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MARISTELA SELL CLAUDINO DEUSCHLE O USO DOS GÊNEROS TEXTUAIS NO ENSINO DE LÍNGUA INGLESA ITAJAÍ (SC) 2009 Livros Grátis http://www.livrosgratis.com.br Milhares de livros grátis para download. UNIVALI UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ Pró-Reitoria de Pesquisa, Pós-Graduação, Extensão e Cultura - ProPPEC Curso de Pós-Graduação Stricto Sensu Programa de Mestrado Acadêmico em Educação – PMAE MARISTELA SELL CLAUDINO DEUSCHLE O USO DOS GÊNEROS TEXTUAIS NO ENSINO DE LÍNGUA INGLESA Dissertação apresentada ao Colegiado do PMAE como requisito parcial à obtenção do grau de Mestre em Educação – Área de concentração: Educação – Linha de Pesquisa: Formação Docente e Identidades Profissionais - Grupo de Pesquisa: Estudos Lingüísticos em Língua Estrangeira . Orientador: Prof. Dr. José Marcelo Freitas de Luna. ITAJAÍ (SC) 2009 UNIVALI UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ Pró-Reitoria de Pesquisa, Pós-Graduação, Extensão e Cultura - ProPPEC Curso de Pós-Graduação Stricto Sensu Programa de Mestrado Acadêmico em Educação – PMAE CERTIFICADO DE APROVAÇÃO MARISTELA SELL CLAUDINO DEUSCHLE O USO DOS GÊNEROS TEXTUAIS NO ENSINO DE LÍNGUA INGLESA Dissertação avaliada e aprovada pela Comissão Examinadora e referendada pelo Colegiado do PMAE como requisito parcial à obtenção do grau de Mestre em Educação. Itajaí (SC), fevereiro de 2009 Membros da Comissão: Orientador: ___________________________________ Prof. Dr. José Marcelo Freitas de Luna Membro Externo: ___________________________________ Prof. Dr. Osmar de Souza Membro representante do colegiado ___________________________________ Profª. Dra. Valéria Silva Ferreira Aos meus pais pelo exemplo que são. Daniela e Eduardo, presentes divino. Jackson, companheiro inseparável. AGRADECIMENTOS A Deus, força maior de minha existência; Ao Prof. Dr. José Marcelo Freitas de Luna, meu orientador, por acreditar em mim e por sua paciência e dedicação nesta minha trajetória. A todos os professores que partilharam brilhantemente seus conhecimentos teóricos e práticos para a concretização deste sonho e em especial à professora Dra. Verônica Gesser, por seu carinho, amizade e estímulo para continuar seguindo sempre. Às queridas secretárias Núbia e Mariana, por estarem sempre dispostas a colaborar em todos os momentos. Às queridas colegas do mestrado que se tornaram muito mais que grandes amigas: Andréa, Daniela, Lucimar, Marli, Raquel, Regina e Rosane. À querida professora Patrícia, com sua sempre calorosa e prestimosa colaboração sem a qual esta pesquisa não teria sido realizada. À Sra. Silvana Pohl, Supervisora dos professores de língua inglesa da rede Municipal de Ensino de Joinville, que concedeu a esta pesquisadora todos os recursos e ajuda necessários para a realização desta pesquisa. Para todas as minhas verdadeiras e grandes amigas do coração que sempre estiveram presentes durante esta minha trajetória, ouvindo minhas angústias e confortando-me com suas doces e sábias palavras. 6 “Não é o desafio com que nos deparamos que determina quem somos e o que estamos nos tornando, mas a maneira com que respondemos ao desafio. Somos combatentes, idealistas, plenamente conscientes. Problemas para vencer, liberdade para provar. E enquanto acreditamos no nosso sonho, nada é por acaso.” (Henfil) RESUMO Esta pesquisa tem como tema o uso dos gêneros textuais no ensino da língua inglesa e insere-se na Linha de Pesquisa Formação Docente e Identidades Profissionais, abrigado ao Grupo de Pesquisa Estudos Linguísticos e Ensino de Língua Estrangeira. Desde a publicação dos Parâmetros Curriculares Nacionais (1998) o uso dos gêneros textuais passou a ser enfatizado no ensino de Língua Estrangeira, neste caso o inglês. O objetivo geral é descrever a seqüência didática de aulas baseadas nos gêneros textuais em comparação ao que é preconizado pela literatura e pelo Programa de Ensino do Município de Joinville. Para isso, com base nos pressupostos teóricos do interacionismo sócio-discursivo, utilizaram-se as capacidades de linguagem, partes integrantes das seqüências didáticas, que envolvem as capacidades de ação, discursiva e lingüística discursiva. Estas três capacidades viabilizaram um olhar mais detalhado sobre os tipos de conhecimentos que deveriam ser mobilizados ao se trabalhar com gêneros textuais. Foi realizada ainda uma análise documental, a partir de uma pesquisa qualitativa para averiguar o material didático utilizado por uma professora da rede municipal de Joinville, descrevendo a prática pedagógica observada, com base na metodologia dos gêneros e investigando se realmente é efetivado o uso das seqüências didáticas. Os resultados mais relevantes indicam que as seqüências didáticas fazem parte integrante das aulas analisadas mesmo não sendo constatado, no Programa de Ensino da Secretaria de Educação de Joinville, um suporte teórico aprofundado condizente com a metodologia acerca das seqüências didáticas de forma a orientar e subsidiar o trabalho do professor em sala de aula. Estes resultados levam a inferir sobre a importância de que o trabalho com gêneros textuais possa ser estendido aos professores da rede municipal de ensino de Joinville mediante uma formação continuada acerca deste objeto de pesquisa. Palavras-chave : Gêneros textuais. Interacionismo socio-discursivo. Seqüências didáticas. Capacidade de linguagem. ABSTRACT The theme of this study is the use of textual genres in English language teaching. It is part of the line of research Teaching Training and Professional Identity, which is covered by the Linguistic Studies and Foreign Language Teaching Research Group. Since the publication of the National Curricular Parameters (1998) the use of textual genres began to be emphasized in the teaching of Foreign Languages, in this case, English. The main goal is to describe the didactic sequence of lessons based on the textual genres, in light of the recommendations of the literature, and the Teaching Program of the Joinville Secretary of Education. Based on the theoretical and methodological concepts of socio-discursive interactionism, language capacities were used which are considered integral parts of the didactic sequence that involves action, discursive and linguistic-discursive capacities. These three capacities enabled a detailed look at the types of knowledge that need to be mobilized when working with textual genres. A documentary analysis was carried out, through a qualitative study, in order to investigate the didactic material used by a teacher with the municipal education network of Joinville, describing the pedagogical practice observed, based on the methodology of textual genres and investigating whether didactic sequences are really used. The principal results indicate that didactic sequences are an integral part of the lessons analyzed, even though no deeper theoretical support was observed in the Teaching Program of the Joinville Secretary of Education that is in line with the methodology of didactic sequences in order to guide and support the teacher’s work in the classroom. These results lead to the inference that the importance of work with textual genres can be extended to English teachers in the municipal education network of Joinville, through continuing training on this object of research. Key words : Text genres. Socio-discursive interactionism. Didactic sequences. Language capacity.SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................... 12 2 OBJETIVOS ...................................................................................................... 17 2.1 OBJETIVO GERAL ......................................................................................... 17 2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ........................................................................... 17 3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓR ICA ...................................................................... 18 3.1 LINGUAGEM .................................................................................................. 18 3.2 GÊNEROS TEXTUAIS ................................................................................... 20 3.3 INTERACIONISMO SÓCIO-DISCURSIVO – ISD ........................................... 26 3.4 Seqüência Didática ..................................................................................... 29 3.4.1 Etapas de uma Seqüência Didática ........................................................... 30 3.4.1.1 Apresentação da Situação ...................................................................... 30 3.4.1.2 Produção Inicial ...................................................................................... 31 3.4.1.3 Módulos .................................................................................................. 32 3.4.1.4 Produção Final ........................................................................................ 34 3.4.2 Capacidades de Linguagem ...................................................................... 35 3.5 Modelo Di dático de Gênero ....................................................................... 39 4 METODOLOGIA .............................................................................................. 41 5 APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS DADOS .......................................... 44 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................ 77 REFERÊNCIAS .................................................................................................. 81 LISTA DE ANEXOS E APÊNDICE ANEXO 1: O USO DOS GÊNEROS TEXTUAIS NO ENSINO E NA APRENDIZAGEM DE LÍNGUA INGLESA .................................... 84 ANEXO 2: PROGRAMA DE ENSINO DA SECRETARIA DE EDUCAÇ ÃO DE JOINVILLE ..................................................................................... 85 ANEXO 3: TRABALHO CO M TEXTOS PUBLICITÁRI OS ................................ 86 ANEXO 4: TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO ............ 113 ANEXO 5: AULAS DE OBSERVAÇÃO ............................................................. 116 ANEXO 6: CONTEÚDO PROGRAMÁTICO PARA O ANO DE 2008.. .............. 231 APÊNDICE : QUESTIONÁRIOS ........................................................................ 232 LISTA DE SIGLAS Capacidade de Ação - CA Capacidade Discursiva - CD Capacidade Lingüística Discursiva - CLD Ensino Fundamental - EF Interacionismo Socio-dicursivo - ISD Língua Estrangeira - LE Língua Inglesa - LI Parâmetros Curriculares Nacionais - PCN Seqüência Didática - SD 12 1 INTRODUÇÃO No Brasil, as propostas de ensino sofreram um impacto no final da década de 90, quando foram publicados os PCN. Esse documento propõe uma possibilidade de operacionalização da proposta pedagógica do ensino de línguas, sendo apresentada como uma alternativa metodológica de trabalho relacionada aos gêneros textuais, constituindo-se como uma nova alternativa metodológica de importante contribuição no que tange à pesquisa e à prática pedagógica em linguagem. As orientações contidas nos PCN, embora se refiram ao ensino de LE para o terceiro e quarto ciclos em torno de tipos de texto sugerem que o trabalho com o texto deva partir do “[...] conhecimento sobre a organização de textos orais e escritos [...]” (BRASIL, 1998, p.31). Ao adotar uma perspectiva social da linguagem, os PCN (BRASIL, 1998, p. 55) propõem que: [...] para além da memorização mecânica de regras gramaticais ou das características de determinado movimento literário, o aluno deve ter meios para ampliar e articular conhecimentos e competências que possam ser mobilizadas nas inúmeras situações de uso da língua com que se depara na família, entre amigos, na escola, no mundo do trabalho. Segundo a proposta dos PCN (BRASIL, 1998, p. 27), o trabalho em sala de aula, no que diz respeito ao ensino de LE, neste caso o inglês, pode ser feito com base no uso dos gêneros textuais: O uso da linguagem (tanto verbal quanto visual) é essencialmente determinado pela sua natureza sóciointeracional, pois quem a usa considera aquele a quem se dirige ou quem produziu um enunciado. Todo significado é dialógico, isto é, construído pelos participantes do discurso. Nas escolas joinvilenses, a língua inglesa faz parte das disciplinas obrigatórias da grade curricular e, muitas vezes, o ensino tem como foco a leitura e a interpretação de textos, pois é esta a modalidade que se encontra mais ao alcance dos alunos, já que pode lhes proporcionar a interação num mundo real e verdadeiro dando-lhes condições de conhecer e ter noção de tudo um pouco. O foco do ensino acima mencionado está relacionado com os PCN de E. F. parte referente à LE, baseada numa concepção sócio-interacionista de linguagem, sugere um trabalho mais intensivo de ensino das línguas estrangeiras, por meio da 13 compreensão escrita, haja vista que a leitura é um meio de levar o aluno à obtenção de informações, de conectá-lo ao mundo e também de permitir que ele realize exames formais que requeiram o domínio da LE. Desde então, a utilização de gêneros textuais no ensino de LE tem sido preocupação constante de professores e pesquisadores, o que tem ocasionado diversas discussões, pesquisas e publicações a respeito do tema, contribuindo dessa forma para uma divulgação cada vez maior da necessidade de trabalho com gêneros textuais. Atualmente, pesquisas têm enfatizado a relevância do ensino de L.I. com base em gêneros textuais, como citam Cristóvão (2002) e Meurer (2002). No início da década de 2000, especialmente no Sul do país, surgiu uma variedade de trabalhos na área de Lingüística Aplicada dedicados ao estudo de gêneros textuais. Conforme Motta-Roth (2006, p. 495), “esses trabalhos têm enfatizado o papel da linguagem em constituir as atividades sociais, as relações interpessoais e os papéis sociais em contextos específicos”. A preocupação com o ensino e a aprendizagem de inglês como L.E., com base em gêneros textuais, tem sido cada vez mais evidente também nas linhas temáticas em eventos como ENPULI (Encontro Nacional de Professores Universitários de Língua Inglesa), INPLA (Intercâmbio de Pesquisas em Lingüística Aplicada) e SIGET (Simpósio Internacional de Estudo dos Gêneros Textuais). Considerando os aspectos descritos, o presente trabalho analisa e observa os instrumentos utilizados em aulas de L.I., com base nos gêneros textuais, tendo como referência a literatura sobre o objeto de estudo e o Programa de ensino do Município de Joinville. São apontados como exemplo alguns trabalhos desenvolvidos nessa área: A Linguagem como Gênero e a Aprendizagem de Língua Inglesa (Vera Lúcia Menezes de OLIVEIRA e PAIVA); Elaboração de Seqüências Didáticas para o ensino de Língua Estrangeira – Uma Produção coletiva (CRISTÓVÃO, FERRARINI, PETRECHE, SILVA); O ensino de produção Textual com base em AtividadesSociais e Gêneros Textuais (DÉSIRÉE MOTTA-ROTH). Dificuldades e avanços nas práticas de professores, no tocante à adoção de material didático significativo, fazem surgir como instrumento de ensino- aprendizagem em L.I., os gêneros textuais, no sentido de desenvolver a capacidade 14 de refletir sobre os mecanismos que participam do processo comunicativo, possibilitando a interação crítica e consciente na sociedade. A questão que norteia esta pesquisa é a verificação da utilização dos gêneros textuais como base teórico-metodológica, conforme consta no Programa do Ensino de Língua Inglesa do Município de Joinville (2008), observando se esta vem sendo efetivamente utilizada de acordo com o que preconiza a literatura. A justificativa para este trabalho é a de que, geralmente, os professores de LI não têm suporte didático para trabalhar com gêneros textuais. Desta forma, a exploração e o ensino/aprendizagem dos gêneros textuais ficam restritos aos procedimentos descritos no material escolhido pelo professor e que, na maioria das vezes, aborda os gêneros de maneira superficial e não condizente com a realidade vivida pelos alunos. Além disso, os textos não são trabalhados como um gênero textual específico, sendo que os mesmos, na maioria das vezes, são utilizados apenas como instrumentos para a exploração lingüística e/ou gramatical. Como professora de L.I. em escola pública, surgiu a necessidade de pesquisar novas áreas do conhecimento no que se refere ao ensino e aprendizagem de línguas, especificamente quanto ao uso dos Gêneros Textuais nas aulas de inglês. Pretende-se assim contribuir para que os alunos possam obter um aprendizado mais produtivo e significativo. O interesse neste assunto deriva da dificuldade em se ensinar inglês na escola pública, do baixo rendimento do aluno, da sua falta de interesse pela disciplina, bem como do discurso de desvalorização do profissional da área de inglês. De acordo com documento emitido pelo Ministério da Educação e Secretaria de Educação Básica em 2006, os organizadores, através de pesquisas realizadas com professores, apontam que os mesmos expressam o desejo de que as escolas disponham de condições mais favoráveis para o ensino de idiomas e informam que os alunos não encontram motivação para essa aprendizagem na escola regular. Dessa forma, talvez esses fatores contribuam para que os objetivos do ensino de uma L.E. em escola regular não sejam alcançados. Segundo o documento, o desconhecimento dos alunos sobre a necessidade e a importância do aprendizado de um idioma estrangeiro para a vida destes e, conseqüentemente, o desconhecimento da razão para estudar essa disciplina na escola, pode contribuir para o seu baixo rendimento e sua falta de interesse. 15 Nota-se também que o quadro de desvalorização da L.E., neste caso, especificamente a L.I., em conjunto com a crença de que seu ensino na escola pública é ineficaz, está estreitamente ligado a valores ideológicos (LINHARES, 2004, p.119). O trabalho em sala de aula realizado com o uso de Gêneros Textuais é uma atividade utilizada de forma sutil, por tratar-se de uma metodologia nova e ainda pouco conhecida pela maioria dos professores. Assim sendo, o presente projeto justifica-se pela carência de estudos acerca dos objetivos de ensino na área de L.I. baseados no uso de gêneros textuais nas salas de aula do E das escolas da rede municipal de Joinville, seguindo as propostas do ISD de Bronckart (1999). A escolha deste autor para fundamentar a presente pesquisa deve-se ao fato de o mesmo ser um dos teóricos fundadores da proposta de ensino de línguas com o uso dos Gêneros Textuais. Reconfigurar o contexto sóciointeracional da sala de aula, enquanto contexto de ensino/aprendizagem possibilita ao professor de LI do Ensino Fundamental uma maior autonomia em relação ao processo de elaboração de um material didático mais relevante no que concerne à formação de cidadãos atuantes e críticos. Dessa forma, permite que o aluno desenvolva capacidades de linguagem nas aulas de inglês, bem como contribui para sua integração social e para o desenvolvimento da cidadania. Tal panorama pode ser revertido a partir da postura dos professores de LE, através de pesquisas sobre sua prática educacional, atuando como colaboradores para uma efetiva transformação da sociedade. É importante saber se os professores conhecem as características de diferentes gêneros para que consigam transpô-lo ao ensino. Outro aspecto que também deve ser considerado é a verificação de como ocorre o ensino de uma L.E., neste caso o inglês, sob a perspectiva da utilização de gêneros textuais. É importante ainda averiguar se o material didático utilizado pelo professor está de acordo com o que preconiza a metodologia do uso dos gêneros textuais e constatar se os professores conhecem as características de diferentes gêneros para que consigam transpô-lo ao ensino. A ênfase da pesquisa encontra-se na investigação da utilização das SD na prática pedagógica em sala de aula e na descrição de aulas de uma professora da rede municipal de ensino de Joinville, conforme o que preconiza a metodologia dos gêneros textuais. 16 Como forma de se atingir os objetivos propostos, este trabalho está dividido em quatro capítulos, quais sejam: Fundamentação teórica baseada no que preconizam os principais autores a respeito de gêneros textuais, interacionismo sóciodiscursivo e seqüências didáticas. Metodologia, explicitando as etapas da pesquisa e os procedimentos utilizados para a coleta e análise dos dados. Apresentação, análise e discussão dos dados coletados à luz do que é preconizado por Schneuwly e Dolz (2004) no que concerne aos gêneros textuais e seqüências didáticas e quanto ao interacionismo sóciodiscursivo defendido por Bronckart (1999). Nas considerações finais é apresentando o resultado obtido através dos objetivos propostos, a confirmação ou não da hipótese, assim como as recomendações para investigações mais aprofundadas a respeito desta pesquisa. 17 2 OBJETIVOS 2.1 Objetivo Geral Descrever a seqüência didática de aulas baseadas nos gêneros textuais em comparação ao que é preconizado pela literatura e pelo Programa de Ensino do Município de Joinville. 2.2 Objetivos Específicos a) Averiguar o material didático utilizado pelo professor com o que preconiza a metodologia do uso dos gêneros textuais; b) Descrever uma aula com base na metodologia dos gêneros textuais; c) Investigar se realmente é efetivado o uso das seqüências didáticas na prática pedagógica em sala de aula. 18 3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 3.1 Linguagem Sabe-se que é pela linguagem que os indivíduos inserem-se, interagem e comunicam-se com o mundo, ressaltando dessa forma a sua importância como instrumento de interação e prática social. Saber utilizá-la é uma habilidade cada vez mais necessária na vida das pessoas. As inúmeras atividades socialmente realizadas são mediadas pela linguagem. Nos termos de Martins (1996), com o surgimento das primeiras civilizações, deu-se o impulso do processo de transmissão do conhecimento que ocorria através de depoimentos pessoais, em rodas de amigos, no ambiente familiar ou em reuniões de pequenos grupos que buscavam relatar e divulgar sob o ponto de vista social, econômico, político ou histórico, relatos verídicos e imaginários. Essa transmissão de conhecimento entre os membros daquelas comunidades passava de geração a geração, inicialmente pela tradição oral. O homem, na sua busca constante de proteção e subsistência, foi ao longo do tempo evoluindo. Como forma de melhor se comunicar, desenvolveu a técnica da escrita. A aplicação desta técnica, associada à difusão do saber, ampliouos meios de comunicação, de início através de manuscritos; mais tarde com a invenção de Gutenberg por meios impressos e atualmente com a evolução tecnológica por vias digitais, perpetuando e transmitindo dessa forma o conhecimento humano que anteriormente o espaço e o tempo impediam de realizar-se. A interação do homem com o uso das mais modernas tecnologias propiciou a transformação da civilização. A escrita, associada ao avanço tecnológico, modificou as relações sociais no que se refere ao poder, à cultura, à educação e às diferentes formas de comunicação. A escrita é um meio de eternizar a memória humana e de simbolizar o progresso evolutivo (BURKE, 2002). Com a propagação dos livros e de documentos com as formas mais variadas de temas, teorias e conhecimentos, abriram-se novas percepções e outros entendimentos de mundo para o leitor, desenvolvendo assim aptidões individuais e coletivas antes nem imaginadas. Todas as transformações geradas da tradição oral 19 à técnica da escrita foram gradativamente incluindo outras formas de representações gráficas, ocasionando uma profunda mudança nos meios de comunicação ao permitir que a informação circule e se multiplique de forma acelerada e com grande abrangência (CHARTIER, 1999). De acordo com as idéias de Meurer (2002), destaca-se a importância de se desenvolver habilidades comunicativas para se interagir no mundo de forma crítica. A linguagem existe a serviço da comunicação e possui função de mediação nas práticas sociais. A mediação entre os homens se faz por intermédio da palavra e a capacidade humana de articular significados coletivos e compartilhá-los se dá por intermédio da linguagem. É importante que todo educador conceba a linguagem como um significado amplo e dinâmico que se relaciona plenamente com a participação social. Trabalhar a linguagem em situação de ensino não é ensinar as palavras, mas seus significados culturais e sociais. A linguagem heterogênea proporciona ao leitor o despertar de estratégias de compreensão do verbal e não-verbal e conduz o interlocutor a interpretações múltiplas, constituindo a mensagem como um todo significativo, ressaltando sempre que há um processo individual de leitura e interpretação. No entanto, é contextual e depende do conhecimento prévio do leitor. Para Bakhtin (1992), a linguagem é um fenômeno social, histórico e ideológico. O autor define um enunciado como uma verdadeira unidade de comunicação verbal cujas condições específicas geram um dado gênero que é limitado de acordo com as trocas verbais dos participantes envolvidos no diálogo. Através do estudo dos gêneros definidos por Bakhtin (1992), têm surgido novas teorias acerca da linguagem. A aplicação dessas noções de linguagem e interação na escola pode ser melhor entendida com estudiosos como Schneuwly e Dolz (2004), Koch (2003), Motta-Roth (2006), Marcuschi (2005), Cristóvão (2002), entre outros. Motta-Roth (2006, p. 501), também compartilha com a descrição dada por Bakhtin (1992) ao enfatizar que ensinar linguagem é mais do que ensinar as estruturas da língua: [...] pois se concentra em levar o aluno a desenvolver competências analíticas dos contextos de uso da linguagem de modo a se tornar capaz de analisar discursos. Os contextos, como situações recorrentes na sociedade, são constituídos na linguagem e pela linguagem e se estruturam como partes da cultura. 20 Como formas de manifestação da linguagem, verbais e não-verbais, a fala e a escrita desenvolvem-se a partir de suas próprias realizações e de seu uso contínuo em situações que sejam significativas para os indivíduos envolvidos no processo. As inúmeras atividades socialmente realizadas podem ser mediadas pela linguagem. Essas atividades moldam a linguagem em enunciados relativamente estáveis, garantindo assim, a comunicação verbal. Esses enunciados, conforme Bakhtin (1992) materializam-se na forma de gêneros discursivos ao contemplar tanto a ação social como as estruturas lingüísticas e sua heterogeneidade, estabelecendo uma relação dialética entre estabilidade de regras e criatividade. Segundo Fiorin (2002, p. 10) “As línguas e a linguagem inscrevem-se num espaço real, num tempo histórico e são faladas por seres situados nesse espaço e nesse tempo.” Para este mesmo autor, a linguagem é a condensação de todas as experiências históricas de uma determinada comunidade, ou seja, do homem historicamente situado. A linguagem é multiplicadora do imaginário e a leitura um ato interativo e reflexivo, que resulta do ponto de vista do leitor. Nesta perspectiva, a sala de aula é o espaço das descobertas e do diálogo entre o previsto e o surpreendente e os gêneros textuais são esses movimentos dos modos de significar da linguagem. Ao considerar a linguagem como um fenômeno social e não individual, a sua aquisição passa a ser um processo orientado para as condições e as interações sociais. A participação em uma atividade e o engajamento na interação com o mundo são componentes centrais no desenvolvimento da linguagem, das habilidades de leitura e de produção textual. Assim, os gêneros passam a ser também um construto teórico útil para o ensino de produção textual. 3.2 Gêneros Textuais O objeto de estudo focaliza um dos fenômenos que representa este novo meio de produção do conhecimento: os gêneros textuais, que Bakhtin (1992) concebe como sendo tipos de enunciados criados dentro dos vários campos da atividade humana. 21 As modernas teorias de ensino/aprendizagem1 apontam para a necessidade de transformação das práticas pedagógicas e definem como eixo didático um movimento pelo ensino reflexivo, o que leva a reconhecer que o domínio dos usos sociais das linguagens verbais e não-verbais pode possibilitar a inserção social do sujeito, bem como transformar as condições dessa participação, conferindo-lhe melhor qualidade. Na visão de Marcuschi (2005), supostamente uma comunidade escolar deve propiciar aos seus membros, sejam estes alunos ou professores, a oportunidade de se expressarem por si mesmos. A aprendizagem, por meio desse novo meio de produção do conhecimento – os gêneros textuais - permite a utilização de um novo espaço de comunicação que liberta a criatividade e a inovação do pensamento humano de forma mais democrática e igualitária. Segundo Marcuschi (2005), é preciso propiciar ambientes e momentos aos alunos para que construam sentido, significado e consciência crítica sobre os conteúdos apresentados e compartilhados em sala de aula, além de aproximá-los do mundo real, em situações que provavelmente irão confrontar-se no decorrer de sua formação e no constante aperfeiçoamento que a sociedade pós-moderna os remete. O pós-modernismo, de acordo com Gadotti (1998), [...] é considerado um movimento de indagação sobre o futuro. Entre os elementos reveladores da pós-modernidade, está a invasão da tecnologia eletrônica, da automação e da informação. Nesse sentido, uma educação pós-moderna seria aquela que considera a diversidade cultural. A educação pós-moderna não prioriza o processo de conhecimento e suas finalidades, trabalha mais com o significado do que com o conteúdo. Não nega conteúdos, mas sim trabalha para uma profunda mudança deles na educação, para torná-los essencialmente significativos para o aluno. Em síntese, pode-se dizer que a educação moderna trabalha com o conceito- chave "igualdade", buscando eliminar as diferenças, e a educação pós- moderna trabalha com o conceito-chave "eqüidade", buscando a igualdade sem eliminar as diferenças. Koch (2003) define gênero do discurso ou gênero textual como um tipo específico de texto que pode ser utilizado como meio de articulação entre práticas sociais e objetos de ensino, sendo eminente seu aprendizado na escola, espaço no qual sua compreensão ainda é limitada e muitas vezes empobrecidaatravés de livros didáticos, que os usam apenas como pretexto para o ensino de aspectos gramaticais. 1 Schneuwly & Dolz; Bronckart, Cristóvão, Meurer, Marcuschi entre outros. 22 [...] o meu ponto de partida para a elucidação das questões relativas ao sujeito, ao texto e à produção textual de sentidos tem sido uma concepção sociointeracional de linguagem vista, pois, como lugar de ‘inter-ação’ entre sujeitos sociais, isto é, de sujeitos ativos, empenhados em uma atividade sociocomunicativa (KOCH, 2003, p.19). Ensinar linguagem sob a perspectiva de gêneros textuais não é o mesmo que ensinar tipos de texto, para Marcuschi (2005, p. 10), é trabalhar: [...] com a compreensão de seu funcionamento na sociedade e na sua relação com os indivíduos situados naquela cultura e suas instituições, com as espécies de textos que uma pessoa num determinado papel na sociedade tende a produzir. Em outras palavras, ensinar linguagem é a interação entre os indivíduos falantes de uma língua, do texto histórico, social e culturalmente produzido por estes durante o ato da comunicação, oral ou escrita, com uma determinada intenção que supre as necessidades comunicativas dos mesmos. O atual sistema de ensino praticado na maioria das escolas através de seus livros didáticos apóia-se na classificação: narração, descrição e dissertação. Para Rodrigues (2002, p. 50): [...] as teorias mais recentes, porém, estão mostrando que essa classificação não dá conta das diferentes práticas sociais através da linguagem, ou seja, não contempla os inúmeros gêneros textuais, mas apenas modalidades ou formas de organizar as informações nos mais variados gêneros. Outro autor que compartilha da mesma postura teórica de Rodrigues é Marcuschi (2005, p.19), sendo que para este: [...] Já se tornou trivial a idéia de que os gêneros textuais são fenômenos históricos, profundamente vinculados à vida cultural e social. Fruto de trabalho coletivo, os gêneros textuais contribuem para ordenar e estabilizar as atividades comunicativas do dia-a-dia. São entidades sócio-discursivas e formas de ação social incontornáveis em qualquer situação comunicativa. Tanto a comunicação verbal quanto a escrita somente é possível de ser realizada através de algum gênero textual. Essa posição, defendida por Bakhtin (1992) e Bronckart (1999) é adotada também pela maioria dos autores que tratam a língua em seus aspectos discursivos e enunciativos. Para Marcuschi (2005, p. 22) “esta visão segue uma noção de língua como atividade social, histórica e cognitiva. Privilegia a natureza funcional e interativa e 23 não o aspecto formal e estrutural da língua”, o que leva a inferir que a língua não é vista como um retrato da realidade nem como um mero instrumento de representação dos fatos, mas é vista como um meio de ação social e histórica que constitui a realidade. Assim sendo, fica evidente que cada vez mais o professor de línguas, seja materna ou estrangeira, deve se convencer de que a língua não se limita à estrutura gramatical e ao vocabulário, mas sim se constitui fundamentalmente nas relações entre eles e o contexto social do seu uso. Bronckart (1999) afirma que a utilização de uma língua efetua-se sob a forma de enunciados, sejam estes orais ou escritos. Assim sendo, como lembra Bronckart (1999), qualquer espécie de texto, concebido como produto concreto da ação da linguagem pode ser designado em termos de gênero. Portanto, todo exemplar de texto observável pode ser considerado como pertencente a um determinado gênero. O autor afirma ainda que todo texto é necessariamente composto por tipos de discurso, ou seja, “formas de organização lingüística em número limitado, com as quais são compostas, em diferentes modalidades, todos os gêneros textuais” (BRONCKART, 1999, p.137). Para estes mesmos autores, ao comunicar-se, o ser humano adapta-se a uma situação de comunicação, ou seja, não escreve da mesma maneira ao redigir uma carta de apresentação ou um email; e não fala da mesma maneira perante um público seleto ou diante de um grupo de amigos. Por este motivo os textos orais ou escritos diferenciam-se uns dos outros, por serem produzidos em condições diferentes, daí decorre a diversidade de gêneros existentes no dia-a-dia do convívio social. Certos gêneros interessam mais à esfera escolar do que outros. Como exemplo, pode-se mencionar alguns como: as narrativas de aventuras, as histórias em quadrinhos, histórias infantis, receitas de cozinha, seminários, contos, parlendas, entre outros. Para Motta-Roth (2006, p. 496), um gênero textual “é uma combinação entre elementos lingüísticos de diferentes naturezas que se articulam na linguagem usada em contextos recorrentes da experiência humana e que são socialmente compartilhados”. Schneuwly e Dolz (2004) desenvolvem a idéia de gênero como instrumento para agir em situações de linguagem. 24 Bakhtin (1992) concebe os gêneros como ‘tipos relativamente estáveis de enunciados’ criados dentro dos vários campos da atividade humana e que são caracterizados por um conteúdo temático, uma estruturação lingüística e uma organização textual entre locutor e interlocutor. De acordo com Marchuschi (2005), os gêneros textuais não se caracterizam por aspectos formais, estruturais ou lingüísticos, mas por aspectos sócio- comunicativos e funcionais, sendo que os mesmos são fenômenos históricos vinculados profundamente à vida cultural e social. Assim sendo, eles “surgem, situam-se e integram-se funcionalmente nas culturas em que se desenvolvem” (MARCUSCHI, 2005, p.20). Conforme Amaral (2008), gênero textual é um nome que se dá às diferentes formas de uso da linguagem que circulam socialmente, sendo que estas podem ser formais ou informais. Como exemplos de gêneros textuais o autor cita: romance, artigo de opinião, conto, receita de bolo, palestra ou debate na televisão, aula, entre outros, já que os gêneros são considerados infinitos. Eles são a forma como a língua se organiza nas inúmeras situações de comunicação. Gênero textual é a língua em uso social, seja quando usada na escola ou fora dela para a comunicação. Esta pode ser feita através de gêneros escritos ou orais. Os gêneros textuais são uma forma da língua em uso, é a língua viva, eles são instrumentos de toda a comunicação. Assim sendo, toda nossa comunicação se dá por textos (orais ou escritos) e todo texto, por sua vez, se concretiza em forma de um gênero. O gênero textual como instrumento de agir nas diversas situações de uso social da linguagem é uma realização lingüística concreta definida por propriedades sociocomunicativas, ou seja, é a situação de produção de um texto que determina em que gênero ele é realizado. É por isso que os gêneros não se definem por aspectos formais ou estruturais da língua, por estarem ligados à natureza interativa do texto, ou seja, à sua funcionalidade, ao seu uso. Segundo Schneuwly e Dolz (2004), os gêneros textuais são considerados uma fonte inesgotável de estudo e conhecimento, que pode possibilitar ao aluno um aprendizado mais relevante e significativo, proporcionando-lhe o desenvolvimento da autonomia perante o processo de desenvolvimento e aquisição da linguagem. Frente a tais perspectivas, a linguagem é aprendida por meio de enunciados concretos, ouvidos e reproduzidos na comunicação verbal. No âmbito da fala, 25 aprender a falar é aprender a estruturar enunciados. No âmbito da escrita, a aprendizagem centra-se nas formas, nas exigências e nas potencialidades dos diferentes gêneros. Assim como na prática, todos os falantes de uma língua aprendem juntamente com a aquisição de regras gramaticais, a se expressar por meio de diferentes gêneros textuais, antes mesmo de aprendê-los na escola. Cabe à escola, aproveitaresse conhecimento intuitivo, sistematizar e tornar consciente o uso dos diferentes gêneros textuais com os quais convivemos nos diversos níveis das nossas práticas sociais. Felizmente existe uma preocupação constante em reverter o baixo nível de aproveitamento nas incursões de leitura e produção de textos escritos em língua inglesa nas escolas públicas. Para tanto, faz-se necessário descortinar o véu que cobre o tradicional ensino de língua inglesa nas escolas municipais, desvelando a contribuição que o tratamento da linguagem como gênero pode trazer para o ensino e a aprendizagem da língua. Os critérios mencionados por Bronckart (1999) para a definição de um gênero são inúmeros, como por exemplo, a atividade humana implicada, o efeito comunicativo visado, o conteúdo, entre outros. A diversidade de critérios e o caráter fundamentalmente histórico e adaptativo das produções textuais que tendem a desaparecer, reaparecer ou a modificar-se, fazem com que as inúmeras classificações de gênero sejam divergentes, parciais e não possam ser consideradas como modelos de referência estabilizada, definitiva. Isso acontece porque os gêneros estão em constante movimento. Um gênero textual não é uma forma fixa, cristalizada e homogênea, pelo contrário, a noção de gênero estabelece uma dimensão de intertextualidade, pois a linguagem traz consigo elementos de experiências discursivas anteriores, que um gênero estabelece com outro no espaço do texto. A intertextualidade inter-gêneros ocorre quando um gênero assume a função de um outro sem deixar de ser ele mesmo. Para o ISD, essa flexibilidade na classificação de gêneros se estende à própria capacidade de usar um gênero típico de uma situação em outra situação sóciocomunicativa. Ou seja, em cada situação de comunicação visada, os gêneros podem migrar de uma formatação específica para outra, bucando objetivos sociocomunicativos diferentes. Um exemplo citado por Marcuschi (2005) é o anúncio publicitário em um outdoor. Este pode ter o formato de um poema, de uma mensagem romântica ou até 26 mesmo de uma simples lista de produtos em oferta, o que importa é que faça a divulgação e estimule a compra por parte dos clientes ou usuários daquele produto. No exemplo acima mencionado, fica evidente a sua funcionalidade e a sua plasticidade, ou seja, um único gênero textual pode ser representado de maneiras diversas. Cada gênero apresenta uma configuração enunciativo-discursiva peculiar, que atende às exigências socioculturais de sua produção, recepção e circulação num determinado grupo social. Quando a interação ocorre socialmente, o ser humano faz uso obrigatório de pelo menos um dentre os diversos gêneros que circulam no meio social. O simples fato de optar por um deles resulta no pressuposto de que o interlocutor também conhece esse gênero e pode interagir com o emissor. Schneuwly e Dolz (2004) afirmam que é por meio dos gêneros que as práticas de linguagem encarnam-se nas atividades dos aprendizes e que estes, ao utilizarem diferentes gêneros como ferramenta de aprendizagem, são colocados frente às reais situações de comunicação e compreenderão o funcionamento da linguagem como prática social. E é por meio das práticas sociais, ou seja, das mediações comunicativas que se cristalizam na forma de gêneros, que as significações sociais são progressivamente construídas. De acordo com Bakhtin (1992), os gêneros organizam a fala. Aprende-se a moldar a fala às formas do gênero e, ao ouvir o outro, sabe-se pressentir-lhe o gênero. Se não existissem gêneros e se as pessoas não os dominassem, tendo que criá-los pela primeira vez no processo da fala, a comunicação verbal seria quase impossível. Ao aprender os gêneros que estruturam um grupo social com uma dada cultura, o aluno aprende diferentes maneiras de participar nas ações de uma comunidade (MOTTA-ROTH, 2006). 3.3 Interacionismo Sócio-discursivo – ISD Diante da postura teórica aqui analisada, pode-se afirmar que a língua insere- se no processo sócio-interativo, segundo Marcuschi (2005, p. 22) e é dentro deste 27 contexto que “os gêneros textuais se constituem como ações sócio-discursivas para agir sobre o mundo e dizer o mundo, constituindo-o de algum modo”. De acordo com Machado e Cristovão (2006), foi no início da década de 90 que trabalhos desenvolvidos na perspectiva do interacionismo sócio-discursivo (ISD) surgiram no Brasil, mais precisamente no Programa de Pós-Graduação em Lingüística Aplicada e Estudos da Linguagem (LAEL) da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP). Bonini (2002) aponta duas fortes vertentes da atualidade que orientam o ensino de produção textual. As duas correntes que convergem para um método interacionista – que postula a produção textual como reprodução de corpo de tradições de uma comunidade, propondo parâmetros para que a produção textual do aluno seja uma produção que faça sentido. São elas: a sócio-retórica, que tem em Swales um dos seus principais representantes e a enunciativa, representada principalmente por Bronckart (1999). Ambas postulam como ponto focal os trabalhos com o texto e com a variedade dos gêneros textuais, embora concebam o funcionamento da linguagem de modo diverso. A psicologia soviética e a concepção marxiana de práxis são consideradas as fontes teóricas fundamentais do ISD. Para Érnica (2004, p.50), [...] Essa união permite aos autores do ISD considerar o psiquismo humano como um fenômeno social. Ou seja, tanto no nível da espécie como no desenvolvimento individual, a formação das funções psicológicas superiores só são possíveis pela interiorização das relações que os indivíduos estabelecem consigo, com os outros e com o meio. O conjunto das relações sociais pré-existentes é a condição histórica concreta na qual as pessoas se formam. A pesquisa a ser desenvolvida apresenta como pressuposto teórico o interacionismo sócio-discursivo (ISD) de Bronckart (1999) e colaboradores, que fundamenta seus estudos com contribuições de diversos teóricos como: Hegel (a influência do caráter dialético do desenvolvimento); Marx e Engels (o papel da linguagem); Habermas (o agir comunicativo) e nas teorias de Vygotski (quando se refere aos conceitos de aprendizagem e práticas do ensino de línguas); e de Bakhtin (sobre a noção de linguagem e abordagem comunicativa). O ISD busca desenvolver um programa de pesquisa voltado à construção de uma “ciência do humano”, com o propósito de atingir uma melhor compreensão do complexo funcionamento psíquico e social do ser humano. Assim sendo, não se pode afirmar que o ISD seja uma 28 teoria da lingüística ou da psicologia. Por ser considerado transdisciplinar, não pode ser limitado de forma estanque a nenhum desses quadros disciplinares. De acordo com Machado (2007, p.24), a principal idéia defendida pelo ISD: [...] é a de que o desenvolvimento dos indivíduos ocorre em atividades sociais, em um meio constituído e organizado por diferentes pré-construídos e através de processos de mediação, sobretudo os linguageiros. Com isso, desde seu nascimento, eles podem ir se apropriando desses pré- construídos sociais, o que permite seu desenvolvimento e, dialeticamente, lhes permite contribuir para a transformação permanente dos pré- construídos. Bronckart (1999) considera que as ciências humanas devem ter como objeto principal tudo o que se refere às condições de funcionamento e desenvolvimento das condutas humanas. Partindo do princípio de que todo desenvolvimento se realiza a partir dos pré-construtos humanos, isto é, nas diferentes construções sociais já existentes em uma determinada sociedade, o ISD considera como primeiro objeto de estudo a sócio-história humana. Neste construto teórico, a linguagem exerce fundamental importância ao ser entendida como uma atividade indispensávelpara o funcionamento e desenvolvimento das interações sociais. O ISD se apóia em uma perspectiva interacionista de uso social da língua e em teorias de linguagem que enfatizam o social (BRONCKART, 1999). Para o ISD, a linguagem tem papel indispensável e fundamental no desenvolvimento humano, sendo que é por meio dela que se constrói uma “memória” dos pré-construtos sociais, sendo ela que organiza, regula e comenta o agir e as interações humanas. É por processos de mediação, principalmente os linguageiros, que esses pré- construtos são apropriados e transformados pelos indivíduos. Seu quadro epistemológico se baseia na concepção de que “as condutas humanas” fazem parte de um processo histórico de socialização e que este é marcado principalmente pela utilização de instrumentos semióticos, como a linguagem e determinado por dimensões culturais. Conforme Cristóvão (2007, p.09), o interacionismo sócio-discursivo [...] Também defende o caráter dialético do desenvolvimento da atividade e do psiquismo humano e a importância do papel que a linguagem e o trabalho desempenham na construção do pensamento consciente além da necessidade de constante superação das determinações culturais para transformação do ambiente social e do próprio indivíduo. 29 Para se estudar as ações humanas, faz-se necessário recorrer às dimensões discursivas e sociais que se constituem em uma perspectiva dialética e histórica. Para o ISD, “o comportamento humano é o resultado de uma socialização particular capacitada por meio da emergência histórica de instrumentos semióticos” (BRONCKART, 1999, p. 78). Por meio desta afirmação, pode-se entender que é nas atividades sociais geradas em uma formação social que se desenvolvem as ações de linguagem, ou seja, a linguagem só se constrói a partir das interações estabelecidas entre sujeitos que são, por sua vez, fruto de um processo histórico de socialização. E é dentro desse processo histórico de socialização que Marcuschi (2005) disserta sobre a importância de se compreender o gênero textual como algo dinâmico, fluido, incapaz de ser assimilado somente através de classificações e de descrições lingüísticas e como modelos estáticos para se confeccionar textos. O autor concebe gênero como sendo fundamentalmente uma atividade social, colocando em segundo plano o elemento constitutivo da linguagem e afirma que os gêneros não devem ser imitados ou reproduzidos, mas recriados e deveriam orientar-se mais para aspectos voltados para a realidade do aluno. Assim sendo o autor aponta a necessidade de se repensar as práticas pedagógicas. 3.4 Seqüência Didática Como forma de transformação das práticas pedagógicas, pode-se fazer uso de SD organizada em torno dos gêneros textuais, sendo que a mesma proporciona a observação de possíveis mudanças no processo de ensino-aprendizagem de língua inglesa ao favorecer a análise das capacidades de linguagem desenvolvidas nos alunos que utilizam esse tipo de material. De acordo com Schneuwly e Dolz (2004, p.97) “uma seqüência didática é considerada como um conjunto de atividades escolares organizadas, de maneira sistemática, em torno de um gênero textual oral ou escrito, guiada ou por um tema, ou por um objetivo geral, ou por uma produção de texto final”, para melhorar uma determinada prática de linguagem. 30 Conforme Schneuwly e Dolz (2004, p. 97) “Uma seqüência didática tem, precisamente, a finalidade de ajudar o aluno a dominar melhor um gênero de texto, permitindo-lhe assim, escrever ou falar de uma maneira mais adequada numa dada situação de comunicação”. As SD servem para dar acesso aos alunos às praticas de linguagens novas ou aquelas que eles não dominam. Desta forma, o trabalho escolar deve ser realizado sobre gêneros que o aluno não domina ou o faz de forma insuficiente. De acordo com Muñoz (2006), os referidos autores ressaltam dois princípios básicos que servem de fundamento às SD, e que permitem abordar o ensino- aprendizagem da língua sob o ponto de vista da comunicação e dos conhecimentos ao mesmo tempo. O primeiro princípio consiste em afirmar que o trabalho sobre os gêneros ocorre sempre em dois níveis: o da comunicação e o da estruturação. Quanto ao nível da comunicação, os aprendizes, através da realização da atividade lingüística, produzem textos em situações de comunicação diversas. E quanto ao nível da estruturação, os aprendizes tomam consciência de algumas das suas dimensões, as observam, as analisam e as exercitam. O primeiro princípio articula sistematicamente a comunicação e a estruturação e faz da atividade lingüística o ponto de partida e o objeto da estruturação. Quanto ao segundo princípio, ressalta-se que é útil e necessário fazer da linguagem verbal um objeto de ensino-aprendizagem autônomo. Para realizar estes dois princípios básicos, articulam-se explicitamente o plano da estruturação com o da comunicação, ou em outros termos, põe-se em relação o trabalho sobre a situação de produção e sobre a produção do texto em si. Esta é a dialética que fundamenta a SD. As SD propiciam a criação de contextos de produção precisos e a apropriação de técnicas (instrumentos), necessárias para o desenvolvimento da capacidade de expressão escrita ou oral em situações variadas de comunicação, através de atividades separadas por módulos que possibilitarão o domínio de gêneros. 3.4.1 Etapas de uma Seqüência Didática Uma seqüência didática divide-se em quatro componentes, quais sejam: 31 3.4.1.1 Apresentação da Situação É o momento em que o aluno será apresentado a uma determinada situação de comunicação. Descreve de maneira detalhada a tarefa que os alunos deverão realizar, seja esta oral ou escrita. É neste momento que os alunos construirão uma representação da situação de comunicação e da atividade de linguagem que será executada. Esta etapa é composta por duas dimensões principais mencionadas por Schneuwly e Dolz (2004): a) Apresentar um problema de comunicação bem definido: um projeto coletivo de produção de um gênero oral ou escrito, que deverá ser proposto aos alunos de maneira bastante explícita para que eles possam compreender da melhor forma possível a situação de comunicação na qual devem agir para a realização de suas produções. Esta fase deverá responder aos seguintes questionamentos: qual é o gênero que será abordado: receita culinária, conto, HQ, HI, dentre outros; a quem se dirige a produção: aos próprios alunos da sala, alunos da mesma escola ou de outras escolas, aos pais ou professores, ou outros; que forma assumirá a produção: produção de um texto oral ou escrito, carta, folheto, poema, música, ou outra forma; Quem participará da produção: todos os alunos, individual ou em grupos de 2, 3, 4 ou mais alunos. b) Preparar os conteúdos dos textos que serão produzidos: é importante que os alunos percebam a necessidade dos conteúdos com os quais irão trabalhar. Para redigir um conto, por exemplo, os alunos deverão saber quais são os seus elementos constitutivos: personagens, ações, lugares típicos, época, dentre outros. Esta fase da apresentação da situação permite fornecer ao aluno todas as informações necessárias para que conheça o projeto comunicativo visado e a aprendizagem de linguagem a que está relacionado. 3.4.1.2 Produção Inicial 32 É nesse momento que o professor percebe as capacidades que o aluno possui a respeito de determinado gênero, a partir de uma produção textual oral/escrita. Nesta etapa, os alunos tentam elaborar um texto oral ou escrito revelando dessa forma para si mesmos e para o professor as representações que têm dessa atividade. Isto lhes permite descobrir o que já sabem fazer e conscientizar-se dos problemas por eles encontrados. Para o professor essa produção inicial permite que a SD possa serrefinada, modulada e adaptada às capacidades reais dos alunos. Esta produção inicial é o primeiro lugar de aprendizagem da seqüência. Esta etapa é para o professor o momento em que ele pode fazer os ajustes necessários na seqüência e adaptá-la de maneira mais precisa às reais capacidades dos alunos. A análise das produções orais ou escritas dos alunos, se guiada por critérios bem definidos, possibilita avaliar de maneira bem precisa em que ponto a turma se encontra e quais são as dificuldades apresentadas pelos alunos. O professor pode, nesta fase, fazer uma discussão em sala sobre o desempenho oral de um aluno; a troca de textos escritos entre os alunos da própria classe; entre outras. Assim, os pontos fortes e fracos serão evidenciados; as técnicas de escrita ou de fala serão discutidas e avaliadas e são buscadas soluções para os problemas que aparecem. 3.4.1.3 Módulos São atividades variadas que instrumentalizam o aluno no sentido de que ele consiga se apropriar do gênero em estudo em determinada esfera comunicativa. É o momento de se trabalhar os problemas e as dificuldades que apareceram na primeira produção e possibilitar aos alunos os instrumentos necessários para que estes possam superá-los. Nesta fase, a atividade de produzir um texto escrito ou oral é, de uma certa maneira, decomposta, para abordar um a um e separadamente seus diversos elementos. Dessa forma, o movimento geral da SD vai do complexo para o simples (da produção inicial aos módulos) e volta novamente ao complexo no fim, com a produção final. 33 Três questões se colocam quanto ao encaminhamento de decomposição e de trabalho sobre os problemas, mencionados por Schneuwly e Dolz (2004): a) Que dificuldades da expressão oral ou escrita abordar? Trabalhar problemas de níveis diferentes. A produção de textos escritos e orais é um processo complexo, com vários níveis que funcionam simultaneamente na mente do indivíduo. Baseado nas abordagens da psicologia da linguagem distinguem-se quatro níveis principais na produção de textos, quais sejam: - Representação da situação da comunicação: o aluno precisa ter bem esclarecido quem será o destinatário do texto (pais, professores, colegas da própria turma ou de turmas diferentes), qual finalidade visada (convencer, divertir, informar), qual a sua posição como autor ou locutor (fala ou escreve como aluno ou como representante da turma? Como indivíduo ou como narrador?) e também sobre o gênero que irá trabalhar; - Elaboração dos conteúdos: o aluno deve ter conhecimento sobre as técnicas para que estas o possam auxiliar a buscar, elaborar ou criar conteúdos, de acordo com o gênero utilizado: técnicas de criatividade, discussões, debates, tomadas de notas, busca de informações, entre outras; - Planejamento do texto: elaborar o seu texto conforme a finalidade que este deseja atingir ou de acordo com o seu destinatário; - Realização do texto: o aluno deve ter conhecimento para que possa escolher quais meios de linguagens são mais eficazes ao escrever o seu texto: utilizar-se de um vocabulário apropriado de acordo com o seu objetivo, saber variar os tempos verbais conforme o seu texto e poder utilizar organizadores textuais de forma a estruturar o seu texto ou produzir argumentos. b) Como construir um módulo para trabalhar um problema particular? Variar as atividades e exercícios. O principal objetivo ao elaborar um módulo que trate de um problema de produção textual é o de variar os modos de trabalho. É muito importante, em cada módulo, propor atividades as mais diversificadas possíveis, possibilitando ao aluno o acesso às noções e aos instrumentos, aumentando assim as suas chances de sucesso. Existem três grandes categorias de atividades e de exercícios: 34 - Atividades de observação e de análise de textos: os textos podem ser orais ou escritos, autênticos ou fabricados. Essas atividades podem ser realizadas a partir de um texto completo ou de uma parte deste; podem comparar vários textos de um mesmo gênero ou de gêneros diferentes, entre outras; - Tarefas simplificadas de produção de textos: são exercícios que permitem descartar certos problemas de linguagem por impor ao aluno limites bastante rígidos. Algumas tarefas que podem ser realizadas são: reorganizar o conteúdo de uma descrição narrativa para um texto explicativo; inserir uma parte que falta num determinado texto; revisar um texto com critérios bem definidos, entre outras; - Elaboração de uma linguagem comum para trabalhar os textos no sentido de analisá-los, discuti-los e aperfeiçoá-los. Estes textos podem ser próprios ou de outros. Este trabalho é gradativo e realizado ao longo de toda a seqüência e principalmente na elaboração dos critérios definidos na produção de um texto. c) Como capitalizar o que é adquirido nos módulos? Ao realizar os módulos, os alunos aprendem também a discursar sobre o gênero abordado. Estes ampliam seu vocabulário e adquirem uma linguagem técnica que será comum à classe e ao professor. Desta forma, eles constroem gradativamente conhecimentos sobre o gênero. Esse vocabulário técnico e as regras elaboradas nas seqüências podem ser registrados numa lista que sintetiza o que foi adquirido nos módulos, construída durante a execução do trabalho ou elaborada num momento de síntese, antes da produção final. Ao final da seqüência é importante fazer um registro dos conhecimentos adquiridos sobre o gênero durante o trabalho nos módulos, na forma de lembrete, glossário ou lista de constatações. 3.4.1.4 Produção Final Esta atividade propiciará reflexão e, a partir dela, o aluno poderá colocar em prática os conhecimentos que adquiriu nas atividades desenvolvidas. 35 A seqüência é finalizada com uma produção final que oferece ao aluno a possibilidade de praticar as noções e os instrumentos elaborados separadamente nos módulos e permite ao professor realizar uma avaliação somativa. O importante é que o aluno encontre, de maneira explícita, os elementos trabalhados em aula e que devem servir como critérios de avaliação. Para Schneuwly e Dolz (2004, p.128) “[...] a intenção não é a de pedir aos professores que realizem toda a sua seqüência na integralidade, mas de levá-los a apropriarem-se progressivamente da proposta”. O material é amplo, mas está distante de recobrir o conjunto de gêneros que poderiam ser abordados em sala de aula. As SD devem funcionar como exemplo à disposição dos professores, pois ao se apropriarem desta, por meio da formação inicial ou contínua, poderão organizar por si próprios, outras seqüências, e seus próprios materiais didáticos. 3.4.2 Capacidades de Linguagem Seguindo uma visão bakhtiniana, as SD devem desenvolver as capacidades de linguagem do aprendiz definidas por Dolz, Pasquier, Bronckart (1993, apud SCHNEUWLY, DOLZ, 2004, p.52) como sendo: a) Capacidade de ação: adaptar-se às características do contexto e do referente; é responsável pela representação de uma determinada situação; b) Capacidade discursiva: mobilizar modelos discursivos; definido como plano textual de cada gênero; c) Capacidade lingüístico-discursiva: dominar as operações psicolingüísticas e as unidades lingüísticas; representado como recursos lingüísticos que tornam o texto coerente. Dolz e Schneuwly (2004) propõem que os gêneros devem ser explorados de maneira que essas capacidades possam se desenvolver no ambiente escolar. Para tanto, sugerem que eles sejam agrupados de acordo com certas regularidades lingüísticas, que oscilam devido a determinados contextos. 36 De acordo com esses pressupostos, ao agir com a linguagem, o indivíduo utiliza gêneros já existentes no arquitexto2, que se encontram em processo de constante transformação. O termo capacidade de linguagem faz referênciaàquilo que se requer para a produção ou para a compreensão de um gênero textual em uma determinada situação de comunicação. Ao produzir ou ao ler um texto, é necessária a utilização das três capacidades, visto que a capacidade de ação permite ao produtor e/ou leitor observar e considerar as características do contexto comunicativo e seu conteúdo referencial, ambas mais ou menos desenvolvidas de acordo com o conhecimento de mundo de quem produz ou lê. No que ser refere à capacidade de ação ou contexto de produção, esta diz respeito às situações de interação de uso da linguagem, dentro de um contexto compartilhado em que produtor e/ou leitor conseguem adaptar a sua produção de linguagem às situações comunicativas exigidas pelo contexto. É o reconhecimento do gênero e de sua relação com o contexto de produção e mobilização de conteúdos. Schneuwly e Dolz (2004) indicam dois conjuntos de fatores ou parâmetros: o primeiro refere-se ao mundo físico e o segundo ao mundo social e subjetivo. Os parâmetros do mundo físico que intervêm na produção de um texto são: o lugar de produção (o espaço físico), o momento da produção (tempo), o emissor/produtor/locutor (a pessoa que produz o texto) e o receptor/interlocutor / destinatário (pessoa ou pessoas para as quais o texto está sendo dirigido). Os parâmetros do mundo social e subjetivo se devem ao fato de que todo texto faz parte de uma atividade social e de uma interação comunicativa. São eles: o lugar social (a formação social, a instituição ou o modo de interação social em que é produzido); a posição social do emissor (papel social desempenhado pelo produtor); a posição social do receptor e a finalidade da interação (os efeitos que o emissor quer provocar no receptor). A perspectiva interacionista sociodiscursiva entende que a noção de ação de linguagem está relacionada ao contexto de produção e ao conteúdo temático em que o texto analisado está inserido. 2 Arquitexto ou intertexto é um conjunto de gêneros teoricamente constituído de um número de gêneros infinito, considerando que a atividade humana também é bastante variada. 37 De acordo com a afirmação anterior, pode-se depreender que a capacidade de ação é responsável por situar o sujeito com relação ao contexto em que o gênero estudado foi produzido. Desse modo, o sujeito é capaz de construir uma certa representação a respeito do autor do texto, do contexto sócio-histórico, o lugar social em que o mesmo foi produzido, ainda sem utilizar-se dos aspectos lingüísticos contidos no texto. Todo texto oral ou escrito está condicionado aos fatores acima mencionados. Quanto à capacidade discursiva – bem como a lingüístico-discursiva – desenvolve-se somente quando o indivíduo, no caso a criança, passa a verbalizar a linguagem. Esta capacidade está relacionada com a forma como o produtor de um texto seleciona um tipo de discurso para realizar uma determinada ação de linguagem, como organiza o conteúdo de seu texto e o formato dado. A capacidade discursiva preocupa-se com o reconhecimento do plano textual geral de cada gênero, ou seja, com os tipos de discurso e de seqüência pertencentes a determinado gênero. A capacidade discursiva agrupa-se em dois subconjuntos principais: as que se relacionam com o planejamento do texto e as que se relacionam com a apresentação do conteúdo. O Planejamento do Texto ou infraestrutura geral do texto está constituído pelo plano geral deste, pelos tipos de discursos e suas modalidades de articulação e pelas seqüências que ali aparecem. Ao comunicar-se verbalmente, o indivíduo, além de escolher o gênero de texto no qual irá organizar suas emoções, representações e conhecimentos, deve selecionar também o tipo de discurso que irá produzir. A noção de tipo de discurso faz referência aos diferentes segmentos que entram na composição de um gênero de texto. Qualquer que seja o gênero ao qual pertencem, os textos compõe-se, de acordo com as diversas modalidades de segmentos discursivos diferentes, segmentos de exposição teórica, de relato, de diálogo, entre outros. Quanto ao texto escrito, a apresentação do conteúdo pode ser realizada de duas maneiras: contar e expor. No primeiro caso, o conteúdo localiza-se no passado e organiza-se cronologicamente. No segundo, pelo contrário, apresenta-se unido ao mundo da interação em curso. Por outro lado, a relação entre o discurso e a situação 38 material da produção também dá origem a duas alternativas: a de implicação com a situação de produção ou a de autonomia frente à mesma. Outro aspecto da infraestrutura geral do texto refere-se ao conceito de seqüência discursiva ou modos de planejamento. A noção de seqüência designa formas de planejamento locais ou particulares ao interior de um texto, que permite apresentar de maneira linear ou seqüencial o conteúdo do mesmo. A organização verbal das emoções, representações, conhecimentos, gostos, etc., exige um trabalho de “linealização”, ou seja, colocar uma coisa depois da outra de forma linear, sucessiva. A realidade (o mundo físico, social e subjetivo) não pode ser verbalizado sem essa tarefa de linealização. Existem diferentes formas de construir essa linealidade, o que dá origem às diferentes seqüências discursivas, que de acordo com Bronckart (2003), podem ser assim classificadas: narrativa, descritiva, explicativa, argumentativa, injuntiva e dialogal. No que se refere à Apresentação do Conteúdo, este é movimentado por um texto em função de um conjunto de variáveis, entre as quais o que já foi dito por si mesmo ou por outros. Esses conteúdos transformam-se e organizam-se na medida em que são enunciados em um momento especial. As informações que passam a constituir o conteúdo são representações construídas pelo produtor desde os conhecimentos que variam em função da experiência e nível de desenvolvimento do produtor e que estão acumulados na sua memória antes de desencadear a ação da linguagem. A capacidade lingüístico-discursiva refere-se às operações implicadas na produção textual para dar ao texto uma arquitetura interna, ou seja, refere-se mais especificamente a operações que o produtor utiliza na produção de textos de acordo com as exigências e características de cada gênero. É o reconhecimento e a utilização do valor das unidades lingüístico-discursivas inerentes a cada gênero para a construção do significado global do texto. A capacidade lingüístico-discursiva é responsável pelo domínio das estruturas e funções gramaticais dentro de determinado gênero, ou seja, há de se considerar os mecanismos de textualização, que consistem em uma série de unidades lingüísticas menores que contribuem para mostrar a progressão e a coerência temática do texto (conexão e coerência verbal e nominal) e os enunciativos. As operações envolvem: 39 a) as operações de textualização as quais incluem as operações de conexão e operações de coesão nominal e verbal, permitem explicitar os diferentes níveis de organização do texto; b) as vozes enunciativas que se realizam por meio de dois tipos de operações: as diferentes vozes enunciativas presentes no texto e as modalizações; c) as operações construção de enunciados (frase ou período) que dependem da consideração do contexto em que será produzido o texto; d) as escolhas lexicais que constituem um conjunto de operações em forte interação com os outros níveis. Para Cristóvão (2002) a seqüência didática proporciona aos professores e alunos a construção de módulos de atividades que podem ser adaptados de acordo com as situações de comunicação ou conforme as classes a serem trabalhadas. Em longo prazo, um ensino baseado em seqüências didáticas deve permitir aos alunos um acesso progressivo e sistemático aos instrumentos comunicativos e lingüísticos necessários àprodução de textos pertencentes a diferentes gêneros textuais. 3.5 Modelo Didático de Gênero Segundo os pesquisadores do ISD, para que os objetivos do processo de ensino-aprendizagem com relação aos gêneros textuais possam ser alcançados, é necessário que as produções de um gênero textual sejam norteadas pelo que os pesquisadores denominam de modelo didático de gênero. Para a construção do modelo didático de gênero é necessária uma análise de textos pertencentes a esse gênero. Seguindo a proposta de Dolz e Schneuwly, 1998 (apud CRISTOVÃO, 2007, p. VIII), deve-se também: [...] conhecer o estado da arte dos estudos sobre esse gênero; as capacidades e as dificuldades dos alunos ao trabalharem com textos pertencentes ao gênero selecionado, as experiências de ensino/aprendizagem desse gênero, assim como as prescrições presentes nos documentos oficiais sobre o trabalho docente. 40 A consulta aos modelos didáticos de gêneros pretende contribuir para que o professor avalie a adequação de gêneros e de textos de acordo com as condições de sua sala de aula e possa definir o tipo de intervenção didática a ser desenvolvida de acordo com o nível de seus alunos. O objetivo é subsidiar o trabalho do professor e o aprendizado do aluno nas atividades destinadas ao desenvolvimento das capacidades de linguagem. Os objetivos que norteiam a construção de modelos didáticos de gênero, conforme proposto por Dolz e Schneuwly (1998), é de que estes possam contribuir com os professores de LI para que preparem suas próprias atividades didáticas, assim como auxiliá-los a avaliar, escolher e adaptar o material didático a ser usado em sua intervenção pedagógica. A apresentação dos modelos didáticos de gêneros está organizada por esferas de atividades em que estes normalmente circulam: ESFERA EXEMPLOS DE MODELOS Cultural/artística HQ (histórias em quadrinhos) e HI (histórias infantis), além de diálogos, dramatizações, parlendas, canções folclóricas. Cotidiano ou familiar Regras de jogos, listas de supermercados, receitas culinárias, manuais, agenda. Correspondência Cartas de pedido de conselho, cartas para pen-pal, cartões postais, emails. Divulgação científica ou universitária Biografias, artigos, teses, dissertações, livros. Jornalística Notícias, reportagens, crônicas, entrevistas, artigo de opinião. Política Social Cartazes, discursos, palestras. Religiosa Cantos, orações, salmos. Política Comícios, debates, entrevistas. Escolar Diário de classe, boletim informativo, avisos, teatros, dramatizações. Literária Livros, jornais, revistas. Quadro 1: Modelos Didáticos de gêneros Fonte: Adaptado de Cristóvão (apud DOLZ e SCHNEUWLY, 1998) 41 4 METODOLOGIA A metodologia utilizada no presente trabalho foi a de Análise Qualitativa. Com o surgimento da comunicação escrita, a observação de um fenômeno pode ser registrada em diversos tipos de documentos, possibilitando sua transmissão sem perder a confiabilidade (RICHARDSON, 1999). A apresentação e discussão dos dados foi realizada à luz do que preconiza a literatura sobre gêneros textuais que tem por base o ISD. Este se apóia em uma perspectiva interacionista social de linguagem e em teorias de linguagem que dão primazia ao social, cujo principal colaborador é Jean-Paul Bronckart (1999). No que diz respeito a SD, os principais colaboradores foram Bernard Schneuwly e Joaquim Dolz (2004), todos da Universidade de Genebra, Suíça. Para fomentar o trabalho apresentado, a coleta de dados foi realizada em duas etapas e com instrumentos distintos. A primeira etapa da pesquisa foi efetuada através de instrumento com questões abertas e fechadas, dirigidas a todos os professores de LI da rede municipal de ensino de Joinville, por ser esta a cidade na qual a pesquisadora exerce a sua profissão como professora de LI em duas escolas deste município. A aplicação do questionário com questões abertas e fechadas (conforme Apêndice) visou efetuar uma sondagem para se obter uma percepção da abrangência do uso dos gêneros textuais nas aulas de LI nas escolas da rede municipal de ensino de Joinville, haja vista que este foi o objeto de estudo do presente trabalho. Tal instrumento foi considerado adequado nessa fase, já que se desconhecia o número de professores que faziam uso da metodologia dos gêneros textuais efetivamente em suas aulas. Os questionários foram enviados por escrito, via malote, para todas as escolas da rede municipal de ensino de Joinville e também para o endereço eletrônico, via email, dos professores que tinham estes dados cadastrados junto à Secretaria de Educação deste Município. Os questionários aplicados aos entrevistados abrangeram os docentes que trabalham com a disciplina de LI nas escolas municipais de Joinville. O contingente previamente obtido foi de oitenta professores. Dos oitenta questionários enviados, recebemos o retorno de dez 42 questionários. Através dos resultados obtidos com a aplicação deste questionário confirmou-se a suposição desta pesquisadora de que os professores da rede municipal de ensino de Joinville pouco sabem sobre gêneros textuais, e que os mesmos não fazem uso desta metodologia em sala de aula. Foi diagnosticada somente uma professora da rede que trabalha efetivamente com os gêneros textuais em suas aulas. A segunda etapa da pesquisa foi efetuada através de uma investigação no material utilizado em sala de aula, tendo como base a utilização dos gêneros textuais, por uma professora do E.F. de uma escola municipal de Joinville, localizada em um bairro de classe média baixa, em uma turma de oitava série do E.F. A escolha da referida escola deveu-se ao fato de ser a única no município de Joinville em que se aplica a metodologia do uso dos gêneros textuais no ensino da LI. Para o aprofundamento desta pesquisa, foi necessário recorrer à observação das aulas ministradas pela respectiva professora. As aulas analisadas totalizaram cinqüenta e uma aulas, sendo que, destas, trinta e três aulas foram observadas por esta pesquisadora in loco. Considerando que cada aula tem a duração de quarenta e cinco minutos, resultou num total vinte e três horas e quarenta minutos de aulas observadas. O objetivo foi verificar a prática pedagógica desta professora, relacionando com o que preconiza a literatura a respeito da utilização de gêneros textuais e o que diz o Programa de Ensino do Município de Joinville. O instrumento utilizado para dar continuidade a esta segunda etapa da investigação foi a observação, a qual deverá enriquecer as informações obtidas e permitir a ampliação das relações descobertas na análise. Procurou-se reproduzir o modelo de uma aula reconstruída, apoiando-nos na obra de Luna ao afirmar que “A reconstrução de uma prática pedalingüística caracteriza-se como concluída com a organização e a descrição dos procedimentos didáticos que foram efetivamente adotados em uma sala de aula” (LUNA, 2000, p.187). O material coletado e analisado foi composto de documentos utilizados como: planos de aula, cópia do caderno de uma aluna da referida escola e transcrição dos dados gravados durante as observações. A justificativa para a escolha desta série deve-se ao fato de supor que os alunos já devam ter atingido, pelo menos em parte, os objetivos apresentados no Programa de Ensino do Município de Joinville (Anexo 1) ao chegar ao final do E.F., tendo trabalhado os conteúdos apresentados na 43 mesma. Por tratar-se de uma pesquisa de Análise Qualitativa, objetivou-se adotar somente uma escola para efetuar as aulas de observação. A escolha desta escola não é aleatória, haja vista o propósito desta pesquisa, ao enfatizar o uso dos gêneros textuais no ensino de LI. Para tanto, fez-se necessário investigar uma escola em que se utiliza como
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