Buscar

dto familia augusto


Continue navegando


Prévia do material em texto

Augusto Sampaio Strohhaecker 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
RECONHECIMENTO DE PATERNIDADE E MATERNIDADE SOCIOAFETIVA 
POST MORTEM 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
2023 
 
Augusto Sampaio Strohhaecker 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Reconhecimento de paternidade e maternidade socioafetiva post mortem 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à 
Faculdade Digital Descomplica, como parte dos 
requisitos necessários à obtenção do grau de 
bacharel tecnólogo em Direito da Família e 
Sucessões. 
 
 
 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
2023 
 
 
RESUMO 
 
O presente trabalho teve como objetivo o estudo da paternidade e maternidade 
socioafetiva post mortem, assim como sua previsão no direito civil brasileiro. Deste 
modo, foi abordado a filiação e seus desdobramentos. Versando sobre a evolução do 
conceito familiar, seus requisitos perante o âmbito jurídico e as previsões legais acerca 
do tema. Por conseguinte, abordou-se a socioafetividade na esfera judicial e 
extrajudicial, as maneiras como são abordadas em cada viés e as noções doutrinarias 
acerca do tema. A partir destas análises, foi discorrido sobre os requisitos essenciais 
para o reconhecimento da parentalidade socioafetiva com ênfase nas situações post 
mortem, passando pelo principal requisito, isto é, a posse do estado de filho. Nesse 
cenário, elencou-se também questões jurídicas e morais acerca do tratamento 
desigual entre os filhos, sendo uma vedação constitucional. 
Palavras-chave: parentalidade socioafetiva; paternidade; maternidade; filiação 
socioafetiva; post mortem. 
 
 
 
 
 
INTRODUÇÃO 
 
 O direito das famílias sofre mudanças drásticas com o passar do tempo e 
consecutivamente com a evolução da sociedade e seus conceitos de família, 
afetividade, vínculos biológicos ou não biológicos. A principal evolução destes 
conceitos se detém a questão do afeto. Os vínculos afetivos, isto é, aqueles criados 
através dos sentimentos humanos e não somente por fatores biológicos, são os 
principais pontos que impactam a esfera jurídica. 
 Através da ênfase nos laços afetivos, o judiciário se depara com uma demanda 
considerável de ações requerendo reconhecimento destes vínculos a título de uniões 
estáveis, reconhecimento de filiações e outros. Esta demanda recebida pelo judiciário 
sobre o tema exemplifica objetivamente a importância no estudo acerca do tema e 
seus principais desdobramentos. 
 A presente tese tem como objetivo averiguar a parentalidade socioafetiva, ou 
seja, a paternidade e maternidade gerada por vínculos afetivos, com ênfase na 
situação do reconhecimento destes vínculos diante do fato post mortem. Será assim, 
analisados quais os conceitos adotados, os requisitos trazidos pela doutrina e pela 
jurisprudência e os impactos consequentes dos mesmos. Além disto, serão analisados 
especificamente, com exemplos claros, os requisitos essenciais para o 
reconhecimento das filiações. O consentimento como critério de avaliação para 
reconhecimento dos vínculos, o estado de posse como método para qualificação da 
maternidade ou paternidade socioafetiva. 
 Esta tese tem como objetivo principal esclarecer e explicar a pergunta: Existe 
a possibilidade de reconhecimento destes vínculos post mortem? Quando este 
reconhecimento pode ocorrer e quais as formas legais para se obter tal 
reconhecimento? 
 
 
 
 
 
 
METODOLOGIA 
 
O método de abordagem utilizado no referido trabalho foi a dedutiva, isto é, 
partimos de um sentido geral de afirmação feitas com base em um fenômeno 
específico baseando-se nas repetições de observações neste sentido. Trazendo como 
ideia que a partir de uma verdade geral descrita pode-se chegar a uma conclusão 
geral. 
Quanto ao método de procedimento foi usado o comparativo, ou seja, toda a 
investigação é realizada por verificação de dois ou mais fenômenos sociais, 
analisando-se as diferenças e compatibilidades. Assim como, foi utilizado o método 
histórico, pois foram feitas análise sobre a evolução dos termos, sentidos e 
adequações sociais sofridas com o passar do tempo trazendo-as para a atualidade. 
 O método de pesquisa utilizado foi o bibliográfico. A pesquisa bibliográfica, 
para FONSECA (2002) é realizada: 
 [...] a partir do levantamento de referências teóricas já analisadas, e 
publicadas por meios escritos e eletrônicos, como livros, artigos científicos, 
páginas de web sites. Qualquer trabalho científico inicia-se com uma 
pesquisa bibliográfica, que permite ao pesquisador conhecer o que já se 
estudou sobre o assunto. Existem, porém, pesquisas científicas que se 
baseiam unicamente na pesquisa bibliográfica, procurando referências 
teóricas publicadas com o objetivo de recolher informações ou 
conhecimentos prévios sobre o problema a respeito do qual se procura a 
resposta. 
 A presente pesquisa baseou-se em teorias já publicadas, assim como doutrinas 
relevantes e jurisprudências pacificadas. Pautando-se no estudo preliminar do 
combinado destas referencias para a elaboração de tese própria e conclusão geral 
pautada na teoria criada com base nestas. 
 
FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA E SEUS DESDOBRAMENTOS 
 
O termo “socioafetivo” etimologicamente é formado pela junção do prefixo 
sócio, que neste contexto possui o significado de companheiro, e afetivo, que tem o 
sentido de afeição e sentimentos. Assim, socioafetivo diz respeito as relações sociais 
pautadas na afetividade, no vínculo sentimental e não somente no fator genético. 
Portanto, relações familiares socioafetivas são aquelas pautadas na afinidade, no 
reconhecimento sentimental e, principalmente, no consentimento entre ambas as 
partes acerca do vínculo existente. 
As relações familiares passaram por diversas e notáveis transformações ao 
longo dos anos e o direito de família precisou adaptar-se para compreender a 
realidade social. Através das mudanças sociais o direito passou a perceber as 
relações socioafetivas sob um novo prisma. É por este motivo que as normas que 
regem estas relações sofreram ampliações significativas no decorrer dos últimos 
anos, especificamente o Código Civil de 2002. Um exemplo simples sobre estas 
mudanças é a alteração no texto quanto a denominação dos filhos entre o Código Civil 
de 1916 e o Código Civil de 2002, ou seja, não se utiliza mais a distinção de filhos 
legítimos e ilegítimos, pois não há desigualdade entre seus direitos, consoante artigo 
227§6º que efetiva o princípio de igualdade entre os filhos (OTONI, 2010). 
A Constituição Federal de 1988 trouxe uma transformação para todo o sistema 
jurídico brasileiro ao evidenciar ditames já reconhecidos internacionalmente, mas 
outrora esquecidos no Brasil. O princípio máximo da dignidade da pessoa humana, o 
princípio da igualdade entre as pessoas e são exemplos claros desta inovação legal. 
Desta forma, os demais compilados legais precisaram adaptar-se as novas 
concepções expressas na Carta Magna. 
A partir dos novos princípios constitucionais que embasam todo o modo de 
operação e aplicação do direito, o Código Civil passou a pessoa humana, sua 
dignidade e sua igualdade perante os demais, como o centro de todo seu texto, 
especialmente ao versar sobre o Direito de Família. Foi a partir dessa pequena, mas 
significativa, mudança que se abriu possibilidade para efetivar garantias independente 
de fatores biológicos, como é o caso da parentalidade e filiação socioafetiva 
(SANTOS, 2021). 
Importante salientar que a partir do texto constitucional e dos princípios intrínsecos a 
este, a “socioafetividade”, ou ainda, apenas, “afetividade”, possuem embasamento e 
diferenciação dos parâmetros da psicologia. Sobre o assunto, LÔBO (2006) explica: 
A afetividade familiar é, pois, distinta do vínculo de natureza obrigacional, 
patrimonial ou societária. Na relação familiar não há fim econômico, cujas 
dimensões sempre derivadas (por exemplo,dever de alimentos, ou regime 
matrimonial de bens), nem seus integrantes são sócios ou associados. Por 
outro lado, a afetividade, sob o ponto de vista jurídico, não se confunde com 
o afeto, como fato psicológico ou anímico, este de ocorrência real necessária. 
O Direito, todavia, converteu a afetividade em princípio jurídico, com força 
normativa, impondo dever e obrigação aos membros da família, ainda que na 
realidade existencial destes tenha desaparecido o afeto. Assim, pode haver 
desafeto entre pai e filho, mas o Direito impõe o dever de afetividade. Além 
dos fundamentos contidos nos arts. 266 e seguintes da Constituição, ressalta 
o dever de solidariedade entre os membros da família (art. 3º, I, da 
Constituição), reciprocamente entre pais e filhos (art. 229) e de todos em 
relação aos idosos (art. 230). A afetividade é um princípio jurídico que 
peculiariza, no âmbito da família, o princípio da solidariedade. 
 
Esclarecido este ponto, é relevante, antecipadamente, abordar também o que 
tange, por sua vez, a própria filiação. Filiação é aquela relação jurídica factual de 
primeiro grau, ascendentes e descendentes, em outros termos, pais e filhos. Apesar 
do Código Civil de 2002 não trazer expressamente um dispositivo acerca da filiação 
socioafetiva pode-se perceber sua vinculação quando refere o “parentesco natural ou 
civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem” (art. 1593). Além disso, o 
enunciado 256 da III Jornada de Direito Civil elucida que a posse de estado de filho, 
que neste caso se refere a percepção de terceiros sobre o vínculo parental ou ainda 
o ânimo paterno-filial, é uma espécie de parentesco civil (OTONI, 2010). 
A filiação socioafetiva pressupõe três requisitos para serem analisados. O 
primeiro deles é o tractus que se refere ao tratamento de uma pessoa para com a 
outra. Neste núcleo em específico seria o exercício real da parentalidade através das 
práticas sociais comuns, como por exemplo se ocorre a criação, o cuidado, a 
educação e, principalmente a apresentação pública da pessoa para com o filho(a). O 
segundo pressuposto é o reputatio que se relaciona com o reconhecimento da 
sociedade sobre aquela relação. No contexto em tela, seria a percepção de outrem 
quanto ao laço existente ou ainda, quanto ao pertencimento do filho(a) naquela 
determinada família. Por último, o nominatio, que versa sobre a nominação, isto é, o 
uso do nome familiar pelo filho(a) (COSTA, 2023). 
Existem duas modalidades reconhecidas pelo direito de filiação socioafetivas: 
a adoção e a criação. A primeira é uma forma de reconhecimento da filiação pela 
esfera jurídica, pois o vínculo só pode ser reconhecido pelo meio de sentença judicial. 
A adoção ainda exige requisitos previamente estipulados pelo ordenamento jurídico. 
Por exemplo, o Estatuto da Criança e do Adolescente prevê que para a concretização 
da adoção é necessária uma convivência por até 180 (cento e oitenta) dias quando 
não existe uma prévia convivência entre as partes, entre outros requisitos (PEREIRA, 
2020). 
Para PEREIRA (2020): 
A filiação socioafetiva exige que uma situação fática prévia esteja 
concretizada para que o vínculo possa ser estabelecido. [...] A filiação 
socioafetiva, de outro turno, não pressupõe a extinção do vínculo biológico. 
Ao contrário, na maioria das vezes, ambos os vínculos conviverão lado a lado, 
ensejando inclusive o surgimento da multiparentalidade. Isso ocorrerá nas 
situações em que o vínculo socioafetivo envolver indivíduos que já tenham 
pai e mãe biológicos conhecidos. Tal não se verifica, contudo, na adoção, 
uma vez que, não sendo ela unilateral, o vínculo com os pais biológicos 
sempre desaparecerá. 
Nesta redação o autor utiliza-se do termo filiação socioafetiva para falar sobre 
a modalidade criação. Diante do exposto acima, podemos visualizar a real diferença 
entre as modalidades de filiação socioafetivas reconhecidas no ordenamento jurídico 
brasileiro. Quanto a filiação por criação, percebe-se uma relação jurídica atípica onde 
desponta uma modalidade consuetudinária. A filiação por criação, citando COSTA 
(2023), explica-se como uma modalidade “quase sempre despida de juridicidade, mas 
revestida de sólidos laços afetivos”. 
 SOCIOAFETIVIDADE NO ÂMBITO JUDICIAL E EXTRAJUDICIAL 
 
Conforme elucidado até aqui, é possível compreender que a filiação não é mais 
tratada unicamente como um elo sanguíneo. A autora COSTA (2023) explica que “a 
existência do pai biológico e identificamos a existência do pai socioafetivo, o que torna 
imperioso separar a figura do “pai” da figura do “genitor””. As figuras distintas 
abordadas pela autora, em algumas situações, podem estar concentradas no mesmo 
individuo ou não. É importante explicar que a figura do genitor não anula a figura do 
pai socioafetivo e vice-versa. Podem existir, para uma mesma criança ou adulto, a 
coexistência entre ambas as figuras, o que nos levaria para uma família multiparental. 
O autor MADALENO (2000) aborda esses conceitos de uma maneira mais 
especifica, vejamos: 
A paternidade tem um significado mais profundo do que a verdade 
biológica, onde o zelo, o amor paterno e a natural dedicação ao filho 
revelam uma verdade afetiva, uma paternidade que vai sendo 
construída pelo livre desejo de atuar em interação paterno-filial, formando 
verdadeiros laços de afeto que nem sempre estão presentes na filiação 
biológica, até porque, a paternidade real não é biológica, e sim cultural, fruto 
dos vínculos e das relações de sentimento que vão sendo cultivados durante 
a convivência com a criança. 
É válido frisar que essa mesma especificação vale também para mãe 
socioafetiva e genitora, ou, mãe biológica. Não há diferenciação entre estes postos 
sociais para o direito, pois uma determinada criança pode ter duas mães, dois pais, 
pai e mãe, entre outros. O rol de tipos de composição familiares pode ser bastante 
extenso, mas não cabe demorar-se nesta dissertação. Sabendo que existe diferença 
entre filiação biológica (genitor ou genitora) e filiação socioafetiva (parentalidade 
afetiva), é preciso compreender como funciona o reconhecimento legal destes 
vínculos. 
Preliminarmente é indispensável esclarecer que o reconhecimento dos vínculos 
socioafetivos pode ser feito através da esfera judicial ou extrajudicial. Na primeira 
opção, neste caso, o reconhecimento pela esfera judicial, como já mencionado 
anteriormente possui amparo no Código Civil de 2002 que expõe as formas de 
parentesco como “natural, civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra 
origem”. Apesar do Código Civil ter sido instituído em 2002, o judiciário somente foi 
aplicar o tema a partir de uma análise doutrinaria do direito de família, após quase dez 
anos após o advento do compilado de normas. 
Para que ocorra, através da via judicial, o reconhecimento da parentalidade 
socioafetiva, o pai ou a mãe socioafetiva deve ajuizar o requerimento de registro em 
face dos genitores, pois estes podem declaração oposição ao eventual 
reconhecimento. Neste caso, o judiciário deve sempre averiguar qual o melhor 
interesse da criança ou adolescente. A ação em questão é de reconhecimento de 
paternidade ou maternidade, onde a afetividade será a principal questão a ser 
verificada pelo juiz(a), pois reconhecer o laço socioafetivo é reconhecer os direitos e 
deveres implícitos a eles (SANTOS, 2021). 
Quando o pedido de reconhecimento chega ao judiciário, além da questão da 
afetividade, o juiz(a) também deverá observar os requisitos já tratados anterior. Isto é, 
se existe na relação o tractus, nominatio e reputatio. Além destes requisitos, do 
mesmo modo é preciso compreender a existência da posse de filho pelo período de 5 
(cinco) anos contínuos e ininterruptos (TARTUCE, 2019). 
A segunda hipótese de reconhecimento da parentalidade socioafetiva é feita de 
forma extrajudicial, ou seja, diretamente nocartório. Essa opção tornou-se possível a 
partir do Provimento Nº 63/2017 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) cuja ementa 
declara: 
Institui modelos únicos de certidão de nascimento, de casamento e de óbito, 
a serem adotados pelos ofícios de registro civil das pessoas naturais, e dispõe 
sobre o reconhecimento voluntário e a averbação da paternidade e 
maternidade socioafetiva no Livro “A” e sobre o registro de nascimento 
e emissão da respectiva certidão dos filhos havidos por reprodução 
assistida (grifo nosso). 
O Provimento supramencionado surgiu após pedido de providencias feito pelo 
Instituto Brasileiro de Direito das Famílias – IBDFAM que requeria uma unificação 
nacional acerca do tema, pois, segundo GENTIL (2022) “muitos Estados já possuíam 
regulamentação acerca da matéria, tendo sido iniciado pelo Estado de Pernambuco”. 
O Instituo Brasileiro de Direito das Famílias já possuía Enunciado próprio acerca do 
tema, cujo teor: 
Enunciado 21 - O reconhecimento voluntário da parentalidade socioafetiva 
de pessoa que não possua parentalidade registral estabelecida poderá ser 
realizado diretamente no ofício de registro civil, desde que não haja 
demanda em curso e independentemente de homologação judicial. 
Através do Provimento 63/2017 CNJ, houve uma unificação do procedimento 
em todo o território nacional e evidenciou-se a existência da socioafetividade e 
multiparentalidade para todo o ordenamento jurídico brasileiro. Logo em seguida o 
CNJ editou o Provimento 83/2019 CNJ que elucidou questões conflituosas que 
surgiram após o provimento anterior. Neste segundo provimento acerca do tema, o 
Conselho Nacional de Justiça trás requisitos necessários para o reconhecimento da 
parentalidade socioafetiva em âmbito extrajudicial. 
Os requisitos exigidos são: Existência do Vínculo Socioafetivo da Filiação, 
Inexistência de Discussão Judicial, Idade do(a) Requerente, Inexistência de Vínculo 
de Ascendentes ou Irmãos, Diferença de Idade, Consentimento e Local do Pedido. 
Quanto aos presentes requisitos, abordaremos em tópicos distintos para uma melhor 
compreensão. 
A existência do vínculo socioafetivo da filiação, isto é, a maternidade ou 
paternidade, deve ser regular e exteriorizada socialmente, consoante o art. 10-A do 
Provimento 63/2017, que foi incluído através do Provimento 83/2019. Este vínculo 
precisa ser atestado pelo registrador após apurar de maneira concreta acerca do 
caso específico. O segundo requisito, a inexistência de discussão judicial, é bastante 
elucidativo. Não pode existir processo judicial prévio que verse sobre 
reconhecimento da paternidade ou maternidade socioafetiva. A inexistência de 
discussão judicial é auto declaratória, em outros termos, são as próprias partes que 
informam o registrador. 
A idade mínima do requerente para o reconhecimento por via extrajudicial é 
18 (dezoito) anos, independentemente do estado civil da parte. O quarto requisito é 
a inexistência do vínculo de ascendente ou irmão, o que quer dizer que não pode 
existir o reconhecimento de paternidade ou maternidade socioafetiva entre genitores 
e prole ou ainda entre irmãos. Assim como também é preciso ser comprovado a 
existência da diferença de idade de no mínimo 16 anos entre as partes. 
Quanto ao consentimento, critério para reconhecimento extrajudicial da 
parentalidade socioafetiva, GENTIL (2022) elucida: 
Caso o (a) filho (a) possua entre doze anos e dezoito anos incompletos, o 
reconhecimento da paternidade ou maternidade socioafetiva exigirá o seu 
consentimento, conforme prevê o artigo 11, §§ 4º e 5º do Provimento nº 
63/2017 do CNJ. A coleta da anuência tanto do pai quanto da mãe do filho 
maior de doze anos deverá ser feita pessoalmente perante o RCPN ou 
escrevente autorizado. Na falta da mãe ou do pai do adolescente, na 
impossibilidade de manifestação de validade destes ou do filho, quando 
exigido, o caso será apresentado ao juiz competente, nos termos da 
legislação local. 
Por último, é indispensável que o pedido de reconhecimento seja feito ante o 
oficial responsável no cartório de registro civil de pessoas naturais, mesmo que em 
local diverso do original de assentamento. Caso qualquer dos requisitos 
mencionados anteriormente não seja atendido, não há o que se falar em recurso 
extrajudicial, portanto, as partes deverão buscar o amparo do judiciário para suscitar 
a questão. Preenchidos os requisitos, o oficial responsável deverá enviar o 
expediente para o Ministério Público (MP), que se manifestará através de parecer 
favorável ou desfavorável. Na hipótese de parecer do MP desfavorável, o registrador 
não poderá realizar o registo da parentalidade socioafetiva devendo encaminhar ao 
juiz competente ou arquivar o expediente (GENTIL, 2022). 
 
O RECONHECIMENTO DA SOCIOAFETIVIDADE POST MORTEM 
 
O reconhecimento da socioafetividade, conforme explanado anteriormente, 
necessita de uma série de fatores objetivos para ser efetivada e pode ser feito por 
duas vias: a judicial e a extrajudicial. Para o reconhecimento post mortem, ou seja, 
quando a tentativa de reconhecimento do vínculo é feita após o óbito de uma das 
partes, só é admitida a declaração de parentalidade socioafetiva pelo âmbito judicial 
e para isto, os requisitos exigidos são analisados de uma perspectiva mais rígida. Isto 
porque a partir do reconhecimento do vínculo passa-se a usufruir dos direitos 
sucessórios inerentes aquele parentesco. 
A viabilidade do reconhecimento da socioafetividade depois da morte do 
parente socioafetivo pode, ou deve ser fundada no próprio direito constitucional como 
pilar para todos os demais direitos e especialmente na ausência de dispositivo 
especifico sobre o tema. No caso de omissão do legislador pode ser aplicado 
princípios que supram esses hiatos legais, pois não há pretextos para não reconhecer 
essa parentalidade. 
Frisa-se, mais uma vez, que o reconhecimento da socioafetividade não visa 
retirar do registro a parentalidade já existente, seja ela biológica ou não. Dito isto, a 
partir da premissa de um reconhecimento deste vinculo pós óbito do parente, 
aparecem diversos conflitos quanto aos efeitos deste vinculo, principalmente quando 
se trata do direito sucessório do de cujus. Quanto ao assunto, os autores RONDON e 
PISSANTI (2021) complementam: 
O disposto no artigo 227, §6º, da CRFB/88, conforme já exposto, revela-se 
amplo, abrangendo todas e quaisquer relações parentais, impedindo que haja 
fundamento que obste a consideração do filho socioafetivo como um herdeiro 
legítimo; o Código Civil deve, portanto, exercer tratamento igualitário entre os 
filhos, sejam eles biológicos, adotivos, etc. 
 
A doutrinadora Maria Helena DINIZ (2011) discorre sobre o tema em seu 
trabalho, esclarecendo que “o reconhecimento da paternidade socioafetiva produz os 
efeitos pessoais e patrimoniais que lhe são inerentes”. Para a autora o vínculo 
socioafetivo após seu reconhecimento legal gera resultados legais para todos os fins, 
nas limitações do direito civil e também esclarece que os princípios constitucionais 
são essenciais para a interpretação de tais direitos. São exemplos claros o princípio 
do melhor interesse da criança e do adolescente, o princípio da dignidade da pessoa 
humana e o princípio da solidariedade, que são aplicados conforme as peculiaridades 
de cada caso. 
O falecimento do parente socioafetivo antes do reconhecimento deste vinculo 
legalmente não pode obstar os direitos daquele ente que ficou desamparado e que 
deseja o reconhecimento da socioafetividade. A jurisprudência é consolidada quanto 
ao assunto. O STJ (Superior Tribunal de Justiça) já decidiu neste sentido diversas 
vezes. Um dos julgados, REsp 1.500.999-RJ, cujo relator foi o Ministro Ricardo Villas 
Bôas Cueva, possui a seguinte ementa: 
Agravo interno no recurso especial. Ação declaratória. Reconhecimento de 
filiação socioafetiva. Adoção póstuma. Possibilidade jurídica do pedido.Inequívoca manifestação de vontade do adotante falecido. Agravo interno 
provido para dar provimento ao recurso especial. 1. Em que pese o art. 42, § 
6º, do ECA estabelecer ser possível a adoção ao adotante que, após 
inequívoca manifestação de vontade, vier a falecer no curso do procedimento 
de adoção, a jurisprudência evoluiu progressivamente para, em situações 
excepcionais, reconhecer a possibilidade jurídica do pedido de adoção 
póstuma, quando, embora não tenha ajuizado a ação em vida, ficar 
demonstrado, de forma inequívoca, que, diante de longa relação de 
afetividade, o falecido pretendia realizar o procedimento. REVISTA DO 
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 552 2. Segundo os precedentes desta 
Corte, a comprovação da inequívoca vontade do falecido em adotar segue as 
mesmas regras que comprovam a filiação socioafetiva: o tratamento do 
adotando como se filho fosse e o conhecimento público dessa condição. 
Nesse sentido: REsp 1.663.137/MG, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira 
Turma, julgado em 15.08.2017, DJe de 22.08.2017; REsp 1.500.999/RJ, Rel. 
Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 12.04.2016, 
DJe de 19.04.2016. 3. A posse do estado de fi lho, que consiste no desfrute 
público e contínuo da condição de filho legítimo, foi atestada pelo Tribunal de 
origem diante das inúmeras fotos de família e eventos sociais, boletins 
escolares, convites de formatura e casamento, além da robusta prova 
testemunhal, cujos relatos foram uníssonos em demonstrar que os adotandos 
eram reconhecidos como filhos, tanto no tratamento como no sobrenome que 
ostentavam, e assim eram apresentados ao meio social. 4. Afastada a 
impossibilidade jurídica do pedido, na situação concreta o pedido de adoção 
post mortem deve ser apreciado, mesmo na ausência de expresso início de 
formalização do processo em vida, já que é possível extrair dos autos, dentro 
do contexto de uma sólida relação socioafetiva construída, que a real intenção 
do de cujus era assumir os adotandos como filhos. 5. Agravo interno provido 
para dar provimento ao recurso especial. 
São inegáveis a existência e o reconhecimento jurídico do instituto de 
parentalidade socioafetivo mesmo post mortem. Assim, para a área sucessória, não 
há distinção entre os gêneros de parentalidade por força do artigo 227, § 6º que traz 
a igualdade entre as filiações. Desta maneira o filho socioafetivo é herdeiro necessário 
e concorre igualmente com os demais filhos e cônjuge. É exatamente neste ponto que 
começa a divergência e onde deve recair a maior atenção do judiciário, pois a posse 
do estado de filho precisa ser enfaticamente comprovada através de provas 
testemunhais e demais admitidas em direito, para que não haja fraude quanto ao 
vínculo socioafetivo para fins de apropriação do patrimônio do de cujus. 
Quanto a divergência sobre esse reconhecimento post mortem se baseia na 
violação do instituto através do número de ações postuladas por supostos filhos (as) 
contra o espólio do indivíduo alvo da pretensa parentalidade socioafetiva. O receio de 
que o instituto da paternidade ou maternidade afetiva possa se tornar disfarce para 
busca por patrimônio indevido é a maior preocupação do judiciário e do legislador. 
Deste modo, torna-se mais difícil para aqueles que realmente buscam apenas pelo 
reconhecimento do vínculo existente antes da morte comprovar e obter êxito na 
demanda judicial. Assim, o judiciário tem requerido que se demonstre a vontade 
inequívoca do possível pai ou mãe sobre o reconhecimento daquele vinculo. 
Assim, o apelo existente é de que o judiciário tenha cautela quanto as ações 
de parentalidade socioafetiva post mortem, em especial com os pedidos e as 
postulações das ações advindas do instituto, para que, desta forma, o poder judiciário 
não sirva como ferramenta para prováveis enriquecimentos sem causas. 
 
CONCLUSÃO 
 
 O presente trabalho abordou o tema da maternidade e paternidade socioafetiva 
e as possibilidades do seu reconhecimento post mortem. Diante do elucidado ficou 
claro que as relações familiares passaram por diversas transformações ao longo da 
história e com isto, o direito de família precisou adaptar-se para compreender as novas 
noções e realidades trazidas pela sociedade. Através dessas mudanças sociais, o 
direito passou a perceber as relações socioafetivas com um novo olhar. 
 A Constituição Federal de 1988 trouxe diversas novidades legais para 
acompanhar o momento em que a sociedade vivenciava e evidenciando princípios e 
procedimentos que já eram reconhecidos internacionalmente, mas que estavam 
deflagrados no Brasil. Com essas mudanças, os demais diplomas legais precisaram 
adaptar-se a Carta Magna. A partir dos novos princípios e direitos elencados na 
constituição, especialmente o princípio da dignidade da pessoa humana, fez com que 
o Direito Civil levasse a pessoa humana para o centro de seu texto. 
 O Código Civil passou a efetivar garantias que independiam de fatores 
biológicos que é o caso da parentalidade e filiação socioafetiva. Como já esclarecido, 
o reconhecimento dessas parentalidades e filiações são feitas através da esfera 
judicial e extrajudicial, mas em ambos os casos, precisa-se ser demonstrados alguns 
requisitos. 
Os requisitos exigidos são: Existência do Vínculo Socioafetivo da Filiação, 
Inexistência de Discussão Judicial, Idade do(a) Requerente, Inexistência de Vínculo 
de Ascendentes ou Irmãos, Diferença de Idade, Consentimento e Local do Pedido. 
Para o reconhecimento post mortem, ou seja, quando a tentativa de 
reconhecimento do vínculo é feita após o óbito de uma das partes, só é admitida a 
declaração de parentalidade socioafetiva pelo âmbito judicial e para isto, os requisitos 
exigidos são analisados de uma perspectiva mais rígida. Isto porque a partir do 
reconhecimento do vínculo passa-se a usufruir dos direitos sucessórios inerentes 
aquele parentesco. 
Dessa forma concluímos que a possibilidade do reconhecimento da 
maternidade e paternidade socioafetivas post mortem é plausível desde que atendidos 
os critérios acima elencados. Entretanto, a comprovação dos requisitos neste caráter 
de demanda é mais onerosa para as partes, principalmente quando se refere a 
comprovação do estado de posse de filho. As provas trazidas ao juízo precisam ser 
incontestáveis, pois, no caso do falecimento de uma das partes, não como ficar 
evidente a sua declaração de vontade e o judiciário precisa tomar cuidado com esta 
questão. 
Conclui-se que a ausência de uma legislação infraconstitucional especifica ou 
ainda de dispositivo específico no Código Civil faz com que se crie uma lacuna grande 
no direito de família, ficando as decisões baseadas em doutrinas ou ainda a mercê de 
entendimentos pacíficos das cortes superiores, o que pode levar mais tempo que o 
recomendado para acontecer. O direito de família evolui rápido demais e o sistema 
judiciário e os diplomas legais precisam ser atualizados na mesma proporção, pois 
não pode os direitos familiares inerentes as pessoas ficarem completamente à mercê 
de um terceiro interpretá-los como efetivo direito ou não. 
 
 
 
 
 
 
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICAS 
 
BARBOSA FRANCO, K.; EHRHARDT JÚNIOR, M. Reconhecimento extrajudicial 
da filiação socioafetiva e multiparentalidade: comentários ao provimento no 63, 
de 14.11.17, do CNJ. Revista Brasileira de Direito Civil, [S. l.], v. 17, p. 223, 2018. 
Disponível em: https://rbdcivil.ibdcivil.org.br/rbdc/article/view/279. Acesso em: 24 ago. 
2023. 
BARBOZA, Heloísa Helena. Efeitos jurídicos do parentesco socioafetivo. Revista 
da Faculdade de Direito da UERJ – RFD, [S.I.], n.24, p. 111-126, dez. 2013. ISSN 
2236-3475. Disponível em: https://www.e-
publicacoes.uerj.br/index.php/rfduerj/article/view/7284. Acesso em: 23 ago. 2023. 
FONSECA, J. J. S. Metodologia da pesquisa científica. Fortaleza: UEC, 2002. 
Apostila. 
GENTIL, Christiane da Luz Le. Reconhecimento extrajudicial dafiliação 
socioafetiva. Direito das Famílias e Sucessões – ABARJ, 2022. Disponível em: 
https://www.jusbrasil.com.br/artigos/reconhecimento-extrajudicial-da-filiacao-
socioafetiva/1424464502. Acesso em: 28 ago. 2023. 
MADALENO, Rolf Hanssen. Novas perspectivas no direito de família. Livraria do 
Advogado, 2011. 
MONTEIRO COSTA, D.; SALOMÃO LEITE, G. A paternidade socioafetiva no 
direito brasileiro. Caderno de Graduação - Humanas e Sociais - UNIT - 
PERNAMBUCO, [S. l.], v. 5, n. 3, p. 65–77, 2023. Disponível em: 
https://periodicos.set.edu.br/facipehumanas/article/view/7394. Acesso em: 23 ago. 
2023. 
OTONI, Fernanda Aparecida Corrêa. A filiação socioafetiva no direito brasileiro e 
a impossibilidade de sua desconstituição posterior. IBDFAM (Instituto Brasileiro 
de Direito de Família), 2010. Disponível em: 
https://ibdfam.org.br/index.php/artigos/680/A+filia%C3%A7%C3%A3o+socioafetiva+
no+direito+brasileiro+e+a+impossibilidade+de+sua+desconstitui%C3%A7%C3%A3o
+posterior. Acesso em: 23 ago. 2023. 
PEREIRA, Fernanda Amadio Piazza Jacobs. Adoção e reconhecimento de filiação 
socioafetiva – um comparativo entre os institutos. Migalhas, 2020. Disponível em: 
https://www.migalhas.com.br/coluna/migalhas-notariais-e-registrais/335153/adocao-
e-reconhecimento-de-filiacao-socioafetiva---um-comparativo-entre-os-institutos. 
Acesso em: 23 ago. 2023. 
SANTOS, Natalye Regiane Alquezar dos. Parâmetros legais e sociais da família 
socioafetiva. IBDFAM (Instituto Brasileiro de Direito de Família), 2021. Disponível em: 
https://ibdfam.org.br/artigos/1648/Par%C3%A2metros+legais+e+sociais+da+fam%C
3%ADlia+socioafetiva. Acesso em: 23 ago. 2023. 
SOCIOAFETIVO. In: DICIO, Dicionário Online de Português. Porto: 7Graus, 2023. 
Disponível em: https://www.dicio.com.br/socioafetivo/. Acesso em: 23 ago. 2023. 
TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil: Volume Único. 9 ed. Rio de Janeiro: 
Forense, 2019.