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São Bernardo do Campo 2019 NATALIA ALMEIDA TRIGO A INTERDIÇÃO SOB A LUZ DA LEI 13.146 DE 06.07.2015 (ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA) São Bernardo do Campo 2019 A INTERDIÇÃO SOB A LUZ DA LEI 13.146 DE 06.07.2015 (ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA) Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade Anhanguera de São Bernardo do Campo, como requisito parcial para a obtenção do título de graduado em Direito. Orientador: Deborah Stagliano NATALIA ALMEIDA TRIGO NATALIA ALMEIDA TRIGO A INTERDIÇÃO SOB A LUZ DA LEI 13.146 DE 06.07.2015 (ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA) Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade Anhanguera de São Bernardo do Campo, como requisito parcial para a obtenção do título de graduado em Direito. BANCA EXAMINADORA Prof(a). Titulação Nome do Professor(a) Prof(a). Titulação Nome do Professor(a) Prof(a). Titulação Nome do Professor(a) São Bernardo do Campo, 18 de junho de 2019. Dedico este trabalho primeiramente a Deus, por ser essencial em minha vida e autor do meu destino, ao meu pai José, minha mãe Clarete e a minha irmã Jéssica. AGRADECIMENTOS A Deus por ter me dado saúde e força para superar as dificuldades. Agradeço а todos os professores por me proporcionarem о conhecimento nãо apenas racional, mаs а manifestação dо caráter е afetividade da educação nо processo dе formação profissional, pоr tanto qυе sе dedicaram а mim, nãо somente pоr terem mе ensinado, mаs por terem mе feito aprender. А palavra mestre, nunca fará justiça аоs professores dedicados аоs quais sеm nominar terão оs meus eternos agradecimentos. Aos meus pais e irmã, pelo amor, incentivo e apoio incondicional. E a todos que direta ou indiretamente fizeram parte da minha formação, o meu muito obrigada. “A maior recompensa para o trabalho do homem não é o que ele ganha com isso, mas o que ele se torna com isso.” John Ruskin TRIGO, Natalia Almeida. A INTERDIÇÃO SOB A LUZ DA LEI 13.146 DE 06.07.2015 (ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA). 2019. 70. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Direito) – Faculdade Anhanguera de São Bernardo do Campo, São Bernardo do Campo, 2019. RESUMO O presente trabalho tem o propósito de realizar um pequeno resumo histórico do instituto da curatela, demonstrando seu desenvolvimento ao longo do tempo e abordando os feitios que lhe deram causa, atingindo a legislação atualmente vigente, tomando conhecimento dos direitos dos incapazes. Após, será descrito um breve estudo do referido instituto sob a perspectiva do Direito Processual Civil moderno culminado com o Estatuto da Pessoa com Deficiência, apontando a necessidade da instituição da curatela e os procedimentos precisos. Por fim, será feita uma análise crítica do referido instituto, no que concerne a não necessidade da interdição e qual o procedimento avaliatório que determina a incapacidade ou não da pessoa humana. Palavras-chave: Curatela; Interdição; Estatuto da Pessoa com Deficiência; Lei 13.146/2015; TRIGO, Natalia Almeida. THE INTEREST UNDER THE LAW OF LAW 13.146 OF 06.07.2015 (STATUTES OF THE PERSON WITH DISABILITY). 2019. 70. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Direito) – Faculdade Anhanguera de São Bernardo do Campo, São Bernardo do Campo, 2019. ABSTRACT The present work has the purpose of making a brief historical summary of the institute of curatela, demonstrating its development over time and addressing the forms that caused it, reaching the current legislation, taking cognizance of the rights of the incapacitated. Afterwards, a brief study of this institute will be described from the perspective of modern Civil Procedural Law, culminating with the Statute of the Person with Disabilities, pointing out the necessity of the institution of curatela and the precise procedures. Finally, a critical analysis will be made of this institute, regarding the need for no interdiction and the evaluation procedure that determines the incapability or not of the human person. Key-words: Curatela; Interdiction; Statute of the Person with Disabilities; LAW 13.146/2015; LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS CPC Código de Processo Civil EPD Estatuto da Pessoa com Deficiência MP Ministério Público CTI Centro de Terapia Intensiva LINDB Lei de Introdução as Normas do Direito Brasileiro 10 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO .............................................................................................. .... 11 2. A PROTEÇÃO LEGAL DOS INCAPAZES ................................................... .... 13 2.1 SOBRE A CURATELA ................................................................................. .... 14 2.2 CARACTERÍSTICAS DA CURATELA ......................................................... .... 14 2.3 LEGITIMIDADE PARA O EXERCÍCIO DA CURATELA .............................. .... 16 3. A CURATELA COM INTERDIÇÃO .............................................................. .... 17 3.1 A FINALIDADE DA INTERDIÇÃO ............................................................... .... 18 3.2 A CAPACIDADE CIVIL E A LEI 13.146/2015 .............................................. .... 19 3.3 O PROCESSO JUDICIAL DA INTERDIÇÃO ............................................... .... 22 4. A CURATELA SEM INTERDIÇÃO ............................................................... .... 25 4.1 O ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL DO ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA ...................................................................................................... .... 26 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................... .... 29 REFERÊNCIAS.................................................................................................... .... 32 11 1. INTRODUÇÃO O presente trabalho de pesquisa apresentou os principais aspectos do instituto da curatela e teve como finalidade expor por meio de pesquisas doutrinárias, jurisprudências e demais fontes, o estudo sobre a curatela do Código Civil de 2002, Código de Processo Civil de 2015 e Estatuto da Pessoa com Deficiência, que se destina a administrar os interesses de um indivíduo portador de uma limitação física ou enfermidade, não necessariamente um incapaz, mas alguém impossibilitado de reger seus próprios negócios. Buscou-se analisar as explicações jurídicas de interdição, uma vez que o indivíduo enfermo ou deficiente físico é, em muitos casos, capaz de assumir responsabilidades da vida civil e entender situações que necessitem de sua decisão. A administração de interesses de outrem que se encontra incapaz de fazê-lo versa sobre a necessidade de se entender a capacidade dos atos da vida civil e o seu exercício, e a curatela é um dos institutos para a proteção de interesses patrimoniais, e até mesmo da dignidade da pessoa e que será analisada. Não apenas falamos de uma função de curadoria exercida por pessoa encarregada de administrar bens de incapazes, estamos diante de nova Lei 13.146/2015, instituindo o Estatuto da Pessoa com Deficiência em nossa Constituição Federal, que não se destina, portanto, tipicamente a um incapaz, mas a alguém que não possui plenas condições físicas ou materiais para exercer seu papel para cuidar de seus próprios interesses. Algumas pessoas perdem a capacidade de discernimento para a prática de atos da vida civil, porém outras embora mantenham a lucidez, perdem, por exemplo, a capacidade de se movimentar, encontrando limitações ao desempenho de suas atividades diárias. As pessoas que apresentam doenças físicas não precisam ser consideradas incapazes e estão respaldadas em seus direitos da vida civil pelo Código Civil. O tema, ao analisar a curatela, com ou sem a necessidade de interdição justifica-se por ser atual e abordar aspectos jurídicos que nos levam a reflexão de limites à interdição. No primeiro capítulo, será feita uma apreciação sobre a proteção legal aos incapazes, um breve histórico da curatela, seus conceitos, características e os indivíduos que estão sujeitos a este instituto. De maneira igual, no segundo capítulo, serão tratadas algumas curadorias especiais, e questões de capacidade 12 civil e capacidade de exercício para proceder à análise das diferenças entre tutela e curatela e a necessidade de interdição. Por sua vez, o terceiro capítulo trata da curatela sem interdição, suas finalidades e de seu procedimento judicial. Posto isso, a principal finalidade desta pesquisa intitulada como: A Interdição Sob a Luz da Lei 13.146 de 06.07.2015 é a proteção e assistência aos enfermos ou portadores de uma necessidade especial física, sem impedi-los de praticar os atos da vida civil, mas simplesmente reger e administrar seus bens e interesses de acordo com suas limitações, necessidades que o ser humano possui. Destaca-se que na elaboração deste trabalho é adotada como estratégia metodológica, a revisão literária nacional sobre os direitos de família sobre o tema proposto: A Intervenção sob a luz da Lei 13.146/2015, com base na Constituição Federal, Estatuto da Pessoa com Deficiência (EPD) e jurisprudências. A seleção é realizada a partir de leitura criteriosa dos artigos, livros, teses e dissertações encontrados nos sites de bancos de dados, sendo selecionada apenas a literatura que atender aos critérios definidos neste estudo. 13 2. A PROTEÇÃO LEGAL DOS INCAPAZES Todo indivíduo deve governar sua pessoa e administrar seus bens e interesses. No entanto, existem diversas pessoas que são incapazes de cuidar dos seus próprios negócios, devido a enfermidades ou deficiência mental, necessitando, portanto, de um curador. Washington de Barros Monteiro (2009, p.39) afirma que: O Com a chegada da maioridade civil é presumido que todo indivíduo poderá reger sua pessoa, assim como, administrar seus bens. Todavia, existem pessoas que por alguma deficiência mental ou enfermidade, não se encontram aptas a cuidar de seus próprios interesses, tendo em vista o fator da falta de discernimento. Acabam por sujeitarem-se à curatela, como uma medida de amparo e proteção. A Lei nº 13.146/2015, além de reformular o sistema das incapacidades civis vigentes no direito privado brasileiro, apresenta importantes alterações em matéria de curatela. O novo diploma normativo procura incluir as pessoas com deficiência, classificando-as de plena capacidade civil, em iguais dos demais indivíduos. O Estatuto da Pessoa com Deficiência, ao engrandecer o princípio da dignidade da pessoa humana, inaugura um sistema inclusivo, conforme instruído por Pablo Stolze (2015). Neste sentido, o autor reforça que, A pessoa com deficiência – aquela que tem impedimento de longo prazo, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, nos termos do art. 2º - não deve ser mais tecnicamente consideradas civilmente incapaz, na medida em que os arts. 6º e 84, do mesmo diploma, deixam claro que a deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa. Todavia, o autor afirma que não há um novo conceito de capacidade, inaugurado com o Estatuto, pois “se assim fosse, haveria um viés discriminatório que a própria Lei exatamente pretende acabar.”. Neste sentido, destaca-se que o processo de interdição não é mais utilizado para as pessoas absolutamente incapazes, tendo em vista que o Estatuto revogou expressamente os incisos II e III do artigo 3º do Código Civil, ou seja, não são mais considerados absolutamente incapazes “os que por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos” e “os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade”. Desta feita, entende-se que, as pessoas referidas nos dois incisos estão incluídas no inciso I do 14 art. 4º do referido diploma, como também os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo, excluído da redação do artigo 4º. Ou seja, são consideradas como absolutamente incapazes apenas as pessoas menores de 16 anos de idade, as quais estão sujeitas à tutela e não à curatela. Dessa forma, para alguns doutrinadores, a assistência simples e não mais a representação plena do curatelado, deixou-os vulneráveis e ainda mais desprotegidos, sendo-os jogados no grupo dos capazes, onde estão desamparados. 2.1. SOBRE A CURATELA Curatela é a responsabilidade prevista em lei dada a alguém capaz de conduzir e administrar os bens dos maiores incapazes, por uma enfermidade ou doença mental. Além disso, tal instituto possui características duplas, sendo a permanente o que conduziria a pessoa e os bens de quem se encontra impossibilitado de fazê-lo por si mesmo e a temporário que regeria apenas os interesses que não podem ser cuidados pela própria pessoa, embora esteja em plena capacidade mental. Ainda, Carlos Roberto Gonçalves (2009, p.625) aduz que: “curatela é o encargo público conferido por lei a alguém capaz, para reger a pessoa e administrar os bens de quem, em regra maior, não pode fazê-lo por si mesmo.”. Sendo esta regra não absoluta, a curatela, por ser um instituto complexo, envolve diversas situações, o Código Civil também prevê esse instituto dos nascituros e das pessoas mentalmente capazes. Maria Helena Diniz (2009, p.647) entende que: Curatela é o encargo público, cometido por lei, a alguém para reger e defender a pessoa e administrar os bens de maiores, que por si sós, não estão em condições de fazê-lo, em razão de enfermidade ou deficiência mental. Posto isso, o instituto tem como finalidade a proteção, mas também a assistência, pois, além de proteger a pessoa incapaz, também conduz seus negócios e interesses. 2.2. CARACTERÍSTICAS DA CURATELA 15 De acordo com Carlos Roberto Gonçalves (2009, p.626), a curatela apresenta cinco características: a) os seus fins são assistenciais; b) tem caráter publicista; c) tem, também, caráter supletivo da capacidade; d) é temporária, perdurando somente enquanto a incapacidade se mantiver (cessada a causa, levanta-se a interdição); e) a sua decretação requer certeza absoluta da incapacidade. O sistema assistencial é atribuído àqueles indivíduos que não podem conduzir a sua pessoa e nem administrar seus interesses, devido a alguma incapacidade física ou mental. O Código Civil finda junto ao instituto da curatela o sistema assistencial dos que não podem, por si mesmos, reger sua pessoa e administrar seus bens. O primeiro se trata do poder familiar dos pais, o qual a proteção, permanece os filhos menores. O segundo é a tutela, sob a qual são postos os filhos menores que se tornaram órfãos ou cujos pais esvaneceram ou declinaram do poder parental e em terceiro lugar surge a curatela, como responsabilidade atribuída a alguém, para conduzir a pessoa e administrar os bens dos maiores incapazes, que não possam fazê-lo por si mesmos, com exceção do nascituro e dos maiores de 16 anos e menores de 18 anos. Ainda, o caráter publicista acontece quando o Estado nomeia pessoas a exercer um múnus público com a finalidade de proteger interesses dos incapazes. Já no caráter supletivo, o curador representa o curatelado em todos os casos de sua incapacidade, seja absoluta ou relativa. A temporariedade da curatela se dá de acordo com a duração da incapacidade do curatelado. Assim, quando os motivos que a determinaram desaparecerem, suspende-se a incapacidade. Conforme o artigo 1.768 do Código Civil a interdição poderá ser promovida: “I- pelos pais ou tutores; II- pelo cônjuge, ou por qualquer parente, III- pelo Ministério Público.”. Nesse sentido, Rui Ribeiro de Magalhães (2002, p.322) aduz que: Na verdade o juiz não examinará o interditando no sentido clínico do termo, mas sim o interrogará sobre sua vida, negócios [...]. A medida reveste-se de caráter acautelatório, visando evitar a interdição de pessoa mentalmente sã para satisfazer interesses inconfessáveis. 16 Para tanto, a medida cautelar indaga a precaução diante de uma interdição de um individuo mentalmente são, ou seja, é necessária a cautela para não retirar direitos daquele capaz de reger os atos da vida civil. 2.3. LEGITIMIDADE PARA O EXERCÍCIO DA CURATELA A lei confia a determinadas pessoas legitimidade para requerer a curatela de outrem (artigo 747 do CPC). Não existe ordem de preferência. Quais sejam: a) Cônjuge ou companheiro: o legitimado em primeiro lugar para requerer a decretação da curatela é a pessoa com quem o interditando é casado ou vive em união estável. Artigo 747, I, CPC; b) Parentes ou tutores: a legitimidade é para qualquer parente, definido conceito nos artigos 1.591 e 1.592 do Código Civil, “ascendentes e descendentes e parentes em linha colateral até o quarto grau”. Como a afinidade também gera relação de parentesco (artigo 1.595 parágrafo 2º); c) Representante de entidade de abrigamento: diante de realidades, o abandono de pessoas com deficiências em instituições públicas ou até privadas, torna legítimo o representante da entidade em que tais pessoas se encontram abrigadas, requerer a curatela; d) Ministério Público: o MP pode promover a ação de curatela em caso de doença mental grave; A comprovação da legitimidade para atuar como requerente da ação se dá independente de quem seja. 17 3. A CURATELA COM INTERDIÇÃO Guimarães (2012) afirma que a curatela: Consiste no encargo de se cuidar de uma pessoa maior de idade que não pode gerir seus bens em virtude de uma incapacidade. Esta pessoa incapaz deve ser interditada, ou seja, através de um processo judicial é averiguada a sua incapacidade e a impossibilidade desta pessoa praticar, autonomamente, os atos da vida civil (vender ou comprar um bem, firmar contratos, etc) Assim, a Curatela visa à proteção patrimonial dos indivíduos que sofrem de incapacidade mental que os impossibilite de praticar os atos da vida civil, dos ébrios habituais e dos usuários de drogas. O interditado é pessoa maior de 18 (dezoito) anos de idade que devido determinada enfermidade, doença mental ou dependência química a impeça temporária ou permanentemente de conduzir e distinguir os atos da vida civil, bem como manifestar sua pretensão, ou ainda, os pródigos. O curador também é um cuidador e tem o papel de zelar pelos direitos e garantias do curatelado, assim como sobre seus bens de família. Em falando de caráter temporário ou permanente, Rangel (2012) demonstra: Imperioso se faz reconhecer que a curatela, também chamada de curadoria, detém um duplo alcance, porquanto pode ser deferida: para reger a pessoa e os bens de quem, conquanto maior, encontra-se impossibilitado, por específica causa ou incapacidade, de fazê-lo por si mesmo; para a regência de interesses que não podem ser cuidados pela própria pessoa, embora esteja no gozo de sua capacidade. Na primeira situação, verifica-se que a curatela tem caráter permanente, ao passo que, na segunda, o aspecto é temporário. Nos casos de curatela, a interdição judicial se faz indispensável para prover a necessidade de representação de pessoas maiores de idade, sendo essa uma condição para a concessão da curatela. Trata-se de medida judicial que declara a carência de capacidade da pessoa para gerir seus interesses e atos decorrentes da vida civil. Como nos mostra Brito (2014) ao afirmar que a incapacidade no Brasil ocorre por dois critérios: objetivo, pela idade, e subjetivo, pelo psicológico. As pessoas menores de 18 (dezoito) anos são consideradas incapazes e não é indispensável nenhum conceito para o reconhecimento de tal incapacidade. Já para considerar um maior de idade incapaz, por ser uma ressalva, é necessário seguir as regras da ação de interdição. Entende-se, assim, que a interdição não deverá ser empregada de qualquer forma, pois ela poderá, a critério do juiz, atingir a liberdade e a intimidade da pessoa interditada, uma vez que será declarada incapaz. O interesse na interdição precisará 18 ser, então, não apenas financeiro, mas no sentido de proteger a dignidade do próprio interditando. Tendo em vista o cuidado com a curatela e a interdição, faz-se necessário analisar o instituto da curatela, mas sem o uso da interdição, uma vez que muitas pessoas apresentam dificuldades físicas, mas não de discernimento para cuidar de si e dos seus bens. 3.1. A FINALIDADE DA INTERDIÇÃO De maneira geral, a interdição é o processo judicial por meio do qual se requer a curatela do maior incapaz, sendo assim, uma medida de proteção daqueles que não possuem discernimento para praticar os atos da vida civil. Segundo Barbosa (2008): “a interdição é uma medida de amparo criada pela legislação civil; um processo judicial por meio do qual a pessoa é declarada civilmente incapaz, total ou parcialmente, para a prática dos atos da vida civil, tais como: vender, comprar, testar, casar, votar, assinar contratos, etc. Para tanto, essa pessoa declarada civilmente incapaz, deve ser representada ou assistida por uma outra pessoa civilmente capaz, denominada curador.” Conforme já exposto anteriormente, àqueles considerados incapazes seja por problemas mentais, sejam ébrios habituais, viciados em drogas ou pródigos é dada a curatela. Ter desenvolvimento intelectual incompleto traz a precisão de representação aos civilmente incapazes e o curador será o responsável por isso. Na interdição parcial, em que o interditado poderá praticar alguns atos de sua vida civil, a sua restrição variará de acordo com as probabilidades percebidas pelo juiz. Para a interdição total, no caso a que provém de problemas mentais, é essencial a especificação da ausência de entendimento para a prática dos atos da vida civil, que cause impossibilidade da demonstração da vontade. De acordo com Mafra (2007, p. 1): A interdição é um ato judicial decorrente da incapacidade total ou parcial da pessoa que não possuir o necessário discernimento para os atos da vida civil. Constitui-se como um direito imprescindível de proteção e segurança social e somente pode ser concedida a pessoas que não possam expressar sua vontade. Dessa forma, essa caracterização da ausência de discernimento deve ser exposta em linguagem médica, uma vez que se trata de uma medida de “exceção da cidadania” regulada por lei. A interdição deve ser nutrida de muito cuidado, pois sua 19 ocorrência ocasiona restrições ao afrontado em relação à sua capacidade de se posicionar na sua vida como cidadão capaz. Por esse lado, apresenta o artigo 1.767 do Código Civil os sujeitos incapazes, que necessitam de curatela, logo os mesmos em que há a necessidade de interdição, por não apresentarem capacidade mental suficiente para as práticas de atos da vida civil, quais sejam: I - aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade; III - os ébrios habituais e os viciados em tóxico; V - os pródigos. Como verificado, são indivíduos que não tem capacidade de percepção. Essa incapacidade se dá por enfermidade ou doença mental, ou mesmo por causa transitória, não possibilitando a expressão de sua vontade. Assim, a interdição torna- se uma fase necessária para que seja instituída a curatela, conferindo a alguém o cargo de administrar a pessoa e o seu patrimônio. Vale lembrar que estão sujeitos à interdição aqueles dispostos à luz do Código Civil, que se torna restritivo, não existindo outras causas possíveis de interdição, como nos afirma Rangel (2012) ao assegurar que além das causas enumeradas no Código, estão “excluídos da interdição a cegueira, o analfabetismo, a idade provecta, desde que, conjugado com tais exemplos, as hipóteses autorizadoras”. Flávio Tartuce (2012, p. 513) salienta que: A curatela, e consequentemente, a interdição, deve ser dada apenas aos maiores que estão acometidos por alguma incapacidade, não tendo a possibilidade de gerir sua própria pessoa e reger seu acervo patrimonial, afirmando que “a curatela também não se confunde com a tutela, pois a última visa à proteção de interesses de menores, enquanto à primeira a proteção dos maiores. Por esse prisma, a retirada da capacidade negocial de alguém tende proteger os interesses dos incapazes e garantir a proteção dos negócios jurídicos a terceiros relacionados para impedir nulidade devido a resultados de falha de origem. Assim, mostra-se que está disposto na seguinte jurisprudência: Ementa: APELAÇÃO. INTERDIÇÃO. INCAPACIDADE DEMONSTRADA. Caso em que restou bem demonstrada a incapacidade do interditando para gerir a sua vida e o seu patrimônio. Necessidade de interdição, para preservação dos próprios direitos e interesses. DERAM PROVIMENTO. (Apelação Cível Nº 70041699646, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rui Porta nova, Julgado em 16/06/2011) 20 Ademais, tem que ser comprovada a incapacidade para atos da vida civil para que haja a interdição, que tem como fim básico a preservação da pessoa, e por conseguinte, de seus bens. Uma questão a ser observada da interdição e curatela está relacionada aos idosos, que aponta protegê-lo poupando seu patrimônio e adequando uma melhor qualidade de vida. A idade anciã não é causa suficiente para interditar completamente uma pessoa idosa. Segundo a juíza da 1ª Vara da Família e Sucessões de Cuiabá, Ângela Gutierrez Gimenez apud Pinheiro (2013) existem alguns requisitos prévios para a interdição do idoso: Quando a pessoa não consegue gerir os atos da vida civil com autonomia e independência se faz necessário à interdição. Isso ocorre quando ela sofreu, por exemplo, algum tipo de acidente que a deixou impossibilitada de tomar decisões, se é portadora de doenças degenerativas ou tem algum problema de sanidade. Nessas circunstâncias é um dever da família buscar a curatela, para o próprio bem do idoso. Apesar do Código Civil não apontar o requerido como civilmente capaz como requisito para a interdição, essa condição mostrar-se como lógica, procedendo da interpretação de que a gestão do incapaz e seus bens não poderá ser exercida por outro incapaz. Tem-se a curatela, realizada a partir de um processo de interdição que visa identificar e comprovar se o indivíduo tem capacidade ou não de reger sua pessoa e seu acervo patrimonial, com fim de evitar prejuízos à pessoa e aos seus bens. Vale notar que Segundo Barbosa (2008, p. 02): A interdição judicial de uma pessoa está prevista como medida de exceção da cidadania, sendo regulada por lei, portanto, deve ser revestida de todo o cuidado e reserva, na medida em que sua ocorrência produz sérias limitações ao atingido no tocante à sua capacidade de se posicionar como cidadão. Para isso, o Ministério Público, quando não fizer o requerimento judicial da interdição de alguém, funciona sempre como fiscal da curatela, fiscal do curador, exatamente para verificar se os interesses do curatelado estão sendo bem defendidos pelo curador, ou se o curador está de alguma forma, lesando o curatelado. De tal modo, de acordo com Rangel (2012) no exercício da curatela deve o curador atentar-se à obrigação de velar pela integridade física e material do curatelado, ou seja, cuidar de seu bem estar físico e psíquico, prestar alimentos necessários, defender seus interesses, cuidar de sua educação e desenvolvimento e administrar o patrimônio de forma tranquila e adequada, prestando contas em juízo anualmente. 21 3.2. A CAPACIDADE CIVIL E A LEI 13.146/2015 Com a entrada em vigor do Estatuto, a pessoa com deficiência (aquela que tem impedimento de longo prazo, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, nos termos do art. 2º da Lei 13.146/2015) não deve ser mais considerada civilmente incapaz, de maneira que os artigos 6º e 84, do mesmo diploma, deixam claro que a deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa: Art. 6º. A deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa, inclusive para: I - casar-se e constituir união estável; II - exercer direitos sexuais e reprodutivos; III - exercer o direito de decidir sobre o número de filhos e de ter acesso a informações adequadas sobre reprodução e planejamento familiar; IV - conservar sua fertilidade, sendo vedada a esterilização compulsória; V - exercer o direito à família e à convivência familiar e comunitária; VI - exercer o direito à guarda, à tutela, à curatela e à adoção, como adotante ou adotando, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas. Art. 84. A pessoa com deficiência tem assegurado o direito ao exercício de sua capacidade legal em igualdade de condições com as demais pessoas. Esse último dispõe claramente que: a pessoa com deficiência é legalmente capaz, ainda que pessoalmente não exerça os direitos postos à sua disposição. Pode-se afirmar, então, que o Estatuto implanta uma nova visão de capacidade, confrontando àquela prevista no art. 2º do Código Civil, havendo um viés discriminatório que a nova Lei exatamente pretende acabar. Assim, dois artigos do Código Civil foram reestruturados: o art. 3º, que dispõe sobre os absolutamente incapazes, teve todos os seus incisos revogados, mantendo-se, como única hipótese de incapacidade absoluta, a do menor impúbere (menor de 16 anos). O art. 4º, no entanto, que cuida da incapacidade relativa, também passou por modificação. No inciso I, permaneceu a previsão dos menores púberes (entre 16 anos completos e 18 anos incompletos); o inciso II, por sua vez, suprimiu a menção à deficiência mental, referindo, apenas, “os ébrios habituais e os viciados em tóxico”; o inciso III, que albergava “o excepcional sem desenvolvimento mental completo”, passou a abordar, apenas, das pessoas que, "por causa transitória ou permanente, não possam exprimir a sua vontade"; em conclusão, permaneceu a previsão da incapacidade do pródigo. Analisando-se o sistema jurídico habitual, vigente por décadas no Brasil, que sempre tratou a incapacidade como um conceito quase inseparável da deficiência, pode parecer complexo a compreensão da alteração legislativa. http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/111983995/c%C3%B3digo-civil-lei-10406-02 http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10731186/artigo-3-da-lei-n-10406-de-10-de-janeiro-de-2002 22 Portanto, o que o Estatuto almejou foi, considerando o princípio da dignidade da pessoa humana, fazer com que a pessoa com deficiência deixasse de ser taxada como incapaz, para ser apreciada como pessoa de plena capacidade legal, ainda que exista a necessidade de utilização de institutos assistenciais específicos, como a tomada de decisão apoiada e, isoladamente, a curatela, para a prática de atos na vida civil. De acordo com este Estatuto, a curatela, limitada a atos relacionados aos direitos de natureza patrimonial e negocial, passa a ser uma medida extraordinária (art. 85): Art. 85. A curatela afetará tão somente os atos relacionados aos direitos de natureza patrimonial e negocial. § 1o A definição da curatela não alcança o direito ao próprio corpo, à sexualidade, ao matrimônio, à privacidade, à educação, à saúde, ao trabalho e ao voto. § 2o A curatela constitui medida extraordinária, devendo constar da sentença as razões e motivações de sua definição, preservados os interesses do curatelado. § 3o No caso de pessoa em situação de institucionalização, ao nomear curador, o juiz deve dar preferência a pessoa que tenha vínculo de natureza familiar, afetiva ou comunitária com o curatelado. Entende-se que a lei não diz que se trata de uma medida especial, mas sim, extraordinária, o que enaltece a sua excepcionalidade. Pessoas portadoras de deficiência e que possuam também grau de discernimento que comporte a indicação dos seus apoiadores, até então sujeitas a uma interdição e curatela total, poderão usufruir de um instituto menos hostil em sua dignidade. 3.3. O PROCEDIMENTO JUDICIAL DA INTERDIÇÃO Segundo Alexandre de Freitas Câmara (2013, p. 859): Pode-se definir a interdição como o procedimento judicial adequado ao reconhecimento da incapacidade, por anomalia psíquica ou prodigalidade, do surdo mudo sem educação que o habilite a enunciar com precisão sai vontade e dos viciados pelo uso de entorpecentes quando acometidos de perturbações mentais, como o fim de instituir-lhes curador. Portanto, a ação de interdição só se justifica a uma pessoa que não esteja apta a exercer, por si só os atos da vida civil. A princípio, a medida protetiva de interdição para o maior incapaz, que busca evitar lesão à sua pessoa e ao seu acervo patrimonial deve ser autorizada pelo pai, 23 mãe ou tutor; pelo cônjuge, ou por qualquer parente; ou pelo Ministério Público, conforme dispõe o artigo 747 do Código de Processo Civil. Ressalva-se que quando existir doença mental grave, e inexistirem pai, mãe, cônjuge ou qualquer outro parente, ou quando estes forem incapazes, o Ministério Público poderá figurar ação de interdição de incapaz. Salienta-se que pela regra da competência relativa a ação de interdição deverá se dar no domicilio do interditando. O seu processo integra Petição Inicial, em que o interessado deve provar sua legitimidade e argumentos e fatos que trazem a prova à incapacidade do interditando de governar seu patrimônio e sua pessoa. O Código de Processo Civil, em seu art. 751, é ministrado que o interditando, suposto incapaz, deverá comparecer em juízo, para o fim de interrogatório, que de acordo com Rangel (2012) é “oportunidade em que será examinado pelo juiz e será procedida a colheita de informações acerca do desenvolvimento mental do interditando”. Observa-se que o próprio interditando poderá solicitar contestação do pedido inicial, e se dará pela impugnação do pedido no prazo de quinze (15) dias, a contar da audiência em que foi realizado o interrogatório. Passado o tempo devido, como disposto no art. 753 do Código de Processo Civil o interditando passará por Perícia Médica obrigatória. Após apresentado o laudo pericial, o juiz proferirá sentença. É importante destacar, como sugere Thais Barbosa (2011) que na sentença de interdição, será feita a nomeação do curador segundo o disposto no art. 747 do Código de Processo Civil, obedecendo a seguinte ordem: o cônjuge não separado judicialmente é, de direito, curador do outro; na falta de cônjuge, a curadoria legitima defere-se sucessivamente o pai; na falta a mãe; e na desta, ao descendente maior. Já entre os descendentes, os mais próximos procedem aos mais remotos e, dentre os de mesmo grau, os homens às mulheres. Dessa forma, de acordo com o laudo, com o pedido, poderá ser decretada a interdição do incapaz, e na oportunidade, nomeado um curador para o interdito. A sentença, então, coloca sobre a direção do curador a pessoa e os bens do interditado. Esse curador deverá ser pessoa idônea que zelará sobre a pessoa do interditado. Segundo Rangel (2012) a: sentença poderá concluir pela incapacidade absoluta ou relativa, sendo, no primeiro caso, deferida a curatela plena, ao passo que, no segundo, a curatela limitada. Em havendo qualquer conflito entre os interesses do curador e do curatelado, restará afastada a nomeação. Ao lado disso, o ato 24 decisório produz efeitos desde logo, conquanto sujeita a recurso, que goza de efeito apenas devolutivo. Embora sujeita à apelação, a sentença de interdição produz efeitos imediatos, sendo nulos todos os atos praticados pelo interdito a partir de então. Por tais razões, cabe lembrar que em se provando a cessação da causa que determinou a interdição, esta será passível de levantamento. A sentença que a levanta e a que a decreta deverá ser levada a registro em cartório competente e publicadas para conhecimento de terceiros. Ressalta-se que nos casos de pessoa com deficiência amparados atualmente pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência, estando em curso um procedimento de interdição (ou mesmo terminado) o interditando (ou interditado) passa a ser considerado, a partir da entrada em vigor do Estatuto, pessoa legalmente capaz. Não é o caso de se propor o levantamento da interdição, os termos de curatela já aparados e emitidos continuam válidos, embora a sua eficácia esteja limitada aos termos do Estatuto, ou seja, deverão ser decifrados em nova perspectiva, para provar a legitimidade e permitir o curador apenas quanto à prática de atos patrimoniais, até porque, mesmo após o Estatuto, a curatela não deixa de existir. Enfim, merece específica alusão a previsão da “curatela compartilhada”, constante no art. 1.775-A do Código Civil, alterado pelo novo diploma estatutário: "Na nomeação de curador para a pessoa com deficiência, o juiz poderá estabelecer curatela compartilhada a mais de uma pessoa”. Por vezes, dentro de uma família, mais de um parente, além do próprio curador, administra a vida da pessoa com deficiência, dispensando-lhe os necessários cuidados, assim, o novo instituto permitirá, na veemência do próprio curatelado, a nomeação de mais de um curador, e, caso haja desacordo entre eles, caberá ao juiz decidir, como ocorre na guarda compartilhada. http://www.jusbrasil.com.br/topicos/49597279/artigo-1775a-da-lei-n-10406-de-10-de-janeiro-de-2002 http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/111983995/c%C3%B3digo-civil-lei-10406-02 25 4. A CURATELA SEM INTERDIÇÃO De início, a curatela é um instituto protetivo que tem por objetivo suprir as incapacidades de indivíduos enfermos ou deficientes. Essas pessoas para terem nomeado um curador, precisam ser declaradas incapazes e em seguida interditadas. Porém, nem sempre o indivíduo que necessita da curatela é mentalmente incapaz. Muitas vezes a pessoa tem todas as suas capacidades mentais, mas está impossibilitado de exercê-las. Nos casos em que há percepção não haveria a possibilidade de nomeação de um curador, pois o indivíduo não perdeu a sua capacidade de raciocínio. O exemplo disso são os pacientes que estão nos Centros de Terapia Intensiva – CTI – ou os portadores de deficiência ou limitação física, mas que apresentam o potencial cognitivo conservado. O jurista Zeno A. Bastos Veloso (2003, p.227) conduz a análise de que: A requerimento do enfermo ou do portador de deficiência física, ou, se estiverem impossibilitados de fazê-lo, a pedido dos pais ou tutores, do cônjuge ou do companheiro, de qualquer parente ou do Ministério Público, o juiz poderá nomear-lhe um curador para cuidar de todos ou alguns dos seus negócios ou bens. Ainda segundo Veloso, o instituto da curatela sem interdição, trata-se de um tipo específico para curatela, sendo ela pontual, restrita e limitada. Esse tipo de curatela serviria, então, a pessoas fragilizadas pela idade, que tem dificuldade em assinar documentos ou de se locomover para chegarem determinados lugares, como repartições, bancos e etc. Trata-se, segundo Clovis Mendes (2007) de: nova modalidade de curatela, destinada ao enfermo ou portador de deficiência física. É uma curatela em menor extensão, posto que pode abranger apenas alguns dos negócios ou bens do curatelado e, ao contrário da curatela decorrente de interdição, não o priva totalmente dos atos da vida civil, nem declara a incapacidade civil absoluta. Assim, o curatelado não perde os direitos políticos, consectário dessa incapacidade (art. 15, II, CF). De tal forma, poderá ser designada qualquer das pessoas a que se refere o art. 747 do Código Processo Civil como curador para cuidar de todos ou alguns desses negócios, interesses, e até mesmo, os bens a pedido de enfermo ou portador de deficiência física que estejam impossibilitados de cuidar de alguns de seus próprios interesses ou negócios. A propósito, essa modalidade de curatela diferencia-se por ser voluntária, não havendo a necessidade de ação de interdição. Por ser o próprio enfermo ou portador 26 de necessidade física o impetrante da curadoria, ele próprio poderá pedir para desfazê-la. Posto isso, cabe então, analisar o instituto da Interdição com intuito de entender e verificar a sua aplicabilidade, levando em conta principalmente as necessidades do curatelado. O Prof. Paulo Lôbo, em excelente artigo, sustenta que, a partir da entrada em vigor do Estatuto: "não há que se falar mais de 'interdição', que, em nosso direito, sempre teve por finalidade vedar o exercício, pela pessoa com deficiência mental ou intelectual, de todos os atos da vida civil, impondo-se a mediação de seu curador. Cuidar-se-á, apenas, de curatela específica, para determinados atos". Na forma em que o Estatuto é claro ao afirmar que a curatela é extraordinária e restrita a atos de conteúdo patrimonial ou negocial, apaga-se a figura da "interdição geral". Ainda assim o procedimento de interdição (ou de curatela) continuará existindo, mesmo que em um novo aspecto, limitado aos atos de conteúdo econômico ou patrimonial. Refere-se ao fim, portanto, não do procedimento de interdição, mas sim, dos requesitos tradicionais da interdição, em virtude da facilitação e abrangência da curatela. 4.1. O ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL DO ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA O Estatuto da Pessoa com Deficiência afirma a proteção dos direitos à saúde e à educação, como também se assevera o direito ao trabalho, à constituição de família por meio do casamento e à sexualidade. Estes últimos aspectos são relevantes, porque a pessoa com deficiência, especialmente aquela com transtorno mental, costuma ser isolada do convívio social, fato que auxilia para que fique “infantilizada”, impedindo-a de desenvolver-se dentro de suas possibilidades. A garantia do direito ao trabalho é importante fator de socialização, como também de assegurar que ela continuará a desenvolver-se com uma atividade relevante após ter concluído os estudos escolares. De tal maneira, o apoio à afetividade e à sexualidade da pessoa com transtorno mental, porque esta tem os mesmos instintos 27 e desejos, tal como qualquer ser humano, cabendo orientar-lhes e explicar-lhes sobre o surgimento do interesse por outra pessoa e as transformações em seu corpo na juventude. Uma vez que o individuo com deficiência física torna-se capaz ao completar 18 anos e não necessita de proteção especial nesse sentido, estabeleceu-se que a pessoa com transtorno mental deve obter a mínima limitação possível no exercício de seus direitos de natureza patrimonial e negocial, considerando-se que a curatela é medida protetiva extraordinária, mantida pelo menor tempo possível. É o que se afirma nos artigos 84 e 85 do Estatuto da Pessoa com Deficiência, bem como os artigos 753, caput e parágrafos 1º e 2º, e 754 do Código de Processo Civil. Vigorante o Estatuto da Pessoa com Deficiência, de todo, resta ao Poder Judiciário aplicá-lo, para que este atenda “aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum”, nos termos do artigo 5º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB). Ressalta-se que se tem reconhecido essa lei como um progresso na disciplina jurídica do assunto, por enaltecer a completa autonomia do indivíduo para o exercício dos direitos civis, proibindo, por exemplo, a comunicação de interdição à Justiça Eleitoral para inabilitá-lo ao exercício do direito ao voto. Existem julgados referentes ao progresso das condições de acessibilidade aos locais públicos, como escolas, estações de trem e até mesmo estabelecimentos do Poder Judiciário. Também houve penalidade quanto ao pagamento de indenização por danos morais de pessoa impedida de utilizar o transporte coletivo por não portar a nova carteira de pessoa com deficiência, assim como se julgou procedente e manteve-se a decisão de concessão de gratuidade no uso de ônibus. Mais um caso foi o de pessoa barrada em agência bancária, porque se exigiu dela documento comprobatório de sua deficiência na perna. Apresentou-se seguro igualmente os direitos da pessoa portadora do transtorno do espectro autista e condenou-se instituição de ensino superior que faltou com serviço de tradução em libras para aluna que, por isso, foi reprovada em nove disciplinas. No sentido de que o indivíduo pode ser relativamente incapaz apenas para o exercício de direitos de natureza bens e negócios, a jurisprudência trás, conforme disposto no Estatuto da Pessoa com Deficiência, que deve-se, no entanto, delimitar com clareza os atos que não poderá exercê-los sem assistência do curador, proibindo-se a interdição para todos os atos da vida civil. Trata-se do caso em que 28 se interditou pessoa portadora de esquizofrenia como relativamente incapaz tão somente para a administração de seus bens, devendo, no caso, incentivar-se a atividade laborativa como forma de inclusão e desenvolvimento da pessoa. Merece atenção, todavia, a situação de pessoas totalmente incapacitadas para manifestar sua vontade e que, anteriormente, seriam absolutamente incapazes. Nesse sentido, nota-se maior rigor nos processos de interdição Ainda em exemplo, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro decidiu que, em caso envolvendo senhora de 95 anos de idade, portadora do mal de Alzheimer, que afeta completamente sua capacidade para a prática de atos comuns da vida civil, esta seja representada, ante a não possibilidade de exercitar atos de disposição com a filha e curadora. Permanecendo nesse raciocínio, o caso julgado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, relativo à jovem de 20 (vinte) anos de idade com síndrome de Down que, no caso, foi diagnosticado com idade mental de 10 anos. Em primeira instância, reconheceu a inconstitucionalidade do Estatuto da Pessoa com Deficiência, alegando que as alterações nos artigos 3º e 4º do Código Civil desamparavam quem necessitava de proteção, e o tribunal manteve a decisão, para declará-lo como absolutamente incapaz. Constata-se que o Estatuto da Pessoa com Deficiência colaborou para maior conscientização acerca das dificuldades enfrentadas por essas pessoas. Progrediu- se com a importância de que as pessoas com transtorno mental podem e devem exercer seus direitos de maneira abrangente e respeitada, tratando-se de matéria patrimonial ou não. Porém, ainda existem dificuldades para adaptar a legislação às situações em que pessoas comprovadamente sem condições de gerenciar seus atos da vida civil sejam consideradas relativamente incapazes, acarretando, nesses casos, a falta de proteção com seus interesses. 29 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS A principal intenção da curatela é trazer proteção aos incapazes no tocante a seus interesses e garantir o cuidado dos negócios realizados por eles com relação a terceiros. Portanto, deve ser respeitado o instituto da curatela, visto que todos os seres humanos são iguais e gozam dos mesmos direitos e deveres. Indubitavelmente, a curatela é um instituto do direito de família, haja vista que o mesmo encontra-se vinculado as normas da nossa Constituição Federal, a qual possui o propósito de assegurar e resguardar o poder familiar. Mesmo com os problemas gerados da própria doença, o deficiente ainda sofre com a difamação e desinformação da família e da sociedade, o que muitas vezes o condenará continuamente aos olhos de todos. É de extrema importância que as pessoas, em primeiro lugar a própria família, informem-se sobre a doença e deem chance e condições ao deficiente para a sua recuperação e reintrodução na sociedade, e, se for o caso, na utilização da interdição apenas para fins de proteção. Não estamos aqui para criticar de certa forma o instituto da interdição, mesmo que seja a medida a ser tomada em última hipótese por ser a mais drástica, mas sim o seu uso impróprio, marginalizando cidadãos que, em alguns casos, poderiam perfeitamente ter uma vida social, familiar ou mesmo estar inserido no mercado de trabalho. Sendo assim indispensável que os verdadeiros objetivos da curatela e seu caráter social sejam respeitados. A curatela sem interdição surgiu de maneira a ser tratada como medida que evita constrangimento dos familiares do enfermo ou portador de alguma necessidade especial. O Código Civil inova de maneira positiva ao criar tal dispositivo, uma vez que o próprio enfermo, havendo a possibilidade, poderá requerer essa curadoria especial sem interdição. E se não houver, somente com a anuência do interessado poderá ser feito tal requerimento. Tão logo, esse dispositivo que permite a curatela sem interdição surge para resguardar os direitos do individuo que necessita apenas de procurador ou representante, que exerça o seu papel restringindo-se a atos negociais e 30 patrimoniais, mas com a finalidade exata de representar os seus interesses, sem tomar decisões por conta própria. Se o curatelado é capaz de discernir o que é certo ou errado, ele é capaz de assumir as responsabilidades e consequências para os atos da vida civil, mantendo diálogos permanentes e lógicos para entender e apreciar situações que envolvam decisões. Estando impossibilitado apenas em sua locomoção, dependente de cuidados de terceiros, extrema dificuldade de expressão ou mesmo para idoso acamado, mas apenas com deficiência ou limitação física e não mental, com domínio de suas capacidades psíquicas suficientes para exercer a sua vontade deve fazê-lo, não cabendo à instituição interdição em sua curatela. Alega-se que o impacto do diploma Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015), se faz sentir em outros ramos do Direito brasileiro, inclusive no âmbito processual. De tal forma, nova Lei veio em boa hora, ao conferir um tratamento mais digno às pessoas com deficiência, trazendo uma verdadeira reconstrução de valor significativo no tradicional contexto do sistema jurídico brasileiro quanto à incapacidade civil. Sendo assim, não se trata do fim da interdição, mas apenas a rigorosa forma a qual tem sido analisada pelo Poder Judiciário sob a luz do Estatuto da Pessoa com Deficiência, resguardando, conforme já analisado, os direitos e capacidades mentais daqueles que não necessitam ser representados por terceiros para expor seus pensamentos e opiniões sobre a vida civil. Conclui-se, então, que a interpretação atual das incapacidades civis trás maior segurança a aqueles que se sentem inferiores aos demais por serem portadores de enfermidades ou deficiências, que dificultam sua introdução em diversos fatores da sociedade, esta que é enferrujada diante das inclusões e possibilidades de reestruturação laboral, educativa e cultural desses indivíduos. A solução mais clara e eficiente que o Estatuto da Pessoa com Deficiência nos trouxe diante do instituto da curatela, é o reconhecimento da importância da vida dos menos capacitados, pois, mesmo com suas restrições, são seres humanos que nos fornecem aprendizados de grandeza absolutamente admirável, pessoas carentes de carinho, atenção e tratamentos, mas que são de maneira geral feliz e se contentam com a simplicidade que muitos de nós talvez não nos acostumássemos viver diariamente. Assim, que aqueles que mais necessitam desse sentimento sejam 31 devidamente amparados por seu Estatuto, de maneira sempre positiva, objetivando apenas o bem-estar e conforto civil dos portadores de enfermidades e deficiências. 32 REFERÊNCIAS BARBOSA, Thais. Interdição Judicial. Disponível em http://www.fenix.org.br/Interdicao_Judicial_Fenix.pdf, 2008. BRITO, Anne Lacerda. O que é interdição e para que serve?. Disponível em http://annelbrito.jusbrasil.com.br/artigos/143838064/o-que-e-interdicao-e-para- queserve, 2012. DINIZ, Maria Helena. Curso de direito Civil brasileiro, v. 5: direito de família. 24 ed. São Paulo. Saraiva, 2009. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. 32ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2018. FILHO, Eduardo Tomasevicius. Atual entendimento jurisprudencial da pessoa com deficiência. Revista Consultor Jurídico, 30 de outubro de 2017. 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