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Sistema de Governo

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 POLÍTICA E CIDADANIA
UNIDADE IV :
SISTEMAS DE GOVERNO
GERALDO MESQUITA JÚNIOR
Senador 
Brasília - 2005
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 Mesquita Júnior, Geraldo.
 Sistemas de Governo / Geraldo Mesquita Júnior. 
 – Brasília : Senado Federal, 2005.
 48p. – (Política e cidadania ; 4)
 1. Formas de governo. 2.Regime de governo. 3. Parlamentarismo. 
 4. Presidencialismo 5. Monarquia. 6. República. 7. Sistema partidário. 8. Sis- 
 tema eleitoral. 9. Governabilidade. I. Título. II. Série.
 CDDir 341.23
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SUMÁRIO
I – Governo: Definição e Conceito
II – Governo e Governabilidade 
III – Governabilidade e Governança
IV – Sistemas Políticos e Sistemas de Governo 
V – Os Parlamentarismos
VI – O Presidencialismo
VII – Brasil, de Monarquia a República
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I – GOVERNO: DEFINIÇÃO E CONCEITO
 
 No Dicionário de Política1 , o prof. Lúcio Levi define Governo como “o conjunto de pessoas que exercem o poder político e que determinam a orientação política de uma determinada sociedade”. Mas ele 
mesmo ressalva que “existe uma segunda acepção do termo Governo, 
mais própria da realidade do Estado moderno, a qual não indica apenas 
o conjunto de pessoas que detêm o poder de governar, mas o complexo 
dos órgãos que, institucionalmente, têm o exercício do poder. Neste 
sentido, completa o autor, o Governo constitui um aspecto do Estado”. 
Se o Estado não é mais do que uma forma de organização política que 
a sociedade assumiu, em sua evolução histórica, é forçoso concluir que 
os governos transcendem o Estado, na medida em que este, em sua 
configuração atual, só surgiu em meados do séc. XVI. É o chamado 
“Estado nacional” unificado em torno das diferentes nacionalidades 
que constituíam os grandes feudos. Essa forma peculiar de Estado, no 
entanto, foi precedida por outra modalidade de organização política, 
a que conhecemos pelo nome de feudalismo, constituído de pequenos 
Estados chamados feudos. Estes, por sua vez, foram antecedidos pelos 
grandes impérios como o romano e o de Alexandre Magno, também 
surgidos depois do declínio das cidades-estado gregas, precedidas estas 
pelos impérios das antigas civilizações, como a egípcia e a assíria. A 
palavra governo, usada para definir o conjunto de pessoas e instituições 
que detêm o poder político, seja nos pequenos feudos, seja nos grandes 
impérios, está, portanto, associada às diferentes etapas da evolução 
histórica do Estado. Essa designação, contudo, não tem o mesmo 
significado, em todos os países e em todas as línguas. Sua definição 
como corpo dirigente e representativo do Estado é própria das línguas 
1 BOBBIO, Norberto, MATEUCCI, Nicola e PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política. 
Brasília, Ed. UnB, 7a ed., 1995, v.I, p. 553. 
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latinas: governo em português e italiano, “gobierno” em espanhol e 
“gouvernement”, em francês. Nos países anglo-saxônicos, “government” 
significa o que nós latinos chamamos de regime político, algo muito mais 
amplo que o conjunto das instituições governamentais que dirigem e 
representam o Estado. Para designar o que entendemos como governo 
do Estado, os ingleses usam o termo “Cabinet” (Gabinete, o Conselho 
de Ministros titular do Poder Executivo, no modelo parlamentarista 
adotado na Grã-Bretanha). Nos Estados Unidos, em que o regime é 
presidencialista e não dispõe dessa instituição que encarna o Poder 
Executivo, como na Grã-Bretanha, o que nós chamamos de governo eles 
denominam de “Administration”. A palavra governo, porém, não é de 
origem latina ou anglo-saxônica. Provém do grego “kubernao”, a parte 
superior do leme dos barcos, que serve para dirigi-lo, também chamada 
em português de timão ou cana do leme. Os pilotos ou timoneiros 
dos barcos gregos eram chamados por isso de “kybernetes”, termo do 
qual provém a palavra cibernética, “ciência que estuda as comunicações 
e os sistemas de controle, não só dos organismos vivos, mas também 
das máquinas”, conforme a definição do Aurélio. Etimologicamente, 
portanto, governo é aquele que dirige e controla. E essa analogia entre 
a arte, técnica ou ciência de governar, sempre foi, desde os gregos, 
associada à habilidade dos timoneiros dos barcos. Platão a utilizou em 
seu livro A República, usando a que ficou conhecida como “parábola do 
navio”. Segundo ele, era sempre ao mais hábil e experiente na arte de 
navegar entre os recifes que se entregava o comando dos barcos, mesmo 
que não fosse o mais popular entre os marinheiros, pois dele, afinal, 
dependia a vida de todos. Aristóteles também usou a figura ainda hoje 
corrente da “nau do Estado”, ao escrever em A Política sobre os limites 
e o tamanho ideal de um país, afirmando que deveriam ser os mesmos 
de um navio, grande o bastante para enfrentar as tormentas, mas não 
demasiado, a tal ponto que não obedecesse ao comando do leme. Assim 
como a arte de dirigir um navio exige habilidades e conhecimentos 
específicos, também a de governar o Estado impõe qualificações 
inerentes às funções de dirigir e comandar. Entre elas, a de controlar, já 
que a cibernética, com a mesma origem etimológica do verbo governar, 
implica em dominar os sistemas de controle. 
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 Em seu sentido mais amplo, por conseqüência, governo é 
todo mecanismo de direção e controle das mais diversas instituições 
e organizações. É correto, portanto, referir-nos ao governo das 
universidades, das corporações, dos hospitais, dos partidos, dos 
sindicatos e de quantas organizações mais atuem fora do âmbito familiar. 
A diferença entre os governos dos Estados e os das demais instituições, 
não reside apenas na sua configuração, mas nos poderes que cada um 
detém. Os governos dos Estados soberanos tomam decisões, como os 
de todas as organizações, com a diferença de que elas são dotadas de 
poder vinculante para todos que vivem em seus respectivos territórios, 
enquanto as decisões de organizações não estatais aplicam-se só aos 
que estão a elas vinculados. Em outras palavras, decisões de governo 
dispõem do monopólio da coerção legal, recurso utilizado para que 
sejam obedecidas, inclusive com o emprego da força, se necessário. 
Ou seja, são decisões de natureza política. A diferença entre governo e 
política é que esta se ocupa da alocação de recursos entre os diferentes 
grupos da sociedade, enquanto o governo trata dos resultados desse 
processo em relação às comunidades que lhes estão afetas, seja uma 
cidade, uma região ou uma nação. Por isso, nos Estados federativos 
como o Brasil, há governos com competências específicas para cada 
esfera de atuação: municipal, estadual e federal. 
 Para explicar a natureza dos governos, Karl Deutsch2 lembra 
que o timoneiro de um navio “deve saber em que lugar ele próprio se 
situa em relação a tudo o que está em seu barco; o que tem que fazer 
para manter o seu controle, pois se o perder, de nada lhe servem todos 
os seus outros conhecimentos”. Em segundo lugar, deve saber onde 
está a nave sob seu comando, em que direção se move e de que espécie 
de embarcação se trata. Terceiro, tem de conhecer onde se localizam os 
escolhos, bancos de areia, baixios e correntes de navegação. Finalmente, 
precisa ter consciência do destino a que se dirige e saber se a rota que 
escolheu o levará para mais perto ou para mais longe dele. Assim, 
conclui esse autor, o processo de governar é constituído por algo muito 
2DEUTSCH, Karl. Política e Governo. Brasília, Ed. UnB, 1979, p. 29. Tradução do original 
em inglês. 
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semelhante à navegação e, tal como em outras tarefas, dirigir e governar 
implica, não raras vezes, numa eficiente divisão do trabalho. 
 A natureza do governo que nos interessa, no estudodos 
sistemas políticos, tem muito a ver e está intimamente associada a 
uma função específica: garantir a governabilidade. Isto nos leva a uma 
outra indagação: que mecanismos a propiciam? Deutsch, na obra há 
pouco citada, pergunta, exatamente, de que modo a política assegura a 
direção da sociedade e a alocação dos valores dentro dela? E ele mesmo 
responde: “Ela opera fundamentalmente, utilizando-se dos hábitos da 
grande massa da população de se submeter às leis e à autoridade dos 
governos; e estes hábitos de submissão são acentuados e fortalecidos 
pela probabilidade de execução da lei contra aqueles que a transgridam. 
Os hábitos de submissão embora sejam os associados invisíveis do 
governo, realizam 90% da tarefa” [de assegurar a governabilidade]. “Se 
muitos motoristas, diz ele, não tivessem o costume de parar com o 
sinal vermelho, quando o guarda não está presente, seria impossível 
fazer respeitar as leis do trânsito. Da mesma forma, os hábitos que a 
maioria das pessoas têm de não assassinar seus vizinhos, de não roubar 
casas e carros, são o que determinam o cumprimento das leis, contra a 
minoria de pessoas que, ocasionalmente, ainda fazem essas coisas”. Há 
outra observação de igual relevância. “Quando os hábitos de submissão 
da população declinam ou desaparecem, as leis podem se tornar 
inaplicáveis. Elas se tornam de difícil execução, quando menos de 
90% da população lhes obedece voluntariamente. Foi o que aconteceu 
com a lei seca [nos Estados Unidos]. Um pouco mais de 50% do 
eleitorado americano tentou proscrever a sede por bebidas alcoólicas 
de um pouco menos dos outros 50%, mas a generalizada insubmissão 
às leis de proibição impossibilitou o seu cumprimento. Isto, por sua 
vez, encorajou ainda, outras desobediências à lei. As probabilidades de 
cumprimento das normas legais podem, sem dúvida, contribuir para os 
hábitos de submissão, embora não se deva esquecer que eles constituem 
a parte maior e mais forte das forças que asseguram a execução das leis 
e que os efeitos das leis e as ameaças de sua aplicação são, em conjunto, 
relativamente marginais” 3. 
3Op. cit. p. 39. 
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 Vê-se, portanto, que o cumprimento da lei, mais que a própria 
lei, é o instrumento de que se valem os governos dos Estados soberanos, 
para conseguir a obediência dos cidadãos às suas decisões. São ainda de 
Karl Deutsch as seguintes observações sobre as leis e o comportamento 
humano: “Usamos leis para controlar o comportamento humano 
porque não custa muito fazê-las aprovar e, desde que as pessoas lhes 
obedeçam voluntariamente, também não custa muito pô-las em vigor. 
As leis, os hábitos de submissão e as probabilidades de cumprimento 
delas, permitem que uma sociedade continue a funcionar. Dentro de 
certos limites, podemos mudar a sociedade, modificando a lei, desde 
que esta seja obedecida. Porém, as grandes alterações na sociedade 
vêm através de mudanças nos hábitos de submissão. A escravidão foi 
abolida no séc. XIX, não por causa da legislação, mas porque todo o 
clima cultural e social do mundo ocidental tinha começado a mudar. 
Nenhuma legislatura poderia ter imposto tal mudança, mas uma vez 
que ela se consumou, as leis desempenharam o papel que lhes cabia, ao 
acelerar a abolição da escravidão e ao fazer com que fosse respeitada. As 
grandes reformas do mundo não podem ser iniciadas pela lei, embora 
possam ser por ela ajudadas. A legislação é apenas um dos elementos 
que contribuem para uma mais profunda mudança dos pensamentos 
e sentimentos dos indivíduos, grupos ou sociedades inteiras, que 
transformam uma época cultural ou política, em outra” . 
 Se para a Política o que importa é mais o cumprimento efeti-
vo da lei do que a simples existência dela, nisto reside a diferença de 
concepções que têm os sociólogos e os juristas, relativamente ao orde-
namento jurídico que tanto emana do governo, quanto o disciplina e 
limita, em todo Estado de Direito democrático. Os juristas se ocupam 
do conjunto ideal das leis, ou seja, de sua existência, independente de 
seu cumprimento real, pois elas podem ser úteis na defesa dos inte-
resses de seus clientes. Os sociólogos, ao contrário se interessam pela 
existência empírica das leis, isto é, aquelas que, além de existirem, são 
efetivamente obedecidas, pois disto depende ,a capacidade de governar 
que, em termos gerais, chamamos de governabilidade.
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I I – GOVERNO E GOVERNABILIDADE 
 
Até agora, vimos a origem da palavra governo e o seu prin-cipal instrumento para garantir a governabilidade, o orde-namento jurídico dotado da faculdade de empregar a força legítima, para conseguir a obediência dos cidadãos, recurso 
de que só os governos dos Estados soberanos dispõem. Para entender 
esse mecanismo coercitivo, é preciso definir o que entendemos por go-
vernabilidade. 
 Segundo a Enciclopedia de las instituciones políticas4, “a governa-
bilidade se refere à capacidade das instituições políticas de um país para 
dirigir a economia e a sociedade”. Esta capacidade diz o mesmo texto 
– “está baseada nas próprias características da sociedade que se pre-
tende ‘guiar’. A governabilidade, conclui, é um problema especial dos 
países democráticos devido à dificuldade de traduzir os mandatos dos 
eleitores em políticas realistas”. Isto significa que, na medida em que 
os eleitores se manifestam em favor de certas demandas que o sistema 
político não consegue atender, aumenta o risco da ingovernabilidade. 
Logo, há uma relação direta entre a capacidade de suprir demandas e a 
governabilidade e uma relação inversa entre a incapacidade de atendê-
las e a governabilidade. A questão assumiu uma enorme importância 
na agenda política dos anos 70 do século passado. Ela foi o resultado 
dos custos crescentes dos governos e do início dos movimentos ide-
ológicos que, nessa época, contestavam sua capacidade para resolver 
graves problemas sociais, circunstância aliada à perda de confiança nos 
governos, por parte do público. Em muitos casos, esse temor era exage-
rado, mas, a despeito disso, terminou levando as instituições políticas e 
4BOGDANOR, Vernon (ed.) Enciclopedia de las instituciones políticas. Madrid, Alianza 
Editorial, 1991. Tradução do original em inglês The Blackwell Encyclopædia of Political 
Institutions. Londres, 1987, verbete “Gobernabilidad”. 
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a opinião pública de muitas das democracias ocidentais a reconsiderar 
a forma pela qual os governos realizavam suas tarefas e atuavam em seu 
relacionamento com a sociedade. Várias teses surgiram para tentar ex-
plicar o que na época se denominou de “crise de governabilidade”. J.L. 
Sunquist, citado por B. Guy Peters, autor do verbete na Enciclopedia 
acima referida, relaciona quatro características que afetam a capacidade 
de governar:
a) a primeira é a qualidade da burocracia. Uma burocracia pública 
que careça de profissionalismo, seja por falta de formação 
adequada, seja pelo fato de que muitos cargos estratégicos 
costumam ser substituídos, quando se dão as mudanças 
de governo, não será capaz de oferecer um bom e adequado 
assessoramento, nem demonstrar capacidade de direção, na 
hora de elaborar as políticas públicas reclamadas pelas decisões 
políticas dos governos ou preconizadas pela sociedade. A 
experiência dos burocratas é muito importante nesse campo, 
de modo que, se seus conhecimentos não forem adequados 
para suprir as exigências do sistema político, é possível que as 
políticas deles oriundas também não o sejam. Neste caso, os 
governos só serão capazes de funcionar de forma reativa, isto é, 
reagindo, ante as situações que surjam; 
b) um segundo fator é a possibilidade de que a burocracia se 
comprometa com os objetivos dos diferentes governos que 
se sucedem no poder, em contraposição a seus próprios fins 
pessoais e organizativos, ou os de suaspróprias convicções. 
Sistemas administrativos muito fragmentados, como os dos 
Estados Unidos e o de alguns países escandinavos, ainda segundo 
Sunquist, podem permitir que as organizações sigam a trajetória 
pré-estabelecida em vez de seguir as novas orientações que se 
produzem, quando há troca de governo. Também é possível 
que utilizem o processo de formulação de políticas públicas, 
como simples recurso para aumentar os seus orçamentos e, 
conseqüentemente, sua influência, o que também é um risco 
para qualquer governo;
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c) em terceiro lugar, o próprio sistema institucional de elaboração 
de políticas públicas pode afetar e influir a governabilidade. 
Segundo a opinião do autor, os governos parlamentaristas, se 
tudo o mais se mantém constante, seriam provavelmente mais 
capazes de manter a governabilidade do que aqueles em que, 
como no presidencialismo, há uma rígida separação de poderes. 
Da mesma forma, os sistemas de governo que dispõem de um 
sistema de revisão judicial da constitucionalidade das políticas 
públicas podem se deparar com maiores dificuldades para atuar 
decisivamente, do que os países que não têm tribunais poderosos. 
Os regimes federativos, especialmente os que dependem de 
governos estaduais e municipais, para a instrumentação das 
políticas do governo central podem se deparar com maiores 
dificuldades para governar do que aqueles em que o exercício do 
poder central independe dos governos locais, como nos Estados 
unitários;
d) finalmente, os sistemas partidários de cada país podem in-
fluenciar a governabilidade, especialmente para gerar e executar 
um claro mandato de ação. Os sistemas pluripartidários, e em 
especial suas versões mais extremas, como vimos no fascículo 
anterior, que sempre exigem governos de coalizão, dificultam 
que os governos tenham um claro mandato a respeito dos temas 
políticos. Por outro lado, partidos nos países dotados de duas 
siglas podem carecer de programas claramente diferenciados, 
caso em que as campanhas eleitorais deixam de proporcionar 
orientação a respeito das políticas públicas propostas por eles. 
Na medida em que os partidos compartilham um consenso bá-
sico a respeito da maioria dessas políticas, ou pelo menos de 
respeito integral às regras do jogo político, haverá sempre maior 
estabilidade do governo, o que implica em aumento da gover-
nabilidade. Além do mais, a governabilidade pode se beneficiar 
da circunstância de haver um número limitado de partidos que 
tenham e sejam capazes de manter posturas políticas claras e 
afins e que tratem de instrumentalizá-las quando estão no po-
der;
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 As características de cada sociedade também afetam claramente 
os resultados dos esforços dos governos. Um fator importante é o seu 
grau de fragmentação. Os países com profundas divisões políticas em 
questões lingüísticas, étnicas ou religiosas serão sempre mais difíceis 
de governar do que as sociedades mais homogêneas. Da mesma forma, 
a fragmentação dos grupos de interesse, especialmente os sindicatos, 
pode tornar mais difícil a elaboração de políticas públicas, tanto no 
campo econômico quanto em relação à harmonização de seus interesses. 
Embora a maioria dos países industrializados tenha desenvolvido 
mecanismos para fazer frente à fragmentação da sociedade nos terrenos 
econômico e social, sua existência constitui sempre um obstáculo para 
a governabilidade. Um segundo fator social que afeta a governabilidade 
é a estrutura dos valores da população. A capacidade de governar está 
fortemente relacionada com a legitimidade e a autoridade do governo. 
Algumas culturas dão maior valor à autoridade política que a outras, 
enquanto há aquelas que valorizam mais a lealdade para com as famílias 
e outros grupos sociais do que a que concedem aos governos, como 
fonte de autoridade. Em alguns casos, o governo pode, inclusive, ser um 
símbolo negativo da autoridade e suas ações podem, em conseqüência, 
ser consideradas como quase intrinsecamente ilegítimas. 
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III – GOVERNABILIDADE E GOVERNANÇA
O conceito de governabilidade foi, durante muito tempo, entendido em seu sentido etimológico, isto é, como a capacidade que têm os governos de tornar efetivas as suas decisões. Essa capacidade deve ser exercida, tanto 
internamente, impondo-se em relação sobre todos os demais grupos 
sociais existentes no território de cada Estado, quanto externamente, 
para impedir que o seu poder seja confrontado pelo de outros Estados 
que possam, eventualmente, se contrapor ao seu. Disso derivaram a 
origem e a evolução histórica de todas as formas de governo, já que 
em nenhuma comunidade a conformidade com as normas sobre as 
quais se funda o desenvolvimento ordenado das relações sociais, se 
consuma de forma espontânea e automática. Daí podermos dizer que 
um governo é tão mais forte, quanto mais se baseia no consenso dos 
governados. Mesmo por que nenhum governo poderia subsistir por 
um longo tempo se tivesse que se impor somente pela força. Como 
lembra o prof. Lúcio Levi5, embora “o liberalismo, a democracia e o 
socialismo tenham contribuído para o alargamento da base social do 
poder e tenham dado origem a um processo de humanização da vida 
política, o exército, a polícia, as prisões, etc., constituem, ainda hoje, o 
fundamento último em que se apóia o poder dos governos”. Daí concluir 
ele que “a força e o consenso são, pois, as duas alternativas dialéticas que 
definem o governo. São termos contraditórios que podem, no entanto, 
harmonizar-se numa situação que jamais se realizou na história, a não 
ser como aspiração, onde a força se qualifique como autoconstrição da 
sociedade sobre si mesma, e, em conclusão, força e consenso tendem a 
confundir-se”. Segundo ele, “se a existência de um governo central que 
detém o monopólio da força é, indubitavelmente, um aspecto típico 
5 Op. cit. 
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do Estado moderno, e representa o ponto de chegada de uma longa e 
complexa evolução histórica, o uso da força ou a ameaça de recorrer a 
ela foi sempre o meio específico que as autoridades de governo tiveram 
sempre à disposição para garantir a supremacia de seu poder”. 
 Uma vez que os Estados se arrogam o direito do uso da força 
em relação a seus cidadãos, e uma vez que os governos têm o monopólio 
desse poder discricionário nos respectivos países, o poder dos governos é, 
em última análise, o titular desse poder, como representante do Estado. 
Neste sentido, os conceitos de governo e Estado se confundem. Na 
famosa conferência “Política como vocação”6 , Weber escreveu: “Todo 
Estado se funda na força, disse um dia Trotsky em Brest-Litvosk7 . E isso 
é verdade. Se só existissem estruturas sociais de que a violência estivesse 
ausente, o conceito de Estado teria também desaparecido e apenas 
subsistiria o que, no sentido próprio da palavra se denomina anarquia. 
A violência não é, evidentemente, o único instrumento de que se vale o 
Estado – não haja a respeito qualquer dúvida – mas é seu instrumento 
específico. Em nossos dias, a relação entre o Estado e a violência é 
particularmente íntima. Em todos os tempos, os agrupamentos 
políticos mais diversos – a começar pela família – recorreram à violência 
física, tendo-a como instrumento normal do poder. Em nossa época, 
entretanto, devemos conceber o Estado contemporâneo como uma 
comunidade humana que, dentro dos limites de determinado território 
– a noção de território corresponde a um dos elementos essenciais do 
Estado – reivindica o monopólio do uso legítimo da violência física . É com 
efeito, próprio de nossa época, não reconhecer, em relação a qualquer 
outro grupo ou aos indivíduos, o direito de fazer uso da violência, a 
não ser nos casos em que o Estado tolere: O Estado se transforma, 
portanto, na única fonte do ‘direito à violência’. (...) Tal como todos os 
agrupamentospolíticos que historicamente o precederam, o Estado 
consiste em uma relação de dominação do homem sobre o homem, 
fundada no instrumento da violência legítima (isto é, da violência 
6 WEBER, Max. Ciência e Política, duas vocações. Brasília/São Paulo. Ed. UnB/Ed. Cultrix, 
1983. Tradução do original alemãoWissenschaft als Beruf und Politik als Beruf. p. 56/57.
7 Cidade em que Trotsky, comissário do exterior da União Soviética, assinou com os países 
centrais da Europa, a paz que pôs fim à participação do país na 1a Guerra Mundial. 
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considerada como legítima). O Estado só pode existir, portanto, sob 
a condição de que os homens dominados se submetam à autoridade 
continuamente reivindicada pelos dominadores”. 
 Se força e consenso são recursos típicos dos Estados e, 
conseqüentemente dos respectivos governos, em que medida a 
dominação se baseia na força e em que proporção se assenta no 
consentimento dos próprios governados? A dominação consensual, 
segundo Weber, se assenta nos três fundamentos da legitimidade. 
O primeiro decorre do chamado “poder tradicional”, baseado na 
autoridade do “passado eterno”, isto é, os costumes santificados pela 
validez imemorial e pelo hábito enraizado nos homens de respeitá-los, 
como o que exerciam outrora os patriarcas e o senhor de terras. Nesta 
categoria está o respeito reverencial que os mais fracos dedicam aos mais 
fortes, mesmo nas democracias. O segundo é o “poder carismático”, 
fundado nos dons pessoais e extraordinários de alguns indivíduos 
(carisma), devoção e confiança pessoal depositadas em alguém que 
se singulariza por qualidades prodigiosas, por heroísmo ou por outras 
qualidades que fazem dele o chefe. É o poder exercido pelo profeta 
ou, no domínio político, pelo guerreiro eleito, pelo soberano escolhido 
através de plebiscito, pelos grandes demagogos ou pelo dirigente de um 
grande partido político. O terceiro é o “poder legal”, calcado na validez 
de um estatuto legal e de uma ‘competência’ positiva, fundado em 
regras racionalmente estabelecidas ou, em outros termos, a autoridade 
fundada na obediência, que reconhece obrigações decorrentes do 
estatuto estabelecido. É o poder que exerce o “servidor do Estado” em 
nossos dias, como faculdade delegada pelo Governo e como o exercem 
os detentores do poder que, sob esse aspecto, dele se aproximam. 
 Como se vê, tanto sob o ponto de vista da ciência política, 
quanto da sociologia, o termo governabilidade diz respeito à eficácia 
ou eficiência dos mecanismos do sistema político, sobretudo os 
governos, para a realização de seus fins e o atendimento das demandas 
da sociedade. Em outras palavras, refere-se à capacidade do governo 
de tornar efetivas suas decisões. Até agora, examinamos o conceito 
expresso na Enciclopedia de las Instituciones Políticas, um texto do fim 
da década de 80 do século passado. The Concise Oxford Dictionary of 
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Politics,8 (O Conciso Dicionário Oxford de Política) editado em 1996, 
usa a mesma conceituação em relação à palavra governabilidade: “O 
conceito não foi bem definido, mas está centrado na idéia de que, como 
a gama de problemas com que o governo se defrontava e se esperava que 
fossem solucionados cresceu, sua capacidade de resolvê-los se reduziu”. 
O autor lembra que a inclusão desse tema na agenda política se deu 
na década de 70. E, efetivamente, ele aparece no Dicionário de Política 
de Norberto Bobbio9, que é do início dos anos 80, quando o termo 
já tinha se generalizado. Mas começa ressalvando, em relação à sua 
definição que “o termo mais usado atualmente seria o oposto, ou seja, a 
não-governabilidade” descrita como “a incapacidade dos governantes”, 
enquanto outros a atribuem “às exigências excessivas dos cidadãos”. O 
autor do verbete, Gianfranco Pasquino, identifica, na literatura da época, 
as três principais vertentes que atribuem a crise de governabilidade a 
diferentes fatores. A primeira, de autoria do professor James Ó Connor, 
da Universidade da Califórnia, a debita à expansão dos serviços do 
Estado para atender as demandas da sociedade, o que termina levando 
a uma sobrecarga e à conseqüente crise fiscal do Estado. A segunda é do 
prof. Samuel Huttington, da Universidade de Harvard, segundo o qual 
a crise é uma questão política: “a governabilidade de uma democracia 
depende do relacionamento entre a autoridade de suas instituições de 
governo e a força de suas instituições de oposição”. E a terceira é do 
filósofo alemão Jurgen Habermas, para quem a não-governabilidade “é 
o produto conjunto de uma crise de gestão administrativa do sistema 
e de uma crise de apoio político dos cidadãos às autoridades e aos 
governos”. 
 O prof. Marcus André B. C. de Melo, da Universidade Federal 
de Pernambuco, abordou, no artigo do intitulado “Ingovernabilidade: 
desagregando o argumento”, publicado no livro Governabilidade e 
8 MC LEAN, Iain.(Ed.) The Concise Oxford Dictionary of Politics. New York, Oxford University 
Press, 1996, verbete “Governability”. 
9 BOBBIO, Norberto, MATEUCCI, Nicola e PASQUINO, Gianfranco. Brasília, Ed. UnB, 
7a edição, 1995. Tradução do original italiano de 1983. Verbete “Governabilidade”. 
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19
pobreza no Brasil 10 outro conceito paralelo ao de Governabilidade, 
o de “Governança”, disseminado pelo Banco Mundial. Diz ele nesse 
artigo: “A discussão contemporânea sobre o Estado tem se centrado 
na questão dos requisitos societais, organizacionais e políticos que 
permitem que o Estado seja eficiente. Mais do que isso, essa discussão 
tem privilegiado também a capacidade governativa em sentido amplo, 
e que se refere não só ao Estado, mas também aos requisitos do bom 
governo. Mais que um debate acadêmico, essa agenda de discussão 
constitui um elemento central nas formulações estratégicas de agências 
multilaterais. Governance, na formulação do Banco Mundial11, “is 
defined as the manner in which power is exercised in the management of a 
country’s economic and social development”. [Em vernáculo: Governança, 
na formulação do Banco Mundial, é definida como a maneira pela qual 
o poder é exercido na administração do desenvolvimento econômico 
e social de um país]. O conceito, acrescenta o autor, se distingue do 
de governabilidade, que descreve as condições sistêmicas do exercício do 
poder em um sistema político. Enquanto a governabilidade se refere às 
condições do exercício da autoridade política, governance qualifica o 
modo de uso dessa autoridade”. [Os itálicos são do original]
 Em outro artigo no mesmo livro, (“Governabilidade e 
solidariedade”) a professora Elisa P. Reis, do IUPERJ, começa 
afirmando que “Governabilidade, governança, sociedade civil são palavras 
recorrentes no léxico das ciências sociais, dos organismos internacionais 
e na mídia”. E depois de adiantar que não vai se deter discutindo o 
sentido de cada um desses conceitos, assinala: “Tomemos o termo 
governabilidade, por exemplo: de termo visto como ‘direitista’, ou pelo 
menos pragmático-realista em autores como por exemplo, Crozier, 
Huttington e Watanuki, ele se transformou em escudo ético moral para 
a direita e esquerda (termos antigos mas ainda expressivos). Vejamos 
o termo de popularização mais recente, governança: inicialmente ele 
10 VALLADARES, Lúcia e COELHO, Magda Prates (Org.) Governabilidade e pobreza 
no Brasil. Rio de Janeiro, Ed. Civilização Brasileira, 1995. O livro é resultado do seminário 
“Governabilidade e Pobreza” realizado no Rio de Janeiro de 29/6 a 1/7/1994, no Rio de 
Janeiro.
 11 World Bank (Banco Mundial) Governance and Development, 1992 (Governança e 
Desenvolvimento).
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foi usado por autores identificados com o novo institucionalismo na 
Ciência Política, particularmente na Inglaterra e nos Estados Unidos. 
(...) Pouco a pouco, porém, a palavra, conceito ou jargão foi perdendo sua 
identificaçãorestrita. Autores que analisaram reformas administrativas 
de perspectivas muito distintas desse grupo tornaram muito elástico o 
sentido de governança (...) Mais surpreendente, porém, foi ver o termo 
transformado quase no seu contrário: o uso que o Banco Mundial 
faz hoje do termo é totalmente diferente, já que a ênfase se deslocou 
dos aspectos técnico-administrativos para a viabilidade política de 
reformas administrativas, fiscais e propriamente políticas. (Governança 
virou quase sinônimo de democracia). Governança é entendido como 
a capacidade governamental para superar resistências políticas e levar 
à frente reformas consideradas indispensáveis, reformas consideradas 
justas e meritórias, universalistas; capacidade de exercício efetivo da 
autoridade”. 
 De acordo com o prof. Marcus André de Melo, portanto:
 Governabilidade se refere às condições do exercício da 
autoridade política; e
 Governança ao modo como se usa essa autoridade. 
 Trata-se, como se vê, de dois aspectos de um mesmo conceito.
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IV – SISTEMAS POLÍTICOS E
 SISTEMAS DE GOVERNO
 Governabilidade e Governança são, portanto, atributos típicos dos Governos a que também se liga a configuração dos sistemas políticos, com todos os seus componentes, ou seja, os sistemas eleitorais, 
partidários e de governo. Como vimos no fascículo II, conhecemos 
dois sistemas eleitorais, o majoritário e o proporcional que, por sua vez, 
admitem diferentes modalidades. Alguns países, como é o caso do Brasil 
usam um ou outro, segundo o fim a que se destinam. Quando se trata 
de escolher os titulares do poder Executivo (Presidente da República, 
Governadores e Prefeitos), assim como os representantes dos Estados 
no Senado, utilizamos o sistema majoritário, em duas modalidades. 
No caso dos Presidentes e Governadores, o sistema majoritário na 
modalidade maioria absoluta, regra que também se aplica à eleição 
dos prefeitos das cidades com mais de 200 mil habitantes. Nos demais 
casos, usamos o mesmo sistema majoritário na modalidade maioria 
simples, método também utilizado para a escolha dos Senadores. Já 
para a eleição dos Deputados, federais, estaduais e distritais e dos 
Vereadores, aplicamos o sistema proporcional, na modalidade de 
quocientes eleitorais. Outros países, como a Inglaterra, empregam o 
sistema majoritário, na modalidade de maioria relativa para a escolha 
dos representantes à Câmara dos Comuns, enquanto a França, para a 
eleição dos Deputados membros da Assembléia Nacional, se vale do 
sistema majoritário, na modalidade de maioria absoluta no 1o turno e 
de maioria relativa no 2o. São poucas, como se vê, as alternativas para 
combinar dois sistemas eleitorais, com suas várias modalidades. 
 Vimos também no fascículo III, que os sistemas partidários 
eram inicialmente classificados segundo o número de partidos, método 
que terminou sendo substituído, depois de sucessivas críticas, primeiro 
pelo grau de concentração deles, e mais tarde pelo de fraccionalização, 
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segundo sua capacidade de coalizão, quando se trata de formar gover-
no. Também verificamos, em relação aos Estados. que eles admitem 
duas formas de organização. Podem ser unitários, como a França, a 
Itália e a Grã-Bretanha, com diferentes graus de concentração do po-
der, ou federados, isto é, organizados sob a forma federativa, com um 
governo central titular da soberania do Estado e governos regionais e 
locais, dotados de autonomia política, Brasil e Estados Unidos. Parale-
lamente, também conhecemos dois sistemas de governo: monárquicos, 
caracterizados pela separação entre a chefia do Estado e do Governo 
exercida por diferentes titulares e republicanos em que um só titular 
é, ao mesmo tempo, chefe de Estado e chefe de Governo. No primei-
ro caso, a escolha dos chefes de Estado, usualmente um monarca, se 
dá por sucessão hereditária, no segundo, por eleição, direta, como na 
França ou em Portugal, ou indireta, como na Itália e Alemanha. As 
formas de organização dos governos, por sua vez, admitem duas mo-
dalidades: parlamentarista ou presidencialista. Essas divisões são dico-
tômicas, isto é, se opõem entre si e portanto se excluem mutuamente. 
Assim, o sistema de governo monárquico é incompatível com o sistema 
republicano, da mesma maneira que a forma de organização parlamen-
tarista é incompatível com a modalidade presidencialista e um Estado 
unitário não pode ser federalista. Entretanto, é preciso ressaltar que 
um sistema de governo republicano admite tanto a modalidade de or-
ganização presidencialista, quanto parlamentarista. O mesmo, contudo 
não se dá com os regimes monárquicos que não admitem a forma de 
governo presidencialista, sendo compatível, apenas com a modalidade 
parlamentarista de governo.
 Todas essas variações são produtos da evolução histórica dos 
Estados e dos Governos que foram adotando uma ou outra forma 
de organização, em razão dos condicionamentos políticos que suas 
histórias lhes impuseram. Resumindo essas diferentes modalidades e 
formas de organização dos Estados, dos Governos e dos respectivos 
sistemas e regimes, lidamos hoje no mundo com as seguintes principais 
modalidades organizacionais dos diferentes países: 
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GOVERNO
 FORMA SISTEMA
FORMA DE
ESTADO
REGIME
POLÍTICO
Parlamentarista Monárquico Unitário Democrático
Presidencialista Republicano Federado Autocrático
 A combinação dessas diferentes formas e modalidades de Estado, 
de Governo e de regime político tem a ver com a governabilidade. Mas 
não são os únicos nem exclusivos condicionamentos. Se considerarmos 
apenas a forma e o sistema de governo, as formas de estado e os respectivos 
regimes políticos, não há grande variedade na maneira de se organizar 
cada nação. Na medida em que consideramos outras modalidades que 
influem na configuração política dos países, o número de variáveis 
aumenta de forma exponencial. Combinando-se os elementos acima, 
podemos ter as seguintes modalidades de configuração das formas de 
Estado, de governo e de regime político. 
GOVERNO
 FORMA SISTEMA
FORMA DE
ESTADO
REGIME
POLÍTICO
Parlamentarista Monárquico Unitário Democrático
Parlamentarista Monárquico Unitário Autocrático
Parlamentarista Monárquico Federativo Democrático
Parlamentarista Monárquico Federativo Autocrático
Parlamentarista Republicano Federativo Democrático
Parlamentarista Republicano Federativo Autocrático
Parlamentarista Republicano Unitário Autocrático
Parlamentarista Republicano Unitário Democrático
Presidencialista Republicano Federativo Democrático
Presidencialista Republicano Federativo Autocrático
Presidencialista Republicano Unitário Autocrático
Presidencialista Republicano Unitário Democrático
 
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 Entretanto, formas e sistemas de Governo, formas de Estado 
e regimes políticos, não são os únicos elementos institucionais que 
configuram um sistema político. Ao analisar os trabalhos sobre o 
tema “Instituições políticas”, apresentados ao IX Congresso da IPSA 
(Associação Internacional de Ciência Política), realizado em Berlim 
em 1994, o professor Bo Rothstein da Universidade de Göteborg, no 
artigo Political Institutions: an Overview (Instituições políticas: um 
sumário), publicado em A New Handbook of Political Science12 (Um novo 
manual de Ciência Política), valeu-se da tabela abaixo reproduzida, de 
autoria de Schmitter e Karl13 , e relacionou 10 aspectos básicos dos 
sistemas políticos contemporâneos:
Variações institucionais entre as democracias
capitalistas do mundo ocidental
Sistema Partidário Bi-partidário X Multipartidário
Sistema Eleitoral Proporcional X Majoritário
Sistema Legislativo Unicameral X Bicameral
Forma de Estado Unitário X Federativo
Forma de Governo ParlamentaristaX Presidencialista
Sistema Judicial Revisão judicial X Previsão judicial
Governos locais Fraca autonomia X Forte autonomia
Serviço público Apadrinhamento X Sistema de mérito
Forças Armadas Profissionalizadas X Serviço militar obrigatório
Relações do Estado com a economia Liberal X Corporativista
 
Com base nela, mostrou que esses dez elementos podem ser 
correlacionados, o que dá a combinação de duas alternativas para cada 
um dos dez elementos. Isto significa 210 o que produz como resultado 
1.024 combinações diferentes! 
12 GOODIN E. e KLINGEMANN, Hans-Dieter. New York, Oxford University Press, 1996, 
cap. 4, p. 133 e segs. 
13 SCHMITTER, P. C. e KARL, T. What Democracy is... and is not. “In” “Journal of Democracy”, 
1991, v. 2, p. 72-136. (O que é Democracia ... e o que não é)
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 Levar em consideração apenas a forma e os sistemas de 
governo e a forma de Estado e os regimes políticos, não permite mais 
que 12 modalidades de organização política, enquanto ter em conta 
as dez variáveis da tabela de Philip Schmitter e T. Karl aumenta para 
1.024 as diferentes opções na configuração dos sistemas políticos. A 
discrepância entre as duas hipóteses mostra como a governabilidade e a 
governança podem variar para mais ou para menos, quando se aumenta 
ou se diminui a variedade dos elementos considerados pela análise 
política. O texto de prof. Rothstein procura explicar porque diferenças 
institucionais como essas ocorrem e que diferença elas fazem. Com 
base nessa realidade, os cientistas políticos, diz ele, devem fazer três 
indagações específicas, sendo uma de natureza normativa: 
a) Que instituições são mais adequadas para se criar “bons” 
governos e melhores relações sociais? 
 As outras são de natureza empírica. 
b) O que explica essa enorme possibilidades de arranjos insti-
tucionais? 
c) Que diferença, esses distintos arranjos provocam no com-
portamento político, no exercício do poder político e nas deci-
sões por ele tomadas? 
 Quando nos cingimos a analisar apenas as conseqüências dos 
sistemas eleitorais nos sistemas partidários, e desses nas duas diferentes 
formas de governo conhecidas, parlamentarismo e presidencialismo, 
as conclusões parecem razoavelmente óbvias. Vejamos sumariamente 
quais são. No fascículo II, examinamos os resultados empíricos das 
duas leis tendenciais de Maurice Duverger, que podem ser resumidas 
numa só. Vamos recordá-la: 
“O sistema eleitoral proporcional facilita a proliferação partidária; o 
majoritário a inibe.” 
enunciado que também pode ter a seguinte variante: 
“O sistema majoritário favorece a concentração partidária, enquanto 
o proporcional propicia sua proliferação.” 
 Examinamos também a constatação empírica dessa conclusão, 
cotejando um mesmo número de eleições na Inglaterra, que adota 
o sistema eleitoral majoritário e no Brasil que utiliza o sistema 
proporcional. Os resultados foram os reproduzidos abaixo: 
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Resultados do Sistema Eleitoral e Partidário
na Inglaterra e no Brasil
Inglaterra Brasil
Eleições
N° de Partidos 
no Parlamento
Índice de 
fraccionalização
Eleições
N° de Partidos 
no Parlamento
Índice de 
fraccionalização
974 (Fev) 3 0,554 1945 10 0,639
1974 (Out) 3 0,556 1954 13 0,782
1979 3 0,542 1962 13 0,780
1983 3 0,506 1986 12 0,647
1987 3 0,532 1990 19 0,885
1992 3 0,551 1998 18 0,860
 
 A Inglaterra é uma monarquia parlamentarista e o Brasil uma 
república presidencialista. O que isto significa? Em relação à Inglater-
ra, que são muitas as diferenças com o Brasil. Em primeiro lugar, que 
não há eleições para a escolha do chefe de Estado, o rei ou a rainha da 
casa reinante. Em segundo lugar, que o rei ou a rainha reinam mas não 
governam. Em terceiro, quem governa é o Gabinete, ou seja o Conse-
lho de ministros, através do respectivo chefe, o Primeiro ministro, que é 
o titular do Poder Executivo. Quarto que os eleitores ingleses escolhem 
os seus representantes na Câmara dos Comuns, mas não o Primeiro 
ministro. Quinto que ao votarem nos candidatos de sua preferência, 
sabem de antemão que o Primeiro-ministro será, obrigatoriamente, 
o líder do partido que eleger o maior número de deputados. Sexto, 
que essa opção, contudo, só será conhecida após as eleições. Sétimo, 
que a função de chefe de Estado é vitalícia e a de chefe do Governo 
temporária. Oitavo: que, embora os deputados sejam eleitos para uma 
legislatura de quatro anos, a Câmara pode ser dissolvida, antes de findo 
esse período, segundo as conveniências do Gabinete. Nono: o Primeiro 
ministro poderá ser reeleito, durante tantas legislaturas, quantas o seu 
partido for o maior da Câmara. Décimo: o Primeiro-ministro poderá 
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ser destituído, sempre que assim o decidir seu partido, sem necessidade 
de que a Câmara seja dissolvida. 
 A principal conseqüência de tudo o que distingue o sistema 
político inglês da República presidencialista que é o Brasil, é que o 
Poder Executivo inglês depende do maior partido do Parlamento. Se 
esse partido for majoritário, isto é, dispuser da maioria das cadeiras, 
poderá governar sozinho. Sendo o maior partido, mas não dispondo 
da maioria, poderá optar por uma de duas alternativas: coligar-se com 
outro, com o qual consiga a maioria dos votos, ou instituir um governo 
minoritário. Qualquer das duas últimas opções torna o Executivo mais 
frágil politicamente e dependente, ou do partido minoritário com o 
qual se coligou para conseguir a maioria, ou do segundo maior partido 
que poderá coligar-se com o terceiro, também minoritário, para formar 
maioria e derrubar o que estiver no poder sem dispor de maioria. É por isso 
que, na linguagem corrente da política inglesa, o seu sistema de governo 
chama-se de “Cabinet Government” (Governo de Gabinete), título de 
um dos livros da trilogia sobre o sistema político inglês de autoria de Sir 
Ivor Jenings14 , um dos maiores constitucionalistas daquele país. Como 
vimos no quadro acima, o sistema eleitoral majoritário inglês favorece a 
concentração partidária, o que se demonstra por seis eleições sucessivas 
em que apenas 3 partidos conseguiram representação partidária na 
Câmara dos Comuns, tornando o sistema reconhecidamente estável. 
Nos 30 anos que vão de 1974 a 2004, a Inglaterra teve apenas cinco 
Primeiros-ministros, como mostra o seguinte quadro: 
14 JENNINGS, W. Ivor. Governo de Gabinete. Brasília, Senado Federal/Ed. UnB, 1979, V. 19 da 
Coleção Bernardo Pereira de Vasconcelos. Tradução do original inglês. As duas outras obras que 
completam a trilogia desse autor sobre o sistema político inglês são: Parliament (Parlamento) e 
Party Politics (A política partidária), ambos ainda não traduzidos em português.
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Governos e Gabinetes Ingleses
1974/2004
Período Partido 1o Ministro Duração 
1974/1976 Trabalhista Harold Wilson 2 anos
1976/1979 Trabalhista James Callaghan 3 anos
1979/1990 Conservador Margareth Tatcher 11 anos
1990/1997 Conservador John Major 7 anos
1997- Trabalhista Tony Blair 7 anos
Trabalhistas X Conservadores
74/79 e 97/2004 Trabalhista Wilson/Callaghan/Blair 12 anos
1979/1997 Conservador Tatcher/Major 18 anos
 
 Como República presidencialista, o sistema político brasileiro 
tem acentuadas diferenças em relação à Inglaterra. Em primeiro lugar, 
um só titular exerce, simultaneamente, a chefia do Estado e a chefia 
do Governo. Em segundo lugar, o chefe de Estado e de Governo, é 
escolhido por eleições diretas pela totalidade do eleitorado. Terceiro, 
como chefe de Estado, e de Governo, é o Presidente quem governa. 
Quarto: como chefe de Governo, o presidente nomeia e demite 
livremente seus ministros, sem interferência dos demais Poderes do 
Estado. Quinto, como Chefe de Estado o Presidente dirige a política 
externae exerce o comando das forças armadas definindo a política 
de segurança nacional. Sexto: o Presidente depende da maioria do 
Congresso para aprovar as leis de que necessite, mas não precisa ter 
maioria para governar. Sétimo: o mandato do presidente é fixo, e tem 
variado, ao longo do tempo, entre 4, 5 e 6 anos; atualmente é de quatro 
anos. Oitavo: só em situações excepcionais o Congresso pode remover 
de seu cargo o Presidente, através do “impeachment”. Nono, desde 
junho de 1997, quando foi aprovada a Emenda constitucional nº 16, os 
presidentes podem ser reeleitos apenas uma vez. Décimo: o Presidente 
não pode dissolver o Congresso. 
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 Examinando-se o quadro político brasileiro dos mesmos 
trinta anos, de 1974 a 2004, temos o resultado de sete presidentes, seis 
governos, com três regimes políticos distintos (regime militar: 1964-
1978; transição política: 1978-1988 e regime democrático a partir de 1988) 
e quatro sistemas constitucionais diversos (Atos institucionais: 1964/69; 
Emenda Constitucional 1-1969/78; Mesmo regime sem atos institucionais 
1978/85; Emenda constitucional 1/69 com emendas liberalizantes: 
1985/88 e Constituição de 1988): 
Governos e Presidentes Brasileiros
1974/2004
Período Partido Presidente Duração
1974/1979 Gov.Militar –Arena Ernesto Geisel 5 anos
1979/1985 Gov.Militar – PDS João Figueiredo 6 anos
1985/1990 PDS/PMDB José Sarney 5 anos
1990/1992 PRN Fernando Collor 2 anos e 9 meses
1992/1994 S/Partido Itamar Franco 2 anos e 3 meses
1995/2002 PSDB Fernando H.Cardoso 8 anos
2003/2006 PT L.Inácio Lula Silva 4 anos
 
 O contraste entre os regimes políticos de ambos os países não 
quer dizer que todo parlamentarismo seja estável como o inglês e nem 
todo presidencialismo conflitivo e instável como o brasileiro. Mas os 
dados dessa comparação permitem concluir que há uma correlação 
inevitável entre sistema eleitoral e sistema partidário que confirma a 
lei de Duverger. O sistema eleitoral majoritário da Inglaterra produziu 
em 30 anos um sistema partidário de baixa fragmentação, com três 
partidos parlamentares ao longo de todo o período considerado, (com 
índice de fraccionalização mínimo de 506 e máximo de 556), enquanto 
o sistema proporcional brasileiro mostrou alta fragmentação, variando 
o número de partidos parlamentares no período considerado de 10 
a 19, (com índice de fraccionalização mínimo de 639 e máximo de 
885). 
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V – OS PARLAMENTARISMOS
 Usamos os exemplos da Inglaterra e do Brasil, com o óbvio desejo de contrastar formas de governo inteiramente distintas: um velho parlamentarismo de pelo menos três séculos, o mais antigo do 
mundo, e um jovem presidencialismo de pouco mais de um século. 
Isto não quer dizer que não seja possível o estabelecimento de sistemas 
impropriamente chamados de “mistos” que, na realidade, misturam 
algumas poucas práticas de ambas as modalidades. A dificuldade está em 
que eles podem ser chamados indistintamente de semipresidencialistas 
ou semiparlamentaristas. Como são poucos em todo o mundo, não vale 
a pena deter-nos em analisá-los, lembrando que os casos conhecidos 
são os da França, Portugal, Áustria, Irlanda e Finlândia. São todos 
pretensamente mistos, com um chefe de Estado, Presidente da 
República, e um chefe de governo, o Primeiro-ministro. A diferença dos 
demais parlamentarismos é que os chefes de Estado são escolhidos pelo 
voto direto de todo o eleitorado, como nos regimes presidencialistas, 
enquanto nos parlamentarismos originários os chefes de Estado ou 
são os monarcas, ou são presidentes, eleitos de forma indireta pelos 
respectivos parlamentos. Nisto consiste a diferença. O primeiro país a 
adotar essa alternativa foi a França, onde o mandato dos presidentes é 
de sete anos e o dos parlamentares de quatro. Isto levou o prof. Maurice 
Duverger a prever, antes mesmo de sua aplicação na prática, o que 
ele chamou de “co-habitação”, isto é, que o presidente, mais cedo ou 
mais tarde, seria obrigado a conviver com um Primeiro ministro de 
partido diferente do seu. Isto, efetivamente, ocorreu com o Presidente 
socialista François Miterrand, quando seu partido perdeu as eleições 
parlamentares e ele teve que aceitar um Primeiro-ministro conservador. 
A situação inédita exigiu um arranjo político não contemplado pela 
Constituição do país, a divisão de poderes entre o Chefe de Estado e o 
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Chefe de Governo. O Presidente passou a dirigir a política externa e a 
de defesa e o Primeiro-ministro as questões de todas as demais áreas de 
governo. Com isso, a França tornou-se o único país da União Européia 
a ser representado por dois mandatários, quando das reuniões da sua 
Comissão Executiva. Na Áustria, também não foi boa a experiência, 
pois o primeiro presidente eleito pelo voto popular foi o ex-Secretário 
Geral da ONU, Kurt Waldheim. Terminada as eleições, descobriu-se 
que ele tinha servido como oficial ao Exército alemão durante o nazismo, 
o que provocou seu isolamento internacional, pois virtualmente todos 
os países democráticos se recusaram a receber em visita oficial um 
chefe de Estado de passado nazista. Como o Presidente da República 
nos sistemas presidencialistas tem funções apenas de Estado, não há 
razão para elegê-lo pelo voto direto. A iniciativa partiu do general De 
Gaulle que desejava contrastar a legitimidade dos presidentes eleitos 
pelo povo, com a dos Primeiros-ministros, escolhidos de forma indireta 
pelo Parlamento. 
 Nos sistemas parlamentaristas tradicionais, o modelo clássico é 
o inglês, que se distingue dos demais por uma particularidade, a de que 
a formação do Gabinete não depende de uma investidura formal, já 
que não exige maioria de votos. O Primeiro-ministro é sempre, como já 
assinalamos, o líder do maior partido, mesmo que não tenha a maioria 
de cadeiras da Câmara dos Comuns. Isto seria impensável na quase 
totalidade dos demais parlamentarismos europeus, e decorre da regra 
não escrita referida acima, de que o líder do maior partido nos Comuns 
será automaticamente investido no cargo de Primeiro-ministro, ao 
ganhar as eleições. Mas, como também já frisamos, este caso é uma 
exceção. Em todos os demais, é o partido que possui a maioria do 
Parlamento, isoladamente, ou em coalizão com outros, que elege o 
Primeiro-ministro. A mecânica é a mesma, com pequenas adaptações 
como no caso alemão a que adiante faremos referência. O Gabinete, 
titular do Poder Executivo, é uma delegação da maioria parlamentar e 
não do Parlamento, como se costuma afirmar. Governará durante toda 
a duração da legislatura, usualmente de quatro anos, enquanto merecer 
a confiança dessa maioria. Em grande parte dos países europeus, são 
governos “bicolores”, isto é, constituídos por dois partidos que se 
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coligam para governar. Essa maioria se mantém no poder, enquanto 
mantiver a preferência do eleitorado. Há duas hipóteses para a cessação 
do Governo. Uma é a aprovação, por maiorias ocasionais, da moção 
denominada “voto de desconfiança”. Aprovada, o governo tem duas 
opções: a primeira é renunciar e convocar novas eleições, para que o 
eleitorado manifeste sua preferência, concedendo maioria ao mesmo 
grupo que estava no poder, ou retirando-lhe a condição majoritária, 
hipótese em que a nova maioria elegerá outro Gabinete. A segunda 
opção, é propor ao Chefe de Estado a dissolução da Câmara, provocando 
o fim da Legislatura e a investidura de uma nova representação que 
decidirá sobre o novo Governo. A outra hipótese é o Gabinete, tendo 
dúvidas quanto a fidelidade da maioria que o sustenta, pedir à Câmara 
um “voto de confiança”. Se aprovado, continuará no poder. Se rejeitado, 
procede segundo as mesmas alternativas no caso da aprovação de um 
voto de desconfiança: ou renuncia, ou dissolve a Câmara, paraque os 
eleitores ajam como árbitros da situação política assim criada.
 Sempre que um voto de desconfiança for aprovado ou um 
voto de confiança rejeitado, e a Câmara for dissolvida, o Gabinete 
que estiver no poder, nele permanece, para evitar a vacância do poder, 
até o resultado das eleições. Renovada a confiança pelo eleitorado, 
o Gabinete permanece, com a mesma constituição, ou com novos 
membros da mesma maioria. Retirada a confiança, sobe ao poder o 
Gabinete escolhido pela nova maioria saída das eleições. Pode ocorrer 
que um Gabinete constituído por muitos partidos perca a maioria pela 
retirada de um deles e se proponha a constituir nova maioria com os 
partidos antes na oposição, e que essa indefinição perdure por algum 
tempo. Para evitar essa situação, a lei fundamental de Bonn, que é a 
Constituição da antiga Alemanha Ocidental, previu, como alternativa 
à moção de desconfiança, o chamado “voto de desconfiança positivo” 
ou afirmativo. Isto significa que qualquer moção de desconfiança só 
pode ser apresentada com a indicação simultânea do Gabinete que 
substituirá o que estiver no poder, na hipótese da moção ser aprovada. 
Com isto se procurou evitar as incertezas decorrentes do período 
que vai da dissolução às eleições e à constituição do novo governo. 
Na Inglaterra, há outra hipótese de mudança do Primeiro-ministro, 
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sem dissolução da Câmara, e no curso de uma mesma legislatura. É 
quando o partido majoritário troca por decisão interna o seu líder. Isto 
ocorreu com Margareth Tatcher destituída da liderança do Partido 
Conservador, em 1990, sendo substituída por John Major seu ministro 
e pertencente ao mesmo partido. 
 O sistema parlamentar de governo, como vimos, existe tanto 
nos regimes monárquicos, quanto nos republicanos. No primeiro 
caso, o chefe da Casa reinante ocupa a Chefia do Estado, não estando 
sujeito, portanto, à eleição. Sua substituição se dá, assim, pelas regras da 
sucessão dinástica, em geral previstas na Constituição. Nas repúblicas, 
com as exceções dos cinco países já referidos, ele é eleito de forma 
indireta. Nos regimes unicamerais, como Portugal, pela Assembléia 
Nacional. Nos regimes bicamerais, pelas duas Casas do Parlamento, 
como ocorre na Itália, usualmente para mandatos mais longos do que 
a duração das Legislaturas que costuma ser de quatro anos. Como o 
regime parlamentar mais antigo do mundo é o da Grã-Bretanha, de lá 
provêem as principais praxes do sistema. A origem do termo Primeiro- 
ministro e a questão de quando começou a ser utilizado, tem sido 
objeto de largas discussões acadêmicas. A expressão, porém, foi usada 
desde o reinado da rainha Ana, entre 1702 e 1714 e se tornou corrente 
durante o reinado de George II, de 1727 a 1760, quando foi atribuída 
depreciativamente a Robert Walpole, que ocupou o cargo entre 1721 e 
1742. A despeito de longo uso, a denominação só se tornou oficial em 
1905, como título atribuído ao líder do Governo, isto é, o presidente do 
Conselho de Ministros. 
 Os mais importantes parlamentarismos da Europa ocidental, 
com exceção da Itália, têm tido gabinetes de longa duração. Em geral, 
são sistemas pluripartidários contidos, isto é, de poucos partidos. A 
Alemanha ocidental, unificada em 1990, teve, de 1949 até hoje, apenas 
sete Primeiros-ministros que lá têm a designação de Chanceler. A 
Espanha, depois da redemocratização, iniciada em 1976, somente cinco 
que lá se denominam Presidente del Gobierno e a Inglaterra 12, entre 
1945 e os dias atuais. Na Itália, onde predomina um pluripartidarismo 
extremado, nada menos de 50 gabinetes diferentes se sucederam no 
poder durante os 48 anos seguintes à Constituição de 1946. Além 
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disso, nos parlamentarismos do tipo inglês, os titulares costumam durar 
muito tempo no poder. Na Inglaterra, como vimos, Margareth Tatcher 
permaneceu 11 anos como Primeira-ministra, e seu sucessor, John 
Major, os sete seguintes, somando 18 anos de domínio conservador. 
Na Alemanha, o chanceler Helmuth Schmidt governou o país por 
oito anos e seu sucessor, Helmuth Kohl, o recordista europeu, por mais 
16 anos, enquanto o espanhol Felipe González permaneceu no poder 
por 13 anos. São dados que mostram que os regimes parlamentaristas, 
ao contrário do que se supõe, costumam ser estáveis, sobretudo em 
face do julgamento dos eleitores. Os casos acima decorrem sobretudo 
dos respectivos sistemas eleitorais, ao permitirem que um, dois ou no 
máximo três partidos conquistem a maioria das respectivas Câmaras. 
O Parlamentarismo, bastante disseminado no mundo contemporâneo, 
é a mais antiga forma de governo conhecida. 
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VI – O PRESIDENCIALISMO
 Na Europa, predominam os regimes monárquicos, todos parlamentaristas, forma de governo adotada também pelas repúblicas daquele continente. A razão da quase totalidade serem parlamentaristas 
é que se trata de nações antigas que se tornaram estados nacionais 
sob a forma monárquica, em torno do séc. XVI. São exceções os que 
se unificaram ou se emanciparam mais cedo, como Inglaterra, França, 
Portugal e Espanha, enquanto Itália, Alemanha e Bélgica, por exemplo, 
só se unificaram durante o séc. XIX. Quase todos eram monarquias 
absolutas que passaram pela revolução burguesa do fim do séc. XVIII, 
ou foram por ela influenciadas. Foi o movimento constitucionalista, 
produto do Iluminismo que, pondo fim ao absolutismo monárquico, 
e adotando o princípio da separação dos poderes, impôs aos reis 
as funções meramente cerimoniais a que hoje se reduzem suas 
atribuições. Monarquia é uma palavra de origem grega que significa 
poder de um só. O termo república, ao contrário, é de origem latina 
e se disseminou no Império Romano, significando “coisa pública”. 
Era corrente já em 62 d.C., ano da publicação por Cícero de sua obra 
De Republica (Sobre a República). Embora haja inclusive uma História 
da República Romana, de autoria de Oliveira Martins15 e muitos dos 
compêndios de História se refiram a uma república em Roma, não 
houve na antigüidade clássica período ou regime que possam ser 
classificados de republicanos. Durante o Renascimento, há freqüentes 
alusões à Sereníssima República de Veneza e a outras repúblicas 
italianas, termo na realidade aplicado por oposição aos demais estados 
independentes, então existentes na península Itálica, governados por 
15MARTINS, J.P. Oliveira. História da República Romana. Lisboa, Liv. De Antônio Maria 
Pereira, Editor, 2 vol. [s.d.]
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titulares escolhidos hereditariamente. A primeira forma republicana de 
governo, tal como a conhecemos hoje, concebida como regime oposto 
às monarquias então existentes, foi construída a partir da união das 12 
das 1316 colônias inglesas na América, que subscreveram a “Declaração 
de Independência” no dia 4 de julho de 1776 e assinaram os “Artigos 
da Confederação” em 1781, documento que serviu de Constituição 
provisória às colônias unidas, até a aprovação da definitiva em 1789. A 
república norte-americana, no entanto, nasceu definitivamente a partir 
do texto constitucional elaborado e aprovado pelos delegados das 13 
ex-colônias, reunidos na Filadélfia entre 14 de maio e 17 de setembro de 
1787. Essa Constituição foi subscrita por apenas 39 dos 55 delegados 
que compunham a Convenção Constitucional, 42 dos quais presentes à 
sessão em que o texto foi aprovado. Para que entrasse em vigor contudo, 
tinha que ser retificada por pelo menos 9 dos 13 Estados, o que ocorreu 
nas seguintes datas e com os seguintes resultados17 :
Aprovação da Constituição de 1787
pelas Assembléias das Antigas Colônias
Estado Data da Ratificação Sim Não
Delaware 07 de dezembro de 1787 Unânime ==
Pensilvânia 12 de dezembro de 1787 46 23
Nova Jersey 18 de dezembro de 1787 Unânime ==
Geórgia 02 de janeiro de 1788Unânime ==
Connecticut 09 de janeiro de 1788 128 40
Massachussetts 05 de fevereiro de 1788 187 168
Maryland 26 de abril de 1788 63 11
Carolina do Sul 23 de maio de 1788 149 73
New Hampshire 21 de junho de 1788 57 47
Virgínia 25 de junho de 1788 89 79
16 New York foi a única das 13 colônias que se absteve na votação desse documento, no 
Congresso Continental realizada no dia 2 de julho, embora o dia da Independência seja 
comemorado em 4 do mesmo mês. 
17 PADOVER, Saul K. A Constituição viva dos Estados Unidos. São Paulo, IBRASA, 1964. 
Coleção Clássicos da Democracia, v. 28, p. 28
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39
Nova York 26 de julho de 1788 30 27
Carolina do Norte 21 de novembro de 1789 195 77
Rhode Island 29 de maio de 1790 34 32
 
 Nesses mais de dois séculos, ela se tornou a mais antiga 
Constituição escrita do mundo, ainda em vigor. Trata-se de um 
documento sintético que, por sua objetividade e brevidade, tornou-se 
paradigma dos sistemas republicanos. Embora sua elaboração durasse 
apenas quatro meses, concretizá-la exigiu um longo e penoso caminho 
que teve início com o chamado Congresso Continental de setembro 
de 1774, reunido na Filadélfia. Essa reunião foi a resposta dos colonos 
à lei dos Atos intoleráveis, votada pelo Parlamento inglês, incluindo 
o fechamento do porto Boston, em represália à queima dos navios 
protagonizada pelos habitantes locais, como reação à cobrança de 
impostos sobre o chá importado da Inglaterra. Os ideais da Declaração 
da Independência de 4 de julho de 1776 e dos “Artigos da Confederação” 
que votados em março de 1781, serviram como Constituição provisória 
do país, só se materializaram com a ratificação do texto aprovado pela 
convenção constitucional de 1789 quando, em 21 de junho de 1788, 
a Assembléia de New Hampshire se tornou o 9o Estado a ratificar 
o texto constitucional. A tarefa de construção do Estado, porém, só 
se completou em 4 de março de 1789, data em que o novo Governo 
federal instalou-se provisoriamente em Nova York, e em 1o de abril, ao 
ser organizada a 1a Câmara dos Deputados, passo essencial para que, 
cinco dias depois George Washington fosse eleito o 1o presidente da 
nova República. Passaram-se 15 anos desde a realização do 1o Congresso 
Continental em 1774, 13 desde a Declaração de Independência, em 
1776 e 8 desde a aprovação dos Artigos da Confederação em 1781. 
 A Constituição americana não instituiu apenas um novo 
sistema de governo, a República, por oposição à monarquia, mas também 
uma nova forma de governo, o presidencialismo, por oposição ao 
parlamentarismo e uma nova forma de Estado, a federação, por oposição 
aos Estados unitários, até então existentes. Se, como diz o prof. Adam 
Przeworski, a última grande invenção da política foi o voto, a república, 
o presidencialismo e a federação foram as três últimas invenções da 
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filosofia política. O primeiro presidente da nova república foi George 
Washington, que tinha presidido a convenção constitucional. Ele 
serviu em dois mandatos, de 1789 a 1797, já que concordou em ser 
reeleito mas, ao recusar uma nova reeleição, estabeleceu o precedente 
de que os presidentes podem cumprir dois e não mais de dois mandatos 
sucessivos, com a duração de quatro anos, enquanto na Câmara dos 
Deputados (“House of Representatives”) os mandatos são de dois 
anos e no Senado (“Senate”), de seis, sem limites quanto à reeleição. O 
precedente da limitação dos dois mandatos sucessivos na Presidência 
foi quebrado por Franklin Delano Roosevelt, que governou de 1933 
a 1945, morrendo no exercício de seu 4o mandato. A norma, porém, 
foi restabelecida pela Emenda Constitucional XXII, de 1951. A 
Constituição americana aprovada em 17 de setembro de 1787, não é 
só a mais antiga em vigor, mas seguramente a mais sintética entre as 
escritas. Entretanto, é preciso examinar o seu conteúdo, mais do que 
sua forma, para não chegarmos a conclusões falsas. Formalmente, seu 
texto original é dividido em sete artigos que, por sua vez, se subdividem 
em 21 Seções. Só que a divisão dos artigos não obedece ao padrão 
brasileiro, com artigos, parágrafos, incisos e alíneas. Um artigo pode 
ter várias seções e uma seção pode ocupar uma página inteira. Seu 
conteúdo é, sumariamente, o seguinte:
 O artigo I é o mais longo e contém 10 seções que tratam 
respectivamente:
A Seção I, do Poder Legislativo, de que é investido o Congresso.
A Seção II, da Câmara dos Deputados. 
A Seção III, do Senado, presidido pelo Vice-Presidente
A Seção IV, da eleição dos deputados e senadores
A Seção V, da organização interna de cada uma das Casas do 
Congresso
A Seção VI, dos subsídios parlamentares, sua imunidade e 
incompatibilidades
A Seção VII, do processo legislativo
A Seção VIII, da competência do Congresso
A Seção IX, das proibições e garantias legais
A Seção X, do que é vedado aos Estados
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41
 O artigo II refere-se ao Poder Executivo e tem 4 seções que dispõem:
A Seção I, do Presidente e do Vice-Presidente e das respectivas elei-
ções
A Seção II, atribui o comando em chefe das Forças Armadas ao Presi-
dente e lhe concede o poder de indulto e perdão, exceto nos crimes de 
responsabilidade
A Seção III, sobre o poder de nomear os funcionários do Executivo e
A Seção IV, sobre o processo de impeachment. 
 O artigo III cuida do Poder Judiciário, sendo dividido em 3 
seções, referentes:
A Seção I, à composição da Corte Suprema e a nomeação de seus 
membros
A Seção II, à competência do Judiciário e o julgamento pelo júri
A Seção III, ao crime de traição
 O artigo IV diz respeito aos Estados e à Federação e consta de 
4 seções sobre:
A Seção I, fé pública dos atos e registros públicos dos Estados, pelos demais
A Seção II, prerrogativas e direitos dos cidadãos de um Estado, em 
relação aos demais
A Seção III, incorporação de novos Estados à Federação
A Seção IV, garantia da União à forma republicana de governo e in-
tervenção federal
 O artigo V não está dividido em seções, e disciplina a reforma 
da Constituição.
 O artigo VI também não dividido em seções, refere-se à garan-
tia das dívidas e obrigações constituídas antes da Constituição, à supre-
macia dos tratados firmados pela União e ao juramento de obediência 
a que se obrigam os parlamentares, magistrados e funcionários. 
 O artigo VII, por fim, determina a vigência do texto constitu-
cional, depois de sua ratificação por pelo menos nove Estados. 
 Nos mais de duzentos anos de existência a Constituição foi 
emendada apenas 17 vezes, sendo que as dez primeiras constituem a 
declaração de direitos, “Bill of rights” e foram adotadas e promulgadas 
de uma só vez. As respectivas datas, vigência e conteúdo constam do 
seguinte quadro: 
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42
Emendas à Constituição Americana de 1787
Número Ratificação Assunto
I a X 15/12/1791 Declaração de Direitos
XI 08/01/1798
Imunidade processual dos cidadãos de cada 
Estado
XII 25/09/1804
Processo de eleição do Presidente em dois 
turnos
XIII 18/12/1865 Abolição da escravidão
XIV 28/07/1868
Naturalização, distribuição dos deputados 
por Estado, cassação do direito à eleição 
dos participantes de rebeliãoe proibição de 
indenizar a libertação dos escravos
XV 30/03/1870
Proibição de negar direito de voto por motivo 
de cor e aos ex-escravos
XVI 25/02/1913 Criação do imposto de renda
XVII 31/05/1913
Eleição dos senadores pelos eleitores dos 
Estados e não mais pelas respectivas legislaturas
XVIII 29/01/1919
Proibição de comércio de bebidas. (Vide 
Emenda XXI)
XIX 26/08/1920 Concessão do direito de voto à mulher
XX 06/02/1933
Vigência dos mandatos do Presidente e 
senadores
XXI 05/12/1933 Revogação da Lei seca (Emenda XVIII)
XXII 26/02/1951
Proibição de mais de dois mandatos de 
Presidente
XXIII 29/02/1961 Representação política da capital do país
XXIV 23/01/1964 Proibição de cobrança de taxas para o direito de voto
XXV 23/01/1967
Sucessãodo Presidente em caso de remoção, 
morte, ou demissão
XXVI 01/07/1971 Concessão do direito de voto aos 18 anos
XXVII 07/05/1992
Proibição de alterar compensação devida 
deputados e senadores, antes das eleições.
 
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43
 Quando comparamos estas 17 emendas com as 52 (6 de 
revisão e 46 ordinárias) da Constituição brasileira, em vigor há 
apenas 16 anos, é possível concluir o quanto é estável a Constituição 
americana. Especialmente se lembrarmos que a atual, em vigor no 
Brasil é a 8a, desde 1824 quando foi outorgada a 1a, ao passo que a 
dos Estados Unidos está em vigor desde 1789. Estas duas condições, 
a brevidade e a longevidade de seu texto tornaram-na um paradigma 
dos regimes presidencialistas. Entre 1789 e 2008, quando termina o 
segundo mandato do atual titular do cargo, os Estados Unidos tiveram 
43 presidentes e o Congresso cumpriu 108 legislaturas, com a que 
terminou em 2004, já que cada uma dura, como assinalamos, dois 
anos. Quando cotejamos o parlamentarismo inglês com pelo menos 
três séculos, e o presidencialismo americano com pouco mais de dois, 
é inevitável concluir que a continuidade dos regimes políticos e a 
estabilidade dos governos, independem de serem os Estados unitários 
como a Grã-Bretanha ou federativos, como os Estados Unidos, suas 
formas de governo parlamentaristas ou presidencialistas e seus sistemas 
de governo monárquicos ou republicanos. O que faz a diferença é 
serem regimes políticos democráticos ou autocráticos e a eficiência dos 
sistemas políticos que garantem a governabilidade. Diferentes formas 
e sistemas de governo e formas de Estado diversas não impedem que 
seus regimes políticos sejam democráticos e representativos. 
 Duas circunstâncias concorreram para que a doutrina 
constitucional dos Estados Unidos não decorresse diretamente 
dos debates que levaram à aprovação do texto constitucional, como 
nos países dotados de Constituições escritas. A primeira é terem os 
trabalhos se desenvolvido dentro do mais absoluto sigilo, para evitar 
que interesses e pressões externas influenciassem os delegados à 
Convenção constitucional, mantendo-se os seus debates secretos 
durante 32 anos. Só em 1819, no governo de Monroe, foram impressos 
e divulgados, pela primeira vez os seus Diários. E os sumários dos 
debates, minuciosamente redigidos pela diligência de James Madison, 
secretário da Convenção, só foram tornados públicos depois de sua 
morte em 1840. A segunda circunstância é ter seu art. VII exigido que, 
para entrar em vigor, o texto teria que ser ratificado por pelo menos nove 
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dos 13 Estados. A oposição do governador Clinton de Nova York à 
ratificação do texto, levou Alexander Hamilton, que tinha representado 
o Estado na Convenção constitucional a publicar, sob o pseudônimo 
de Publius, uma série de artigos que se estenderam de 27 de outubro de 
1787 a 4 de abril de 1878, defendendo sua ratificação. Nessa tarefa ele 
contou com a colaboração de John Jay e de James Madison que usaram 
o mesmo pseudônimo Publius já utilizado por Hamilton. Os 85 artigos 
mais tarde reunidos em livro, com o título de O Federalista, tornaram-
se a maior fonte de referência sobre matéria constitucional dos Estados 
Unidos. O prof. Benjamin Fletcher Wright, autor de uma das mais 
apreciadas introduções à coleção dos artigos18 chama a atenção para 
o fato de que “O Federalista não pretendia ser um tratado sistemático 
sobre filosofia política e constitucional”. Mas ao mesmo tempo lembra 
que os artigos, “considerada a sua época, apresentam uma análise de suas 
idéias políticas e constitucionais, melhor do que qualquer outro livro 
na América (...) O Federalista foi reimpresso pelo menos em quarenta 
edições e lido por homens de seis gerações, em muitos países, não por 
causa da fama de seus autores, nem porque seja a mais longa defesa 
de um documento ainda em vigor, e apenas parcialmente por ser uma 
análise da Constituição”. Daí sua conclusão de que: “Qualquer análise 
que não atentar para a enorme contribuição do livro ao pensamento 
político e constitucional na América e no mundo moderno não estará 
fazendo justiça à sua permanente importância”. 
18 HAMILTON, Alxander, MADISON, James e JAY, John. O Federalista. Brasília, Ed. UnB, 
1984. Introdução de Benjamin Fletcher Wright, Trad. de Heitor Almeida Herrera. Vol. 62 da 
Coleção “Pensamento Político
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VII – BRASIL, DE MONARQUIA A REPÚBLICA
 Assim como o parlamentarismo é predominante no continente europeu e sobrevive em alguns países asiáticos, na América, predominam as repúblicas presidencialistas, segundo o modelo norte-america-
no. Há raríssimas exceções, como o Canadá parlamentarista, o Suri-
name que é uma república semipresidencialista, com um Presidente 
assistido por um Primeiro-ministro e a Guiana francesa que é um dos 
Departamentos da França unitária e não um país soberano. À seme-
lhança das colônias britânicas que constituíram na América o primeiro 
regime republicano de sua época, a primeira federação, e o primeiro 
presidencialismo do séc. XVIII, também as colônias espanholas, ao se 
emanciparem no início do séc. XIX, escolheram o sistema republicano 
e a forma presidencialista de governo, embora alguns tenham optado 
pela forma unitária e não federativa. O Brasil, colônia portuguesa, se-
guiu caminho totalmente inverso. Não cabe discutir as razões dessa 
opção, mas convém não esquecer que a colônia, elevada à condição de 
Reino Unido ao de Portugal e Algarves abrigou, durante 13 anos, a 
corte portuguesa, quando a família real fugiu da invasão napoleônica 
da Península Ibérica. Ao voltar para Lisboa em 1821, por exigência 
das Cortes Constituintes, convocadas em face da revolução do Porto 
ocorrida no ano anterior, D. João VI aqui deixou, como Regente, seu 
primogênito, o príncipe D. Pedro, a quem coube precipitar o processo 
de emancipação da antiga colônia, sendo aclamado imperador e de-
fensor perpétuo do Brasil. A primeira Constituição por ele outorgada 
em 1824, adotou como sistema de governo a monarquia e deu ao novo 
Estado a forma unitária. Serviu de inspiração aos que a redigiram, o 
modelo proposto poucos anos antes pelo ensaísta e pensador francês 
nascido na Suíça, Benjamin Constant de Rebecque, em seu Curso de 
Direito Constitucional. Nessa obra ele sugeria, ao contrário de Mon-
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tesquieu, a divisão não em três mas em quatro poderes: o Executivo, 
o Legislativo, o Judiciário e o Moderador, também chamado de poder 
neutro. Algumas de suas idéias foram literalmente transcritas no texto 
outorgado por D. Pedro I e elaborado por um Conselho de Estado, 
por ele criado depois que, num ato de força, dissolveu a Constituinte 
de 1823 por ele convocada. Benjamin Constant define o poder Mode-
rador como a chave de toda a organização política por ele imaginada. 
E o art. 98 da primeira Constituição brasileira dispunha: “O poder 
moderador é a chave de toda a organização política, e é delegado priva-
tivamente ao Imperador, como chefe supremo da nação e seu primeiro 
representante, para que incessantemente vele sobre a manutenção da 
Independência, equilíbrio e harmonia dos mais poderes políticos”. Ou-
tro princípio da doutrina constitucional do ensaísta e filósofo francês, 
é o que diz respeito à natureza substantiva da matéria constitucional, 
quando, em 1815, escreveu: “Digo já há algum tempo que, tal como 
uma constituição é a garantia da liberdade de um povo, tudo o que 
pertence à liberdade é Constitucional, ao mesmo tempo que nada há 
de constitucional, no que não lhe diz respeito”. O art. 178 da Cons-
tituição do Império, recepcionando esse princípio, prescreveu: “É só 
constitucional o que diz respeito aos limites e atribuições respectivas 
dos poderes políticos e aos direitos políticos e individuais dos cidadãos; 
tudo o que não é constitucional pode ser alterado,

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