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BÂ, Amadou Hampaté, A. Tradição Viva In. História geral da África, I: Metodologia e pré-história da África / editado por Joseph Ki -Zerbo. 2.ed. rev. Brasília : UNESCO, 2010. Capitulo 8, p. 182

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BÂ, Amadou Hampaté, A. Tradição Viva In. História geral da África, I: Metodologia e pré-história da África / editado por Joseph Ki -Zerbo. – 2.ed. rev. – Brasília : UNESCO, 2010. Capitulo 8, p. 182.
Saulo Cardoso da Silva
O texto em si é fantástico, nos remete a uma concepção epistemológica não só de mundo, mas também da própria produção do conhecimento e o papel da educação nisso tudo, esta por sua vez não concebida aos moldes sistemáticos europeus. O autor do texto logo de inicio busca situar o leitor a perceber a importância que há na tradição oral da história e da própria relação com o meio em que esta se situa, não há neste sentido uma relação de hierarquização entre os povos de tradição oral e os povos de tradição escrita, ambas possuem singularidades específicas nas comunidades africanas estudadas por ele.
Além disso, o autor procura deixar evidente que a possibilidade de apreender sobre a dinâmica de vida das comunidades estudadas deve-se ser numa perspectiva etnográfica, não é possível perceber essa relação no cotidiano da observação distanciada do objeto de estudo. Assim, o autor continua sua narrativa problematizando a próprio processo de escrita dos fatos, uma vez que estes podem sofrer inúmeras modificações intencionais ou não, passando inclusive por falsificações dos sujeitos que estão envolvidos inclusive numa concepção identitariamente com o objeto/fato em si.
Para ele, o que está em jogo é o valor que cada sociedade dá “ao o homem na relação com a palavra”, existe aqui uma coerência no seio social que uma vez maculada gera consequências complexas, não só para o sujeito em si, mas em toda a cadeia relacional do mesmo, não existe então uma relação cartesiana da ação em que o individuo é isolado no mundo. 
Decorrendo o texto, percebemos que ao contrário do que estamos habituados a pensar quando nos remetemos à tradição oral, como sendo algo ligado ao imaginário mítico de determinadas populações, o autor nos mostra que nas comunidades africanas essas tradições orais são parte inerente aos atores sociais, em que o material e o não material estão associados em suas transmissões. Assim, não podemos imaginar, como o próprio autor nos adverte, essas tradições numa perspectiva cartesiana de produção do saber, que por sua vez é pressupões pela separação. 
Neste sentido, é que o autor busca situar o leitor na própria criação da origem da palavra como sendo um instrumento fundamental na compreensão da lógica de pensamento em que o mesmo está fundado. Além disso, o autor objetiva trazer ao leitor a perspectiva da origem, da criação e do processo de magia em que a fala está situada, isso é importante porque na nossa compreensão ocidental de supervalorização da escrita como modelo a ser seguido e nos apresentado como sendo de uma “cultura europeia superior”, podemos perceber então uma concepção de tradição oral que é única, não caindo assim em comparações hierarquizadas e principalmente numa hierarquia que é ideologicamente pensada como dominação. 
Continuando a perspectiva de análise do autor ao abordar os tradicionalistas, ou seja, aqueles constituídos socialmente como sendo os responsáveis pela preservação da história e consequentemente pela transmissão da mesma, percebemos o valor e a importância que é destinado aos mesmo na relação sociocultural dos sujeitos. É possível perceber também, quão danosa foi à relação com o colonizador, que uma vez vindo a conquistar, buscou empreender mecanismos dos mais diversos para extirpar do cotidiano os griots.
Enfim, a narrativa do autor nos remete a construção de um mundo que só é possível de perceber a partir do momento em que de fato consigamos, nos deslocar de toda hierarquização moral fundada no homem-branco-europeu que se solidifica por meio da escrita como lógica de dominação. Compreender a tradição oral, a epistemologia do conhecimento africano, a contextualização do costume inerente ao estar no mundo interligado numa relação em cadeia palavra-sujeito-mundo não separados, mas, como processos contínuos e ininterruptos em que o seio das relações sociais não podem ser percebidas como laços individuais, só a partir de então conseguiremos aprender sobre e com o outro numa lógica de não dominação, deixando assim nossas questões pessoais em segundo plano.

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