Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
INVESTIGAÇÃO DE RISCOS E FRAUDES CORPORATIVAS AULA 5 Prof. Francisco de Assis do Rego Prof. Guilherme Frederico Tobias de Bueno 2 CONVERSA INICIAL O objetivo desta aula é explicar ao aluno qual a origem do termo compliance, bem como demonstrar em que consiste um Programa de Compliance, qual é o seu escopo, como funciona e quais são as vantagens que esse programa proporciona às corporações que o adotam de forma efetiva. Será apresentado aos alunos que o Programa de Compliance consiste em uma ferramenta de autorregulação nas instituições, a qual se dá por meio da criação de códigos de ética e de conduta, desenvolvimento de políticas e normas internas, todos baseadas nas boas práticas corporativas e na legislação que regulam as atividades empresariais. Com relação aos objetivos, será demonstrado que o Programa de compliance, inicialmente, atua preventivamente à ocorrência de fraudes, por meio da identificação e mitigação dos riscos inerentes às atividades empresariais e, por isso, as empresas dos mais variados ramos de atuação têm adotado essa ferramenta no âmbito de suas estruturas de governança corporativa, principalmente aquelas que atuam nos mercados mais desenvolvidos. Ainda, será exposto aos alunos que o Programa de compliance funciona como um sistema e é estruturado por pilares, os quais são inter-relacionados e codependentes, sendo que a efetividade do programa depende da efetividade de cada um deles. Em seguida, será evidenciada a relevância que o Líder de Compliance destacado para implantar e conduzir o programa dentro da corporação exerce no resultado final. Por isso, serão apresentadas algumas características que devem estar presentes nesse profissional para que os objetivos do Programa de compliance sejam efetivamente atingidos. Na sequência, será iniciada a apresentação da estrutura do Programa de Compliance, sendo que, nesta aula, serão abordados os seguintes pilares: I. O Apoio da Alta Administração – Tone From The Top; II. Mapeamento e Análise de Riscos; III. Códigos de ética e de conduta. Vale dizer que os demais elementos estruturantes do programa serão tratados na aula seguinte. 3 Além da apresentação de cada um dos elementos do Programa de Compliance, serão discutidas as respectivas particularidades e nuances, demonstrando a função específica de todos e como eles se inter-relacionam. Por fim, na parte prática, serão evidenciadas algumas das vantagens de ordem competitiva que o Programa de Compliance proporciona às empresas, refletindo diretamente no aumento de sua credibilidade perante o mercado e no ganho de competitividade em relação aos concorrentes. TEMA 1 – UMA VISÃO GERAL SOBRE O PROGRAMA DE COMPLIANCE O termo compliance é uma palavra de origem inglesa e deriva do verbo to comply, o qual significa "agir em concordância com as leis, regulamentos e ordens". Assim, pode-se entender que o Programa de Compliance consiste em uma ferramenta de autorregulação das empresas, desenvolvido com base em boas práticas corporativas, incentivando condutas pautadas pela ética, visando prevenir a ocorrência de fraudes e corrupção. A ocorrência destes ilícitos causa prejuízos à imagem da companhia e prejudicam sua saúde financeira. O legislador brasileiro utilizou o termo programa de integridade para se referir ao Programa de Compliance, conforme o art. 7º, inciso VIII, da Lei n. 12.846/2013. De todo modo, o Programa de Compliance objetiva influenciar o comportamento das pessoas, por meio de normas e políticas internas, desenvolvendo uma cultura corporativa com base em comportamentos éticos e probos nas relações interpessoais e institucionais. A criação do Programa de Compliance dentro da empresa parte dos riscos de fraude e corrupção a que a empresa está exposta, os quais se denominam "Riscos de Compliance" e são inerentes às atividades de determinada empresa. Identificados os riscos, já que raramente se pode eliminá-los, são desenvolvidas e implementadas medidas com o intuito de mitigá-los, tais como a elaboração dos Códigos de Ética e Conduta, a criação de políticas e controles internos, a criação do canal de denúncias, investigação e reporte. Por isso, ele deve ser desenvolvido sob medida para cada corporação, dado que suas regras e políticas devem ser elaboradas de acordo com os riscos específicos de cada empresa. O Programa de Compliance funciona como um sistema e, assim, a falha de um único processo pode comprometer seu resultado pretendido. 4 Deste modo, para que ele seja realmente efetivo, deve ser estruturado por meio dos seguintes pilares: 1. Apoio da alta administração – Tone from the Top; 2. Análise e mapeamento de riscos; 3. Códigos de ética e de conduta; 4. Due Diligence de terceiros; 5. Políticas e controles internos; 6. Comunicação e treinamento; 7. Canal de denúncias; 8. Investigação e reporte; 9. Monitoramento e auditoria. A implantação do Programa de Compliance pode ocorrer por meio de equipe formada por funcionários da própria empresa ou por consultoria especializada contratada pela empresa. Vale lembrar que o sucesso do processo de implantação dependerá, também, do envolvimento de todos os setores e departamentos da empresa, sob pena de comprometer a efetividade do programa. TEMA 2 – O LÍDER DE COMPLIANCE O Líder de Compliance será a pessoa destacada pela empresa para conduzir todo o processo de implantação do programa, e sua atuação será determinante para a efetividade do programa. Esse líder será o auxiliar interno da empresa caso a implantação seja realizada por meio de consultoria externa. Considerando a relevância da atuação do líder de Compliance, Giovanini (2014, p. 114-117) recomenda que esse cargo seja ocupado por pessoa já madura e experiente na vida profissional, que demonstre capacidade de liderança e gerenciamento de pessoas, seja comunicativo, possua habilidade de convencimento e influência sobre os demais, tenha aptidão para gerenciamento e solução de conflitos, tenha segurança para tomar decisões, goze de credibilidade entre os pares e conte com reputação ilibada, adote comportamento ético, seja proativo, detenha conhecimentos em sistemas de gestão, ferramentas de qualidade e conheça os negócios e processos da empresa tendo em vista os desafios que se lhe apresentarão ao longo de todo o 5 processo, principalmente na fase inicial, até a completa implantação do programa. Destarte, podemos verificar que, independentemente da maneira que for escolhida para implantação, se interna ou externa – e isso vai depender da realidade de cada empresa –, grande parte do resultado a ser obtido com o Programa de Compliance dependerá do perfil do líder que for escolhido, daí a relevância e o cuidado que se deve ter no momento da designação deste que será o comandante da longa empreitada. TEMA 3 – O APOIO DA ALTA ADMINISTRAÇÃO: TONE FROM THE TOP O apoio da Alta Administração talvez seja o principal responsável pelo sucesso ou não do Programa de Compliance, principalmente porque ele permeia e influencia todos os demais pilares que o estruturam. A implantação do Programa de Compliance parte da decisão da Alta Administração da empresa, e esta deverá emprestar apoio irrestrito ao setor responsável pela materialização do programa, sob pena de comprometer o seu desenvolvimento. Somente com esse suporte é que será possível a inclusão da nova cultura de integridade dentro da organização, bem com a adesão e colaboração dos stakeholders ao programa. Ainda, a Alta Administração deverá promover as condições para a criação do setor que será responsável pelo Compliance, disponibilizando recursos financeiros e humanos necessários à estruturação do programa; conceder autonomia e independência ao profissional Líder de Compliance para o exercício dassuas funções; e permitir a participação do gestor de Compliance nas reuniões do Conselho e/ou corpo diretivo, cujas recomendações devem ser consideradas na tomada de decisões. O membro da Alta Administração, ao realizar o discurso de abertura de qualquer evento promovido pela companhia – reuniões, treinamentos, comemorações – deve exaltar e incentivar o cumprimento das normas do código de ética e demonstrar o apoio visível e inequívoco às investigações das denúncias e aplicação, quando for o caso, das medidas disciplinares pertinentes. Além disso, recomenda-se a existência de um canal de comunicação aberto e acessível entre o Líder de Compliance e a Alta Administração da empresa. Finalmente, os membros da Alta Administração devem ser os primeiros a agir sempre dentro dos limites estabelecidos pelas 6 normas do Código de Ética e de Conduta da empresa, além de incentivar que os demais também o façam. Essas ações de apoio da Alta Administração devem, sempre que possível, ser documentadas, visando à comprovação do cumprimento desses requisitos. A implantação do Programa de Compliance envolve mudanças de paradigmas antigos e exige a adoção de novos comportamentos, sendo natural que ocorram resistências a tais mudanças, o que é minimizado por meio do apoio da Alta Administração. A esse respeito, Giovanini (2014, p. 56) nos mostra, de forma bem didática, o poder do exemplo, quando ele pontua que o discurso deve igualar-se à ação. Imaginemos um pai aconselhando o filho adolescente que nunca fume cigarro, pois faz mal à saúde. Contudo, ao aconselhar o filho, o pai está segurando um cigarro aceso na mão direita. Ora, certamente o exemplo do comportamento do pai vai influenciar muito mais no comportamento do filho do que as suas palavras. Diante dessa analogia, podemos afirmar que as condutas do Presidente e/ou dos Diretores da corporação exercem influência marcante no comportamento das demais pessoas que atuam na empresa, pois são eles que dão o tom de como todos devem respeitar as normas internas e do nível de comprometimento com os objetivos da instituição e com o Programa de Compliance. Destarte, o apoio da Alta Administração é deveras relevante ao programa de integridade, sendo que o Decreto n. 8.420/2015, em seu art. 42, inciso I, estabelece-o como primeiro requisito de efetividade: "I - comprometimento da alta direção da pessoa jurídica, incluídos os conselhos, evidenciado pelo apoio visível e inequívoco ao programa" (Brasil, 2015). TEMA 4 – MAPEAMENTO E ANÁLISE DE RISCOS Iniciaremos este tópico a partir de duas premissas: 1. todas as atividades empresariais envolvem riscos que lhes são inerentes; 2. risco é a probabilidade da ocorrência de um fato ou evento danoso. Logo, se risco está relacionado a dano e dano está relacionado a prejuízo, então podemos dizer que risco também está relacionado a prejuízo. Importante demonstrar que o risco somente se elimina com a eliminação da própria atividade, o que nem sempre é possível sob pena de inviabilizar a 7 própria empresa. Desse modo, a solução mais viável consiste em adotar medidas capazes de reduzir a probabilidade de ocorrência dos riscos. Primeiramente, os riscos de compliance devem ser conhecidos e mapeados e, num segundo momento, devem ser analisados e classificados quanto à probabilidade de ocorrência e o potencial de dano. Quando o Programa de Compliance é implementado, é recomendável focar apenas os riscos que foram identificados como sendo os de alta probabilidade de ocorrência e, simultaneamente, de alto potencial de dano. A apuração dos riscos deve envolver todos os setores da empresa, a fim de que o mapeamento seja o mais completo possível. Após o levantamento dos riscos da empresa, é necessário classificá-los em ordem crescente, uns em relação aos outros, de acordo com a probabilidade da ocorrência de cada um e o potencial de dano financeiro e à imagem da empresa que podem gerar. Se, por exemplo, foram detectados nove riscos, vamos dividi-los de acordo com os seguintes graus: baixo, médio e alto, primeiramente em relação à probabilidade da ocorrência, depois quanto ao impacto que o risco pode gerar. Assim, o setor de compliance se ocupará, inicialmente, daqueles considerados de alta probabilidade e alto potencial de dano concomitantemente, sem que isso implique no descarte dos demais riscos existentes que foram considerados de nível médio ou baixo. O mapeamento dos riscos deve ocorrer periodicamente, dependendo de cada situação, podendo ser semestral ou anual, por exemplo. O setor de Compliance deve acompanhar os resultados das medidas adotadas para mitigação dos riscos e providenciar os ajustes necessários, quando for o caso. Ademais, deverá envolver a alta administração na identificação e análise dos riscos, visando ao seu apoio na fase de desenvolvimento e implantação das políticas internas. TEMA 5 – CÓDIGOS DE ÉTICA E DE CONDUTA Os Códigos de Ética e de Conduta são os documentos normativos internos. Eles estabelecem os parâmetros de conduta dos agentes da empresa e as diretrizes do Programa de Compliance. O Código de Ética relaciona os valores da empresa e o Código de Conduta expõe como a empresa espera que seus funcionários e administradores 8 ajam diante de situações específicas, bem como estabelece as penalidades disciplinares no caso de transgressão das normas da empresa. Exemplos de penalidades: advertência, suspensão e demissão. Os Códigos de Conduta são compostos por diversos temas, tais como: atendimento à legislação; zelo pela imagem da empresa; conflito de interesses; relações com stakeholders, em particular com os parceiros comerciais, clientes, fornecedores e o mercado; segurança da informação e propriedade intelectual; conformidade nos processos e nas informações; proteção ambiental; saúde e segurança do trabalho; confidencialidade; respeito, honestidade e integridade; proibição à retaliação (principalmente no caso de denúncias de atos ilícitos); combate a fraudes, corrupção e lavagem de dinheiro; assédio moral e assédio sexual; e combate ao trabalho escravo e ao trabalho infantil (Giovanini, 2014, p. 138). Além disso, esses códigos têm a função de divulgar os valores da empresa, de forma ampla e irrestrita, a todos os públicos que com ela se relacionam, sejam internos ou externos. Por isso, a sua redação deve ser clara e acessível aos diversos públicos, o que contribui para o a disseminação da cultura ética no ambiente da empresa de forma mais célere e efetiva, visando à mitigação dos riscos de compliance. NA PRÁTICA Para fins práticos, cabe destacar algumas das vantagens que podem ser experimentadas pela empresa que opta em adotar a cultura de compliance: A empresa passará a conhecer os riscos a que está exposta e, assim, adotar as medidas necessárias para mitigá-los. Com isso, a ocorrência de casos de fraudes internas e corrupção diminuem sensivelmente, preservando a saúde financeira da empresa e sua imagem perante o mercado e a sociedade em geral, principalmente no que tange à credibilidade. O aumento da credibilidade da empresa entre seus funcionários, parceiros e clientes torna-a mais competitiva perante os seus concorrentes, seja com relação à realização de mais negócios, seja quanto à atração de maiores talentos para comporem seus quadros funcionais. 9 Conforme a Lei n. 12.846/2013, em seu art. 6º, a empresa passa a gozar do benefício legal da redução de eventual multa administrativa imposta pelo Poder Público em eventual envolvimento da empresa em caso de corrupção, a qual pode atingir o patamar de 20% do faturamento bruto anual ou R$ 60 milhões, conforme o caso (Brasil, 2013). Experimentar a redução dos custos operacionais e o aumento da sua competitividade em relação aos concorrentes, agregando valor à marca e à imagem, vez que “nummundo em constante transformação, a nova leva de consumidores tende a ser altamente crítica e a adquirir não somente produtos e serviços, mas valores e comportamentos sustentáveis, além de seus efeitos em termos de confiança pública nacional e internacional” (Ribeiro; Diniz, 2015, p. 94). A maior empresa brasileira, a Petrobras, que foi vítima de casos de corrupção, em sua política de relacionamento com terceiros passou a exigir dos fornecedores a demonstração objetiva de integridade, o que, a nosso ver, somente é possível por meio do Programa de Compliance (Petrobras, 2015, p. 14). O Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES), o maior banco de financiamento de investimentos de longo prazo do país, que disponibiliza crédito com juros subsidiados, passou a incluir nos contratos de concessão de crédito o condicionamento ao desembolso das respectivas parcelas ao não envolvimento do financiado em casos de corrupção. FINALIZANDO Nesta aula foram demonstrados a origem do termo Compliance, em que consiste um Programa de Compliance, qual é o seu escopo, como funciona e quais são as vantagens que esse programa proporciona às corporações que o adotam de forma efetiva. Viu-se que o Programa de Compliance se desenvolve com base nos códigos de ética e de conduta, políticas e normas internas, baseados nas boas práticas corporativas e na legislação. Verificou-se também que o Programa de Compliance atua preventivamente com relação às fraudes, por meio da identificação e mitigação dos riscos. 10 Observou-se que o Programa de Compliance funciona como um sistema e é estruturado por pilares, os quais são inter-relacionados e codependentes entre si. Demonstraram-se o papel e a relevância do Líder de Compliance, bem com as competências que devem estar presentes nesse profissional. Iniciou-se a apresentação da estrutura do Programa de Compliance, em que foram abordados os aspectos dos seguintes pilares: I. Apoio da Alta Administração – Tone From The Top; II. Mapeamento e Análise de Riscos; III. Códigos de Ética e de Conduta. Por fim, foram demonstradas vantagens que o Programa de Compliance proporciona às empresas, além da crescente exigência do mercado na demonstração objetiva de integridade das corporações. 11 REFERÊNCIAS BRASIL. Decreto n. 8.420, de 18 de março de 2015. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 19 mar. 2015. _____. Lei n. 12.846, de 1 de agosto de 2013. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 2 ago. 2013. CANDELORO, A. P. P.; RIZZO, M. B. M. de; PINHO, V. Compliance 360º: estratégias, conflitos e vaidades no mundo corporativo. São Paulo: Trevisan Editora Universitária, 2012. GIOVANINI, W. Compliance: excelência na prática. São Paulo: [editora independente], 2014. GONSALES, A. et al. Compliance: A nova regra do jogo. São Paulo: Pauligrafi, 2016. SANTOS, J. A. A.; BERTONCINI, M.; CUSTÓDIO, U. Comentários à Lei 12.846/2013: Lei anticorrupção. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2014.
Compartilhar