Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ – UEM UNIVERSIDADE ESTADUAL DE LONDRINA – UEL PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO – PPA Área de concentração: Gestão de Negócios CUSTEIO BASEADO EM ATIVIDADES EM LABORATÓRIOS DE ANÁLISES CLÍNICAS ESTUDO DE CASO EM UM HOSPITAL FILANTRÓPICO Dissertação de Mestrado MIRIAN APARECIDA MICARELLI STRUETT Londrina 2005 Livros Grátis http://www.livrosgratis.com.br Milhares de livros grátis para download. 1 MIRIAN APARECIDA MICARELLI STRUETT CUSTEIO BASEADO EM ATIVIDADES EM LABORATÓRIOS DE ANÁLISES CLÍNICAS ESTUDO DE CASO EM UM HOSPITAL FILANTRÓPICO Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Administração do Programa de Pós- Graduação em Administração da Universidade Estadual de Londrina e da Universidade Estadual de Maringá, como requisito à obtenção do título de Mestre em Administração. Área de Concentração: Gestão de Negócios Orientadores: Prof.ª Dr.ª Márcia Regina Gabardo da Câmara Prof. Antonio Artur de Souza, Ph.D. Londrina 2005 MIRIAN APARECIDA MICARELLI STRUETT 2 CUSTEIO BASEADO EM ATIVIDADES EM LABORATÓRIOS DE ANÁLISES CLÍNICAS: ESTUDO DE CASO EM UM HOSPITAL FILANTRÓPICO Dissertação aprovada como requisito para obtenção do grau de Mestre no Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade Estadual de Londrina e da Universidade Estadual de Maringá, pela seguinte banca examinadora. ______________________________________________ Prof.ª Dr.ª Márcia Regina Gabardo da Câmara (PPA-UEL) ______________________________________________ Prof. Antônio Artur de Souza, pH.D. (FACE-UFMG) ______________________________________________ Prof. Dr. Luiz Antonio Felix (PPA-UEL) Londrina, 16 de Setembro de 2005 3 Dedico este trabalho ao meu esposo e a meus filhos, que compreenderam a minha distância e o meu silêncio, oriundos desses últimos anos de estudos, com os quais me envolvi com esmero para que pudesse não só atingir os meus objetivos como ser um exemplo para eles de persistência e dedicação pelo que se busca da vida. Dedico ao meu pai (in memoriam) e à minha mãe, que me mostraram que o que realmente importa “não é o que se leva desta vida, mas a vida que se leva”. AGRADECIMENTOS 4 Agradeço a DEUS, pela paciência e resignação a mim atribuídas para concretizar mais esta etapa em minha vida. Em especial, agradeço a meu esposo, filhos, parentes e amigos, que acreditaram em mim e souberam me apoiar nos momentos difíceis quando eu já não tinha forças para continuar. Ao Hospital Filantrópico, representado pelo superintende, Sr. José Pereira, pelo administrador, Sr. Heraldo, pela supervisora, Sophia, e pelos demais funcionários, que, apesar da falta de tempo para concretizarem suas tarefas, contribuíram para que os objetivos desta pesquisa fossem alcançados. Em especial, agradeço aos meus amigos Prof. Dr. Antonio Artur de Souza e Prof.ª Ms. Simone Letícia Raimundini, que acreditaram em mim e não mediram esforços, auxiliando e cooperando para que esta dissertação alcançasse os objetivos almejados. De maneira também especial, agradeço à Prof.ª Dr.ª Márcia Regina Gabardo da Câmara, que se dispôs a orientar-me, contribuindo para que a dissertação fosse concretizada. RESUMO 5 As organizações hospitalares, diante das mudanças que vêm ocorrendo na área da Saúde, estão buscando adotar novas ferramentas de gestão. Entre os sistemas de gestão, destacam-se os de custeio, porque, ao mesmo tempo em que mensuram o custo dos serviços, geram informações para o planejamento, controle e tomada de decisão. Das organizações da área da saúde, principalmente os hospitais, é exigido um padrão elevado de qualidade no atendimento. Em contrapartida, os agentes financiadores, ou seja, as operadoras de planos de saúde, ressarcem os serviços por valores cada vez menores. Neste contexto, as informações de custos são imprescindíveis para a tomada de decisão, mas informações provenientes dos métodos de custeios tradicionais apresentam limitações. Neste sentido, este trabalho tem como objetivo demonstrar como o sistema de custeio baseado em atividades pode contribuir para a gestão financeira de uma organização hospitalar, especificamente no seu Laboratório de Análises Clínicas. Inicialmente buscou-se analisar a aplicabilidade do sistema de custeio baseado em atividades, tomando como base a literatura nacional e internacional, contemplando principalmente casos empíricos realizados nas áreas da saúde e congêneres. Na seqüência, buscou-se, por meio de um estudo de caso qualitativo e em profundidade, analisar uma organização hospitalar, mais especificamente seu laboratório de análises clínicas, com características de apoio ao diagnóstico terapêutico e, ao mesmo tempo, com característica de setor produtivo. Para a coleta de dados foi utilizada a observação direta não participante, a entrevista detalhada não estruturada e a pesquisa documental. Os resultados demonstraram que o sistema de custeio baseado em atividades em um laboratório de análises clínicas pode contribuir para a gestão financeira de uma organização hospitalar, principalmente porque permite avaliar os processos de análises clínicas do laboratório e identificar possíveis diferenças no custo de atendimento entre o usuário externo e o interno da organização hospitalar. Foi possível concluir que os exames realizados pelos pacientes internos são mais onerosos do que os dos usuários externos. Os resultados demonstraram que a organização precisa renegociar alguns exames, ou reduzir ou seus custos, principalmente overheads. Pôde-se concluir que é mais viável financeiramente, tanto para a organização hospitalar quanto para as operadoras a ela conveniadas, que os exames de análises clínicas realizados pelo laboratório sejam de caráter preventivo em vez de apoio ao diagnóstico terapêutico. Palavras-chave: custeio baseado em atividades; organizações hospitalares; gestão financeira em hospitais, custos laboratoriais. ABSTRACT 6 In face of the changes in the health sector, hospital organizations are seeking to adopt new management tools. Within management, cost systems are highlighted because they estimate the service costs and provide information for planning, controlling and decision making. Health sector organizations, particularly hospitals, are always demanded to provide high quality services. On the other hand, the financial agents, or either, the operators of health plans, repay the services for lesser values each time. In this context, cost information are essential for decision making, but cost information made available by traditional cost systems present many limitations. In that sense, the aim of this study is to show the contribution of cost systems to the financial management of a hospital organization, specifically to its Clinical Analysis Laboratory. First of all, the viability of the activity-based costing system was analyzed, based on national and international literature, focusing some empirical cases about the health sector. Secondly, a hospital organization, specifically its clinical analysis laboratory, with therapeutic diagnosis support and a productive profile, was analyzed through a deep qualitative method. Data were collected through non-obtrusive observation, non- structured interviews and documental research. Results showed that the activity-based costing system in a clinical analysis laboratory may contribute to thefinancial management of a hospital organization, mainly because it allows both to evaluate the clinical analysis process of the laboratory and to identify possible divergences in the service costs between external and internal users. It was possible to conclude that internal patients' tests are more expensive than the external users' tests. Results showed that the organization needs to renegotiate some tests or to reduce their costs, mainly overheads. As a result, it is financially more feasible for both, the hospital organization and the operators under agreement, that the clinical analysis tests carried out by the laboratory should be preventive instead of supporting the therapeutic diagnosis. Key words: activity-based cost; hospital organizations; hospital financial management; laboratory costs. LISTA DE FIGURAS 7 Figura 01 – Estrutura da dissertação .................................................................................... 25 Figura 02 – Modelos de transformação ................................................................................. 35 Figura 03 – Diagrama das fases de tomada de decisão .......................................................... 37 Figura 04 – Estrutura representativa dos objetos de custos.................................................... 45 Figura 05 – Níveis de ação da abm com o uso do sistema abc .............................................. 50 Figura 06 – A cadeia de valor................................................................................................. 51 Figura 07 – Subprocessos do processo de análises clínicas do laboratório............................ 90 LISTA DE QUADROS Quadro 01 – Problema de pesquisa e objetivos........................................................................20 Quadro 02 – Nível de descrição de estrutura............................................................................32 Quadro 03 – Atividades relacionadas às contas de custos e a seus direcionadores .................47 Quadro 04 – Síntese dos estudos empíricos internacionais sobre o sistema abc .....................57 Quadro 05 – Estudos empíricos no brasil sobre o abc..............................................................68 Quadro 06 – Dificuldades na implantação do sistema abc no brasil ........................................68 Quadro 07 – Protocolo para a realização do estudo de caso ....................................................76 Quadro 08 – Protocolo das perguntas elaboradas para a pesquisa ...........................................77 Quadro 09 – Descrição da pesquisa..........................................................................................78 Quadro 10 – Subprocessos e atividades principais do processo de análises clínicas...............89 Quadro 11 – Exames realizados no laboratório........................................................................94 LISTA DE TABELAS 8 Tabela 01 – Recursos e Direcionadores de custos primários ................................................. 91 Tabela 02 – Tempo Total de atividades disponíveis e utilizadas ........................................... 99 Tabela 03 – Custos Diretos das atividades disponíveis – Em R$......................................... 100 Tabela 04 – Custos Diretos das atividades disponíveis e utilizadas pelo laboratório .......... 101 Tabela 05 – Custos Diretos das atividades utilizadas pelo laboratório ................................ 101 Tabela 06 – Custos Interdepartamentais das atividades disponíveis – Em R$. ................... 106 Tabela 07 – Custos Interdepartamentais das atividades utilizadas....................................... 107 Tabela 08 – Custos totais do processo do laboratório de análises clínicas. ......................... 108 Tabela 09 – Custos por atividade e procedimento................................................................ 109 Tabela 10 – Síntese dos custos da atividade Análise Clínica – Hematologia ...................... 110 Tabela 11 – Custos dos exames de Análise Clínica da área da Hematologia ...................... 111 Tabela 12 – Custos da atividade Análise clínica – Bioquímica ........................................... 112 Tabela 13 – Custos dos exames de Análise Clínica da área da Bioquímica ........................ 113 Tabela 14 – Custos dos exames de Análise Clínica da área da Imunologia......................... 114 Tabela 15 – Custos dos exames de análise Clínica da área da Parasitologia ....................... 116 Tabela 16 – Custos da análise clínica da área da Urinálise.................................................. 116 Tabela 17 – Custos dos exames da Urinálise por atividade ................................................. 117 Tabela 18 – Custos da atividade análise clínica – Microbiologia ........................................ 117 Tabela 19 – Custos dos exames da Microbiologia por atividade ......................................... 118 Tabela 20 – Custos médio/unitário dos exames do Laboratório de Análises Clínicas......... 119 Tabela 21 – Viabilidade Financeira da realização do exame – LAC versus Rhezus ........... 120 Tabela 22 – Viabilidade Financeira da realização de exames – LAC versus AMB............. 123 Tabela 23 – Agentes Financiadores do Laboratório de Análises Clínicas ........................... 125 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS 9 ABC – Activity-Based Costing (Custeio Baseado em Atividades) ABM – Activity-Based Management (Gestão Baseada em Atividades) AC – Análise Clínica COPEL – Companhia Paranaense de Energia Elétrica CUAC – Custo Unitário de Atividade Clínica CTAC – Custo Total de Atividade Clínica CUUI – Custo Unitário do Usuário Interno CUUE – Custo Unitário do Usuário Externo CTUE – Custo Total do Usuário Externo CTUI – Custo Total do Usuário Interno HL – Hospital Londrina HURM – Hospital Universitário Regional de Maringá LAC – Laboratório de Análises Clínicas SANEPAR – Saneamento do Paraná SCGA – Sistema de contabilidade geralmente aceita SUS – Sistema Único de Saúde TADM – Tempo de atividade disponível em minutos TADUM – Tempo de atividade utilizada em minutos UEM – Universidade Estadual de Maringá UFMG – Universidade Federal de Minas Gerais UTI – Unidade de Tratamento Intensivo SUMÁRIO 10 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................12 1.1 TEMA DE PESQUISA.................................................................................................. 12 1.2 PROBLEMA DE PESQUISA ....................................................................................... 15 1.3 OBJETIVOS.................................................................................................................. 18 1.3.1 Objetivo geral .........................................................................................................18 1.3.2 Objetivos específicos ..............................................................................................18 1.4 JUSTIFICATIVA .......................................................................................................... 21 1.5 ESTRUTURA DA DISSERTAÇÃO............................................................................. 23 2 ORGANIZAÇÕES HOSPITALARES E SISTEMAS DE CUSTEIO...........................26 2.1 A ORGANIZAÇÃO HOSPITALAR ............................................................................ 26 2.1.1 Definindo a atividade hospitalar ..........................................................................26 2.1.2 Caracterização do hospital filantrópico...............................................................27 2.1.3 Estrutura organizacional hospitalar ....................................................................312.1.4 Produção em uma organização hospitalar ..........................................................34 2.1.5 Conceitos do processo decisório............................................................................ 35 2.2 SISTEMA DE CUSTEIO E SISTEMA DE GESTÃO ABM ....................................... 39 2.2.1 Sistemas de custeio tradicionais............................................................................39 2.2.2 Sistema de custeio baseado em atividades ...........................................................43 2.2.3 Gestão baseada em atividades ..............................................................................49 2.2.4 Considerações sobre os sistemas de custeios .......................................................52 2.3 ESTUDOS SOBRE A APLICABILIDADE DO SISTEMA ABC E DA GESTÃO ABM EM HOSPITAIS.................................................................................................................. 53 2.3.1 Estudos empíricos internacionais .........................................................................54 2.3.2 Estudos empíricos no Brasil..................................................................................58 2.3.3 Considerações finais ..............................................................................................69 3 METODOLOGIA DA PESQUISA...................................................................................71 3.1 INTRODUÇÃO............................................................................................................. 71 3.2 DELINEAMENTO DA PESQUISA............................................................................. 71 3.2.1 Técnicas de coleta e tratamento dos dados..........................................................72 3.2.2 Protocolo de estudo de caso...................................................................................74 3.3 A UNIDADE DE ANÁLISE......................................................................................... 77 3.4 DELIMITAÇÃO DA PESQUISA................................................................................. 78 3.5 CLASSIFICAÇÃO DA PESQUISA ............................................................................. 78 3.6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................ 79 4 ESTUDO DE CASO NO LABORATÓRIO DE ANÁLISES CLÍNICAS.....................80 4.1 INTRODUÇÃO............................................................................................................. 80 4.2 DESCRIÇÃO DA ORGANIZAÇÃO HOSPITALAR.................................................. 81 4.2.1 Estrutura hierárquica e capacidade produtiva do hospital ...............................82 4.3 DESCRIÇÃO DO LABORATÓRIO ............................................................................ 84 4.4.1 Identificação e definição dos recursos e direcionadores primários...................88 4.4.2 Identificação e definição das atividades e dos direcionadores secundários......93 4.4.2.1 Direcionadores Secundários Departamentais.................................................95 4.4.2.2 Direcionadores Secundários Interdepartamentais ........................................102 4.4.3 Identificação dos custos das atividades..............................................................106 4.4.4 Análise dos custos e preços de venda dos serviços ............................................118 4.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 127 11 5 CONCLUSÕES.................................................................................................................129 5.1 INTRODUÇÃO........................................................................................................... 129 5.1.1 Quanto à metodologia de pesquisa .....................................................................129 5.1.2 Quanto ao referencial teórico .............................................................................130 5.1.3 Quanto aos objetivos desta pesquisa ..................................................................133 5.1.4 Sugestões e recomendações para pesquisas futuras..........................................142 5.2 CONCLUSÃO FINAL ................................................................................................ 143 REFERÊNCIAS....................................................................................................................146 ANEXOS................................................................................................................................151 ANEXO 1..........................................................................................................................152 ANEXO 2..........................................................................................................................160 ANEXO 3..........................................................................................................................163 12 1 INTRODUÇÃO 1.1 TEMA DE PESQUISA Os hospitais são considerados um dos tipos de empresa mais difíceis de administrar. A falta de uma administração profissionalizada contribui para que a organização hospitalar nem sempre alcance os resultados sociais, assistenciais, operacionais e econômicos em níveis satisfatórios. A razão dessa complexidade é justificada pelo trabalho emergencial e variável, pela aplicação direta dos serviços em seres humanos, pela difícil mensuração dos resultados, pela diversidade de profissionais envolvidos e pela falha de controle gerencial (CHERUBIN; SANTOS, 1997). As organizações hospitalares procuram adotar ferramentas de gestão próprias frente às transformações que vêm ocorrendo na área da Saúde. Os sistemas de custeio destacam-se entre os sistemas de gestão disponíveis, porque permitem mensurar o custo dos serviços e gerar informações para o planejamento, o controle e a tomada de decisão para a administração das organizações hospitalares. As organizações hospitalares costumam optar ou pelos sistemas de custeio tradicionais (custeio por absorção e custeio direto) ou pelo sistema de custeio baseado em atividades. No que se refere aos resultados proporcionados pela adoção de um desses sistemas de custeio, as organizações devem verificar qual é mais viável, levando-se em consideração a variabilidade dos serviços profissionais prestados e dos recursos disponíveis, assim como as informações geradas para a tomada de decisão. Os objetivos de um sistema de custos adequado para um hospital, conforme a American Hospital Association (AHA), incluem os seguintes componentes: a) informações para comunicação, negociação, planejamento e gerência dos níveis de pessoal hospitalar e entre o hospital e instituições reguladoras; b) uma metodologia de medição dos efeitos de alterações 13 em intensidade e diversidade de casos atendidos; c) um método de avaliação e medição de performance comparado a um plano prefixado (no Brasil, poderia ser a tabela da Associação Médica Brasileira-AMB-, os diversos tipos de convênios privados e o convênio público com o Sistema Único de Saúde); d) uma forma de prover a informação necessária para a gerência eficiente dos recursos da organização em todos os níveis; e) um método capaz de identificar os gastos da organização e melhorar o desempenho financeiro; e f) um método capaz de identificar funções ineficientes e de demonstrar qual é a natureza do problema em termos de custo, volume ou prática organizacional (FALK, 2001). A organização hospitalar, ao exercer suas funções, especialmente a de prevenção de doenças e restauração da saúde, faz com que ocorra o consumo de materiais e de recursos humanos, em função do serviço prestado aos pacientes. Assim, a organização hospitalar pode ser consideradauma empresa fornecedora de multiprodutos, com vários processos de produção altamente interdependentes, cujos produtos se articulam para a produção de seu principal produto, qual seja, o diagnóstico e o tratamento do paciente. Tal interdependência prende-se ao fato de o produto de um processo ser simultaneamente insumo de outro. Dessa forma, um laboratório de análises clínicas em um hospital é um setor produtivo e, ao mesmo tempo, um insumo do objetivo principal de um hospital, que é a prevenção de doenças e a restauração da saúde. A utilização do sistema ABC (Activity Based Costing) também chamado de Custeio Baseado em Atividades, é muito recente no Brasil, comparando-se com as empresas dos Estados Unidos, Inglaterra e Canadá (KHOURY; ANCELEVICZ, 1999). As organizações hospitalares são classificadas pela administração financeira como “indústrias de serviços em saúde”. Ao aplicar os conceitos de custos, controle e planejamento é possível delinear o seu processo produtivo e identificar seus problemas financeiros e operacionais, gerando 14 informações confiáveis para a tomada de decisão. Isso implica a adoção das ferramentas de gestão financeira. Entre os sistemas de custeio, o ABC, desde sua criação, teve sua aplicação voltada para a área de prestação de serviços (KAPLAN; COOPER, 2000). Com o sucesso do sistema ABC, surgiu a gestão ABM (Activity-Based Management), também chamada Gestão Baseada em Atividades. A gestão ABM enfatiza o gerenciamento financeiro e o gerenciamento operacional dos recursos, sendo que a relação entre o sistema ABC e a gestão ABM está no fato de este utilizar informações geradas pelo sistema ABC para o gerenciamento da organização a partir do foco de como o processo produtivo gera resultados para a organização (KAPLAN; COOPER, 2000). A apuração de custos dos serviços, a elaboração de relatórios financeiros, o uso do custo para formação do preço, o uso do custo para a análise de lucratividade, a determinação do preço mínimo para uma transação, o cálculo da receita mínima a ser alcançada, o uso do custo para a avaliação de desempenho e o rateio dos custos indiretos aos serviços, na ordem decrescente de importância, informam as questões gerenciais relacionadas com a gestão de custos formuladas por empresas da área da saúde do Rio de Janeiro (ROSADAS; MACEDO, 2003). Um sistema de custeio ABC possibilita a utilização da gestão ABM na organização, proporcionando resultados satisfatórios. Entre os resultados que a gestão ABM proporciona para a organização, destacam-se: análise da rentabilidade dos serviços; análise do processo produtivo; planejamento e controle orçamentário baseado em atividades; e informações precisas e confiáveis para a tomada de decisão. Portanto, a gestão ABM, a partir da descrição do processo feito pelo sistema ABC, analisa e controla o processo produtivo, os custos de cada atividade e o nível de aproveitamento dos recursos disponíveis; executa o planejamento, o orçamento e o controle dos gastos; e analisa a lucratividade dos serviços prestados. 15 1.2 PROBLEMA DE PESQUISA Os problemas na área de Saúde no Brasil, como falta de recursos financeiros, baixos investimentos e custos elevados na prestação dos serviços, não se referem somente à iniciativa pública. A organização hospitalar é vital para a sociedade, seja pública ou privada. Para Cecílio (1997) e Gonçalves (1998), isso ocorre em função de seu estreito vínculo com a comunidade e por estar presente em momentos fundamentais da vida do ser humano. A organização hospitalar detém tecnologia sofisticada e ritmo operacional dinâmico, porém está passando por um momento de mudanças. Problemas na estrutura organizacional e na gestão de recursos fazem com que essas organizações busquem cada vez mais um modelo de gestão ajustado à sua realidade. Organizações hospitalares internacionais buscam aprimorar os sistemas de informações envolvendo médicos, enfermeiras e os demais níveis de gestão, fazendo com que haja um fortalecimento da gerência nos serviços da saúde (COSTA et al., 2000). É importante reconhecer também as limitações do gerenciamento baseado na atividade e suas oportunidades. Ou seja, para tomar muitas de suas decisões, uma organização precisa dispor de uma base de informações mais ampla do que o mero conhecimento de sua estrutura de custos (KAPLAN; COOPER, 2000). A Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP) e o Ministério da Saúde (MS), a pedido do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), realizaram um amplo estudo sobre a situação dos hospitais filantrópicos brasileiros, divulgado em oito de novembro de 2003 na cidade do Rio de Janeiro. Este estudo mostrou que os hospitais filantrópicos precisam, além de mais recursos, de orientação e controles mais precisos, tanto na área assistencial quanto na administrativa. Segundo o coordenador do estudo, Pedro Ribeiro 16 Barbosa, “a maioria dos hospitais filantrópicos tem baixa performance gerencial” (REGIS, 2003). No caso da administração hospitalar, há uma carência real e concreta, constatada pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Uma pesquisa realizada pelo órgão em uma amostra de mais de 100 hospitais filantrópicos, distribuídos em 14 estados e 84 municípios, constatou que o setor apresenta "padrão incipiente de gestão", com instrumentos e práticas gerenciais defasados em relação aos padrões gerenciais contemporâneos. "Certamente, estas atuais condições, se não já comprometem seus resultados, muito certamente põem em risco o futuro de boa parte do parque", afirma o relatório do BNDES. Para mudar esse quadro e evitar um colapso da rede, o banco sugere "incentivos à maior profissionalização da gestão, com incorporação de novos instrumentos e capacitação profissional" (CELESTINO, 2003, p.1). A literatura financeira hospitalar está cheia, especialmente durante o período de 1983-1990, de artigos que prescrevem métodos detalhados de coletar dados sobre custos, e tudo a fim de reavaliar a rentabilidade hospitalar (FALK, 2001). Isso tem ocorrido, principalmente, porque os sistemas de apuração de custos passaram a ser considerados o componente do sistema de informação financeira mais importante para a análise gerencial e a tomada de decisões estratégicas das organizações hospitalares, fazendo que as organizações obtenham vantagens competitivas a partir desses sistemas de custeio (KAPLAN; COOPER, 2000). Mais do que a necessidade de se adequarem a esta nova realidade, com a profissionalização da administração, na busca por um desempenho gerencial eficaz, os hospitais precisam também alcançar os resultados sociais, assistenciais, operacionais e econômicos que sejam considerados adequados para a sociedade (CHERUBIN, 1998). Dessa forma, as empresas 17 estão aperfeiçoando seus sistemas de custeio para projetarem produtos e serviços que correspondam às expectativas dos clientes e possam ser produzidos e oferecidos com lucro, sinalizando onde é necessário realizar aprimoramentos de qualidade, com eficiência e rapidez, orientando o mix de produtos e decidindo sobre seus investimentos, escolhendo fornecedores e negociando preços, entre outros benefícios que um sistema de custos pode proporcionar (KAPLAN; COOPER, 1998, ATKINSON et al., 2000). Segundo Falk (2001), o sistema ABC originou-se nos bastidores das indústrias e têm propiciado grandes benefícios para as empresas prestadoras de serviços, até mesmo hospitais. Em organizações de serviços, onde há aumento da variedade e complexidade de operações há também maior demanda de pessoal indireto e de apoio. Nesse sentido, o ABC se mostra eficaz, porque, mais do alocar os seus custos, permite identificar as atividades que estão sendo executadas pelos recursos indiretos e de apoio (KAPLAN; COOPER, 2000, p. 99). Especificamente na área da Saúde, diversos autores brasileiros contemplamo assunto em suas pesquisas. Por exemplo: Baumgartner (1998), Bittencourt (1999), Botelho (2000), Brimson (1996), Ching (1999, 2001a, 2001b), Cogan (1997), Falk (2001), Habib (1999), Raimundini (2003) e Tognon (1999). Há, também, comprovação de um hospital filantrópico brasileiro, considerado de grande porte, que tem implementado a metodologia do custeio baseado em atividades com sucesso, conforme demonstram as pesquisas de Fukumoto, Freitas (2000), Freitas e Fukumoto (2001) e Freitas, Fukumoto e Souza (2002). A pergunta diretriz da pesquisa realizada em um hospital filantrópico situado no estado do Paraná, é: Como o sistema de custeio baseado em atividades pode contribuir para a gestão financeira do laboratório de análises clínicas de um hospital filantrópico? 18 1.3 OBJETIVOS Segundo Cooper e Schindler (2003), para estudos de natureza descritiva, os objetivos podem ser declarados como a própria questão de pesquisa. Os objetivos devem ser utilizados como base do planejamento para realizar a pesquisa proposta, fluindo naturalmente através dos problemas e possibilitando a discussão da proposta mediante a análise dos dados e das metas. Concomitante ao problema de pesquisa, os objetivos são classificados em geral e específicos. 1.3.1 Objetivo geral Analisar a aplicabilidade do sistema de custeio baseado em atividades no Laboratório de Análises Clínicas de um hospital filantrópico. 1.3.2 Objetivos específicos Realizar uma revisão crítica da literatura sobre os sistemas de custeio utilizados em organizações hospitalares, englobando evolução teórica e análises empíricas, destacando o uso do custeio ABC; Realizar e analisar, comparativamente, os sistemas de custeio atualmente utilizados em organizações hospitalares; Descrever as organizações hospitalares em termos de estrutura organizacional e de gestão de custos; Identificar, descrever e discutir o processo gerencial e as atividades realizadas no Laboratório de Análises Clínicas do hospital estudado e mostrar como as informações são geradas e utilizadas para a gestão de custos e financeira do hospital; Apurar os custos das atividades executadas no Laboratório de Análises Clínicas; e, Calcular e analisar os custos apurados com o método do custeio ABC e tradicional no Laboratório de Análises Clínicas. 19 Para alcançar atingir individualmente os objetivos específicos, formulou-se um protocolo do estudo de caso, a ser respondido no decorrer da pesquisa: Quais são os sistemas de custos utilizados por empresas hospitalares? Dentre os sistemas de custos existentes, quais são os limites e as deficiências para as empresas de serviços hospitalares? Quanto à utilização do sistema ABC em organizações hospitalares, quais foram os resultados alcançados por pesquisas anteriores? Como está formada a estrutura organizacional do hospital, especificamente no Laboratório de Análises Clínicas e quais são as suas principais características? Como o sistema de custeio atualmente utilizado pela administração do hospital contribui para a gestão hospitalar? Quais são as fontes de receita e de despesas? Como elas estão relacionadas na visão da administração do hospital? O hospital utiliza qual sistema de custeio? Quais seus benefícios e desvantagens? Quais são as atividades desenvolvidas pelo hospital no Laboratório de Análises Clínicas? Como elas são distribuídas? Quais são os processos de tomada de decisão mais dependentes do sistema de custos? Quais são os custos das atividades desenvolvidas no Laboratório de Análises Clínicas? Quais são as contribuições oferecidas pelo sistema de custeio baseado em atividades? Quais são os benefícios encontrados e os problemas que surgiram com a utilização do sistema de custeio baseado em atividades no hospital? De acordo com o problema definido e em consonância com o objetivo geral descrito, do qual decorrem os objetivos específicos e o respectivo protocolo do estudo de caso, a pesquisa será desenvolvida em uma organização hospitalar, visando testar, de forma empírica, as questões 20 levantadas. Para efetuar a demonstração da relação existente entre os objetivos específicos de pesquisa e as questões formuladas, elaborou-se o quadro 1. Problema de pesquisa Como o sistema de custeio baseado em atividades pode contribuir para a gestão financeira de um hospital filantrópico, especificamente no seu Laboratório de Análises Clínicas? Objetivo geral Analisar a aplicabilidade do sistema de custeio baseado em atividades no Laboratório de Análises Clínicas em um hospital. Objetivos específicos Realizar uma revisão bibliográfica sobre os sistemas de custeios utilizados em organizações hospitalares. Quais são os sistemas de custeio utilizados por empresas hospitalares? Identificar e discutir trabalhos de pesquisa relacionados ao custeio ABC em organizações hospitalares. Analisar, comparativamente, os sistemas de custeio atualmente utilizados em organizações hospitalares. Dentre os sistemas de custeios existentes, quais são os limites e as deficiências para as empresas de serviços hospitalares? Quanto à utilização do sistema ABC em organizações hospitalares, quais foram os resultados alcançados por pesquisas anteriores? Quais são os benefícios encontrados e os problemas que surgiram com a utilização do sistema de custeio baseado em atividades no hospital? Descrever as organizações hospitalares em termos de estrutura e de gestão de custos Como é a estrutura de uma organização hospitalar? Quais são os processos de tomada de decisão mais dependentes do sistema de custos? Descrever, identificar e discutir o processo gerencial e as atividades realizadas no Laboratório de Análises Clínicas do hospital estudado e mostrar como as informações são geradas e utilizadas para a gestão de custos e financeira do hospital. Como está formada a estrutura organizacional, especificamente do Laboratório de Análises Clínicas, e quais são as suas características? Quais são as fontes de receita e despesas? Como elas estão relacionadas na visão da administração do hospital? O hospital utiliza qual sistema de custeio? Quais são seus benefícios e desvantagens? Como o sistema de custeio atualmente utilizado pelo hospital contribui para o processo de tomada de decisão? Quais são as atividades desenvolvidas no Laboratório de Análises Clínicas do hospital? Como elas são distribuídas? Como as informações são geradas e utilizadas para o gerenciamento de custos e financeira no hospital? Apurar os custos das atividades executadas no Laboratório de Análises Clínicas. Quais são os custos das atividades desenvolvidas no Laboratório de Análises Clínicas? Analisar os custos apurados no Laboratório de Análises Clínicas com o uso do custeio ABC Quais são as contribuições oferecidas pelo sistema de custeio baseado em atividades no Laboratório de Análises Clínicas? QUADRO 1 – Problema de pesquisa e objetivos 21 1.4 JUSTIFICATIVA O ambiente no quais as organizações hospitalares estão inseridas torna-se cada dia mais competitivo, em virtude das várias mudanças econômicas ocorridas nos níveis mundial, nacional e regional (BRIMSON, 1996; FALK, 2001). Hospitais e outras instituições de saúde têm sido obrigados, em tempos recentes, a mudar sua forma de analisar os dados de custos, devido à tecnologia e a seus impactos no capital, na tecnologia e no conhecimento. Para hospitais filantrópicos, especificamente, o parque de equipamentos está obsoleto e a tecnologia empregada é pouca e defasada, na maioria das entidades. Os hospitais filantrópicos precisam, para serem vistos como tal, atender no mínimo 60% de pacientes pelo Sistema Único da Saúde (SUS). No entendimento dos gestores, os valores repassados precisam de reajustes urgentes, uma vez que estão defasadas. Além desse fator, o restante dos serviços,40%, que podem oferecer para atendimentos particulares ou planos médicos, não cobrem as despesas de um hospital (REGIS, 2003). A conseqüente elevação nos gastos com a saúde versus agentes financiadores cada vez mais interessados em pagar menos por serviços prestados de alta qualidade faz com que as informações de custos sejam cada vez mais importantes para os tomadores de decisão. No Brasil, a alta competitividade entre as organizações de saúde e a necessidade de diminuir as despesas sem prejudicar a qualidade induzem os administradores hospitalares a implantarem uma gerência de qualidade total do atendimento médico-hospitalar (FALK, 2001; COGAN, 1997). As instituições de saúde, segundo pesquisa realizada por Rosadas e Macedo (2003), não apresentam métodos de custos adequados ao processo de tomada de decisão. Abbas (2001) 22 afirma que muitas empresas sequer conseguem aplicar ferramentas básicas de gestão de custos. Especificamente em hospitais filantrópicos no Brasil, a grande maioria (83%) foi considerada como de nível incipiente de gestão e nenhum deles foi classificado como avançado em termos de gerenciamento. No cruzamento da classificação gerencial com o nível de complexidade assistencial, porte de leitos e porte financeiro observa-se que 98% dos hospitais da amostra que apresentam um desenvolvimento gerencial incipiente (83%) são de baixa e média complexidade, 85% possuem menos de 100 leitos e 88% são de micro ou pequeno porte financeiro. Os 17% restantes, classificados como em desenvolvimento, apresentam-se com um perfil diferente do segmento majoritário da amostra. Desses, 91% são de média e alta complexidade e 55% possuem mais de 100 leitos. No que tange ao uso dos instrumentos gerenciais, estas organizações não apresentam racionalidades gerenciais típicas de complexos organizacionais presentes em outros setores da economia, evidenciando, ainda, uma discrepância entre os componentes da entidade e denunciando uma limitada coordenação do complexo hospitalar como sede (LIMA et al., 2004). Esta é uma área de grande oportunidade para a aplicação de ferramentas de gestão de custos, percebida apenas precariamente neste setor. Neste contexto, as informações oriundas dos métodos tradicionais de custos apresentam várias limitações quanto à sua aplicabilidade, principalmente quanto à correta distribuição dos custos indiretos, que a cada dia representam uma parcela maior dos custos totais, em especial nas atividades prestadoras de serviços. Dessa forma, a metodologia tradicional não é estratégica, pois permite subsídios cruzados entre serviços e produtos. 23 As pesquisas e as aplicações realizadas em empresas industriais têm contribuído para o desenvolvimento de novas correntes e a evolução dos sistemas de custos; em particular, para a sua aplicação em empresas de serviços. A literatura apresenta diversos estudos sobre a aplicabilidade do sistema de custeio baseado em atividades, inclusive em hospitais. Em geral, o processo de implantação é parcialmente descrito, limitando-se à análise de algumas vantagens e dificuldades encontradas na aplicação do sistema de custeio baseado em atividades. Diante dessa limitação, as organizações de saúde têm tido dificuldade na implementação e manutenção deste custeio, necessitando, portanto, de pesquisas mais aprofundadas sobre o tema. Associado a essa justificativa, está o fato de esta pesquisa contribuir para o desenvolvimento da administração hospitalar no Brasil, sendo possível confirmar ou não os benefícios apontados pelas teorias. 1.5 ESTRUTURA DA DISSERTAÇÃO A pesquisa divide-se em quatro etapas − Introdução, Fundamentação Teórica, Pesquisa Empírica e Conclusão −, compondo-se de seis capítulos. A primeira etapa do trabalho é a Introdução, apresentada no capítulo 1, que inclui o tema de pesquisa, o problema de pesquisa, os objetivos e a justificativa da pesquisa. A finalidade deste capítulo é caracterizar o problema e apresentar os objetivos e a justificativa de pesquisa. Nesta seção, foram enfatizados os problemas de administração financeira encontrados nos hospitais brasileiros. Na segunda etapa, desenvolve-se a Fundamentação Teórica, que tem por finalidade apresentar a base de conhecimento teórico que será utilizada para interpretar os resultados da pesquisa. É compreendida pelo capítulo 2 e discorre sobre estrutura, produção, conceitos do processo decisório e sistemas de custeios utilizados em organizações hospitalares. Neste capítulo, são 24 contempladas as pesquisas de casos empíricos sobre a aplicabilidade do método de custeio baseado em atividades em organizações hospitalares. A terceira etapa da pesquisa é compreendida pelos capítulos 3, 4 e 5. O capítulo 3 apresenta a metodologia utilizada para fazer a pesquisa e descreve as técnicas utilizadas para a coleta de dados e o âmbito dos dados coletados, finalizando com a apresentação dos fatores que permitiram delimitar o objeto da pesquisa. O capítulo 4 apresenta a descrição da organização hospitalar e da unidade de pesquisa e realiza a aplicação da metodologia de custeio baseado em atividades, conforme apresentada na literatura e nas pesquisas disponíveis. No capítulo 5, realiza-se a análise e discussão dos resultados da pesquisa do Hospital Filantrópico, especificamente do Laboratório de Análises Clínicas. A última etapa, denominada Conclusão, refere-se ao capítulo 6. Nesta etapa, é realizada a avaliação da pesquisa, expondo as limitações que ocorreram durante o seu desenvolvimento e colocando as contribuições do estudo. Ao final, é apresentada a conclusão da dissertação. A figura 1 apresenta uma síntese da estrutura desta dissertação. CCaappííttuulloo 11 Introdução CCaappííttuulloo 22 Organização hospitalar, revisão bibliográfica e métodos de custeio CCaappííttuulloo 55 Análise dos resultados CCaappííttuulloo 44 Estudo de caso no Hospital Filantrópico CCaappííttuulloo 33 Metodologia de pesquisa 25 CCaappííttuulloo 66 Conclusões finais FIGURA 1 – Estrutura da dissertação 26 2 ORGANIZAÇÕES HOSPITALARES E SISTEMAS DE CUSTEIO 2.1 A ORGANIZAÇÃO HOSPITALAR O objetivo desta seção é compreender o que é uma organização hospitalar. Inicia-se com a definição da atividade hospitalar e a caracterização do Hospital Filantrópico. São discorridos os tópicos sobre a estrutura organizacional, sobre a produção em uma organização hospitalar, sobre os conceitos do processo decisório e as influências do meio ambiente no processo decisório hospitalar e, por fim, sobre a informação de custo para a tomada de decisão. Na próxima seção, são tratados os assuntos referentes à revisão da literatura sobre custeio e gestão baseada em atividades. 2.1.1 Definindo a atividade hospitalar A palavra hospital tem origem na língua latina, do vocábulo hopes, que significa hóspede. Desse vocábulo originou as palavras hospitalis e hospitium, as quais designavam, respectivamente, lugar que recebiam hóspedes e estabelecimentos acolhedores de enfermos pobres, incuráveis ou doentes mentais (CHERUBIN; SANTOS, 1997). No século IV d.C., ligado a Igreja Católica, com caráter puramente filantrópico e sob responsabilidade direta do Estado romano, organizaram-se os primeiros hospitais. Atualmente, os hospitais têm um ordenamento jurídico e estão presente em todos os países do mundo. A organização hospitalar, ao exercer suas funções, especialmente os de prevenção de doenças e restauração da saúde, incorre no consumo de materiais e de recursos humanos, em função do serviço prestado aos pacientes. Esse consumo ocorre em razão da poliformidade das atividades desenvolvidas, a saber: a) atividades clínicas − desenvolvidas no ambulatório, pronto atendimento, unidades de internação, centro cirúrgico e obstétrico, exercidas por médicos e enfermeiras; b) atividades administrativas − sãorealizadas pela administração 27 financeira, de recursos humanos, do almoxarifado e do patrimônio; e c) atividades de apoio ou assistencial − lavanderia, segurança, zeladoria, higiene e limpeza, nutrição, farmácia e laboratório. A organização hospitalar pode ser considerada uma empresa de multiprodutos, com vários processos de produção altamente interdependentes, cujos produtos se articulam para a produção de seu principal produto, representado pelo diagnóstico e tratamento do paciente. Tal interdependência refere-se ao fato de o produto de um processo ser simultaneamente insumo de outro. Por exemplo, a roupa lavada é produto da lavanderia e, simultaneamente, insumo do processo de produção de cirurgias e internação (LIMA; BARBOSA, 2001). 2.1.2 Caracterização do hospital filantrópico As entidades filantrópicas, ou organizações filantrópicas, representam um foco específico: o bem-estar social de serviços que representa o acesso da população carente aos serviços essenciais de saúde oferecidos por estas organizações. Suas ações sociais são direcionadas para complementar as ações do governo, num quadro crescente de desigualdade e de carências sociais. Atualmente, para renovarem o certificado de entidade de fins filantrópicos pelo Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), as instituições filantrópicas precisam apresentar documentos comprobatórios e controles internos que possibilitem a veracidade das informações, conforme inciso IV do art. 18 da lei n. 8.742/93 (SOUZA; GIENTROSKI, 2003). O setor hospitalar filantrópico é atualmente responsável por cerca de 1/3 do parque hospitalar existente no Brasil. São 1.917 unidades, com aproximadamente 150 mil leitos, a maioria prestadora de serviços SUS. Totalmente desvinculadas entre si, tais unidades hospitalares filantrópicas, espalhadas por todo território nacional, apresentam grande heterogeneidade em 28 suas estruturas gerenciais e tecnológicas, seus perfis e suas práticas assistenciais quanto à clientela. Essas organizações cumprem desde funções básicas, desvinculadas das redes de serviços, até práticas médicas de última geração e elevado grau de complexidade, sobretudo nas grandes centros urbanos, sendo alguns estabelecimentos referências tecnológicas e assistenciais para a saúde no Brasil (GERSCHMAN et al., 2003). Das 6.545 entidades filantrópicas, apenas 11% prestam assistência à educação. Na sua maioria, atuam na área de assistência social como creches, asilos e APAES. O setor da saúde corresponde a 17% e compreende os hospitais filantrópicos e as Santas Casas. A filantropia com certificações, benefícios e isenções governamentais é predominante nas regiões Sul e Sudeste, onde representam 83% do total de entidades filantrópicas no Brasil (SOUZA; GIENTORSKI, 2003). Decretos aprovados pelo Ministério da Saúde (MS) criam condições para o acesso ao certificado de filantropia, ao vincular a condição de hospital estratégico para o SUS. O decreto nº, 4481, de 22 de novembro de 2002, define os requisitos a serem preenchidos pelos hospitais gerais ou especializados, sendo condição comum a todas as categorias a realização de no mínimo 30% de internações, medidas em pacientes-dia para o SUS. São seis as categorias definidas neste decreto: Hospital geral que preste serviço no sistema de alta complexidade em pelo menos quatro grupos entre os definidos pelo Ministério da Saúde, no mesmo decreto; Hospital geral que tenha ao menos dois programas de ensino em pós-graduação e preste serviço de alta complexidade em três grupos entre os dez definidos pelo MS; Hospital especializado com ao menos um programa de ensino de pós-graduação e que preste serviço em alta complexidade no sistema de sua especialidade; 29 Hospital geral ou especializado enquadrado no sistema estadual de referência hospitalar para atendimento de áreas de urgência-emergência ou gestão de alto risco; Hospital geral ou especializado que tenha um programa de ensino de pós-graduação e seja reconhecido pelo MS como centro de referência em uma das áreas definidas pelo ministério; e Hospital geral que tenha um programa de ensino em pós-graduação e que realize atividade estratégica de saúde de interesse do gestor local, com formalização e homologação da Saúde. Segundo dados da Federação das Santas Casas e Hospitais Filantrópicos do Rio Grande do Sul (2005), no ano de 2004 as internações em todos os hospitais do Brasil referentes aos pacientes atendidos pelo SUS representaram 12.362.477 internações, sendo que destes atendimentos 35,78% foram provenientes de atendimentos prestados por entidades filantrópicas, ou seja, 4.423.341 atendimentos. Pesquisa do ano de 2003 demonstrou que os hospitais filantrópicos atenderam a 38% de pacientes internados pelos SUS, o que representou 32% dos leitos totais do Brasil. Do total, 40% eram de pequenos hospitais, ou seja, aqueles que possuíam menos de 50 leitos; e 73% de médios hospitais, ou seja, aqueles com menos de 100 leitos, enquanto somente 3% eram de grandes hospitais, ou seja, aqueles que possuem mais de 300 leitos (REGIS, 2003). As pesquisas revelaram a importância do setor filantrópico para a política pública de atenção hospitalar no País, tanto que houve um aumento percentual de 3,78% do atendimento prestado pela filantropia. A relevância do SUS para o setor filantrópico tem sido substancial. Segundo pesquisa de Gerschman et al. (2003), 79% das internações eram de pacientes do SUS e menos de 20% dos hospitais filantrópicos não prestaram serviços para o setor privado. Pesquisa da 30 Escola Nacional de Saúde Pública e do Ministério da Saúde mostrou que cerca de 65% da receita desses hospitais era proveniente do SUS. Segundo Gerschamn et al. (2003), na condição de operadoras de planos, identifica-se mais de uma centena de hospitais que são simultaneamente prestadores e operadores de planos próprios de saúde. Essas entidades filantrópicas têm implantado planos próprios de estratégia mercadológica, com a perspectiva de um mix de financiamento, especialmente em grandes entidades localizados nos maiores centros urbanos com menor dependência do SUS. Outras apresentam tais produtos como remanescentes e/ou como evolução dos antigos “planos associados” ao hospital ou entidade sem racionalidades mercadológicas ou econômico- financeiras específicas. Muitos desses planos são igualmente confundidos ou acoplados às estruturas da própria entidade e/ou hospital, deles não se diferenciando quanto a receitas, custos, reservas e todos os demais instrumentos gerenciais, como plano de contas e provisões. Parte das entidades sequer se apresenta como empresa constituída, sendo o plano apenas mais uma atividade dentro do próprio hospital, impondo limites à ação gerencial (GERSCHMAN et al., 2003). No âmbito do financiamento do custeio, o Ministério da Saúde implantou o programa integral SUS/MS. Trata-se de um conjunto de incentivos fixados na tabela geral de procedimentos do SUS exclusivo para o setor, diferenciando os hospitais filantrópicos em três subgrupos: hospitais estratégicos, definidos nacionalmente pelo Ministério da Saúde, num total de 62, que recebem incentivos na tabela igual a 25%; hospitais estratégicos em âmbito estadual, composto por até 138 hospitais, definidos pelos respectivos gestores, auferindo um incentivo de 15% sobre os valores da tabela; e demais hospitais filantrópicos, com acréscimo de 8% na tabela (GERSCHMAN et al., 2003). 31 Um dos mecanismos de controle atualmente aplicados ao setor de filantropia é o envio obrigatório de relatórios ao INSS, até o dia 30 de abril de cada ano, relativos ao ano anterior. Para as entidades que gozam da cota patronal do INSS, o envio do relatório anual é uma condição para a manutenção da mesma. A presença dos auditores do SUS é bem mais freqüente, sobretudo na vigilância sanitária e, em menor grau, na assistênciae na administração (GERSCHMAN et al., 2003). A Controladoria dessas instituições deve dispor de todas as informações necessárias para sustentar a continuidade da obtenção do certificado de entidade filantrópica. Pela dificuldade em obter algumas informações, principalmente quanto ao conceito de gratuidade, muitas instituições filantrópicas acabam perdendo o benefício. Ressalta-se então a importância de buscar caminhos para que essas entidades possam obter auxílio para demonstrar de forma mais adequada e transparente o que realizam em prol da coletividade, buscando atender às formalidades da Lei, dos princípios fundamentais e das normas brasileiras de contabilidade (SOUZA; GIENTROSKI, 2003). 2.1.3 Estrutura organizacional hospitalar A estrutura organizacional hospitalar é definida por Gonçalves (1998, p. 24) como sendo o arcabouço definidor de responsabilidades, de autoridades e de comunicação entre os indivíduos em cada segmento da organização, bem como da função de cada parte com as demais e para com a organização como um todo. De forma geral, a estrutura organizacional é montada com o objetivo de promover a coordenação dos membros da organização e apresenta-se como uma estrutura grande e complexa. Na visão da Associação Americana de Hospitais, os hospitais são considerados organizações complexas que realizam atividades altamente importantes na sociedade. Elas apresentam 32 níveis significativos de gastos e são as maiores empregadoras na comunidade onde estão instaladas (FALK, 2001). A estrutura organizacional consiste na maneira como uma organização define e divide as funções e as atribuições da função e, também, como essas atribuições são agrupadas e coordenadas, a fim de que a organização obtenha resultados. Para isso, a estrutura organizacional é dimensionada em “especialização do trabalho”, “departamentalização”, “cadeia de controle” e “centralização ou descentralização da tomada de decisão”. O Quadro 2 apresenta as definições destes níveis de descrições da estrutura. A estrutura organizacional define a hierarquia da organização, as responsabilidades e autoridade dos indivíduos e o modo como se dá o processo de comunicação na hierarquia (ROBBINS, 1999). Nível de descrição Definição Especialização do trabalho Descreve o grau em que as funções, na organização, estão divididas em tarefas (atribuições da função) Departamentalização É o agrupamento das funções para que as tarefas comuns ou relacionadas possam ser coordenadas conjuntamente Cadeia de controle Esclarece quem se reporta a quem dentro da organização, seja tanto para recorrer quanto para ser recorrido quando há problemas. Para isso, é dada autoridade a fim de atender às responsabilidades pertinentes a unidade que lhe é designada. Centralização ou descentralização da tomada de decisão Refere-se ao modo como é o processo decisório, à delegação de autoridade e à autonomia para a tomada de decisão. QUADRO 2 – Nível de descrição de estrutura Fonte: adaptado de Robins (1999). A estrutura organizacional centralizada até aqui adotada pela administração hospitalar está desgastada, resultando em ineficiência na coordenação das ações das atividades na prestação do serviço, improvisação na tomada de decisão, ausência quase completa de compromisso com os resultados e desperdício de recursos devido ao mau uso da capacidade instalada. Reconhece-se a necessidade de mudar a estrutura organizacional dos hospitais, de modo que atendam às necessidades exigidas pelo ambiente no qual está inserido o hospital, integrando 33 os funcionários, com o objetivo de melhorar o desempenho operacional e os resultados obtidos (GONÇALVES, 1998). Em hospitais, os médicos julgam-se independentes, revelando descomprometimento com a equipe e com a organização. É comum o médico dividir seu tempo entre a atividade profissional e a administrativa em uma organização. Porém, muitas vezes, não está preparado para exercer esta função, revelando resistência às práticas administrativas e dedicando-se à medicina (RAIMUNDINI, 2003): As decisões geralmente são encaminhadas para a Diretoria da atividade, embora muitas decisões devessem ser tomadas por profissionais dos níveis intermediários, o que permitiria à Direção maior disponibilidade para desenvolver o trabalho de planejamento, coordenação e interlocução com as demais atividades e com a própria atividade. Na atividade de apoio não existe espírito de equipe, por ser o grupo mais heterogêneo. Não é trabalhada a idéia de que os pacientes são os consumidores dos serviços prestados, principalmente nas funções de hotelaria do hospital, os quais também devem ser oferecidos com qualidade. Há falhas na comunicação entre os funcionários de diferentes níveis hierárquicos. Esse problema é mais evidente na atividade clínica, quando a enfermagem assume competências que são atribuídas aos médicos, ao mesmo tempo em que a enfermagem procura firmar sua posição na hierarquia organizacional. Esses problemas fazem com que os pontos fortes da organização hospitalar passem despercebidos ou tornam-se mal utilizados pela gestão. Podem, ainda, ofuscar a qualidade intrínseca dos serviços (as especialidades clínicas que o hospital oferece, os equipamentos que o hospital possui, o cuidado com o bem-estar do paciente, entre outros fatos que o 34 hospital pode oferecer para atender bem o paciente) e a qualidade extrínseca (a imagem que o paciente leva consigo a respeito do hospital e do atendimento recebido). Quando atingem a qualidade dos serviços prestados a ocorrência desses problemas revela que os profissionais estão limitados apenas a executar suas tarefas, desconhecendo a importância delas para a organização como um todo. 2.1.4 Produção em uma organização hospitalar A função produção é central para todo tipo de organização, mas existem algumas funções que servem de apoio à função de produção, como os recursos humanos, as compras e a engenharia segundo Slack et al. (2002). NOGUEIRA (1994, p.15) comenta que a produção de serviços de saúde é executada por um grupo extremamente heterogêneo de agentes, em que aparecem, de um lado, os médicos e, de outro, uma ampla gama de trabalhadores, com níveis educacionais e de qualificação profissional muito distinto entre si. O usuário de saúde não é como um consumidor comum diante das mercadorias e muitas vezes, está desprovido de conhecimentos técnicos que lhe permitam avaliar a adequação do serviço às suas necessidades. Desse modo, os hospitais são considerados organização prestadora de serviços, devido à simultaneidade entre a produção e o consumo do bem, o qual é intangível. Caracteriza-se como um trabalho de interface com o cliente (o paciente), devido à proximidade com o sujeito que recebe os serviços e à qualificação dos profissionais envolvidos (médicos e enfermeiras) para prestar os serviços. Assim, os médicos e enfermeiras são os agentes responsáveis pela qualidade no atendimento e na assistência no tratamento dos pacientes, com influência direta no resultado total. 35 Todo tipo de produção pode estar compreendido no modelo input e output. Os hospitais, por exemplo, possuem os inputs, que serão utilizados na produção. Dessa forma, podem ser classificados como recursos transformados medicamentos, sangue e informações a respeito do paciente. Os recursos de transformação agem sobre os recursos transformados, compreendendo desde o prédio onde está instalado o hospital, até o corpo médico e o de enfermagem, por exemplo. O processo de transformação corresponde à segunda etapa. Consiste em transformar materiais, informações e consumidores em input. A última etapa corresponde ao output, ou seja, ao resultado do processo, que poderá ser a produção de um novo bem ou serviço prestado. No hospital, o produto corresponde à recuperação do paciente, como se pode observar na figura 2.ambiente aammbbiieennttee ambiente aammbbiieennttee Recursos transformados: Materiais, informações, consumidores. Recursos de transformação: Instalações e pessoal Processo de Transformação consumidore s Recursos de Entrada INPUT Saídas de produtos e Serviços OUTPUT FIGURA 2 – Modelos de transformação Fonte: Adaptado de Slack et al. (2002, p. 36). 2.1.5 Conceitos do processo decisório Cooper e Schindler (2003, p. 82) definem a teoria da decisão dizendo que “quando há alternativas para escolher, uma forma racional de chegar a uma decisão é tentar avaliar os resultados de cada ação”. Duas ações possíveis podem representar duas formas diferentes de organizar uma empresa, desta forma, o administrador escolhe a ação que melhor representa o 36 resultado, ou seja, a ação que satisfaça ou exceda os critérios estabelecidos para o julgamento das alternativas. O conhecimento1 e a análise do resultado são empregados para interpretar a informação e para escolher a melhor ação. A administração abrange uma série de aspectos da organização: pessoas, materiais e recursos financeiros, produtivos e políticos, por exemplo. Entretanto, o processo decisório é algo que está presente em todas as funções e problemas de qualquer organização. A informação pode gerar mudanças nos modelos empresariais, porém somente terá valor para aqueles que têm uma base de conhecimento para utilizá-la na decisão. O modelo mais simples de tomada de decisão pode ser dividido em quatro fases: inteligência, desenho (ou projeto), escolha e implementação segundo Alter (1992). A inteligência inclui coleta de dados, análise do meio ambiente e detecção de problemas a serem resolvidos. Tem como desafios obter dados completos e corretos, e compreender o que o dado realmente significa para a decisão. O desenho inclui a sistemática de estudar o problema, a criação de alternativas e a avaliação dos resultados. Tem como desafios abranger o problema, fazendo-o gerenciável, criar reais alternativas e desenvolver critérios e modelos para avaliação de alternativas. A escolha é a seleção de alternativa preferida, e os desafios incluem a reconciliação de objetivos e interesses, incorporando incertezas e gerenciando processos de decisão em grupo. A última fase, implementação, consiste em pôr a decisão em prática, ou seja, divulgar para as pessoas apropriadas, construir consenso de que a decisão faz sentindo e criar comprometimento. Tem como desafio certificar-se de que a decisão e sua implicação serão 1 O conhecimento é a combinação de instintos, idéias, regras e procedimentos que guiam ações e decisões (ALTER, 1992). 37 compreendidas e que outras pessoas na organização seguirão. Essas fases podem ser melhor visualizadas na figura 3. O processo decisório, sua dinâmica e característica ganham influência do contexto, principalmente do setor de atuação da organização. No processo decisório, um sistema de informações é importante, sobretudo na fase da inteligência, para assegurar a coleta, a triagem e o acesso às informações geradas pela organização. O processamento de informação faz parte de uma parcela substancial do trabalho dos profissionais de um hospital, sejam eles médicos enfermeiros ou administradores. Dado Inteligência Desenho ou projeto Escolha Implementação R es ul ta do FIGURA 3 – Diagrama das fases de tomada de decisão Fonte: Adaptado de Alter, 1992. Na gestão estratégica de custos, diversos são os processos apoiados, segundo Vasconcelos (1996): a escolha das metas de produção e vendas de produtos/serviços “mix de produção e de vendas), em situações de múltiplas possibilidades e distintas condições produtivas e de mercado, tendo em vista a capacidade da produção instalada; a determinação dos níveis adequados de custos fixos, a partir da possibilidade de escolher estruturas tecnológicas ou organizacionais alternativas; a fixação de preços adequados para produtos/serviços, a partir das metas de vendas estabelecidas e/ou administradas segundo as margens de contribuição unitária e total dos produtos/serviços, em face da necessidade de praticar preços competitivos; e 38 a definição de alterações ou, mesmo, de eliminação ou terceirização de procedimentos, a partir dos custos nos diversos setores, áreas, divisões ou atividades das empresas. Muitos dos problemas pelos quais a área hospitalar vem passando podem ser abordados com a gestão de custo, uma vez que a maioria dos processos apontados é de natureza financeira. O objetivo da obtenção de custos mais próximos do real compreende a geração de informações para a tomada de decisões gerenciais. Essas informações, tomadas em separado ou em conjunto com outras, são a base da vantagem competitiva e produtiva de todas as organizações. A contabilidade de custos torna-se gerencial quando identifica, mensura e analisa as informações a respeito de eventos econômicos da organização. Estas informações sobre custos podem ser tanto financeiras quanto operacionais, voltados aos interesses e necessidades dos indivíduos internos da organização (CHING, 2001). Com efeito, todas as informações geradas sobre custos terão influência em todos os níveis e áreas organizacionais: Marketing, Finanças, Recursos Humanos e Produção, por exemplo. Segundo Lima (1992), ao considerar que as decisões tomadas nas organizações são relativas, principalmente na obtenção e distribuição de recursos, pode-se estabelecer certa diferença entre tipos de decisões relacionadas com uma escala ou cada espécie de recursos. Esta escala e a diferença entre os tipos de decisões sobre cada recurso são fatores determinantes da natureza das decisões, a qual será utilizada como meio para classificar o planejamento nas organizações. Esta seção teve como objetivo principal proporcionar aos leitores um embasamento sobre a organização hospitalar. Com este propósito, foi apresentada uma noção geral do que representa uma organização hospitalar. Neste contexto, foi caracterizado o hospital 39 filantrópico. Na próxima seção, realiza-se uma revisão bibliográfica sobre sistemas de custeio tradicionais e sistemas de custeio da gestão baseado em atividades. A seguir, são descritos e analisados estudos empíricos sobre a aplicabilidade da metodologia do custeio baseado em atividades em organizações hospitalares internacionais e nacionais, que servirão de sustentabilidade para a aplicação da metodologia no hospital pesquisado. 2.2 SISTEMA DE CUSTEIO E SISTEMA DE GESTÃO ABM Nesta seção discutem-se os sistemas de custeio; são analisados os sistemas de custeio tradicionais (o custeio por absorção e o custeio variável) e o sistema de custeio baseado em atividades (ABC). Além disso, aborda-se a gestão baseada em atividades (ABM). Quanto aos sistemas de custeio tradicionais, esses se limitaram ao custeio por absorção e ao custeio variável, porque os trabalhos pesquisados (artigos ou dissertações) abordaram o custeio por absorção ou o custeio variável para fins de comparação com o sistema ABC. Finaliza-se a seção com as controvérsias existentes sobre estes sistemas de custeio quanto à sua aplicabilidade para fins gerenciais. 2.2.1 Sistemas de custeio tradicionais Um custo representa sacrifício de recursos. É medido pelo sacrifício que precisamos fazer para adquirir um produto, estabelecido por meio do preço. As duas principais categorias são: custos de caixa; e custos de oportunidade. Os sistemas contábeis geralmente aceitos (SCGA) contemplam os custos de caixa, mas não os custos de oportunidade. Dessa forma, os administradores, incorretamente, algumas vezes, ignoram os custos de oportunidade ao tomar decisões (MAHER, 2001).Vários custos de hospitais podem ser considerados como custos compartilhados de vários departamentos e procedimentos. Os custos de produção ou serviços ainda podem ser classificados em: custos variáveis; e custos fixos. Os custos variáveis se 40 alteram na proporção direta da alteração do volume, em um intervalo relevante de atividade. Já os custos fixos não se alteram quanto ao volume (MAHER, 2001; ATHINSON et al., 2000). Os custos de produção variáveis geralmente incluem materiais diretos, certos custos indiretos de fabricação (materiais indiretos, mão-de-obra que lida com os materiais e energia elétrica, por exemplo) e a mão-de-obra direta em alguns casos (tal como trabalhadores temporários). Certos custos, como comissão sobre vendas, são variáveis, entretanto a maior parte dos custos indiretos de fabricação e alguns industriais são considerados fixos. A forma da apropriação dos custos tradicionais dá-se por meio dos métodos de custeio mais conhecidos: o custeio por absorção, ou total, e o custeio direto, ou variável. A grande diferença entre os dois métodos é que enquanto o primeiro apropria todos os custos de produção, fixos e variáveis, diretos e indiretos, aos produtos, o segundo apropria todos os custos variáveis de produção, quer diretos ou indiretos, tratando os custos fixos como despesas do período. Para Maher, (2001, p. 360) o custeio por absorção significa “o sistema de contabilização de custos no qual tanto os custos fixos como os custos variáveis de produção são considerados custos do produto”. Este método consiste na apropriação de todos os custos de produção ou de serviços prestados. É adotado pela contabilidade financeira das empresas, sendo válido para fins fiscais, de balanço patrimonial e de demonstração de resultados. Entretanto, este método possui algumas desvantagens, a saber: os critérios utilizados na alocação dos custos indiretos, dada a sua subjetividade; a não classificação em custos fixos e variáveis; e os custos somente são calculados ao término do período contábil. Essas desvantagens prejudicam os gerentes dos centros ou unidades de custos (CHING, 2001a). 41 No custeio variável ou custeio direto, apenas os custos variáveis são alocados aos produtos. Para o Maher (2001, p. 360) “o custeio variável é um sistema de contabilização de custos em que apenas os custos variáveis de produção são atribuídos aos produtos”. Os custos fixos são identificados e considerados como despesas do período, sendo levados em conta apenas na apuração do resultado. Os custos dos produtos são compostos apenas pelos custos variáveis e, mudam na proporção das mudanças que ocorrem no nível de produção ou vendas (ATKINSON et al., 2000). Muitas decisões administrativas exigem a separação entre o que é custo de produção ou componentes fixos e variáveis. O custeio variável é consistente com esta separação enquanto no custeio por absorção os custos fixos são tratados como se fossem unitários, isto é, como se fossem custos unitários, desta forma sendo enganoso. Entretanto, o custeio variável ainda tende a refletir melhor os modelos de decisões gerenciais do que o custeio por absorção. Este método significa a apropriação de todos os custos variáveis diretos e indiretos, e tão-somente dos variáveis. Os princípios contábeis não admitem o uso de demonstrações de resultados e de balanços avaliados à base do custeio variável. Entretanto, apesar desta não aceitação, nada impede que a empresa utilize-se deste para fins gerenciais (MAHER, 2001). Existem algumas limitações dos sistemas tradicionais de custeio, como as citadas por Maher (2001), Atkinson et al., (2000) e Ching (2001a), dentre os quais apontam-se: as distorções no custeio dos produtos, provocadas por rateios arbitrários de custos indiretos quando do uso dos custeios que promovem tais rateios; a utilização de um reduzido número de bases de rateio, nesses mesmos casos; a não mensuração dos custos da não-qualidade, provocada por falhas internas e externas, tais como retrabalho e outras; 42 a não segregação dos custos das atividades que não agregam valor; a não utilização do conceito de custo-meta ou custo alvo; e a não consideração das medidas de desempenho de natureza não financeira, mais conhecidos por “indicadores físicos de produtividade”. A representação dos custos, em termos de fixos e variáveis, tem a vantagem de oferecer uma rápida perspectiva do comportamento dos custos a respeito das mudanças no volume de produção. Entretanto, esta representação de custos elimina detalhes importantes em termos de custos de atividade (ATKINSON et al, 2000). Constata-se que estes sistemas deixam de fornecer aos gestores importantes informações que possibilitem melhores desempenhos no processo de melhoria contínua, tão almejado neste novo ambiente de negócios, onde tudo se torna obsoleto, até mesmo a informação, com grande rapidez. Os sistemas tradicionais de mensuração dos custos dos produtos fornecem informações distorcidas, falhando em atribuir com exatidão os crescentes custos indiretos requeridos para desenhar, produzir, vender e entregar produtos e serviços. Gerentes necessitam medir o custo e a rentabilidade de seus produtos, de segmentos de mercado e de clientes. Por último, necessitam de informações operacionais de controle, que irão realçar a melhoria de custos e de qualidade (KAPLAN et al., 2000, p.18; CHING, 2001a, p. 15). De modo geral, as empresas de serviços são candidatas ideais ao custeio baseado em atividades, principalmente porque a maioria de seus custos são indiretos e aparentemente fixos (KAPLAN; COOPER, 2000). Dessa forma, a contabilidade contemporânea vem criando sistemas de informações que permitem melhor gerenciamento de custos, com base no auxílio do controle, como forma de ajudar na tomada de decisão. A metodologia baseada em atividades procura atingir tal objetivo (MAHER, 2001, CHING, 2001a). 43 2.2.2 Sistema de custeio baseado em atividades O custeio baseado em atividades (ABC), também conhecido como Activity based costing, teve sua origem em trabalhos desenvolvidos pela General Eletric, no início da década de 60, nos Estados Unidos. Posteriormente, na década de 70, o ABC foi aperfeiçoado pelo professor Robin Cooper, e somente a partir dos anos 80 é que conseguiu a ter maior desenvolvimento, por intermédio de empresas de consultorias (CATELLI; GUERREIRO, 1995). Segundo os autores, as pesquisas sobre o ABC no Brasil se desenvolveram, a partir de 1989, estimuladas pelo professor do Departamento de Contabilidade da USP Masayuki Nakagawa, o primeiro a lançar um livro sobre o assunto no país. A metodologia de apuração de custos não é uma alternativa nova de contabilidade de custos para as organizações de saúde. Na realidade, é mais uma abordagem de como observar a realização das atividades dentro da instituição. O sistema admite que as atividades consumam recursos para produzir um resultado (output), uma vez que cada paciente necessita de uma série de atividades para seu tratamento e recuperação (FALK, 2001). Para os idealizadores Cooper e Kaplan, da Harvard Business School, segundo Cangi (1995, p.16) “é uma abordagem que analisa o comportamento dos custos por atividade, estabelecendo relações entre as atividades e o consumo dos recursos, independentemente de fronteiras departamentais”. Isto permite a identificação dos fatores que levam a instituição ou empresa a incorrer em custos em seus processos de oferta de produtos e serviços e de atendimento a mercado e clientes. Em outras palavras, pode-se dizer que uma empresa é um conjunto de atividades, cada uma composta por tarefas, que transforma os recursos internos em produtos ou serviços que deveriam agregar valor ao negócio. A partir daí, é possível avaliar a eficácia da organização 44 mediante a análise do custo x benefício de cada atividade, dos processos
Compartilhar