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# UNIDADE II - livro- RESPOSTAS SLIDES e 20 QUESTÕES

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Pós-Graduação - Lato Senso
GERONTOLOGIA – ASPECTOS TEÓRICOS E METODOLÓGICOS
 
Irene Gaeta 
Unidade II
1
Título: Gerontologia
Subtítulo: O desenvolvimento Humano na segunda 
metade da vida
 Assuntos:
1. Metanóia 2. Gerontologia 3. Psicologia Analítica 4. Velhice como desenvolvimento Humano 5. Longevidade 
 Pós-Graduação Lato Sensu UNIP. II.
Autor (a): Gaeta, Irene Pereira - 1961
Orientador (a): Gaeta, Irene Pereira
APRESENTAÇÃO DO PROFESSOR-AUTOR
Irene Gaeta: Psicóloga, Doutora em Psicologia Clínica pela PUC/SP. Mestre em Gerontologia pela PUC/SP. Especialista em Práxis Artísticas e Terapêutica: Interfaces da Arte e da Saúde pela USP na Faculdade de Medicina.
Analista didata do Instituto Junguiano de São Paulo (IJUSP); membro da Associação Junguiana do Brasil (AJB); filiada à International Association Analytical Psychology (IAAP/Zurich). 
Coordenadora do NAPA – Núcleo de Estudos em Arte e Psicologia Analítica do IJUSP e do Departamento de Arte e Psicologia da AJB. 
Professora do curso de Psicologia da Faculdade de Ciências Humanas e da Saúde da PUC-SP, lecionando sobre os seguintes temas: Psicoterapia segundo o enfoque da Psicologia Analítica integrada às técnicas de Abordagem Corporal - especialmente a Calatonia de P. Sándor; Supervisão de estágios em clínica. Coordenadora da Pós-Graduação em Psicologia Analítica e em Psicogerontologia da Universidade Paulista. 
Autora dos Livros: Memória corporal o simbolismo do corpo na Trajetória da vida; Psicoterapia Junguiana: Novos caminhos na clínica o uso do desenho de mandalas e calatonia. 
Organizadora da Coleção Gerontologia todos pela Editora Vetor.
 Coautora dos livros: Sonhos e Arte – diário de Imagens pela Primavera Editorial; Arte terapia e Mandalas uma abordagem Junguiana pela editora Vetor, Corpo em Jung pela Vetor, Etapas da Família – Quando a Tela nos espelha 
Pela Editora Appris.
E-mail: estudosjunguianos.irenegaeta@gmail.com
	
 Resposta Slides
 Resposta 20 Perguntas
SUMÁRIO
Sumário
INTRODUÇÃO	5
1.	GERONTOLOGIA	9
2.	Envelhecimento e cultura	10
3.	O ENVELHECIMENTO SEGUNDO A PSICOLOGIA ANALíTICA	11
4.	A velhice como fenômeno da modernidade	12
5.	FASES	17
6.	O DESENVOLVIMENTO HUMANO NA SEGUNDA METADE DA VIDA	23
7.	A descida de Inanna	30
8.	O Mito de Maat	33
REFERÊNCIAS	35
INTRODUÇÃO
1 Gerontologia – este curso tem como objetivo oferecer bases teóricas para a compreensão do fenômeno do envelhecimento a partir do conceito junguiano de metanóia (segunda metade da vida) e instrumentar o aluno a entender indivíduos em processo de envelhecimento em sua prática clínica, social e hospitalar.
2 Jung declara repetidamente em sua obra que, na segunda metade da vida (conceito que não tem sentido exclusivamente cronológico, mas depende do processo de desenvolvimento individual), o ser humano é obrigado a se confrontar com o fato de que o avanço da idade não pode ser tomado como mero apêndice da juventude, e que a debilidade física não simboliza distanciamento de sua alma, mas o contrário: a 1) - possibilidade de realização do Si mesmo, ou seja, ser quem se é, incluindo na personalidade aspectos até então inconscientes devido à unilateralidade do ego jovem. A essa ação, Jung dá o nome de processo de individuação. O envelhecimento será apresentado sob a perspectiva junguiana, levando em consideração o processo de individuação vivido a partir da metanóia. 
3 O envelhecimento populacional está em curso em todos os países, considerando-se as características exclusivas de cada localidade. No Brasil, nas últimas décadas, houve uma queda significativa da mortalidade, principalmente infantil. Junto a uma diminuição da taxa de fecundidade, definida como o número médio de filhos por mulher em idade reprodutiva. A junção desses fatores contribuiu para o 1) - prolongamento da vida dos seres humanos. Vale lembrar que esse fato é recente para os brasileiros. Em 1960, a expectativa de vida para um recém-nascido era de até 48 anos, já em 2010, poderia esperar chegar aos 73,4 anos de idade. Como pode-se observar, em apenas cinco décadas, houve um aumento de aproximadamente 25 anos na expectativa média de vida do brasileiro.
4 Conjuntamente às transformações demográficas, ocorreram mudanças 2) - na incidência e predomínio de doenças e também das principais causas de morte, ou seja, a transição epidemiológica.
5 Observa-se uma redução da mortalidade por doenças infecciosas agudas mais incidentes na população infantil e um aumento das doenças crônico-degenerativas que atingem sujeitos adultos, principalmente idosos. Enfermidades do aparelho circulatório, diabetes, câncer, doenças respiratórias e a depressão estão se tornando as principais causas de incapacidades e morte.
6 A existência de doenças crônicas traz implicações 3) exigindo cuidados à independência e à autonomia do indivíduo, de familiares e a utilização de serviços de saúde como: assistência a domicílio, internação em hospital, etc. Não há dúvidas de que o envelhecimento, em que há condições de maior fragilidade, além da redução da qualidade de vida, cria maior demanda por políticas públicas de saúde. 
7 Alguns estudiosos afirmam que um importante indicador de saúde não é mais a presença ou não de doença, mas 4) - o grau de competência funcional do indivíduo, compreendida como a capacidade de preservar habilidades físicas e mentais necessárias à preservação de uma vida independente e autônoma, ainda que convivendo com limitações. É o grau de perda da competência funcional que indicará quem viverá um processo de envelhecimento saudável ou não.
8 Assim, é de grande importância que as políticas públicas contemplem iniciativas voltadas para a manutenção da capacidade funcional da população idosa. Se, por um lado, a longevidade humana deve ser celebrada, por outro, ela promoveu uma mudança no perfil da morbimortalidade, levando 5) - ao aumento das doenças crônicas, para as quais o tratamento necessita de atendimento e serviços de cuidado integral, além do diálogo permanente entre profissionais. 
9 Independência e autonomia fazem parte da concepção de envelhecimento ativo criado pela Organização Mundial de Saúde no final da década de 1990. Esse conceito reconhece que, além dos cuidados com a saúde, 2) - as pessoas idosas devem continuar participando ativamente das questões sociais, econômicas, culturais, civis e espirituais de sua comunidade e de seu país. Essa proposta tem por objetivo a promoção de uma vida saudável ao longo de toda a existência, para todas as pessoas, incluindo as que requerem mais cuidados. 
10 Deve-se mencionar que o envelhecimento é um processo individual, social e complexo, sendo influenciado por diversos fatores que interagem entre si, entre eles, biológicos, psicológicos, sociais, culturais, econômicos, políticos e pelo modo como o sujeito vive, suas relações profissionais, interpessoais e com o meio em que vive. 
11 Cada indivíduo envelhece de modo particular, então não se pode generalizar, mas sim respeitar o que é lhe é específico. 
 12 Em síntese, o envelhecimento populacional é uma das principais conquistas sociais do século XX, porém traz inúmeros desafios, entre eles, o de promover a formação de profissionais que trabalham com esse segmento. O curso visa qualificar o profissional para atuar na área de envelhecimento com base em sólido conhecimento, habilidade e competência. 
13 O estudo do envelhecimento é complexo e próprio da modernidade, que traz a tecnologia para o estudo das 6) - ciências biológicas, nanotecnologia, neurociência, que pesquisam sobre a longevidade. Para compreender o processo de envelhecimento, é necessária uma perspectiva 7) - “caleidoscópica”, interdisciplinar e transdisciplinar. O envelhecimento é um processo individual que pode se constituir na possibilidade da realização de si mesmo, com o processo de individuação – metanoia. Existe uma dificuldade maior de lidar com o mundo interior na segunda etapa da vida. O indivíduo não sabe qual o real desejo da sua alma, porquenão se conhece. Quando se tem a serenidade de reconhecer o verdadeiro desejo da sua alma, a vida pode ser mais fácil. Para isso, é necessário o autoconhecimento, um aprofundamento no seu eu, para se reinventar. 
A velhice é um vento que nos toma
No seu halo feliz de ensombramento.
E, em nós depõe no que se deu à obra
somente o modo de não sentir o tempo
senão no ritmo interior da sombra
passar á transparência do momento.
Mas um momento de que baniram horas
O hábito e o jeito de estar vendo para
muito mais longe. Para onde a obra
surde. A velhice nos ilumina o vento.
(F. Echevarría)
14 O aumento da longevidade é uma das maiores conquistas da modernidade e isso traz desafios complexos para os indivíduos e para a sociedade. Em todo o mundo, a vida passa a ser um projeto de longo prazo, no qual é preciso se preparar não apenas para viver até os 80 anos, mas, quem sabe, até os 90 ou 100 anos.
 25 O segmento que mais cresce dentre a população idosa é o das pessoas muito idosas, com mais de 85 anos, denominados integrantes da quarta idade. Esse segmento populacional cresce a uma taxa de 8% ao ano, devido à redução da mortalidade em todas as idades, especialmente nas mais avançadas, e à grande fertilidade que havia entre as mulheres das gerações anteriores.
16 Esse fenômeno se iniciou na Europa, no final do século XVIII e marcou o século XX, com isso, pesquisadores das ciências humanas e sociais passaram a estudar mais minuciosamente esse aumento da população idosa, principalmente entre os países menos desenvolvidos que vem envelhecendo rapidamente. Isso se dá por diferentes motivos, destacando-se 8) - o maior acesso a serviços de saúde e saneamento, avanços na área da tecnologia na medicina, como vacinas e antibióticos que possibilitam a prevenção e, até mesmo, a cura de muitas enfermidades. 
17 No entanto, ainda predomina na sociedade a perspectiva do envelhecimento sob o ponto de vista do risco e, na maioria das vezes, relaciona o envelhecimento 9) - a perdas e dependências e se impõe sobre o lado positivo dessa longevidade. A maioria das pessoas idosas vive seus últimos anos com doenças como diabetes, cardiopatias, pressão alta, ou, ainda, pode sofrer acidente vascular encefálico. São as chamadas doenças não transmissíveis que podem trazer condições incapacitantes, no entanto, há a possibilidade de que essas doenças apareçam mais tarde ou nem cheguem a acometer o organismo. 
18 Apesar disso, estudos demostram que já está em perspectiva para a população mais jovem, a necessidade de se pensar sobre o envelhecimento e a velhice (GIACOMETTI, 2014).
19 A expectativa de viver mais traz muitos desafios, pois impõe a necessidade de se refletir sobre o que fazer nesses anos a mais. Todos os âmbitos da vida se colocam nesse prisma: onde viver, com quem ficar, quem cuidará de nós?
20 A percepção da nova geração em relação à possibilidade de maior longevidade, cada vez mais evidenciada pela ciência, parece não fazer parte do imaginário. Cuidar de si mesmo na velhice não parece ser algo que esperam que aconteça, pois ainda existe a expectativa de que sejam os filhos os cuidadores dos genitores na velhice. O cuidado acontecerá como uma forma de retribuição, já que fizeram isso aos filhos, remetendo os cuidados na velhice como atribuição da família. 
21 A cultura do imediatismo predominante na nossa sociedade, que prima muito pelo indivíduo e o tempo presente, pode resultar na 3) - dificuldade do mais jovem de se projetar para o futuro. O que se percebe é que todos querem chegar na velhice, no entanto ninguém quer estar lá. 
22 Nessa conjuntura, a mídia exerce um papel muito importante na produção de representações sociais em relação ao idoso e à velhice, influenciando sobremaneira a construção do imaginário social. Por um lado, a imagem do idoso saudável, praticante de esportes, com tempo livre, consumindo produtos e serviços, é fundamental para a transformações da imagem negativa. Por outro lado, pode gerar frustrações, pois é preciso levar em conta que as perdas físicas e o declínio do corpo são inerentes ao envelhecimento e, mesmo que seja adotado um estilo de vida saudável, esse declínio vai acontecer em algum momento.
10) - Os mais modernos estudos da gerontologia trazem uma visão menos catastrófica do envelhecimento ao evidenciar e valorizar aquilo que as pessoas podem fazer e não mais dando enfoque sobre a incapacidade, sobre aquilo que não se pode mais realizar. O que se evidencia é a necessidade de que seja exercitado e mantido, ao longo de todo curso da vida, a capacidade do o indivíduo de interagir com o ambiente aproveitando dos recursos físicos, mentais, ambientais e socioeconômicos para fazer aquilo que consideram importante para sua realização pessoal, a chamada capacidade funcional (OMS, 2015).
 24 A mudança no jeito de ver a vida é fundamental para a velhice, a nova realidade se impõe e empreender e aceitar desafios pode se configurar em renovação e na própria “reinvenção”.
 
1. Envelhecimento e cultura
1 A cultura ainda nos impulsiona a valorizar a juventude e tende a associar a imagem da pessoa idosa a deficiências e falta de beleza. Por esse motivo, é preciso valorizar a 4) - heterogeneidade cultural e individual, pois corre-se o risco de não se conferir importância adequada à influência dos fatores biopsicossociais no envelhecimento. Por não ser um processo homogêneo, pode causar a enganosa interpretação de que a alta incidência de condições específicas na velhice, como as doenças não transmissíveis, pode representar a totalidade dos casos (HAYAR, 2013).
2 As tecnologias inovadoras na medicina, saúde pública e nanotecnologias fizeram surgir possibilidade do prolongamento da vida, mas a sociedade não absorve essa transformação simultaneamente. 
 3 É preciso criar uma “cultura do envelhecimento” para que mudanças necessárias aconteçam e permitam que as pessoas vivam e aceitem, o envelhecimento e a velhice, de forma positiva e, para isso, é necessária uma mudança de status da imagem que a sociedade faz da pessoa idosa.
4 As representações sociais que circulam em nosso meio social em relação à velhice estão se modificando e muitas são associadas 5) - à alegria, atividade física, bem-estar, tempo livre, etc. Essa mudança na forma de pensar e agir é muito importante porque, às pessoas que envelhecem, é preciso acrescentar, além de mais anos, qualidade para sua vida, independentemente de gênero. Já está comprovado que as mulheres vivem mais que os homens, em média 6 a 8 anos, no entanto cada indivíduo se diferencia em seu processo de envelhecimento. O ciclo da vida segue etapas que não são necessariamente cronológicas, o que importa mais é o tempo vivido, que faz sentido para cada indivíduo.
5 A modernidade impõe à sociedade a 6) - desconstrução da imagem negativa do velho e do envelhecimento, é preciso reescrever esse script, pois as pessoas idosas já não são as mesmas das de décadas passadas, o papel social do idoso vem se alterando devido às transformações que aconteceram no cerne das famílias e mudaram o estilo de viver e, viver sem uma atividade útil e prazerosa é, segundo Simone de Beauvoir, pior que a morte.
6 Envelhecer, para esta geração, significa que há necessidade de uma reinvenção constante ao longo de todas as etapas da vida, porque a vida, agora, é um projeto de longo prazo. É um caminho longo, que requer coragem e certa “ousadia” para encarar o que aflora nessa nova fase.
2. O ENVELHECIMENTO SEGUNDO A PSICOLOGIA ANALíTICA
1 Na primeira metade da vida, o indivíduo busca a base necessária para a construção concreta da sua vida, os meios para se sustentar a si e à sua família, ou seja, criar um sistema externo para sua sobrevivência. Quando isso se efetiva, resta ao indivíduo olhar para si próprio e buscar uma ressignificação para vida. Não é tarefa fácil, pois esse olhar direcionado a si próprio pode trazer à tona questionamentos, frustrações e desejos reprimidos.
2 Na primeira metade da vida, há uma orientação 7) rumo à personalidade, a busca pelo “lugar ao sol”, posiçõese certo “status”, o que é esperado e aceito pela sociedade.
3 O ser humano está em constante evolução e podemos entendê-lo a partir de uma metáfora: a primeira metade da vida corresponde 8) - ao sol nascente que atinge seu ápice ao meio-dia, podendo ser considerada como a primeira metade do ciclo vital. A segunda metade da vida corresponde ao sol poente que, aos poucos, vai perdendo a força e o calor sem, no entanto, deixar de brilhar.
4 Com frequência, Jung afirma em sua obra que na segunda metade da vida (conceito que não tem conotação rigidamente cronológica, mas sim depende do processo de desenvolvimento individual), o ser humano é obrigado a se confrontar com o fato de que o avançar da idade não pode ser tomado como mero apêndice da juventude, e que o declínio físico não significa afastamento de sua alma, mas exatamente o contrário: a possibilidade de realização do Si mesmo, ou seja, ser quem se é, incluindo na personalidade conteúdos até então inconscientes e negligenciados devido à unilateralidade do ego jovem. Jung chama de processo de individuação essa tarefa.
5 Esse processo de individuação pode trazer a possibilidade de um encontro com a 9) - criatividade, com a espiritualização. O corpo físico pode perder suas formas joviais e, ao esgotar suas forças, vai potencializar o encontro com a finitude, ainda desconhecida e não aceita.
6 Na segunda metade da vida, há uma reorientação do foco, em que o ser ganha destaque, a personalidade inconsciente começa a constelar, para que haja integração de conteúdos inconscientes. Há um chamado para que o indivíduo retome a sua própria história, reveja o que foi realizado na primeira metade da vida e integre conteúdo. Esse pode ser um período de transformação e mudança intensos.
7 Foi dado o nome de metanoia a esse período, que significa10) transformação da identidade a partir da experiência vivida pelo sujeito. Vale lembrar que não são todas as pessoas que realizam a metanoia e que chegar à meia idade não é garantia de que ela seja realizada. Para entrar em contato com os conteúdos internos, olhar para si, debruçar-se sobre o fenômeno da existência pessoal, envolve coragem. Esse processo pode não ser vivenciado como algo prazeroso ou simplório, mas sim um momento de dúvidas, crises, em que fantasmas internos persistem em assombrar o indivíduo numa espécie de chamado para que realize a integração, que olhe para si, se transforme e possa ter a sua consciência ampliada.
3. A velhice como fenômeno da modernidade
1 A concepção de uma nova ciência como a gerontologia vai ao encontro da proposta mais inovadora da atualidade, em termos científicos, no que diz respeito à mudança de paradigma da visão de homem e de mundo, especialmente quanto aos conceitos de complexidade, interdisciplinaridade e transdisciplinaridade.
2 O entendimento de um construto teórico tão inovador é 11) - desafiador e assustador. Desafiador, porque impõe um olhar em relação a questões nunca pensadas, como os desafios que a longevidade impõe à humanidade, a velhice como provável futuro de todos nós. Assustador, porque não oferece nada pronto, o que leva a refletir sobre o poema de Antônio Machado (poeta modernista espanhol, 1875-1939):
Caminhante, são teus passos
o caminho e nada mais;
caminhante, não há caminho,
faz-se caminho ao andar. 
Ao andar se faz caminha, 
e ao voltar a vista atrás
se vê a senda que nunca
se voltará a pisar.
Caminhante, não há caminho,
mas sulcos de escuma ao mar
3 Assim, passar por várias áreas do saber para a construção de um novo conhecimento nos leva ao infinito, na medida em que a cada nova descoberta um universo se abre.
4 O questionamento sobre o envelhecimento existe há mais de 2700 anos. Heráclito elaborava uma fórmula complexa: Viver de morte, morrer de vida. Morin (1996, p. 279) faz uma reflexão acerca desse paradoxo:
Rejuvenescemos sem cessar. Cada batida de nosso coração irriga nosso organismo com sangue desintoxicado pelos pulmões. Rejuvenescemos 60 vezes por minuto. Eu rejuvenesço, vocês rejuvenescem, nossas moléculas fazem-no várias vezes por ano. Passamos o tempo rejuvenescendo, ou seja, vivemos da morte dessas células para rejuvenescer. Mas então por que morremos? Porque com o tempo, rejuvenescer é sumamente cansativo. Rejuvenescer é mortal. Por isto desgraçadamente morremos. Morremos de vida.
5 Desse modo, pelas afirmações feitas, explicita-se que este trabalho leva em conta o entendimento do homem em sua totalidade.
6 Na modernidade, passamos a considerar a velhice como um estágio importante para o desenvolvimento humano, não como anteriormente era visto, quase como 12) - uma fase terminal da existência.
7 Esse fato se dá por uma questão bastante lógica: a infância se dá em 10 anos, depois passamos para a adolescência e aos 21 anos somos considerados adultos. Então, quando chegamos aos 50/60 anos, somos considerados velhos, pelo menos em termos de mercado de trabalho, já que, na modernidade e sob a égide do capitalismo, deixamos de ser produtivos e/ou o mercado de trabalho deixa de absorver essa faixa etária.
8 Assumindo que haja o aumento da expectativa de vida, poderemos viver aproximadamente até 80 anos, significando, em tese, que teremos 40 anos de velhice. Como se dará esse processo de envelhecimento?
9 Jung diz, que, em primeiro lugar, 13) - o homem deve estabelecer no mundo vínculos sólidos, fundar uma família, construir uma situação. No entanto, quando chega à maturidade, no declínio das forças, então é tempo de ser si mesmo, no sentido mais profundo, ou seja, de procurar apreender a totalidade de nossa alma, aquela que não conhece as barreiras do tempo nem do espaço.
10 O homem que envelhece deveria saber que sua vida não está em ascensão nem em expansão, mas em um processo interior inexorável que produz uma contração da vida. Na visão do jovem, constitui um perigo ocupar-se demais com si próprio, mas para o homem que envelhece é um dever e uma necessidade dedicar atenção séria ao seu próprio si mesmo. Depois de haver esbanjado luz e calor sobre o mundo, o sol recolhe os seus raios para iluminar-se a si mesmo (JUNG, 2000, p. 349).
11 A velhice é um território desconhecido para todos nós; poderíamos compará-la com 14) - o outono, pois já semeamos, plantamos e agora de uma certa maneira colhemos. Não sabemos, ao certo, o que o outono pode nos mostrar, porque na primavera não percebemos claramente o que foi gerado. A mudança no corpo nos remete às questões do espírito ou a um tipo de atenção à psique.
	Para Prétat (1997, p. 42):
Precisamos conhecer sua realidade, tentando encontrar uma centelha de luz nas trevas de forças desconhecidas, vivenciadas quando a consciência mergulha em algo que se assemelha ao esquecimento. O aborrecimento das experiências internas e externas que surgem nesses momentos não pode ser evitado, ele precisa ser vivido. Quando descemos às profundezas da psique é importante permanecermos os mais possíveis presos ao mundo exterior para que possamos conservar uma noção da realidade externa, mesmo que dolorosa.
	12 A interpretação que fazemos do envelhecimento pode nos trazer sabedoria, se percebermos a sutileza que há nas entrelinhas. Ou seja, é preciso romper com os estereótipos impostos socialmente e se lançar ao desconhecido sem receio.
	13 A modernidade trouxe ao homem esse desafio. Com o alto nível tecnológico, com a explosão demográfica, o homem se depara com algo inusitado: um período maior para ser vivido fora do processo produtivo nos moldes capitalistas, mas inserido em uma sociedade de classes e de consumo de mercadorias, para a qual há a necessidade de poder aquisitivo.
	Jung (2000, p. 349) diz que: 
O ser humano não chegaria aos setenta ou oitenta anos se esta longevidade não tivesse um significado para a sua espécie. Por isto, a tarde da vida humana deve ter também um significado e uma finalidade próprios, e não pode ser apenas um lastimoso apêndice da manhã da vida.
14 Não queremos dissociar a velhice do processo de desenvolvimento humano. Não se trata de falar das etapas da vida humana,até porque esse seria um pensamento linear, quando na verdade estamos falando de mudanças de paradigma. Qual o significado da velhice? O que significa, então, ser uma pessoa idosa?
15 Para Martins (1991), o sujeito não pode ser uma série de eventos, isto é, ser criança, ser adolescente, ser adulto, ser velho, como um conjunto segmentado de eventos; por isso, é que ele não é eterno. Resta para esse sujeito, que pode ser eu, que pode ser você, ser temporal. 
16 Precisa-se, então, pensar na ideia de tempo propriamente dito, e é somente acompanhando a sua dialética interna – o homem não está no tempo é o tempo que está no homem – que seremos levados a compreender a ideia de sujeito humano (MARTINS, 1991, p. 3).
17 Somando-se à consciência de que o homem é envolvido, é construído culturalmente, é importante olhar o ser humano pela mediação do seu tempo vivido, pois o tempo é o sentido da vida.
18 Voltando à questão a respeito do significado da velhice: se a aldeia global fosse de fato uma tribo, a exemplo dos primitivos, caberia aos anciões ser “os guardiães dos mistérios e das leis” o que, portanto, exprime a herança cultural da tribo. A globalização significa, sim, 15) - uma padronização de valores e significados pela difusão de uma dada ideologia que atende aos interesses do capital. 
19 No entanto, a aldeia global não vê no envelhecimento um motivo para celebrar. Pelo contrário, há negação de tudo o que é velho. O atual desenvolvimento do capital nos transformou para a sociedade do “descartável”. Hoje, três quartos da humanidade são descartáveis, pois necessitamos todos de saúde, educação, transporte, segurança, moradia, alimentos, etc. Se 16) - aos 25 anos, o homem já é “descartado” e pesa para o sistema, o que dizer dos velhos?
20 Temos uma gerontofobia, pelo menos aqui no mundo capitalista – incluindo o Japão, apesar de toda sua cultura de respeito aos idosos – é o medo e a negação do envelhecer que impera.
21 Temos medo de envelhecer, em primeiro lugar, porque a partir daí a vida termina. Ponto final. E temos medo de envelhecer porque não teremos mais espaços sociais de reconhecimento e de sobrevivência. Haja estímulo ideológico a plásticas, ginásticas, cosméticos, etc.
22 Contraditoriamente, o medo de envelhecer nos empurra para a velhice, no sentido de “parar o desenvolvimento, por se achar velho”.
23 O envelhecimento é visto pelo conjunto da sociedade como um tabu, como algo desagradável e que, portanto, deve ser negado. Lidar com as questões da velhice e do envelhecer, tanto nosso quanto do outro, requer uma abertura especial. Temos que ter a compreensão do envelhecimento como uma totalidade que não é simples e tampouco abstrata. 
24 O envelhecimento tem várias dimensões, não podendo ser entendido apenas dentro de uma única perspectiva, pois o homem é multidimensional.
Simone de Beauvoir (1990, p. 348) nos diz: “Mesmo que nos venham sinais do corpo, eles são ambíguos. Pode-se ficar tentado a confundir uma doença curável com um envelhecimento irreversível”.
25 O paradoxo de nossa época é que as pessoas idosas gozam de melhor saúde do que em outros tempos, permanecem “jovens” por mais tempo e a ociosidade só pode lhes pesar mais ainda.
26 Segundo os gerontologistas, viver os últimos vinte anos da vida em bom estado físico, mas sem nenhuma atividade 17) - útil, é psicológica e sociologicamente impossível. É preciso dar a esses sobreviventes motivos para viver. “A sobrevivência bruta é pior que a morte” (BEAUVOIR, 1990, p. 348).
27 Na modernidade, há uma desconstrução ideológica da categoria velhice, em relação às doenças tidas como próprias da velhice. São propostas formas preventivas para se chegar à velhice saudável. Há, também, mudanças quanto ao mercado consumidor, pois, com a aposentadoria privada, alguns idosos passam também a ser consumidores, ou seja, com recursos ele pode ser capaz de utilizar a moda, prover a manutenção do corpo, etc.
 	Para Featherstone (1998, p. 61):
Pode-se argumentar que nas sociedades ocidentais contemporâneas, esse processo é exacerbado pela forte ênfase na aparência física na imagem visual que é um dos elementos fundamentais que impulsiona a cultura de consumo. Nenhuma outra sociedade na história, como é frequentemente dito, produziu e disseminou tal volume de imagens do corpo humano através dos jornais, revistas, dos anúncios e das imagens do corpo em movimento na televisão e nos filmes. A paisagem física das grandes cidades, das construções e lugares nos quais fazemos compras ou nos divertimos estão cheias de imagens e réplicas do corpo humano. A vasta maioria dessas imagens, especialmente aquelas usadas para vender mercadorias e experiências por meio de anúncios, são imagens da juventude, saúde e beleza dos corpos. Uma boa parte da promoção da moda, indústria de cosméticos e de cuidado com o corpo apresenta esses ideais de corpos como algo que deveria ser atingido. A transformação do corpo que levará a uma transformação pessoal é algo que está ao alcance de todos nós. A mensagem divulgada é simples: Se você parece bem, você se sente bem.
28 Durante a pesquisa, foi pedido ao grupo de pesquisadas para fazer a construção de um corpo coletivo (Figura Corpo Coletivo, p. 251). Apesar de ter sido feito por um 18) grupo de mulheres idosas, não retrata necessariamente uma velha.
29 A visão que cada uma do grupo tem do próprio corpo é interessante. A construção desse corpo coletivo sugere que elas não se veem como velhas e sim como jovens. 
30 Beauvoir (1990, p. 352) refere que “a aparência de nosso corpo e de nosso rosto nos informa com mais certeza: que contraste com nossos vinte anos! Só que essa mudança se opera continuamente e nós mal a percebemos”. 
31 A autora vai mais além quando diz: “A menos que haja um acidente análogo, para nos fazer parar diante do reflexo que nos propõe o espelho, e nele descobrir nossa idade, é preciso já ter razões para interrogá-lo.” (BEAUVOIR, 1990, p. 353).
32 Então, como podemos começar a nos perceber de maneira mais realista aos cinquenta, sessenta ou setenta anos como ainda tendo valor para nós, para a família e para a sociedade?
33 19) - Talvez seja agora importante olhar todo esse processo de uma maneira linear, falando um pouco sobre as seguintes fases: um período de crescimento, durante o qual o desenvolvimento construtivo prevalece sobre o declínio; um período de equilíbrio entre desenvolvimento e declínio; um período de involução, uma época de declínio crescente (LIEVEGOED, 1984, p. 39).
4. FASES
De uma forma irreverente, Goethe (apud LIEVEGOED, 1984) descreveu as fases da vida nestes termos: a criança é um realista; o jovem idealista; o homem adulto, um cético e o homem idoso um místico!
 [...] Se considerarmos as conquistas da humanidade, vemos que a sabedoria da velhice pode revelar-se num mundo atemporal. Aqui se situa um campo atingível para todos que permanecerem ativos: o sumário da essência da vida e o encontro de um mundo atemporal de valores e significâncias! (LIEVEGOED, 1984, p. 73)
De qualquer maneira, sempre me parece persistir o medo do envelhecimento, como se não houvesse a percepção do curso da vida. Um trecho clássico da literatura retrata bem o homem contemporâneo na luta contra o envelhecimento.
Quando Dr. Fausto assinou o pacto com o diabo, exigiu em primeiro lugar voltar a ser jovem. Mefisto, tendo-o guiado ao antro de uma bruxa, quando Fausto viu no lume o caldeirão no qual a poção mágica estava a ferver teve uma náusea.
Dr. Fausto, a Mefisto:
— Esta bruxaria demente enjoa-me. Asseguras-me que voltarei a ser novo com esses sortilégios? Precisarei mesmo da ajuda desta velha bruxa? Será verdade que essa poção infernal me vai rejuvenescer de trinta anos? Pobre de mim se nada de melhor tens para me oferecer! A esperança já me abandona, não terá a natureza ou qualquer espírito nobre descoberto nenhum remédio para a velhice?
Mefisto:
— Ótimo! Esse remédio obtém-se, aliás sem a ajuda de nenhum médico nem de nenhuma bruxa. Vai viver para o campo. Cultiva, desbrava a tua terra leva uma vida simples, semsair do cerco limitado da tua propriedade. Alimenta-se de pratos grosseiros e poucos cozinhados. Vive como o teu gado e em sua companhia, e não te julgues muito orgulhoso para estrumar o solo. Aqui tens a melhor maneira, acredita-me de rejuvenescer aos 84 anos!
 Fausto:
— Mas eu não estou habituado; não me convém nada manejar a pá e essa vida limitada não é do meu agrado!
Mefisto:
— É por isso que precisas da bruxa!
Fausto é cada um de nós, pois aceitamos mais facilmente a morte do que a velhice. Envelhecer e morrer parece-nos inelutável, pois é o destino de todos desde sempre!
Edgar Morin (1970) nos diz que as ciências do homem negligenciam sempre a morte. Contentam-se em reconhecer o homem pelo utensílio (homo faber), pelo cérebro (homo sapiens) e pela linguagem (homo loquax). Contudo, a espécie humana é a única para a qual a morte está presente durante a vida; a única que faz acompanhar a morte de ritos fúnebres, a única que crê na sobrevivência ou no renascimento dos mortos.
Portanto, é um paradoxo não sermos educados para a morte também e durante o curso da vida.
Morin (1970, p. 13) vai além, quando fala que:
A morte situa-se exatamente na charneira bioantropológica. É a característica mais humana, mais cultural do anthropos. Mas, se nas suas atitudes e crenças perante a morte, o homem se distingue mais nitidamente dos outros seres vivos, é aí mesmo que ele exprime o que a vida tem de mais fundamental. Não tanto o querer-viver, o que é um pleonasmo, mas o próprio sistema do viver.
Ao iniciar o contato com os sujeitos da pesquisa, dona E. mostrou-se muito interessada em participar do estudo. Segundo ela, pelo seu depoimento seria imortalizada nas páginas deste trabalho. É evidente que a obsessão da sobrevivência, muitas vezes em detrimento da vida, revela no homem a preocupação lancinante de conservar a sua individualidade (MORIN, 1970).
 A ideia inicial era fazer uma discussão sobre o corpo e, no entanto, o tema foi conduzido 20) - para as questões pertinentes à morte.
A discussão trazida sobre a morte foi: No Egito, antigamente era assim: você nasceu nu e morre nu também; enterra-se sem roupa... a pedra de mármore colocada no cemitério também mostra o poder da pessoa.
Edgar Morin (1970) fala que o horror da morte é, portanto, a emoção, o sentimento ou a consciência da perda da individualidade para além da morte.
Quando durante a pesquisa E. falava sobre as mortes, eu diria que sua vida se deu contrapondo-se à morte, pois foi a partir dela que sua vida foi pautada. Assim, o luto exprime socialmente a inadaptação individual à morte, mas, ao mesmo tempo, é o processo social de adaptação que tende a fazer cicatrizar a ferida dos indivíduos que sobrevivem.
Faço minhas as palavras de Morin (1970, p. 325):
Para o homem, a morte faz parte da teia do seu mundo, do seu ser, do seu espírito, do seu passado e do seu futuro. [...] Mas isto não anula a esperança de reformar a morte. Essa reforma é o prolongamento da vida humana para que o indivíduo possa cumprir o seu novo ciclo de desenvolvimento.
Basta observar o desenrolar de nossa vida para perceber como nos deparamos com a morte em várias instâncias: a infância morre e nasce a adolescência. A adolescência passa e nos tornamos adultos. Um nascimento requer uma morte e uma morte requer um nascimento.
Na mitologia grega, os deuses criaram o mundo, decidiram que não gostavam dele, destruíram tudo o que haviam construído e criaram um outro. A morte é um processo que não para na natureza. Há também a imagem do deus morrendo e renascendo, aquele que é destruído de uma forma, reaparece novamente transformado.
 Dionísio é desmembrado, mas Atenas, a deusa da sabedoria, salva seu coração e ele nasce novamente; como a Fênix, podemos ser temporariamente reduzidos a cinza, mas somos capazes de nos levantar, renovados. A forma pode ser destruída, mas a essência permanece para aparecer novamente em alguma outra forma.
O poeta alemão Goethe escreveu: Enquanto você não morre e se levanta novamente, você é um estranho para a sombria Terra.
No transcorrer de uma vida, experimentamos muitas formas diferentes de mortes psicológicas, sociais, profissionais, etc.
Se estivermos derivando nossa identidade pessoal de um relacionamento pessoal e este terminar, estaremos diante da morte de quem temos sido. Da mesma maneira, se adquirirmos nosso sentido de vitalidade ou significado de vida a partir de uma determinada profissão e a perdemos, também morreremos pela forma que nos conhecíamos.
Na figura (Corpo Coletivo, p. 251), percebemos na construção do desenho coletivo que o grupo de mulheres judias realizou, apesar de terem uma biografia de um corpo marcado pela guerra, pela exclusão social, pelo antissemitismo, o retrato de um corpo cheio de vida sob a égide do arquétipo da criança divina. Num movimento de renascimento, podemos considerar como sendo um desenho compensatório de um corpo sofrido, mas também podemos pensar na possibilidade de um crescimento da sensualidade, da espiritualidade e da psique.
Dessa maneira, temos a morte seguida da vida, o que podemos também considerar no fator do envelhecimento como a passagem de um corpo novo para o corpo velho, um processo de morte-renascimento no sentido de criatividade e de crescimento.
 Erik Erikson (1950) é um dos teóricos do desenvolvimento mais conhecido; ele descreve oito estágios do desenvolvimento humano:
•	Primeiro estágio: confiança X desconfiança básica
Sendo este estágio inicial, próprio do bebê, quando ele supera a desconfiança inicial, indo em direção à confiança básica para que possa então se desenvolver e crescer.
•	Segundo estágio: autonomia X vergonha e dúvida
Este estágio está relacionado com a criatividade, representado pelo funcionamento intestinal, em que controlar e reter as fezes é extremamente importante, pois é também nessa fase que temos nossa primeira criação.
•	Terceiro estágio: iniciativa X culpa 
Este estágio está relacionado com a sexualidade, na qual a criança torna-se consciente dos seus órgãos genitais. Tornar-se consciente dos órgãos genitais para a criança, traz uma mudança de comportamento; no menino, leva a um comportamento que ele chamou de fálico-intrusivo, na menina, o comportamento se torna sedutor ou cativante e carinhoso.
•	Quarto estágio: diligência X inferioridade
Período este de grande aprendizado no mundo onde a criança aprende a obter o reconhecimento pela sua produção. Sendo importante, neste estágio, unir habilidade com aptidão, a fim de que se possa realmente sentir prazer no trabalho para que no futuro possa se tornar um membro produtivo da sociedade.
•	Quinto estágio: identidade X propagação do papel
Este estágio é marcado pelo fim da infância e maturidade sexual, gerando para o adolescente, dúvidas em relação à própria sexualidade e ao seu lugar no mundo. Por isso, Erikson considera importantes os ritos da puberdade que, segundo ele, permitiriam a integração para a nova identidade. Nesse momento há o desenvolvimento da identidade, gerando grandes dúvidas, podendo haver atração pelo mesmo sexo.
 •	Sexto estágio: intimidade X isolamento
Para Erikson, é imprescindível o domínio dos cinco estágios iniciais para que se possa avançar neste estágio que requer a capacidade de nos perdemos no encontro de corpos e mentes, conduzindo a uma expansão gradual dos interesses do ego e a uma ligação com os outros.
•	Sétimo estágio: produção X estagnação
Este é o momento marcado pelo desejo de consolidar e orientar a próxima geração. Para Erikson (1950, p. 231 apud PRÉTAT, 1997, p. 82):
Somente aquele que de alguma maneira cuidou das coisas e das pessoas, e adaptou-se aos triunfos e desapontamentos, inerentes ao ser, necessariamente o gerador das coisas e das ideias [...] poderá gradualmente produzir o fruto desses sete estágios.
•	Oitavo estágio: integridade do ego X desespero
Este estágio é considerado por Erikson como integração acumulada do ego. Para ele este estágio de desenvolvimento humano raramente é atingido. Isso implica ter sensação de ordem e significado, em que o passadocom as experiências de vida desde o nascimento até o momento presente é visto de uma nova maneira. Erikson (1976), embora cônscio da relatividade de todos os vários estilos de vida que deram significado ao esforço humano, afirma que o possuidor de integridade está pronto para defender a dignidade do seu próprio estilo de vida contra todas as ameaças físicas e econômicas.
De acordo com Erikson, o desenvolvimento deste estágio estaria mostrando as diferenças do envelhecer de pessoa para pessoa, de cultura para cultura. Ele nos diz:
As provas clínicas e antropológicas sugerem que a falta ou perda dessa integração acumulada do ego se manifesta pela repulsa e pelo desespero: a sorte não é aceita como estrutura da vida, a morte não é vista como a sua fronteira finita. O desespero expressa o sentimento de que o tempo é curto, demasiado curto para a tentativa de começar uma outra vida e experimentar rumos alternativos para a integridade. [...] Assim, uma velhice significativa, precedendo uma possível senilidade terminal, serve à necessidade de uma herança integrada que proporcione uma indispensável perspectiva ao ciclo vital. [...] Seja qual for o abismo a que as preocupações fundamentais possam conduzir os homens, individualmente considerados, o homem, como criatura psicossocial, defrontar-se-á, no final de sua vida, com uma nova edição da crise de identidade que poderíamos formular nas seguintes palavras: ‘Eu sou o que sobreviveu de mim’. [...] A força psicossocial, em conclusão, depende de um processo total que regula os ciclos vitais individuais, a sequência das gerações e a estrutura da sociedade, simultaneamente. Pois todos os três componentes do processo evoluíram juntos (ERIKSON, 1976, p. 141).
Sendo assim, se faz necessário, no estudo do envelhecimento, desenvolver um olhar diferenciado para as questões contemporâneas referentes ao envelhecer. Para Featherstone (1998, p. 46):
[...] No estudo do envelhecimento e do curso da vida frequentemente os aspectos corporais do envelhecimento são reduzidos ao envelhecimento fisiológico, ao terreno da biologia, como algo que pode ser estudado independente dos parâmetros culturais e sociais que o modela de diferentes modos em diferentes sociedades. Ao mesmo tempo temos que estar conscientes do fato de que os corpos não operam no mundo social como as coisas “em si mesmas”; ao contrário sua capacidade de operar é mediada pela cultura. Com efeito, a cultura é escrita sobre os corpos e nós precisamos examinar os modos particulares de como isso acontece em diferentes sociedades, incluindo o papel das imagens sobre nossas percepções do corpo e os modos pelos quais à construção das identidades dependem das construções das imagens do corpo.
5. O DESENVOLVIMENTO HUMANO NA SEGUNDA METADE DA VIDA
Carl Gustav Jung (1875-1961), psiquiatra e psicoterapeuta suíço, fundador da psicologia analítica, define a segunda metade da vida como metanoia: uma fase em que experimentamos a consciência de nós mesmos como parte de algo maior.
Metanoia é um termo grego que aponta a transformação da própria identidade pessoal depois de uma experiência que transforma os valores até então adotados pelo sujeito. 
Pieri (2002, p. 323) afirma que
Jung retoma o termo para indicar o fenômeno de crise psicológica através do qual sucede a inversão radical de todos os valores sobre os quais está ordinariamente fundamentada a existência de um homem. A ilustração clássica da metanoia dá-se por ocasião da análise do limiar que liga e distingue a primeira e a segunda metade da vida: nessa fase de passagem pôr-se-iam na sombra todos os valores sobre os quais o indivíduo está fundamentado, e contemporaneamente pôr-se-iam em luz outros valores que estão em oposição. A primeira fase de nossa vida é muito centrada na iden¬tidade do ego; tentamos nos firmar no mundo exterior com casamento, profissão, etc. Mas, quando ultrapassamos o meio do caminho, que Jung denominou de metanóia, é o momento de sermos nós mesmos com uma dedicação séria e necessária para atingir esse autoconhecimento. O desenvolvimento dessa percepção de si mesmo requer um rompimento do determinismo, da herança dos condicionamentos, um rompimento com os padrões de funcionamento.
Depois de haver esbanjado luz e calor sobre o mundo, o sol recolhe os seus raios para iluminar-se a si mesmo. Em vez de fazer o mesmo, muitos indivíduos idosos preferem ser hipocondríacos, avarentos, dogmatistas e laudatores temporis acti (louvadores do passado) e até mesmo eternos adolescentes, lastimosos sucedâneos da iluminação do si mesmo, consequência inevitável da ilusão de que a segunda metade da vida deve ser regida pelos princípios da primeira (JUNG, 2000, p. 349).
Jung compara a vida humana com o Sol, com os 180 graus de seu arco e a vida sendo dividida em quatro partes. A primeira parte, ele representou como sendo a infância, na qual não teríamos problemas conscientes; na verdade, quando crianças, somos problemas para os outros (pais, educadores, médicos, etc.). Nesse estágio de consciência não há problemas, pois a dependência aos pais nos mantêm imersos na atmosfera deles.
Depois na adolescência, com o início da atividade sexual, há de fato um rompimento com os pais; deixamos a vida simbiótica, o que será considerado como um nascimento psíquico; então ocorre uma diferenciação consciente em relação aos pais. Nesse momento, a mudança fisiológica, com suas manifestações corporais, ocasiona uma imposição desmedida do eu e é por isso que a adolescência é considerada como uma fase difícil, de rebeldia.
Então, temos na infância uma forma de consciência, que é um estado anárquico; no segundo estágio, na adolescência, temos o complexo do eu desenvolvido e no terceiro estágio avançamos em direção à consciência da divisão. Nesse momento, no ingresso da vida adulta, temos dúvidas a respeito de nós mesmos. Se houver um preparo, essa passagem pode ser tranquila, mas se existirem ilusões que impeçam a visão da realidade, poderão surgir dificuldades.
Nesse caso, então, tenderíamos a regredir para os estágios anteriores de desenvolvimento. “Alguma coisa dentro de nós quer permanecer como criança, quer permanecer inconsciente, ou quando muito consciente apenas do seu ego” (JUNG, 2000, p. 342).
A sociedade não valoriza os aspectos psíquicos e da consciência; pelo contrário, só valoriza as aquisições materiais e intelectuais, o que para o jovem se torna um grande desafio – ser e estar no mundo –, tendo que adquirir tais condições que lhe conferem poder e prestígio social.
Na procura por essa autoafirmação, o jovem tem que desenvolver a eficiência, a utilidade, que poderiam ampliar e consolidar sua existência de forma a fixá-lo no mundo; mas tudo isso dificulta o desenvolvimento da consciência humana.
Nessa busca, muitas vezes, o jovem pode se distanciar do seu ideal, pois ele tenta adaptar o que foi dado no passado às exigências do futuro. É uma luta travada dentro e fora de si próprio e comparável à luta da criança pela existência do eu. Só se alcança o objetivo social com sacrifício da totalidade da personalidade. 
São muitos – muitíssimos – os aspectos da vida que poderiam ser igualmente vividos, mas jazem no depósito de velharias, em meio as lembranças recobertas de pó; muitas vezes; no entanto são brasas que continuam por baixo das cinzas amareladas (JUNG, 2000, p. 344-345).
Geralmente, quando atingimos a meia-idade (40/50 anos), algumas mudanças começam a ocorrer de forma sutil, por isso nem sempre são percebidas, sendo que essas mudanças começam no inconsciente. A estatística tem mostrado que as depressões são mais frequentes nessa época. As mudanças de que falamos podem ser as mais diversas; antigos traços da infância poderão vir à tona, antigas inclinações; os interesses, enfim, poderão ser totalmente mudados.
Todos distúrbios neuróticos, bastante freqüentes, da idade adulta têm em comum o fato de quererem prolongar a psicologia da fase juvenil para além do limiar da chamada idade do siso! Quem não conhece aqueles comovedores velhinhos que necessitam sempre dereesquentar o prato de seus saudosos tempos de estudante e só conseguem reavivar um pouco a chama da vida, recordando-se de seus tempos heróicos. [...] Não são neuróticos, mas em geral pessoas estereotipadas, tediosas (JUNG, 2000, p. 346).
Retornando à comparação que Jung faz com o sol, se na velhice o sol ilumina a si mesmo fazendo o movimento de retorno, o pôr do sol da vida humana se assemelha ao nascer do sol, pois, tal como a criança, o velho também passa a ser o problema do outro.
No primeiro momento da vida, não temos problemas com nossa consciência; teremos, sim, a partir do segundo e terceiro momentos (ou seja, na juventude e na meia idade).
A infância e a extrema velhice são totalmente diferentes entre si, mas têm algo em comum: a imersão no processo psíquico inconsciente. Como a alma da criança se desenvolve a partir do inconsciente, sua vida psíquica, embora não seja facilmente acessível, contudo não é tão difícil analisar quantas pessoas muito velhas que mergulham de novo no inconsciente, onde desaparecem progressivamente. A infância e a extrema velhice são estadas da vida sem qualquer problema consciente [...] (JUNG, 2000, p. 353).
Esse processo na extrema velhice é também presente na infância; é inevitável; é como se fosse sinalizar uma iniciação para uma transição importante da natureza humana. Reconhecer os sinais do corpo como mensageiros desse processo poderá auxiliar essa passagem da vida.
Para Pretát (1997, p. 66), o corpo retém muitas memórias em suas células, “a descida no corpo e a liberação de antigos assuntos podem ser controlados conscientemente ou acontecer de um modo inconsciente”.
Claro que não é uma decisão mental simplesmente, pois todo nosso ser estará envolvido – mente, corpo, espírito. O próprio Jung produziu muito nessa ocasião, quando estava na casa dos 70/80 anos e, talvez, não o tivesse feito se não passasse pela experiência de um ataque cardíaco.
Embora estejamos condicionados social e culturalmente a encarar a doença como algo penoso, ela também pode nos manter presos à vida. Também pode sinalizar alguns aspectos de nossa vida que não enxergamos e que poderiam ser valorizados.
Quantas vezes não vemos relatos de pessoas que passaram por experiência de “quase morte” e passam a ressignificar a sua vida depois dessa experiência?
Jung falava em abaissement du niveau mentale, ou seja, uma diminuição do nível da consciência, um rebaixamento do nível mental. Abaissement é um afrouxamento da tensão da consciência, que poderia ser comparado a uma baixa leitura barométrica, que prenuncia o mau tempo. A tonicidade cedeu, o que é sentido subjetivamente como desânimo, mau humor e depressão. A pessoa já não tem nenhum desejo ou coragem de enfrentar as tarefas do dia-a-dia. Ela se sente como chumbo, porque nenhuma parte do corpo parece disposta a mexer, o que é causado pelo fato de a pessoa não possuir nenhuma energia à disposição (JUNG apud PRÉTAT, 1997).
Com essa modificação da consciência, quando idosos passamos a valorizar as tarefas cotidianas, tais como as amizades, as crianças, a espiritualidade, estar em casa, cozinhar, cuidar do jardim, em detrimento das atividades que antes eram excitantes como a vida excessivamente intelectual ou social.
O que é tido como uma acomodação da idade na verdade é uma confiança na intimidade e na privacidade. “[...] a integridade, e integração não alcançam aquele que se mantém à distancia da consciência, que se recusa a responder à percepção crescente” (BRENNAN, 1991, p. 173).
Nessa perspectiva, fica clara a importância de redescobrir a arte, de se entreter na segunda fase da vida para que ocorra a individuação, para que se possa fazer a transição do desenvolvimento de ego para o desenvolvimento do si mesmo.
Causa estranhamento valorizar o ser em vez do ter. A busca do prazer para algumas pessoas pode se tornar difícil, pois o prazer é como um músculo atrofiado quando não usado.
Na velhice, buscar o prazer, o lazer, a espiritualidade é fundamental – momentos de imersão no inconsciente. “O entretenimento e a oração conectam-nos com nosso mais profundo ‘si mesmo’. O entretenimento e a oração permitem¬-nos perceber o quanto mais de nós existe além de nosso ego” (BRENNAN, 1991, p. 178).
Os valores sociais não importam tanto como quando criança, quando nos ocupamos principalmente de brincar como algo fundamental na vida. Sendo assim, a vida longa pode ser encarada como uma dádiva, pois permite a plena realização da personalidade; é um chamado para uma transformação contínua.
Jung, nos últimos anos de sua vida, além de continuar sua obra escrevendo muito, deixando seu legado à humanidade, aliou esta tarefa de forma prazerosa, nas pequenas coisas da vida. Há relatos de Brennan (1991, p. 178) de como Jung usou seu tempo nos últimos dias, referindo que:
O tempo tem estado indescritivelmente bonito, e isto é o que mais tem contribuído para que eu não escreva cartas e, em vez disso, eu acabei de pintar o teto de Bollingem e trabalhei mais em minha escritura – e por último, embora não menos importante – recanalizei os riachos para evitar infiltrações e preparei comida gostosa, encontrei e comprei um vinho excelente. Tudo isso me tem repousado e me curado de vários aborrecimentos.
Assim, vemos como o entretenimento com as coisas simples da vida, como o lazer e a contemplação possibilitam ao ser humano se tornar integrado a si mesmo. Pela simplicidade de estarmos prontos a responder às solicitações cotidianas que a vida vai apresentando: ficar no presente, dar um passo de cada vez, com toda a consciência do seu significado. Devemos buscar o sentido da vida não nos grandes momentos ou gestos, mas nas pequenas atividades e emoções do dia a dia.
 Brennan (2004) chama a atenção para questão da espiritualidade e coloca a crise presente na meia-idade como uma possível forma de reorientação em que o foco ou o centro de atenção sai do ego em direção ao Self. Chamamos de ego um conjunto de pensamentos, emoções e sensações que define o universo pessoal do indivíduo, garantindo identidade física e psicológica. Representa apenas uma parcela do espectro psíquico e não a sua totalidade e corresponde ao centro da consciência. Sua função é responder e intermediar as solicitações do mundo exterior e do si-mesmo, sendo responsável pela adaptação. Em relação às partes da personalidade que ficaram na Sombra, a tarefa do ego é reconhecê-las e integrá-las à consciência.
Self ou si mesmo é o arquétipo que representa a unidade dos sistemas consciente e inconsciente, funcionando como centro regulador da totalidade da personalidade. No movimento de retorno ao self, desenvolve-se uma nova forma de criatividade que emerge a partir do indivíduo ao se deparar com situações novas. Essa criatividade é flexível, não traz em si uma estrutura repetitiva e nem está a serviço do passado psicológico do indivíduo. 
O self é uma realidade ontológica universal e transcende diferenças culturais. Na segunda metade da vida, pode haver um desenvolvimento da personalidade, um retorno ao self.
Enquanto na infância e na juventude é o mundo exterior que nos chama, na meia-idade e nos anos maduros acontece o contrário: o ambiente exterior cede lugar ao interior. 
Dessa ligação entre os níveis superiores do psiquismo é que o ser humano pode desenvolver um crescimento equilibrado, de forma a expandir a sua consciência. É uma esfera que se amplia constantemente. Essa forma de expansão não linear ou expansão da consciência pressupõe um aumento das atividades de superação do egocentrismo ou das atitudes separatistas que nos afastam dos demais, potencializando criatividades que possibilitam a expressão de todos os recursos que constituem a nossa totalidade. 
Essa mudança de foco pode se tornar uma verdadeira revolução, na qual a espiritualidade pode ser direcionada de forma inconsciente. A espiritualidade ou o chamado à espiritualidade pode ser uma forma de um continum do desenvolvimento, onde o questionamento “Quem sou realmente?” busca a resposta dentro de cada um. Apesar dos fatores externos daexistência não serem negados, eles mudam de ênfase. 
Para Brennan (2004), a espiritualidade na meia-idade flui de uma nova atitude e orientação. A mudança de vida nessa fase é revolucionária. Quando se entra na meia-idade, o self torna-se central, substituindo a importância do ego. Um novo ponto de vista e atitude afloram na pessoa, acompanhada por novos valores. 
A mesma devoção e atenção dadas na primeira etapa do desenvolvimento humano devem agora ser direcionadas, assim exigindo a mesma atenção. A pessoa na meia-idade deve entregar-se a si mesma para poder ser remodelada. 
É preciso ser moldado pela sua própria história (passado), pelo seu mundo interior, pelas suas experiências e realidades únicas (presente), bem como pelo discernimento do Espírito, que nos guia através de novos vales e montanhas (futuro) (BRENNAN, 2004, p. 67). 
Dentro dessa perspectiva, o ser humano está em constante processo de crescimento pessoal, realizando seu potencial não manifesto. 
	Primeira metade da vida
	Segunda metade da vida
	Ego
	Self
	Personalidade
	Personalidade inconsciente
	Eventos externos
	Eventos internos
	Fazer
	Ser
Esse processo de desenvolvimento presente na meia-idade pode durar três ou quatro décadas da vida. É uma retomada da própria história, é um chamado para integrar os aspectos que foram negligenciados até então, em que o passado pode ser externado e reconfigurado. Jung chamou de individuação esse processo de reconstrução e integração interior, presente como desenvolvimento próprio da segunda metade da vida. 
Jung aponta o caminho da individuação como possibilidade de crescimento e desenvolvimento durante toda a nossa existência. Principalmente na segunda metade da vida, ou seja, depois de termos construído uma base sólida, uma família, uma profissão, a realização da jornada interior, a integração dos aspectos femininos (anima) e masculinos (animus) da nossa personalidade para que, enfim, possamos descobrir e viver o amor verdadeiro.
O corpo físico pode perder suas formas joviais e, ao extenuar suas forças, potencializa o encontro com a finitude, ainda desconhecida, não aceita. Jung considerava que homens e mulheres na meia-idade sofrem um processo de individuação no qual expressam aspectos da personalidade até então negados. Algumas questões podem ser fundamentais nessa fase da vida, como abrir mão da imagem da juventude e entrar em contato com a finitude.
Considerar a vida como um processo ininterrupto, no qual estamos em constante desenvolvimento, é fundamental. Envelhecer pode ser perigoso quando na segunda metade da vida carregamos o passado como um imenso fardo – frustrações, experiências não vividas, desejo do amor pleno, enfrentamento dos ressentimentos, das mágoas e tantos outros sentimentos controversos e amargos. 
6. A descida de Inanna
Conta a história que Inanna, a grande deusa do amor, da fertilidade, da guerra, do céu e da terra, decide ir ao mundo subterrâneo para visitar sua irmã gêmea, Ereshkigal, a rainha do grande abismo. Como precaução, Inanna dá instruções a Ninshubur, sua serva de confiança, no sentido de pedir ajuda aos deuses para garantir o seu retorno, caso ela não volte em três dias.
No percurso, Inanna é detida na primeira porta do mundo inferior, onde revela a sua identidade. O guardião informa a Ereshkigal, a rainha do grande abismo, que a rainha do céu pede para ser admitida na “terra de onde não há retorno” para presenciar os funerais de Gugalana, marido de Ereshkigal. Ela se enfurece e insiste que a deusa do mundo superior seja tratada de acordo com as leis e os ritos destinados a todos os que entram no seu reino: ser trazida à sua presença “nua e curvada” (como os sumérios eram colocados no túmulo).
O guardião executa as suas ordens. A cada uma das sete portas de entrada, ele remove uma das vestes de Inanna. Agachada e desnuda ela é julgada pelos sete juízes e entra no submundo e seu corpo é enfiado em um poste, ela é crucificada. 
Depois de três dias, vendo que Inanna não volta, Ninshubur coloca em execução suas instruções de levantar o povo e os deuses com tambores fúnebres e lamentações.
Ninshubur dirigi-se a Enlil, Deus supremo do céu e da terra, e a Nana, o Deus lua e pai de Inanna, mas ambos se recusam a interferir nas determinações do mundo inferior. Finalmente Enki Deus das águas e da sabedoria, ouve o apelo de Ninshubur e resgata Inanna, utilizando-se de dois carpidores feitos com a sujeira de suas unhas. Estes se esgueiram pelo Mundo Inferior sem serem notados, levando o alimento e a água da vida que Enki lhes dera, e asseguram a libertação de Inanna ao compadecerem-se de Ereskigal, que agora está gemendo pelo morto, ou em dores de parto. Ela se sente tão grata pela empatia que entrega o corpo de Inanna.
Inanna é restituída a vida, porém é avisada de que precisará mandar alguém ao mundo inferior para ocupar o seu lugar. Para agarrar essa vítima de sacrifício, os servos de Ereshkigal a rodeiam, enquanto ela retorna através das sete portas e exige suas vestes.
Na busca de um substituto, Inanna não entrega nenhum daqueles que lamentaram a sua morte. No caminho, encontra seu marido, Dumuzzi (Tamuz), sentado, feliz, no seu trono, reinando em seu lugar. Inanna enfurece, o fita e os demônios o agarram. Dumuzzi desaparece com a ajuda de Utu, o Deus sol e irmão de Inanna. Utu o transforma em cobra para facilitar a fuga. Dumuzzi sonha com sua própria queda e vai até à irmã, Geshtinanna, que o ajuda a interpretar o sonho e fugir. Quando a fuga se mostra inútil, ela o protege e se oferece para o sacrifício em seu lugar. 
Inanna decide que ambos devem dividir a condenação, e passar seis meses cada um no mundo subterrâneo. Então GeshtInanna (Deusa dos caniços de papiro), a irmã de Damuzzi, alterna com ele a permanência no inferno e dividi sua dor. Assim ele passa metade de cada ano no submundo (outono e inverno) e na outra metade retorna trazendo abundância e felicidade a terra (primavera e verão).
Nas várias análises e interpretações que podem ser feitas desse mito, pode-se pensar no “mergulho para o inferno” como o mergulho na personalidade inconsciente, em aspectos antes não vistos ou, até então, tidos como sombrios que são necessários para que haja integração dos conteúdos. A descida de Inanna mostra que devemos estar nus para realizarmos o “mergulho”, desnudos de concepções e preconceitos, desnudos para olhar dentro da psique, visitar terrenos pantanosos, verdadeiros “infernos”, etapas necessárias para transformação e ampliação da consciência, abandonando o estado infantil, numa espécie de “morte e ressureição”.
Na metanoia, o indivíduo enfrenta sua sombra e vive o conflito entre a persona e sombra. Sobre essa questão, Mello (2015) afirma:
O diálogo entre a persona e a sombra ocorre na metade da vida e representa um equilíbrio necessário ao indivíduo. Pode-se dizer que, na primeira metade da vida, é o momento em que a persona se desenvolve, é o momento de criação e manutenção da persona, a realidade interior é negligenciada.
Com a chegada da metanoia, o indivíduo olha para a sua realidade interior, aos chamados do self, compreende a possibilidade de realizar a travessia, um percurso que exige coragem, sinceridade e honestidade, um compromisso consigo mesmo.
Outra questão, observada na segunda metade da vida, é o encontro com a função inferior que, neste caso, é assim chamada pelo fato de ser menos utilizada. Para que haja a integração de conteúdos anteriormente inconscientes, é necessário que aconteça o contato com a sombra, assim as potencialidades podem se tornar conscientes via criatividade, desconhecida, até então.
É muito comum ver, na metanoia, pessoas mudarem suas profissões ou simplesmente darem novo “rumo” às suas vidas, pois descobrem dentro de si potencialidades, desejos e aptidões que se encontravam inconscientes anteriormente e, depois de árduo “trabalho interno”, se tornam livres.
Neste momento, livre das amarras e do egocentrismo, o ego torna-se pequeno, frente às exigências e vivências de self. Como visto no mito de Inanna, atravessia nessa descida é difícil e complexa. 
Além do enfrentamento e/ou diálogo entre a persona e a sombra, há, também, a integração entre a anima e o animus, podendo esta ser realizada pelo amor, o que acaba por configurar um relacionamento intrapsíquico.
A anima e o animus dizem respeito, respectivamente, ao feminino que existe internamente no homem e ao masculino que existe internamente na mulher. Integrar esses aspectos é essencial na metanoia, pois ambos auxiliam o entendimento do indivíduo sobre si mesmo.
Mesmo que a velhice seja uma fase misteriosa, cabe pensá-la em momento também oportuno para o desenvolvimento humano, embora esse desenvolvimento não pode ser compreendido de maneira linear, mais sim como parte de um todo no meio do processo de individuação e no momento da metanoia, em que, através do mergulho na personalidade inconsciente, nos arcabouços da experiência humana, ou então na descida ao inferno, como no mito de Inanna, a consciência é ampliada, nova orientação é tomada, as experiências vividas possuem outro “sabor” e novo rumo é dado à vida – o indivíduo como consciência de si em meio ao todo.
As experiências podem e devem ser integradas e as marcas da vida devem ser olhadas, tal como no mito egípcio da deusa Maat.
7. O Mito de Maat
A atividade crucial de Maat ocorria no Palácio das Duas Verdades (Maati), onde os mortos iam para o julgamento final. Primeiro, o falecido deveria proferir uma “confissão negativa” declarando que não cometera pecados ou más ações. Verificava-se então se estava sendo honesto a cada um dos 42 itens confessados. Depois seu coração era colocado em um dos pratos da balança da justiça, enquanto no outro estava uma pena de avestruz simbolizando Maat (a verdade). 
Por vezes era, ela mesma, a balança. Não se sabe com clareza de que forma o coração era pesado para que a alma do morto fosse considerada justa. Sabe-se somente que se o coração tivesse o peso certo em contraste com o peso de Maat, a pessoa estava justificada.
O coração, portanto, é considerado a “voz” e somente ele dirá para onde deverá ser destinado. Caso não o tenha, a pessoa é lançada a um monstro híbrido temível composto de partes de crocodilo, leão e hipopótamo, chamado Ammut, comedor de mortos.
Para os egípcios, o coração não era tão somente um órgão vital do corpo, mas era também a consciência, ou o centro do pensamento. Ele representava a voz de Maat no ser humano, a voz oracular da Ordem Cósmica que rasga o véu e penetra no mundo humano. 
Entretanto, por essa razão, as palavras do coração tornaram-se um problema para os egípcios, pois ele testemunhava no Palácio das Duas Verdades contra a pessoa. Essa crença era tão forte, que existia até uma prece especial, dirigida ao coração, que era inscrita em um amuleto em forma de escaravelho e depositada no local do coração durante o ritual de embalsamento. Tal prece suplicava que o coração não se levantasse “como testemunha contra mim”.
Um fato não conhecido sobre esta deusa é que o alimento de Maat eram as cicatrizes. Assim, um coração com cicatrizes, ao ir para o tribunal de Osíris, servia de alimento para Maat, deixando, então, o coração “leve como uma pluma”.
Observando esse mito, pode-se pensar que, primeiramente, é através do coração que o destino será guiado e, o importante é que este coração possua cicatrizes, ou seja, vivências, marcas, possua história. Pode-se pensar na velhice e na metanoia em um momento em que tais cicatrizes são revistas, integradas com outros aspectos da personalidade anteriormente inconsciente, tornando assim sua existência única – eis a individuação. 
O caráter é para a velhice o que o chamado individual do Daimon é para a juventude; ele dá sentido e propósito às mudanças do envelhecimento. Está sempre exposto, como estilo, hábito, gesto, disposição, constituição, postura, expressão e presença. 
Hillman (2001, p. 228) lembra que “o rosto revela o caráter e dirige-se ao caráter. Como imagem, o caráter precisa ser imaginado, além de percebido”.
As transformaçãoes na velhice, mesmo as extenuantes, têm propósitos e valores organizados pela psique. A memória para acontecimentos recentes pode faltar, oferecendo mais lugar para as rememorações do passado distante.
Envelhecer não é um acidente, observa Hilmann (2001), é algo necessário à condição humana e pretendido pela alma.
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