Responsabilidade civil. v4. São Paulo: Saraiva. 2012. p.20. 16 CORREIA, Jonas Ricardo. Dano moral indenizável. 2.ed. Campo Grande: Contemplar. 2013. p.71. 17 O ato ilícito, que representa a violação de um dever jurídico, quase sempre acarreta um dano para outrem, desta forma gerando novo dever jurídico, o de reparar o dano causado.17 Ainda nas palavras de Sergio Cavalieri Filho Há, assim, um dever jurídico originário, chamado por alguns de primário, cuja violação gera um dever jurídico sucessivo, também chamado de secundário, que é o de indenizar o prejuízo. A título de exemplo, lembramos que todos têm o dever de respeitar a integridade física do ser humano. Tem-se, aí, um dever jurídico originário, correspondente a um direito absoluto. Para aquele que descumprir esse dever surgirá um outro dever jurídico: o da reparação do dano. É aqui que entra a noção de responsabilidade civil. Em seu sentido etimológico, responsabilidade exprime a ideia de obrigação, encargo, contraprestação. Em sentido jurídico, o vocábulo não foge dessa ideia. A essência da responsabilidade está ligada à noção de desvio de conduta, ou seja, foi ela engendrada para alcançar as condutas praticadas de forma contrária ao direito e danosas a outrem. Designa o dever que alguém tem de reparar o prejuízo decorrente da violação de um outro dever jurídico. Em apertada síntese, responsabilidade civil é um dever jurídico sucessivo que surge para recompor o dano decorrente da violação de um dever jurídico originário.18 A Responsabilidade Civil poderá ser direta ou indireta. Sendo que em regra, somente haverá a responsabilidade de indenizar a quem causar dano a outrem por conduta própria, desta forma, só respondendo pelo dano aquele que lhe der causa. No entanto, na responsabilidade civil indireta, existe a responsabilidade proveniente de ato de terceiro com o qual o agente tenha vínculo legal de responsabilidade (arts. 932 e 933 do Código Civil), a responsabilidade de fato animal (art. 936, do CC) e também a responsabilidade de coisa inanimada sob sua guarda (art. 937 do CC).19 A Responsabilidade Civil pode ser também dividida em responsabilidade subjetiva e responsabilidade objetiva, sendo a responsabilidade civil subjetiva aquela causada por conduta culposa, que envolve a culpa e o dolo. A culpa caracteriza-se quando o agente causador do dano pratica o ato com 17 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. p. 2. 18 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. p. 2. 19 MELLO, Cleyson de Moraes. Responsabilidade civil e sua interpretação pelos tribunais. p.37. 18 negligencia ou imprudência. A responsabilidade objetiva é aquela onde o elemento culpa é dispensável. Durante algum tempo, a responsabilidade civil subjetiva foi suficiente para a resolução de todos os casos, mas com a evolução da indústria e o consequente aumento do número de acidentes de trabalho, surgiu a necessidade de uma maior proteção às vítimas, nas palavras de Rui Stoco: A necessidade de maior proteção a vitima fez nascer a culpa presumida, de sorte a inverter o ônus da prova e solucionar a grande dificuldade daquele que sofreu um dano demonstrar a culpa do responsável pela ação ou omissão. O próximo passo foi desconsiderar a culpa como elemento indispensável, nos casos expressos em lei, surgindo a responsabilidade objetiva, quando então não se indaga se o ato é culpável.20 Nesse contexto surge a denominada responsabilidade civil objetiva, que prescinde da culpa. 1.1.1 Responsabilidade Subjetiva A Responsabilidade Subjetiva ou clássica é aquela que gera o dever de indenizar pelo agente causador do dano. No ensinamento de Rogério Marrone de Castro Sampaio: [...] Tem-se como elemento essencial a gerar o dever de indenizar o fator culpa entendido em sentido amplo (dolo ou culpa em sentido estrito). Ausente tal elemento, não há que se falar em responsabilidade civil. Assim, para que se reconheça o a obrigação de indenizar, não basta apenas que o dano advenha de um comportamento humano, pois é preciso um comportamento humano qualificado pelo elemento subjetivo culpa, ou seja, é necessário que o autor da conduta a tenha praticado com a intenção deliberada de causar um prejuízo (dolo), ou, ao menos, que esse comportamento reflita a violação de um dever de cuidado (culpa em sentido estrito).21 20 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência. 7 ed. São Paulo Editora Revista dos Tribunais, 2007. p.157. 21 SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil. 3. ed. São Paulo: Atlas. 2003. p.26. 19 A responsabilidadeCivil Subjetiva é aquela que pressupõe a existência de culpa. Logo, não havendo culpa, não há falar-se em responsabilidade. A culpa é o pressuposto da responsabilidade civil subjetiva,22 Nas palavras de Cleyson de Moraes Mello: A responsabilidade civil subjetiva poderá ocorrer por violação à norma contratual válida (responsabilidade subjetiva contratual) ou em virtude de violação a um dever genérico de conduta (responsabilidade subjetiva extracontratual). O artigo 927, caput, do nosso Código Civil afirma que ―aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repara-lo‖. Aqui, se revela a responsabilidade subjetiva extracontratual, a partir da violação do dever genérico de conduta.23 A Responsabilidade Civil que, para se configurar depende de culpa, é aquela denominada de responsabilidade civil por culpa ou Responsabilidade Subjetiva. De acordo com o entendimento de Pablo Stolze Gagliano, a Responsabilidade Civil Subjetiva pode ser assim descrita: A responsabilidade civil subjetiva é a decorrente de dano causado em função de ato doloso ou culposo. Esta culpa, por ter natureza civil, se caracterizará quando o agente causador do dano atuar com negligência ou imprudência [...] [...] (―Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito‖). Do referido dispositivo normativo supratranscrito, verificamos que a obrigação de indenizar (reparar o dano) é a consequência juridicamente lógica do ato ilícito [...] [...] A noção básica da responsabilidade civil, dentro da doutrina subjetiva, é o princípio segundo o qual cada um responde pela própria culpa — unuscuique sua culpa nocet. Por se caracterizar em fato constitutivo do direito à pretensão reparatória, caberá ao autor, sempre, o ônus da prova de tal culpa do réu.24 22 MELLO, Cleyson de Moraes. Responsabilidade civil e sua interpretação pelos tribunais. p.34. 23 MELLO, Cleyson de Moraes. Responsabilidade civil e sua interpretação pelos tribunais, p.35. 24 GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA Filho, Rodolfo. Novo curso de direito civil, volume III: responsabilidade civil. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2014. p.39. 20 No nosso ordenamento jurídico, a Responsabilidade Subjetiva é a regra, tendo como pressuposto para a configuração do dever de indenizar, a culpa lato sensu. Os pressupostos para a configuração da Responsabilidade Subjetiva são a conduta, a culpa, o nexo de causalidade e o dano.25 Nesse sentido, Garcia relaciona os pressupostos para a configuração da Responsabilidade Subjetiva: a) Conduta Humana: ato praticado por vontade humana, decorrente de ação (conduta positiva) ou omissão (conduta negativa). Na hipótese de omissão é indispensável que haja por parte do agente o dever jurídico de agir e ele se abstenha. [...] b) Culpa lato sensu: abrange o dolo e a culpa em sentido estrito. Dolo é a intenção de produzir o resultado. Na culpa em sentido estrito temos uma conduta voluntária com resultado indesejado. [...] c) Nexo de causalidade: é liame virtual e necessário que liga a conduta ao dano. d) Dano: é o prejuízo efetivamente sofrido.26 Ainda nesse sentido, ensina Elpídio Donizetti quando afirma que no direito brasileiro, a hipótese geral de Responsabilidade Subjetiva é a da responsabilidade delitual, ou seja, da responsabilidade decorrente de ato ilícito.27 A ideia de culpa, na teoria clássica da Responsabilidade Civil Subjetiva fundamenta a obrigação da reparação do dano por aquele o causou agindo intencionalmente (com dolo) ou com negligência, imprudência e imperícia (culpa).28 No ensinamento de Flori Antônio Tasca, sobre a Responsabilidade Civil Subjetiva: 25 GARCIA, Wander. Manual completo de direito civil/ Wander Garcia, Gabriela R. Pinheiro. 1.ed. Indaiatuba, SP: Foco Jurídico, 2014. p.494. 26 GARCIA, Wander. Manual completo de direito civil/ Wander Garcia, Gabriela R. Pinheiro. p. 494. 27 DONIZETTI, Elpídio. Curso didático de direito civil / Elpídio Donizetti; Felipe Quintella. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2014. p.15. 28 TASCA, Flori Antônio. Responsabilidade civil: pessoa jurídica e dano moral, 2. ed. Curitiba: Flamma, 2005. p. 116. 21 A conduta do agente deve ser qualificada como antijurídica pela intenção de lesar a outrem ou pela falta de atenção ou cuidados elementares, além do agir imprevidente causador de dano a outrem. A teoria clássica da responsabilidade civil subjetiva, também chamada aquiliana, tem seu fundamento na culpa do agente, impondo a vitima do dano provar o elemento subjetivo do ato ou omissão, o que nem sempre é fácil.29 Na teoria da culpa ou teoria subjetiva, a culpa é um elemento que fundamenta a responsabilidade civil, pois não havendo culpa, em consequência não haverá responsabilidade.30 Diz-se, pois, ser ―subjetiva‖ a responsabilidade quando se esteia na ideia de culpa. A prova da culpa do agente passa a ser pressuposto necessário do dano indenizável. Nessa concepção, a responsabilidade do causador do dano somente se configura se agiu com dolo ou culpa.31 A Responsabilidade Civil Subjetiva pode ser entendida no ensinamento de Sergio Cavalieri Filho: A ideia de culpa está visceralmente ligada à responsabilidade, por isso que, de regra, ninguém pode merecer censura ou juízo de reprovação sem que tenha faltado com o dever de cautela em seu agir. Daí ser a culpa, de acordo com a teoria clássica, o principal pressuposto da responsabilidade civil subjetiva. O Código Civil de 2002, em seu art. 186 manteve a culpa como fundamento da responsabilidade subjetiva. A palavra culpa está sendo aqui empregada em sentido amplo, lato sensu, para indicar não só a culpa stricto sensu, como também o dolo. Por essa concepção clássica, todavia, a vítima só obterá a reparação do dano se provar a culpa do agente, o que nem sempre é possível na sociedade moderna. 32 A responsabilidade daquele que causou o dano, somente existe se o mesmo agiu culposa ou dolosamente, de modo que a prova da sua culpa é indispensável para que então surja o dever de indenizar, sendo neste caso, a Responsabilidade Subjetiva, pois depende da conduta do agente.33 29 TASCA, Flori Antônio. Responsabilidade civil: pessoa jurídica e dano moral. p. 116. 30 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. Responsabilidade civil. p.46. 31 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. Responsabilidade civil. p.46. 32 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. p.18. 33 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: responsabilidade civil. p.11. 22 1.1.2 Responsabilidade Objetiva Na Responsabilidade Objetiva, existindo a relação de causalidade entre o dano experimentado pela vítima e o ato do agente, mesmo não sendo este culposo gera o dever de indenizar. Nas palavras de Sílvio Rodrigues: A teoria do risco é a da responsabilidade objetiva. Segundo essa teoria, aquele que, através da sua atividade, cria um risco de dano para terceiros deve ser obrigado a repara-lo, ainda que sua atividade e o seu comportamento sejam isentos de culpa. Examina-se a situação, e, se for verificada, objetivamente, a relação de causa e efeito entre o comportamento do agente e o dano experimentado pela vítima, esta tem direito de ser indenizada por aquele.34 De acordo com Carlos Roberto Gonçalves, sobre a Responsabilidade Objetiva: A lei impõe, entretanto, a certas pessoas, em determinadas situações, a reparação de um dano independentemente de culpa. Quando isto acontece, diz-se que a responsabilidade é legal ou ―objetiva‖, porque prescinde da culpa e se satisfaz apenas com o dano e o nexo de causalidade. Esta teoria, dita objetiva, ou do risco, tem como postulado quetodo dano é indenizável, e deve ser reparado por quem a ele se liga por um nexo de causalidade, independentemente de culpa.35 Conforme as lições de Sílvio de Salvo Venosa, na Responsabilidade Objetiva, a teoria do risco é baseada no exercício de uma atividade, pois quem exerce determinada atividade, dela tira proveito direto ou indireto da mesma forma responde pelos danos causados pela mesma, independente de culpa sua ou de seus prepostos. 36 Venosa ainda ensina que: No direito mais recente, a teoria da responsabilidade objetiva é justificada tanto sob o prisma do risco como sob o dano. Não se indenizará unicamente porque há um risco, mas porque há um 34 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: responsabilidade civil. p.11. 35 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. Responsabilidade civil. p.47. 36 VENOSA. Sílvio de Salvo. Direito civil: responsabilidade civil. p.13 23 dano e, neste último aspecto, em muitas ocasiões dispensa-se o exame do risco.37 Ainda em relação à Responsabilidade Civil Objetiva, Cleyson de Moraes Mello esclarece que: Na responsabilidade civil objetiva, o causador do dano se exime do dever jurídico de indenizar se ficar provado: caso fortuito, força maior, fato exclusivo da vítima ou de terceiro. O fundamento é, pois, a teoria do risco. A teoria do risco pode ser agrupada nas seguintes subespécies: teoria do risco-proveito; teoria do risco profissional; teoria do risco excepcional; teoria do risco criado e teoria do risco integral.38 A Responsabilidade Civil Objetiva é uma exceção no ordenamento jurídico brasileiro, visto que entre os pressupostos para a configuração do dever de indenizar não está incluída a culpa em sentido amplo, sendo necessários apenas a conduta, o nexo de causalidade e o dano.39 Na Responsabilidade Objetiva, também chamada de responsabilidade sem culpa, a simples ação ou omissão do agente e estando presente o nexo de causalidade que causou o dano, gera o dever de indenizar, não necessitando a vítima provar a culpa do agente.40 Ainda nas palavras de Flori Antônio Tasca, sobre a Responsabilidade Civil Objetiva: Na responsabilidade civil objetiva a atitude culposa do causador do dano é de menor relevância, bastando existir relação de causalidade entre o dano sofrido pela vítima e o ato (positivo ou negativo) do agente para nascer o dever de reparar, tenha existido ou não a culpa. A teoria objetiva é fundamentada na ideia de risco em que aquele que, no exercício de alguma atividade, crie um risco de dano para outrem fica obrigado a reparar os danos efetivamente causados, ainda que inexista a culpa.41 37 VENOSA. Sílvio de Salvo. Direito civil: responsabilidade civil. p.13 38 MELLO, Cleyson de Moraes. Responsabilidade civil e sua interpretação pelos tribunais, p.35. 39 GARCIA, Wander. Manual completo de direito civil/ Wander Garcia, Gabriela R. Pinheiro. p.495. 40 TASCA, Flori Antônio. Responsabilidade civil: pessoa jurídica e dano moral, p. 116. 41 TASCA, Flori Antônio. Responsabilidade civil: pessoa jurídica e dano moral, p. 116. 24 Segundo Pablo Stolze Gagliano, hipóteses há em que não é necessário sequer ser caracterizada a culpa. Nesses casos, estaremos diante do que se convencionou chamar de ―responsabilidade civil objetiva‖ 42. Pablo Stolze Gagliano afirma ainda que: Segundo tal espécie de responsabilidade, o dolo ou culpa na conduta do agente causador do dano é irrelevante juridicamente, haja vista que somente será necessária a existência do elo de causalidade entre o dano e a conduta do agente responsável para que surja o dever de indenizar. As teorias objetivistas da responsabilidade civil procuram encará- la como mera questão de reparação de danos, fundada diretamente no risco da atividade exercida pelo agente. De acordo com a lição de Sergio Cavalieri Filho, na Responsabilidade Civil Objetiva, a culpa é irrelevante: Na responsabilidade objetiva teremos uma atividade ilícita, o dano e o nexo causal. Só não será necessário o elemento culpa, razão pela qual se fala em responsabilidade independentemente de culpa. Esta pode ou não existir, mas será sempre irrelevante para a configuração do dever de indenizar. Indispensável será a relação de causalidade porque, mesmo em sede de responsabilidade objetiva, não se pode responsabilizar a quem não tenha dado causa ao evento. 43 Na Responsabilidade Civil Objetiva, o elemento culpa não é preponderante, pois o parágrafo único do artigo 927 determina que haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.44 1.1.3 Responsabilidade Contratual Na Responsabilidade Contratual, segundo os ensinamentos de Rogério Marrone de Castro Sampaio, o dever de indenizar os prejuízos 42 GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA Filho, Rodolfo. Novo curso de direito civil, volume III: responsabilidade civil. p.40. 43 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. p.150. 44 MELLO, Cleyson de Moraes. Responsabilidade civil e sua interpretação pelos tribunais, p.35. 25 decorre do descumprimento de uma obrigação contratualmente prevista, tanto assim que estabelece o artigo 389 do Código Civil que: ―Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado‖.45 [...] O não cumprimento, de forma culposa, da obrigação por um dos contratantes dá ensejo, se assim desejar o outro, à resolução do contrato por inexecução voluntária da obrigação, ou a exigir do faltoso a realização, ainda que tardia ou de forma correta, da prestação avençada. Surge, como um dos efeitos principais desses fatos, a obrigação do contratante inadimplente de reparar os prejuízos diretamente causados ao outro, prejuízos estes que podem, inclusive, ser prefixados no momento do aperfeiçoamento do contrato, quando estabelecida a cláusula penal. Tem-se aqui a responsabilidade contratual.46 A Responsabilidade Contratual trata da reparação dos danos causados pelo descumprimento de um contrato, Maria Helena Diniz em seu ensinamento esclarece que: Sendo o principio da obrigatoriedade da convenção um dos princípios fundamentais do direito contratual, as estipulações feitas no contrato deverão ser fielmente cumpridas, sob pena de execução patrimonial contra o inadimplente. O ato negocial, por ser uma norma jurídica, constituindo lei entre as partes, é intangível, a menos que ambas as partes o rescindam voluntariamente ou haja a escusa por caso fortuito ou força maior (CC, art. 393, parágrafo único) [...] As obrigações devem ser, portando cumpridas; o devedor está obrigado a efetuar a prestação devida de modo completo, no tempo e lugar determinados no negócio jurídico, assistindo ao credor o direito de exigir o seu cumprimento na forma convencionada. O adimplemento da obrigação é a regra e o inadimplemento, a exceção [...].47 Conforme a definição de Sergio Cavalieri Filho, pode-se entender da seguinte forma, Responsabilidade Civil Contratual: Haverá responsabilidade contratual quando o dever jurídico violado (inadimplemento ou ilícito contratual) estiver previsto no contrato. A norma convencional já define o comportamento dos 45 SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil. p.24. 46 SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil. p.24. 47 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. v7: responsabilidade civil. p.245. 26 contratantes e o dever específico a cuja observância ficam adstritos. E como o contratoestabelece um vínculo jurídico entre os contratantes, costuma-se também dizer que na responsabilidade contratual já há uma relação jurídica preexistente entre as partes (relação jurídica, e não dever jurídico, preexistente, porque este sempre se faz presente em qualquer espécie de responsabilidade). Haverá, por seu turno, responsabilidade extracontratual se o dever jurídico violado não estiver previsto no contrato, mas sim na lei ou na ordem jurídica.48 Na Responsabilidade Contratual, havendo violação de norma contratual válida, fica evidenciada a responsabilidade civil de forma subjetiva contratual.49 1.1.4 Responsabilidade Extracontratual Na Responsabilidade Extracontratual, o dever de indenizar não se vincula a existência prévia de um contrato e ao descumprimento de alguma de suas obrigações, sendo a sua ocorrência devida à prática de um ato ilícito ou uma conduta humana violadora de direitos conforme Rogério Marrone de Castro Sampaio, que esclarece ainda: Em outras palavras, a obrigação de reparar o dano não está relacionada à existência anterior de um contrato e ao descumprimento culposo de uma obrigação por ele gerada. Origina-se, outrossim, de um comportamento (genericamente tratado pelo ordenamento jurídico no referido art. 186 do CC) socialmente reprovável.50 A Responsabilidade Civil Extracontratual decorre de uma lesão ao direito de alguém, sem que haja qualquer liame obrigacional anterior entre o agente causador do prejuízo e a vítima. Maria Helena Diniz ensina que: A responsabilidade extracontratual, delitual ou aquiliana decorre de violação legal, ou seja, de lesão a um direito subjetivo ou da prática de um ato ilícito, sem que haja nenhum vínculo contratual entre lesado e lesante. Resulta, portanto, da inobservância da norma jurídica ou de infração ao dever jurídico geral de abstenção 48 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. p.17. 49 MELLO, Cleyson de Moraes. Responsabilidade civil e sua interpretação pelos tribunais, p.34. 50 SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil. p. 24. 27 atinente aos direitos reais ou de personalidade, ou melhor, de violação à obrigação negativa de não prejudicar ninguém. (DINIZ, 2003, p.521) 51 No ensinamento de Sergio Cavalieri Filho, a Responsabilidade Extracontratual é aquela em que não existe nenhuma ligação anterior entre o agente causador do dano e o lesado: Na responsabilidade extracontratual inexiste qualquer liame jurídico anterior entre o agente causador do dano e a vitima (eles são estranhos) até que o ato ilícito ponha em ação os princípios geradores da obrigação de indenizar. É o ato ilícito por si só que gera a relação jurídica obrigacional, criando para o causador do dano o dever de indenizar a vitima. Quando uma pessoa se constitui em responsabilidade contratual, preexiste um laço de direito entre ela e a vitima do prejuízo, isto é, um contrato. É precisamente por seu ulterior procedimento, concretizado em violação do contrato, que a parte incorre na responsabilidade. O mesmo já não acontece na responsabilidade extracontratual. Aqui, não existe relação de direito preexistente ligando o autor do dano ao prejudicado. É o fato danoso que estabelece esse laço.52 Na Responsabilidade Extracontratual, havendo violação a um dever genérico de conduta, fica evidenciada a responsabilidade civil de forma subjetiva extracontratual.53 . 1.2 ATO ILÍCITO O conceito de Ato Ilícito é de grande importância para a responsabilidade civil, pois dele nasce a obrigação de reparar o dano. O ato ilícito produz efeitos jurídicos não pretendidos pelo agente, tendo como consequência o dever de reparar. Sobre o conceito de Ato Ilícito, nas palavras Maria Helena Diniz: O ato ilícito (CC, art. 186) é praticado em desacordo com a ordem jurídica, violando direito subjetivo individual. Causa dano a outrem, 51 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. v7: responsabilidade civil. P 521. 52 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. P. 307. 53 MELLO, Cleyson de Moraes. Responsabilidade civil e sua interpretação pelos tribunais, p. 35. 28 criando o dever de reparar tal prejuízo (CC, arts. 927 e 944) seja ele moral ou patrimonial (Súmula 37 do STJ). Logo, produz efeito jurídico, só que este não é desejado pelo agente, mas imposto pela lei.54 O Ato Ilícito é a conduta contrária ao ordenamento jurídico, sendo seus elementos a antijuridicidade e a imputabilidade. Segundo Silvio de Salvo Venosa, o Ato Ilícito traduz-se em um comportamento voluntário que transgride um dever.55 Nas palavras de Luís Guilherme Loureiro: Não obstante, quando a pessoa faz alguma coisa vedada pela lei, ou se abstém quando a norma legal exige uma conduta ativa, há violação do direito e, consequentemente, a prática de um ato ilícito. Logo, o ato ilícito pode ser conceituado como a conduta ativa ou omissiva que viola uma norma jurídica e causa prejuízo a outrem. Em outras palavras, é o ato contrário à ordem jurídica e que viola direito subjetivo individual. Cumpre ressaltar que também o exercício de um direito subjetivo pode caracterizar ato ilícito, quando exceder manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes (art. 187, CC).56 Precisa é a lição de Humberto Theodoro Junior sobre o duplo aspecto do Ato Ilícito: O direito se constitui como um projeto de convivência, dentro de uma comunidade civilizada (o Estado), no qual se estabelecem os padrões de comportamento necessários. A ilicitude ocorre quando in concreto a pessoa se comporta fora desses padrões. Em sentido lato, sempre que alguém se afasta do programa de comportamento idealizado pelo direito positivo, seus atos voluntários correspondem, genericamente, a atos ilícitos (fatos do homem atritantes com a lei). Há, porém, uma ideia mais restrita de ato ilícito, que se prende de um lado ao comportamento injurídico do agente, e de outro ao resultado danoso que dessa atitude decorre para outrem. Fala-se, então, de ato ilícito em sentido estrito, ou simplesmente ato ilícito, como se faz no art. 186 do atual Código Civil. Nesse aspecto, a ilicitude não se contentaria com a ilegalidade do comportamento humano, mas se localizaria, sobretudo, no dano injusto a que o agente fez a vitima se submeter.57 54 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 1.Teoria Geral do Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 2014. P. 606. 55 VENOSA, Silvio de Salvo, Direito Civil: responsabilidade civil, p. 20. 56 LOUREIRO, Luís Guilherme. Curso completo de direito civil. São Paulo: Método, 2010, p. 247. 57 THEODORO JUNIOR, Humberto. Comentários ao novo Código Civil. v. m, t. lI. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p.18. 29 Maria Helena Diniz ensina que o Ato Ilícito, constitui uma ação (comissão ou omissão), imputável ao agente, danosa para o lesado e contrária à ordem jurídica.58 1.2.1 Ato ilícito como fonte da obrigação de indenizar O Código Civil, em seu art. 186, ao se referir sobre o Ato Ilícito, afirma que este ocorre quando alguém por ação ou omissão voluntária (dolo), negligencia ou imprudência (culpa), viola direito ou causa dano, ainda que exclusivamente moral, a outrem, em face do que será responsabilizado pela reparação dos prejuízos, de acordo com Maria Helena Diniz, que ensina: No nosso ordenamento jurídico vigora a regra geral de que o dever ressarcitório pela pratica de atos ilícitos decorre da culpa, ou seja, da reprovabilidade ou censurabilidade da conduta do agente. O comportamento do agente será reprovado ou censurado quando, ante circunstâncias concretas do caso, se entende que ele poderia ou deveria ter agido de modo diferente. Portanto, o ato ilícito qualifica-sepela culpa. Não havendo culpa, não haverá, em regra, qualquer responsabilidade.59 De acordo com o ensinamento de Sergio Cavalieri Filho, o Ato Ilícito pode ser assim definido: Em sentido amplo, o ato ilícito indica apenas a ilicitude do ato, a conduta humana antijurídica, contrária ao Direito, sem qualquer referência ao elemento subjetivo ou psicológico. Tal como o ato lícito, é também uma manifestação de vontade, uma conduta humana voluntária, só que contrária à ordem jurídica. O ato ilícito, portanto, é sempre um comportamento voluntário que infringe um dever jurídico, e não que simplesmente prometa ou ameace infringi-lo, de tal sorte que, desde o momento em que um ato ilícito foi praticado, está-se diante de um processo executivo, e não diante de uma simples manifestação de vontade. Nem por isso, entretanto, o ato ilícito dispensa uma manifestação de vontade. Antes, pelo contrário, por ser um ato de conduta, um comportamento humano, é preciso que ele seja voluntário. Em 58 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. v7: responsabilidade civil. p. 24. 59 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. v7: responsabilidade civil. p. 44. 30 conclusão, ato ilícito é o conjunto de pressupostos da responsabilidade.60 Na Responsabilidade Civil, o autor de um Ato Ilícito tem a obrigação de indenizar a vitima, pelos prejuízos causados a ela. Conforme nos ensina Rogério Marrone de Castro Sampaio: Atos ilícitos são atos humanos cujas consequências não são as almejadas pelos agentes, mas decorrentes de conduta contrária à lei. A conduta humana é praticada em desacordo com a ordem jurídica, violando direito subjetivo individual. E, diante do prejuízo provocado a terceiro, surge a obrigação imposta pela lei consistente na indenização pelo dano causado. Reside aqui a fonte da obrigação de reparar o dano, objeto da responsabilidade civil.61 A consequência do Ato Ilícito, de acordo com o ensinamento de Maria Helena Diniz, esclarece que: A obrigação de indenizar (CC, arts. 186 e 927) é a consequência jurídica do ato ilícito (CC, arts. 944 a 954). O Código Civil, ao prever as hipóteses de responsabilidade civil por atos ilícitos, consagrou a teoria objetiva em vários momentos, como, p. ex., nos arts. 927, parágrafo único, 929, 931, 933, 938, substituindo a culpa pela ideia de risco-proveito. Quando a responsabilidade é determinada sem culpa, o ato não pode ser considerado ilícito. Apesar dos progressos dessa teoria, a necessidade de culpa para haver responsabilidade, preconizada pela teoria subjetiva, continua a ser a regra geral.62 O Ato Ilícito é aquele que, praticado de forma culposa contrariando determinação legal, viola direito individual, ocasionando dano e causando prejuízo a alguém, e criando desta forma, a obrigação de reparação. 1.3 A REPARAÇÃO DO DANO A obrigação de indenizar o dano causado a outrem tem previsão em nosso ordenamento jurídico, conforme o artigo 927 do Código Civil Brasileiro: 60 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 10 ed. São Paulo: Atlas, 2012. p.11 e 13. 61 SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil. p.19. 62 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 1. Teoria geral do direito Civil. p. 611. 31 Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. Na Responsabilidade Civil, estando configurada a obrigação de indenizar decorrente da prática de ato ilícito, e medida a extensão do dano, cabe ao autor, satisfazer este crédito. Sampaio esclarece que: A ideia de liquidar o dano pode ser perfeitamente retratada com o seguinte raciocínio: indenizar a vítima significa reparar integralmente o prejuízo suportado. Assim, independentemente da natureza da responsabilidade civil ou das regras específicas de liquidação fornecidas pelo legislador, deve-se ter sempre como princípio básico a reparação integral do prejuízo sofrido pela vítima.63 Nas palavras de Maria Helena Diniz, indenizar é ressarcir o dano causado, cobrindo todo o prejuízo experimentado pelo lesado, existindo dois modos de reparar o dano patrimonial, a reparação específica e a reparação por equivalente: 1) Reparação especifica ou in natura, consiste em fazer com que as coisas voltem ao estado que teriam se não houvesse ocorrido o evento danoso. É preciso, todavia, deixar bem claro que nem sempre é possível a reconstituição natural e às vezes, mesmo sendo possível, é inconveniente ao interesse do lesado. Para levar a efeito a reparação in natura será mister verificar a natureza do dano que se pretende indenizar. [...] 2) Reparação por equivalente, ou melhor, indenização (sanção indireta), entendida como remédio sub-rogatório, de caráter pecuniário, do interesse atingido. Tal reparação se traduz por pagamento equivalente em dinheiro. Pela indenização, não se repõe na forma específica o bem lesado, mas se compensa o menoscabo patrimonial sofrido em razão do dano, restabelecendo o equilíbrio patrimonial em função do valor que representa o prejuízo.64 Na Responsabilidade Civil, a reparação integral dos danos patrimoniais ou extrapatrimoniais, causados pelo agente, deverão ter como 63 SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil. p.128. 64 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. v7: responsabilidade civil. p.132. 32 consequência a recomposição ou reparação dos direitos ou bens jurídicos lesados, sempre que for possível. 65 Sobre a indenização devida, Flori Antônio Tasca ensina que: Os artigos 944 a 954 do CCB tratam da indenização, a qual é medida ―pela extensão do dano‖. Segundo a codificação, ―Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir equitativamente, a indenização‖ (artigo 944 e parágrafo único). Destaque-se o artigo 945 do CCB, pelo qual ―Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano‖ 66 Na reparação dos danos, aquele que comete Ato Ilícito responderá com os seus bens pela reparação do dano (art. 942 do CC), conforme esclarece Wander Garcia: Daí, diferentemente de como funcionava no passado, não se admite castigos corporais ou trabalhos forçados como forma de reparação. Nessa linha de raciocínio, se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente com seu patrimônio. Na via regressiva, a indenização atribuída a cada agente será fixada proporcionalmente à sua contribuição para o evento danoso.67 O direito de exigir reparação e a obrigação de prestá-la, transmite-se com a herança. Conforme os ensinamentos de Garcia, este direito abrange também os danos morais, mesmo que a ação não tenha sido iniciada pela vítima (Enunciado n. 558 JDC/CJF).68 A indenização e outras considerações nas palavras de Silvio Rodrigues: Indenizar significa ressarcir o prejuízo, ou seja, tornar indene a vítima, cobrindo, cobrindo todo o dano por ela experimentado. Esta é a obrigação imposta ao autor do ilícito, em favor da vitima. O art. 402 do Código Civil determina que as perdas e danos devidos ao credor abrangem não só o dano emergente como 65 TASCA, Flori Antônio. Responsabilidade civil: pessoa jurídica e dano moral, p. 113. 66 TASCA, Flori Antônio. Responsabilidade civil: pessoa jurídica e dano moral, p. 115. 67 GARCIA, Wander. Manual completode direito civil/ Wander Garcia, Gabriela R. Pinheiro. p. 512. 68 GARCIA, Wander. Manual completo de direito civil/ Wander Garcia, Gabriela R. Pinheiro. P. 512. 33 também o lucro cessante; ou seja, tudo aquilo que a vitima efetivamente perdeu, assim como tudo o que ela deixou razoavelmente de ganhar. [...] [...] A ideia de tornar indene a vitima se confunde com o anseio de devolvê-la ao estado em que se encontrava antes do ato ilícito. Todavia, em numerosíssimos casos é impossível obter-se tal resultado, porque do acidente resultou consequência irremovível. Nessa hipótese há que se recorrer a uma situação postiça, representada pelo pagamento de uma indenização em dinheiro. É um remédio nem sempre ideal, mas único de que se pode lançar mão.69 No entendimento de Silvio de Salvo Venosa, a reparação do dano pode ser entendida como: Reparar o dano, qualquer que seja a sua natureza, significa indenizar, tornar indene o prejuízo. Indene é o que se mostra integro, perfeito, incólume. O ideal de justiça é que a reparação de dano seja feita de molde que a situação seja reconstituída. [...] [...] o ideal é indenizar exatamente o valor da perda, o que, todavia, nem sempre é possível. Ao mesmo tempo em que não podemos converter a indenização em instrumento de lucro ou enriquecimento injusto, de nada adianta indenizar de forma insignificante ou incompleta. Uma vez ocorrido o dano. Os transtornos a vitima são inevitáveis, ainda que obtenha indenização in natura ou in pecúnia. A sentença e a liquidação dos danos funcionam, na maioria das vezes, como mero lenitivo para o dano, mormente quando o valor em dinheiro é substitutivo da coisa.70 Configurado o dano, que é a diminuição ou subtração de um bem jurídico, surge a obrigação de reparar, que significa restaurar, desde que possível, seu status quo ante. Não havendo possibilidade de voltar ao estado anterior, caberá então a indenização, que deverá contemplar toda a extensão do dano causado.71 Estando configurado o dano, resta saber se o mesmo causou prejuízo patrimonial ou extrapatrimonial. Sendo extrapatrimonial ou moral, o mesmo também será objeto de reparação, como será visto no capítulo seguinte. 69 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: responsabilidade civil. p.185-186. 70 VENOSA, Silvio de Salvo, Direito civil: responsabilidade civil, p. 272-273. 71 MELLO, Cleyson de Moraes. Responsabilidade civil e sua interpretação pelos tribunais, p. 46. 34 Capítulo 2 O DANO MORAL 2.1 CONCEITO Inúmeros são os conceitos existentes na literatura jurídica sobre Dano Moral, porém, todos os autores são unânimes em afirmar que o Dano Moral é aquele que não é patrimonial, ou seja, que não afeta o patrimônio da pessoa lesada. Conforme o ensinamento de Wander Garcia, o Dano Moral pode ser assim conceituado: Consiste na ofensa ao patrimônio moral de pessoa, tais como o nome, a honra, a credibilidade, a responsabilidade, a liberdade de ação, a autoestima, o respeito próprio e a afetividade. Em suma, ofensa a algum de seus direitos de personalidade. Quanto ao tema, importante esclarecer que o dano moral indenizável não pressupõe necessariamente a verificação de sentimentos humanos desagradáveis como dor e sofrimento (Enunciado n. 445 JDC/CJF) 72 Ensina Yussef Said Cahali, que é possível distinguir os danos entre duas categorias, sendo o dano patrimonial aquele em que há o verdadeiro e próprio prejuízo econômico e o dano extrapatrimonial ou moral, aquele onde existem o sofrimento psíquico ou moral, as angustias, as frustrações e as dores causadas ao ofendido.73 No entendimento de Arnold Wald: Dano é a lesão sofrida por uma pessoa no seu patrimônio ou na sua integridade física, constituindo, pois uma lesão causada a um bem jurídico, que pode ser material ou imaterial. O dano moral é o causado a alguém num dos seus direitos de personalidade, sendo 72 GARCIA, Wander. Manual completo de direito civil/ Wander Garcia, Gabriela R. Pinheiro. p. 522. 73 CAHALI, Yussef Said. Dano moral. 3 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. p. 20. 35 possível à cumulação da responsabilidade pelo dano material e pelo dano moral74 Para o Professor Cleyson de Moraes Mello, as violações causadas por terceiros e que venham a causar dor física ou psíquica, ou constrangimento, angustia ou qualquer alteração psicológica ou psíquica causada a uma pessoa pela conduta comissiva ou omissiva do agente, não deveriam ser denominadas de maneira genérica de danos morais, como costumeiramente é feito pelos estudiosos, pois nem sempre são as mesmas ligadas à moral, como a ofensa à honra ou à imagem, calúnia, difamação e à perda de prestígio. As lesões podem ocorrer sem nenhuma conotação moral, como no caso de um estupro em que haja sequela psíquica que impossibilite a pessoa a ter prazer sexual ou a de uma vítima de um assalto violento que adquire transtorno obsessivo-compulsivo que limite a convivência social, portanto, todas as lesões, de natureza moral ou de ordem psíquica ou psicológica deveriam ser denominadas genericamente de danos extrapatrimoniais. 75 De acordo com a lição de Fabrício Zamprona Matielo, os danos morais podem ser mistos, quando ocorrem juntamente com danos materiais ou então, danos puramente morais, que são aqueles: Verificados através de fatos humanos que conduzem a lesões em interesses alheios, juridicamente protegidos, mas que atingem apenas a reserva psíquica do ofendido. Buscando repassar ao mundo dos fatos a teoria explicitada, tem-se por possível a ocorrência de dano moral quando, exemplificativamente, a vítima é caluniada, difamada ou injuriada, ou tem de qualquer maneira prejudicada a imagem que dele faz a sociedade. Consoante exposto acima assume o dano moral dois sentidos: 1º) Interno – quando o lesado padece em termos subjetivos, ou seja, sente-se diminuído em sua autoestima e valoração, com ou sem repercussão somática; 2º) Externo – a partir do momento em que se deprecia a imagem do ser humano objetivamente, isto é, situação na qual a sociedade repercute negativamente circunstancias que envolvem determinada pessoa, igualmente com reflexos sobre ela. Em assim sendo, sofre dano moral quem é desvalorizado no meio 74 WALD, Arnoldo. Curso de direito civil brasileiro. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1989. p. 407. 75 MELLO, Cleyson de Moraes. Responsabilidade civil e sua interpretação pelos tribunais, p. 57. 36 social em virtude de aleijão, como também é vítima, com nuanças externas, aquele que tem objetivamente depreciada a condição social face a uma calunia, difamação ou injuria. Tanto no sentido interno como no externo existe prejuízo de ordem moral e dor psíquica, apenas com a diferença quanto à origem dos males, se primacialmente interno (subjetivo) ou externo (objetivo).76 Conforme esclarece Carlos Alberto Bittar, os danos morais são aqueles que ofendem os valores da moralidade pessoal ou social, sendo os mesmos reparáveis juridicamente.77 Desta forma, Carlos Alberto Bittar conceitua o dano moral como: Qualificam-se como morais os danos em razão da esfera da subjetividade, ou do plano valorativo da pessoa na sociedade, em que repercute o fato violador, havendo-se como tais aqueles que atingem os aspectos mais íntimos da personalidade humana (o da intimidade e da consideração pessoal, na autoestima), ou da própria valoração da pessoa no meio em que vive e atua (o da reputação ou da consideração social, na estima social) 78 O Dano Moral por ser um assunto da atualidade, permite que qualquer pessoa com um mínimo conhecimento jurídico consiga dizer o que ele seja, mas certamente terá dificuldade de defini-lo, tendo em vista os inúmeros conceitos existentes na literatura jurídica, porém pode-se afirmarcom segurança ser extrapatrimonial o seu caráter e inegável reflexo sobre o patrimônio. Enfim, o Dano Moral pode lesar alguém no que ela é, e não somente no que ela tem.79 2.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA Embora a responsabilidade civil seja uma característica da modernidade, o dever de reparar o dano por quem o cometeu, remonta às mais 76 MATIELO, Fabrício Zamprogna. Dano moral, dano material e reparação. 4. ed. Porto Alegre: Sagra Luzzatto, 1998. p. 15. 77 BITTAR, Carlos Alberto. Reparação civil por danos morais 4 ed. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 44. 78 BITTAR, Carlos Alberto. Reparação civil por danos morais, p. 45. 79 FLORINDO, Valdir. Dano moral e o direito do trabalho. 3. ed. São Paulo: LTr, 1999. p. 41. 37 antigas sociedades humanas, sendo possível identificar em várias culturas, a existência de um sistema codificado de leis, em que já havia a previsão de condutas passíveis da obrigação de reparar o dano causado. 2.2.1 O código de Hamurabi Surgido na Mesopotâmia, o código criado pelo rei da Babilônia, Hamurabi (1792-1750 a, C.), era constituído por um sistema de leis sumérias e acadianas, que estabelecia uma ordem social com base nos direitos individuais e aplicados pela autoridade do Estado e das divindades babilônicas. O código previa uma reparação ao lesado, equivalente ao dano sofrido, tendo como princípio geral que o forte não prejudicaria o fraco, surgindo então o célebre axioma ―olho por olho, dente por dente‖, inserto nos parágrafos 196, 197 e 200 do código. No código de Hamurabi, a reparação do dano tem sua noção claramente definida. As ofensas pessoais eram reparadas com ofensas idênticas, além de ser previsto no código ainda, uma reparação em valor pecuniário.80 O código de Hamurabi previa a reparação da ofensa ou lesão causada de forma proporcional ao dano provocado, sendo em muitos casos a conduta poderia ser penalizada com a morte do ofensor, como forma de compensação ao ofendido. 81 Nas palavras de Cleyson de Moraes Mello, o código de Hamurabi previa em seus parágrafos diversas modalidades de reparação, tanto pecuniárias como penas de morte: § 1 Caso haja acusação infundada de uma pessoa à outra de homicídio, pena de morte ao acusador; § 2 Uma acusação não comprovada de feitiçaria feita a alguém – aqui note-se a verdadeira origem dos ordálios (juízos de Deus) não surgidos na Idade Média, como entendem alguns, mas aqui na Babilônia – mergulhar-se-á no rio o acusado; se morrer 80 REIS, Clayton. Dano moral. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998. p. 10. 81 MELLO, Cleyson de Moraes. Responsabilidade civil e sua interpretação pelos tribunais, p. 26. 38 afogado o acusador tomará sua casa, se sair ileso o acusado será morto e sua casa irá para o acusado; § 5 Caso houvesse um julgamento de um juiz e, após tomar uma decisão, fazendo exarar um documento e depois alterou este julgamento o juiz pagaria 12 vezes a quantia reclamada nesse processo e não mais poderia ser juiz (eis aqui a fonte da responsabilidade patrimonial do julgador por evidente conduta de corrupção); § 8 Indenizações por furto de animais (boi, ovelha, asno, porco) ou barco equivalente ao pagamento de multa diferenciada: 30 vezes o valor do objeto se fosse de um templo ou palácio e se fosse um indivíduo de classe média, apenas 10 vezes. Se o ladrão não tivesse como pagar seria morto; § 59 Se um home livre, (awilum) sem o consentimento do proprietário cortou uma arvore no pomar do outro, pagará meia mina de prata.82 O Código de Hamurabi, gravado em uma estrela de basalto negro, se encontra conservado no museu do Louvre em Paris, sendo constituído por leis sumérias e acadianas, que foram revisadas, adaptadas e ampliadas por Hamurabi.83 2.2.2 O código de Manu Na índia, existiu um homem muito respeitado por todas as castas, chamado Manu Vaivasvata, que elaborava textos jurídicos de muita importância, sendo a sua obra chamada de: O Código de Manu ou conhecido também como as leis de Manu. Embora elaborasse textos jurídicos, Manu era muito religioso, sendo-lhe atribuído o título de pai do Hinduísmo, que é a religião da maioria dos indianos. O Código de Manu, diferentemente do Código de Hamurabi, tratava a reparação do dano em pecúnia, não havendo reparação de lesão por 82 MELLO, Cleyson de Moraes. Responsabilidade civil e sua interpretação pelos tribunais, p. 27. 83 REIS, Clayton. Dano moral. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998. p. 9. 39 outra lesão, demonstrando características éticas ao evitar por meio da reparação em pecúnia que o ofensor fosse alvo de vingança.84 Em comparação com Código de Hamurabi, houve uma evolução, motivada pelo fato da reparação ser feita pelo pagamento de uma importância e não na reparação de uma ofensa por outra. Desta forma foi suprimida a violência física evitando a fúria vingativa da vítima. 85 Ensina ainda, o Professor Clayton Reis que o Código de Manu nos trouxe uma conceituação primária de Dano Moral: No livro IX, parágrafos 237 e 239, havia inclusive uma penalidade imposta aos juízes, em virtude de erros judiciários. Estabeleciam os textos que ―o rei na revisão do processo imporá aos ministros ou juízes responsáveis pela condenação injusta do inocente uma pena de mil planas‖ No geral era o rei quem impunha penalidades previstas no Código. É o caso, por exemplo, do parágrafo 224, no qual o rei ficava autorizado a impor pesada multa àquele que desse, em casamento, uma ―donzela com defeitos‖, sem antes haver prevenido o interessado.86 Para o Código de Manu, o compromisso proveniente de um contrato válido, tinha algo de sagrado e deveria ser cumprido. Por quem empenhava a sua palavra. Descumprir a palavra dada ou as clausulas de um contrato, previa para o contratante inadimplente, além do pagamento de indenização em pecúnia, também sujeitava o ofensor à pena de desterro (expatriação, deportação ou exílio).87 2.2.3 Grécia A civilização grega foi sem, dúvidas a mais importante e expressiva na história da humanidade, onde pela primeira vez se falou em 84 FLORINDO, Valdir. Dano moral e o direito do trabalho. p. 26. 85 REIS, Clayton. Dano moral. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998. p. 12. 86 REIS, Clayton. Dano moral. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998. p. 13. 87 SILVA, Américo Luís Martins da. O dano moral e a sua reparação civil. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002. p. 67. 40 democracia e a noção de reparação de dano era pecuniária, tendo o seu sistema jurídico, por meio de seus grandes pensadores, atingido notável destaque influenciando o homem e as civilizações que a sucederam.88 Sobre a importância da Grécia para a história da humanidade, Valdir Floriano ensina: A Grécia assumiu um papel importante na história do homem, tendo seu sistema jurídico atingido pontos elevados, graças aos seus grandes pensadores. Foi, sem dúvida, na Grécia que se ouviu falar, pela primeira vez, em civilização e democracia, elementos importantes, e que certamente influenciaram as civilizações que estavam por vir, sobretudo na antiga Roma.89 As leis, instituídas pelo Estado, davam ao cidadão a necessária proteção jurídica, sendo que a reparação do dano era pecuniária, demonstrando com isso, sua importante parcela na construção da proteção do ser humano.90 2.2.4 Roma Os romanos demonstravam uma grande preocupação com a honra, quando diziam est alterium patrimonium (a honesta fama é outro patrimônio) afirmando ainda que a honra é um patrimônio da boa conduta, na expressão est prerrogativa quaedam ex vitae morunque probitate causata (a honra é uma prerrogativa motivada pela probidade da vida e dos bons costumes).91 Para Clayton Reis, os romanospossuíam a exata noção de reparação do dano, de forma que para cada ato lesivo ao patrimônio ou a honra de alguém implicava em uma consequente reparação pecuniária: 88 REIS, Clayton. Dano moral. p. 16. 89 FLORINDO, Valdir. Dano moral e o direito do trabalho. p. 28. 90 FLORINDO, Valdir. Dano moral e o direito do trabalho. p. 28. 91 FLORINDO, Valdir. Dano moral e o direito do trabalho. p. 29. 41 Os delitos de natureza pública eram considerados mais graves, eis que ofendiam o Estado, sobre o qual se assentava toda a estrutura politico-econômico-social do sistema vigente da época. Daí por que os delitos contra o Estado eram graves e redundavam em repressões extremas.92 Os romanos quando vitimas de injuria, podiam utilizar-se da ação pretoriana chamada injuriararum aestimattória exigindo uma reparação pecuniária, que ficava à critério do juiz, que avaliava todas as circunstâncias para a aplicação de uma pena justa, objetivando a reparação e a proteção dos interesses do ofendido. De acordo com a lição de Valdir Florindo, a prova dessa proteção à vítima é encontrada na Lei das XII Tábuas (Lex duodec tabularum), na tábua VII – De delicits, com seguinte texto: § 1º ―Se um quadrúpede causa qualquer dano, que o seu proprietário indenize o valor desses danos ou abandone o animal ao prejudicado.‖ § 2º ―Se alguém causa um dano premeditadamente que o repare.‖ § 5º ―Se o autor do dano é impúbere, que seja fustigado a critério do protetor e indenize em dobro.‖ § 8º ―Mas, se assim agiu por imprudência, que repare o dano; se não tem recursos para isso, que seja punido menos severamente do que se tivesse intencionalmente.‖ § 9º ―Aquele que causar dano leve indenizará 25 asses.‖ § 12 ―Aquele que arrancar ou quebrar um osso a outrem deve condenado a uma multa de 300 asses, se o ofendido é homem livre; e 150 asses, se o ofendido é um escravo.‖ § 13. ―Se o tutor administra com dolo, que seja destituído como suspeito e com infâmia; se causou algum prejuízo ao tutelado, que seja condenado a pagar o dobro ao fim da gestão.‖ 93 Embora não restem dúvidas, que os romanos usavam a pena pecuniária para a reparação dos danos, existe resquícios da pena de Talião, como a encontrada na Lei das XII Tábuas, através do § 11 da mesma tábua VII: 92 REIS, Clayton. Dano moral. p. 16. 93 FLORINDO, Valdir. Dano moral e o direito do trabalho. p. 30. 42 ―Se alguém fere a outrem, que sofra a pena de Talião, salvo se existiu acordo‖ (Si, membrum rupsit, ni cum eo pacit, talio esto).94 2.3 O DANO MORAL NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO Anteriormente à Constituição de 1988, muito se discutia desde a irreparabilidade até a incondicional indenizabilidade dos danos morais na esfera da responsabilidade civil, por falta de dispositivos sobre este tema nas constituições anteriores. Com a promulgação da Constituição de 1988, recepcionando expressamente a responsabilidade civil por danos morais, encerra- se a discussão sobre o tema. No artigo 1º, inciso III, fica a dignidade da pessoa humana destacada como um dos fundamentos da nação, enfatizando a importância da proteção da personalidade, mais precisamente no artigo 5º, inciso V, que diz ―é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem‖.95 A jurisprudência dominante e praticamente unificada a respeito do Dano Moral, existente até a Constituição de 1988, não admitia a reparação unicamente de danos morais, permitindo apenas a fixação de valores complementares em uma indenização por danos materiais. Esta posição ficava mais evidente nos julgados referentes a menores, quando eram negadas aas indenizações se o menor não contribuísse coma renda da família. 96 Sobre este tema ensina ainda o Professor Cleyson de Moraes Mello: Tal situação sofreu uma modificação radical por força da Súmula 491 do STF: ―É indenizável o acidente que cause a morte de filho menor, ainda que não exerça trabalho remunerado‖. A partir desta 94 FLORINDO, Valdir. Dano moral e o direito do trabalho. p. 30. 95 MATIELO, Fabrício Zamprogna. Dano moral, dano material e reparação. 4. ed. Porto Alegre: Sagra Luzzatto, 1998. p. 66. 96 MELLO, Cleyson de Moraes. Responsabilidade civil e sua interpretação pelos tribunais, p. 59. 43 Súmula, iniciou-se, ainda que timidamente, nos Pretórios nacionais algumas decisões em que se reconheciam indenizações a menores que não concorriam para a economia doméstica e, por extensão, algumas decisões a favor de pessoas maiores APENAS por lesões sem repercussão patrimonial.97 A reparação de danos morais puros caracterizou-se como uma evolução da reparação de danos morais reflexos, tendo em sua fase inicial a jurisprudência dominante da tese da irreparabilidade. Com o aumento das demandas sobre esta matéria e do avanço cientifico do Direito, os tribunais reconheceram a injustiça daquele posicionamento, vindo a adotar a posição da plena reparação dos danos morais.98 Esta evolução passou por uma fase intermediária que foi de suma importância para o reconhecimento do Dano Moral puro, conforme explica Carlos Alberto Bittar: Com efeito, superada a fase inicial, num estágio intermediário foi acolhida a tese da reparabilidade de danos morais reflexos, exigindo-se a existência de consequências patrimoniais negativas, em caso de lesão a componente dos circuitos da moral e da afetividade humana. Sustentou-se, então, nessa hipótese, a patrimonialidade indireta da obrigação legal de indenizar danos de ordem moral. Embora limitativa – e até mesmo negativa do dano moral puro, quando examinada a fundo -, essa posição abriu espaço a absorção da ideia da reparabilidade plena.99 No atual Código Civil, na Parte Geral, são encontrados diversos artigos que tratam dos direitos inerentes à personalidade, como ensina Yussef Said Cahali: O novo Código Civil traz em sua Parte Geral, uma regra genérica de proteção dos chamados ―direitos da personalidade‖ referindo- se que, ―pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei‖ (art.12). Ainda em termos genéricos, dispões que ―o nome da pessoa não pode ser empregado por outrem em publicações ou representações que a exponham ao desprezo público, ainda quando não haja intenção difamatória‖ (art. 17); ―salvo se autorizadas, ou se necessário à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, 97 MELLO, Cleyson de Moraes. Responsabilidade civil e sua interpretação pelos tribunais, p. 59. 98 BITTAR, Carlos Alberto. Reparação civil por danos morais, p. 86. 99 BITTAR, Carlos Alberto. Reparação civil por danos morais, p. 87. 44 a exposição ou utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento, sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais‖ (ar. 20). E finalmente, ―a vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma‖ (art. 21).100 De acordo com os ensinamentos de Wander Garcia e Gabriela R. Pinheiro, o STJ reconhece algumas condutas que geram Dano Moral, sem que seja necessário provar a sua ocorrência, se o ofendido for pessoa jurídica; por exemplo: a inscrição indevida em cadastro de inadimplentes e a publicação não autorizada da imagem de pessoa, com fins econômicos ou comerciais (Súmula 403). Exemplos de casos em cabe Dano Moral: Súmula STJ 388 – A simples devolução indevida de cheque caracteriza dano
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