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14/09/2020 FISIOPATOLOGIA II Aula 14 1 Pancreatites Doença inflamatória do pâncreas ou pancreatite, na grande maioria das vezes de etiologia não infecciosa, pode ser aguda ou crônica. Os quadros morfológico e clínico das pancreatites variam bastante segundo a natureza, a duração e a intensidade das lesões. As principais formas de pancreatite estão descritas a seguir. Pancreatite Aguda É um episodio discreto de lesão celular e inflamação pancreática que é deflagrada pela ativação e liberação de enzimas digestivas para o pâncreas e tecidos peripancreáticos. Apresenta-se habitualmente com sintomas de dor abdominal, náuseas e vômitos acompanhados por elevação dos níveis séricos de amilase, lipase ou ambas, e pela evidência radiológica de inflamação, edema ou necrose do pâncreas. Embora após o surto agudo possa existir recuperação da estrutura e da função pancreáticas, a recuperação completa é improvável se o dano inicial for substancial, particularmente se o episódio original for associado à necrose pancreática significativa. Com episódios repetidos, pode haver um desvio de inflamação aguda, necrose e apoptose para um ambiente de inflamação crônica, ativação de células estreladas pancreáticas, destruição contínua de tecidos e, por último, a fibrose característica de pancreatite crônica. Cerca de 25% dos pacientes com pancreatite aguda irão ter uma recorrência, e cerca de 10% irão desenvolver pancreatite crônica. Epidemiologia A gravidade é proporcional à intensidade da lesão, podendo a mortalidade alcançar 10% dos casos se não houver infecção associada ou até 100% quando o tecido necrótico se torna infectado. A incidência de pancreatite aguda tem grande variação geográfica e depende da causa. Relatos de necrópsia mostram prevalência que varia de 0,38 a 1,3% na população geral. Nos EUA, pancreatite aguda associa-se mais a ingestão abusiva de álcool, enquanto na Inglaterra e no Brasil a causa principal é a doença biliar calculosa; álcool e litíase biliar respondem por 80% dos casos de pancreatite aguda. Outras causas são obstrução dos ductos por outros agentes, hipercalcemia, hiperlipoproteinemia, traumatismos e fármacos. A proporção de homens e mulheres é de 1:3 no grupo com doenças das vias biliares e de 6:1 nos casos de alcoolismo. Fisiopatologia Os mecanismos incluem exposições a potenciais desencadeadores de doença e polimorfismos genéticos que predispõem a pancreatite aguda. Sendo caracterizada por ativação prematura de enzimas digestivas pancreáticas no interior do pâncreas. Em muitos modelos de pancreatite, a sinalização anormal do cálcio e ativação de proteínas cinase específicas conduzem à geração de mediadores inflamatórios, à ativação de enzimas no interior das células acinares, exocitose mal direcionada e, por fim, a lesão celular e morte, que caracterizam a pancreatite aguda. A ativação de tripsinogênio a tripsina pode ser um passo inicial crítico, tendo a tripsina capacidade para ativar outras proteases no interior da glândula. Estas enzimas ativadas produzem lesão celular e morte. A necrose pode envolver não só o pâncreas, mas também a gordura e estruturas envolventes, conduzindo ao extravasamento de fluido no espaço retroperitonial (perdas para o “terceiro espaço”). Apesar de alguns graus de necrose microscópica poderem estar presentes na maioria dos casos de pancreatite aguda, necrose mais grave (visível numa tomografia computadorizada [TC] realçada com contraste) é designada pancreatite necrotizante aguda e é distinguida da pancreatite intersticial aguda ligeira, na qual a necrose não é visível na TC scan. Além do dano local, dentro e ao redor do pâncreas, a pancreatite agusa pode estar associada a falência de órgãos a distancia. A liberação de citocinas inflamatórias e enzimas digestivas ativadas na circulação pode produzir resposta inflamatória sistêmica e falência de sistema de órgãos associada. As manifestações mais comuns destes processos incluem hipotensão, insuficiência renal e insuficiente respiratória. Cálculos biliares e álcool Eposódios graves: reparo com cicatrização; Episódios repetitivos levam à pancreatite crônica. 2 representam certa de 70-80% de todos os casos de pancreatite aguda, e a causa permanece desconhecida em cerca de 10% dos casos. Álcool Uso prolongado de quantidade substancial de álcool, ou seja, normalmente mais de 5 anos de ingestão média de 5-8 doses diárias ou mais, é necessário antes que a pancreatite se desenvolva. Mesmo assim, o risco absoluto de pancreatite é apenas de 2-5%, enfatizando, assim, cofatores importantes como dieta rica em gorduras, variabilidade genética e tabagismo. O mecanismo pelo qual o álcool causa lesão pancreática é incerto, mas provavelmente envolve uma mistura de toxicidade direta, estresse oxidativo e alterações na secreção de enzimas pancreativa. Cálculos Biliares e Obstrução A passagem de um cálculo através da ampola de Vater, com obstrução transitória do ducto pancreático, é o evento inicial na pancreatite por cálculos biliares. Apenas cerca de 5% de todos os pacientes com cálculos biliares desenvolvem pancreatite, e pacientes com cálculos pequenos (≤5 mm), que podem passar para o ducto cístico e chegar à ampola, estão em risco mais elevado. Microlitíase descreve cálculos muitos pequenos que não são facilmente visíveis na ultrassonografia transabdominal-padrão, mas podem causar pancreatite por cálculos biliares. Além de cálculos biliares e microlitíase, a obstrução do ducto pancreático em consequência de adenocarcinoma do ducto pancreático, adenoma ou carcinoma ampular ou neoplasia mucinosa papilar intraductal podem causar pancreatite aguda. Estenoses benignas da ampola podem causar pancreatite aguda devido a doenças 3 duodenais, tais como doença celíaca e divertículos periampulares. A disfunção do esfíncter de Oddi, definida por pressões elevadas do esfíncter pancreático, e o pâncreas divisum, no qual o pâncreas dorsal maior drena através da papila menor, são causas controversas de pancreatite aguda, uma vez que estes pacientes apresentam frequentemente mutações genéticas subjacentes que contribuem para esta doença. Drogas, Toxinas e Fatores Metabólicos Níveis de triglicerídeos superiores a 500 mg/dL e normalmente superiores a 1.000 mg/dL podem causar pancreatite aguda, O mecanismo é desconhecido. Pancreatite pode ser precipitada pela administração de estrogênios, que podem exacerbar uma hipertrigliceridemia subjacente. Hipercalcemia é uma causa extremamente rara de pancreatite aguda. Pancreatite induzida por fármacos é rara e geralmente um evento idiossincrárico, Os fármacos implicados incluem 6- mercapto[urina e azatioprina (de uma taxa de ataque de 4%), pentamidina, didanosina, ácido valproico, furosemida, sulfanamidas e aminossalicilatos. Toxinas que podem causar pancreatite aguda incluem álccil metílico, inseticidas organofosforados e o veneno de alguns escorpioes. Causas Genéticas e Autoimunes Mutações em vários genes predispõem ao desenvolvimento de pancreatite aguda e crônica. A maioria dos pacientes com estas mutações não desenvolverá pancreatite, mas aqueles que o fazem frequentemente desenvolvem pancreatite aguda recidivante e, em último caso, pancreatite crônica. Mutações com ganho de função no gene do tripsinogênio catiônico (PRSS1), predispõem a pancreatite hereditária, com uma penetrância tão alta que quase todos os indivíduos afetados irão em algum momento desenvolver pancreatite crônica, com um risco 35 vezes mais elevado de desenvolver adenocarcinoma pancreático ductal ao chegarem aos 70 anos. Mutações no gene regulador transmembrana da fibrose cística (CFTR) e no inibidor da serinoprotease Kazal tipo 1 (SPINK1), quimotripsina C (CTC), gene do receptor sensor do cálcio e genes claudina-2 predispõem à ocorrência de ambas, pancreatite aguda recidivante e crônica. Com exceção de PRSS1, estas mutaçõessão mais bem descritas como cofatores que interagem com outros fatores de risco e modificadores de doenças para causar pancreatite. Duas formas de pancreatite autoimune, apresentando-se classicamente como pancreatite crônica, têm sido identificadas. Tipo 1 é uma doença sistêmica que afeta as glândulas salivares, retroperitônio, ductos biliares, rins e outros órgãos e raramente se apresenta como pancreatite aguda. Tipo 2 afeta apenas o pâncreas e pode, por vezes, apresentar-se como pancreatite aguda inexplicada. Ação da Lipase Lipase: secretada na forma ativa o Ação sobre digestão de gordura: esteatonecrose * Hipocalcemia sérica um marcador de gravidade, devido ao aumento da estease necrose no local acabará ocorrendo essa hipocalcemia sérica no sangue. * Saponização, deposito de cálcio (hipercalcemia) levando a diminuição de cálcio sérico no sangue. * Necrose Gordurosa. 4 Morfologia Macroscópica As lesões básicas são: (1) edema; (2) necrose gordurosa (esteatonecrose); (3) necrose parenquimatosa; (4) destruição da parede vascular e hemorragia; (5) infiltrado inflamatório. O aspecto macroscópico da forma discreta é de intumescimento do órgão (pancreatite edematosa ou intersticial), com esteatonecrose focal, que se evidencia por pontilhado amarelo-gema, constituindo as chamadas “manchas em pingo de vela”. Necrose do parênquima pancreático ou hemorragia estão ausentes. Nos quadros graves, extensas áreas de esteatonecrose estendem-se por todo o órgão, acompanhadas de necrose do parênquima pancreático (pancreatite necrosante) e hemorragia (pancreatite necro- hemorrágica). A hemorragia pode ficar restrita ao pâncreas ou comprometer também a gordura mesentérica. Por vezes, forma-se hematoma peripancreático. A necrose gordurosa situa- se na maioria dos casos na superfície do pâncreas, mas pode estender-se ao omento e ao retroperitônio, ou ainda à medula óssea e até mesmo ao tecido subcutâneo. Na cavidade peritoneal, encontra-se líquido turvo ou acastanhado, contendo, às vezes, glóbulos degordura. Manifestações Clínicas Os sintomas típicos da pancreatite aguda são dor abdominal, náuseas e vômitos. A dor abdominal geralmente tem início no epigástrio e, com frequência, se irradia para a região dorsal. A dor é de caráter contínuo, atingindo sua intensidade máxima em 30 a 60 minutos, após o que persiste por dias. Esses sintomas característicos podem ser mascarados em pacientes que apresentam delírio, falência de múltiplos órgãos ou coma. Em geral, o exame físico revela taquicardia. Hipotensão, taquipneia, dispneia e febre são vistos nos casos mais graves. Confusão, delírio e coma podem estar presentes. O abdome é frequentemente distendido, com a diminuição dos ruídos hidroaéreos. Sensibilidade à palpação do abdome, tanto localizada no epigástrio como difusa, é típica, e é possível ver reação de defesa nos casos mais graves. Pode-se observar maciez à percussão nos campos pulmonares inferiores na presença de derrame pleural. Achados clínicos mais raros, como, por exemplo, presença de equimoses em flancos (sinal de Grey-Turner) ou em região periumblical (sinal de Cullen), resultam do extravasamento de fluidos e sangue do retroperitônio para essas regiões. A icterícia pode estar presente se houver obstrução biliar por um cálculo. 5 Taquicardia, dispneia, taquipneia, hipotensão ortostática, derrame pleural, queda da saturação de oxigênio ou sinais de choque associados a perdas substanciais para o terceiro espaço evidenciam maior probabilidade de complicações e pior prognóstico. A pancreatite aguda grave é caracterizada por necrose pancreática e peripancreática, presença de coleções e disfunção de outros órgãos e sistemas. Consequências e complicações da Pancreatite Aguda: o Hipotensão arterial; o Choque o Dano alveolar difuso (DAD) ou síndrome de angústia respirartória aguda (SARA); o Coagulação intravascular disseminada; o Insuficiencia Renal Aguda; o Abscesso Pancreático; o Abscesso pancreático; o Pseudocisto; o Obstrução duodenal e do colédoco (icterícia). Morfologia Microscópica Na forma discreta (pancreatite edematosa) encontram-se afastamento dos lóbulos e ácinos por edema e escasso infiltrado inflamatório de polimorfonucleares. No tecido adiposo, encontram- se focos de esteatonecrose caracterizada por apagamento da estrutura tecidual, que adquire coloração basofílica devido à saponificação da gordura. Nesse processo, o glicerol e os ácidos graxos, liberados pela lise dos adipócitos, combinam-se com o cálcio. A forma edematosa é pouco observada na prática do patologista e costuma ser reversível. Na forma grave (pancreatite necro-hemorrágica), a esteatonecrose estende-se por áreas maiores e é acompanhada de necrose do parênquima pancreático e hemorragia. Inicialmente, observa-se necrose de grupos de ácinos, com infiltrado inflamatório de polimorfonucleares discreto; nas lesões mais graves, há destruição extensa de lóbulos e ductos, com infiltrado inflamatório polimorfonuclear exuberante, podendo formar abscessos. Nos casos graves, é frequente o encontro de trombos, o que agrava ainda mais a lesão parenquimatosa por causa da isquemia. (1) extravasamentos microvasculares causando edema; (2) necrose de tecido adiposo por enzimas lipolíticas; (3) inflamação aguda; (4) destruição proteolítica do parênquima pancreático; e (5) destruição dos vasos sanguíneos e subsequente hemorragia intersticial. Esteatonecrose. Saponificação da gordura. Necrose do parênquima e infiltrado inflamatório do polimorfonucleares. 6 Diagnostico A elevação das concentrações de amilase ou lípase sérica, três vezes acima dos valores normais, são características de pancreatite aguda. Na pancreatite aguda grave, a leucocitose e a hemoconcentração são observadas com mais frequência. A manutenção dos níveis elevados de ureia e creatinina e a persistência da hemoconcentração após ressucitação volêmica se associam a um pior prognóstico. A hiperglicemia, a hipocalcemia e a elevação discreta dos níveis séricos dos triglicérides podem estar presentes nos casos mais graves. Na maioria dos pacientes, a ultrassonografia abdominal e a tomografia computadorizada são usadas de forma complementar. Os achados ultrassonográficos de pancreatite aguda incluem aumento do volume da glândula, presença de edema e de coleções peripancreáticas associadas. A ultrassonografia abdominal é mais precisa para a identificação de cálculos biliares ou de dilatação coledociana. Por outro lado, a tomografia computadorizada (TC) é mais específica para se confirmar o diagnóstico de pancreatite aguda, a presença de necrose pancreática e de coleções peripancreáticas. Na TC com contraste, o parênquima pancreático que sofre opacificação pelo meio de contraste ainda é considerado viável enquanto a necrose pancreática não sofre impregnação pelo meio de contraste. A extensão da necrose pancreática, observada com maior exatidão a partir do terceiro dia do início do quadro, não podendo ser evidenciada quando a TC é realizada de forma precoce, tem importância prognóstica. A TC deve ser realizada rotineiramente em pacientes na vigência da primeira crise de pancreatite aguda, nas formas graves da doença, naqueles que apresentam complicações sistêmicas ou quando a doença apresenta evolução lenta ou há dúvidas acerca do diagnóstico. A Ressonância Nuclear Magnética (RM) é equivalente à TC no diagnóstico tanto da doença e de suas complicações como de outras patologias que possam mimetizar a pancreatite aguda. A Colangiopancreatografia por Ressonância Magnética (CPRM) é mais precisa que a TC na identificação de cálculos biliares. Em pacientes críticos, é mais difícil realizar RM do que TC. 7 Pancreatite Crônica A pancreatite crônica, que é um processo complexo, implica a presença de fibrose irreversível e permanente, frequentemente com a presença de infiltrado inflamatório mononuclear,lesão nervosa, perda de ácinos, ductos e ilhotas. A pancreatite crônica evolui após episódios de pancreatite aguda, que pode ser subclínica, mas às vezes é difícil identificar a transição entre pancreatite aguda e crônica. Embora a pancreatite crônica possa se apresentar como repetidos surtos de pancreatite aguda, a principal distinção entre a pancreatite surtos de pancreatite aguda, a principal distinção entre a pancreatite aguda, principalmente distinção entre a pancreatite aguda é a crônica é o comprometimento irreversível na função pancreática que é característico da pancreatite crônica. A pancreatite autoimune, que é uma das manifestações da doença associada à IgG4. Esta faz parte de uma doença autoimune sistêmica ou é lesão isolada. Clinicamente, o quadro pode simular adenocarcinoma do pâncreas. A doença responde bem aos corticosteroides. Epidemiologia A prevalência de evidencias histológicas de pancreatite crônica em estudos de autópsia é de cerca de 5%, o que indica que muitas pessoas aparentemente desenvolvem lesões pancreáticas crônicas como consequência do envelhecimento, de outras doenças ou da exposição a toxinas, como, por exemplo, consumo de álcool, mas não desenvolvem quaisquer sintomas ou sinais de pancreatite crônica durante toda a vida. Fisiopatologia Múltiplos episódios de inflamação aguda, seja clínica ou subclínica, eventualmente alteram a resposta inflamatória do pâncreas, com evolução para inflamação crônica, ativação das células estreladas pancreáticas e produção de fibrose. Esse processo é autossustentável e produz o dano histológico característico observado na doença. Mutações genéticas predispõem à pancreatite crônica, mas essa predisposição está associada à exposição do indivíduo a várias toxinas que precipitam a pancreatite aguda, com necrose celular ou apoptose, que progride, em alguns indivíduos, particularmente aqueles com múltiplos episódios, para a cronicidade e a fibrose do órgão. Nos países ocidentais, o abuso de álcool e o tabaco são as causas principais de pancreatite crônica. Um fator importante para a dor na pancreatite crônica é a lesão dos nervos nociceptivos do pâncreas e a complexa interação neuroimmune induzida pelo estado inflamatório crônico. A dor crônica produz hiperalgesia visceral, medular e central, podendo perpetuar- se mesmo quando o tratamento da insuficiência pancreática é bem-sucedido. Além desse mecanismo neural, o aumento da pressão no interior da glândula, a isquemia associada, a obstrução do ducto pancreático e a formação de um pseudocisto podem causar dor. Álcool e Tabaco essas células iram promover a secreção de colágeno e remodelação da membrana, contração e retração do parênquima deformando os ductos e com isso haverá uma lesão celular irreversível devido a alteração estrutural do órgão. 8 Nos Estados Unidos e em outros países industriais, o álcool causa cerca de 70% a 80% de todos os casos de pancreatite crônica. Em geral, é necessário haver ingestão substancial e prolongada de álcool, na ordem de 5 a 8 drinques diários, ao longo de mais de 5 anos. A maioria das pessoas que consome essa quantidade de álcool não desenvolve pancreatite crônica, o que aponta para a ocorrência de cofatores, como alterações genéticas e tabagismo. Na pancreatite alcoólica, admite-se haver hipersecreção proteica pelas células acinares induzida pelo álcool sem haver secreção proporcional de água e bicarbonato pelas células centroacinares/ductulares; com isso, a secreção produzida, mais espessa, forma tampões proteicos intraductais que acabam por obstruir os pequenos ductos. A precipitação de cálcio sobre os tampões proteicos resulta na formação de cálculos intraductais comumente observados nessa pancreatite, razão pela qual ela é conhecida também como pancreatite crônica calcificante. Genética A pancreatite hereditária é uma doença autossômica dominante caracterizada pelo desenvolvimento precoce de pancreatite aguda e crônica, insuficiência pancreática exócrina e endócrina, e alto risco de adenocarcinoma pancreático. Quando ocorrem mutações no gene do tripsinogênio, parece que o PRSS1 nessas famílias leva a um ganho de função em que o tripsinogênio mutante é ativado à tripsina. Essa tripsina, se presente em uma quantidade que supere os mecanismos normais de proteção, pode ativar outras enzimas pancreáticas e levar a lesões agudas da glândula pancreática e a uma pancreatite crônica. Um dos mecanismos protetores é o gene inibidor da tripsina pancreática, chamado SPINK1. Mutações com perda de função do SPINK1 podem predispor à pancreatite crônica, mas, ao contrário das mutações PRSS1, não são suficientes para causá-la. As principais mutações do CFTR levam à fibrose cística, que está associada a pancreatite crônica e atrofia pancreática. Mutações mais brandas do CFTR predispõem à pancreatite crônica sem causar as características manifestações sinopulmonares de fibrose cística, podendo ser encontradas em pacientes com pancreatite crônicas idiopática. Morfologia Macroscópica O pâncreas mostra aumento da consistência e aspecto nodular grosseiro. O tamanho do órgão varia de acordo com a intensidade e a duração do processo, podendo apresentar- se normal, aumentado ou diminuído de volume. O sistema ductal encontra-se dilatado, por causa de estenose cicatricial, de fibrose periductal ou de cálculos na luz dos ductos. Pseudocistos formam-se por autodigestão em um surto de pancreatite aguda ou por obstrução ductal, aumento da pressão e ruptura do ducto, com destruição parenquimatosa e formação de cavidade cuja parede é constituída por fibrose e infiltrado inflamatório mononuclear; pode haver ou não comunicação da cavidade com o sistema ductal. Por vezes, porém, há preservação do epitélio do ducto dilatado, quando são chamados de cistos de retenção. As mesmas complicações comentadas para os pseudocistos na pancreatite aguda são também encontradas na pancreatite crônicas: fistulização para o intestino ou colédoco, hemorragia, ruptura e infecção. Morfologia Microscópica 9 Observam-se hipotrofia acinar, que se caracteriza no início por diminuição dos grânulos de zimogênio das células acinares e dilatação da luz dos ácinos, os quais se tornam semelhantes a dúctulos, mantendo-se a arquitetura lobular. Esses “dúctulos” e os ductos intra e interlobulares contêm material proteináceo eosinofílico na luz dilatada. Mais tarde, os ácinos desaparecem e são substituídos por fibrose, restando apenas elementos ductulares que parecem dúctulos verdadeiros em meio ao tecido conjuntivo. Os ductos maiores podem apresentar epitélio hipotrófico, hiperplásico ou com metaplasia escamosa. As lesões têm distribuição lobular, e lóbulos normais podem aparecer lado a lado com lóbulos lesados. Cálculos podem formar-se na luz dos ductos, principalmente quando a pancreatite é de etiologia alcoólica. A fibrose, de início com distribuição intra e perilobular, preservando a arquitetura lobular, evolui com substituição acinar extensa. Na fase avançada, evidenciam-se somente estruturas ductais e ilhotas de Langerhans, que são mais resistentes. No início, as ilhotas mantêm-se preservadas e ficam envolvidas por tecido conjuntivo; com a evolução das lesões, elas também sofrem hipotrofia. Infiltrado inflamatório mononuclear permeia a fibrose, na maioria das vezes, é discreto. Na pancreatite autoimune, encontram-se infiltrado de mononucleares, rico em plasmócitos produtores de IgG4, em correspondência com ductos e na parede de veias (venulite), além de fibrose acentuada. A pancreatite crônica é caracterizada por fibrose parenquimatosa, pelo reduzido número e tamanho dos ácinos, pelo relativo acometimento das ilhotas de Langerhans e pela variável dilatação dos ductos pancreáticos. Manifestações Clínicas O sintoma mais comum de pancreatite crônica é dor abdominal. A dor pode ser episódica ou constante e, em geral, é sentida no epigástrio,com irradiação para as costas. Se a dor for episódica, o paciente pode ser rotulado como portador de pancreatite aguda ou de uma exacerbação aguda da pancreatite crônica. Quando a dor é severa, podem 10 ocorrer náuseas e vômitos. A dor pode piorar, melhorar ou permanecer estável ao longo do tempo. Até 5% dos pacientes não têm dor, apresentando, em vez disso, insuficiência pancreática exócrina (esteatorreia, perda de peso) ou endócrina (diabetes). A doença tende a ser progressiva ao longo do tempo, mesmo que a causa (p. ex., álcool) seja removida. A fisiopatologia da dor é complexa. Diagnostico Pode ser suspeitado com base nas características clínicas, mas deve ser confirmado por testes que identificam a lesão estrutural do pâncreas ou alterações na função pancreática. A pancreatite crônica é uma doença que progride lentamente. Nela, a lesão visível da glândula (p. ex., em uma TC) e a insuficiência funcional (p. ex., esteatorreia ou diabetes) podem não ser aparentes por anos. Todos os testes diagnósticos são mais precisos quando a doença está em estágio avançado e menos esclarecedores nos estágios iniciais. 11 Cisto Pancreático o Cistos verdadeiros o Desenvolvimento anômalo dos ductos pancreáticos o Poucos mm até 5 cm o Revestidos por epitélio colunar baixo, sem comunicação com o sist. Ductal o 5-15% dos cistos pancreáticos são neoplásicos o Doença policística do pâncreas • Isolada • Doença renal policística • Doença de Von Hippel-Lindau Pserudocisto Caso Clínico – Pancreatite Aguda JCS, masculino, 53 anos comparece ao pronto-socorro com queixas de dor abdominal grave na região epigástrica média que irradia para as costas. A dor melhora quando o paciente se inclina para a frente ou assume a posição fetal e se agrava com respiração intensa e movimento. Ele também se queixa de náuseas, vômitos e anorexia, e indica uma história de ingestão alcoólica intensa na última semana. Ele está taquicardíaco, taquipneico e febril com hipotensão. Ele está ligeiramente agitado e confuso. A ausculta pulmonar revela murmúrio vesicular diminuído na base do pulmão esquerdo. A investigação laboratorial evidenciou aumento dos níveis séricos de amilase e lipase. I. Qual a principal hipótese diagnóstica? II. Qual o papel do álcool na patogenia da doença? Caso Clínico – Pancreatite Crônica JCS, masculino, 61 anos, comparece ao pronto-socorro com queixas de dor abdominal grave na região epigástrica média que irradia para as costas. A dor melhora quando paciente se inclina para a frente ou assume a posição fetal e se agrava com respiração intensa e movimento. Ele também se queixa de náuseas, vômitos e anorexia, e indica uma história de ingestão alcoólica intensa na ultima semana. Refere ter apresentado vários episódios semelhantes nos últimos oito anos. Há certa de um ano a dor, inicialmente episódica, torna-se constante, com piora após as refeições. Diminuição do apetite e emagrecimento progressivo – cerca de 8 kg no ultimo ano. 12 Refere diarreias frequentes no período, fezes de aspectos esbranquiçado que ficam flutuando no vaso, Aumento da glicemia, deterctado em vistas esporádicas ao pronto socorro, I. O que explica o agravamento dos sintomas apresentados por JCS? Caso Clínico – Bonus Uma mulher de 47 anos de idade com sobrepeso procura o pronto atendimento por queixa de dor abdominal generalizada. Refere que há um dia iniciou dor em quadrante superior direito que se iniciou após ingestão de refeição gordurosa (assemelhando-se aos episódios prévios apresentados por ela no pronto-socorro ao longo dos últimos meses), porém hoje houve piora da intensidade da dor que irradiou-se para todo o andar superior do abdômen, acompanhada de náuseas e vômito. Relata que uma ultrassonografia obtida em sua última visita no pronto-socorro revelou cálculos biliares sem inflamação da vesícula biliar, e ela foi aconselhada a consultar um cirurgião. Ao exame: REG, facies de dor, desidratada, levemente ictérica. Abdomen doloroso à palpação, principalmente no andar superior. Exames subsidiários revelam leucocitose, aumento de amilase, lipase e PCR. I. Qual a principal hipótese diagnóstica que explica o quadro atual? II. Quais dados de anamnese, exame físico e exames laboratoriais que subsidiam a(s) hipótese(s) diagnóstica(s)? III. Explique a fisiopatologia desse processo IV. Proposta: tente responder com consulta, em dez minutos Referencias - BRASILEIRO FILHO, Geraldo. Bogliolo Patologia. 9. ed. Belo Horizonte: Guanabara Koogan, 2016. 1556 p. - FORSMARK, Chris E.. Pancreatite. In: GOLDMAN, Lee. Goldman-Cecil: tratado de medicina interna. 25. ed. São Paulo: Elsevier Editora Ltda., 2018. Cap. 144. p. 170-513. Disponível em: https://www.evolution.com.br/epubreader/9788535289947. Acesso em: 14 set. 2020. - GRIMM, Ian S.. Pancreatite. In: S.RUNGE, Marschall. Netter: medicina interna. 2. ed. Rio de Janeiro: Elsevier Editora Ltda., 2009. Cap. 55. p. 404-408. - H.HRUBAN, Ralph. O pâncreas. In: KUMAR, Vinay. Robbins & Cotran - Patologia: bases patológicas das doenças. 8. ed. Rio de Janeiro: Elsevier Editora Ltda., 2010. Cap. 19. p. 899-912.
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